DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
1. No dia 27 de janeiro de 2016, a sociedade comercial A…, S. A., NIPC…, com sede na … …, …, Lisboa, (doravante, Requerente), na qualidade de sociedade dominante do Grupo B…, tributado pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade e a anulação de parte da liquidação de IRC n.º 2014…, referente ao exercício de 2010, e das liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios n.ºs …, …, …, … e …, na sequência do indeferimento, respetivamente, total e parcial dos recursos hierárquicos que interpôs contra aquelas mesmas liquidações.
A Requerente juntou 29 (vinte e nove) documentos e arrolou 2 (duas) testemunhas, não tendo requerido a produção de quaisquer outras provas.
É Requerida a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida ou AT).
1.1. No essencial e em breve síntese, a Requerente alegou o seguinte:
- A Requerente tem por objeto social a promoção, dinamização e gestão, por forma direta ou indireta, de empreendimentos e atividades na área do setor elétrico, tanto a nível nacional como internacional, com vista ao incremento e aperfeiçoamento do desempenho do conjunto das sociedades do seu grupo;
- Num mercado extremamente competitivo e altamente concorrencial, é necessário investir em estratégias de marketing, comunicação e aproximação com os clientes e acionistas (atuais e potenciais), na aquisição dos melhores talentos junto das universidades de modo a integrá-los nos seus quadros e, finalmente, numa política eficaz de interação com os órgãos de comunicação social;
- Foi neste contexto de promoção, mais concretamente de publicidade institucional, de expansão e aumento da notoriedade e reconhecimento pelo público, que a Requerente incorreu num conjunto de despesas em eventos dinamizados maioritariamente pela sua Direcção de Marketing e Comunicação, a saber: “H…” que é uma reunião de trabalhadores da área comercial do grupo com o objetivo de trocarem entre si experiências de relacionamento com o cliente, uniformizando estratégias e procedimentos e não envolvendo a participação de quaisquer pessoas estranhas à Requerente; o “C…” realizou-se na barragem com o mesmo nome e permitiu divulgar a atividade exercida pela Requerente, ao ter lugar no espaço físico de uma infra-estrutura emblemática, e como tal ideal para dar a conhecer a sua dimensão industrial, inovadora e tecnológica; a Requerente encontra-se cotada no principal índice bolsista português, possui uma forte dimensão internacional e opera num setor estratégico e de elevado interesse público, pelo que a cerimónia de apresentação dos seus resultados é da máxima importância e gera uma grande expetativa junto quer dos seus stakeholders, quer dos meios de comunicação social, sendo que, tendo em conta a duração desta ação promocional, foi servido um “D…” à comunicação social presente, que tal como o nome indica se limita ao mínimo condigno, como é atualmente prática habitual em qualquer evento empresarial; o “E…” que consubstancia uma iniciativa em que são convidados representantes da comunicação social portuguesa com o intuito de, mediante a exposição de temas relacionados com a atividade da Requerente, possibilitar a colocação de questões aos órgãos de gestão da empresa, sendo os conteúdos das entrevistas obviamente passíveis de publicação; em 2010 foi também promovido o “F…”, que se realiza com periodicidade anual e visa a apresentação aos principais analistas e investidores dos conceitos, projetos e a estratégia do Grupo B… para os próximos anos; os “G…” que se inserem no contexto da difusão da dimensão e importância da atividade da Requerente junto do público mais jovem, sendo que de modo a marcar a conclusão do “G…” e reconhecer o esforço e mérito dos participantes, a Requerente realizou uma cerimónia com o intuito de proceder à entrega dos prémios aos participantes; por último, a Requerente esteve presente na “Expo Shangai” que foi a maior feira internacional realizada até então, tendo sido subordinada a temas de elevado interesse para a Requerente, como é o caso das energias renováveis, inovação e tecnologia no setor da energia;
- É incompreensível a desconsideração feita pela Administração Tributária, excluindo os eventos da realidade empresarial e, como tal, considerando os montantes em causa “despesas de representação” e como tal sujeitos a tributação autónoma, nos termos dos artigos 88.º, n.º 3, al. a) e 88.º, n.º 7 do CIRC, em vigor à data dos factos;
- Tendo a AT liquidado à Requerente, ilegalmente, o montante de € 25.481,51, a título de tributação autónoma;
- A exclusão do direito à dedução que deu lugar às liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios de que a Requerente oportunamente reclamou, e que nesta sede contesta, respeitam ao imposto incorrido nos seguintes eventos: “C…”, no valor de € 4.200,00; “D…” de apresentação de resultados, no valor de € 142,00; “E…”, no valor de € 4.924,56; “F…”, no valor de € 1.229,89; e “G…”, no valor de € 4.457,18;
- O entendimento da Administração Tributária em matéria do IVA, com respeito à realização destes eventos, é que estamos perante despesas que se enquadram no artigo 21.º, n.º 2, al. d) do Código do IVA, efetuadas para as necessidades diretas dos participantes dos eventos em causa e que, nessa medida, o imposto em causa só pode ser deduzido até ao limite de 50%;
- A Requerente não se pode conformar com a interpretação da AT e apesar de ter procedido ao pagamento integral, em 30 de Maio de 2014, das liquidações adicionais de imposto e correlativos juros compensatórios em causa, considera que assentam sistematicamente num vício de violação de lei sobre os pressupostos de facto e de direito de aplicação do artigo 21.º, n.º 2, al. d) do CIVA;
- Os eventos em causa inseriram-se em ações de divulgação e promoção da imagem da Requerente e, nessa medida, intrinsecamente conexionados com a prossecução da sua actividade, pelo que se tais despesas não se consideram alheias à atividade exercida e, mais ainda, contribuem para a sua prossecução, para além de terem uma fortíssima componente publicitária, não se vê por que razão haverá de ser questionado o direito à dedução integral do IVA suportado pela Requerente;
- A sujeição a tributação autónoma dos encargos suportados pela Requerente para a realização dos eventos já identificados assente no pressuposto de que se tratam de “despesas de representação”, tal como se encontram definidas no artigo 88.º, n.º 7 do CIRC, é manifestamente ilegal;
- Com efeito, nos casos em que as despesas consubstanciam custos relacionados estritamente com a atividade empresarial e sendo os mesmos indispensáveis para a realização de proveitos e para a manutenção da fonte produtora, só uma violação grave da lei pode levar à incidência de tributação autónoma;
- Estamos, efetivamente, perante um conjunto de despesas incorridas na realização de eventos que se revelam fundamentais e plenamente inseridos na estratégia de marca e comunicação da Requerente, enfermando de ilegalidade toda a argumentação e interpretação firmada no ato de indeferimento do recurso hierárquico que manteve a liquidação de IRC e as tributações autónomas em causa;
- A tributação autónoma em apreço, alicerçada na qualificação das despesas em que a Requerente incorreu como despesas de representação, é manifestamente ilegal por erro grosseiro quanto aos pressupostos de facto e de direito de aplicação do artigo 88.º, n.º 3, al. a) e do artigo 88.º, n.º 7, ambos do CIRC, em vigor à data dos factos;
- Quando uma despesa seja de carácter exclusivamente empresarial e vise a obtenção de proveitos não deve ser incluída no âmbito de incidência de tributação autónoma a título de despesas de representação, sendo que um entendimento contrário não se coaduna com o princípio da tributação sobre o lucro real das empresas, sendo uma penalização excessiva e manifestamente contra legem;
- Nessa perspetiva, estar-se-á a penalizar fortemente os encargos com iniciativas de caráter puramente profissional e/ou promocional em sede de IRC, não reconhecendo (de forma totalmente desconexa com a realidade empresarial) a sua relevância por via de uma tributação mais desfavorável;
- Penalizar aqueles encargos – tributando-os como despesas de representação – faria com que a Requerente fosse inequivocamente prejudicada por fatores incompreensíveis e limitadores da sua liberdade de gestão de negócios;
- Pelo que os custos em apreço não poderão ser qualificados como despesas de representação nos termos do artigo 88.º, n.º 3, al. a) e do artigo 88.º, n.º 7 do CIRC em vigor à data dos factos, sob pena de violação do princípio constitucional da tributação pelo lucro real das sociedades e do princípio da dedutibilidade dos custos necessários para a obtenção de proveitos tributáveis e manutenção da fonte produtora;
- Todos os eventos foram dinamizados numa perspetiva de desenvolvimento empresarial e com finalidades puramente profissionais, pelo que a incidência de tributação autónoma sobre as despesas em referência enferma do vício de violação de lei quanto aos pressupostos de facto e de direito de aplicação dos artigos 88.º, n.º 3, al. a) e 88.º, n.º 7 do CIRC;
- Uma vez que, embora formalmente os encargos se possam qualificar como despesas de representação, a incidência de tributação autónoma não pode ser automática e desprovida de qualquer apreciação casuística, devendo, então, proceder-se à análise das finalidades, objetivos e especificidades dos eventos em apreço;
- A liquidação de IRC e de tributações autónomas mantida pelo ato de indeferimento do recurso hierárquico oportunamente apresentado pela Requerente não pode subsistir, pelo que a Requerente deve ver-lhe restituído o montante de € 25.385.,51 indevidamente liquidado a título de tributação autónoma, entretanto pago, acrescido da condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios que se mostrem devidos, nos termos do artigo 43.º da LGT e do artigo 61.º do CPPT;
- A Administração Tributária considerou, em sede inspetiva, que as despesas incorridas pela Requerente no âmbito da realização dos referidos eventos promocionais estariam supostamente enquadradas no disposto no artigo 21.º, n.º 2, al. d), do CIVA;
- Esta disposição, assim como todo o corpo do artigo 21.º do CIVA assume-se como um normativo anti-abuso, visando prevenir a dedução do IVA relativo a operações que o legislador considerou como não essenciais à atividade produtiva ou facilmente desviáveis para consumos particulares;
- Sendo as previsões contidas no artigo 21.º do CIVA subsumíveis a presunções legais, deverão sempre admitir prova em contrário, conforme resulta explicitamente do artigo 73.º da LGT;
- Se o fim prosseguido pela norma é o de evitar a fraude fiscal e se a presunção de não afetação a operações tributadas admite prova em contrário, então, haverá que determinar, no caso concreto, a finalidade com que os serviços foram adquiridos no sentido de aferir o caráter dedutível (ou não) do IVA incorrido;
- Sendo assim, se as despesas em causa não se consideram alheias à atividade exercida e, mais ainda, contribuem para a sua prossecução – ao serem subsumíveis a despesas de publicidade – não se vê por que razão haverá de ser questionado o direito à dedução do IVA contido nestas despesas, posto que se destinam à atividade tributável da Requerente;
- Tendo a AT fundamentado no artigo 21.º do CIVA os atos de liquidação, estes padecem de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, uma vez que estamos perante despesas com fins estritamente ligados à atividade da Requerente, pelo que a referida norma não tem aplicação;
- Em decorrência deste vício, os atos de liquidação padecem também de violação do disposto nos artigos 19.º e 20.º do CIVA, ao determinarem uma exclusão ilegal e inadmissível do direito à dedução do imposto consagrado nestas normas;
- No que se refere às liquidações de juros compensatórios que nesta sede se contesta, importa recordar que as mesmas se encontram numa relação de acessoriedade com a liquidação de imposto;
- Numa circunstância em que as liquidações adicionais de IVA se encontrem inquinadas de vícios que afetem a respectiva validade – tal como sucede na situação em presença – esses vícios comunicam-se às correspondentes liquidações de juros compensatórios, visto que estas últimas (dada a sua natureza acessória) não podem subsistir sem aquelas;
- Assim, para além da restituição do montante do imposto liquidado, no valor de € 14.954,23, deve ser anulada a decisão de manutenção da liquidação de juros compensatórios, no valor de € 259,71 vertida na decisão de indeferimento do recurso hierárquico, perfazendo o valor total a restituir de € 15.213,94;
- É manifesto que os erros de que enferma a liquidação adicional de imposto resultam de um “erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”, nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT;
- Pelo que o montante a ressarcir à Requerente deverá ser acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da nota de crédito, que deverá ser processada no prazo de 90 dias contados a partir do início do prazo de execução espontânea da decisão arbitral, como preceitua o artigo 61.º do CPPT e sem prejuízo dos eventuais juros de mora a que a Administração Tributária possa estar sujeita, nos termos do artigo 43.º, n.º 5, da LGT.
A Requerente remata o seu articulado inicial peticionando o seguinte:
«Termos em que se requer a V. Exa. que se digne admitir o presente pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral, nos termos e para os efeitos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, seguindo a tramitação prevista nos artigos 17.º e seguintes e aplicando-se os efeitos mencionados no artigo 13.º do referido diploma, tudo com as devidas consequências legais, concluindo-se, a final:
a) pela declaração de ilegalidade e anulação de parte da demonstração de liquidação de IRC n.º 2014…, referente ao exercício de 2010, bem como à restituição do montante indevidamente pago no valor de € 25.385,51;
b) pela declaração de ilegalidade e anulação das liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios n.ºs…, …, …, …, …, e, bem como à restituição do montante indevidamente pago a título de imposto no valor de € 14.954,23 e de € 259,71 respeitante a juros compensatórios;
c) pela condenação da Administração Tributária no pagamento dos juros indemnizatórios que se mostrem devidos sobre as quantias referidas em a) e b), no valor global de € 40.599,45, nos termos do disposto nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT, contados desde os pagamentos indevidos efectuados pela Requerente até à emissão da respectiva nota de crédito.»
2. O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT em 12 de fevereiro de 2016.
3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
4. Em 29 de março de 2016, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 13 de abril de 2016.
6. No dia 17 de maio de 2016, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual arguiu a exceção de cumulação ilegal de pedidos e impugnou, especificadamente, os argumentos aduzidos pela Requerente, tendo concluído pela improcedência da presente ação, com a sua consequente absolvição do pedido.
A Requerida não juntou documentos, nem requereu a produção de quaisquer outras provas.
7.1. No essencial e também de forma breve, importa respigar os argumentos mais relevantes em que a Requerida alicerçou a sua Resposta:
- O facto de os pedidos resultarem da mesma ação inspetiva não implica que estejamos perante a possibilidade legal de cumulação de pedidos prevista no artigo 3.º, n.º 1, do RJAT uma vez que os pedidos formulados nos presentes autos respeitam a diferentes actos tributários, mais concretamente a liquidações de IRC e de IVA, e não dependem da aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito;
- Ou seja, ainda que as circunstâncias de facto a apreciar possam ser essencialmente as mesmas, o mesmo não sucede com os princípios ou regas de direito a aplicar, resultando evidente do pedido formulado que os fundamentos legais invocados pela Requerente para anulação parcial da liquidação de IRC não são os mesmos que invoca para anulação das liquidações de IVA e respetivos juros compensatórios;
- A cumulação dos pedidos anulatórios viola o disposto no n.º 1 do artigo 3.º do RJAT, não podendo, por isso, ser admitida;
- Verifica-se uma situação de cumulação ilegal de pedidos, na medida em que no mesmo pedido de pronúncia arbitral são invocadas como causas de pedir diferentes regras de direito, umas com sede no CIRC, e outras no CIVA;
- Assim, nos termos dos artigos 193.º, n.º 2, alínea c), 194.º, 493.º, n.º 2 e 494.º, alínea b), todos do CPC (aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT), a cumulação ilegal de pedidos constitui exceção dilatória determinante da absolvição da instância;
- Assim, deverá ser julgada procedente a exceção da cumulação ilegal de pedidos, absolvendo-se a Requerida da instância relativamente aos pedidos que não prosseguirem para apreciação do Tribunal;
- Da totalidade das correções efetuadas pela AT por referência a despesas de representação – tributação autónoma, no montante de € 54.378,80, que tiveram por fundamento o disposto no n.º 7 do artigo 88.º do CIRC e a análise aos encargos apurados na contabilidade, a Requerente reclamou graciosamente das correcções efetuadas no montante de € 25.385,51 por entender que apenas se enquadram no n.º 7 do artigo 88.º do CIRC os encargos que não estão diretamente relacionados com a sua atividade e que não visam a obtenção de qualquer contrapartida para a empresa;
- A reclamação foi totalmente indeferida, por se entender que da conjugação do n.º 7 do artigo 88.º do CIRC com o artigo 23,º do CIRC resulta que os encargos em causa são fiscalmente dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável (de outro modo a inspeção tributária não teria aceitado a sua dedutibilidade), não estando em causa, por conseguinte, qualquer prova quanto à sua conexão com a atividade empresarial da Requerente;
- Os encargos em causa constituem, todavia, encargos que pela sua natureza entendeu o legislador sujeitar a tributação autónoma, entendimento que também tem apoio na jurisprudência;
- Daquela decisão a Requerente recorreu hierarquicamente, com os mesmos fundamentos, recurso esse que foi julgado improcedente;
- Não se alcança em que é que o contexto de promoção e publicidade que a Requerente invoca para as despesas ora controvertidas se distingue das restantes despesas sujeitas igualmente a tributação autónoma e com a qual a Requerente se conformou;
- Embora se admita que os encargos se inserem no âmbito da atividade promocional da empresa, entendeu-se que os mesmos não configuram gastos em publicidade e propaganda, i.e., encargos com anúncios em meios de comunicação social, campanhas publicitárias promocionais, materiais publicitários, mas antes a natureza de verdadeiras despesas de representação;
- Relativamente ao evento “H…”, a Requerente não juntou ao processo administrativo documentos que comprovassem o alegado;
- Assim, será de julgar improcedente o pedido para anulação das correções efetuadas em sede de IRC, absolvendo-se a AT do pedido;
- Da totalidade das correções efetuadas pela AT por referência a IVA indevidamente deduzido, no montante de € 77.879,38, a Requerente reclamou graciosamente das correções efetuadas que geraram IVA adicional no montante de € 14.954,23 e juros compensatórios no montante de € 10.019,02, por entender que o IVA suportado com a aquisição de bens e serviços ora controvertidos se refere a atividades promocionais sendo, por conseguinte, totalmente dedutível;
- A reclamação foi totalmente indeferida, mantendo as conclusões da inspeção tributária;
- Daquela decisão a Requerente deduziu recurso hierárquico, o qual foi parcialmente deferido, mantendo as correções efetuadas quanto ao IVA e anulando parcialmente a correção efetuada quanto a juros compensatórios, ou seja, relativamente ao imposto, concluindo que não estava em causa que as despesas tivessem sido incorridas para a realização de eventos que contribuíam para reforçar a atividade da Requerente, porém, dada a natureza daquelas operações, e por força do disposto na al. d) do n.º 2 do artigo 21.º do CIVA, as mesmas apenas podiam usufruir de dedução parcial do imposto incorrido, e relativamente aos juros compensatórios, concluiu-se que estando a Requerente nos períodos de imposto em causa numa situação de crédito de imposto, não existindo falta de imposto, deveriam aqueles juros compensatórios ser anulados, com exceção da importância de € 259,71 uma vez que no período de agosto de 2010 a Requerente não esteve numa situação de crédito de imposto;
- Não se trata, por conseguinte, de questionar o direito à dedução do IVA suportado, dando-se por adquirida a dedutibilidade daqueles encargos à luz do artigo 20.º do CIVA, mas antes da aplicação do disposto nas alíneas c) e d) do n.º 1 e al. d) do n.º 2 do artigo 21.º do CIVA que exclui do direito à dedução 50% do imposto;
- O artigo 21.º do CIVA não contém qualquer presunção legal, pois, acordo com a definição legal de presunção contida no artigo 349.º do CC, resulta forçoso que aquele normativo legal não presume factos desconhecidos a partir de factos conhecidos, mas antes e tão-somente procede ao enquadramento jurídico-tributário de factos conhecidos;
- Uma vez que o artigo 21.º do CIVA nada presume a partir de factos conhecidos, não se pode ilidir a presunção de factos desconhecidos como a Requerente pretende, não havendo lugar ao disposto no artigo 73.º da LGT;
- Mais, se o n.º 1 do artigo 21.º do CIVA estabelecesse presunções ilidíveis, então estariam desprovidas de sentido as derrogações àquele normativo contidas no n.º 2, normativo este aplicável sem necessidade de demonstrar que as despesas nele elencadas se destinam exclusivamente a uma atividade prevista no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, pressuposto prévio à aplicação do artigo 21.º do CIVA;
- As exclusões do direito à dedução previstas no n.º 1 do artigo 21.º do CIVA assentam na natureza efetiva dos encargos, tendo como pressuposto a sua conexão com a atividade da Requerente pois constitui um princípio geral que só podemos deduzir o IVA suportado para a realização de operações tributáveis;
- Para além de se exigir que os encargos sejam suportados com vista ao desenvolvimento de uma atividade económica que confere tal direito, o direito à dedução do IVA depende de outros requisitos, como sejam: a) a existência de faturas passadas, em forma legal, em nome e na posse do sujeito passivo; b) o IVA seja suportado em território nacional; c) as despesas em causa não estejam por si só excluídas do direito à dedução, nos termos do artigo 21.º do CIVA;
- Assim, será de julgar improcedente o pedido para anulação das correções efetuadas em sede de IVA, absolvendo-se a AT do pedido.
A Requerida remata assim o seu articulado:
«Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser julgada procedente a excepção de cumulação ilegal de pedidos, com as devidas consequências legais.
Caso prossiga a instância relativamente a algum dos pedidos, deve o mesmo ser julgado improcedente com a consequente absolvição da AT do pedido.»
7.2. A 30 de maio de 2016, a Requerida juntou aos autos o respetivo processo administrativo (doravante, abreviadamente designado PA).
8. Em 6 de junho de 2016, foi proferido despacho a julgar improcedente a exceção de cumulação ilegal de pedidos suscitada pela Requerida.
9. Em 28 de junho de 2016, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT – na qual foi tratado o que consta da respetiva ata que aqui se dá por reproduzida –, tendo-se, ainda, procedido à inquirição das duas testemunhas arroladas pela Requerente. Naquela reunião foi ainda fixado o dia 13 de outubro de 2016 como data limite para a prolação do acórdão arbitral.
10. Ambas as Partes apresentaram alegações escritas, nas quais reiteraram as posições anteriormente assumidas nos respetivos articulados.
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II. SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.
O processo não enferma de nulidades.
As partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias, encontram-se devidamente representadas e são legítimas.
Não há exceções – para além da já anteriormente decidida por despacho arbitral autónomo – ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e de que cumpra conhecer.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1. DE FACTO
§1. FACTOS PROVADOS
Consideram-se provados os seguintes factos:
a) A Requerente é uma sociedade comercial que tem por objeto a promoção, dinamização e gestão, por forma direta ou indireta, de empreendimentos e atividades na área do setor energético, tanto a nível nacional como internacional, com vista ao incremento e aperfeiçoamento do desempenho do conjunto das sociedades do seu grupo, tendo como CAE principal o … e como CAE secundários o … e o…. [cf. certidão permanente de registo comercial com o código de acesso: …-…-…]
b) A Requerente encontra-se cotada no principal índice bolsista português, possuindo uma forte dimensão internacional e operando num setor estratégico e de elevado interesse público.
c) A Requerente é considerada “contribuinte de elevada relevância económica e fiscal”, nos termos previstos no artigo 68.º-B da LGT, constando do elenco previsto no Despacho n.º 6999/2013, de 30 de abril de 2013, proferido nos termos do disposto na Portaria n.º 107/2013, de 15 de março. [cf. PA junto aos autos]
d) A Requerente é a sociedade dominante do grupo B…, o qual está sujeito ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS). [cf. PA junto aos autos]
e) Em termos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), a Requerente encontra-se sujeita ao regime geral de IRC, sendo tributada de acordo com o regime especial de tributação de grupos de sociedades (RETGS), constituindo-se como a sociedade dominante do grupo. [cf. PA junto aos autos]
f) Para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), a Requerente está enquadrada no regime normal, periodicidade mensal. [cf. PA junto aos autos]
g) Em 29 de setembro de 2010, ocorreu o evento denominado “H…”, realizado pela Requerente e consubstanciado numa reunião de trabalhadores da área comercial do Grupo B… com o objetivo de trocarem entre si experiências de relacionamento com o cliente/consumidor, uniformizando estratégias e procedimentos, visando melhorar a qualidade daqueles comerciais, o qual não envolveu a participação de quaisquer pessoas estranhas à Requerente. [cf. depoimento da testemunha I… e Doc. n.º 9 anexo à P. I.]
h) A Requerente adjudicou à empresa “J…, Lda.” a organização daquele evento, compreendendo o fornecimento de todos os bens e serviços necessários à sua realização, com o qual despendeu o valor de € 11.965,00, acrescido de IVA no valor de € 2.512,65, perfazendo assim o montante total de € 14.477,65. [cf. Doc. n.º 9 anexo à P. I.]
i) No dia 8 de julho de 2010, ocorreu o concerto denominado “K…”, realizado pela Requerente no …, concretamente na barragem com o mesmo nome, o qual, ao ter lugar no espaço físico de uma infraestrutura emblemática, permitiu divulgar a atividade exercida pela Requerente e visou mitigar o efeito negativo na imagem da Requerente decorrente da construção de infraestruturas que, embora necessárias à produção de energia na barragem …, provocaram um forte impacto paisagístico. [cf. Doc. n.º 10 anexo à P. I. e depoimento da testemunha I…]
j) Segundo uma análise de “Communication Performance – Sponsorship” realizada pela “Z...”, aquele concerto «foi objecto de referências nos órgãos de comunicação social em 25 notícias. O espaço editorial ocupado foi avaliado em 3,9 milhões de euros. A B… foi objecto de referência em 92% da informação veiculada e o espaço mediático ocupado permitiu à marca um retorno de 1,3 milhões de euros.». [cf. Doc. n.º 11 anexo à P. I.]
k) A Requerente adjudicou à empresa “L…, S. A.” a organização daquele evento, compreendendo o fornecimento de todos os bens e serviços necessários à sua realização – nomeadamente, o estudo do layout a adotar, a criação e maximização dos espaços de apoio ao evento e o fornecimento e montagem dos suportes audiovisuais –, com o qual despendeu o valor de € 130.812,50, acrescido de IVA no valor de € 26.720,63, perfazendo assim o montante total de € 157.533,13. [cf. depoimento da testemunha I… e Docs. n.ºs 12 e 13 anexos à P. I.]
l) A cerimónia de apresentação pública dos resultados anuais da Requerente à comunicação social gera uma grande expetativa junto quer dos seus stakeholders, quer dos meios de comunicação social e procura garantir que a informação disponibilizada é feita com elevados níveis de rigor e transparência. [cf. depoimentos das testemunhas I… e M…]
m) Aquela cerimónia tem uma duração de cerca de duas horas, sendo vocacionada para os media nacionais e estrangeiros (nomeadamente, a W... e a Y...) e à qual costumam comparecer 30 a 40 pessoas, na sua quase totalidade jornalistas. [cf. depoimentos das testemunhas I… e M…]
n) A Requerente adjudicou à empresa “L…, S. A.” o fornecimento de um “wellcome coffee” – composto, sobretudo, por águas, refrigerantes e cafés – para aquela cerimónia que ocorreu em março de 2010, com o qual despendeu o valor de € 1.420,00, acrescido de IVA no valor de € 284,00, perfazendo assim o montante total de € 1.704,00. [cf. depoimento da testemunha I… e Doc. n.º 16 anexo à P. I.]
o) A Requerente foi objeto de reconhecimento internacional no que respeita a procedimentos de reporte financeiro, tendo ficado classificada em primeiro lugar no “TOP 30 Global Rankings for Financial Disclosure Procedures” do “IR Global Rankings’10”. [cf. Doc. n.º 15 anexo à P. I.]
p) Nos dias 9 e 10 de novembro de 2010, teve lugar o evento denominado “E…”, realizado pela Requerente e para o qual foram convidados representantes da comunicação social portuguesa e estrangeira com o intuito de, mediante a exposição de temas relacionados com a atividade da Requerente, possibilitar a colocação de questões aos órgãos de gestão da empresa – sendo os conteúdos das entrevistas passíveis de publicação –, visando, desse modo, a promoção de uma política de total transparência e rigor na informação. [cf. depoimento da testemunha I… e Docs. n.ºs 17 e 19 anexos à P. I.]
q) A Requerente adjudicou à empresa “L…, S. A.” a organização daquele evento, compreendendo o fornecimento de todos os bens e serviços necessários à sua realização, com o qual despendeu o valor de € 46.900,50, acrescido de IVA no valor de € 9.849,11, perfazendo assim o montante total de € 56.749,61. [cf. Doc. n.º 19 anexo à P. I.]
r) Nos dias 19 e 20 de maio de 2010, teve lugar o evento denominado “F…”, realizado pela Requerente e pela “N…” e que visou apresentar aos principais analistas e investidores os conceitos, projetos e a estratégia do Grupo B… para os anos seguintes, tendo incluído a apresentação dos resultados e estratégias inerentes à atividade da Requerente, conferindo ainda aos presentes a possibilidade de colocarem questões sobre os temas em análise. [cf. depoimentos das testemunhas I… e M… e Docs. n.ºs 20 e 21 anexos à P. I.]
s) Naquele evento marcaram presença 79 pessoas, tendo assistido, via webcast, 69 pessoas, na quase totalidade representantes da banca de investimento, de acionistas, de analistas e da imprensa económica. [cf. Doc. 22 anexo à P. I. e depoimento da testemunha M…]
t) A Requerente adjudicou à empresa “L…, S. A.” a organização daquele evento, compreendendo o fornecimento, montagem e desmontagem dos suportes audiovisuais e o desenvolvimento de todo o layout do evento, com o qual despendeu o valor de € 19.445,00, acrescido de IVA no valor de € 3.889,00, perfazendo assim o montante total de € 23.334,00. [cf. depoimento da testemunha I… e Doc. n.º 23 anexo à P. I.]
u) Este evento é de crucial importância para a Requerente captar fundos de investidores nacionais e estrangeiros. [cf. depoimento da testemunha M…]
v) A Requerente realiza anualmente o “G…”, num contexto de difusão da dimensão e importância da atividade por si desenvolvida, visando conferir aos estudantes universitários oriundos de todas as faculdades do País a oportunidade de efetuarem a apresentação dos seus projetos, contemplando ainda a oferta de estágios, garantindo aos estudantes uma primeira experiência profissional e assim maximizando a possibilidade de futura contratação e integração de participantes nos quadros da Requerente, o que permite a esta a captação dos melhores talentos e recursos humanos. [cf. depoimento da testemunha I…]
w) Em todas as edições do “G…” é definido um tema ou projeto a desenvolver, tendo a edição do ano de 2010 sido subordinada ao tema “Plano de Marketing e Comunicação da marca B… enquanto player global” e contado com a participação de um total de 333 estudantes oriundos de 31 faculdades e divididos por 81 equipas. [cf. depoimento da testemunha I… e Docs. n.ºs 24 e 25 anexos à P. I.]
x) A fim de assinalar a conclusão do “G…” e reconhecer o esforço e mérito dos participantes, a Requerente realizou uma cerimónia com o intuito de proceder à entrega dos prémios aos participantes, a qual teve lugar no …, em Lisboa, no dia … de 2010. [cf. depoimento da testemunha I… e Docs. n.ºs 26 e 27 anexos à P. I.]
y) A Requerente adjudicou à empresa “L…, S. A.” a organização daquele evento, compreendendo o fornecimento dos bens e serviços indispensáveis à sua realização, com o qual despendeu o valor de € 42.455,00, acrescido de IVA no valor de € 8.915,55, perfazendo assim o montante total de € 51.370,55. [cf. Docs. n.ºs 26 e 27 anexos à P. I.]
z) No ano de 2010, realizou-se a feira internacional “Expo 2010 Shangai”, na qual Portugal tinha um pavilhão, tendo a Requerente integrado uma comitiva empresarial que ali se deslocou e marcado presença no pavilhão nacional, onde interveio numa conferência subordinada a temas relacionados com as energias renováveis, a inovação e a tecnologia no setor da energia, para a qual levou do nosso País alguns participantes e elementos dos media, tendo sido esta a primeira vez que a Requerente surgiu e foi dada a conhecer institucionalmente no Oriente. [cf. depoimento da testemunha I… e Doc. n.º 28 anexo à P. I.]
aa) Tendo em vista a participação dos seus representantes naquele certame internacional, a Requerente contratou um conjunto de serviços à “O…, S. A.”, com os quais despendeu o montante de € 7.662,77.
ab) A coberto da Ordem Serviço n.º OI2012…, de 6 de agosto de 2012, emitida pela Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC), a Requerente foi sujeita a um procedimento de inspeção externo, relativo ao exercício de 2010, de âmbito geral, cujo principal objectivo foi o de apurar a situação tributária do sujeito passivo e obter um grau de segurança aceitável sobre se as demonstrações financeiras refletem o cumprimento das obrigações fiscais inerentes ao exercício da sua atividade. [cf. PA junto aos autos]
ac) A referida acção inspectiva teve início no dia 6 de fevereiro de 2013, tendo sido prorrogada por dois períodos sucessivos de três meses, cada um. [cf. PA junto aos autos]
ad) A Requerente, relativamente ao exercício de 2010, deu o devido cumprimento às obrigações fiscais de índole declarativa a que se encontra obrigada, tendo procedido à entrega, nomeadamente, da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, da Declaração Anual de Informação Empresarial Simplificada (IES), das Declarações Periódicas de IVA, da Declaração Modelo 10, da Declaração Modelo 19, da Declaração Modelo 30 e da Declaração Modelo 34. [cf. PA junto aos autos]
ae) No respetivo projecto de Relatório da Inspeção Tributária foram propostas, além de outras, as seguintes correções em sede de IRC e, mais concretamente, relativamente a tributação autónoma [cf. PA junto aos autos]:
af) No mesmo projecto de Relatório da Inspeção Tributária foram propostas, entre outras, as seguintes correções quanto ao IVA deduzido [cf. PA junto aos autos]:
ag) A Requerente foi notificada para, querendo, exercer o direito de audição sobre aquele projeto de Relatório da Inspeção Tributária, o que fez, por meio de documento escrito que deu entrada na UGC em 3 de fevereiro de 2014, que aqui se dá por inteiramente reproduzido, tendo merecido por parte da AT a apreciação constante do Relatório de Inspeção Tributária que aqui se dá igualmente por reproduzida. [cf. PA junto aos autos]
ah) No Relatório da Inspeção Tributária foram consignadas, entre outras, as seguintes correções ao cálculo do IRC, concretamente quanto a tributação autónoma [cf. PA junto aos autos]:
ai) No mesmo Relatório da Inspeção Tributária foram consignadas, entre outras, as seguintes correções ao IVA deduzido [cf. PA junto aos autos]:
aj) A Requerente foi notificada do Relatório da Inspeção Tributária, através do ofício n.º…, datado de 06/02/2014, dos Serviços de Inspeção Tributária, Unidade dos Grandes Contribuintes, entregue por mão própria na sua sede social. [cf. PA junto aos autos]
ak) A coberto da Ordem de Serviço n.º OI 2014…, de 13 de fevereiro de 2014, emitida pela UGC, foi realizado um procedimento interno de inspeção ao grupo B… referente ao exercício de 2010, de âmbito parcial, visando refletir na declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do grupo, as correções efectuadas pela AT ao IRC na esfera individual da Requerente, decorrentes da ação inspetiva supra identificada no facto provado ab). [cf. PA junto aos autos]
al) No respetivo projeto de Relatório da Inspeção Tributária foram propostas, além de outras, as seguintes correções ao cálculo do IRC do grupo B…, concretamente quanto a tributação autónoma, tendo por base as ditas correções efetuadas na esfera individual da Requerente, [cf. PA junto aos autos]:
am) A Requerente foi notificada para, querendo, exercer o direito de audição sobre aquele projeto de Relatório da Inspeção Tributária, o que fez, por meio de documento escrito que deu entrada na UGC em 24 de março de 2014, que aqui se dá por inteiramente reproduzido, tendo merecido por parte da AT a apreciação constante do Relatório de Inspeção Tributária que aqui se dá igualmente por reproduzida. [cf. PA junto aos autos]:
an) No Relatório da Inspeção Tributária foram consignadas, entre outras, as seguintes correções ao cálculo do IRC do grupo B…, concretamente quanto a tributação autónoma [cf. PA junto aos autos]:
ao) A Requerente foi notificada do Relatório da Inspeção Tributária, através do ofício n.º…, datado de 01/08/2014, dos Serviços de Inspeção Tributária, Unidade dos Grandes Contribuintes, remetido por carta registada com aviso de receção. [cf. PA junto aos autos]
ap) Em virtude e na sequência das referenciadas correções, a AT efetuou:
- a liquidação de IRC n.º 2014… , datada de 11 de agosto de 2014, referente ao exercício de 2010, na qual foi apurado o valor a reembolsar de € 33.417.465,02 [cf. Doc. n.º 1 anexo à P. I.];
- a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1003, no montante de € 142,00 [cf. Doc. n.º 2 anexo à P. I.];
- a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1005, no montante de € 9.971,50 [cf. Doc. n.º 3 anexo à P. I.];
- a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1011, no montante de € 14.997,12 [cf. Doc. n.º 4 anexo à P. I.];
- a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1012, no montante de € 22.212,25 [cf. Doc. n.º 5 anexo à P. I.]; e
- a liquidação de juros compensatórios n.º…, referentes ao período de 1008, no montante de € 259,71 [cf. Doc. n.º 6 anexo à P. I.].
aq) O valor total das tributações autónomas liquidadas, no âmbito do IRC, relativamente às despesas referenciadas nos factos provados h), k), n), q), t), y) e aa), cifra-se em € 25.385,51. [cf. PA junto aos autos]
ar) Em 30 de maio de 2014, a Requerente efetuou tempestivamente o pagamento voluntário e integral das liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios referidas no facto provado ap). [cf. Docs. n.ºs 2 a 6 anexos à P. I.]
as) Em 23 de setembro de 2014, a Requerente apresentou reclamação graciosa – cujo requerimento inicial aqui se dá por inteiramente reproduzido – que teve por objeto as liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios referidas no facto provado ap), tendo a Requerente ali peticionado o seguinte [cf. PA junto aos autos]:
«(i) a anulação total ou parcial das liquidações adicionais de IVA, consoante o caso, promovendo-se, na parte aplicável, a sua reforma e substituição, em função dos montantes ora contestados, no valor global de € 14.954,23;
(ii) a anulação total das liquidações de juros compensatórios, no valor global de € 10.019,02, em virtude de a Reclamante ter sempre persistido em situação de crédito de imposto perante o Estado;
(iii) a restituição dos montantes indevidamente pagos relativamente às liquidações mencionadas em (i) e (ii) e;
(iv) o pagamento dos juros indemnizatórios devidos, calculados sobre os montantes referidos nas alíneas (i) e (ii), ao abrigo do disposto nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.»
at) A referida reclamação graciosa foi autuada sob o n.º …2014… no Serviço de Finanças de Lisboa-…, tendo sobre a mesma recaído o seguinte projeto de decisão [cf. PA junto aos autos]:
au) A Requerente foi notificada, através do ofício n.º…, datado de 18/12/2014, da Unidade dos Grandes Contribuintes, Divisão de Gestão e Assistência Tributária, remetido por carta registada com aviso de receção, daquele projeto de decisão e para, querendo, exercer o direito de audição. [cf. PA junto aos autos]
av) A Requerente não exerceu aquele direito de audição prévia. [cf. PA junto aos autos]
aw) A Requerente foi notificada, através do ofício n.º…, datado de 31/12/2014, da Unidade dos Grandes Contribuintes, Divisão de Gestão e Assistência Tributária, remetido por carta registada, da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, com a seguinte fundamentação [cf. PA junto aos autos]:
(…)
(…)
(…)
ax) Em 30 de janeiro de 2015, a Requerente interpôs recurso hierárquico – cujo requerimento inicial aqui se dá por inteiramente reproduzido – da decisão de indeferimento da reclamação graciosa referida no facto provado anterior, tendo a Requerente ali peticionado o seguinte [cf. PA junto aos autos]:
«(i) a anulação da decisão de indeferimento que recaiu sobre a reclamação graciosa;
(ii) a anulação total ou parcial das liquidações adicionais de IVA, em função das correções e montantes ora contestados, promovendo-se, na parte aplicável, a sua reforme e substituição, no valor global de € 14.954,23;
(iii) a anulação total das liquidações de juros compensatórios, no valor global de € 10.019,02, em virtude de a Recorrente ter sempre persistido em situação de crédito de imposto perante o Estado;
(iv) a restituição dos montantes indevidamente pagos relativamente às liquidações mencionadas em (ii) e (iii) e;
(v) o pagamento de juros indemnizatórios devidos, calculados sobre os montantes referidos nas alíneas (ii) e (iii), ao abrigo do disposto nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.»
ay) O referido recurso hierárquico foi autuado sob o n.º …2015… no Serviço de Finanças de Lisboa-…, tendo sobre o mesmo recaído decisão de deferimento parcial, proferida pela Direção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado (DSIVA), nos termos e com a fundamentação seguinte [cf. PA junto aos autos]:
(…)
az) A Requerente foi notificada, através do ofício n.º…, datado de 07/01/2016, da Unidade dos Grandes Contribuintes, Divisão de Gestão e Assistência Tributária, remetido por carta registada, da decisão referida no facto provado anterior. [cf. Doc. n.º 8 anexo à P. I. e PA junto aos autos]
ba) Em 4 de fevereiro de 2015, a Requerente apresentou reclamação graciosa – cujo requerimento inicial aqui se dá por inteiramente reproduzido – que teve por objeto a liquidação de IRC referida no facto provado ap), tendo a Requerente ali peticionado o seguinte [cf. PA junto aos autos]:
«…diligenciar no sentido de se proceder:
(i) à anulação da demonstração de liquidação de IRC n.º 2014…, referente ao exercício de 2010 e da subsequente demonstração de acerto de contas n.º 2014…;
(ii) à devolução do montante entretanto indevidamente pago, no valor de € 25.385,51, acrescido dos correspondentes juros compensatórios e;
(iv) ao pagamento dos juros indemnizatórios que nos termos da lei se mostrem devidos.»
bb) A referida reclamação graciosa foi autuada sob o n.º …2015… no Serviço de Finanças de Lisboa-…, tendo sobre a mesma recaído o seguinte projeto de decisão [cf. PA junto aos autos]:
bc) A Requerente foi notificada, através do ofício n.º…, datado de 13/02/2015, da Unidade dos Grandes Contribuintes, Divisão de Gestão e Assistência Tributária, remetido por carta registada, daquele projeto de decisão e para, querendo, exercer o direito de audição. [cf. PA junto aos autos]
bd) A Requerente exerceu aquele direito de audição prévia. [cf. PA junto aos autos]
be) A Requerente foi notificada, através de ofício, datado de 18/03/2015, da Unidade dos Grandes Contribuintes, Divisão de Gestão e Assistência Tributária, remetido por carta registada, da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, com a seguinte fundamentação [cf. PA junto aos autos]:
bf) Em 10 de abril de 2015, a Requerente interpôs recurso hierárquico – cujo requerimento inicial aqui se dá por inteiramente reproduzido – da decisão de indeferimento da reclamação graciosa referida no facto provado anterior, tendo a Requerente ali peticionado o seguinte [cf. PA junto aos autos]:
«… diligenciar no sentido de se proceder:
(i) à anulação da demonstração de liquidação de IRC n.º 2014…, referente ao exercício de 2010 e da subsequente demonstração de acerto de contas n.º 2014…;
(ii) à devolução do montante entretanto indevidamente pago, no valor de € 25.385,51, acrescido dos correspondentes juros compensatórios e;
(iv) ao pagamento dos juros indemnizatórios que nos termos da lei se mostrem devidos.»
bg) O referido recurso hierárquico foi autuado sob o n.º …2015… no Serviço de Finanças de Lisboa-…, tendo sobre o mesmo recaído decisão de indeferimento, proferida pela Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (DSIRC), nos termos e com a fundamentação seguinte [cf. PA junto aos autos]:
«B – PARECER
(…)
Analisando os motivos que deram origem à decisão de indeferimento da reclamação graciosa sub judice, em contraponto com os argumentos apresentados pela ora recorrente tendo por base normativos legais em vigor à data dos factos, somos a informar:
i) Dispõe a alínea a) do n.º 3 do art. 88.º do Código do IRC que são tributados autonomamente à taxa de 10% “os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação…”, considerando-se como tal, nomeadamente, as despesas suportadas com receções, refeições, viagens, passeios e espetáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades (cfr. n.º 7 do mesmo normativo legal).
ii) Por outro lado prevê o art. 23.º do Código do IRC que “Consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto, ou para a manutenção da fonte produtora…” indicando-se a título exemplificativo os gastos que poderão estar contemplados nesta norma.
iii) Constata-se assim que, na prática, o legislador pretendeu, no que toca a determinados encargos, onde se incluem as despesas de representação, reduzir a vantagem fiscal conferida a estes gastos por via da respetiva dedução fiscal no apuramento do lucro tributável, estabelecendo, para o efeito, uma tributação autónoma relativamente aos mesmos.
iv) Esta evidência é percetível quando o legislador atribui, somente, relevância para efeitos de sujeição a tributação autónoma, aos “encargos dedutíveis relativos a despesas de representação”.
v) Ora, sabendo-se que a tributação autónoma das despesas de representação só pode ocorrer quando estejam em causa encargos dedutíveis, este requisito do legislador evidencia, manifestamente, o propósito de tributar as despesas em causa que apresentem uma inegável ligação à atividade económica desenvolvida pelos sujeitos passivos e à prossecução do seu objeto social.
vi) Com referência às despesas de representação, a tributação autónoma, apenas, não é aplicável quando estamos na presença de gastos considerados pelos sujeitos passivos como “não dedutíveis”, isto é, aqueles que não concorreram para a formação do lucro tributável.
vii) De notar, ainda, que o legislador não adotou qualquer prerrogativa quando as despesas de representação são suportadas em correlação e no exercício normal da atividade dos sujeitos passivos, levando-nos a concluir que a Tributação Autónoma é uma imposição legal para todas as despesas abrangidas pela definição constante no n.º 7 do art. 88.º do Código do IRC.
viii) Somos de opinião que, se fosse intenção do legislador afastar da tributação autónoma as despesas de representação que, inequivocamente, estivessem associadas à atividade de cada sujeito passivo, teria feito essa exclusão de uma forma expressa tal como o fez relativamente aos encargos dedutíveis respeitantes a viaturas ligeiras de passageiros ou mistas (cfr. n.º 6 do art. 88.º do Código do IRC).
ix) Trata-se de uma norma de incidência objetiva, tendo o legislador pretendido com a mesma tributar de forma independente as despesas de representação, as quais, por si só, constituem factos tributários autónomos.
x) Nesse sentido, reportamo-nos ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 310/2012 proferido no âmbito do Processo 150/2012, onde é referido que “… no caso tributa-se cada despesa efetuada, em si mesma considerada, e sujeita a determinada taxa, sendo a tributação autónoma apurada de forma independente do IRC”.
xi) Entende-se, por isso, que a tributação autónoma reconduz-se, apenas, a uma penalização dos sujeitos passivos que suportam as despesas elencadas no art. 88.º do Código do IRC, compelindo-os a adotar um comportamento mais restritivo relativamente às mesmas. Em conformidade com o exposto refira-se o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 18/2011, Processo n.º204/2010, “Por sua vez, os n.ºs 3 e 4 do artigo 81.º referem-se a encargos dedutíveis como custos para efeitos de IRC, isto é, a encargos que comprovadamente foram indispensáveis à realização dos proveitos, á luz do que estabelece o artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, sendo a tributação prevista nestes preceitos explicada pela intenção legislativa de incentivar as empresas a reduzirem tanto quanto possível as despesas que afetem negativamente a receita fiscal”.
xii) Igualmente, o Acórdão do Tribunal Arbitral – Processo n.º 92/2013-T menciona que “A génese e o escopo das tributações autónomas, não levarão a outro sentido que não seja o de que competiria ao sujeito passivo, que suportou/efetuou as despesas que estão na sua origem, ser igualmente sujeito daquelas”.
xiii) Portanto, à luz do exposto, após análise dos eventos sub judice somos de parecer que os mesmos integram o conceito de despesas de representação, não apresentando características para poderem ter enquadramento na conta 6222 do Sistema de Normalização Contabilística (SNC) – Publicidade e propaganda, conforme pretende a recorrente.
xiv) Somos de opinião de que, não obstante admitir-se que os eventos em causa possuam os atributos que a ora recorrente lhes confere, isto é permitem das testemunho da atividade desenvolvida pela recorrente (produção de eletricidade de origem hídrica) dando a conhecer o seu património, facultando, ainda, uma relevante projeção mediática, a verdade é que o tipo de encargos suportados assumem a natureza de despesas de representação – “receções, refeições, viagens, passeios e espetáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades” – e não gastos em Publicidade e Propaganda – “anúncios em meios de comunicação social, campanhas publicitárias promocionais, materiais publicitários”.
xv) Relativamente ao evento “A experiência do cliente” que a ora recorrente alega tratar-se de um encontro interno de cariz comercial somos a referir que a ora recorrente não juntou ao processo documentos que demonstrassem inequivocamente essa circunstância, mantendo-se, deste modo, a correção efetuada a título de tributação autónoma.
xvi) Subscreve-se assim inteiramente o entendimento expendido em sede de procedimento inspetivo e na reclamação graciosa, segundo o qual o reconhecimento contabilístico e a correspondente dedutibilidade fiscal de gastos suportados pela recorrente que envolvam entidades terceiras caem no conceito de despesas de representação, sendo as mesmas tributadas autonomamente, à taxa de 10%, nos termos do n.º 7 do art. 88.º do Código do IRC.
xvii) Cabe ainda referir que, no caso concreto, não existe qualquer tipo de presunção legal, pois as razões da conduta da AT e o critério de decisão estão espelhadas na lei, mais especificamente na al. a) do n.º 3 e no n.º 7 do art. 88.º ambos do Código do IRC, na redação em vigor à data dos factos.
xviii) Importa, ainda, realçar que esta Direção de Serviços apenas se pode pronunciar sobre matéria e normativos legais no âmbito do IRC, razão pela qual não nos expressamos sobre a ação inspetiva, em sede de IVA, mencionada no pedido.
IV – CONCLUSÃO
Por tudo o exposto, não se vislumbrando qualquer ilegalidade no despacho recorrido, deve ser mantida a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, termos em que a presente petição não merece provimento, propondo-se, deste modo, o indeferimento do presente recurso hierárquico.»
bh) A Requerente foi notificada, através do ofício n.º…, datado de 28/10/2015, da Unidade dos Grandes Contribuintes, Divisão de Gestão e Assistência Tributária, remetido por carta registada, da decisão referida no facto provado anterior. [cf. Doc. n.º 7 anexo à P. I. e PA junto aos autos]
bi) Em 27 de janeiro de 2016, a Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo. [cf. sistema informático de gestão processual do CAAD]
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§2. FACTOS NÃO PROVADOS
Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não há factos que não se tenham provado.
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§3. MOTIVAÇÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal fundou-se nos factos articulados pelas Partes, cuja aderência à realidade não foi posta em causa, nos documentos e no processo administrativo juntos aos autos e, ainda, na prova testemunhal produzida.
Relativamente aos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela Requerente – I… [funcionário da Requerente há cerca de 10 anos, sendo responsável pela Direção de Marca, Marketing e Comunicação da Requerente (inquirido sobre a matéria de facto constante dos artigos 7 a 65 da P. I.)] e M…[funcionário da Requerente há cerca de 10 anos, sendo responsável pela Direção de Relação com Investidores da Requerente (inquirido sobre a matéria de facto vertida nos artigos 22 a 26 e 36 a 43 da P. I.)] que depuseram de forma clara, objetiva e isenta sobre os factos aos quais foram inquiridos, revelando inequívoco e detalhado conhecimento direto dos mesmos, pelo que os seus depoimentos mereceram total credibilidade –, as mesmas explicitaram e corroboraram, no essencial, a factualidade alegada pela Requerente, sobre a qual depuseram.
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III.2. DE DIREITO
No caso concreto em apreço, temos que a Requerente vem peticionar – na sequência do indeferimento, respetivamente, total e parcial de recursos hierárquicos que interpôs – a declaração de ilegalidade e a anulação parcial da liquidação de IRC n.º 2014…, referente ao exercício de 2010 e a declaração de ilegalidade e a anulação das liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios n.ºs…, …, …, … e…, referentes aos períodos de 1003, 1005, 1008, 1011 e 1012.
Como resulta da factualidade provada, temos que os factos que são postos à apreciação deste Tribunal Arbitral, seja no tocante à liquidação de IRC controvertida, seja quanto às liquidações adicionais de IVA impugnadas, são essencialmente os mesmos; efetivamente, num caso e noutro importa apreciar a factualidade atinente aos diversos eventos dinamizados pela Requerente – cf. factos provados g), i), l), p), r), v) e z) – e às despesas por ela incorridas com a aquisição de bens e serviços relativos à respetiva organização – cf. factos provados h), k), n), q), t), y) e aa).
A Requerente defende, em suma, que os eventos em causa inserem-se em ações de divulgação e promoção da sua imagem empresarial, intrinsecamente conexionados com a prossecução da sua atividade e que, sendo assim, aquelas despesas não podem ser consideradas alheias à atividade exercida, sendo que, aliás, contribuem para a sua prossecução, tendo uma fortíssima componente publicitária.
Por isso, a Requerente não vislumbra por que razão haverão as mesmas de ser consideradas como despesas de representação e, como tais, sujeitas a tributação autónoma em sede de IRC, e por que motivo haverá de ser questionado o direito à dedução do respetivo IVA.
Nesta parametria, afigura-se que o epicentro do dissenso que opõe as Partes neste processo radica na determinação da natureza das referenciadas despesas, que dependerá sobretudo do juízo que se fizer sobre o enquadramento e justificação dos mencionados eventos em face daquela que é a atividade empresarial da Requerente. A resposta a esta questão primeira e essencial condicionará o subsequente enquadramento jurídico-fiscal daquelas despesas em sede de IRC e de IVA, pois a caracterização que for feita daquelas despesas servirá depois para determinar o seu correto enquadramento em sede de IRC e de IVA, a ser feito de acordo com as normas próprias de um e de outro imposto.
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§1. DO ENQUADRAMENTO DOS EVENTOS PROMOVIDOS PELA REQUERENTE NO ÂMBITO DA RESPETIVA ATIVIDADE
Como resulta da factualidade provada, a Requerente é a sociedade dominante do Grupo B…, tem por objeto a promoção, dinamização e gestão, por forma direta ou indireta, de empreendimentos e atividades na área do setor energético, tanto a nível nacional como internacional, com vista ao incremento e aperfeiçoamento do desempenho do conjunto das sociedades do seu grupo, estando cotada no principal índice bolsista português.
O setor de atividade em que a Requerente se insere – o setor energético (eletricidade e gás) – é, consabidamente, altamente competitivo e concorrencial, tanto a nível interno, como internacional.
É facto público que a Requerente e o seu grupo estão ativa e fortemente presentes quer no mercado nacional, quer no mercado internacional, seja na prossecução do seu objeto social – internamente é o maior produtor, distribuidor e comercializador de eletricidade e, externamente, está implantada em mais de 10 países, pelo que o seu universo de clientes se cifra na casa dos milhões –, seja na captação dos recursos financeiros necessários ao desenvolvimento da sua atividade – presentemente, a Requerente é, aliás, uma sociedade comercial maioritariamente detida por acionistas estrangeiros.
À luz deste enquadramento, importa então dilucidar se os referenciados eventos promovidos pela Requerente se inserem ou não na prossecução do seu escopo societário, para o que se afigura determinante ter em consideração as respetivas especificidades e finalidades.
O evento denominado “H…”, como ficou provado, consubstanciou-se “numa reunião de trabalhadores da área comercial do Grupo B… com o objetivo de trocarem entre si experiências de relacionamento com o cliente/consumidor, uniformizando estratégias e procedimentos, visando melhorar a qualidade daqueles comerciais, o qual não envolveu a participação de quaisquer pessoas estranhas à Requerente” (facto provado g)).
Tratou-se, pois, de um evento com um particular enfoque na estratégia de relacionamento com os clientes do Grupo B… e, portanto, com um cunho marcadamente comercial, sendo evidente a sua intrínseca conexão com a prossecução da atividade da Requerente e, mais concretamente, com a promoção da sua imagem e dos seus serviços junto do público consumidor.
Como é consabido, atualmente as técnicas de manutenção e fidelização dos clientes são de fulcral importância para qualquer empresa, pois, pese embora não ser de descurar a angariação de novos clientes, é uma evidência da gestão empresarial que os clientes já conquistados são os que geram valor, quer pelo que adquirem/consomem, quer pelo “passa palavra” da sua satisfação e, por isso, são a base da atividade da empresa.
O concerto denominado “K…”, realizado pela Requerente na barragem do …, como resultou comprovado, “permitiu divulgar a atividade exercida pela Requerente e visou mitigar o efeito negativo na imagem da Requerente decorrente da construção de infraestruturas que, embora necessárias à produção de energia na barragem …, provocaram um forte impacto paisagístico” (facto provado i)). Ainda a propósito deste evento, resultou igualmente provado que, “segundo uma análise de “Communication Performance – Sponsorship” realizada pela “Z...”, aquele concerto «foi objecto de referências nos órgãos de comunicação social em 25 notícias. O espaço editorial ocupado foi avaliado em 3,9 milhões de euros. A A… foi objecto de referência em 92% da informação veiculada e o espaço mediático ocupado permitiu à marca um retorno de 1,3 milhões de euros.»” (facto provado j)).
Os factos falam por si, sem necessidade de qualquer glosa adicional, sendo meridianamente evidente que se tratou de uma relevante ação de divulgação e promoção da imagem e da marca da Requerente, com uma forte componente publicitária.
A cerimónia de apresentação pública dos resultados anuais da Requerente à comunicação social é um evento que, como ficou provado, “procura garantir que a informação disponibilizada é feita com elevados níveis de rigor e transparência” (facto provado l)), estando vocacionado “para os media nacionais e estrangeiros (nomeadamente, a W... e a Y...) e à qual costumam comparecer 30 a 40 pessoas, na sua quase totalidade jornalistas” (facto provado m)).
Para uma empresa com a dimensão da Requerente, com uma vocação multinacional e cotada em bolsa de valores, a apresentação anual dos seus resultados financeiros, para além de gerar natural expetativa junto do público em geral e, em particular, dos analistas e investidores, será um momento importante de publicitação e projeção da sua imagem e da sua marca, como, aliás, resulta evidenciado pelo reconhecimento internacional de que a Requerente foi objeto “no que respeita a procedimentos de reporte financeiro, tendo ficado classificada em primeiro lugar no “TOP 30 Global Rankings for Financial Disclosure Procedures” do “IR Global Rankings’10”” (facto provado o)).
O mesmo se diga, relativamente à inserção numa clara estratégia de comunicação e de promoção da imagem e da marca da Requerente, no tocante ao evento denominado “E…”, “realizado pela Requerente e para o qual foram convidados representantes da comunicação social portuguesa e estrangeira com o intuito de, mediante a exposição de temas relacionados com a atividade da Requerente, possibilitar a colocação de questões aos órgãos de gestão da empresa – sendo os conteúdos das entrevistas passíveis de publicação –, visando, desse modo, a promoção de uma política de total transparência e rigor na informação” (facto provado p)).
O evento designado “F…” “visou apresentar aos principais analistas e investidores os conceitos, projetos e a estratégia do Grupo B… para os anos seguintes, tendo incluído a apresentação dos resultados e estratégias inerentes à atividade da Requerente, conferindo ainda aos presentes a possibilidade de colocarem questões sobre os temas em análise” (facto provado r)), sendo, como resultou provado, “de crucial importância para a Requerente captar fundos de investidores nacionais e estrangeiros” (facto provado u)).
Também aqui os factos apontam para um evento de divulgação e promoção da atividade e, portanto, da imagem e da marca da Requerente, neste caso junto de um universo de pessoas e instituições que é essencial à prossecução da atividade da Requerente, pois permite-lhe captar os recursos financeiros de que necessita para concretizar os seus projetos empresarias.
No tocante ao “G…” quer o concurso em si mesmo – que confere à Requerente a possibilidade de futura contratação e integração de participantes nos seus quadros, permitindo-lhe assim a captação dos melhores talentos e recursos humanos (cfr. facto provado v)) –, quer a cerimónia final de encerramento e entrega de prémios aos participantes, são eventos que têm uma ampla divulgação pública, tendo sempre a marca da Requerente como “pano de fundo”, pelo que a componente publicitária está aqui forte e indubitavelmente presente.
Relativamente à participação da Requerente no certame internacional “Expo 2010 Shangai” – na qual o nosso país esteve presente, “tendo a Requerente integrado uma comitiva empresarial que ali se deslocou e marcado presença no pavilhão nacional, onde interveio numa conferência subordinada a temas relacionados com as energias renováveis, a inovação e a tecnologia no setor da energia” (facto provado z)) –, não podemos deixar de relembrar que a Requerente é uma empresa multinacional e, nessa medida, eventos como este – no qual estão presentes quase todos os países de mundo – afiguram-se de crucial importância para a Requerente promover a sua imagem e a sua marca, visando expandir e implementar a sua atividade noutros mercados, pelo que este evento deve ser considerado inserido na estratégia de comunicação e marketing da Requerente.
Em síntese conclusiva, entendemos que todos e cada um dos enunciados eventos consubstanciam ações de divulgação e promoção da imagem e da marca da Requerente, inseridas numa estratégia de comunicação e marketing intrínseca e claramente conexionada com a prossecução da sua atividade.
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§2. DO ENQUADRAMENTO JURÍDICO-FISCAL DAS DESPESAS INCORRIDAS PELA REQUERENTE COM A REALIZAÇÃO DOS EVENTOS
§2.1. EM SEDE DE IRC
§2.1.1. DAS DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO
A base de incidência do IRC encontra-se consagrada no artigo 3.º do Código do IRC1, sendo que o seu n.º 2 define o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é nos artigos 17.º e seguintes do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no seu artigo 23.º quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artigo 23.º, o qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efetuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo.
Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspetiva ampla de atividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objetiva entre a atividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito.
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respetivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.
O requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspetiva económico-empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objeto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à Administração Fiscal atuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a Administração Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respetivo escopo societário (cfr., além de outros, o acórdão do STA, de 29 de março de 2006, proferido no processo n.º 01236/05 e o acórdão do TCA Sul, de 22 de janeiro de 2015, proferido no processo n.º 05327/122).
Importa ainda salientar que é entendimento da jurisprudência e da doutrina que a Administração Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa. Um custo é indispensável quando se relacione com a atividade da empresa, sendo que os custos estranhos à atividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão atual do código – cfr. artigo 23.º, n.º 1, do Código do IRC), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica (cfr., entre outros, o acórdão do STA, de 21 de abril de 2010, proferido no processo n.º 0774/09, e o acórdão do TCA Sul, de 16 de outubro de 2014, proferido no processo n.º 6754/13).
Dito isto, atento aquele que é o epicentro do dissenso existente entre as partes, quanto ao enquadramento jurídico-fiscal das despesas incorridas pela Requerente com a realização dos sobreditos eventos, centremos agora a nossa atenção na análise das despesas de representação.
O artigo 37.º, alínea a), do Código da Contribuição Autárquica estatuía que as despesas de representação não se consideravam como custos ou perdas do exercício, sendo escrituradas a qualquer título e ainda que devidamente documentadas, na parte em que a Direção-Geral das Contribuições e Impostos as reputasse de exageradas.
Face ao regime previsto na citada norma legal, a doutrina definia as despesas de representação como aquelas que visavam custear as deslocações dos gerentes das empresas ou os seus representantes, sempre que tais deslocações fossem ao serviço das mesmas e devendo ser devidamente documentadas para serem consideradas custos pela Administração Fiscal.
O Código do IRC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, na redação originária do artigo 41.º, n.º 1, alínea g), passou a determinar que as despesas de representação não são custos fiscais, sendo escrituradas a qualquer título, na parte em que a Direção-Geral dos Impostos as repute exageradas.
Em qualquer dos normativos mencionados o “quantum” das despesas de representação não se encontrava vertido na lei e dependia da subjetividade de interpretação da Administração Fiscal. Assim, o quantitativo das despesas de representação que não era aceite fiscalmente sujeitava-se ao poder discricionário da Administração Fiscal, podendo o sujeito passivo recorrer hierarquicamente para o Ministro das Finanças, no caso de não concordar com a decisão da Direção-Geral dos Impostos.
Com a Lei n.º 39-B/94, de 27 de dezembro (LOE 1995), em vigor a partir de 1 de janeiro de 1995, o artigo 41.º, n.º 1, alínea g), do Código do IRC, passou a não considerar como custo fiscal as despesas de representação, escrituradas a qualquer título, na proporção de 20%. Com esta alteração legislativa, a quantificação em 20% da não consideração como custo fiscal das despesas de representação, o legislador visou resolver os ditos problemas subjetivos inerentes ao critério de razoabilidade a analisar pela Administração Fiscal. Ademais, o n.º 3 do citado artigo 41.º estabelecia que se consideravam despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com receções, refeições, viagens, passeios e espetáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.
Posteriormente, o artigo 41.º, n.º 5, da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de abril (LOE 2000), veio revogar, além do mais, o artigo 41.º, n.ºs 3 e 4, do Código do IRC, integrando essas despesas no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 192/90, de 9 de junho, mais estabelecendo, no seu n.º 3, que as despesas de representação são tributadas autonomamente em IRS ou IRC, consoante os casos, a uma taxa de 6,4%.
A Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro (a designada “Lei da Reforma Fiscal”), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2001, no seu artigo 6.º aditou o artigo 69.º-A ao Código do IRC, sendo que no n.º 3 deste novo preceito passam a ser tributados autonomamente, à taxa correspondente a 20% da taxa normal mais elevada, as despesas de representação.
Por último, através do Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de julho, que procedeu à renumeração dos artigos do Código do IRC, a tributação autónoma das despesas de representação passou a ser incluída no artigo 81.º, n.º 3, daquele compêndio legal, mantendo-se a taxa de tributação autónoma em 20%. Desta forma, é assegurada uma maior receita fiscal em IRC, pois que a tributação autónoma de tais despesas se caracteriza pelo facto de a empresa pagar imposto, independentemente da obtenção de lucro ou prejuízo fiscal. É que a sujeição a tributação autónoma de tais gastos implica que cada ato de despesa se considere um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em IRC no fim do respetivo exercício económico.
Atento o agora disposto no artigo 88.º, n.º 7, do Código do IRC, são consideradas “despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades”, sendo as mesmas tributadas autonomamente à taxa de 10% (n.º 3 do mesmo artigo 88.º).
A finalizar, refira-se que apenas são dedutíveis como despesas de representação os custos devidamente documentados e escriturados, assim devendo satisfazer o requisito de indispensabilidade previsto no já citado artigo 23.º do Código do IRC, para que sejam como tal considerados.
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§2.1.2. DO CASO CONCRETO
Revertendo ao caso dos autos, importa começar por realçar que, tal como a própria AT expressamente reconhece, não se «coloca minimamente em causa o contexto em que os encargos em discussão (…) foram incorridos, dando por adquirido que os mesmos estão directamente relacionados com o exercício da actividade da Requerente».
Por conseguinte, a questão a dilucidar é, tão somente, a de saber se a liquidação de IRC controvertida padece ou não do vício invalidante de erro na qualificação das mencionadas despesas suportadas pela Requerente como despesas de representação e, portanto, se devem as mesmas estar ou não sujeitas a tributação autónoma, nos termos do artigo 88.º, n.º 3, do Código do IRC.
Atento o que acima dissemos sobre o enquadramento dos eventos promovidos pela Requerente no âmbito da respetiva atividade empresarial, julgamos que se afigura incontroverso, sem necessidade de maiores desenvolvimentos – que, certamente, pecariam por redundantes –, afirmar que nos encontramos perante despesas que se destinam, não a representar a Requerente onde esta não se encontra presente – portanto, fora da sua atividade principal (core business) –, mas a assegurar o desenvolvimento do seu objeto social, dentro do circuito económico onde este naturalmente se manifesta, o qual extravasa o mercado nacional (recorde-se que estamos na presença de um player no mercado internacional de energia).
Nesta parametria, não estamos perante despesas de representação, mas antes perante custos inerentes ao normal desenvolvimento da atividade da Requerente, com fins manifestamente promocionais da imagem e da marca da Requerente, os quais relevam como custo, para efeitos do disposto no artigo 23.º, n.º 1, do Código do IRC – ainda que apenas de forma mediata os mesmos conduzam à obtenção de ganhos ou à manutenção da fonte produtora –, não estando, pois, sujeitos a tributação autónoma.
Por consequência, o ato de liquidação de IRC controvertido padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, consubstanciada na errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 88.º, n.ºs 3, alínea a), e 7, do Código do IRC, o que importa a respetiva anulação.
O ato de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2015… e o ato de indeferimento do recurso hierárquico n.º …2015… padecem do mesmo vício invalidante, pelo que a final também serão anulados.
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§2.2. EM SEDE DE IVA
§2.2.1. DO DIREITO À DEDUÇÃO DO IVA
O direito à dedução do IVA constitui um alicerce central do sistema comum do IVA e visa libertar os sujeitos passivos do encargo do imposto no âmbito das suas atividades económicas, de modo a garantir a neutralidade fiscal quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as mencionadas atividades estarem, elas mesmas, sujeitas ao IVA.
Como refere Sérgio Vasques3, “[o] princípio da neutralidade em que assenta o IVA só se concretiza quando os sujeitos passivos se desoneram da carga do imposto, subtraindo o IVA incorrido nos seus inputs ao IVA que liquidam nos outputs.”
O direito à dedução está positivado, entre nós, no artigo 19.º do Código do IVA4, do qual decorre, no que aqui importa considerar, o seguinte:
Artigo 19.º
Direito à dedução
1. Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram:
a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos;
(…)
2. Só confere direito a dedução o imposto mencionado nos seguintes documentos, em nome a na posse do sujeito passivo:
a) Em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal;
(…)
O subsequente artigo 20.º elenca aquelas que são as operações que conferem o direito à dedução, estatuindo o seguinte, com pertinência para o caso concreto:
Artigo 20.º
Operações que conferem o direito à dedução
1. Só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes:
a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.
(…)
O direito à dedução não pode, em princípio, ser limitado, ressalvadas as exceções consignadas na Diretiva IVA (Diretiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006) – designadamente nos artigos 176.º e 177.º, com correspondência parcial no artigo 21.º do Código do IVA – e é exercido imediatamente relativamente à totalidade do imposto que incidiu sobre as operações efetuadas a montante, abrangendo atividades preparatórias5.
O citado artigo 21.º do Código do IVA estabelece o seguinte, no que importa para o caso concreto:
Artigo 21.º
Exclusões do direito à dedução
1. Exclui-se, todavia, do direito à dedução o imposto contido nas seguintes despesas:
(…)
d) Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções;
(…)
2. Não se verifica, contudo, a exclusão do direito à dedução nos seguintes casos:
(…)
d) Despesas mencionadas nas alíneas c) e d), com excepção de tabacos, ambas do número anterior, efectuadas para as necessidades directas dos participantes, relativas à organização de congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares, quando resultem de contratos celebrados directamente com o prestador de serviços ou através de entidades legalmente habilitadas para o efeito e comprovadamente contribuam para a realização de operações tributáveis, cujo imposto é dedutível na proporção de 50%;
(…)
Como bem se afirma no acórdão arbitral proferido no processo n.º 238/2013-T do CAAD6, “[a]s normas relativas ao direito à dedução de IVA têm como efeito o afastamento da incidência do imposto, pelo que se reconduzem a normas de delimitação negativa de incidência” e, por isso, deve aplicar-se o regime do “artigo 73.º da LGT às presunções nelas contidas”.
Ainda segundo a mesma decisão arbitral, “subjacentes às situações de afastamento do direito à dedução estarão presunções de que as despesas indicadas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 21.º não têm total ou parcialmente relação exclusiva com a atividade produtiva das empresas sujeita a IVA, pois essa é a única justificação aceitável para o afastamento da dedutibilidade deste imposto, que, como imposto sobre o consumo, se pretende que seja neutro para os intermediários no circuito económico.”
No caso do artigo 21.º do Código do IVA estamos, pois, inequivocamente, perante uma norma antiabuso em sede de IVA, a qual visa prevenir a dedução do IVA em despesas que seriam facilmente desviáveis para consumos não empresariais, motivo pelo qual o legislador optou, com algumas exceções, por excluir o direito à dedução do IVA incorrido nas mesmas.
O artigo 73.º da LGT estabelece que “as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”.
Nesta parametria, desde já podemos adiantar que não tem a Requerida qualquer razão quando diz que o artigo 21.º do Código do IVA não contém qualquer presunção legal, procedendo apenas «ao enquadramento jurídico-tributário de factos conhecidos», e, uma vez que «nada presume a partir de factos conhecidos, não se pode ilidir a presunção de factos desconhecidos como a Requerente pretende, não havendo lugar ao disposto no art. 73.º da LGT».
A aplicação da citada alínea d) do n.º 2 deste artigo 21.º depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: (i) que sejam despesas previstas nas alíneas c) e d) do n.º 1, com exceção dos tabacos, (ii) incorridas para as necessidades diretas dos participantes, (iii) relativas a congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares, (iv) quando resultem de contratos celebrados diretamente com o prestador de serviços ou através de entidades legalmente equiparadas para o efeito.
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§2.2.2. DO CASO CONCRETO
No caso sub judice, a exclusão do direito à dedução que originou as liquidações adicionais de IVA controvertidas, respeita ao imposto incorrido nos seguintes eventos promovidos pela Requerente: “C…” (vide factos provados i) a k)) “D…” (vide factos provados l) a n)), “E…” (vide factos provados p) a q)), “F…” (vide factos provados r) a u)) e “G…” (vide factos provados v) a y)).
Atento o acima exposto relativamente ao enquadramento dos eventos promovidos pela Requerente no âmbito da respetiva atividade, resulta inequívoco, sem necessidade de maiores considerações, que os concretos eventos aqui em causa têm uma enorme potencialidade de divulgação, promoção e projeção da imagem e da marca da Requerente, aquém e além fronteiras e junto de inúmeros públicos (investidores, banca, meios de comunicação social, consumidores, estudantes universitários, …), e, nessa medida, para além de terem uma óbvia componente publicitária, enquadram-se na prossecução do escopo empresarial da Requerente.
Nesta parametria, deve considerar-se ilidida a presunção que justifica o afastamento da dedutibilidade do IVA quanto às despesas atinentes a tais eventos, sendo ainda que não se verificam aqui os pressupostos de que depende a aplicação da alínea d) do n.º 2 do artigo 21.º do Código do IVA (desde logo, que as despesas incorridas visassem a satisfação direta das necessidades dos participantes naqueles eventos).
Considerando-se ilidida a presunção contida na alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA, resulta ter a Requerente direito a deduzir a totalidade do IVA relativo às mencionadas despesas.
Consequentemente, os atos de liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios controvertidos padecem de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, consubstanciada na errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 20.º, n.º 1, al. a), e 21.º, n.ºs 1, al. d), e 2, al. d), ambos do Código do IVA, e no artigo 73.º da LGT, o que importa a respetiva anulação.
O mesmo vício invalidante fulmina o ato de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2014… e o ato de indeferimento parcial do recurso hierárquico n.º …2015…, os quais também serão a final anulados.
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§3. DO REEMBOLSO DAS QUANTIAS PAGAS E DO PAGAMENTO DE JUROS INDEMNIZATÓRIOS
A Requerente peticiona, ainda, a condenação da AT ao reembolso do imposto e dos juros compensatórios indevidamente pagos, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios.
O artigo 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT preceitua que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, restabelecer a situação que existiria adotando os atos e operações necessários para o efeito, o que se deve entender, em conformidade com o disposto no artigo 100.º da LGT, aplicável ex vi alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, como abrangendo o pagamento de juros indemnizatórios, em consonância, aliás, com o disposto no n.º 5 do mesmo artigo 24.º do RJAT.
O artigo 43.º, n.º 1, da LGT determina que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”, estatuindo o n.º 5 do artigo 61.º do CPPT que os “juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos”.
No caso concreto, como decorre do acima exposto e sem necessidade de maiores considerações, verifica-se que a ilegalidade das liquidações controvertidas, por erro nos pressupostos de facto e de direito, é inteiramente imputável à AT, pelo que a Requerente tem direito, em conformidade com o disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, ao reembolso dos valores de imposto e de juros compensatórios indevidamente pagos, cujo somatório dos respetivos valores unitários ascende ao montante total de € 40.599,45 (€ 25.385,51 referentes a tributação autónoma, em sede de IRC; € 14.954,23 referentes a IVA; e € 259,71 respeitantes a juros compensatórios), e a juros indemnizatórios, nos termos do estatuído nos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT, calculados desde as datas dos pagamentos, à taxa resultante do n.º 4 do artigo 43.º da LGT, até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos.
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IV. DECISÃO
Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente, por vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, consubstanciada na errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 88.º, n.ºs 3, al. a), e 7, do Código do IRC, nos artigos 20.º, n.º 1, al. a), e 21.º, n.ºs 1, al. d), e 2, al. d), ambos do Código do IVA e no artigo 73.º da LGT:
- declarar parcialmente ilegal a liquidação de IRC n.º 2014…, referente ao exercício de 2010, e anulá-la na parte referente às tributações autónomas incidentes sobre as mencionadas despesas atinentes aos referidos eventos organizados pela Requerente, no montante total de € 25.385,51;
- declarar ilegais e anular:
(i) a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1003, no montante de € 142,00;
(ii) a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1005, no montante de € 9.971,50;
(iii) a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1011, no montante de € 14.997,12;
(iv) a liquidação adicional de IVA n.º…, referente ao período de 1012, no montante de € 22.212,25; e
(v) a liquidação de juros compensatórios n.º…, referentes ao período de 1008, no montante de € 259,71.
- declarar ilegal o ato de indeferimento do recurso hierárquico n.º …2015…, com a sua consequente anulação;
- declarar ilegal o ato de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2015…, com a sua consequente anulação;
- declarar ilegal o ato de indeferimento parcial do recurso hierárquico n.º …2015…, com a sua consequente anulação;
- declarar ilegal o ato de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2014…, com a sua consequente anulação;
b) Julgar procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar à Requerente os valores de imposto e de juros compensatórios indevidamente pagos, no montante total de € 40.599,45 (€ 25.385,51 referentes a tributação autónoma, em sede de IRC; € 14.954,23 referentes a IVA; e € 259,71 respeitantes a juros compensatórios), acrescido de juros indemnizatórios calculados, à taxa legal, desde as datas dos pagamentos até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos;
c) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento das custas do processo.
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VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto nos arts. 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de € 40.599,45 (quarenta mil quinhentos e noventa e nove euros e quarenta e cinco cêntimos).
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CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, o montante das custas é fixado em € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
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Lisboa, 29 de setembro de 2016.
O Árbitro,
(Ricardo Rodrigues Pereira)