Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 462/2015-T
Data da decisão: 2016-04-05  IRS  
Valor do pedido: € 12.880,30
Tema: IRS - Residência fiscal; CDT Portugal/Espanha e Convenção Modelo OCDE (artigo 15º)
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Decisão Arbitral

 

 

I – Relatório

 

1. No dia 21 de Julho de 2015, A…, com o NIF número … e domicílio na Travessa…, nº…, Apartamento…, …, Maia, veio, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), requerer a constituição de tribunal arbitral com vista à anulação do acto de liquidação identificado com o número 2015…, relativamente ao exercício de 2014, respeitante ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, no montante global de € 12.880,30 (doze mil, oitocentos e oitenta euros e trinta cêntimos). Juntou, para além da procuração forense e comprovativo de pagamento de taxa inicial, 9 documentos.

2. No Pedido de pronúncia arbitral, o Requerente optou por não designar árbitro tendo sido por decisão do Presidente do Conselho Deontológico, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, designada como árbitro único a signatária, que aceitou o encargo no prazo legalmente estipulado.

3. O tribunal arbitral ficou constituído em 5 de Outubro de 2015.

4. A Administração Tributária e Aduaneira (AT ou Requerida) enviou, em 10 de Novembro de 2015, a sua Resposta assim como o processo administrativo (PA).

5. Notificadas as Partes de despacho arbitral para se pronunciarem acerca da dispensabilidade da reunião do artigo 18º do RJAT e de alegações escritas, o Requerente veio, em 28 de Dezembro de 2015, assentir na dispensa de reunião e até de alegações escritas na condição de ser aceite a junção de mais quatro documentos aos autos, pelo que o tribunal, aceitando os documentos, mandou notificar a Requerida para se pronunciar, marcando desde logo prazo para eventuais alegações.

6. Após concordância da Requerida com a dispensa da reunião do art. 18º do RJAT, foram apresentadas alegações escritas, sucessivas (em 9 e 17 de Fevereiro de 2016, respectivamente) e o tribunal indicou que proferiria decisão no dia 5 de Abril de 2016. 

 

7. O Pedido de Pronúncia

No Pedido inicial, o Requerente sustenta, em síntese:

-          Durante anos não residiu habitualmente em Portugal mas em Espanha, onde exerceu a sua actividade profissional e foi tributado enquanto residente ao abrigo do “Régimen Especial aplicable a los trabalhadores desplazados a território Espanhol”, tendo, em Setembro de 2014, regressado a Portugal para aí ocupar um posto de trabalho e auferir rendimentos, tendo, nessa altura, passado a ter como morada principal a residência indicada no Pedido e deixado de residir em Espanha.

-          Por lapso, não deu então conhecimento do seu regresso à Autoridade Tributária e Aduaneira, só o tendo feito posteriormente, com efeitos retroactivos a Setembro de 2014, tendo também requerido a correcção dos registos em Espanha.

-          Entregou em Portugal a sua declaração de IRS relativa a 2014 na qualidade de residente mas a AT efectuou a liquidação de imposto sem aplicar o disposto no Acordo entre Portugal e Espanha para Evitar a Dupla Tributação, nomeadamente o respectivo artigo 15º, à situação declarada de rendimentos de trabalho dependente tributados em Espanha, enquanto aí residente nos termos do regime mencionado, e de rendimentos do trabalho dependente em Portugal após o seu regresso em Setembro de 2014.

-          É que o Requerente foi enquadrado como residente fiscal em Espanha no período entre Janeiro e Setembro de 2014, existindo uma sobreposição entre a residência fiscal portuguesa e espanhola.

-          Enquanto a Espanha aplica à extensão temporal da residência um critério fraccionado, em Portugal aplicava-se um critério anual, verificando-se um caso de verdadeira dupla tributação internacional: há identidade do objecto (o mesmo rendimento auferido em função do trabalho), identidade do sujeito (o Requerente), identidade do período (entre Janeiro e Setembro de 2014) e identidade de imposto (IRS e IRPF, impostos incidente sobre os rendimentos auferidos por uma pessoa singular).

-          Nos termos da Convenção entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha, aprovada pela resolução nº 6/95 da AR, tendo em conta o princípio da territorialidade que marca a conexão pela fonte, resulta que o Estado onde o sujeito passivo reside é o competente para tributar os rendimentos por este auferidos, independentemente da sua origem.

-          E resulta do art. 15º, nº 1, da Convenção que os rendimentos obtidos no exercício de profissões dependentes são tributados exclusivamente no Estado da residência, sendo que o nº 2 especifica uma situação excepcional ao estipular que, não obstante o disposto no nº 1, as remunerações obtidas por um residente de um Estado contratante de um emprego exercido noutro Estado só podem ser tributadas no Estado primeiramente mencionado se o beneficiário permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que no ano civil em causa não excedam 183 dias.

-          Como, neste caso, estão em causa as remunerações obtidas de um emprego exercido noutro Estado, onde permaneceu durante um período superior a 183 dias, esses rendimentos não podem ser tributados em Portugal.

-          Assim, os rendimentos auferidos em Espanha no período de Janeiro a Setembro, não podem ser tributados em Portugal de acordo com o nº 2 do art. 15º da Convenção não havendo que aplicar a alínea a) do nº 1 do art. 24º da Convenção, disposição que só seria aplicável se os rendimentos pudessem ser tributados em Portugal, para eliminar a dupla tributação.

-          O emprego foi exercido exclusivamente em Espanha pelo que Portugal não tem competência para a tributação do rendimento em causa, auferido entre Janeiro e Setembro de 2014.

-          Porque o valor da lei interna cede perante o valor das convenções internacionais (art. 8º, nº 2, da CRP) a proposta de liquidação viola a Convenção, devendo ser anulada.

 

8. A Resposta

A Requerida responde, em síntese:

-          Segundo o Código do IRS, em 2014, os rendimentos auferidos estão sujeitos a imposto pelo seu valor anual (art. 1º e 2º do CIRS, incidência real), desde que o seu titular seja residente em território português ou, não o sendo, aqueles rendimentos devam ser considerados obtidos em território português (art. 13º, nº 1 do CIRS), sendo relevante, para efeitos de tributação, a situação pessoal e familiar que se verificar no último dia do ano a que o imposto respeita, conforme o nº 7 do art. 13º (incidência pessoal).

-          De acordo com as alíneas a) e b) do nº 1 do art. 16º do CIRS são residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos, hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, ou, tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, a 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual e, nos termos do nº 2 do art. 16º do CIRS, são sempre havidas como residentes em território português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo, no caso dos autos o Requerente ou a respectiva cônjuge.

-          O nº 3 do artigo 16º prevê que a condição de residente resultante da aplicação do disposto no nº 2 possa ser afastada pelo cônjuge que não preencha o critério previsto na alínea a) do nº 1, desde que prove inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas actividades económicas e o território português, e o art. 81.º, também do CIRS, dispõe sobre eliminação da dupla tributação jurídica internacional.

-          O Requerente requereu em 2/4/2015 aos serviços da AT a rectificação da sua situação cadastral, dando-se como residente fiscal em Vila do Conde, Portugal, com efeitos retroactivos desde 1/9/2015, o que foi aceite, e apresentou a sua declaração de IRS respeitante ao ano de 2014, na qualidade de residente fiscal.

-          Na declaração de rendimentos modelo 3 de IRS do ano de 2014, o Requerente e sua cônjuge, B…, fizeram constar, no anexo H, habitação permanente em Portugal e benefícios fiscais referentes a essa fracção autónoma e, no anexo J, inscreveram rendimentos obtidos no estrangeiro, tendo sido com base nessa situação tributária e dados comunicados que foi efectuada a liquidação de IRS, resultante de tratamento automática, que é posta em crise pelo Requerente.

-          Não existe situação de dupla tributação jurídica internacional porque o Requerente deve ser considerado residente, para efeitos fiscais, em Portugal, no ano de 2014, aliás, segundo o disposto no artigo 4º nº 1 e 2 da CDT entre Portugal e Espanha, em especial na 2ª parte da alínea a) do nº 2, o enquadramento jurídico da questão só deveria passar para a aferição do Estado com o qual fossem mais estreitas as relações pessoais e económicas do Requerente (centro de interesses vitais) se este tivesse uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados.

-          E, da factualidade, não resulta que o Requerente tivesse, em 2014, habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados: o Requerente habitou em Espanha parte do ano de 2014 (não se sabe precisamente quanto tempo e se o mesmo foi seguido ou interpolado) mas essa habitação assumiu carácter transitório até à mudança do Requerente para Portugal, a partir de 01.09.2014, então sim com intenção de “permanência”.

-          O Requerente apenas juntou umas instruções para preencher a declaração do «Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas», não apresentando qualquer documento emitido por autoridade competente para atestar que, de acordo com a legislação espanhola, estava aí sujeito a imposto, devido ao seu domicílio ou à sua residência.

-          Não foi apresentada pelo Requerente nenhuma prova documental susceptível de atestar que permaneceu em território português menos de 183 dias, sendo que em 31 de Dezembro de 2014 dispunha em território português de habitação em condições que fazem supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual, nos termos previstos na alínea b) do nº 1 do art. 16º do CIRS.

-          Os documentos destinados a fazer prova deverão ser apresentados com o articulado onde se aleguem os factos correspondentes, ficando precludida, a apresentação ulterior de prova documental, pelo Requerente (artigo 423.º do CPC).

-          O Requerente nem juntou esclarecimentos sobre a sua situação jurídico-tributária e do seu agregado familiar (tais como local de realização de despesas de saúde em 2014, quais os consumos de água, luz e gás efectuados na casa de morada de família antes e depois de 01/09/2014) susceptíveis de afastar os indícios da sua permanência em território nacional nesse ano (alínea a) do nº 1 do art. 16º do CIRS e do artigo 15.º n.º 2 da Convenção) nem declaração da entidade patronal referindo o local onde foram desempenhadas as funções inerentes à sua actividade no ano de 2014.

-          Deverá o presente pedido ser julgado improcedente mantendo-se na ordem jurídica o acto tributário de liquidação impugnado.

 

9. Objecto do pedido

A questão objecto de litígio consiste em saber se o Requerente, ao alterar a sua residência fiscal de Espanha para Portugal em Setembro de 2014, está sujeito à incidência do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) relativamente a todos os rendimentos auferidos nesse ano, quer em Espanha (Janeiro a Agosto) quer em Portugal (Setembro até final do ano), com dedução do imposto pago em Espanha ou se estará sujeito a tributação em Portugal apenas pelos rendimentos auferidos no território português.

 

10. Saneamento

O tribunal arbitral colectivo é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não padece de qualquer nulidade nem foram suscitadas pelas partes quaisquer excepções que obstem à apreciação do mérito da causa, pelo que se mostram reunidas as condições para a prolação da decisão arbitral.

 

 

II Fundamentação

 

11. Factos provados

11.1. A…, Requerente nos autos, e B…, entregaram em 29 de Abril de 2015, via internet, a declaração de rendimentos de IRS modelo 3, referente ao ano de 2014, indicando como residência fiscal “continente”: no anexo A foi incluído como rendimento de trabalho dependente do sujeito passivo A (marido) o montante de € 34.770,33; no anexo J, como rendimento de trabalho dependente auferido no estrangeiro, o montante de € 105.378,33 (campo 401); no anexo H, foram inscritos encargos com imóveis afectos a habitação permanente (campos 731 e 814) (PA, fls. 15 a 17).

11.2. A declaração referida no número anterior originou a liquidação de IRS nº 2015…, de 09/06/2015, no montante de € 12.880,30, a pagar até 31 de Agosto de 2015 – o imposto retido no estrangeiro, Espanha, no valor de € 26.081,14, foi incluído na linha da dedução à colecta (26.682,47) e considerado dedutível até à concorrência da parte da colecta proporcional a esses rendimentos, nos termos do art. 81º do CIRS (Doc. nº 1 junto com o Pedido, PA, fls. 12 e 18 a 22).

11.3. Entre Setembro e Dezembro de 2014 a C…-Sucursal em Portugal processou salários ao Requerente (Documento nº 3, junto com Pedido).

11.4. Através de requerimento de 2 de Abril de 2015, o Requerente solicitou à AT alteração de morada com efeitos a Setembro de 2014, pedido que foi deferido e objecto de comunicação em 27 de Maio de 2015 (documento nº 6 junto com o Pedido).

11.5. O Requerente obteve inscrição no Registo Central de Estrangeiros da Direcção Geral de Polícia e da Guarda Civil como residente comunitário em Espanha desde 18 de Março de 2011, sendo nessa data emitido certificado de registo de cidadão da União e atribuído número de segurança social (Documento nº 8 junto com o Pedido).

11.6. A empresa D…, S.L.U. com endereço em... ...– …/…, … …, Barcelona, emitiu em 8 de Abril de 2011, uma declaração de que o Sr. A…, que até essa data havia exercido, desde 14 de Fevereiro de 2005, o cargo de Director da D… em Portugal,  tinha sido contratado com o cargo de Director Geral de Espanha e Portugal (documento nº 4 junto aos autos em Dezembro). 

11.7. A empresa D…, S.L.U., é filial da empresa C…, classificada em Fortune 500, que tem sede principal em…, …, EUA, com empregados em mais de 60 países (doc. nº 4 junto com o Pedido, http://www…com/.../.../.../...=…;

https://en.wikipedia.org/wiki/…

11.8. Em 1 de Maio de 2011, o Requerente assinou um contrato de arrendamento de um apartamento sito na…,  em…, pelo prazo de um ano prorrogável até um máximo de quatro anos (Documento nº 1 junto aos autos em Dezembro de 2015).

11.9. Em 13 de Maio de 2011, o Requerente apresentou junto da Agência Tributária, na Dependência de Gestão Tributária, em Barcelona, uma comunicação de opção pelo regime especial aplicável aos trabalhadores deslocados no território espanhol, regulado no artigo 93 da lei 35/2006, de 28 de Novembro, do Impuesto de la Renta de las Personas Físicas (IRPF), o que deu origem à emissão, em 18 de Julho de 2011, pela referida Dependência de Gestão Tributária, de certificado da condição de contribuinte de IRPF pelo regime especial de tributação pelo Imposto sobre Rendimento de não residentes, e que esta opção salvo renúncia ou exclusão, abarca os exercícios fiscais 2011 a 2016[1] (Doc. n.º 7, junto com Pedido).

11.10. Segundo a base de dados Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes (SGRC) da AT, A… comunicou entre 2011 e 2014, sucessivamente, os seguintes domicílios fiscais: Espanha em 2011-12-09 e 2011-07-12; Rua…, Vila do Conde, em 2011-08-01; Espanha em 2013-05-07 e 2013-05-08 e Rua…, Vila do Conde, em 2014-09-01 (PA, fls. 11).

11.11. Em 3 de Maio de 2014 foi emitida uma notificação de sanção por excesso de velocidade dirigida a A…, para a morada “…, …, …, … …, Barcelona” (Documento nº 3 junto em Dezembro).

11.12. Em 28 de Abril de 1999, A… e sua mulher, B…, adquiriram um imóvel destinado a habitação permanente (doc. nº 4, junto com o Pedido)[2].

11.13. Relativamente ao exercício de 2014, e com vista a devolução de imposto, o Requerente apresentou na Agencia Tributaria, em Espanha, o modelo 150 do Impuesto sobre la renta de las Personas físicas, Regímen especial aplicable a los trabajadores desplazados a território español” (art. 30º do Pedido e Doc nº 9 junto com o Pedido).

11.14. Em 31 de Março de 2015 foi, por um terceiro e via Internet, apresentada à Agencia Tributária espanhola uma declaração modelo 30 de mudança de domicílio fiscal do Requerente, situando-o no estrangeiro, Rua…, …, Vila do Conde, Portugal, e como lugar de domicílio para notificações em Espanha, …, nº…, no…, Barcelona (Documento nº 5 junto com o Pedido).

11.15. Em 10 de Junho de 2015, entregou na Agência Tributária, em Espanha, comunicação sobre a conta a ser debitada ou creditada de acordo com o resultado da liquidação referente a 2014 (Documento nº 9 junto com o Pedido).

12. Factos não provados

12.1. Que o Requerente tenha vivido e trabalhado exclusivamente em Espanha no período entre 2001 e 2014.

12.2. Qual o montante de rendimento do Requerente declarado e tributado em Espanha no ano de 2014.

 

13. Fundamentação dos factos provados e não provados

A fixação da factualidade fez-se com base nos factos alegados pelas partes e não contestados, assim como na documentação junta aos autos, incluindo o processo administrativo.

O Tribunal aceitou a junção dos documentos apresentados, já posteriormente ao Pedido, pelo Requerente por não ver nisso qualquer perturbação aos princípios processuais consagrados no artigo 16º do RJAT, salvaguardado que foi o princípio do contraditório.  

Os factos provados mostram-se suficientes para decisão do processo.

 

14. Aplicação do direito

14.1. Os factos a enquadrar juridicamente

Apesar das dúvidas que podem restar face à factualidade fixada, é possível concluir que:

O Requerente é funcionário da multinacional C… desde pelo menos 2005. Até 2011 (Março/Abril?) trabalhou, segundo declaração da entidade patronal, num estabelecimento situado em Portugal, tendo aí voltado para exercer funções de direcção no ano de 2014 (os recibos emitidos pela entidade empregadora e juntos aos autos confirmam esse exercício, pelo menos a partir de Setembro). 

Em 2011 (Março? Abril?) passara a desempenhar o cargo de Director Geral de Espanha e Portugal, sendo remunerado pela filial D…, S.L.U., sita em…, …, Barcelona.

Nesse mesmo ano de 2011, em Março, o Requerente assinou um contrato de arrendamento de um apartamento em…, …, …(área de Barcelona). E efectuou o seu registo como estrangeiro, cidadão da União, no Registo Central de Estrangeiros da Direcção Geral de Polícia e Guarda Civil, em Espanha assim como obteve número de Segurança Social (Ministério do Tabalho e Imigração, em Espanha) indicando como domicílio… .

Em Maio de 2011, representado pela C…, apresentou na “Agencia Tributaria”, delegacion Especial de Cataluna, uma comunicação de opção pelo “regime especial aplicável a trabalhadores deslocados em território espanhol”.

 

Atenta a documentação (ou falta dela) junta, quer pelo Requerente quer pela AT, desconhece-se qual foi exactamente a situação tributária e laboral do Requerente em Portugal no período entre Março de 2011 e Setembro de 2014. Exercendo nesse período, segundo declaração da D…, o cargo de “Director Geral de Espanha e Portugal”, é admissível que distribuísse o seu tempo e trabalho pelos dois países, ainda que tendo necessidade de um local que lhe permitisse (também?) viver em Barcelona. Não se sabe se assim foi. Assim como se desconhece a razão e consequências da alteração de domicílio fiscal comunicada à Base de dados da AT em Portugal entre 2012 e 2013. E, apesar de o Requerente afirmar, a dado passo, que a mulher o acompanhou também para Barcelona, fica sem se perceber se e como foram apresentadas declarações de IRS em Portugal pelo agregado familiar.

Regista-se também o facto de o Requerente ter diligenciado alterar o seu domicílio fiscal em Portugal apenas em Maio de 2015, embora com efeitos a partir de 1 de Setembro de 2014.  

Pese embora as identificadas dúvidas sobre a real situação de facto, não cabia a este tribunal fazer um inquérito aprofundado à situação tributária do Requerente se os dados existentes fossem suficientes para decidir o caso objecto do presente Pedido. E cremos que são.

Assim, a presente decisão arbitral, referente apenas a 2014, fundamenta-se nos dados factuais trazidos aos autos e nas disposições normativas invocadas e aplicáveis.

 

14. 2. O regime legal aplicável – dúvidas e interpretação

14.2.1. A tributação dos rendimentos do trabalho dependente e o conceito de residência - a lei interna e os conflitos de competência

O Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), na redacção vigente ao tempo da situação dos autos[3] dispunha, quanto aos sujeitos passivos do imposto, no artigo 13º: «1 - Ficam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos. 2 - Existindo agregado familiar, o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos das pessoas que o constituem, considerando-se como sujeitos passivos aquelas a quem incumbe a sua direcção»[4], sendo que “A situação pessoal e familiar dos sujeitos passivos relevante para efeitos de tributação é aquela que se verificar no último dia do ano a que o imposto respeite”  (nº 7 do art. 13º).

 

De acordo com o artigo 15º do CIRS[5], o imposto incide exclusivamente sobre as pessoas singulares que residam no território português ou nele não residindo aqui obtenham rendimentos[6], sendo que no que respeita aos residentes o imposto incide sobre a totalidade dos rendimentos obtidos fora do território nacional enquanto os não residentes apenas estão sujeitos quanto aos rendimentos obtidos em território português.

 

Torna-se pois fundamental delimitar o conceito de residente, elemento de conexão que, a verificar-se, “legitima a tributação dos rendimentos dos residentes numa base mundial, i.e., de todos os rendimentos independentemente do local onde os mesmos sejam obtidos (world income principle)”[7].

 

O nº 1 do artigo 16º do Código do IRS dispunha[8]:

«São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos:

a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados;

b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, em 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual;

c) Em 31 de dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva nesse território;

d) Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de carácter público, ao serviço do Estado Português».

 

A consagração de uma “pluralidade de critérios alternativos faz surgir o perigo de duplas tributações, em virtude do elemento de conexão residência, visto aquelas poderem tanto resultar de definições diversas nos espaços fiscais em causa como de definições iguais, desde que integradas por uma pluralidade de critérios que se repetem nas legislações desses espaços fiscais sendo a situação enquadrável em critérios diferentes” [9].

 

Para evitar os conflitos derivados de aplicação das normas tributárias em caso de situações com ligações a outros territórios assume especial importância a negociação e celebração de Convenções assinadas entre Portugal e outros Estados para Evitar a Dupla Tributação (CDTs).

 

As convenções não consagram porém uma definição autónoma de residência[10], remetendo para a noção de residência dos Estados contratantes, embora com alguns critérios delimitativos, pelo que uma mesma pessoa pode ser considerada residente em dois espaços fiscais, situação para a qual o nº 2 do artigo 4º do Modelo de Convenção da OCDE estabelece critérios de resolução:

«Quando, por virtude do disposto no n.º 1, uma pessoa singular for residente de ambos os Estados contratantes, a situação será resolvida como segue:

 a) Será considerada residente apenas do Estado em que tenha uma habitação permanente à sua disposição. Se tiver uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados, será considerada residente apenas do Estado com o qual sejam mais estreitas as suas relações pessoais e económicas (centro de interesses vitais);

b) Se o Estado em que tem o centro de interesses vitais não puder ser determinado ou se não tiver habitação permanente à sua disposição em nenhum dos Estados, será considerada residente apenas do Estado em que permanece habitualmente;

c) Se permanecer habitualmente em ambos os Estados ou se não permanecer habitualmente em nenhum deles, será considerada residente apenas do Estado de que for nacional;

d) Se for nacional de ambos os Estados ou não for nacional de nenhum deles, as autoridades competentes dos Estados contratantes resolverão o caso de comum acordo».

Significa isto que “alguém - no âmbito de uma convenção – não pode ser considerado residente em dois Estados. Mas (...) sendo considerado residente num Estado pela respectiva lei interna, não pode pretender deixar de o ser para efeitos da convenção quando o outro Estado não o considere residente segundo a correspondente legislação. A dupla não residência é inadmissível, de outro modo a convenção seria inaplicável, visto exigir-se, pelo menos, a residência num dos Estados Contratantes”[11].

 

14.2.2. Situação geradora de dúvidas – jurisprudência e evolução legislativa

O facto de o nº 2 do artigo 16º do CIRS dispor que “São sempre havidas como residentes em território português as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo”, veio a desencadear muitas dúvidas relativamente a casos de emigrantes que, trabalhando noutro Estado, mantinham em Portugal uma habitação onde continuava a residir o outro cônjuge, acompanhado ou não dos filhos. 

 

A disposição explicita que nessa situação as pessoas ausentes fisicamente do território português continuam a ser consideradas residentes pela lei interna. E se for considerada residente por outro Estado Contratante, como se aplica a Convenção para evitar a dupla tributação? O recurso a normas com conteúdo como o do artigo 4º da Convenção Modelo levanta problemas quando o emigrante tem no Estado onde trabalha “habitação permanente”, um “centro de interesses económicos vitais” e “permanência habitual”.

 

Precisamente a propósito dessa situação, com especial relevo para situações de emigrantes na Alemanha, surgiram, logo durante a década de 90, numerosos litígios, vindo os tribunais tributários a pronunciar-se em sentidos diferentes. Depois de hesitações, veio a impor-se uma corrente jurisprudencial no sentido de que, reconhecendo-se, por força do artigo 8º da CRP, a supremacia das normas constantes de convenções internacionais, a remissão do artigo 4º, nº 1 da CDT Portugal/Alemanha (idêntica de resto a de outras Convenções e seguindo a Convenção Modelo da OCDE) para a legislação fiscal interna dos Estados contratantes não deve ser vista como uma remissão incondicional, antes impondo que a análise da questão da residência seja feita pessoa a pessoa, abstraindo da situação familiar do sujeito em causa, estabelecendo limites à natureza das conexões adoptadas pelas leis dos Estados contratantes, impondo-se que tais critérios exprimam uma ligação efectiva com o território do Estado.

Neste sentido, e por todos, veja-se o Acórdão do STA de 25 de Março de 2009, in proc. nº 068/09, que conclui: «O critério de “residência por dependência” adoptado no artigo 16.º, n.º 2 do Código do IRS, porque não respeita as limitações convencionais ao conceito de residência que os Estados Contratantes podem adoptar, não é fundamento válido para uma pretensão tributária do Estado português em face de um residente na Alemanha que aí tenha obtido no ano em causa todos os seus rendimentos e que não seja tributado nesse país apenas pelo facto de o Estado alemão ser o Estado da fonte dos rendimentos do trabalho»[12].

 

Esta controvérsia foi em grande medida ultrapassada pelas disposições aditadas ao artigo 16º do CIRS, pela Lei nº 60-A/2005, de 31 de Dezembro, que passou a prever, no nº 3, que: “A condição de residente resultante da aplicação do disposto no número anterior pode ser afastada pelo cônjuge que não preencha o critério previsto na alínea a) do n.º 1, desde que efectue prova da inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas actividades económicas e o território português, caso em que é sujeito a tributação como não residente relativamente aos rendimentos de que seja titular e que se considerem obtidos em território português nos termos do artigo 18.º” e no nº 4, que “Sendo feita a prova referida no número anterior, o cônjuge residente em território português apresenta uma única declaração dos seus próprios rendimentos, da sua parte nos rendimentos comuns e dos rendimentos dos dependentes a seu cargo segundo o regime aplicável às pessoas na situação de separados de facto nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 59.º”

«Com as modificações e aditamentos de novas regras, o regime passou a deixar de tributar os rendimentos do trabalhador auferidos por emprego exercido e pago fora de Portugal, no caso de aquele demonstrar a falsidade do estatuído no nº 2, o que se fará por meio da demonstração de “inexistência de uma ligação entre a maior parte das suas actividades económicas e o território português”»[13]. [14]

Acontece porém que, nos autos, não foi invocada a aplicação do nº 2 do artigo 16º.

E tratar-se-á de um caso em que a situação do Requerente é qualificada como residente por normas do direito interno de ambos os Estados?

 

14.2.3. Os factos, o regime fiscal espanhol e delimitação da questão controvertida

Como visto acima, em Março de 2011, o Requerente efectuou em Espanha o seu registo como cidadão estrangeiro, cidadão da UE, e em Maio de 2011 apresentou, representado pela sua entidade patronal, na “Agencia Tributaria” espanhola, uma comunicação de opção pelo “regime especial aplicável a trabalhadores deslocados em território espanhol”.

 

Em Espanha, vigora o Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas (IRPF), aprovado pela Lei 35/2006, de 28 de Novembro (e respectivas alterações posteriores).

Ficando-nos por uma referência bastante superficial, regista-se apenas que o IPRF é um imposto que incide sobre a totalidade dos rendimentos do contribuinte independentemente do lugar em que se produzam, sendo contribuintes as pessoas que tenham residência habitual no território espanhol, entendendo-se que tal acontece quando permaneçam mais de 183 dias nesse território ou nele radiquem o núcleo principal ou a base das suas actividades ou interesses económicos, de forma directa o indirecta (...) (artigos 2º, 8º e 9º da Lei citada).

 

O mesmo diploma (artigo 93º) prevê a aplicação de um regime especial para trabalhadores deslocados em território espanhol, trabalhadores que adquiram a residência fiscal em Espanha em consequência de deslocação, consistente na opção por tributação pelo Imposto sobre o Rendimento de Não Residentes[15], mantendo a condição de contribuintes pelo IRPF desde que preenchidas as condições estabelecidas no nº 1 do art. 93º, e aplicando-se as regras do nº 2 do mesmo artigo.

 

Ou seja, o Requerente é, segundo o regime do IRPF, considerado residente em território espanhol, mas de acordo com normas dessa mesma lei, optou pela aplicação do regime de tributação sobre o Rendimento de Não Residentes (possivelmente por se lhe ter revelado mais favorável).

 

Contudo, e independentemente desse aspecto, vejamos a argumentação esgrimida pelas Partes:

O Requerente defende que tendo exercido a sua actividade profissional em Espanha até Setembro de 2014 e vendo os rendimentos aí auferidos tributados na qualidade de residente nesse território, quando se mudou para Portugal onde trabalhou o resto do ano, sem permanecer aí 183 dias, o IRS referente a 2014 não poderia incidir sobre os rendimentos de fonte portuguesa e sobre os salários auferidos em Espanha porque nos termos do artigo 15º, nº 2, do ADT, a competência para a tributação do rendimento obtido em Espanha pertence exclusivamente ao Estado espanhol.

 

A AT, para além de pôr em causa a suficiência da prova produzida quanto a existência de efectiva residência e habitação permanente do Requerente em Espanha durante todo o período a seguir a 2011 (ou pelo menos 2014), e quanto à não permanência em território português por menos de 183 dias em 2014, considera que o facto de o Requerente dispor a 31 de Dezembro de 2014 em território português de habitação em condições que fazem supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual, conduz à aplicação da alínea b) do nº 1 do art. 16º do CIRS e, em caso de dúvida, ao art. 4º da Convenção. 

 

Em suma, para o Requerente está em causa o valor do direito convencional, superior ao direito interno, defendendo que o disposto no nº 2 do artigo 15º, nº2 do CDT sobrepõe-se ao disposto no artigo 16º, nº 1, b) do CIRS, enquanto para a Requerida está em causa a aplicação do artigo 16º do CIRS, com eventual recurso ao disposto o artigo 4º da Convenção. 

 

14.2.4. Âmbito do artigo 15º da CDT e relação com o artigo 4º da mesma CDT

Posta assim a questão, considera-se que será de utilidade relacionar o âmbito de aplicação dos artigos 4º e 15º da CDT entre Portugal e Espanha (e concordantes com o disposto nos correspondentes artigos da convenção Modelo da OCDE).

Como já visto acima o artigo 4º dispõe para o caso de, segundo a legislação interna dos Estados contratantes, uma pessoa singular ser considerada residente de ambos os Estados, elegendo critérios - habitação permanente, centro de interesses vitais, nacionalidade, comum acordo dos Estados contratantes – com a finalidade de possibilitar a eliminação de dupla tributação derivada de dupla residência.

 

O artigo 15º da Convenção entre a República Portuguesa e o Reino da Espanha para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em matéria de Impostos sobre o Rendimento[16], sobre “Rendimentos do emprego”, dispõe nos números 1 e 2:

«1. Com ressalva do disposto nos artigos 16.º, 18.º e 19.º, os salários, ordenados e remunerações similares obtidos de um emprego por um residente de um Estado contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que o emprego seja exercido no outro Estado contratante. Se o emprego for aí exercido, as remunerações correspondentes podem ser tributadas nesse outro Estado. 2. Não obstante o disposto no n.º 1, as remunerações obtidas por um residente de um Estado contratante de um emprego exercido no outro Estado contratante só podem ser tributadas no Estado primeiramente mencionado se: a) o beneficiário permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que não excedam, no total, 183 dias em qualquer período de doze meses com início ou termo no ano fiscal em causa; e

 b) as remunerações forem pagas por uma entidade patronal ou em nome de uma entidade patronal que não seja residente do outro Estado; e

c) as remunerações não forem suportadas por um estabelecimento estável ou por uma instalação fixa que a entidade patronal tenha no outro Estado.»

 

A versão da Convenção Modelo da OCDE diz nos artigos correspondentes[17] (redacção de 1992):

«1. Com ressalva do disposto nos artigos 16.º, 18.º e 19.º, os salários, ordenados e remunerações similares obtidos de um emprego por um residente de um Estado contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que o emprego seja exercido no outro Estado contratante. Se o emprego for aí exercido, as remunerações correspondentes podem ser tributadas nesse outro Estado.

2. Não obstante o disposto no n.º 1, as remunerações obtidas por um residente de um Estado Contratante de um emprego exercido no outro Estado Contratante são tributáveis exclusivamente no primeiro Estado mencionado se:

a) o beneficiário permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que não excedam, no total, 183 dias em qualquer período de doze meses com início ou termo no ano fiscal em causa; e

b) as remunerações forem pagas por uma entidade patronal ou por conta de uma entidade patronal que não seja residente do outro Estado; e

c) as remunerações não forem suportadas por um estabelecimento estável que a entidade patronal tenha no outro Estado.»

 

Em comentário à redacção da convenção modelo da OCDE, diz Margarida Cordeiro Mesquita[18] «Em matéria de tributação dos rendimentos das profissões dependentes, o Modelo OCDE (artigo 15, parágrafo 1), tal como o Modelo das NU, atribui ao Estado em que a actividade tem lugar o direito primário à tributação, com a limitação, porém, do parágrafo 2: quando a actividade for exercida em estado diferente do Estado da residência, o Estado do exercício da actividade pode tributar quando o beneficiário permaneça no seu território durante um período ou períodos que excedam, no total, 183 dias durante um período de doze meses que comece ou termine no ano fiscal considerado, quando as remunerações sejam pagas por um empregador ou por conta de um empregador que seja seu residente ou quando o pagamento das remunerações seja suportado por um estabelecimento estável ou por uma base fixa que o empregador não residente possua no seu território. Verificada uma qualquer parte destas circunstâncias, ambos os Estados poderão tributar, cabendo ao Estado da residência, nos termos do artigo 23, a eliminação da dupla tributação. Se, diferentemente, não se verificar qualquer das três condições enunciadas, a tributação caberá, em exclusivo, ao Estado da residência (parágrafo 2)»

 

14.2.5. A relação entre o artigo 15º da CDT e o artigo 16º do CIRS

O Acórdão proferido pelo TCAN em 26 de Outubro de 2016 (proc. 00198/04), exemplifica a colocação e delimitação de questões que, no nosso entendimento, são, no caso dos autos, objecto de confusão na argumentação do Requerente.

 

Estava em causa uma situação em que o sujeito passivo tinha, em 2001, auferido rendimentos na Alemanha, onde permanecera mais de 183 dias. No ano seguinte entregou em Portugal declaração de IRS conjunta com a mulher. O sujeito passivo alegara que o artigo 15º da Convenção funciona como regra especial, de exclusão das regras de tributação gerais portuguesas contidas nos artigos 15°/1 e 16° do CIRS, uma vez que no conflito entre a Lei Interna do Estado Português e a Lei emergente de Tratado Internacional ratificado por Portugal, prevalece a solução consignada no Tratado - sob pena de ficar violado o artigo 8° da CRP. E, contra a posição da AT, o artigo 24° da Convenção, norma excepcional, apenas seria aplicável nesta situação se os rendimentos em questão pudessem ser tributados pelo Estado Português, caso em que lhe cumpria proceder à eliminação da dupla tributação.

 

Identificando como questão decidenda a de saber se as remunerações de trabalho auferidas pelo impugnante marido, na Alemanha, durante os 365 dias do ano de 2001, estão ou não sujeitas a tributação em Portugal, provado como está que, durante esse ano, ele residiu naquele país por um período superior a 183 dias, onde auferiu rendimentos e onde pagou o imposto correspondente, tendo a impugnante mulher e o filho permanecido a residir em Portugal, o tribunal veio a resolver a questão nos termos da jurisprudência então prevalecente e constante do Acórdão proferido pelo STA no proc. n.º 01211/05, ou seja, interpretando o artigo 4º da Convenção em conjugação com o nº 2 do art. 16º do CIRS, e reconhecendo a residência por dependência do contribuinte (tratava-se de situação anterior à alteração legislativa referida acima que introduziu os números 3 e 4 do art. 16 do CIRS e à predominância de corrente jurisprudencial expressa, entre outros, no Acórdão 68/09, do STA).

 

Considerando o sujeito passivo residente em Portugal, e tendo em conta que o país de residência, Portugal, era diverso do país onde o rendimento fora auferido (Alemanha), Estado da fonte, o tribunal passou à análise do artigo 15.º da Convenção para estabelecer qual o Estado competente para a tributação.

 

E, assim, prosseguiu:

« (...) dispõe o art. 15.º da Convenção[19] nos termos seguintes previa: a) Competência exclusiva do país de residência se o emprego é aí exercido – n.º 1, primeira parte; b) Competência cumulativa dos dois Estados se o emprego é exercido no outro Estado, (que não o da residência) – n.º 1, última parte. Por sua vez, o n.º 2 do art. 15.º prevê a hipótese de competência exclusiva do Estado onde o emprego é exercido – não obstante o contribuinte aí não residir, uma vez verificados cumulativamente os três requisitos negativos aí referidos – “actividades temporárias”. Assim (...), a dita segunda parte do n.º 1 consagra uma competência cumulativa dos dois Estados para a tributação – cfr. cit. p. 434, Casalta Nabais, Direito Fiscal, 2ª edição, p. 232 e ss., Leite de Campos, Direito Tributário, 2ª edição, p. 332 e Fiscalidade n.ºs 17-61 e 18-61. Ou seja, o Estado em que o emprego é exercido só tem competência cumulativa uma vez verificados os ditos requisitos, mas pela positiva e alternativamente. Nos autos, aplica-se, assim, a última parte do n.º 1 do art. 15º: competência tributária cumulativa de Portugal e da Alemanha para tributação dos rendimentos em causa. Cabendo, pois, ao Estado da residência – Portugal – eliminar a dupla tributação, nos termos do art. 24.º da Convenção (alíneas a) do n.º 1: dedução no imposto pago em Portugal, do imposto pago na Alemanha, não podendo contudo exceder a fracção do imposto, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos auferidos no estrangeiro, exigindo-se documento comprovativo do imposto aí pago (...). Cf. no sentido exposto os Acórdãos do STA, de 24 de Março de 2004 Recurso n.º 1872/03, de 15 de Dezembro de 2004 Recurso n.º 834/04 e de 20 de Abril de 2005 Recurso n.º 1254/04.»


No sentido desta interpretação do artigo 15º da Convenção, o Acórdão cita o Prof. Alberto Xavier[20]: «se o emprego é exercido no Estado da residência do empregado nenhum problema se suscita; se, porém, é exercido noutro Estado, importa proceder à repartição dos poderes de tributar potencialmente interessados na situação e, nesta hipótese, há que distinguir as “actividades duradouras”, caso em que ocorre a competência tributária cumulativa do Estado da fonte (no caso, a Alemanha pode tributar), das “actividades temporárias”, caso em que o Estado da residência tem um poder exclusivo se se verificarem cumulativamente os seguintes três requisitos negativos: I- o beneficiário permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que, no ano civil em causa, não excedem, no total, 183 dias; II- a remuneração for paga por entidade patronal ou em nome da entidade patronal que não seja residente do outro Estado; III- as remunerações não forem suportadas por um estabelecimento estável ou por uma instalação fixa que a entidade patronal tenha no outro Estado»[21].

 

Ou seja, no caso submetido ao TCAN, cujo excerto transcrevemos, o tribunal aceitou a qualificação do sujeito passivo como residente em Portugal, por aplicação do art. 16º, nº 2 do CIRS, mas, encontrando-se provado que o trabalhador permanecera na Alemanha mais de 183 dias, foi então decidido que a Alemanha podia também, nos termos convencionais, tributar (como tributou) os rendimentos que ele aí obteve, existindo, assim, uma competência tributária cumulativa de Portugal e da Alemanha, cabendo ao Estado da residência – Portugal - eliminar a dupla tributação jurídica internacional, mediante a aplicação do mecanismo previsto no art. 24º nº 1 da Convenção, isto é, deduzindo ao imposto pago em Portugal uma importância igual ao imposto que foi pago na Alemanha, com o limite de dedução aí previsto.

 

Esta posição é também confirmada (e explicada) por Rui Duarte Morais, num muito útil comentário sobre a jurisprudência referente a esta matéria[22], porque não só se clarifica a relação entre os vários preceitos como se esclarece a razão de algumas dúvidas que se possam gerar face ao conteúdo do texto da CDT Portugal Espanha[23].

 

Referindo expressamente a norma das CDT sobre a “tributação dos rendimentos do trabalho dependente” (artigo 15º), considera que a disposição «(...) consagra, relativamente aos rendimentos de emprego (rendimentos obtidos por um residente num Estado contratante em razão de actividades por conta de outrem exercidas no outro Estado contratante), as soluções preconizadas pelo Modelo da OCDE. Tentando sintetizá-las, diremos: normalmente, cumulam-se as competências do Estado da fonte e do Estado da residência para tributarem tais rendimentos. Porém em certas circunstâncias, o direito à tributação pertence, em exclusivo, ao estado da residência. Assim acontece verificando-se os seguintes condicionalismos: o beneficiário (o trabalhador) ter permanecido no país da fonte, durante o período fiscal em causa menos de 183 dias; as remunerações terem sido suportadas por entidade patronal não residente no Estado da fonte e que não tenha nesse Estado estabelecimento estável a cuja actividade o pagamento de tais remunerações deva ser imputado. A razão de ser desta excepção à competência cumulativa de ambos os Estados parece ser clara: em tais circunstâncias, entende-se que não existe uma conexão suficiente tempo de presença física do trabalhador e localização no Estado onde a actividade é exercida da fonte financeira das remunerações) capaz de legitimar o direito à tributação pelo estado da fonte (o local onde o emprego foi exercido).»

 

E, considerando erróneas algumas decisões judiciais no sentido de que um trabalhador que tivesse permanecido mais de 183 dias na Alemanha só poderia ser tributado nesse país, o Autor identificava duas razões para tal erro:

- não se ter previamente respondido à questão essencial de saber qual era, no caso, o Estado da fonte e o da residência, não logrando uma visão sistematizada dos direitos e obrigações que, no quadro convencional, decorriam para cada um dos Estados em presença;

- o teor equívoco do texto legal.

 

Quanto à segunda, explica: «A expressão “as remunerações obtidas por um residente de um Estado contratante de um emprego exercido no outro Estado contratante só podem ser tributadas no Estado primeiramente mencionado se (...)” constante do corpo do nº 2 do artigo 15º da Convenção, presta-se a ser, como foi, lida no sentido de que a tributação pelo Estado primeiramente mencionado (Estado da residência, ou seja, Portugal) apenas pode ter lugar quando se verificarem os condicionalismos previstos nas alíneas de tal número e não – como é correcto – que verificados tais condicionalismos, o único Estado competente para tributar é o da residência (só podem ser tributadas no Estado primeiramente mencionado significa que só esse Estado pode tributar)».

 

O Autor levanta ainda dúvidas sobre se a dificuldade não deriva da tradução efectuada da Convenção Modelo da OCDE, possivelmente realizada a partir do original inglês “remuneration derived by a resident of a Contracting State in respect of an employment exercised in the other Contracting State shall be taxable only in the first-mentioned State if” (...). Em confronto, seria muito mais clara a versão francesa” (...”les rémunérations q’un résident d’un État contractant reçoit au titre d’un emploi exercé dans l’autre État contractant ne sont imposables que dans le premier État si (...)”.

 

Mas, reafirma, interpretação diferente traduz uma incompreensão dos “princípios gerais” a que obedece a repartição do direito à tributação operada pelas CDT[24]).

 

14.3. Conclusão sobre a situação dos autos

Como vimos acima, o artigo 16º, nº 2, do CIRS passou a ser objecto de interpretação firmada a nível do STA no sentido de o conceito de residência por dependência não valer contra as normas convencionais.

 

Mas no caso dos autos, não está em causa a aplicação do nº 2 do art. 16º mas da alínea b) do nº 1 do artigo 16º. O Requerente tinha em 31 de Dezembro habitação em Portugal em condições que revelavam intenção de a manter e ocupar como residência habitual (desempenhava um cargo dirigente na empresa em Portugal e pedira o registo como residente em Portugal a partir de Setembro de 2014).

 

Então, atentas todas as considerações acima feitas, conclui-se que:

- O Requerente é face à lei interna portuguesa considerado residente em Portugal em 2014;

- Nesse mesmo ano auferiu rendimentos pagos e declarados em Espanha, sendo tributado nesse Estado apenas por eles[25];

- Segundo o artigo 15º, nºs 1 e 2, da Convenção entre Portugal e Espanha, resulta que se o Requerente tivesse permanecido em 2014 menos de 183 dias em Espanha apenas o Estado da residência, Portugal, teria direito a tributar todo o rendimento auferido nesse ano; no caso de permanência em Espanha mais de 183 dias, existe competência cumulativa dos dois Estados, cabendo ao Estado da residência – Portugal - eliminar a dupla tributação jurídica internacional.

 

Assim, a liquidação efectuada pela Requerida, com base nos dados inscritos na declaração modelo 3 de IRS apresentada pelo próprio sujeito passivo, foi efectuada de acordo com os preceitos do CIRS sem violar qualquer disposição da Convenção para evitar a Dupla Tributação entre Portugal e Espanha, designadamente o invocado artigo 15º, pelo que o Pedido arbitral não merece provimento. 

 

15. Decisão

Com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:

a)      Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral de declaração de ilegalidade da liquidação de IRS relativa ao ano de 2014 (n.º 2015…).

b)      Condenar o Requerente em custas.

 

16. Valor do processo

De harmonia com o disposto no n.º 2 do artigo 315.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do artigo 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de €12.880,30 (doze mil, oitocentos e oitenta euros e trinta cêntimos).

 

17.Custas

Para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 12º e no n.º 4 do artigo 22.º do RJAT e do n.º 4 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 918,00 (novecentos e dezoito euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar integralmente pelo Requerente.

 

Lisboa, 5 de Abril de 2016.

 

A Árbitro

 

 

 

(Maria Manuela Roseiro)

 



[1] Nesse “Certificado de haber ejercitado la opción por el régimen especial aplicable a los trabajadores desplazados a territorio español” afirma-se: “A la vista de la comunicación y documentation justificativa presentadas y conforme al artículo 119.2 del reglamento del Impuesto de la Renta de las Personas físicas, se expide el presente certificado a los efectos de justificar ante las personas o entidades obligadas a retener la condicion de contribuyentes del IRPF por el régimen especial de tributación por el Impuesto sobre la Renta de no residentes”

[2] Não é possível verificar a identificação do imóvel porque o documento está incompleto (falta página 3).

[3] Redacção anterior às alterações introduzidas pela Lei nº 82-E/2014, de 31/12, mas com as alterações introduzidas pela Lei nº 60-A/2005, de 31/12. 

[4] Compunham o agregado familiar, designadamente, “Os cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens e os seus dependentes” (alínea a) do nº 3 do artigo 13º).

[5] «1 - Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território. 2 - Tratando-se de não residentes, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português.»

[6] Leia-se das categorias sujeitas a imposto segundo o artigo 1º do mesmo Código, entre os quais se encontram os rendimentos de trabalho dependente, como os que estão em causa nos autos. 

[7] Rui Duarte Morais Sobre o IRS, Almedina 2014, 3ª edição, pp. 11 e ss. A residência é hoje, geralmente aceite como constituindo o elemento de conexão que expressa a mais íntima ligação económica entre uma pessoa e um Estado (crise do princípio da nacionalidade – nota 19, p. 11).

[8]  Redacção já constante no texto do CIRS aprovado pelo Decreto-Lei nº 442-A/88, de 30 de Novembro.

[9] “Artigo 16º, nº 2, do CIRS e as Convenções destinadas a evitar a dupla tributação”, Manuel Pires, Estudos em memória do Professor Doutor António Marques dos Santos”, vol. II, Almedina, p. 594.

[10] As Convenções para evitar a dupla tributação sobre o rendimento e o património têm seguido o Modelo de Convenção da OCDE, cujo nº 1 do artigo 4º diz: «Para efeitos da Convenção, a expressão "residente de um Estado contratante" significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direcção ou a qualquer outro critério de natureza similar, e aplica-se igualmente a esse Estado e às suas subdivisões políticas ou autarquias locais (...)» (sublinhado nosso).

[11] Manuel Pires, in “Artigo 16º, nº 2 do CIRS e as Convenções destinadas a evitar a dupla tributação”, ibidem, p. 596.

[12] Cf. ponto 3 do sumário. O Acórdão contém relevantes citações doutrinárias, entre as quais retemos: «A análise da residência deve ser feita pessoa por pessoa, ainda que casadas, pelo que é frequente a existência de «casais mistos», sendo um dos membros considerado residente num país e o outro, noutro (...) As Convenções sobrepõem-se portanto aos regimes internos que eventualmente consagrem, por ficção, a «residência» por «dependência» de uma pessoa no país de residência de qualquer dos outros membros do agregado familiar» (Alberto Xavier, in Direito Tributário internacional, nota 61 a pp. 291) e: «Relativamente às pessoas singulares, o teste da residência é efectuado contribuinte a contribuinte, independentemente da sua situação conjugal. O conceito convencional de residência sobrepõe-se aos regimes internos que, como o português, consagram a “residência por dependência” de uma pessoa no país da residência de outro membro do seu agregado familiar – cfr. Código do IRS, artigo 16.º, n.º 2» (Maria Margarida Cordeiro Mesquita, in As Convenções sobre Dupla Tributação, Lisboa, 1998, p. 85).

[13] Gustavo Courela, Revista de Finanças Públicas e Direito fiscal”, ano I, nº 1, p. 293. Realçando o facto de o outro cônjuge se declarar como separado de facto para ser tributado, o Autor levantava a dúvida sobre a compatibilidade com a previsão constitucional relativa ao tratamento do agregado familiar.

[14] Estas disposições foram eliminadas com a Reforma do IRS, aprovada pela Lei nº 82-E/2014, de 31 de Dezembro. (cf. justificação ponto 4.2.2 do Anteprojeto da Reforma do IRS Julho de 2014 p. 45 “Residência por atracão. O regime da residência por atração, previsto no artigo 16.º, nº 2 do Código do IRS, é gerador de múltiplos conflitos positivos de residência, pelo que se propõe a sua revogação. Na realidade, não obstante a lei prever já a possibilidade de afastamento da condição de residente por parte do cônjuge que não permanece em território português, o regime em causa representa uma desnecessária fonte de complexidade. Mais, adotando-se o princípio da tributação separada dos cônjuges, é mais coerente que a residência fiscal seja aferida relativamente a cada sujeito passivo do agregado familiar”).  

[15] Sobre a tributação da Renda de Não Residentes, Real Decreto Legislativo 5/2004, de 5 de Março e Real Decreto 1776/2004, de 30 de Julho.

[16] Assinada em Madrid, em 26 de Outubro de 1993, aprovada, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República nº 6/95, em 29 de Junho de 1994, e publicada no Diário da República em 28 de Janeiro de 1995 (Decreto do Presidente da República nº 14/95).

[17] Cf. “Modelo de Convenção sobre o Rendimento e o património, Comité dos Assuntos Fiscais”, Cadernos Ciência e Técnica Fiscal nº 210, p. 46 e 47.

[18] As Convenções sobre dupla tributação, Cadernos de Ciência e Técnica fiscal nº 179, Centro de Estudos Fiscais, Lisboa 1998, p. 231.

[19] Leia-se 15º da Convenção celebrada entre a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre o rendimento e o capital, (idêntico ao art. 15º das outras Convenções assinadas por Portugal e outros Estados, designadamente com a Espanha, e tendo como modelo o artigo 15º da Convenção Modelo OCDE).

[20] Direito Tributário Internacional, pág. 434 (trata-se da 1º edição).

[21] Pelo que no caso em julgamento, em que o tribunal aceitou a qualificação do sujeito passivo como residente em Portugal por aplicação do art. 16º, nº 2 do CIRS, mas permanecera na Alemanha mais de 183 dias, a Alemanha podia também, nos termos convencionais, tributar (como tributou) os rendimentos que ele aí obteve, existindo, assim, uma competência tributária cumulativa de Portugal e da Alemanha, cabendo ao Estado da residência - Portugal - eliminar a dupla tributação jurídica internacional, mediante a aplicação do mecanismo previsto no art. 24º nº 1 da Convenção, isto é, deduzindo ao imposto pago em Portugal uma importância igual ao imposto que foi pago na Alemanha, com o limite de dedução aí previsto.

[22] “Dupla tributação internacional em IRS, notas de uma leitura de jurisprudência”, in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano 1º, nº 1, pp. 111 a 127.

[23] Ponto 7 do referido comentário (ibidem, p. 124 a 127).

[24] Insiste ainda na importância de não se ignorar o Modelo da OCDE, que é fonte de tais convenções (e, em especial, os seu comentários (in RFPDF, ano 1, nº 1, p. 127). De realçar que, como visto acima, a tradução efectuada pelo Centro de Estudos Fiscais, e publicada em 2010 nos Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal (nº 210), é a seguinte: «Não obstante o disposto nº número 1, as remunerações obtidas por um residente de um Estado contratante de um emprego exercido no outro Estado contratante são tributadas exclusivamente no primeiro Estado mencionado se: (...)» (sublinhado nosso).

[25] Segundo declaração do Requerente, não inteiramente confirmada documentalmente (cf. 12.2.).