Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 244/2016-T
Data da decisão: 2016-10-31  IMI  
Valor do pedido: € 1.734,46
Tema: IMI – Classificação de prédios urbanos; Posto de abastecimento de combustíveis.
Versão em PDF

 

 

DECISÃO ARBITRAL

1.    RELATÓRIO

A…, SA, com o NIPC … e com sede na Av.ª…, n.º…, …, em Lisboa (doravante designada por Requerente), vem, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea b) e 10.º, n.ºs 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, com a intervenção de árbitro singular, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), tendo em vista a declaração de ilegalidade do ato de fixação do valor patrimonial tributário (VPT) do prédio urbano de que é proprietária, inscrito sob o artigo … da freguesia de … e …, concelho de ..., de cuja 2.ª avaliação, no valor de € 363 560,00, foi notificada em 15 de abril de 2016. Mais requer a anulação daquele ato de avaliação, com a consequente repetição do procedimento.

Invoca a Requerente como fundamentos do seu pedido:

a.    O facto de o prédio urbano identificado supra ser constituído por dois edifícios (de cafetaria e de apoio/oficina), um terreno no qual estão instalados bens de equipamento (cobertura metálica, tanques e bombas de combustível) e respetivos arruamentos (passeios, zonas verdes e local de passagem dos veículos para aquisição dos combustíveis);

b.    De se tratar, portanto, de uma estação de serviço, que se encontra licenciada e tem por “destino normal” uma atividade comercial (venda de combustíveis, bebidas e alimentos);

c.    Devendo, por isso, ser classificado como prédio urbano “comercial” ou “para serviços”, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, do Código do IMI e não, como pretende a AT, como prédio urbano da espécie “outros”, enquadrável na alínea d) e no n.º 4, do mesmo artigo;

d.   A avaliação é ilegal, porque efetuada nos termos do artigo 46.º, n.º 2, do Código do IMI, em violação dos critérios fixados pelo artigo 38.º, n.º 1, do Código do IMI, para a determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços.

Notificada nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17.º, do RJAT, a AT apresentou resposta e juntou os processos administrativos referentes à avaliação do imóvel. Entende a Requerida que o prédio identificado na p. i. deve manter a qualificação de prédio urbano da espécie “outros”, com os seguintes fundamentos:

a.    O prédio a que se refere a Requerente como sendo uma “estação de serviço” é “um prédio onde se encontra implantado (…) um posto de abastecimento de combustível, com 4 ilhas de abastecimento, é (…) composto por áreas comerciais de venda e exposições, túnel de lavagem de viaturas, instalações sanitárias e armazém”, “cujas características construtivas fazem com que seja de adoptar para a avaliação, o método do custo de construção previsto no artigo 46.º, n.º 2 do CIMI”, em que “Os custos de construção contemplam para além dos edifícios, toda a infra-estrutura que permite a instalação dos depósitos e demais equipamentos necessários ao funcionamento, conforme mapa anexo a referida ficha de avaliação”;

b.    “(…) o alvará de utilização.º …/2005 emitido pelo Município de…, em … de Setembro de 2005 refere como utilização do prédio “posto de Abastecimento de combustível coma área de construção de 574m2””, tendo sido essa a “designação utilizada nos termos de avaliação que justificam a avaliação efectuada”;

c.    Não é indiferente a designação de “posto de abastecimento” ou de “estação de serviço”, pois enquanto a primeira é definida pelo artigo 2.º, n.º 3 alínea q) da Portaria n.º131/2002, de 9 de Fevereiro (posteriormente alterada pela Portaria n.º 362/2005, de 4 de Abril), que aprova o Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis como “a instalação destinada ao abastecimento, para consumo próprio, público ou cooperativo, de gasolinas, gasóleo e GPL para veículos rodoviários, correspondendo-lhe a área do local onde se inserem as unidades de abastecimento, os respectivos reservatórios e as zonas de segurança e de protecção, bem como os edifícios integrados e as vias necessárias à circulação dos veículos rodoviários a abastecer”, a segunda é sinónimo de “área de serviços”, enquanto “um conjunto de serviços concebidos para responder às necessidades de quem viaja”, em que “estão disponíveis serviços como: abastecimento de combustível, restauração, loja de conveniência, estação de serviço, zonas de descanso, entre outros”;

d.   Tratando-se de um “posto de abastecimento”, o seu destino primordial é o de “proceder ao abastecimento dos veículos com o combustível, utilizando-se os equipamentos adequados para o efeito”, que se enquadra na atividade de Downstream da Requerente (comercialização de produtos petrolíferos); a loja de conveniência e o centro de lavagem de veículos, que a Requerente anexou no espaço do logradouro sobrante, são atividades acessórias, o “que não desvirtua a definição legal de estação de serviços, nem de posto de abastecimento de combustível”;

e.    A AT enquadrou o prédio da Requerente na categoria de “outros”, tal como definida pelo n.º 4 do artigo 6.º, do CIMI, dado que um posto de abastecimento de combustível comporta edifícios e construções licenciados para esse fim, que, em seu entender, não são fins habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, muito embora a Requerente aí pratique atos de comércio;

f.      Como consta dos termos de avaliação, a AT optou por aplicar o método do custo adicionado do valor do terreno, previsto no n.º 2 do artigo 46.º, do CIMI, em detrimento do método de avaliação previsto no artigo 38.º, pelo facto de ser um prédio “outro”, cujas características intrínsecas impedem a utilização da fórmula que consta do último artigo citado;

g.    A descrição do prédio da Requerente inclui um terreno onde se encontram as unidades de abastecimento, as áreas de acesso, as zonas de proteção, a “Pala de Cobertura das unidades de abastecimento” (cobertura metálica), a loja de conveniência e os espaços de lavagem-auto e de abastecimento de ar/água, com os respetivos acessos, a que não é possível aplicar o coeficiente de qualidade e conforto, nem os critérios majorativos ou minorativos a que se refere o artigo 43.º, do CIMI, ou o coeficiente de vetustez;

h.    Por outro lado, nos termos da “alínea a) do n.º 2 do art.º 7.º do CIMI, o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das classificações do n.º 1 do art.º 6.º do CIMI “caso uma das partes seja principal e a outra ou outras meramente acessórias, por aplicação das regras de avaliação da parte principal, tendo em atenção a valorização resultante da existência das partes acessórias”, o que foi tido em conta na avaliação;

i.      O método de avaliação adotado, do custo adicionado do valor do terreno, desconsiderou qualquer implantação e tratou o terreno isoladamente, “tal como o exige o próprio método”, de acordo com as áreas médias de construção permitidas para a zona envolvente segundo os índices do PDM.

Termina a AT por, invocando em abono da sua defesa o Acórdão proferido pelo STA em 10 de abril de 2013, no processo n.º 0770/12, requerer a absolvição do pedido.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral deu entrada no CAAD em 27 de abril de 2016, tendo sido aceite pelo Exm.º Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT.

A Requerente informou que não pretendia utilizar a faculdade de designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º, do RJAT, foi a signatária nomeada árbitro pelo Exm.º Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, encargo que aceitou no prazo legalmente previsto, sem oposição das Partes.

O Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 15 de julho de 2016 e é materialmente competente para apreciar e decidir o litígio objeto dos presentes autos.

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

Não tendo sido requerida a produção de prova adicional, nem havendo necessidade de correção das peças processuais, foi dispensada a realização da reunião a que se refere o artigo 18.º, do RJAT, e convidadas as Partes à produção de alegações escritas sucessivas pelo prazo de 10 dias, com início na Requerente.

As Partes não produziram alegações.

 

2.    MATÉRIA DE FACTO

Com interesse para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

1.    Em 22 de dezembro de 2014, a Requerente submeteu declaração modelo 1 de IMI, ao abrigo do disposto no artigo 130.º, n.º 1, alínea a), do Código do IMI (registo n.º…), referente ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo … da União das Freguesias de … e … (…), concelho de ...;

2.    O prédio foi descrito pela sua proprietária como sendo afeto a comércio, com apenas um piso e uma divisão, edificado em terreno com a área total de 3 276,4000 m2, sendo a área de implantação do prédio de 373,9500 m2, equivalente à área bruta de construção e a área bruta privativa de 296,6500 m2, com 21 anos de construção;

3.    Por requerimento da mesma data, dirigido ao Senhor Chefe do Serviço de Finanças de …, a Requerente prestou informação referente à declaração modelo 1 apresentada, juntando cópias da planta do prédio e da respetiva licença de utilização, assim como de decisão do tribunal arbitral favorável a uma sua idêntica pretensão e, ainda, simulação do VPT, considerando o prédio como “comercial”;

4.    Pelo ofício n.º … do Serviço de Finanças de …, datado de 16 de novembro de 2015, foi a Requerente notificada do resultado da primeira avaliação do prédio (ficha n.º…), classificado como prédio urbano “outros” e avaliado nos termos do artigo 46.º, n.º 2, do Código do IMI, ao qual foi atribuído o VPT de € 363 710,00, de acordo com o quadro que segue:

5.    Em 11 de dezembro de 2015 foi requerida segunda avaliação do prédio urbano identificado, com o fundamento de tratar-se de um prédio comercial, a avaliar nos termos do artigo 38.º, do Código do IMI;

6.    A segunda avaliação foi notificada à Requerente através do ofício n.º… do Serviço de Finanças de …, expedido a coberto do registo dos CTT *RY…PT, recepcionado em 15 de abril de 2016;

7.    Os dados da avaliação, de que resultou o VPT de € 363 560,00, por aplicação do método previsto no n.º 2 do artigo 46.º, do Código do IMI, são os que constam do quadro infra:

8.    O Representante da Requerente na Comissão que procedeu à 2.ª avaliação lavrou voto de vencido, por considerar que, atendendo à atividade comercial para que está licenciado e que nele é exercida, o prédio avaliado devia ser classificado nos termos conjugados da alínea b) do n.º 1 com o n.º 2, ambos do artigo 6.º, do Código do IMI, aplicando-se-lhe a fórmula constante do artigo 38.º, do mesmo Código;

9.    O “Alvará de Autorização de Utilização n.º …/2005”, emitido pela Câmara Municipal de … em … de setembro de 2005, titula a autorização de utilização do prédio da Requerente, ao tempo omisso na matriz, a que correspondia a licença de construção n.º…, de … de fevereiro de 2004, como “Posto de Abastecimento de Combustíveis, com a área de construção de 574 m2 (…)”.

 

2.2. Fundamentação da matéria de facto provada:

A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada resultou da análise crítica da prova documental junta ao pedido de pronúncia arbitral e à resposta da Requerida.

2.3. Factos não provados

Não existem factos relevantes para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.

 

3.        MATÉRIA DE DIREITO – FUNDAMENTAÇÃO

3.1.   A questão decidenda:

A questão a decidir nos presentes autos traduz-se em saber se o ato de avaliação sindicado padece do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, ao partir da classificação como prédio urbano “outros” de um prédio licenciado para “posto de abastecimento de combustíveis”, ao invés de o ter classificado como prédio urbano “comercial”, pois que a classificação atribuída à realidade fáctica existente condiciona o método a utilizar na respetiva avaliação – o método previsto no n.º 2 do artigo 46.º, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), utilizado pela AT ou o previsto no artigo 38.º, do CIMI, como defende a Requerente.

 

3.2.   Do conceito de prédio urbano comercial

Na sistemática do Código do IMI, o artigo 2.º, inserido no Capítulo I – Incidência, contém a definição legal de prédio como sendo “toda a fração de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com caráter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fração de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.” (n.º 1), com as especificações constantes dos seus n.ºs 2 a 4.

Acordam as Partes em que o prédio de cuja avaliação se trata é um prédio urbano (artigo 4.º, do CIMI), divergindo, contudo, na sua classificação como “comercial” ou “outros”, muito embora a AT assinta em que a principal atividade que nele se desenvolve integra o objeto social da Requerente, na sua vertente de “Downstream”, ou seja, o “fornecimento e comercialização (…) de produtos petrolíferos”, “a venda de combustível a retalho”.

Quanto às classificações dos prédios urbanos, rege o artigo 6.º, do CIMI, sob a epígrafe de “Espécies de prédios”, de acordo com cujo n.º 1,

1 - Os prédios urbanos dividem-se em:

a) Habitacionais;

b) Comerciais, industriais ou para serviços;

c) Terrenos para construção;

d) Outros. “,

determinando o n.º 2 que

2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

Os prédios urbanos classificados como “outros” são definidos pelo critério residual contido no n.º 4 do mesmo artigo 6.º, do Código do IMI, no que se reporta aos “edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da exceção do n.º 3”.

Pois bem: atentos à enunciação legal, de que os prédios “comerciais” (artigo 6.º, n.º 1, alínea b), do CIMI) são “os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins” (artigo 6.º, n.º 2, do CIMI), resta saber o que são fins comerciais e se são esses ou outros os prosseguidos pela Requerente no prédio cuja avaliação se contesta.

É de há muito pacificamente aceite pela doutrina que as normas tributárias se interpretam como quaisquer outras normas jurídicas, solução que consta hoje expressamente do n.º 1 do artigo 11.º, da Lei Geral Tributária (LGT), ao estabelecer que “1 - Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis”.

Por outro lado, determina o n.º 2 do mesmo artigo 11.º, da LGT, que “2 - Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm salvo se outro decorrer diretamente da lei”.

Ora, os fins comerciais a que se destinam os prédios urbanos, não poderão ser outros senão os fins regulados pelas leis comerciais, ou seja, a prática de atos de comércio, entre os quais a compra e venda comerciais, prevista nos artigos 463.º e seguintes do Código Comercial.

A venda de combustíveis, enquanto atividade principal exercida pela Requerente no prédio avaliado, reconduz-se à prática de atos de comércio, quer objetivos, porque a venda de produtos adquiridos para esse fim são vendas comerciais, quer subjetivos, dado que as sociedades comerciais são comerciantes por natureza (artigo 13.º, n.º 2, do C. Comercial).

Argumenta a entidade Requerida que, para que um prédio seja comercial, não basta que nele se pratiquem atos de comércio, dando como exemplo a praça de touros, prédio destinado a espetáculos (atos comerciais subjetivos, por serem comerciais as empresas singulares ou coletivas que os organizam) e que, tal como decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão prolatado em 10/04/2013, no processo n.º 0770/12, em cujo sumário se pode ler:

I – Um imóvel destinado a «praça de touros» é classificado, para efeitos fiscais, como um prédio urbano na espécie de «outros», tal como definida no nº 4 do artigo 6º do CIMI;

II – A parte principal desse prédio é constituída pela arena e bancadas, sendo as demais dependências acessórias ou subsidiárias dessa parte, sem autonomia económica relativamente àquela;

III – Não tendo um destino económico diferente, nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 7º do CIMI, as zonas de apoio devem ser avaliadas pelas regras de avaliação da parte principal.

IV – Nos prédios urbanos da espécie “Outros” utiliza-se, sempre que possível, a fórmula geral de determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos destinados à habitação, comércio, indústria e serviços; quando, devido à natureza do prédio, não seja possível utilizar aquela fórmula, deve utilizar-se o método do custo de construção adicionado do valor do terreno.

V – A praça de touros, pelas suas características específicas, deve ser avaliada pelo método do custo de construção adicionado do valor do terreno.”

A parte decisória do mesmo Acórdão citado esclarece os motivos pelos quais uma “praça de touros” deve ser avaliada pelo método do custo de construção adicionado do valor do terreno: é que “A fórmula matemática do artigo 38º não se pode aplicar à parte principal do prédio, constituída pela arena e pelas bancadas, porque os coeficientes que a integram não se ajustam à determinação do valor de mercado. Desde logo, o coeficiente fundamental desse método de avaliação, que é o valor base (vc), e que é fixado administrativamente para todo o país, não se ajusta às caraterísticas próprias de uma praça de touros, especialmente àquelas zonas ou partes principais. O artigo 39º do CIMI estabelece que o valor base corresponde ao custo unitário de construção de um metro quadrado de um edifício ou de uma construção, adicionado do valor do terreno. Ora, se a componente custo do terreno se poderia aplicar a toda a área, o mesmo não acontece com a componente valor da construção, pois, nem a arena é uma parte edificada, nem as bancadas são uma construção que, num mercado de concorrência, estejam nas mesmas condições das construções imobiliárias para as quais se fixa anualmente o valor de um metro quadrado”. (sublinhados nossos).

Mas o prédio de cuja avaliação tratam os presentes autos não está nas mesmas condições de uma praça de touros, pois que um “posto de abastecimento de combustíveis” é, por definição legal, “a instalação destinada ao abastecimento, para consumo próprio, público ou cooperativo, de gasolinas, gasóleo e GPL para veículos rodoviários, correspondendo-lhe a área do local onde se inserem as unidades de abastecimento, os respetivos reservatórios e as zonas de segurança e de proteção, bem como os edifícios integrados e as vias necessárias à circulação dos veículos rodoviários a abastecer (…)” – sublinhado nosso (cfr. o art.º 2.º, alínea q), do Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis, aprovado pela Portaria n.º 131/2002, de 9 de fevereiro, alterada pela Portaria n.º 362/2005, de 4 de abril), citado pela Requerida na sua resposta).

Portanto, “posto de abastecimento” não corresponde apenas à “instalação destinada ao abastecimento, para consumo próprio, público ou cooperativo, de gasolinas, gasóleo e GPL para veículos rodoviários” como a Requerida parece fazer crer, instalação que na terminologia do Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis se denomina por “unidade de abastecimento”, composta por uma ou mais “ilhas”.

“Posto de abastecimento” é uma realidade complexa em que, para além das unidades de abastecimento, se inserem ainda os “edifícios integrados”, ainda que os mesmos se destinem à prossecução de atividades complementares (definidas pelo Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis como sendo “os serviços a prestar aos utentes dentro dos limites do posto de abastecimento, em complemento da oferta de combustíveis e lubrificantes, nomeadamente loja de conveniência, apoio auto e lavagem de viaturas (manual ou automática) ”.

Como refere a Requerente e vem representado na fotografia do prédio, anexa ao pedido de pronúncia arbitral e que a AT não contesta, este “posto de abastecimento” é composto por dois edifícios (edifício de cafetaria e edifício de apoio/oficina), que dele são partes integrantes, não se vislumbrando os motivos da impossibilidade de aplicação do método de avaliação previsto no artigo 38.º, do CIMI.

Aliás, no que ao caso específico dos “postos de abastecimento de combustível” concerne, é abundante a jurisprudência arbitral e judicial a considerá-los como prédios urbanos comerciais.

Exemplarmente, em situação semelhante, cita-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 4 de junho de 2015 no processo n.º 08035/14, disponível em www.dgsi.pt, em que se decidiu “(…) IX. Quanto à classificação do prédio urbano como pertencente à espécie “outros” o legislador adoptou um critério de finalidade “residual” por referência aos fins enunciados no n.º 2, tal como resulta do disposto no n.º 4 do art. 6.º do CIMI ao excluir-se desta espécie todos os edifícios e construções que tenham como destino normal os fins referidos no n.º 2;

X. Apenas se poderá classificar um prédio urbano na espécie “outros” prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 6.º do CIMI quando o edifício ou construção não seja de classificar na espécie comerciais, industriais ou para serviços”. 

Demonstrado que o prédio da Requerente é um “posto de abastecimento” composto por dois edifícios, que se encontra licenciado para fins comerciais e que tem como destino normal a prática de atividades comerciais, forçoso é concluir-se que se trata de um prédio comercial, a avaliar nos termos do artigo 38.º, do CIMI.

 

4.        DECISÃO

Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados e, nos termos do artigo 2.º, alínea b), do RJAT, decide-se em, julgando inteiramente procedente o presente pedido de pronúncia arbitral:

4.1.   Declarar a ilegalidade do ato de avaliação do prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de … e …, concelho de ..., sob o artigo …, determinando a sua anulação;

4.2.   Determinar a repetição do procedimento de avaliação em conformidade com a qualificação do prédio como “prédio comercial”, com aplicação dos critérios previstos no artigo 38.º, do CIMI, na redação em vigor à data dos factos.

VALOR DO PROCESSO: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2 e 3.º, n.º 3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 1 734,46 (mil setecentos e trinta e quatro euros e quarenta e seis cêntimos).

CUSTAS: Calculadas de acordo com o artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 306,00 (trezentos e seis euros), a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Lisboa, 31 de outubro de 2016.

O Árbitro,

 

/Mariana Vargas/

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do DL 10/2011, de 20 de janeiro.

A redação da presente decisão rege-se pelo acordo ortográfico de 1990.