Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 356/2016-T
Data da decisão: 2016-11-04  Selo  
Valor do pedido: € 4.337,08
Tema: IS – Verba n.º 28 da TGIS
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Decisão Arbitral

 

            I – Relatório

 

            1.1. A… (doravante designado por «requerente») – com domicílio na Rua …, …, …, …-… Porto, com o NIF…, e na qualidade de representante legal de herança indivisa, com o NIF … –, tendo sido notificado das notas de liquidação de Imposto do Selo (IS), no montante total de €4337,08, apresentou, no dia 29/6/2016, um pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral, nos termos do disposto no artigo 99.º do CPPT e nos arts. 2.º, n.º 1, al. a), e 10.º, n.º 2, al. c), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/1 (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante somente designado por «RJAT»), em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), tendo em vista que se declare “a ilegalidade de todos os actos de liquidação do imposto do selo objecto da presente impugnação, bem como a respectiva anulação e devolução da quantia de €2838,70 indevidamente paga, bem ainda condenando-se a A.T. no pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal sobre a quantia paga, desde a data do seu pagamento até integral devolução, à taxa legal em vigor, com todas as consequências legais, bem como ainda da taxa de justiça paga.”

 

            1.2. Em 19/9/2016 foi constituído o presente Tribunal Arbitral Singular.

 

            1.3. Nos termos do art. 17.º, n.º 1, do RJAT, foi a AT citada, enquanto parte requerida, para apresentar resposta, nos termos e para os efeitos do mencionado artigo. A AT apresentou a sua resposta a 28/10/2016, tendo argumentado, em síntese, a total improcedência do pedido do requerente.

 

            1.4. Por despacho de 31/10/2016, o Tribunal considerou, nos termos do disposto no artigo 16.º, al. c), do RJAT, ser dispensável a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, e que o processo estava pronto para decisão. Foi, ainda, fixada a data de 4/11/2016 para a prolação da decisão arbitral.

           

            1.5. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, é materialmente competente, o processo não enferma de vícios que o invalidem e as Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, configurando-se legítimas.

 

            II – Alegações das Partes

 

            2.1. Vem o Requerente alegar, na sua petição inicial, que: a) “o imposto do selo ora em causa não é devido, uma vez que o prédio urbano respeita a um conjunto de unidades independentes de utilização separada, mas em propriedade vertical, ou total”; b) “a verba 28.1 da TGIS foi estabelecida para propriedades com afectação habitacional que apresentem um valor patrimonial tributário superior a €1.000.000,00”; c) “existindo dúvida quanto ao alcance da referida verba, justifica-se, portanto, observar o que diz o CIMI. Da leitura do CIMI percebe-se que o conceito de prédio com afectação habitacional remete, naturalmente, para o conceito de prédio urbano que está definido nos artigos 2.º e 4.º. Adicionalmente, constata-se que a determinação do Valor Patrimonial Tributário (VPT) obedece ao disposto nos artigos 38.º e seguintes do mesmo Código”; d) “se é certo que o n.º 4 do artigo 2.º do CIMI refere que, «para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio», também é certo que nada há na lei que aponte para a discriminação entre prédios em propriedade horizontal e vertical no que se refere à sua identificação como «prédios urbanos habitacionais»”; e) “daqui se conclui que partes autónomas de prédios em propriedade vertical com afectação habitacional devem ser consideradas como prédios urbanos habitacionais”; f) “distinguir, neste contexto, entre prédios constituídos em propriedade horizontal e em propriedade total não tem qualquer suporte legal, até porque nada indica, nem na verba n.º 28 da TGIS, nem no disposto no CIMI, uma justificação para essa particular diferenciação”; g) “o critério uniforme que se impõe é, assim, o que determina que a incidência da norma em causa apenas tenha lugar quando alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente de prédio em propriedade horizontal ou total, com afectação habitacional, possua um VPT superior a €1.000.000,00”; h) “fixar como valor de referência para a incidência do novo imposto o VPT global do prédio em causa não encontra base na legislação aplicável, que é o CIMI, dada a remissão feita pelo citado n.º 2 do artigo 67.º do CIS”; i) “neste caso, constata-se que os VPT’s das unidades independentes com afectação habitacional são todos de valor inferior a €1.000.000,00. Daqui se conclui que sobre os mesmos não pode incidir o imposto do selo a que se refere a verba n.º 28 da TGIS, sendo, portanto, ilegais os actos de liquidação aqui contestados”; j) “o requerente procedeu ao pagamento das referidas notas de liquidação no dia 20/04/2016 [...]. [...] face a todo o exposto supra, entende o aqui requerente verificar-se [«prestação tributária excessiva que deve ser devolvida pela AT com devidos juros legais»]. Pelo que se vencem [...] juros indemnizatórios a favor do contribuinte requerente [...] o que se requer, desde já, sejam pagos a final ao aqui requerente.” 

 

            2.2. Em conclusão, pede o ora Requerente a “inteira procedência do pedido, sendo, em consequência, declarada a ilegalidade de todos os actos de liquidação do imposto do selo objecto da presente impugnação, bem como a respectiva anulação e devolução da quantia de €2838,70 indevidamente paga, bem ainda condenando-se a A.T. no pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal sobre a quantia paga, desde a data do seu pagamento até integral devolução, à taxa legal em vigor, com todas as consequências legais, bem como ainda da taxa de justiça paga.” 

           

            2.3. Por seu lado, a AT vem alegar, na sua contestação: a) que “o prédio foi avaliado, tendo em conta o destino habitacional e comercial”; b) que, “para o cálculo do VPT, o coeficiente varia consoante o seu destino e, sendo o valor patrimonial tributário total do imóvel referente às divisões destinadas a habitação superior a €1.000.000,00, o coeficiente de afectação aplicado foi o de 1,00 e de 1,20 às divisões afectas a comércio”; c) que, “sendo esta a informação matricial, de acordo com o artigo 23.º, n.º 7, do CIS, a liquidação de imposto do selo em causa, foi efectuada, pela Administração tributária, tendo em conta a natureza do prédio urbano, nomeadamente as suas divisões afectas à habitação, à data do facto tributário, aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI”; d) que, “tendo em conta a informação matricial constante da caderneta predial, não logra o Requerente, com os documentos que presentemente junta aos autos, fazer prova que contrarie a natureza das divisões com carácter habitacional. Logo, as liquidações de imposto de selo contestadas foram emitidas de acordo com a informação que consta da caderneta predial do prédio, portanto, são válidas e não enfermam de qualquer ilegalidade”; e) que “o que está aqui em causa são liquidações que resultam da aplicação directa da norma legal, que se traduz em elementos objectivos, sem qualquer apreciação subjectiva ou discricionária”; f) que, “quanto à liquidação de IMI, tratando-se de prédios em propriedade total, o VP que serve de base ao seu cálculo, será indiscutivelmente o VP que o ora Requerente define como «valor global do prédio»”; g) que, “em cumprimento do disposto no artigo 119.º, n.º 1, do CIMI, o documento de cobrança é enviado ao sujeito passivo com discriminação das partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta imputada a cada município da localização dos prédios. E estando correcta a liquidação e sendo devido o imposto apurado, não são devidos os juros indemnizatórios, desde logo por não existir qualquer erro imputável aos Serviços, que se limitaram a actuar, como deviam, no estrito cumprimento da norma legal”; h) que “não se pode concluir por uma alegada discriminação em violação do princípio da igualdade quando, na verdade, estamos perante realidades distintas, valoradas pelo legislador de forma diferente”; i) que “a verba 28 da TGIS, não enferma de nenhuma inconstitucionalidade, inexistindo qualquer violação dos princípios constitucionais conformadores da lei fiscal, especificadamente, dos princípios da igualdade fiscal, da capacidade contributiva e da proporcionalidade. Assim, entende a AT que a previsão da verba 28.º da TGIS não consubstancia qualquer violação do princípio da igualdade do art. 13.º da CRP”.      

 

2.4. Em conclusão, a AT considera que “deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados, absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.”

 

            III – Factualidade Provada, Não Provada e Respectiva Fundamentação

 

            3.1. Consideram-se provados os seguintes factos:

 

            i) Está em causa a liquidação de Imposto do Selo efectuada ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, aditada pelo artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29/12, referente ao ano de 2015 e ao prédio em regime de propriedade vertical ou total, com matriz predial urbana n.º … da freguesia de … (antigo art. … da freguesia do …), concelho e distrito de Lisboa, no valor de €4337,08.

 

            ii) O Requerente é cabeça de casal da herança indivisa proprietária de parte do referido prédio urbano. O prédio urbano em causa tem um valor tributário total de €3.469.628,83 (vd. doc. 1 apenso aos autos), consistindo em 14 pisos e 22 unidades de utilização independente (todas com VPTs, constantes das cadernetas prediais anexas – vd. doc. 1 apenso aos autos –, inferiores a €1.000.000,00).

           

            iii) O Requerente foi notificado da liquidação supra referida, sendo o valor a pagar no mês de Abril de 2016 de €2838,70. Este valor foi pago pelo Requerente a 20/4/2016.

            iv) Inconformado, o Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral em 29/6/2016.

           

            3.2. Não há factos não provados relevantes para a decisão da causa.

 

            IV – Do Direito

 

            No caso ora em análise, as questões essenciais que se colocam são as de saber: 1) se a sujeição a IS, nos termos do disposto na verba n.º 28 da TGIS, é determinada pelo VPT que corresponde a cada uma das partes do prédio com afectação habitacional, ou se, ao invés, é determinada pelo VPT global do prédio, o qual corresponderia à soma de todos os VPTs dos andares ou unidades independentes que o compõem; 2) se, como invoca a AT, a verba n.º 28 “não enferma de nenhuma inconstitucionalidade, inexistindo [...] violação [...] dos princípios de igualdade tributária e da capacidade contributiva”; 3) se são devidos os peticionados juros indemnizatórios.

 

            Vejamos, então.

 

            1) Na origem da primeira questão está a verba n.º 28 da TGIS, aditada pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29/10, que dispõe o seguinte:

 

            “28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000,00 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI: 28.1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%. 28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.

 

            A Lei n.º 55-A/2012, que entrou em vigor em 30/10/2012, não procedeu à qualificação dos conceitos que constam da referida verba n.º 28, nomeadamente, do conceito de «prédio com afectação habitacional». Contudo, observando o que dispõe o art. 67.º, n.º 2, do Código do Imposto do Selo (CIS), também aditado pela citada Lei n.º 55-A/2012, verifica-se que «às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.» Existindo dúvida quanto ao alcance da referida verba, justifica-se, portanto, observar o que diz o CIMI.

           

            Da leitura do CIMI percebe-se que o conceito de «prédio com afectação habitacional» remete, naturalmente, para o conceito de «prédio urbano» que está definido nos arts. 2.º e 4.º. Por seu lado, constata-se que a determinação do VPT obedece aos artigos 38.º e ss. do CIMI.

 

            Entre as várias espécies de «prédios urbanos» (art. 6.º), menciona-se, expressamente, os «prédios urbanos habitacionais» [v. n.º 1, al. a)], acrescentando, depois, o n.º 2 do mesmo artigo do CIMI, que estes “são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

 

            Se é certo que o n.º 4 do art. 2.º do CIMI refere que, “para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio”, também é certo que nada há na lei que aponte para a discriminação entre prédios em propriedade horizontal e vertical no que se refere à sua identificação como «prédios urbanos habitacionais». Daqui se conclui que partes autónomas de prédios em propriedade vertical com afectação habitacional devem ser consideradas como «prédios urbanos habitacionais».

 

            Com efeito, não faz sentido distinguir na lei aquilo que a própria lei não distingue (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus). Com efeito, nada denuncia, nem na verba n.º 28, nem no disposto no CIMI, uma justificação para aquela particular diferenciação. Note-se, a este propósito, o que dispõe o artigo 12.º, n.º 3, do CIMI: “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário.

 

            O critério uniforme que se impõe é, assim, o que determina que a incidência da norma em causa apenas tenha lugar quando alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente de prédio em propriedade horizontal ou total com afectação habitacional, possua um VPT superior a €1.000.000,00. Fixar como valor de referência, para a incidência do novo imposto, o VPT global do prédio em causa, não encontra base na legislação aplicável, que é o CIMI, considerando a remissão feita pelo acima referido art. 67.º, n.º 2, do CIS.

 

            Assim, e observando o caso ora em análise, verifica-se que, como nota o Requerente, “os VPT’s das unidades independentes com afectação habitacional são todos de valor inferior a €1.000.000,00”. Daqui se conclui, em face do que foi supra exposto, que sobre os mesmos não deve incidir o IS a que se refere a verba n.º 28 da TGIS, sendo, consequentemente, ilegais os actos de liquidação impugnados pelo ora Requerente.

 

            Com efeito, e como bem refere a DA proferida no proc. n.º 552/2015-T, de 27/1/2016, em processo idêntico ao ora em análise, “a principal questão trazida aos autos [...] é a de saber se a sujeição a Imposto do Selo (verba 28 da TGIS) de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal é determinada pelo VPT que corresponde a cada uma das divisões de utilização independente e com afetação habitacional [...], ou se é determinada pelo VPT global do prédio, o qual corresponderia ao somatório de todos os VPT dos andares ou divisões de utilização independente e com afetação habitacional que o integram [...]. Efetivamente, do ponto de vista formal, bem anda a AT ao referir que um prédio constituído em propriedade horizontal é uma realidade jurídico-tributária distinta de um prédio urbano em propriedade vertical ou total. Porém, se o n.º 4 do artigo 2.º do CIMI, estabelece a ficção legal de que cada uma das frações autónomas de um prédio constituído em propriedade horizontal consubstancia um prédio, daí não decorre, necessariamente, que uma parte de utilização independente de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal seja considerada prédio. Se o legislador utilizou, na norma da verba 28.1 da TGIS, a expressão «prédio urbano de afetação habitacional», não se afigura legítimo que a AT nela pretenda incluir os andares ou divisões de utilização independente de prédios não constituídos em propriedade horizontal que, como a própria reconhece, não são prédios, não podendo, por isso, ser equiparados às fracções autónomas de prédios constituídos em regime da propriedade horizontal. No que respeita à determinação do valor patrimonial tributário dos prédios não constituídos em propriedade horizontal, rege o artigo 7.º, n.º 2, do CIMI, mas apenas quanto aos «prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das classificações do n.º 1 do artigo anterior», caso em que, de acordo com a sua alínea b) «(…) cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes». E é esta a única norma do CIMI em que se faz referência ao «valor [global] do prédio», sem que, contudo, este tenha qualquer relevância ao nível da liquidação do imposto. Assim, da conjugação das normas do n.º 2 do artigo 7.º e do n.º 1 do artigo 6.º, ambos do CIMI, resulta que, se um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal integrar exclusivamente partes ou divisões destinadas a habitação, o valor do prédio não equivale à soma das suas partes.”

 

É de notar, por último, que este entendimento (de ordem infraconstitucional), que tem sido aqui defendido, tem sido sufragado pelo STA, como se pode ver pelo recente Acórdão n.º 47/15, de 9/9/2015, no qual se assinalou, de uma forma clara, que, “tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação.”

 

            2) A este respeito, segue-se aqui, por se concordar inteiramente – nomeadamente, no que se refere à desnecessidade de apreciação da norma ora em causa à luz dos princípios e parâmetros constitucionais referidos –, o que foi, pertinentemente, observado no seguinte aresto recente do STA (vd. Acórdão de 24/5/2016, proferido no rec. 1344/15): “a questão que incumbe decidir prende-se com a interpretação da verba 28 e 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS) aditada pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29/10, no sentido de definir se ela tem aplicação aos prédios urbanos, com um artigo de matriz mas constituídos por partes com afectação e utilização independentes a que foram atribuídos independentes VPT, cada um destes de valor inferior a um milhão de euros. Esta questão já não é nova neste Supremo Tribunal e tem merecido uma resposta uniforme no sentido propugnado na sentença recorrida [ou seja, e como sintetiza este aresto: «Tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação.»], por todos, o acórdão datado de 04.05.2016, recurso n.º 0166/16. Também o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre a dimensão constitucional desta norma à luz dos princípios da igualdade tributária, capacidade contributiva e proporcionalidade, tendo concluído que, a norma constante da verba 28 e 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, aditada pelo artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, na medida em que impõe a tributação anual sobre a propriedade de prédios urbanos com afetação habitacional, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a €1.000.000,00, não é inconstitucional, por todos o acórdão 247/2016, datado de 04.05.2016. No presente recurso não se coloca a necessidade de apreciação da norma em apreço à luz de tais princípios e parâmetros constitucionais, antes se impondo uma interpretação teleológica e sistemática da mesma, pelo que, a orientação jurisprudencial que tem sido seguida pelos Tribunais comuns, e que agora se seguirá, não belisca a boa doutrina imposta por aquele Tribunal Constitucional.”

 

3) À luz do que dispõe o n.º 5 do art. 24.º do RJAT – “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” –, tem-se entendido que esta norma permite o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios em processos arbitrais. Justifica-se, assim, a análise do presente pedido.

   

            São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, ter havido erro imputável aos serviços do qual resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (vd. art. 43.º, n.º 1, da LGT). É, por isso, condição necessária para a atribuição dos mencionados juros a demonstração da existência de erro imputável aos serviços: “O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do art. 43.º da LGT [...] depende de ter ficado demonstrado no processo que esse acto está afectado por erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à AT.” (Ac. do STA de 30/5/2012, proc. 410/12); “O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária pressupõe que no processo se determine que na liquidação «houve erro imputável aos serviços», entendido este como o «erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Fiscal»” (Ac. do STA de 10/4/2013, proc. 1215/12).

 

Tendo havido, como decorre do que se disse no ponto 1), erro imputável aos serviços, tal determina a procedência do pedido de pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente.

 

***

 

            V – DECISÃO

 

            Em face do supra exposto, decide-se:

 

            – Declarar a ilegalidade da liquidação de Imposto do Selo impugnada, por erro nos pressupostos de direito, determinando a sua anulação, bem como a devolução da quantia de €2838,70, indevidamente paga.

            – Julgar procedente o pedido também na parte que diz respeito ao reconhecimento do direito a juros indemnizatórios a favor do requerente.

 

 

Fixa-se o valor do processo em €4337,08 (quatro mil trezentos e trinta e sete euros e oito cêntimos), nos termos do art. 32.º do CPTA e do art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e do art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

Custas a cargo da requerida, no montante de €612,00 (seiscentos e doze euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, dado que o presente pedido foi julgado procedente, e em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e do disposto no art. 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique.

 

Lisboa, 4 de Novembro de 2016.

 

O Árbitro

 

 

 

(Miguel Patrício)

 

***

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto

no art. 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.