Decisão Arbitral
I – RELATÓRIO
1 A…, solteiro, maior, CF[1]…, na qualidade de cabeça de casal das heranças abertas por óbito de B… e de C…, residente na Avª … nº … –…, …-… Lisboa, apresentou um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a AT[3], com vista à apreciação da legalidade dos atos tributários de liquidação de imposto do selo, referente ao ano de 2014, incidente sobre a propriedade de um imóvel em propriedade vertical, inscrito na matriz sob o artigo urbano nº … da freguesia de …, área do … Serviço de Finanças de Lisboa, conforme caderneta predial junta, relativamente à s 2ª e 3ª prestações, no valor global de € 6 023,18.
2 Que foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[4] e automaticamente notificado à AT em 22/02/2016.
3 Nos termos e para efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicado às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 20/04/2016, designado árbitro do tribunal Arlindo José Francisco, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo legalmente estipulado.
4 O tribunal foi constituído em 06/05/2016 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
5 Com o seu pedido, visa a requerente, a anulação de imposto do selo, referente às 2ª e 3ª prestações e ao ano de 2014 respeitante ao imóvel já identificado cujo VPT[5] global é superior a € 1 000 000,00
6 Suporta o seu ponto de vista, em síntese, no entendimento de que a AT não pode considerar o VPT total do prédio, uma vez que o legislador estabeleceu regra diferente em sede de CIMI[6], sendo este o código aplicável às matérias não reguladas no CIS[7], sendo certo que a verba 28 da TGIS[8] estipula que o IS[9] incide sobre o VPT utilizado para efeitos de IMI[10].
7 Sendo o IMI, calculado divisão a divisão, não pode a AT utilizar entendimento diverso, ao fazê-lo, viola os princípios de legalidade e da igualdade fiscal e a CRP[11], nomeadamente o seu artigo 103º.
8 Ora, não tendo nenhum dos andares ou divisões com utilização independente, VPT igual ou superior a € 1 000 000,00 não se verifica o pressuposto legal de incidência do IS previsto na aludida verba 28, havendo, por isso lugar à anulação das correspondentes liquidações.
9 Refere ainda que os demais atos de liquidação de imposto do selo do ano de 2014, relativamente ao prédio em causa (prestação única e 1ª e 2ª prestações, com data limite de pagamento em abril e Julho de 2015) são objeto do processo 501/2015 que corre termos no CAAD.
10 Na resposta, a requerida, corrige que o pedido se circunscreve apenas à 3ª prestação do ano de 2014, no montante de € 6 023,18 e que, consultado o processo 501/2015, a decisão, nele proferida, anula as liquidações do ano de 2014, como foi pugnado pela AT.
11 Considera que este processo carece de objeto já que a requerente tinha já apresentado impugnação das liquidações do ano de 2014, esquecendo que impugna liquidações anuais e não prestações que são apenas, o meio de pagamento faseado das liquidações anuais.
12 Conclui haver uma inutilidade superveniente da lide o que conduz à sua absolvição da instância mas, para o caso de assim não se entender, fez a defesa por impugnação, onde, em síntese, sustenta que o IS incide sobre o VPT global do prédio e não por andar ou parte suscetível de utilização independente, como pretende o requerente, uma vez que não há equiparação entre um prédio em regime de propriedade horizontal e um prédio em propriedade total, sendo regimes jurídico civilísticos diferentes e a lei fiscal respeita-os .
II - SANEAMENTO
O tribunal foi regularmente constituído, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º,nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.
Apresentada a resposta da requerida, como questão prévia, suscitou a questão da inutilidade superveniente da lide, com a consequente absolvição da instância, uma vez que os atos de liquidação do IS aqui postos em crise, já tinham sido objeto de apreciação e decisão nº Pº 501/2015, que anulou as respetivas liquidações.
Suscitou ainda a dispensa de reunião prevista no artigo 18º do RJAT, bem como da produção de alegações escritas ou orais.
Por despacho de 11/06/2016, foi o requerente convidado a pronunciar-se sobre as dispensas suscitadas, o qual, em requerimento de 24/06/2016, veio aderir às propostas da requerida.
Por despacho de 29/06/2016, face à convergência de posições das partes, consideraram-se reunidas condições para a prolação da decisão, fixando-se o dia 20/09/2016 para o efeito.
Deste modo, não enfermando o processo de nulidades, vai a questão prévia da inutilidade superveniente da lide, ser apreciada em primeiro lugar.
III- FUNDAMENTAÇÃO
1 – As questões a dirimir, com interesse para os autos, são as seguintes:
a) Saber se os atos de liquidação de IS, aqui postos em crise, foram objeto de decisão anulatória no Pº 501/2015, havendo assim uma inutilidade superveniente da presente lide.
b) Caso contrário se as referidas liquidações deverão ser ou não declaradas ilegais.
2 – Matéria de Facto
A matéria de facto considerada relevante e provada com base nos elementos juntos aos autos é a seguinte:
a) As heranças de B… e C… eram, no ano de 2014, titulares do imóvel já identificado, situado na freguesia de … área do … Serviço de Finanças do concelho de Lisboa.
b) O referido imóvel é constituído por 19 andares ou divisões de utilização independente destinado a habitação.
c) O imóvel no ano de 2014, não se encontrava no regime de propriedade horizontal, sendo o seu VPT total de € 1 762 846,56.
d) Nenhum dos andares ou divisões independentes tem VPT igual ou superior a € 1 000 000,00 (variam entre € 15 955,09 e 161 789,29).
e) O valor económico atribuído pela requerente ao processo é de € 6 023,18, que corresponde ao valor da 3ª prestação aqui impugnada, tendo, a prestação única e 1ª e 2ª prestações, sido impugnadas no processo 501/2015.
f) A AT junta a decisão proferida no processo 501/2015 e considera que a mesma anula as liquidações do ano de 2014 e que a requerente esquece que impugna liquidações que são anuais e não prestações que são, apenas, o meio de pagamento faseado das liquidações anuais.
g) A requerente não contestou a posição da requerida, antes aderiu à dispensa da reunião do artigo 18º do RJAT bem como da produção de alegações proposto pela AT, conforme requerimento de 24/06/2016.
Não existe factualidade dada como não provada que seja relevante para a decisão.
3 – Matéria de Direito
Vem a AT, na sua resposta, referir que a requerente esquece que impugna liquidações, que são anuais, e não prestações que são apenas, o meio de pagamento faseado das liquidações anuais e alegar a inutilidade superveniente da presente lide uma vez que as liquidações em causa foram objeto de anulação em consequência da decisão proferida no processo 501/2015 que de facto declarou procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente anulação, com todos os efeitos legais, dos atos de liquidação de IS.
Como se alcança do pedido de pronúncia arbitral pretende-se a apreciação da legalidade das liquidações de imposto do Selo, referente ao ano de 2014 (terceira prestação).
Do ponto de vista do tribunal a possibilidade de pagamento em prestações é uma técnica de cobrança de um determinado ato de liquidação que é único e só ele poderá constituir ato lesivo suscetível de impugnação. Qualquer prestação autonomamente considerada não é um ato de liquidação, nem tão pouco uma parte desse ato, é tão só uma técnica de cobrança.
No caso concreto, o ato de liquidação do IS previsto na verba 28 da TGIS é o ato único de apuramento total do tributo a pagar, a possibilidade desse valor apurado, ser pago em prestações não significa que ocorram tantas liquidações quantas as prestações.
Esse ato único de liquidação, poderá ser impugnado, quer após a notificação para pagamento da 1ª, da 2ª ou da 3ª prestação, basta que o pedido se dirija ao ato único de liquidação.
Sobre esta problemática já houve decisões (Pºs 736/2014, 725/2015, entre outros) que consideraram o tribunal materialmente incompetente para a sua apreciação.
Porém, no caso concreto, a AT considera que os atos de liquidação de IS em causa foram anulados em vista da decisão proferida no processo 501/2015 o que provoca a inutilidade superveniente da lide, posição a que o tribunal adere, ficando, deste modo, prejudicado o conhecimento de outras questões.
IV DECISÃO
Face ao exposto, o tribunal decide o seguinte:
a) Declarar a inutilidade superveniente da presente lide, com a consequente absolvição da requerida da presente instância e a sua extinção de acordo com o disposto na alínea e) do artigo 277º do CPC[12], aplicável ex vi artigo 29º nº 1 alínea e) do RJAT.
b) Fixar o valor do processo € 6 023,18 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299º, nº 1, do CPC, artigo 97º-A do CPPT[13], e artigo 3º, nº2, do RCPAT[14].
c) Fixar as custas, ao abrigo do nº4 do artigo 22º do RJAT, no montante de € 612,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo da requerente.
Notifique.
Lisboa, 20 de Setembro de 2016
Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º,nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º,nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.
O árbitro
Arlindo José Francisco
[1] Acrónimo de Contribuinte Fiscal
[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária
[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira
[4] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa
[5] Acrónimo de Valor Patrimonial tributário
[6] Acrónimo de Código do Imposto Municipal sobre Imóveis
[7] Acrónimo de Código do Imposto do Selo
[8] Acrónimo de Tabela Geral do Imposto do Selo
[9] Acrónimo de Imposto do Selo
[10] Acrónimo de Imposto Municipal sobre Imóveis
[11] Acrónimo de Constituição da República Portuguesa
[12] Acrónimo de Código de Processo Civil
[13] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário
[14] Acrónimo de Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária