Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 446/2016-T
Data da decisão: 2017-02-06  Selo  
Valor do pedido: € 17.209,84
Tema: IS – Verba 28 da TGIS
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Decisão Arbitral

 

I – RELATÓRIO

 

1        A… SA, com o NIPC[1]…, com sede na Rua … nº…, …-…Lisboa, apresentou um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º, do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a AT[3], com vista à apreciação da legalidade dos atos tributários de liquidação de imposto do selo, referente ao ano de 2015, incidentes sobre a propriedade de terreno para construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … sob o artigo … área do … Serviço de Finanças do concelho do ..., conforme documentos de cobrança 2016…, no montante de € 5 736,62, 2016…, no montante de € 5 736,61 e 2016… no montante de € 5 736,61, respetivamente, tudo no valor global de € 17 209,84.

2         Que o pedido foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[4] e automaticamente notificado à AT em 29/07/2016.

 

 

3        Nos termos e para efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicado às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 03/10/2016, designado árbitro do tribunal Arlindo José Francisco, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo legalmente estipulado.

4        O tribunal foi constituído em 19/10/2016 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

5        Com o seu pedido, visa o requerente, a anulação de imposto do selo, referente ao ano de 2015, conforme notas de cobrança já referidas, respeitante ao imóvel já identificado cujo VPT[5] é superior a € 1 000 000,00, previsto na verba 28.1 da TGIS[6].

6        Suporta o seu ponto de vista, em síntese, no entendimento de que o facto da inscrição do imóvel como terreno para construção não justifica por si só a tributação, sem que previamente se faça a análise se para o referido terreno há ou não uma edificação autorizada ou prevista.  

7        Considera que o facto do terreno se situar numa área em que o PDM[7] admite a possibilidade das construções futuras se destinarem à habitação, não permite a tributação prevista na verba 28.1 da TGIS, sem que o seu proprietário tenha desencadeado ou manifestado qualquer intenção de levar a efeito tais construções.

8        Assim a mera expectativa de construção com fins habitacionais, por si só, não será suficiente para preencher a previsão da norma e como tal não poderá haver tributação.

9        O requerente, enquanto proprietário do imóvel, não tenciona nele levar a cabo qualquer edificação e o mesmo só veio à sua posse por incumprimento de contrato de crédito por parte de um seu cliente, sendo a tributação manifestamente ilegal por erro nos pressupostos de facto e de direito.

10    Subsidiariamente, invoca a inconstitucionalidade da verba 28 da TGIS quando aplicada a terrenos para construção, por a considerar violadora do princípio basilar da igualdade, consagrado no artigo 13º da CRP[8], ao mesmo tempo que contraria o princípio da igualdade fiscal ao determinar uma dupla tributação e da capacidade contributiva, previstos no seu artigo 104º nº 3.

11    Considera ainda inaplicável ao caso concreto, a jurisprudência do TC[9] que considerou constitucional a verba 28 da TGIS quando aplicada a prédios habitacionais, e não quando aplicada a terrenos para construção, concluindo com o pedido de reembolso do IS[10] indevidamente pago acompanhado do pagamento de juros indemnizatórios por parte da AT, nos termos dos artigos 43º e 100º da LGT[11].

12    Na sua resposta a AT, também síntese, vem, em primeira linha, fazer a sua defesa por exceção suscitando a incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, dado lhe estar vedado apreciar o pedido de declaração de inconstitucionalidade de normas.

13    Por impugnação, vem dizer que, ao contrário do propugnado pelo requerente, o conceito de prédios com afetação habitacional, para efeitos da verba 28 da TGIS, abrange não só os prédios edificados como também os terrenos para construção, dado que o VPT destes é apurado da mesma forma que o VPT dos edifícios construídos, citando neste sentido o Acórdão nº 04950/11 de 14/02/2012 do TCA[12] do Sul.

14    Na sua perspetiva o legislador, ao utilizar a expressão “afetação habitacional”, quis abranger não só os prédios edificados mas também os terrenos para construção, tendo sido este sempre o entendimento da AT, mas agora com a alteração introduzida pela Lei 83-C/2013 que inclui, na redação da verba 28 da TGIS, os terrenos para construção, nenhuma dúvida subsiste quanto à sua tributação em IS

15    O aparecimento da norma ocorreu numa situação de grandes dificuldades para o País, em especial as contas públicas, que levou o legislador a tomar medidas extraordinárias, chamando ao esforço coletivo franjas da sociedade, que revelassem riqueza patrimonial com VPT igual ou superior a € 1 000 000,00.

16    Quanto à inconstitucionalidade da verba 28 da TGIS coma redação da Lei 83-C/2013 de 31/12/2013, refere que o TC, na sua jurisprudência mais recente, vem proclamando a sua constitucionalidade, por não se verificarem violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.

17     Concluindo que, na hipótese de procedência do pedido, não serão devidos juros indemnizatórios, uma vez que a AT, à data dos factos, fez a aplicação da lei em vigor, não se podendo falar em erro imputável aos serviços.

 

II - SANEAMENTO

 

O tribunal foi regularmente constituído, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º, nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

Na resposta a AT suscitou a incompetência material do tribunal, que marcou, por despacho de 23/11/2016 a reunião a que alude o artigo 18º do RJAT para o dia 14/12/2016 que, por indisponibilidade do CAAD, foi remarcada para o dia 05/01/2017, pelas 11,30 horas.

Na aludida reunião o requerente pronunciou-se pela improcedência da exceção invocada pela AT, mantendo esta o seu ponto de vista quanto à mesma.

As partes declararam prescindir da produção de alegações orais ou escritas, tendo o tribunal considerado reunidas as condições para proferir decisão.

Deste modo, não enfermando o processo de nulidades, cumpre decidir.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

 

1 – As questões a dirimir, com interesse para os autos, são as seguintes:

 

a)      Apreciar a exceção de incompetência material do tribunal suscitada pela AT.

b)      Em caso de improcedência da mesma declarar se os atos tributários do IS em questão são ou não ilegais por vício de violação da lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito.

c)       Apreciar se a verba 28.1 da TGIS, na redação em vigor à data dos factos está ou não em conformidade com os princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva.

d)      Se em caso de procedência do pedido com a consequente anulação dos atos tributários aqui em crise e reembolso do IS oportunamente pago, este deverá ou não ser acompanhado do pagamento de juros indemnizatórios por parte da AT.

 

 

       2- Matéria de Facto

 

a)      O requerente, em 31/12/2015 era proprietário do prédio urbano “terreno para construção”, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia de … área do ... serviço de finanças do concelho do ....

b)      O VPT do imóvel em questão foi determinado em 2012 e é de € 1 720 984,25, sobre o qual recaiu o IS no montante global de € 17209,84, divido em três prestações, conforme notas de cobrança 2016… de € 5 736,62, 2016… de € 5 736,61 e 2016… de € 5 736,61.

c)      Até à data do pedido tinham sido pagas as duas primeiras prestações e a 3ª tinha prazo de pagamento até 30 de Novembro de 2016.

d)      O referido imóvel foi avaliado como terreno para construção com uma área de implantação do edifício prevista de 1 450m2 e com destino habitacional em 2003.

e)      Os factos descritos estão provados por documentos juntos aos autos e consideramos serem os relevantes para apreciação do mérito da causa.

 

 

 

3        – Matéria de Direito

 

3.1 – Da incompetência material do tribunal, exceção suscitada pela AT

 

A infração das regras de competência, em razão da matéria determina a incompetência absoluta do tribunal, a qual é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria.

Sustenta a AT que o requerente pretende que seja declarada a inconstitucionalidade da verba 28 da TGIS e consequentemente seja declarada a ilegalidade dos atos tributários de liquidação do imposto do selo o que contraria o plasmado no nº 1 do artigo 2º do RJAT, sendo manifesto que a competência do foro jurisdicional arbitral não compreende a apreciação da conformidade constitucional dos atos legislativos ou das suas normas.

Na reunião do artigo 18º do RJAT, a requerente, convidada a pronunciar-se sobre a exceção invocada, declarou que a mesma não se verifica e que o pedido deverá ser declarado improcedente.

Analisadas as posições das partes sobre esta matéria, o tribunal, tendo em conta as disposições contidas na alínea a) do nº 1 do artigo 2º do RJAT e o artigo 2º da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, entende que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação atinente à declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, no presente caso IS, cuja administração pertence à requerida.

No caso em apreço o requerente pede, em primeira linha, que sejam anulados os atos tributários de liquidação do IS por vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito e, só subsidiariamente, pede a declaração de ilegalidade dos atos tributários em apreço, por terem sido praticados com base em normas que, no seu entender, serão inconstitucionais.

É, pois, evidente que o requerente pretende ver apreciada a ilegalidade dos atos de liquidação, sendo os vícios apontados parte integral da mesma, considerando-se, nesta perspetiva, o tribunal materialmente competente, nos termos legais já referidos, improcedendo, deste modo a exceção suscitada.

 

3.2 – Da ilegalidade dos atos tributários em causa, por erro nos pressupostos de facto e de direito

Na perspetiva do requerente a verba 28 da TGIS só terá aplicação aos terrenos para construção, quando a edificação neles a implantar esteja autorizada ou prevista e se destine à habitação e não basta, no seu entendimento, que o PDM respetivo preveja a construção habitacional, haverá sempre necessidade do seu proprietário desencadear um processo com vista a tal desiderato, o que não aconteceu, no caso do requerente, nem irá acontecer, uma vez que a sua atividade não está potenciada para a construção, mas sim para outras, nomeadamente operações de crédito, sendo o incumprimento dos contratos de crédito a causa de ser proprietário de vários imóveis, incluindo terrenos para construção, cuja propriedade resulta de dações em pagamento. Refere decisões já proferidas por tribunais arbitrais do CAAD onde se decidiu que a verba 28 da TGIS só poderá ser materializada pela verificação da efetiva potencialidade de edificação.

Vejamos o que nos diz a verba 28 da TGIS na redação que lhe foi dada pela Lei 83-C/2013: “28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000,00- sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de IMI:

28.1 – Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI…1% …”

Para o tribunal é patente que a lei exige que haja propriedade, usufruto ou direito de superfície, que o VPT seja igual ou superior a € 1 000 000,00 e, no caso dos terrenos para construção haja edificação autorizada ou prevista.

O legislador nada mais disse sobre expetativas de construção, atividades dos proprietários, intenções de construir ou outras e bem se compreende, na verdade a inscrição dos prédios na matriz é feita mediante declaração apresentada pelo SP[13], conforme artigo 13º nº 1 do CIMI[14] redação da Lei 83-C/2013 de 31 de Dezembro, sendo a iniciativa da primeira avaliação do Chefe de Finanças com base na referida declaração - artigo 37º do CIMI nº1 - e no caso dos terrenos para construção a referida declaração deverá ser acompanhada de fotocópia do alvará de loteamento e caso não exista por fotocópia do alvará de licença de construção, projeto aprovado, informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade de construção – nº 3 do citado artigo 37º do CIMI (este artigo 37º tem a redação da Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro).

Tendo o imóvel em questão sido inscrito na matriz em 2003, altura em que vigorava o CCA[15] a inscrição era feita por declaração do contribuinte proprietário, nº 1 do artigo 14º do citado Código, estando o conceito de terreno para construção plasmado no nº 3 do artigo 6º do CCA que dizia: “ Terrenos para construção são os terrenos, situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedido alvará de loteamento, aprovado projecto ou concedida licença de construção e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo”

Constata-se assim que o prédio em questão vem sendo considerado terreno para construção, pelo menos desde 2 003, por declaração do seu então proprietário, prevendo o respetivo PDM construção habitacional, bem sabendo o seu proprietário da existência da sua potencialidade construtiva que poderá ou não ser utilizada, facto que não está na disponibilidade da requerida, mas o que, por si só, não é suscetível de afastar a sua tributação em IS, no ano de 2015. Nem se diga que a mera expetativa ou possibilidade jurídica não é suficiente para caracterizar o imóvel como terreno para construção e a sua tributação em IS, na verdade a situação cai na previsão da norma do nº 1 do artigo 1º do CIS[16] que diz” O imposto de selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens”. Daí entender o tribunal estarem reunidos os pressupostos de facto e de direito para a sua tributação em IS, isto é, há direito de propriedade de um terreno para construção, o seu VPT é igual ou superior a € 1 000 000,00 e a situação jurídica está prevista na TGIS.

 

3.3 – Da inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS

 

A título subsidiário, o requerente invocou a inconstitucionalidade da norma contida na verba 28.1 da TGIS, na redação da Lei 83-C/2013, quando aplicada a terrenos para construção, considerando que a mesma viola os princípios constitucionais, da igualdade, igualdade fiscal e da capacidade contributiva, consagrados no artigo 13º e nº 3 do artigo 104º, ambos da CRP.

Transcrevemos os normativos constitucionais invocados:

 “Artigo 13º - 1-  Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.

                     2 – Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.”

“Artigo 104º…

 3 – A tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos”

É à luz destes normativos que iremos aferir se a verba 28, 28.1 da TGIS, na redação da Lei 83-C/2013, está ou não em conformidade com a CRP, transcrevendo-se: “28 - Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000,00 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de IMI:

28.1 – Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI…1%”.

 

O requerente sustenta o seu ponto de vista no seguinte:

 No facto do legislador, de forma arbitrária, ter excluído uma parcela significativa de património imobiliário de elevado valor destinado a fins diferentes da habitação;

Tributar em IS o proprietário de um único prédio afeto à habitação com VPT igual ou superior a € 1 000 000,00 e, excluir outro proprietário, com vários prédios que na sua globalidade ultrapassam aquele VPT;

Não ter em conta que há terrenos para construção de habitação cujo VPT é igual ou superior a € 1 000 000,00, mas relativamente aos quais está prevista a edificação de unidades habitacionais de valor inferior a € 1 000 000,00.

Fazer dupla tributação do mesmo facto tributário o que gera discriminação negativa relativamente a outros proprietários que, apenas viram incidir sobre o mesmo facto tributário, um único imposto.

Da não aplicação da jurisprudência constitucional que considerou conforme a constituição a verba 28 da TGIS, dado que a mesma se refere apenas a prédios habitacionais e não a terrenos para construção.

Entende o tribunal que a ratio do aparecimento da verba 28 da TGIS e, de acordo com a  exposição de motivos da respetiva proposta de lei, foi a prossecução do interesse público, em face da situação económico-financeira do País, que vinha a exigir diminuição da despesa e a introdução de medidas fiscais com vista ao combate ao défice  que levou o legislador a intervir, procurando medidas fiscais que abrangessem os vários tipos de rendimento, por forma a garantir uma repartição de sacrifícios. Uma dessas medidas foi a criação da verba 28 da TGIS, cuja conformidade constitucional, na sua redação inicial foi afirmada pelo TC no Acórdão nº 590/2015 de 11 de Novembro onde se concluiu que o legislador pretendeu tributar a propriedade de habitações de luxo por ser reveladora de capacidade contributiva adequada. A nova redação, não só manteve os prédios habitacionais, como incluiu os terrenos para construção com destino habitacional cujo VPT seja igual ou superior a € 1 000 000,00, calculado segundo as regras do CIMI.

O legislador, como já se disse, procurou uma justa repartição dos sacrifícios com vista ao cumprimento do programa de ajustamento, alargando a tributação a rendimentos e setores da sociedade que tivessem maior capacidade contributiva, tais como, o agravamento da tributação dos rendimentos de capitais e das mais-valias mobiliárias bem como dos rendimentos obtidos ou transferidos para os paraísos fiscais. A criação da verba 28 da TGIS sobre os terrenos para construção de afetação habitacional, tem de ser entendida nesse âmbito de ajustamento e de repartição de sacrifícios pelos diferentes setores da população.  

O princípio da igualdade fiscal exige tributação igual ao que é igual e desigual ao que seja desigual e dele não resulta a inibição do legislador em determinar quais os factos que quer tributar em detrimento de outros, resulta é que lhe está vedado o arbítrio. No caso em apreço, o legislador considerou ser necessária a tributação de prédios urbanos habitacionais e dos terrenos para construção com afetação habitacional, no âmbito do esforço de consolidação orçamental, na medida em que ser proprietário de imóveis de VPT superior a € 1 000 000,00, com destino habitacional, revela um maior indicador de riqueza, suscetível de fundar um contributo acrescido, com vista ao desiderato da consolidação orçamental. Ao mesmo tempo permitiu repartir os sacrifícios com os que vivem do rendimento do trabalho ou pensões. Não tributar outros terrenos para construção cuja afetação não seja a habitação, como por exemplo (comercial, industrial, serviços ou outra) tem de ser entendido como uma opção de política económica que, no entender do legislador, levaria não a uma consolidação mas a um agravamento orçamental.

Também não está o legislador constitucionalmente obrigado a tributar a totalidade do património do sujeito passivo, podendo legitimamente optar pela tributação de segmentos desse património, desde que para tal exista substrato económico adequado. Com a verba 28 da TGIS não pretendeu o legislador fazer uma tributação geral sobre o património, mas tão só a tributação parcelar de prédios habitacionais e de terrenos para construção habitacional com VPT igual ou superior a € 1 000 000,00, isentando os restantes de VPT inferior, o que nos parece uma escolha legítima, com suficiente fundamento material, constitucionalmente admitida e que visou a promoção da equidade social na austeridade.

No caso de nos prédios com VPT igual ou superior a € 1 000 000,00, virem a ser edificadas habitações de VPT inferior, trata-se de uma situação posterior, hipotética que, a verificar-se, não preencheria a previsão da norma, logo não haveria tributação, mas em 31 de Dezembro 2015 a realidade a tributar é diversa e preenche a previsão da norma e, por isso, foi tributada.

Quanto à dupla tributação que, no entender do requerente, a verba 28 da TGIS gera discriminação negativa de determinados sujeitos passivos face a outros, uma vez que nuns o mesmo facto tributário é tributado duas vezes e noutros, apenas uma tributação. O tribunal entende que estamos em presença de um imposto de natureza e sujeito ativo diferente que visa aumentar as receitas do Estado, tendo o IMI[17] a natureza de imposto municipal com sujeito ativo os municípios, não se vislumbrando nesta opção legislativa, pelos motivos já expendidos, desconformidade constitucional.

Quanto à não aplicação da jurisprudência do TC que considerou constitucional a verba 28 da TGIS na redação da Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro, o tribunal considera que a nova redação, introduzida pela Lei 83-C/2013 de 31 de Dezembro, que inclui os terrenos para construção destinados à edificação habitacional cujo VPT seja igual ou superior a € 1 000 000,00 não terá alterado, pelos motivos já atrás referidos, essa conformidade.

 Temos que ter em conta que os direitos e princípios constitucionais têm todos a mesma dignidade e valor, mas, para que se cumpra a constituição, em determinadas circunstâncias, há direitos e princípios que cedem para que a constituição se cumpra. Assim aconteceu com a tributação dos terrenos para construção com afetação habitacional, com VPT igual ou superior a € 1 000 000,00 que, como já se referiu, surgiu num contexto de grave crise económica e das finanças públicas, entendendo o legislador que a sua propriedade é reveladora de capacidade contributiva adequada ao aumento das receitas fiscais do Estado.

Concluindo-se, por isso, que os factos tributários constantes da verba 28.1 da TGIS, não foram escolhidos de forma arbitrária, respeitam os princípios da igualdade, da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, estando a opção legislativa perfeitamente justificada e do nosso ponto de vista, em conformidade com a CRP.

 

3.4 – Pedido de pagamento de juros indemnizatórios

 

 

Tendo em conta o referido nos pontos 3.2 e 3.3 torna-se desnecessário apreciar esta matéria.

 

IV DECISÃO

 

Face ao exposto, o tribunal decide o seguinte:

a)      Declarar improcedente a exceção de incompetência material do tribunal suscitada pela AT.

b)      Declarar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo na ordem jurídica os atos tributários de liquidação de IS nele postos em crise.

c)      Fixar o valor do processo € 17 209,84 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299º, nº 1, do CPC[18], artigo 97º-A do CPPT[19], e artigo 3º, nº2, do RCPAT[20].

d)      Fixar as custas, ao abrigo do nº4 do artigo 22º do RJAT, no montante de € 1 224,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo do requerente.

 

Notifique.

Lisboa, 06 de Fevereiro de 2017

Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º, nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.

O árbitro

 Arlindo José Francisco

 



[1] Acrónimo de Número de identificação fiscal de Pessoa Coletiva

[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária

[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira

[4] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa

[5] Acrónimo de Valor Patrimonial tributário

[6] Acrónimo de Tabela Geral do Imposto do Selo

[7] Acrónimo de Plano Diretor Municipal

[8] Acrónimo de Constituição da República Portuguesa

[9] Acrónimo de Tribunal Constitucional

[10] Acrónimo de Imposto do Selo

[11] Acrónimo de Lei Geral Tributária

[12] Acrónimo de Tribunal Central Administrativo

[13] Acrónimo de Sujeito Passivo

[14] Acrónimo de Código do Imposto Municipal sobre Imóveis

[15] Acrónimo de Código de Contribuição Autárquica

[16] Acrónimo de Código do Imposto do Selo

[17] Acrónimo de Imposto Municipal sobre Imóveis

[18] Acrónimo de Código de Processo Civil

[19] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário

[20] Acrónimo de Regulamento de Custas Nos Processos de Arbitragem Tributária