Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 10/2016-T
Data da decisão: 2016-05-11  Selo  
Valor do pedido: € 15.657,33
Tema: IS - Verba 28.1 TGIS; propriedade vertical.
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DECISÃO ARBITRAL

1.    RELATÓRIO

A HERANÇA INDIVISA ABERTA POR ÓBITO DE A..., sujeito passivo com o NIF..., representada por B..., NIF..., residente na ..., ...–..., ...-..., Lisboa, na qualidade de cabeça de casal (doravante designada por Requerente), vem, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, com a intervenção de árbitro singular, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), tendo em vista a declaração de ilegalidade e consequente anulação das liquidações de Imposto do Selo (Verba 28.1, da TGIS) do ano de 2014, referentes às divisões de utilização independente destinadas a habitação, do prédio urbano sito na ..., n.ºs ... a..., inscrito na matriz sob o artigo ... da freguesia de ..., em Lisboa, no valor global de € 5 192,07, assim como a restituição dos valores pagos.

 

A Requerente invoca, em síntese, os seguintes fundamentos:

a.    O valor patrimonial (VPT) total do imóvel é de € 1 830 063,81, correspondente ao somatório dos VPT dos vários andares com utilização independente;

b.    A AT liquidou Imposto do Selo (IS) sobre os andares ou divisões de utilização independente com afetação habitacional (cave, sótão, 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 5.º andares), cujos valores patrimoniais tributários somam a quantia de € 1 565 733,81;

c.    A verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) determina a sujeição àquele imposto, à taxa de 1%, da propriedade de prédios urbanos afetos a habitação, de VPT igual ou superior a € 1 000 000,00;

d.   Importa saber se, para aplicação da taxa de 1%, prevista na verba 28.1, da TGIS, o VPT do prédio corresponde ao somatório das várias divisões de utilização independente, como entende a AT, ou se apenas ao valor de cada uma daquelas divisões;

e.    É entendimento da Requerente que se deverá atender ao VPT atribuído a cada uma das divisões de utilização independente, uma vez que, no segmento final da verba 28, da TGIS, consta expressamente que se atende ao VPT utilizado para efeitos de IMI;

f.     Ora, no caso dos autos, não tendo nenhuma das divisões de utilização independente um VPT igual ou superior a € 1 000 000,00, não é devido o Imposto do Selo liquidado;

g.    O artigo 12.º, n.º 3, do CIMI, aplicável ex vi do artigo 67.º, n.º 2, do CIS, determina que cada andar ou parte de utilização independente do prédio não constituído em propriedade horizontal, é considerado separadamente na matriz, a qual também discrimina o respetivo VPT;

h.    Deste modo, entende a Requerente que a matéria coletável, para efeitos da verba 28, da TGIS é o VPT de cada divisão de utilização independente, utilizado para efeitos de IMI.

Termina a Requerente por pedir que seja decretada a anulação das liquidações de Imposto do Selo que lhe foram notificadas, assim como a restituição dos valores pagos.

Notificada nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17.º, do RJAT, a AT apresentou resposta, defendendo, por impugnação, que os atos de liquidação objeto do presente pedido de pronúncia arbitral devem ser mantidos, o que faz com os seguintes fundamentos:

a.     “A sujeição ao imposto de selo da verba 28.1. da Tabela Geral anexa ao CIS resulta da conjugação de dois factos, a saber: a afectação habitacional e o valor patrimonial de cada prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00”;

b.    A AT entende que se o edifício for constituído em propriedade total, com partes suscetíveis de utilização independente, integra uma única unidade e o seu VPT é determinado pela soma das partes com afetação habitacional;

c.     O n.º 4 do artigo 2.º, do CIMI, ressalva as frações autónomas dos prédios constituídos em propriedade horizontal, que excecionalmente considera como prédios, o que não acontece com as partes de utilização independente dos prédios em propriedade total, em que releva o prédio no seu todo;

d.    No entanto, a tal não obsta a separação na matriz e a atribuição de VPT diferenciado para os andares ou divisões de utilização independente (artigo 12.º, n.º 3, do Código do IMI), justificada para relevar a autonomia da utilização de cada uma delas e o facto de estarem ou não arrendadas, determinante face às regras de avaliação fiscal no âmbito do Código do IMI;

e.     A propriedade horizontal e a propriedade total são institutos jurídicos distintos, que merecem, segundo a AT, um tratamento fiscal diferenciado; do mesmo modo se conclui que a ora Requerente, para efeitos de IMI e de Imposto do Selo, não é proprietária de frações autónomas, mas sim de um único prédio;

f.     Não se reconhece, por isso, qualquer erro nos pressupostos de facto ou de direito na emissão dos atos tributários de liquidação do imposto impugnado, que não violou qualquer norma legal (ou constitucional), devendo ser mantidos;

g.    Conforme decidiu o Tribunal Constitucional (Acórdão de 11 de novembro de 2015, no processo n.º 542/2014), “(…) Não julga inconstitucional a norma da verba 28. e 28.1da tabela Geral do imposto de Selo, aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/20121, de 29 de Outubro, na medida em que impõe a tributação igual sobre a propriedade de prédios urbanos com afectação habitacional, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000,000,00”;

 

Termina a AT pedindo a dispensa da reunião a que se refere o artigo 18.º, do RJAT, assim como de alegações escritas, dado que a matéria em litígio é exclusivamente de direito e se encontra amplamente exposta nas peças processuais.

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral deu entrada no CAAD em 13 de janeiro de 2016, tendo sido aceite pelo Exm.º Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 28 de janeiro de 2016.

A Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º, do RJAT, foi a signatária nomeada árbitro pelo Exm.º Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, encargo que aceitou no prazo legalmente previsto, sem oposição das Partes.

O Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 29 de março de 2016 e é materialmente competente para apreciar e decidir o litígio objeto dos presentes autos.

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

Por despacho de 6 de abril de 2016, na sequência da resposta transmitida pela AT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o artigo 18.º, do RJAT; porém, subsistindo dúvidas sobre a identificação dos atos impugnados – se as liquidações de Imposto do Selo de 2014, se apenas a terceira prestação de cada uma daquelas liquidações, foi determinado o prosseguimento do processo com alegações escritas sucessivas pelo prazo de 10 dias, com início na Requerente, convidando-se esta a, no mesmo prazo, clarificar o objeto dos autos.

Por requerimento de 19 de abril de 2016, veio a Requerente solicitar a ampliação do pedido, assim como a correção do valor da causa, esclarecendo que aquele se reporta à anulação das liquidações de Imposto do Selo (verba 28.1, da TGIS) do ano de 2014, referentes ao prédio identificado na petição inicial e juntando cópias das notas de cobrança referentes às 1.ª e 2.ª prestações das mesmas liquidações.

Notificada para se pronunciar sobre o requerimento mencionado no parágrafo precedente, a AT apresentou alegações finais em que reiterou a posição jurídica assumida em sede de resposta, pugnando pela manutenção dos atos impugnados e consequente absolvição do pedido, sem que se tenha pronunciado sobre o teor do requerimento da Requerente.

 

2.    MATÉRIA DE FACTO

2.1. Factos que se consideram provados:

2.1.1. Quer à data da produção do facto tributário (31 de dezembro de 2014), quer à data do pedido de constituição do tribunal arbitral, a Requerente era proprietária do prédio urbano inscrito sob o artigo ...  da freguesia de..., concelho de Lisboa, correspondente ao anterior artigo ... da extinta freguesia de ..., constituído por 8 andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, com o valor patrimonial total de € 1 830 063,81, sendo 7 dos referidos andares, de afetação habitacional;

2.1.2. O somatório dos VPT atribuídos aos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente e afetação habitacional é da quantia de € 1 565 733,81, sendo esse o valor indicado em cada uma das notas de cobrança como “Valor Patrimonial do prédio – total sujeito a imposto”;

2.1.3. O VPT atribuído a cada andar ou divisão suscetível de arrendamento separado e afetação habitacional, tal como consta das notas de cobrança emitidas, varia entre € 159 561,13 e € 240 410,20;

2.1.4. Em nome da Requerente foram emitidas, em 20 de março de 2015, para pagamento voluntário em três prestações anuais, as liquidações de Imposto do Selo do ano de 2014, cujas primeiras prestações constam das notas de cobrança identificadas no quadro que segue, tendo por base o VPT de cada uma das divisões suscetíveis de utilização independente e a taxa de 1%:

Identificação do Documento

Identificação do Prédio

VPT

Coleta

2015 ...

...– U –...– C/V

€ 205 604,30

€ 2 056,04

2015 ...

...– U –...– 1.º

€ 240 410,20

€ 2 404,10

2015 ...

...– U –...– 2.º

€ 240 410,20

€ 2 404,10

2015 ...

...– U –...– 3.º

€ 240 410,20

€ 2 404,10

2015 ...

...– U –...– 4.º

€ 240 410,20

€ 2 404,10

2015 ...

...– U –...– 5.º

€ 238 927,58

€ 2 389,28

2015 ...

...– U –...– SOT

€ 159 561,13

€ 1 595,61

 

2.2. Fundamentação da matéria de facto provada:

A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto dada como provada resultou da análise da prova documental junta ao pedido de pronúncia arbitral (cópias das notas de cobrança de cada uma das prestações em que se subdividiram as liquidações impugnadas, da caderneta predial e da certidão do registo predial), não contestada pela Requerida.

 

2.3. Factos não provados

Não existem factos relevantes para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.

 

3.        MATÉRIA DE DIREITO – FUNDAMENTAÇÃO

3.1.   Questão prévia: da ampliação do pedido

O pedido ou pretensão, que corresponde ao efeito jurídico pretendido pelo impugnante, deve ser formulado na petição inicial, em que se identifique o ato cuja anulação se peticiona, se indiquem os factos que fundamentam o pedido, assim como os vícios que determinem a anulação do ato impugnado, requisitos que, quanto ao processo arbitral tributário, se encontram elencados no n.º 2 do artigo 10.º, do RJAT.

Na impugnação judicial não há, em regra, lugar à ampliação do pedido (princípio da estabilidade da instância), fora dos casos previstos no artigo 63.º, do CPTA e no n.º 2 do artigo 265.º, do CPC, subsidiariamente aplicáveis ao processo arbitral tributário, nos termos do artigo 29.º, n.º 1, alíneas c) e e), respetivamente, ou seja, com fundamento em factos supervenientes, devendo ter lugar até ao termo da discussão da causa em primeira instância.

Tal não impede porém que, exceto nos casos de ineptidão da petição inicial, o impugnante seja convidado a suprir, no prazo que se designar, qualquer deficiência ou irregularidade (artigo 110.º, n.º 2, do CPPT, de aplicação subsidiária, ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT), desde que, naturalmente, seja dada à contraparte a oportunidade de exercício do contraditório.

No caso dos autos, o pedido inicial não continha a identificação inequívoca dos atos impugnados; no entanto a AT apresentou contestação na qual defendeu, por impugnação, a legalidade das liquidações do Imposto do Selo do ano de 2014, não tendo suscitado qualquer exceção que obstasse ao conhecimento do mérito da causa.

Admite a Requerente ter-se reportado, na petição inicial, à terceira prestação das liquidações de Imposto do Selo de 2014, cujo prazo de pagamento voluntário decorreu em novembro de 2015, pelo que veio requerer a ampliação do pedido, de modo a abranger as três prestações em que aquela liquidação se subdividiu, atribuindo à causa o valor económico de € 15 630,33.

O requerimento contendo ampliação do pedido e do valor da causa foi objeto de notificação à Requerida, que sobre o mesmo se não pronunciou, não obstante tivesse produzido alegações escritas, nas quais reiterou a posição assumida em sede de contestação.

Devendo considerar-se sanada a irregularidade da petição inicial, nada obsta à prolação de decisão de mérito.

 

3.2.   Do mérito das liquidações de Imposto do Selo /verba 28.1, da TGIS, impugnadas:

A principal questão trazida aos autos pela Requerente é a de saber se a sujeição a Imposto do Selo, nos termos da verba n.º 28, da TGIS, de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, é determinada pelo Valor Patrimonial Tributário (VPT) que corresponde a cada uma das partes do prédio, com afetação habitacional, ou se é determinada pelo VPT global do prédio, o qual corresponderia ao somatório dos VPT de todos os andares ou divisões de utilização independente e com afetação habitacional que o compõem, conforme a interpretação dada pela AT à norma de incidência.

Cumpre apreciar e decidir.

A verba 28, da TGIS, aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro estabelece, na sua redação atual, em vigor à data da produção do facto tributário, a sujeição a Imposto do Selo das seguintes situações:

«28 — Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000 — sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 — Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI (Redação da Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro);

28.2 — Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças — 7,5 %.»

 

Constituem, assim, requisitos cumulativos de aplicação da norma de incidência contida na verba 28.1, da TGIS, que o imóvel a tributar seja um prédio urbano destinado a habitação (ou um terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação), cujo valor patrimonial tributário, para efeito de IMI, seja igual ou superior a € 1 000 000,00.

O conceito de prédio urbano habitacional não se encontra definido no Código do Imposto do Selo, mas antes nas normas do Código do IMI, para cuja aplicação subsidiária remete, em bloco, o n.º 2 do artigo 67.º, do Código do Imposto do Selo, aditado pela mesma Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, ao estatuir que “2 - Às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI.”

 

Efetivamente, o artigo 6.º, do Código do IMI, inserido no Capítulo I, sob a epígrafe “Incidência”, classifica os prédios urbanos como sendo: a) Habitacionais; b) Comerciais, industriais ou para serviços; c) Terrenos para construção; d) Outros, delimitando os n.ºs 2, 3 e 4, do mesmo artigo, o que deve entender-se por cada uma daquelas designações.

Assim, são habitacionais os prédios urbanos que, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º, do Código do IMI, sejam edifícios ou construções licenciados para habitação ou que, na falta de licença, tenham como destino normal a habitação (fins habitacionais).

Todavia, a lei não exclui que possa haver prédios urbanos como mais do que uma afetação (nomeadamente a afetação a habitação e a comércio, indústria ou serviços), como acontece, frequentemente, no caso dos prédios urbanos não constituídos sob o regime da propriedade horizontal, como é o caso do prédio de que a Requerente é proprietária, que integra oito andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, uma delas destinada a serviços e, as restantes sete, destinadas a habitação.

É a essa realidade de afetação mista que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 7.º, do Código do IMI, ao dispor que,

2 - O valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das classificações do n.º 1 do artigo anterior determina-se:

a)(…);

b) Caso as diferentes partes sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes.

Assim, se, de acordo com a alínea b) do n.º 2 do artigo 7.º, do Código do IMI, o prédio não constituído em propriedade horizontal integrar andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, com mais do que uma das classificações a que se refere o n.º 1 do artigo 6.º, do mesmo Código, o seu valor (patrimonial tributário) será equivalente à soma dos valores das partes, avaliadas por aplicação das correspondentes regras, tendo em conta, nomeadamente, o coeficiente de afetação previsto no artigo 41.º, do Código citado.

No entanto, se o valor (patrimonial tributário) global do prédio urbano em propriedade total releva, por exemplo, para efeito de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transações Onerosas de Imóveis (cfr. o artigo 12.º, do Código do IMT) ou de Imposto do Selo nas transmissões gratuitas (cfr. o artigo 13.º, do Código do Imposto do Selo), por não ser possível a transmissão autónoma de cada uma das partes de utilização independente, já assim não acontece no que respeita ao IMI e ao Imposto do Selo da Verba 28.1, da TGIS.

De facto, para além do n.º 2 do artigo 7.º, do Código do IMI, outras normas do mesmo Código se referem aos prédios urbanos em propriedade total ou vertical, de que se destacam o artigo 12.º, n.º 3 (“3 - Cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário”) e o artigo 119.º, n.º 1 (“1 - Os serviços da Direcção-Geral dos Impostos enviam a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, o competente documento de cobrança, com discriminação dos prédios, suas partes suscetíveis de utilização independente, respetivo valor patrimonial tributário e da coleta imputada a cada município da localização dos prédios”).

Da conjugação das normas antes referidas se extrai a conclusão de que, no caso dos prédios não constituídos em propriedade horizontal, o valor patrimonial tributário relevante para efeito de IMI e, consequentemente, para efeito da incidência do Imposto do Selo, da verba 28, da TGIS, é o valor patrimonial tributário atribuído a cada andar ou divisão suscetível de utilização independente e não o seu valor patrimonial tributário (global).

 

Por outro lado, tratando-se de um prédio com afetação mista, composto por divisões ou andares destinados a habitação e, pelo menos uma delas, destinada a serviços, não poderá ser classificado como prédio habitacional, ou cujo destino seja, em exclusivo, a habitação, não se afigurando que os andares ou divisões afetos a habitação que o compõem, possam ser segregados do todo, para, no seu conjunto, integrarem a noção de prédio de afetação habitacional prevista na norma de incidência da verba 28.1, da TGIS.

Efetivamente, utilizando a norma da verba 28.1, da TGIS, a expressão “prédio habitacional”, não se afigura legítimo que AT nela pretenda incluir os andares ou divisões de utilização independente de prédios urbanos não constituídos em propriedade horizontal que, como a própria AT reconhece, não são prédios, não podendo, por isso, integrar a previsão da norma.

Não se afigurando ser essa a intenção legislativa, não se poderá aceitar que a AT formule uma norma de incidência ex novo, diversa da que foi criada pelo legislador, pretendendo tributar partes de prédios, ainda que económica e funcionalmente independentes e, como tal, separadamente inscritas na matriz, pois a lei é clara ao sujeitar a imposto de selo da verba 28.1, da TGIS, os prédios urbanos de afetação habitacional, cujo VPT, para efeitos de IMI, seja superior a € 1 000 000,00.

Pelos motivos que antecedem, tendo-se por verificado o vício de violação de lei, por erro na aplicação do direito, decorrente da errada interpretação das normas previstas na verba n.º 28.1, da TGIS e nos artigos 6.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, 7.º, n.º 2, alínea b), 12.º, n.º 3 e 119.º, n.º 1, do Código do IMI, aplicáveis ex vi do artigo 67.º, n.º 2, do Código do IS, não poderão as liquidações impugnadas manter-se na ordem jurídica.

 

4.        DECISÃO

Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados e, nos termos do artigo 2º do RJAT, decide-se em, julgando inteiramente procedente o presente pedido de pronúncia arbitral:

4.1.Declarar a ilegalidade das liquidações de Imposto do Selo impugnadas, por erro nos pressupostos de direito, determinando a sua anulação;

4.2.Condenar a AT à restituição das quantias indevidamente pagas pela Requerente a título de Imposto do Selo de 2014.

 

VALOR DO PROCESSO: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 15 657,33 (quinze mil, seiscentos e cinquenta e sete euros e trinta e três cêntimos), equivalente ao valor global das liquidações impugnadas.

 

CUSTAS: Calculadas de acordo com o artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 918,00 (novecentos e dezoito euros), a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 11 de maio de 2016.

O Árbitro,

 

/Mariana Vargas/

 

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do DL 10/2011, de 20 de janeiro.

A redação da presente decisão rege-se pelo acordo ortográfico de 1990.