Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 555/2015-T
Data da decisão: 2016-04-26  IRC IRS  
Valor do pedido: € 851.969,02
Tema: IRC/IRS – Retenção na fonte; remuneração dos administradores/gerentes; notas de compensação, juros indemnizatórios
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Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado por acordo dos outros Árbitros), Prof. Doutor Diogo Leite de Campos e Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro, designados, respectivamente, pela Requerente e pela Requerida, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 01-12-2015, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

 

A… SGPS, S.A, Pessoa Colectiva n.º … e com sede social em Rua…, n.º…, …, …, … –… Lisboa, veio apresentar pedido de anulação das liquidações de IRS (retenção na fonte) que constam dos documentos n.ºs 2015…, 2015 … e 2015 … e respectivas notas de compensação, acrescidas de juros indemnizatórios.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

A Requerente procedeu à designação de árbitro, Prof. Doutor Diogo Leite de Campos, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do RJAT.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-09-2015.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6 e do n.º 3 do artigo 11.º do RJAT e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do mesmo diploma, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro a Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro.

Os árbitros designados designaram o terceiro árbitro, Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa, nos termos do artigo 11.º, n.º 4 do RJAT.

Os signatários designados para integrar o presente Tribunal Arbitral colectivo aceitaram as designações, nos termos legalmente previstos.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 02-11-2015.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 01-12-2015.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em defendeu a improcedência dos pedidos.

Em 11-02-2016, realizou-se uma reunião em que as Partes foi produzida prova testemunhal e acordado que o processo prosseguisse com alegações escritas.

As Partes apresentaram alegações.

O Tribunal Arbitral é competente e foi regularmente constituído.

Partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e a Requerente tem legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas excepções.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a.                  A Requerente A…– SGPS SA, tem como objecto a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indirecta de exercício de actividades económicas;

b.                 A sociedade encontra-se constituída sob a forma de sociedade anónima com o capital social de € 71.000,00 (representado por 71.000 acções ordinárias, nominativas ou ao portador, com o valor nominal de 1 euro cada), totalmente subscrito, com a seguinte estrutura accionista:

c.                   Em 30-09-2009, a Requerente adquiriu a sociedade G… SA, NIPC…, com uma participação no capital de 100% (doravante a sociedade será designada por “G…”);

d.                 Em 16-09-2009, a Requerente adquiriu a H… UNIPESSOAL LDA, NIPC…, com uma participação no capital de 100% (doravante a sociedade será designada por “H…”);

e.                  A G… foi constituída, por escritura pública em 2002-10-16, sob a forma de sociedade por quotas, tendo dado início de actividade a 01-04-2003, sendo o capital inicial integralmente realizado em dinheiro foi de 6.000,00 Euros, dividido da seguinte forma:

– I…, quota de € 2.835,00;

– F…, quota de € 2.835,00

– J…, quota de € 330,00;

f.                   O objecto social da G… consistia na “prestação de serviços de consultoria na área da gestão, formação profissional e prestação de serviços de gestão empresarial”, tendo em 19-04-2006, sido alterado para “prestação de serviços de consultoria em equipamentos e programação informática, bancos de dados e formação profissional”;

g.                  Em 08-02-2007, as sócias gerentes da G… I… e F…, renunciaram à gerência, tendo, no mesmo dia, sido designados os novos membros de órgãos sociais:

– B… (NIF…);

– C… (NIF…);

h.                 Em 22-02-2007, foram efetuadas as seguintes alterações ao contrato da sociedade da G…:

– Transmissão de Quotas: Resultante da divisão da quota do sócio J…, no valor de € 330,00, em duas quotas de € 165,00, sendo as mesmas transmitidas para B… e C…;

– Transmissão de Quotas: A quota de € 2.835,00 da sócia I… foi transmitida para C…;

– Transmissão de Quotas: A quota de € 2.835,00 da sócia F… foi transmitida para B…;

i.                    I… e F…, são cônjuges, respectivamente de B… e C…;

j.                   Após a transmissão de quotas, o capital social da sociedade G… que se manteve no valor de € 6.000,00, ficou com a seguinte estrutura (Cf. Anexo VIII, pág. 4 do Relatório de Inspecção):

– B…- Quota - € 3.000,00

– C…- Quota - € 3.000,00;

k.                 Em 13-04-2007, foi efectuada outra alteração ao contrato da sociedade G…, com a transmissão de duas quotas no valor de € 150,00, cada uma, resultante da divisão das quotas de € 3.000,00, dos sócios B… e C…, para o novo sócio D…, ficando este com uma quota de € 300,00, e os outros dois sócios, designadamente, B… e C…, com uma quota de € 2.850,00,cada um;

l.                    Em 19-05-2008, foi efectuado o registo na Conservatória do Registo Comercial de …, do aumento do capital, da transformação da sociedade G… em sociedade anónima e foram designados os órgãos sociais, mantendo-se o objecto social;

m.               Por deliberação de 08-04-2008 foram designados os seguintes órgãos sociais para o Conselho de Administração:

– Presidente -B…,

– Vogal – C…;

n.                 Por deliberação de 08-04-2008, foi realizado um aumento da capital social da G…, no montante de € 44.000,00, tendo sido realizado 43.800,00 por incorporação de reservas livres e € 200,00, pela entrada de dois novos sócios, F… e E…, com a quantia de € 100,00, cada um;

o.                  F… e E…, são familiares de C… e B…, respectivamente, cônjuge e pai;

p.                 Assim, a sociedade G… encontra-se constituída sob a forma de sociedade anónima com o capital social de € 50.000,00 (representado por 50.000.00 ações ordinárias, nominativas ou ao portador, com o valor nominal de 1 euro cada), totalmente subscrito, com a seguinte estrutura accionista:

q.                 Sobre as razões económicas subjacentes à decisão de transformação da sociedade G… foi questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira o sócio C…, que referiu o seguinte:

“(…) as sociedades por quotas estão, fundamentalmente, vocacionadas para a organização da pequena empresa, revelando pouca maleabilidade no que respeita:

a) a centros de decisão;

b) à captação de investimentos;

c) à mobilidade do capital e à capacidade de respostas que é necessário revelar nas solicitações do dia a dia.

As sociedades anónimas são as que melhor se adaptam à estrutura da nossa empresa em crescente desenvolvimento, através da maleabilidade de gestão e à concentração dos poderes de gestão no órgão de administração, com facilidade:

a) nas decisões rápidas e independentes;

b) na organização da empresa.

A Gestão considerou que o desenvolvimento empresarial da sociedade devia ser acompanhado por uma modificação substancial da estrutura jurídica, de forma a conferir maior flexibilidade na sua actuação quotidiana (…)”;

r.                  Desde o seu início de actividade até ao exercício de 2009, a sociedade G… não procedeu à distribuição de resultados pelos sócios/accionistas;

s.                   A partir do exercício de 2008 o resultado líquido desta empresa sofre um acréscimo, que coincide com o exercício em que se começou a desenhar a sucessão de actos económicos já referidos;

t.                   Após a sua aquisição pela A…, a G…, passou a distribuir dividendos à sua única acionista, A…- conforme quadro abaixo:

 

  1. Os contratos então celebrados, mais o valor entregue em espécie pelos sócios totalizavam os seguintes montantes:

– Contrato celebrado entre a A… e o acionista B…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 3.358.300,00 (total de ações – 23.650);

– Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e o acionista C…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 3.118.178,00 (total de ações – 21.959);

– Contrato celebrado entre a A…e o acionista D…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 595.122,00 (total de ações – 4.191);

– Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e o acionista E…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 14.200,00 (total de ações – 100);

– Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e a acionista F…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 14.200,00 (total de ações – 100);

– Valor global das ações: € 7.100.000,00;

– Condições de pagamento (conforme Cláusula Segunda) - “(…) a liquidar no todo ou em parte no prazo máximo de 10 (dez) anos, conforme as partes venham a acordar.”

v.                  O preço das acções foi justificado com o resultado da avaliação efectuada pela Sociedade de Revisores Oficiais de Conta, K…, NIPC…, com referência a 31-12-2008, e concluído em 12-05-2009.

w.                A Requerente não possuía capacidade financeira para proceder ao pagamento de € 7.100.000,00, não dispunha de liquidez, capitais próprios de valor suficiente, nem recorreu a financiamento para o efeito;

x.                  Em 16-09-2009, foi constituída a sociedade unipessoal por quotas com o capital social de € 5.000,00, integralmente realizado em dinheiro, representado por uma quota de igual valor nominal pertencente à sócia única A…- SGPS, SA;

y.                  A gerência da sociedade encontra-se a cargo de B… e C…;

z.                  A H… passou a distribuir dividendos à sua única accionista - A…- SGPS, no exercício de 2012, de acordo com o seguinte quadro:

aa.              Em 06-07-2012, reuniu a Assembleia Geral da sociedade comercial unipessoal por quotas H…, com a finalidade de deliberar sobre a distribuição de dividendos do exercício de 2011, que se encontravam contabilizados como resultados transitados, no valor de € 153.391,12 e proceder à distribuição de dividendos antecipados do exercício de 2012, no montante de € 250.000,00, à accionista única A… SGPS, perfazendo o total de € 403.391,12, transferidos no referido exercício;

bb.             Em 22-06-2009, foi apresentada a registo a constituição da sociedade A…- SGPS, SA, na Conservatória do Registo Comercial, tendo dado início de actividade em 30-06-2009;

cc.               A Requerente A… SGPS não possui qualquer colaborador e, nos exercícios de 2009 a 2012, não constam quaisquer custos com o pessoal registados contabilisticamente, nem, à data em que finalizou o procedimento de inspecção, a sociedade havia entregue qualquer anexo J/Modelo 10;

dd.             A Requerente A… SGPS não presta qualquer serviço às suas participadas quer através de um quadro de pessoal próprio, quer pelo recurso a serviços de terceiros contratados para o efeito;

ee.               A única actividade da Requerente A… SGPS registada contabilisticamente consiste na distribuição de dividendos que recebe das suas participadas;

ff.                Os administradores/gerentes nomeados pela G… e pela H… foram remunerados, no decurso dos seus mandatos, em sede de IRS – categoria A (Trabalho Dependente), pela G…, detida a 100% pela A… SGPS, não auferindo, de acordo com as actas das Assembleias Gerais qualquer remuneração pelo exercício das funções inerentes ao cargo de gerentes da Requerente;

gg.              A Requerente presentava os seguintes Balanços para os exercícios 2009 a 2012:

Balanço a 2009-12-31:

https://lh3.googleusercontent.com/VU7X3BuV3GZcuN1-I91RqTe7tlK9E70buwPRruSle51HIo6iG6EfH9UjqRrpACxeabkTtuhNy8nylmzCLZELBxj-LoSF_ehiOju0sMcVckh3H7uJ_R_FskL6odvG-_7CVtBP5o9h7kHtK9i3eg

hh.             Antes da aquisição das participações correspondentes a 100% do capital social da G…, por € 7.100.000,00, a sociedade apresentava uma situação líquida de € 49.937,60;

ii.                  O mapa de fluxos de caixa da Requerente nos anos de 2010 a 2012 é o seguinte:

https://lh3.googleusercontent.com/7LsC-I8vHdG22BZFCVEMKeIGD61pl8IIKINB0q1CDD9XvIgEyKOeFP6WjDlUVIsg5hc1tc-h8LpaCRzbQ7G6t_EIZWLERloenFg1iUd-XZyGUGMO95PQE_Gx2iYN7zFf8AA43On4C6DNlokcpg

jj.                 Para além de algumas aplicações de tesouraria, a actividade da Requerente é limitada à ”gestão” de dividendos pagos pelas suas participadas, os quais são visivelmente canalizados para remuneração dos sócios (campo A 5318 vs campo A 5329);

kk.             Durante os exercícios de 2010 a 2012, os valores transferidos da Requerente, para os seus accionistas e os registos contabilísticos efectuados em resultado dessas transferências foram os constantes no quadro que se segue:

ll.                  Nos exercícios de 2010, 2011 e 2012, os accionistas da Requente, receberam como pagamento do valor em dívida respeitante à aquisição das acções da G… (nos referidos exercícios), o montante de € 3.262.500,00;

mm.         O pagamento das quantias referidas não foi onerado com o pagamento de qualquer imposto;

nn.             A coberto das ordens de serviço n.º s OI2014…, OI2014… e OI2014…, dirigidas à A…– SGPS SA, foram efectuadas acções inspectivas de âmbito parcial, visando o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e Retenções na Fonte de IRS;

oo.              O procedimento de inspecção teve início em 21-07-2014, com a assinatura das respectivas ordens de serviço e termo em 10-09-2014;

pp.             No final da inspecção referida foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do Processo Administrativo, parte 1, cujo teor se dá como reproduzido, que foi notificado à Requerente em 23-12-2014, em que se refere, além do mais, o seguinte:

I - Conclusões da Ação Inspetiva

No decurso do presente procedimento de inspeção foram analisados atos e negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos por meios artificiosos e com abuso das formas jurídicas, à redução de impostos que seriam devidos sem a utilização desses meios, que constituem fundamento para proceder à aplicação da norma legal antiabuso prevista no n.º 2 do artigo 38.º da Lei Geral Tributária (LGT).

Em face da aplicação do n º 2 do artigo 38.º da LGT, resultam da acão inspetiva efetuada à A…-SGPS.SA, NIPC…, as seguintes correções em matéria tributária:

Quadro 1 - Correções do imposto em falta - Retenções na Fonte de IRS

(...)

Dos factos apurados durante o procedimento inspetivo, e em concreto sobre as razões económicas invocadas pelos administradores, subjacentes à transformação da sociedade por quotas, em sociedade anónima, importa relevar o seguinte:

Concordamos que a decisão de transformação de uma sociedade por quotas numa sociedade anónima, considerando os gastos que esta decisão tem associados, deverá estar relacionada, e tal como refere o sujeito passivo, com a abertura do capital a novos investidores, munindo as empresas de sustentabilidade financeira num mercado global. Por outro lado, a estrutura de Administração definida para estas entidades, caracterizada pela criação de um concelho de Administração e nomeação de um Presidente, permite concentrar os poderes de gestão num órgão de administração, com facilidade nas decisões rápidas e independentes.

Concordamos igualmente que a estrutura da sociedade anónima é aquela que melhor se adapta a uma empresa em crescente desenvolvimento.

Porém, no caso em concreto, não se verificaram as alterações que poderiam motivar/justificar o ónus da transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima, e que aliás são apontadas pelo sujeito passivo. Vejamos:

— Não se verificou um aumento de capital social, que permitisse dotar esta entidade de uma sustentabilidade financeira, que não tinha à data. Constata-se que o aumento de capital que existiu antes do processo de transformação foi efetuado à custa da incorporação de reservas, na verdade apenas existiu uma entrada de capital efetiva de € 200,00 (cf Ata junta ao anexo IX);

— Por outro lado, não existiu, de facto, uma abertura de capital a novos investidores. Repare-se que para perfazer o número mínimo de cinco acionistas, entram nesta sociedade E… (pai de B…- acionista maioritário) e F… (cônjuge de C…- o outro acionista maioritário) e cuja participação representa 0,2% do capital social, e

— Quanto à "maleabilidade da gestão e à concentração dos poderes de gestão no órgão de administração referido pelos administradores, assistimos que esta continua a ser desempenhada, de facto, pelos acionistas maioritários: B… e C…, os quais passam de gerentes para administradores. Não existiu portanto, qualquer alteração nos órgãos de gestão.

Sem questionar as razões económicas da decisão de transformação de sociedade por quotas em sociedade anónima por parte dos detentores do capital e decisores, parece aceitável que perante esta realidade a AT conclua, que neste caso em concreto, esta decisão não foi acompanhada das alterações societárias que permitiriam a esta sociedade munir-se de uma melhor performance competitiva.

(...)

A 30 de Setembro de 2009 (data em que o s.p adquiriu a G…, SA), foram celebrados os contratos de compra e venda de ações entre a sociedade A…SGPS e cada um dos acionistas da sociedade G… (ver quadro 2), para aquisição da totalidade das ações representativas do capital social da G… que cada um possuía (Anexo XII, 19 págs).

Não foram elaboradas quaisquer atas relativas à decisão de aquisição e condições de aquisição da G…, que evidenciassem as razões e objetivos deste negócio.

Note-se, que as mais-valias obtidas com a sua alienação onerosa das partes de capital encontravam-se, à data dos factos, excluídas de tributação em sede de IRS nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 10 º do CIRS (redação à data).

Isto é, caso não tivesse ocorrido a transformação da sociedade por quotas, em sociedade anónima, este negócio de alienação das partes de capital tinha resultado na tributação da mais-valia fiscal, que no caso em concreto, considerando a tributação autónoma à taxa de 10%, prevista no artigo 72.º do CIRS (redação à data), teria sido, no total, € 709 380,00, como se demonstra a seguir:

Este negócio levanta de imediato as seguintes questões:

i) Qual é a lógica empresarial da venda das participações sociais ao sujeito passivo sem que exista uma verdadeira alteração societária, criando uma dívida que poderá revelar-se impeditiva de uma verdadeira reestruturação/reorganização empresarial, quando pode optar por outras alternativas, designadamente a permuta de ações?

ii) Se de facto a motivação era a reorganização empresarial, mantendo a estrutura societária igual, qual o sentido do sujeito passivo (A…SGPS), adquirir participações sociais quando as pode permutar, beneficiando do regime de neutralidade fiscal, previsto no art.º 73.º n.º 5 e n.º 10.º do CIRC?

iii) Por outro lado, atendendo que a entidade adquirida e a entidade adquirente têm em comum os mesmos detentores de capital, isto é, na prática assistimos a um negócio em que vendedores e compradores são os mesmos, porquê definir o valor de alienação tão elevado para esta transação, se na prática, quem compra é quem vende?

iv) Caso não tivesse ocorrido a transformação, a alienação das partes sociais (quotas), teria sido pelo mesmo montante? Sabendo que tais valores estariam sujeitos a tributação, que tal como se determinou no quadro supra, ascenderia a € 709 380,00?

v) Por fim, qual o sentido económico de efetuar este negócio de compra e venda de ações, quando a função típica deste negócio é transmitir a "propriedade"? Face ao exposto, parece lógico que a Administração Fiscal possa concluir que este negócio visou criar artificiosamente uma dívida, que permite remunerar os detentores do capital até ao limite de €7.100.000,00, sem qualquer tributação.

Os contratos então celebrados, mais o valor entregue em espécie pelos sócios totalizavam os seguintes montantes (Anexo XII, 19 págs):

> Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e o acionista B…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 3.358.300,00 (total de ações -23650);

> Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e o acionista C…: preço unitário por ação de 1142,00, preço global de € 3.118.178,00 (total de ações - 21.959);

> Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e o acionista D…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 595.122,00 (total de ações-4.191);

> Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e o acionista E…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 14.200,00 (total de ações - 100);

> Contrato celebrado entre a A…- SGPS SA e a acionista F…: preço unitário por ação de € 142,00, preço global de € 14 200,00 (total de ações -100);

> Valor global das ações: € 7.100.000,00;

> Condições de pagamento (conforme Cláusula Segunda) - "(...) a liquidar no todo ou em parte no prazo máximo t/e 10 (dez) anos, conforme as partes venham, a acordar."

O preço das ações foi justificado com o resultado da avaliação efetuada pela Sociedade de Revisores Oficiais de Conta, K…, NIPC…, com referência a 2008-12-31, e concluído em 2009-05-12.

Relativamente às condições de pagamento acordadas, é de salientar o seguinte:

a) Como veremos adiante, as contas da sociedade A… SGPS SÁ, constituída em 2009-06-22, revelavam que esta não possuía capacidade financeira para proceder ao pagamento de € 7.100.000,00, não dispunha de liquidez, capitais próprios de valor suficiente, nem recorreu a financiamento para o efeito.

b) Os alienantes e acionistas da A… SGPS SA, ficam credores em relação a esta do preço das ações alienadas na qualidade de acionistas da G…, o valor em dívida tem a natureza de dívida a terceiros - outros credores (que por sinal são também acionistas da A… SGPS SA), o que é reconhecido contabilisticamente movimentando a conta … - Outros Credores Diversos.

Vejamos, que não só o negócio de alienação das partes de capital da G… à A… SGPS SA, não é tributado, como, tendo subjacente as condições particulares traçadas nos contratos, é constituída nesta ultima uma dívida para com os seus acionistas no montante de € 7.100.000,00, que lhe permite serem remunerados até esse montante, sem tributação, na medida que os pagamentos efetuados, tomam a veste de pagamento do preço das ações, ao invés de dividendos.

• Da criação da H…- UNIPESSOAL LDA - NIPC…

A sede da sociedade é coincidente com a sede da A- SGPS SA, NIPC…, em Rua…, N.º …, …-… LISBOA (Anexo XIII, 4 págs).

Em 2009-09-16, foi constituída a sociedade unipessoal por quotas com o capital social de € 5.000,00, integralmente realizado em dinheiro, representado por uma quota de igual valor nominal pertencente à sócia única A…- SGPS, SA A gerência da sociedade encontra-se a cargo de B…, NIF … e C…, NIF … (Anexo XIV, 7 págs).

A H… passou a distribuir dividendos à sua única acionista - A…- SGPS, no exercício de 2012, de acordo com o seguinte quadro:

Na data de 2012-07-06, reuniu a Assembleia Geral da sociedade comercial unipessoal por quotas H…, com a finalidade de deliberar sobre a distribuição de dividendos do exercício de 2011, que se encontravam contabilizados como resultados transitados, no valor de € 153.391,12 e proceder à distribuição de dividendos antecipados do exercício de 2012, no montante de € 250000,00, à acionista única A… SGPS, perfazendo o total de € 403.391,12, transferidos no referido exercício (Anexo XV, 3 págs).

(...)

Decorridos 4 anos da transação das partes sociais e por conseguinte da constituição da SGPS, que se revelou um elemento fundamental para evitar a tributação da remuneração dos acionistas, os detentores do capital já receberam € 3 262 500,00, livres de qualquer imposto (vide quadro 10 deste Relatório)

Estas importâncias conforme referido, não foram objeto de qualquer tributação e tiveram origem nos lucros distribuídos pela G…, e no exercício de 2012, também pela sociedade G…, que por sua vez são a única fonte de liquidez da A… SGPS, Vejamos que em algumas situações existem mesmo coincidência de datas (meses) - em anexo consta o quadro demonstrativo da distribuição de dividendos das referidas sociedades à A… SGPS (Anexo XVIII, 12 págs.):

 

Fonte: Atas, extratos da conta … e documentos de suporte

(a) O valor excedente é aplicado na subscrição de produtos financeiros considerados de baixo risco. designadamente "Caixa …", da CGD

(b) O pagamento aos acionistas não ocorre exatamente nestes dias, mas ainda durante o mês de Julho e o restante no início de Setembro

Por fim, salienta-se, que assistimos em algumas das situações à deliberação de dividendos antecipados à sociedade A… SGPS, de forma a assegurar o pagamento aos detentores do capital, fazendo as Atas referência a "dada a necessidade de remunerar os detentores do capital" (cf. afãs 16, 22 (G…) - Anexo XI e ata 5 (H…) - Anexo XV). Note-se, que a atividade da SGPS nos exercícios em análise, se resume a gerir os pagamentos aos sócios, através da liquidez gerada pela distribuição de dividendos das suas participadas, alguns destes antecipados, e a fazer algumas aplicações de tesouraria com o valor remanescente.

III.2 - Do Direito

(...)

III.2.1 - Apreciação Do Caso Concreto

Os factos relatados, e mais a sequência com que estes foram desenhados, resulta numa evidente vantagem fiscal, objetivamente, na anulação do imposto que os detentores do capital teriam que pagar, caso as importâncias que efetivamente receberam, não tivessem tomado a veste de pagamento de preço das partes de capital, mas sim, o recebimento de dividendos. Na verdade, assistimos a uma remuneração dos detentores do capital, sem qualquer tributação, utilizando para tal.

(i) a transformação da sociedade G… LDA, em sociedade anónima, permitindo que na alienação a mais-valia obtida, de realização das partes de capital desta sociedade à sociedade A… SGPS, independentemente do valor atribuído, ficasse afastada de tributação;

(ii) A criação da SGPS, para que, através da alienação das partes da capital da sociedade G… à sociedade A… SGPS SA, fosse constituída uma dívida aos detentores do capital no montante de € 7.100.000,00, garantindo a sua remuneração, sem qualquer tributação;

(iii) A utilização instrumental da sociedade A… SGPS S.A., para a remuneração dos detentores de capital através do recebimento de dividendos sob a veste do pagamento do preço das ações.

Ora, é entendimento de CASALTA NABAIS, que o recurso às normas gerais antiabuso, se revela necessário e útil, pois para o Autor, "tanto os indivíduos como as empresas podem, designadamente, verter a sua ação económica em atos jurídicos e atos não jurídicos de acordo com a sua autonomia privada guiando-se mesmo por critérios de elisão ou evitação dos imposto (tax avoidance) ou de aforro fiscal, desde que, por uma tal via, não se violem as leis fiscais nem se abuse da (liberdade de) configuração jurídica dos factos tributários, provocando evasão fiscal ou fuga aos impostos através de puras manobras ou disfarces jurídicos da realidade económica (tax evasion). Manobras e disfarces estes contra os quais se procura lutar presentemente através do recurso seja a cláusulas especiais seja a cláusulas gerais antiabuso, como as existentes actualmente no nosso sistema jurídico fiscal."

Analisando a norma transcrita no subcapítulo III.2 e seguindo a jurisprudência recente sobre esta matéria, designadamente vertida em Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul (vide acórdãos do TCA Sul Processos n.º 4255/10 de 2011-02-15 e n.º 5104/11 de 2012-02-14), que segue o instituído na obra de GUSTAVO LOPES COURINHA, conclui-se que a mesma encerra quatro pressupostos que carecem de ser provados para que a Autoridade Tributária (AT) a possa aplicar, são eles:

- A forma utilizada - elemento meio;

- A vantagem fiscal e a equivalência económicas obtidas - elemento resultado;

- A motivação do contribuinte - elemento intelectual;

- A reprovação normativo - sistemática da vantagem obtida - elemento normativo;

Ora, da avaliação de todos os elementos que foram dados a conhecer ao procedimento é possível, em consideração com as condições referidas, identificar:

1) Elemento meio

Em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 38º da LGT foram utilizados "...actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos...à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico...."

O elemento meio corresponde à via escolhida pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal, isto é os atos e ou negócios jurídicos celebrados cuja estrutura se encontra determinada em função de um dado resultado fiscal, que não se verificaria caso estes não tivessem ocorrido com os contornos que ocorreram.

No caso em apreço, como se descreverá de seguida, os acionistas da A…SGPS/G… recorreram a um conjunto de atos e negócios jurídicos que tiveram como resultado transformar um fluxo financeiro sujeito a imposto, nos termos da al. h) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS (o pagamento de dividendos aos acionistas da A… SGPS), noutro fluxo financeiro não sujeito (o pagamento do preço determinado no negócio de aquisição da G…).

Iremos pois, cronologicamente, descrever os passos seguidos pelos acionistas para alcançar o resultado fiscal pretendido:

1. Em 2008-05-19, foi efetuado o registo na Conservatória do Registo Comercial de … do aumento do capital, da transformação da sociedade G… em sociedade anónima e foram designados os órgãos sociais, mantendo-se o objeto social, cfr. anteriormente referido.

2. A sociedade gestora de participações sociais A… SGPS foi constituída por deliberação de 2009-05-25, registada na CRC em 2009-06-22 e iniciou atividade em 2009-06-30, com o capital social de € 71.000,00 integralmente subscrito, de acordo com o quadro 1 deste Relatório, sendo os seus 5 acionistas, comuns à G…;

3 A 30 de Setembro de 2009, três meses depois do início de actividade da A… SGPS, foram celebrados os contratos de compra e venda de ações da G… S.A;

4. O preço global definido foi de € 7.100.000,00;

5. As características particulares deste negócio foram: o diferimento do pagamento do preço "(...) a liquidar no todo ou em parte no prazo máximo de 10 (dez) anos, conforme as partes venham, a acordar."

6 A A… SGPS como sociedade gestora de participações sociais, vocacionada para o exercício de gestão de participações, não dispunha (nem dispõe) de capacidade financeira para a celebração de um negócio desta magnitude;

7. A sociedade G… não distribuiu qualquer resultado pelos seus sócios/accionistas antes do exercício de 2009. Entre 2009 e 2012, distribuiu € 4.093.448,20 para a sociedade A… SGPS, sendo que esta sociedade, neste momento, e em montante similar, inicia o pagamento aos detentores de capital, do valor da dívida gerada, aquando do contrato de alienação das partes sociais.

8. Por esta forma, os pagamentos efetuados aos detentores do capital da A… SGPS, no montante de 3.262.500,00, ficam excluídos de qualquer tributação, por quanto "vestem" a forma de pagamento por conta do contrato de alienação das partes ao invés de dividendos.

É manifesto que os atos e negócios jurídicos realizados pelos sujeitos passivos não são típicos nem normais na gestão de empresas efetuada com base na racionalidade económico-financeira.

Só é possível compreender esta sucessão de atos e negócios jurídicos no contexto da procura de um determinado resultado fiscal (a não tributação da distribuição de dividendos).

As condições contratuais do negócio determinadas aquando da alienação das partes sociais, designadamente, o valor estabelecido bem como o prazo para o pagamento, assim como todos os atos praticados previamente, nomeadamente a transformação da sociedade alienada em sociedade anónima e a criação da sociedade SGPS, inserem-se na lógica do esquema desenhado pelos acionistas da G…, e tiveram como objectivo a transformação do pagamento de dividendos no pagamento do preço de venda das ações acordado, obtendo assim estes detentores do capital, uma remuneração sem qualquer

Estas condições contratuais, só foram possíveis porque os acionistas /decisores são comuns a ambas as sociedades (aliás a sua percentagem de participação na A… SGPS, é exatamente a mesma na G…) - vide quadros 1 e 2 deste Relatório.

Para além de se tratar de uma sucessão de negócios atípicos, no contexto da racionalidade económica e financeira como já foi amplamente referido, releva-se ainda que esta não era de todo necessária para obter os fins desejados pelos acionistas/decisores. Isto é, tal como referido pelos administradores (Anexo XVII), querendo estes com a constituição da sociedade A… SGPS alcançar a constituição de um grupo económico, que permitisse enfrentar os desafios de uma economia global, dotando as sociedades que o compõe de um maior dinamismo, assegurado por uma sociedade que reunisse as participações sociais, facilitando assim, a conquista de novos mercados e a captação de novos investimentos, será que não existiam outras alternativas a esta sucessão de negócios?

É que o ato ou negócio praticado não poderá cair no âmbito da cláusula se o contribuinte não pôde efetivamente optar por outra via, ou se no caso desta outra via existir a mesma, seja habitual ou normalmente usada.

Como exemplifica GUSTAVO LOPES COURINHA, se por exemplo um dado contribuinte é forçado a uma determinada atuação, porque exigências de certa natureza o determinaram - por exemplo, cumprir com exigências de leis anti-trust, que podem exigir cisões de sociedades, ainda que daí decorra uma clara vantagem fiscal, não se pode falar de ato livre ou optativo. Mais do que uma justificação económico-jurídica para o(s) atos(s) praticado(s), ocorre uma efetiva inexistência de opção, que é pressuposto sine qua non da atuação elisiva, tal qual prevê a cláusula gerai antiabuso. Conclui o Autor que nestes casos, o elemento meio não se verifica.

Pois bem, veiamos:

(i) A sociedade A… SGPS, constituída pelas razões invocadas, poderia ter adquirido a sociedade G… Lda, antes, ou sem que tivesse existido, a transformação em sociedade anónima?

Ora, como dispõe o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 495/88 de 30 de dezembro, as SGPS's podem adquirir e deter quotas ou ações de quaisquer sociedades nacionais ou estrangeiras, nos termos da lei. Aliás a sociedade A… SGPS, para além de deter 100% do capital da sociedade G… SA, detém ainda 100% do capital de outras duas sociedades, por quotas: H… LDA e L… LDA (cf. quadro 7). Conclui-se assim que não existia qualquer obrigatoriedade de transformar a sociedade G… Lda em sociedade anónima.

(ii) Existia outra possibilidade da sociedade G…S.A. passar a ser detida pela sociedade A…SGPS, sem que tivesse ocorrido o negócio de alienação de partes sociais?

Perante a situação líquida da empresa, e atendendo aos objetivos desejados pelos acionistas através da constituição desta sociedade, seria economicamente bem mais razoável optar, designadamente, por realizar o capital da sociedade A…SGPS, através de entradas em espécie (partes de capital), ou através de permuta de ações, operação esta que beneficia dos privilégios do "regime de neutralidade fiscal" consignados no Código do IRC, precisamente, porque o legislador quis desonerar de tributação as operações de transformação, reorganização e reestruturação, quando estamos perante razões económicas válidas. Estas duas alternativas evitavam a criação de um passivo, que pelo valor em causa (€7.100.000,00), pode afastar investidores.

(iii) Por fim, qual é a lógica empresarial da venda das participações sociais ao sujeito passivo, criando artificiosamente uma dívida que poderá revelar-se impeditiva de uma verdadeira reestruturação/reorganização empresarial, quando as pode permutar?

Não existindo qualquer alteração à estrutura societária, não se vislumbra qualquer necessidade na prática de negócios jurídicos de compra e venda de participações sociais tendo em vista as operações de reorganizações societárias, quando o próprio legislador no artigo 73.º do CIRC abre a porta às reorganizações através do mecanismo das permutas de participações sociais que gozam de neutralidade.

Conforme refere o artigo 73.º n.º 5 do CIRC;

"(...) 5- Considera-se permuta de partes sociais a operação pela qual uma sociedade (sociedade adquirente) adquire uma participação no capital social de outra (sociedade adquirida), que tem por efeito conferir-lhe a maioria dos direitos de voto desta última, ou pela qual uma sociedade, já detentora de tal participação maioritária, adquire nova participação na sociedade adquirida, mediante a atribuição aos sócios desta, em troca dos seus títulos, de partes representativas do capital social da primeira sociedade e, eventualmente, de uma quantia em dinheiro não superior a 10% do valor nominal ou, na falta de valor nominal, do valor contabilístico equivalente ao nominal dos títulos entregues em troca."

Onde, por sua vez, o n.º 10 do mesmo artigo refere:

"(...) 10 - O regime especial estabelecido não se aplica, total ou parcialmente, quando se conclua que as operações abrangidas pelo mesmo tiveram como principal objectivo ou como um dos principais objectivos a evasão fiscal, o que pode considerar-se verificado, nomeadamente, nos casos em que as sociedades intervenientes não tenham a totalidade dos seus rendimentos sujeitos ao mesmo regime de tributação em IRC ou quando as operações não tenham sido realizadas por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou a racionalização das actividades das sociedades que nelas participam procedendo-se então, se for caso disso, As correspondentes liquidações adicionais de imposto"5

Pelo que não se trata de um negócio substancialmente válido, a alienação de ações intra grupo. Ora, qual é o sentido de se alienar as participações, quando podiam permutar as participações sociais? É que não passa em qualquer teste de lógica empresarial o sujeito estar adquirir participações sociais, quando as pode permutar

Ou seja, se A pode trocar com B, qual é o sentido de A vender a B? Qual é o sentido de vender as participações, quando toda a estrutura societária se mantêm igual? Criar artificiosamente uma dívida? Está-se perante uma situação que desvirtua à luz da lei fiscal e societária as operações de reorganização.

É, na verdade, patente que a aludida compra e venda das ações não logra o efeito benigno que constitui o timbre das operações de reorganização. Por outro lado, a função típica do negócio, de compra e venda, consiste na transmissão da propriedade de uma coisa.

É inequívoco que os acionistas não quiseram celebrar a compra e venda de ações, porquanto esta do ponto vista societário é inócua, não trazendo qualquer aporte na cadeia de valor do grupo.

Ademais, observando o ato de venda das participações de uma forma isolada e existindo operações sucedâneas, isto é, igualmente idóneas (adequadas) para alcançar o mesmo suposto fim (jurídico-económico), o sujeito passivo escolheu aquela que é fiscalmente ineficiente, na medida em que pela permuta das participações poderia gozar de neutralidade fiscal na operação pretendida.

Com efeito, só se justifica a compra e venda das participações sociais com o único fito de obter, a final, um ganho superior em termos fiscais.

Por outro lado, é evidente que a questão da revalorização das ações e posterior venda, não se afigura como um ato de gestão societária que tenha uma válida motivação económica ou empresarial. Ou seja, não faz sentido a sociedade revalorizar e vender as participações sociais, quando "compradores e vendedores", são os mesmos.

Daí que nestas situações, até a neutralidade da permuta das participações sociais constantes do artigo 73.º do CIRC, permita a troca das participações pelo seu valor nominal e não pelo valor de mercado, não existindo qualquer necessidade de revalorizar as participações sociais, que coincidem com o montante do reembolso ou pagamento da dívida.

Porém, a verdade, é que, se os decisores não tivessem optado por desenhar este negócio, não seria possível criar um crédito junto da sociedade A…SGPS, de forma a permitir obter uma remuneração afastada de qualquer tributação. Pois, se os dividendos distribuídos pelas sociedades participadas à sociedade SGPS, beneficiavam da exclusão de tributação, prevista até ao exercício de 2010, no artigo 32.º do EBF, e a partir desta data, sujeita aos requisitos do artigo 51.º do CIRC (redação à data), a verdade é que a distribuição de dividendos aos detentores do capital, qualquer que seja a sociedade, estão sempre sujeitos a tributação nos termos da al. h) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS.

2) Elemento resultado

Conforme refere o n.º 2 do artigo 38º da LGT, os atos ou negócios jurídicos "anómalos" deverão ser "essencial ou principalmente dirigidos à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios...".

Em suma, o elemento resultado consiste na vantagem fiscal conseguida através do elemento meio utilizado pelo sujeito passivo, que no caso em apreciação consistiu na transformação de um fluxo financeiro - a distribuição de dividendos, sujeitos a IRS nos termos da al. h) do n c 2 do artigo 5.c do CIRS, noutro fluxo, o pagamento do valor em dívida a cada vendedor/acionista relativo ao preço determinado no negócio de aquisição das partes sociais da G…, do qual, mais uma vez se refere, não decorre qualquer tributação.

Equivalência do resultado dos atos e negócios celebrados com os atos e negócios normais de efeito económico equivalente

Se os acionistas pretendessem realizar os atos e negócios pelo seu fim económico, decorrente dos ganhos de competitividade, eficiência e massa critica obtidos, quer pela constituição da SGPS, quer pela concentração das participações sociais na esfera desta, teriam ao seu dispor atos e negócios normais de efeito económico equivalente e/mas providos de racionalidade económica. Assim, seria normal, por exemplo, constituir para esse efeito uma sociedade com capitais próprios de montante suficiente para proceder à aquisição de participações sociais deste montante, ou a obtenção de financiamento com capitais alheios para o efeito, ou a subscrição do capital social inicial através de entradas em espécie consubstanciada nas participações sociais, ou até a permuta de ações, mas ao invés foi antes decidido adquirir as ações por um valor 142 vezes superior ao seu valor de balanço, criando um crédito de €7.100.000,00.

Verificando-se que a SGPS não possui estrutura física, financeira e humana, capaz de providenciar os fins para os quais foi constituída, é legítimo concluir que a razão da sua existência não é mais que meramente instrumental. A atividade da G… em nada se alterou com esta interposição de uma SGPS entre si e os seus acionistas, antes diretos e agora indiretos, alterou-se sim a forma de distribuição de dividendos, feita à A… SGPS (que beneficia da eliminação da dupla tributação económica nos termos da al. c) do n.º1 do artigo 51.º do CIRC e até ao exercício de 2010 inclusive, nos termos do artigo 32.º do EBF), em vez de diretamente aos acionistas individuais tributada pelo disposto na al. h) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS.

Salienta-se que não estão em causa as razões económicas da constituição da SGPS, mas sim o seu caráter instrumental com vista à remuneração dos acionistas e consequente incremento da sua capacidade contributiva sem qualquer tributação.

No caso concreto a artificialidade da constituição da SGPS, da revalorização das ações, do financiamento da SGPS (através do pagamento diferido e ausência de fundos) e da compra e venda das participações, constituem o conjunto de atos que levam à ineficácia do ato de pagamento do preço para efeitos tributários, devendo caracterizar-se como uma distribuição de dividendos.

Isto é, se os detentores do capital não tivessem optado por efetuar tal negócio de alienação de partes de capital, pelo valor e nas condições definidas, não seria possível criar um crédito na sociedade A… SGPS, que permitisse "simular" o pagamento de dividendos através do pagamento do preço das ações alienadas.

Tivessem os atos e negócios sido celebrados sob formas típicas e normais, a A… SGPS faria a distribuição desses dividendos aos seus acionistas, que aliás, em condições típicas e normais esperariam obter esse resultado - a remuneração do capital investido - dos seus investimentos, sendo esses rendimentos de capitais sujeitos a IRS nos temos da al. h) do n.º2 do artigo 5,º do C1RS.

Do Resultado - a vantagem fiscal obtida

Assim, durante os exercícios de 2009 a 2012, foram transferidos da A… SGPS, para os seus acionistas € 3.262.500,00, desonerada de qualquer tributação. A distribuição destes dividendos é indiciadora da intenção de eliminar a tributação, pretensão dos acionistas da A… SGPS /G…, alcançada através dos atos e negócios jurídicos acima descritos.

É por isso evidente o resultado pretendido - receber dividendos da A... SGPS, como se de outra realidade (pagamento de valor em dívida), se tratasse, com vista ao afastamento da tributação do "negócio/ato real"

Releva-se mais uma vez, no sentido de comprovar que esta sucessão de negócios foi dirigida à eliminação da tributação da remuneração dos detentores do capital, que:

(i) Os detentores do capital só começaram a ser remunerados, depois de constituído o crédito na sociedade A… SGPS. A partir deste momento os resultados gerados nas sociedades participadas por esta, inclusivamente os resultados transitados, começaram a ser distribuídos aos detentores do capital, por via da sociedade A… SGPS, sob a veste de pagamento do preço das ações adquiridas;

(ii) Existe coincidência entre o momento do recebimento dos dividendos distribuídos pelas participadas à sociedade A… SGPS e o posterior pagamento aos detentores do capital, em algumas das situações conforme demonstrado no quadro 11, a data é coincidente;

(iii) Por vezes, para assegurar a remuneração aos acionistas, recorre-se à deliberação da distribuição de dividendos antecipados.

Face ao exposto, podemos concluir que os acionistas da A… SGPS receberam efetivamente desta, lucros e adiantamentos por conta de lucros, sem que sobre eles impendesse qualquer carga fiscal, nos seguintes montantes:

Em resultado da correcção proposta, por efeito da aplicação da norma anti-abuso, os valores recebidos, a título de pagamento da dívida, são considerados rendimentos de capitais (Cat. E). Face ao exposto, o enquadramento fiscal, o momento em que a sua tributação deve ocorrer e a tributação dos dividendos e adiantamentos por conta de lucros recebidos são os seguintes:

a. São sujeitos a IRS nos termos da al. h) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS;

b. Nos termos do artigo 7.º, n.º 3, al. a), ponto 2 do CIRS, a retenção na fonte deve ocorrer no momento "em que são colocados à disposição dos seus titulares".

c. Os lucros e adiantamentos por conta de lucros recebidos por pessoas singulares estão sujeitos a retenção na fonte, a título definitivo, à taxa liberatória de 20% - art.º 71, n.º 3, al. c) do CIRS, (redacção em vigor até Março de 2010), 21,5% - art.º 71.º n.º 1, al. c) do CIRS (redação em vigor até Dezembro de 2011), 25% - art.º 71.º n.º 1, al. c) do CIRS (redação em vigor até Outubro de 2012) e 26,5%- art.º 71.º n.º 1, al. c) do CIRS (redação em vigor até Dezembro de 2012), no momento em que são pagos, ou colocados a disposição, pelo que não serão tributados na esfera dos seus beneficiários (neste caso os acionistas que os receberam).

d. A entidade retém o imposto devido que deve ser entregue ao Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que foi deduzido, conforme dispõe o art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 42/91, de 22 de Janeiro, o n.º 3 do artigo 98.º e al. a) do n º 2 do artigo 101 º do CIRS.

De acordo com o exposto o total de imposto não retido na fonte e não entregue foi de € 760.950.00. conforme quadro abaixo:

 

3) Elemento intelectual

Ainda de acordo com o n.º 2 do artigo 38 º da Lei Geral Tributária: "(...) São ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas."

Nos termos da norma transcrita, exige-se que a escolha e forma adotada pelo sujeito passivo seja fiscalmente dirigida (tax driven) à obtenção da vantagem fiscal.

Assim, seguidamente demonstrar-se-á que a escolha da forma feita pelo sujeito passivo, na pessoa de seus administradores, foi motivada por razões fiscais, ou seja, só as razões fiscais explicam a opção seguida por estes. Para o demonstrar iremos provar que os atos e negócios realizados que conduziram à vantagem fiscal ilegítima, não são usuais entre agentes económicos independentes, não seguiram as formas e condições usualmente utilizadas, nem tiveram um resultado em linha com o pretendido em negócios similares.

No contexto da integração europeia foi, através do Decreto-Lei n.º495/88 de 30 de Dezembro (regime jurídico das SGPS), criado o regime legal das Sociedades Gestoras de Participações Sociais, de forma a desenvolver condições que facilitassem e incentivassem a constituição de grupos económicos mais capazes de enfrentar a concorrência que advinha da entrada no Mercado Único.

No seu preâmbulo é referido que este regime "visa, em conformidade, proporcionar aos empresários um quadro jurídico que lhes permita reunir numa sociedade as suas participações sociais, em ordem à sua gestão centralizada e especializada."

Temos então que na génese da criação de uma sociedade gestora de participações sociais esta a criação de um grupo económico e a sua gestão mais eficiente e eficaz, permitindo desta forma, por exemplo, o financiamento do grupo como um todo e a prestação de serviços de apoio às participadas que tornem o grupo mais ágil e com melhores condições para enfrentar a concorrência crescente, ao nível interno e europeu.

Faria então sentido, seria típico e normal, a criação de uma sociedade gestora de participações sociais para (i) adquirir por€ 7.100.000,00, (ii) sem meios financeiros para tal, (iii) participações sociais representativas de uma só sociedade, (iv) sendo os acionistas e as respetivas quotas exatamente as mesmas que as da sociedade a adquirir, (v) sem dotar a SGPS de meios físicos e humanos para a gestão das participações que adquiriu?

Pretenderam os acionistas da G…, através da criação da A… SGPS e posterior aquisição da G…, criar e dotar um grupo económico de condições de financiamento e fornecimento de serviços capazes de incrementar a competitividade das sociedades do grupo?

Os factos indiciam o contrário, como se percebe do adiante enunciado:

A A… SGPS criou um grupo económico ao centralizar as participações das entidades G…, H… e L…, estas duas já criadas após a constituição da sociedade A… SGPS SA.

Porém não centralizou em si o financiamento e o fornecimento de serviços ao mesmo. Não criou condições económico-financeiras para efetuar esse financiamento, nem criou a estrutura operacional capaz de centralizar e prestar serviços às suas participadas.

Mas antes, essa sociedade conforme se constata pela análise das Demostrações Financeiras, e em concreto o Mapa de Fluxos de Caixa, apenas se limita a gerir os dividendos gerados pelas participadas e a distribuir os mesmos, livre de tributação aos seus detentores do capital.

Por outro lado, vejamos o negócio de alienação das partes de capital da sociedade G… à sociedade A… SGPS SA.

Ainda que o preço da transação seja coincidente com a avaliação efetuada da sociedade G… pela consultora K…, com referência a 2008-12-31 e concluída em 2009-05-12, a verdade é que sociedade A… SGPS, constituída com apenas € 50.000,00 de capital social (valor mínimo para constituição de uma SGPS), adquire em 2009-09-30, a G…, por um valor que supera em 142 vezes o seu capital social (€ 7.100.000,00), não definindo quaisquer condições concretas de pagamento, além de um deferimento no prazo de 10 anos e o registo do crédito relativo a cada acionista como uma dívida da sociedade A… SGPS.

Será que tal seria possível entre entidades independentes, reguladas pelo mercado e não pelo estímulo da remuneração sem tributação?

Porém, atendendo à forma como o negócio foi desenhado, foi criado o crédito, pela aquisição de uma sociedade de que eram já diretamente proprietários. Por outro lado, a administração e os acionistas da G… alteraram radicalmente a política de distribuição de lucros aos acionistas - até ao exercício 2008 a G… não tinha procedido a qualquer distribuição de lucros, a partir dessa data e até ao final do exercício de 2012, distribuiu €4.093.448,20 (2009 até 2012).

Destes lucros, € 3.262 500,00, durante os exercícios de 2010 a 2012, foram posteriormente transferidos para os acionistas da G… / A… SGPS, como contrapartida do crédito que tinham criado na A… SGPS, livre de qualquer tributação.

Percebe-se assim que com esta sucessão de negócios jurídicos, a A… SGPS foi instrumentalizada, com vista à transformação de um fluxo - os dividendos - em outro - o pagamento de uma dívida - criado com o propósito único de permitir a eliminação da carga fiscal associada ao recebimento de dividendos. Mais acresce, que os custos associados à constituição e existência da SGPS (v.g. capital social, emolumentos, impostos, pagamento de serviços a R.O.C., T.O.C.), só são compensados com o pressuposto da vantagem fiscal obtida, porque outra não se vislumbra.

Uma operação com estas características: a criação de uma SGPS que se predispõe a adquirir participações sociais no valor de € 7.100.000,00, sem possuir nem liquidez, nem capitais próprios para o efeito e que não recorre a qualquer meio de financiamento para efetuar o pagamento do valor em dívida, não poderia ter outro objetivo ou consequência que não fosse fiscal e não poderia ter sido praticada por qualquer outra sociedade que não uma criada pelos mesmos acionistas da sociedade a adquirir, com a mesma percentagem de participação no capital da sociedade adquirida e com um objetivo preciso e instrumental: permitir a transformação de um fluxo monetário tributado, em outro fluxo monetário não tributado.

4) Elemento Normativo

O n.º 2 do artigo 38 º da Lei Geral Tributária refere também que:

"...por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas... (essencial ou principalmente dirigidos) à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico"

A este elemento subjaz a desconformidade do resultado obtido com a ratio legis, o espírito ou propósito da lei, os princípios do Código em causa ou do Sistema Fiscal.

Em suma, trata-se de, num exercício reflexivo, demonstrar que, apesar de a letra da lei permitir que o ato ou o negócio realizado proporcione os efeitos fiscais desejados, a intenção da lei e/ou do Direito rejeita a sua obtenção, e como tal, o resultado obtido. Também quanto a este elemento, dúvidas não existem de que o mesmo se verifica no caso em análise, porquanto a Constituição e a lei fiscal pressupõem a tributação segundo a capacidade contributiva.

Os impostos de acordo com o n.º 1 da Lei Geral Tributaria "assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património", não pode por isso a simples redenominação de um rendimento obtido, proveniente da atividade exercida por uma sociedade da qual são acionistas, não ser tratado como tal ~ um rendimento. Os acionistas da G…/A… SGPS receberam dividendos provenientes da G… canalizados para a sociedade A…SGPS (que por meios artificiosos "transformaram" em pagamento de uma dívida), sem que sobre eles impendesse qualquer imposto.

Os princípios subjacentes ao sistema fiscal consagrados nos artigos 103.º e 104.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como as normas de incidência previstas concretamente no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, pretendem a tributação dos rendimentos efetivamente obtidos No caso em concreto é evidente o aumento da capacidade contributiva dos detentores do capital, sendo que, com recurso a meios artificiosos, tais incrementos são afastados de tributação.

Parece-nos evidente que sendo a Lei Fiscal um corolário da CRP, no que concerne à equidade e justiça fiscal, não era pretensa do legislador, quer com a exclusão de tributação das mais-valias na alienação de acções detidas há mais de 12 meses, prevista no artigo 10.º n.º 2 do CIRS, apenas revogado com a Lei 15/2010, de 26/07, quer com os benefícios atribuídos às SGPS em vigor à data dos factos, permitir o aproveitamento por parte dos agentes económicos, no sentido da redução da tributação devida.

Relativamente aos rendimentos da categoria E - rendimentos de capitais - prevê o n.º 1 do artigo 5.º do CIRS que "consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, directa ou indirectamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respectiva modificação, transmissão ou cessação, com excepção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias."

Ora no caso em apreço, os sujeitos passivos obtêm um rendimento, recebido da A… SGPS, procedente dos lucros obtidos pela sociedade G… distribuídos à A… SGPS, mas que denominaram "pagamento de dívida" de forma a obviar à sua tributação, como se demonstrou.

De realçar que a subsunção do caso concreto à norma foi realizada tendo por base uma análise crítica e conjugada, segundo juízos de experiência comum e de normalidade social, económica e financeira dos factos e elementos recolhidos que, com razoável segurança, patenteiam a natureza abusiva do planeamento fiscal do sujeito passivo.

III.3 Fundamentação da Aplicação da Norma Anti-abuso

Nas definições elaboradas por SALDANHA SANCHES, "Os limites do planeamento fiscal", Coimbra editora, 2006, pág. 21, o planeamento fiscal legítimo "consiste numa técnica de redução da carga fiscal pela qual o sujeito passivo renuncia a um certo comportamento por este estar ligado a uma obrigação tributária ou escolhe, entre as várias soluções que lhe são proporcionadas pelo ordenamento jurídico aquela que, por ação intencional ou omissão do legislador fiscal, está acompanhada de menos encargos fiscais". Por outro lado, o planeamento fiscal ilegítimo "consiste em qualquer comportamento de redução indevida, por contrariar princípios ou regras do ordenamento jurídico-tributário, das onerações fiscais de um determinado sujeito passivo".

Ora,

De acordo com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 04255/10, de 15 de fevereiro de 2011:

(...) As normas anti-abuso encontram a sua "raison d'être" no comportamento evasivo e fraudatório dos sujeitos passivos em matéria fiscal ... e na necessidade de estabelecer meios de reacção adequados por fornia a garantir o cumprimento do princípio da igualdade na repartição da carga tributária e na prossecução da satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas (cfr. artº. 103, nº.1, da C.R. Portuguesa).

... Isso porque é inerente à racionalidade económica a minimização dos impostos a suportar, podendo utilizar-se várias vias para atingir tal desiderato, embora a fronteira de distinção entre elas nem sempre seja fácil de vislumbrar e nesse sentido são seguidas normalmente as vias da gestão ou planeamento fiscal da evasão ou elisão fiscal e da fraude fiscal.

(...) A evasão ou elisão fiscal, dá-se pela prática de actos ou negócios licitou mas que a lei fiscal qualifica como não sendo conformes com a substância da realidade económica que lhe está subjacente, assim devendo qualificar-se como anómalos, anormais ou abusivos ... e dos comportamentos tributários evasivos resulta um sério entrave à concorrência empresarial, uma notória erosão das receitas fiscais, a distorção do princípio da equidade e um claro menosprezo do cumprimento das regras de cidadania, situações que se fundam em causas de carácter político, económico, psicológico e técnico. E as formas utilizadas giram em torno de actos e contratos atípicos ou anormais visando tornear a lei... ou interpretando-a com fins diversos daqueles que o legislador tinha em mente (...)

(...) É em vista de tais situações que os Estados se preocupam com a tomada de medidas visando combater os comportamentos evasivos e fraudatórios dos sujeitos passivos através das designadas cláusulas específicas anti-abuso ...e cláusulas gerais anti-abuso (de que ó exemplo a norma contida no art. 38, nº. 2, da L.G.Tributária)."

Face a todo o exposto e ambicionando uma prática normativamente racionalizada do direito, entende-se estarem verificadas as condições para que se possa lançar mão do mecanismo previsto no n.º 2 do artigo 38º da LGT, acima transcrito.

Resulta então da presente informação que estão cumpridos os pressupostos procedimentais previstos n.º 3 do artigo º 63.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário para aplicação da disposição prevista no n.º 2 do artigo 38.º da LGT, concretamente:

a) Descrição do negócio jurídico celebrado ou do ato jurídico realizado e dos negócios ou atos de idêntico fim económico, bem como indicação das normas de incidência que se lhes aplicam.

b) A demonstração de que sucessão de negócios jurídicos celebrados ou a prática dos atos jurídicos foi essencialmente ou principalmente dirigida à redução, eliminação ou deferimento temporal de impostos que seriam devidos em caso de negócio ou ato jurídico com idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais.

 

qq.             Em 10-12-2014, o Senhor Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira proferiu despacho autorizando a liquidação de tributos à Requerente com aplicação do disposto no artigo 38.º, n.º 2, da LGT, com base no Relatório da Inspecção Tributária (página 27 do Processo Administrativo, parte 1);

rr.               A Requerente foi notificada para exercer o direito de audição com base no projecto do Relatório da Inspecção Tributária, mas não o exerceu;

ss.                Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as seguintes liquidações de IRS e juros compensatórios, que foram anuladas em 22-04-2015:

– através do documento n.º…, nos valores de € 178.450,00 e € 30.890,71, de IRS e juros compensatórios, respectivamente,  relativas ano de 2010;

– através do documento n.º…, nos valores de € 163.400,00 e € 22.689,62, de IRS e juros compensatórios, respectivamente, relativas ano de 2011;

– através do documento n.º…, nos valores de € 419.100,00 e € 37.438,69, de IRS e juros compensatórios, respectivamente, relativas ano de 2012; (documento n.º VI junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);  

tt.                 Em 24-04-2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a certidão cuja cópia consta do documento VII junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, que «face aos elementos disponíveis no sistema informático de gestão e controlo de processos de execução fiscal, que A…- SGPS SA, NIF…, tem a sua situação tributária regularizada, uma vez que não é devedor perante a Fazenda Pública de quaisquer impostos, prestações tributárias ou acréscimos legais»;

uu.             Posteriormente, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu as seguintes liquidações de IRS (retenções na fonte), que foram notificadas à Requerente em 02-05-2015:

– relativamente ao ano de 2010, a liquidação de IRS n.º 2014…, datada de 29-04-2015, no valor de € 178.450,00, e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2015…, 2015 … e 2015…, no valor global de € 30.890,71, de que resultou o valor total a pagar de € 209.340,71 (identificação de documento n.º 2015…);

– relativamente ao ano de 2011, a liquidação de IRS n.º 2014…, datada de 29-04-2015, no valor de € 163.400,00, e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2015… e 2015…, no valor global de € 22.589,62, de que resultou o valor total a pagar de € 186.089,62 (documento n.º 2015…);

– relativamente ao ano de 2012, a liquidação de IRS n.º 2014…, datada de 29-04-2015, no valor de € 419.100,00, e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2015…, 2015 … e 2015…, no valor global de € 37.438,69, de que resultou o valor total a pagar de € 456.538,69 (documento n.º 2015…, junto pela Requerente em 24-03-2016);

vv.              Em 2010, a empresa M…, SA, desenvolveu diligências junto da Requerente, durante um período temporal de 6 meses, para aquisição de parte do seu capital, tendo em vista a detenção da G…, que era a empresa principal detida pela Requerente, diligências essas que se materializaram, em finais de 2010, na sua avaliação em € 13.500.000,00 e no acordo que consta do documento n.º XIII junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, só não se tendo concretizado a aquisição devido à crise política e financeira gerada que culminou com a intervenção da troika e diminuição do grau de confiança do investimento, que teve como consequência não ser interessante para aquela empresa deter acções de empresas portuguesas no seu portfolio (depoimentos das testemunhas N… e O…);

ww.          O grupo M…, SA, é um dos maiores grupos polacos que se expandiu internacionalmente, tendo interesse pelo tipo de software criado pela G… e interesse em deter uma empresa em Portugal pelo acesso ao mercado lusófono (depoimento da testemunha N…);

xx.              A empresa P…, por volta de 2008 ou 2009 esteve interessada na aquisição da G…, que sugeriu a criação de uma SGPS (depoimento da testemunha Q…);

yy.              A criação da SGPS foi motivada essencialmente por ser normal no tipo de empresas tecnológicas a criação de grupos, para crescimento com novas aquisições, por ser benéfico em termos de imagem como sinal de organização a estruturação e por permitir segmentar os negócios, diluindo os riscos com a criação de empresas especializadas, como veio a ocorrer com a criação de duas empresas pela Requerente, como accionista único (a H…em 2009 e a L…, LDA em 2012) (depoimentos das testemunhas O… e R…);

zz.               Desde 2009, houve várias tentativas de a Requerente adquirir participações sociais numa empresa angolana e de entrar no mercado do Brasil que acabaram por não se concretizar pela situação de crise portuguesa (depoimentos das testemunhas O… e S…);

aaa.          A Requerente, pelos negócios em que estava envolvida tinha capacidade de contrair um empréstimo e receber a totalidade da quantia de que necessitou para adquirir as participações que adquiriu e pagar a totalidade aos accionistas, logo em 2009 (depoimento da testemunha O…);

bbb.        Apesar de, por opção dos accionistas, a Requerente não ter trabalhadores e os seus administradores serem remunerados pela G…, foram pela Requerente prestados serviços, sem lhes ser atribuído valor, que se traduziram nos bons resultados obtidos pela G... e pela H… (depoimento da testemunha O…);

ccc.           A Requerente foi constituída através de entrada em espécie (permuta de acções) quanto a 1% do capital (depoimento da testemunha O…);  

ddd.        A avaliação da G… foi efectuada pela empresa de revisão de contas K…, com base em previsões de lucros para os cinco anos seguintes que foram muito inferiores aos que vieram de facto a verificar-se nesses cinco (depoimento da testemunha O…);  

eee.           Presentemente a Requerente tem cerca de € 7.000.000,00 de capitais próprios que na maioria configuram valores distribuíveis aos sócios (depoimentos das testemunhas O… e R…);

fff.             Os valores distribuíveis da G… aos sócios/accionistas antes do exercício fiscal de 2009, representavam o montante de € 383.698,02 (Documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

ggg.          Os pagamentos das dívidas da Requerente para com os seus accionistas foram efectuados de acordo com o quadro 13 do Relatório da Inspecção Tributária, cujo teor se dá como reproduzido;   

hhh.        Em 12-10-2015, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados

 

Não se provou que a Requerente tivesse efectuado o pagamento das quantias liquidadas.

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos do processo administrativo e nos juntos pela Requerente, bem como as testemunhas inquiridas, nos pontos referidos.

As testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento pessoal dos factos sobre que depuseram.

 

3. Matéria de direito

 

O processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa declarar a ilegalidade de actos dos tipos indicados no artigo 2.º do RJAT e eliminar os efeitos jurídicos por eles produzidos, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele].

Por isso, sendo o acto de liquidação praticado pela Administração Tributária o objecto do processo, tem de se apreciar a sua legalidade à face dos seus precisos termos, tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. São, assim, irrelevantes fundamentações invocadas a posteriori, após o termo do procedimento tributário em que foi praticado o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida ([1] ).

            No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira, no Relatório da Inspecção Tributária subjacente à liquidação impugnada, decidiu aplicar a cláusula geral antiabuso à Requerente, pelas seguintes razões, em suma:

 

a.                  Em 19-05-2008, a sociedade G… LDA foi transformada de sociedade por quotas em sociedade anónima, permitindo que na alienação a mais-valia obtida de realização das partes de capital desta sociedade à sociedade A… SGPS, independentemente do valor atribuído, ficasse afastada de tributação;

b.                 Em 30-09-2009, foi criada a Requerente, uma SGPS, «para que, através da alienação das partes da capital da sociedade G… à sociedade A… SGPS SA, fosse constituída uma dívida aos detentores do capital no montante de € 7.100.000,00, garantindo a sua remuneração, sem qualquer tributação»;

c.                  «A utilização instrumental da sociedade A… SGPS S.A., para a remuneração dos detentores de capita] através do recebimento de dividendos sob a veste do pagamento do preço das ações».

 

            Segundo se refere no RIT, a Autoridade Tributária e Aduaneira entende «no caso em concreto, não se verificaram as alterações que poderiam motivar/justificar o ónus da transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima, e que aliás são apontadas pelo sujeito passivo», ocorrida em 2008, que permitiu, depois, em 2009, a alienação de acções sem qualquer tributação a título de mais-valias.

            Para além disso, entendeu a Autoridade Tributária e Aduaneira que não tem lógica empresarial a venda das participações sociais à Requerente «sem que exista uma verdadeira alteração societária, criando uma dívida que poderá revelar-se impeditiva de uma verdadeira reestruturação/reorganização empresarial, quando pode optar por outras alternativas, designadamente a permuta de ações», «beneficiando do regime de neutralidade fiscal, previsto no art.º 73.º n.º 5 e n.º 10.º do CIRC».

A Autoridade Tributária e Aduaneira questiona ainda o valor elevado desta transacção, quando «a entidade adquirida e a entidade adquirente têm em comum os mesmos detentores de capital» e concluiu que «este negócio visou criar artificiosamente uma dívida, que permite remunerar os detentores do capital até ao limite de €7.100.000,00, sem qualquer tributação».

Refere ainda a Autoridade Tributária e Aduaneira, «no sentido de comprovar que esta sucessão de negócios foi dirigida à eliminação da tributação da remuneração dos detentores do capital», que «os detentores do capital só começaram a ser remunerados, depois de constituído o crédito na sociedade A… SGPS», que «existe coincidência entre o momento do recebimento dos dividendos distribuídos pelas participadas à sociedade A… SGPS e o posterior pagamento aos detentores do capital» e que «por vezes, para assegurar a remuneração aos acionistas, recorre-se à deliberação da distribuição de dividendos antecipados».

Assim, entendeu a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuar uma correcção que se traduziu em «por efeito da aplicação da norma anti-abuso, os valores recebidos, a título de pagamento da dívida, são considerados rendimentos de capitais (Cat. E)», no «momento em que a sua tributação deve ocorrer e a tributação dos dividendos e adiantamentos por conta de lucros».

 

4. Questões de caducidade

 

A Requerente coloca duas questões de caducidade: uma relativa à liquidação de 2010; a outra relativa à própria aplicação da cláusula geral antiabuso.

 

4.1. Caducidade do direito de liquidação relativa ao ano de 2010

 

A primeira questão colocada é a da caducidade do direito de liquidação quanto à liquidação referente ao ano de 2010, que foi efectuada em 29-04-2015.

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que «inexiste qualquer caducidade quanto à aplicação da cláusula geral antiabuso», porque «porquanto os actos preparatórios ou instrumentais, não conferem o desiderato de início de contagem do prazo de caducidade da liquidação».

Esta argumentação da Autoridade Tributária e Aduaneira reporta-se à questão da caducidade da cláusula geral antiabuso e não à questão da caducidade do direito de liquidação referente ao ano de 2010.

O artigo 45.º, n.º 1, da LGT estabelece que «o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro».

Nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, o prazo de caducidade conta-se, nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou o facto tributário.

É este o termo inicial do prazo de caducidade e não a prática de quaisquer actos.

Por outro lado, «o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo do seu início, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação» (artigo 46.º, n.º 1, da LGT).

Não se verifica qualquer outra causa de suspensão da caducidade.

 

Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo adoptada no acórdão de 03-04-2013, processo 0103/12, o prazo de caducidade «suspende-se com a notificação ao contribuinte de início de acção inspectiva externa, mas esse efeito suspensivo cessa caso esta ultrapasse o período de seis meses contados a partir daquela notificação» e «se a acção inspectiva se concluir antes de decorridos aqueles seis meses, o efeito suspensivo do prazo de caducidade mantém-se até à notificação ao contribuinte da conclusão do procedimento inspectivo, pela elaboração do relatório final».

A notificação do Relatório da Inspecção Tributária ocorreu em 23-12-2014, pelo que o período de suspensão da caducidade é de 155 dias, entre 21-07-2014 e 23-12-2014 (datas de início da inspecção e notificação do Relatório da Inspecção Tributária).

Assim, o prazo de caducidade do direito de liquidação relativo ao ano de 2010 terminou em 03-06-2015, pelo que, tendo a liquidação sido notificada em 02-05-2015 [alínea uu) da matéria de facto fixada], tem de se concluir que foi efectuada dentro do prazo de caducidade.

            Assim, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão da caducidade do direito de liquidação relativamente ao ano de 2010.

 

            4.2. Questão da caducidade do direito de aplicar cláusula geral antiabuso

 

O artigo 63.º, n.º 3 do CPPT, originariamente, dispunha que o procedimento de aplicação da cláusula geral antiabuso apenas podia ser aberto “no prazo de três anos após a realização do acto ou da celebração do negócio jurídico objecto da aplicação das disposições antiabuso”.

Na redacção introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, que entrou em vigor em 1-1-2009, aquele artigo 63.º, n.º 3, passou a estabelecer que o procedimento de aplicação de normas antiabuso “pode ser aberto no prazo de três anos a contar do início do ano civil seguinte ao da realização do negócio jurídico objecto das disposições antiabuso”.

Com a redacção dada a este artigo 63.º pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, deixou de se prever qualquer prazo especial para início do procedimento de aplicação da cláusula geral antiabuso.

A Requerente defende, em suma, que

– «a abertura do procedimento inspectivo da figura jurídico – tributária da cláusula geral anti-abuso, em razão do momento da realização do negócio ou acto jurídico subjacente»;

– que à sucessão de redacções daquelas normas deve ser aplicado o regime do artigo 12.º, n.º 3, da LGT e que, no caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou como actos subjacentes a aplicação da cláusula geral antiabuso a criação da Requerente, em 22-06-2009, e a posterior celebração dos contratos de compra e venda de acções da G… SA, em 30-09-2009;

– que nos termos dos artigos 12.º, n.º 3 e 55.º, ambos da LGT, 63.º n.º 3 do CPPT (à data dos factos, actos e negócios jurídicos em análise, segundo a configuração e enquadramento dados pela própria AT), bem como, dos Princípios da previsibilidade e estabilidade fiscais (artigo 1.º e 103.º da CRP) e princípio da justiça e segurança no procedimento tributário (artigo 266.º e 268.º da CRP), os serviços competentes da Autoridade Tributária e Aduaneira, deveriam ter suscitado e iniciado o procedimento de aplicação da cláusula geral anti-abuso no período temporal de três anos, ou seja, até à data de 22-06-2012 (registo na sociedade A… SGPS, SA) ou até à data de 30-09-2012 (celebração do contrato de compra e venda de acções);

– os serviços competentes da Autoridade Tributária e Aduaneira, apenas iniciaram o procedimento inspectivo de aplicação da cláusula geral anti-abuso, na data de 21-07-2014.

 

Como resulta do teor expresso daquele n.º 3 do artigo 63.º do CPPT, o prazo nele referido conta-se com base na «realização do negócio jurídico objecto das disposições anti-abuso» e não dos actos materiais posteriores que necessários para assegurar vantagem patrimonial. Por isso, não tem a ver com este prazo no último acto necessário para assegurar a vantagem fiscal.  

O artigo 12.º, n.º 1, da LGT estabelece que “as normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor” e, no que concerne às normas sobre procedimento e processo, dispõe o n.º 3 que estas “são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes”.

Em 2009, quando ocorreram os factos que a Requerente indica como subjacentes a aplicação da cláusula geral antiabuso, já estava em vigor a redacção do n.º 3 do artigo 63.º do CPPT introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, pelo que o prazos para o início do procedimento de aplicação da cláusula geral antiabuso terminaria em 31-12-2012, termo do terceiro ano «a contar do início do ano civil seguinte ao da realização do negócio jurídico objecto das disposições anti-abuso».

Porém, em 01-01-2012, data da entrada em vigor da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, antes de se verificar a caducidade derivada da aplicação deste n.º 3, ele foi revogado pelo artigo 153.º desta Lei.

Como resulta daquele n.º 3 do artigo 12.º da LGT, o limite à aplicação imediata da norma procedimental que era o n.º 3 do artigo 63.º da LGT são garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes.

A fixação de um prazo para abertura de um procedimento não implica, só por si, a constituição de um direito na esfera jurídica do sujeito passivo, derivada da extinção de um direito potestativo – de abertura do procedimento de aplicação de norma antiabuso – na esfera jurídica do sujeito activo. A certeza e a segurança jurídica conferida com a caducidade do direito apenas se constituí se o prazo transcorrer sem que o direito potestativo seja exercido, pelo que só se este já tivesse decorrido na totalidade é que se poderia considerar que existiam “garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes”.

  De resto, é a esta conclusão que conduzem os princípios gerais sobre a aplicação da lei no tempo.

            Como ensina BAPTISTA MACHADO, o problema da aplicação da lei no tempo consubstancia-se na determinação da lei competente, devendo distinguir-se «entre factos determinantes da competência da lei aplicável e os factos abrangidos no campo de aplicação (nas hipóteses normativas) da lei competente». «Não são quaisquer factos que determinam a competência da lei aplicável, mas só os factos constitutivos (modificativos e extintivos) de situações jurídicas. Pelo que a teoria do facto passado, enquanto critério determinativo da competência da lei nova e não dos factos a que esta se aplica, deverá ser reformulada nos seguintes termos: a lei nova não se aplica a factos constitutivos (modificativos e extintivos) verificados antes do seu início de vigência – no sentido de que será retroactiva sempre que se aplique a factos passados por ela própria assumidos ou visados como factos constitutivos (ou modificativos, ou extintivos) de situações jurídicas. Mas já nada impede que, uma vez determinada a competência da lei nova com fundamento na circunstância de o facto constitutivo da situação jurídica se passar sob a sua vigência, a mesma lei seja aplicada a factos passados que ela assume como pressupostos impeditivos ou "desimpeditivos" (isto é, como pressupostos negativos ou positivos) relativamente à questão da validade ou admissibilidade da constituição da situação jurídica, questão essa que é da sua exclusiva competência». ([2])

  A extinção do direito de Autoridade Tributária e Aduaneira iniciar procedimento de aplicação da cláusula geral antiabuso depende do decurso de um determinado período de tempo e, enquanto esse período de tempo não se esgota, está-se perante uma situação em curso de extinção.

  Perante uma sucessão de leis reguladoras de uma situação jurídica em curso de extinção, se essa situação não se extinguiu durante a vigência da lei antiga, a lei competente para determinar o regime da sua extinção (inclusivamente a sua não extinção) é a lei nova.

  Sobre este tipo de situações, na lição de BAPTISTA MACHADO ([3]), podem formular-se as seguintes regras, no que aqui interessa:

 

     1.ª A lei nova é competente para regular a extinção das situações jurídicas cujo processo extintivo ainda não estava concluso no momento da sua entrada em vigor, o que implica que possa, sem retroactividade:

a) recusar a possibilidade de extinção da situação jurídica;

b) considerar irrelevantes para efeitos de extinção da situação jurídica factos passados sob o domínio da lei antiga que, em face desta lei, eram havidos como factos virtualmente extintivos;

c) exigir novas condições para a extinção da situação jurídica em causa.

 

No caso em apreço, a Lei n.º 64-B/2011 veio eliminar a extinção do direito de instaurar procedimento para aplicação da cláusula geral antiabuso, pelo que a nova lei é aplicável a todas as situações em que anteriormente se previa a extinção que ainda não estivessem extintas.

Assim, não estando extinto o direito de Autoridade Tributária e Aduaneira instaurar sendo, não existe qualquer restrição à aplicação imediata da norma que afasta a caducidade do direito de instaurar procedimento para aplicação da cláusula geral antiabuso.

Por isso, deixou de ser aplicável a Requerente o referido prazo especial de caducidade do direito de aplicação da cláusula geral antiabuso.

E não sendo aplicável aquele prazo para início do procedimento, não é aplicável também qualquer outro, pois não está previsto na legislação posterior a 01-01-2012, o que se reconduz a que o exercício dos direitos da Autoridade Tributária e Aduaneira apenas fique limitado temporalmente pelo prazo de caducidade do direito de liquidação. Mas, este prazo aplicação à própria liquidação e sua notificação e não à instauração do procedimento para aplicação da cláusula geral antiabuso.

Improcede, assim, o vício de caducidade do direito de instaurar procedimento para aplicação da cláusula geral antiabuso invocado pela Requerente.

 

5. Preterição de formalidades legais

 

5.1. Ofensa dos princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica

 

A Requerente defende, em suma, o seguinte:

 

– foi surpreendida na data de 02-05-2015 com a notificação para pagamento de 3 notas de liquidação, sobre os mesmos exercícios fiscais (2010, 2011 e 2012), sobre o mesmo imposto e sobre os mesmos factos tributários;

– não compreende qual o procedimento inspectivo e respectivo relatório de inspecção tributária, que fundamenta em termos factuais e jurídico–tributários a emissão das mencionadas 3 notas de liquidação, pois, caso seja o procedimento inspectivo de natureza externa e respectivo relatório de inspecção tributária identificados no artigo 7.º da presente impugnação judicial, o resultado do mesmo consistiu na emissão de 3 notas de liquidação, entretanto objecto de anulação, facto devidamente provado pela emissão da certidão negativa e de ausência de quaisquer impostos ou realidades tributárias em divida perante a Autoridade Tributária e Aduaneira;

– nos termos do artigo 63.º, n.º 4, da LGT, que é corolário do princípio da proporcionalidade expressamente consagrado no artigo 266.º, n.º 2, da CRP e artigo 55.º da LGT, não poderá existir mais que um procedimento externo de fiscalização relativamente ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, quanto ao mesmo imposto e período de tributação, sem que haja factos novos e haja uma decisão fundamentada do dirigente máximo do serviço no sentido de efectivação de novo procedimento inspectivo;

– toda a actuação da Administração Tributária e Aduaneira no âmbito da inspecção tributária e emissão das diversas notas de liquidação, para além de violar o artigo 63.º, n.º 4, da LGT e igualmente do artigo 63.º do CPPT, coloca em causa um princípio fundamental que deve presidir e servir de critério orientador, em toda a actuação jurídico – tribuário das diversas entidades, ou seja, o princípio da segurança jurídica;

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira, nas suas alegações, explica a anulação de iniciais liquidações dizendo, em suma, que «as mesmas não foram notificadas à Requerente por falha no sistema informático de não reconhecimento da validação da notificação efectuada».

A Requerente também não refere ter sido notificada das liquidações que foram anuladas, o que, de qualquer forma não se demonstrou.

Não deixa de ser estranho que a Autoridade Tributária e Aduaneira, na sequência da constatação de que não foram notificadas liquidações, as tenha anulado, em vez de as notificar, fixando um prazo de pagamento voluntário tendo em contar da data da notificação.

De qualquer forma, neste circunstancialismo, não se vê que seja afectado os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade, pois não houve um segundo procedimento tributário (que e proibido pelo artigo 63.º, n.º 4, da LGT) nem qualquer hipotética situação jurídica constituída pelas primeiras liquidações, já que, não sendo notificadas, não produziram efeitos em relação à Requerente (artigos 77.º, n.º 6, da LGT e 36.º, n.º 1, do CPPT).

Por outro lado, não há qualquer razão para crer que a Requerente não se tenha apercebido de que o Relatório da Inspecção Tributária de que foi notificada está subjacente às liquidações que impugnou, já que nestas se concretizam as consequências tributárias das correcções indicadas naquele.

Assim, improcede o invocado vício procedimental por violação dos princípios referidos.

 

5.2. Da insuficiência de fundamentação

 

A Requerente defende, em suma:

 

– a Administração Tributária e Aduaneira não indicou provas do fundamento da não aceitação da estrutura jurídico-societária do modelo SGPS e respectiva tributação dos incrementos patrimoniais obtidos com recurso à simulação de negócios ou actos jurídicos sobre as remunerações entregues aos accionistas, limitando-se a concluir, a julgar e deduzir, mas não a fundamentar;

– a fundamentação do recurso à cláusula geral anti-abuso, deve conter obrigatoriamente a indicação dos critérios utilizados e a ponderação dos factores que influenciaram a determinação do resultado, nos termos do artigo 84.º, n.º 3, da LGT;

– a Administração Tributária e Aduaneira, ao estruturar a sua decisão num juízo de prognose virtual e hipotético, viola o dever de fundamentação dos actos tributários, que integra a garantia constitucional consagrada no artigo 268.º, n.º 3, da CRP;

– toda a actuação da Administração Tributária e Aduaneira, designadamente no seu relacionamento com os contribuintes, não deve contemplar a realização de uma discricionariedade tributária excessiva ou uma margem de livre apreciação demasiado ampla, devendo ter sempre por critério orientador o princípio da boa fé;

– deveria a Administração Tributária e Aduaneira, na sua decisão de aplicar a figura da cláusula geral anti-abuso, fundamentar de facto e de direito os termos rigorosos e precisos de tal utilização e explicar de forma clara, objectiva e expressa qual o raciocínio que utilizou para apurar o montante global de imposto a pagar de € 851.669,02;

– a Autoridade Tributária e Aduaneira refere no Relatório da Inspecção Tributária que concorda que a estrutura da sociedade anónima é aquela que melhor se adapta a uma empresa em crescente desenvolvimento, pelo que é ela própria considera não existir qualquer artifício na transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima e consequentes actos jurídicos praticados;

– é acentuada a exigência de fundamentação das decisões de aplicação da cláusula geral antiabuso;

– se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto tributário considera-se não fundamentado, nos termos da disciplina jurídica vertida no artigo 125.º, n.º 2, do CPA.

 

A Requerente tem razão quanto a especiais exigências da fundamentação dos actos de aplicação de cláusula geral antiabuso, não propriamente pelos fundamentos de direito invocados, mas porque eles estão, de facto, expressamente previstos no n.º 3 do artigo 63.º da LGT, e não no artigo 84.º, n.º 3, da mesma Lei, que se reporta a actos de avaliação da matéria tributável e não de aplicação da cláusula geral antiabuso.

De qualquer forma, tratando-se do mesmo vício de falta de fundamentação, não há obstáculo processual a que se aprecie a questão à face do enquadramento correcto, já que «o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito» [artigo 5.º, n.º 3, do CPC subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].

Como decorre daquele n.º 3 do artigo 63.º há um exigência específica de fundamentação de actos deste tipo, pelo que não basta constatar que se verificam as circunstâncias que, em geral, permitem concluir pela suficiência de fundamentação.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a ser no sentido de que, nos casos em que não há especiais exigências de fundamentação dos actos tributários, esta é suficiente quando, através do seu teor, é possível a um destinatário normal aperceber-se das razões de facto e de direito pelas quais a autoridade que o praticou decidiu no sentido em que decidiu. ([4])

No caso em apreço, a extensa fundamentação do Relatório da Inspecção Tributária é idónea a proporcionar à Requerente a percepção das razões por que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu aplicar a cláusula geral antiabuso.

Designadamente, quanto ao específico ponto em que a Requerente manifesta incompreensão pela fundamentação do Relatório da Inspecção Tributária, que é o ponto em que se refere que concorda que a estrutura da sociedade anónima é aquela que melhor se adapta a uma empresa em crescente desenvolvimento, pelo que é ela própria considera não existir qualquer artifício na transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima e consequentes actos jurídicos praticados, percebe-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira entende que «porém, no caso em concreto, não se verificaram as alterações que poderiam motivar/justificar o ónus da transformação de uma sociedade por quotas em sociedade anónima, e que aliás são apontadas pelo sujeito passivo».

É isso que a Autoridade Tributária e Aduaneira depois explica, dizendo o seguinte:

— Não se verificou um aumento de capital social, que permitisse dotar esta entidade de uma sustentabilidade financeira, que não tinha à data. Constata-se que o aumento de capital que existiu antes do processo de transformação foi efetuado à custa da incorporação de reservas, na verdade apenas existiu uma entrada de capital efetiva de € 200,00 (cf Ata junta ao anexo IX);

— Por outro lado, não existiu, de facto, uma abertura de capital a novos investidores. Repare-se que para perfazer o número mínimo de cinco acionistas, entram nesta sociedade E… (pai de B…- acionista maioritário) e F…, (cônjuge de C…- o outro acionista maioritário) e cuja participação representa 0,2% do capital social, e

— Quanto à "maleabilidade da gestão e à concentração dos poderes de gestão no órgão de administração referido pelos administradores, assistimos que esta continua a ser desempenhada, de facto, pelos acionistas maioritários: B… e C…, os quais passam de gerentes para administradores. Não existiu portanto, qualquer alteração nos órgãos de gestão.

Sem questionar as razões económicas da decisão de transformação de sociedade por quotas em sociedade anónima por parte dos detentores do capital e decisores, parece aceitável que perante esta realidade a AT conclua, que neste caso em concreto, esta decisão não foi acompanhada das alterações societárias que permitiriam a esta sociedade munir-se de uma melhor performance competitiva.

 

Perante esta fundamentação do RIT, percebe-se que, embora a Autoridade Tributária e Aduaneira concorde, em princípio, que a estrutura da sociedade anónima é aquela que melhor se adapta a uma empresa em crescente desenvolvimento, entende que só se justifica a decisão de transformação de uma sociedade por quotas em anónima quando «em concreto, esta decisão não foi acompanhada das alterações societárias que permitiriam a esta sociedade munir-se de uma melhor performance competitiva».

Por isso, seja ou não correcto este entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, o certo é que se percebe por que é que entendeu que não se justificava, no caso concreto, a transformação da sociedade por quotas em anónima.

Por outro lado, a Autoridade Tributária e Aduaneira indica quais os negócios praticados que entende integrarem uma sucessão que tenta provar ter sido principalmente dirigida à eliminação de impostos e indica os negócios que acha que deveriam ter sido praticados para atingir a mesma finalidade económica, bem como as normas de incidência que se lhes aplicam, pelo que se afigura que deu satisfação aos requisitos de fundamentação previstos no artigo 63.º, n.º 3, do CPPT. Aliás, a Autoridade Tributária e Aduaneira diz na parte final do Relatório da Inspecção Tributária que satisfez estes requisitos e a Requerente não questiona essa afirmação.

Entende-se, assim, que estão satisfeitas as exigências de fundamentação, pelo que não ocorre vício de falta de fundamentação, independentemente de ser ou não correcta posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Se o entendimento adoptado pela Autoridade Tributária e Aduaneira não estiver correcto, estar-se-á perante vícios de erro sobre os pressupostos de facto, mas não perante vício de falta de fundamentação.

 

6. Da aplicação da cláusula geral antiabuso

6.1. Regime de aplicação da cláusula geral antiabuso

 

O artigo 38.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária estabelece uma cláusula geral antiabuso, nos termos da qual «são ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas».

Como a Requerente defende, em primeira linha, é sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira que recai o ónus da prova da verificação dos pressupostos da cláusula geral antiabuso, pois é ela que a invoca (artigo 74.º, n.º 1, da LGT).

No entanto, esta questão nada tem a ver com a especificação dos «pressupostos da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável», de que falta a Requerente, pois não está em causa a quantificação da matéria tributável, mas sim a aplicação de um determinado regime legal a factos perfeitamente quantificados.

 

6.1.1. Planeamento fiscal legítimo e ilegítimo

 

Nas definições elaboradas por Saldanha Sanches ([5]): o planeamento fiscal legítimo «consiste numa técnica de redução da carga fiscal pela qual o sujeito passivo renuncia a um certo comportamento por este estar ligado a uma obrigação tributária ou escolhe, entre as várias soluções que lhe são proporcionadas pelo ordenamento jurídico, aquela que, por acção intencional ou omissão do legislador fiscal, está acompanhada de menos encargos fiscais»; enquanto que o planeamento fiscal ilegítimo «consiste em qualquer comportamento de redução indevida, por contrariar princípios ou regras do ordenamento jurídico-tributário, das onerações fiscais de um determinado sujeito passivo».

Dentro do quadro do planeamento fiscal podemos, assim, distinguir as situações em que o sujeito passivo actua contra legem, extra legem e intra legem.

Quando este actua contra legem, a sua actuação é frontal e inequivocamente ilícita, pois infringe directamente a lei fiscal, e configura uma fraude fiscal ([6]) passível, inclusive, de ser objecto de censura contra-ordenacional ou criminal.

A actuação extra legem ocorre quando o sujeito passivo aproveita de forma abusiva a lei para chegar a um resultado fiscal mais favorável, pese embora este não a violar directamente. Este adopta «um comportamento que tem como finalidade exclusiva ou principal contornar uma ou várias normas jurídico-fiscais, de modo a conseguir a redução ou a supressão do encargo fiscal» ([7]). Sendo que dessa ou dessas normas jurídico-fiscais se deve detectar uma tentativa de contornar «uma clara intenção de tributar afirmada pelos princípios estruturantes do sistema» ([8]). Este tipo de actuação é comummente designada de «fraude à lei fiscal» mas, conforme alerta Saldanha Sanches, pretendendo melhor ilustrar e distinguir estas situações das de fraude fiscal, também designada de «evitação abusiva de encargos fiscais», «evitação fiscal abusiva» ou ainda «elisão fiscal» ([9]).

Só se afigura legítima – e, assim, planeamento fiscal legítimo ou não abusivo – a actuação intra legem. Com efeito, a obtenção de uma poupança fiscal não constitui um comportamento proibido pela lei, desde que a actuação não se enquadre na supra referida actuação extra legem ([10]).

A doutrina e a jurisprudência têm vindo a desconstruir a letra da norma apontando cinco elementos nela patentes. Correspondendo um dos elementos à estatuição da norma, os restantes quatro afiguram-se requisitos cumulativos que permitem aferir – como se de um teste se tratasse – quanto à verificação de uma actividade caracterizável como um planeamento fiscal abusivo ([11]).

Estes elementos, em torno dos quais ambas as partes aliás constroem a sua argumentação, consistem:

– no elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida – acto ou negócio jurídico, isolado ou parte de uma estrutura de actos ou negócios jurídicos sequenciais, lógicos e planeados, organizados de modo unitário – pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal; como decorre do texto do artigo 38.º. n.º 2, da LGT, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso têm de ser «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas»;

– no elemento resultado, que contende com a obtenção de uma vantagem fiscal, em virtude da escolha daquele meio, quando comparada com a carga tributária que resultaria da prática dos actos ou negócios jurídicos «normais» e de efeito económico equivalente ([12]);

– no elemento intelectual, que exige que a escolha daquele meio seja «essencial ou principalmente dirigid[a] [...] à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos» (artigo 38.º, n.º 2 da LGT), ou seja, que exige não a mera verificação de uma vantagem fiscal, mas antes que se afira, objectivamente, se o contribuinte «pretende um acto, um negócio ou uma dada estrutura, apenas ou essencialmente, pelas prevalecentes vantagens fiscais que lhe proporcionam» ([13]);

– no elemento normativo, que «tem por sua função primordial distinguir os casos de elisão fiscal dos casos de poupança fiscal legítima, em consideração dos princípios de Direito Fiscal, sendo que só nos casos em que se demonstre uma intenção legal contrária ou não legitimadora do resultado obtido se pode falar naquela »([14]);

– e, por fim, no elemento sancionatório, que, pressupondo a verificação cumulativa dos restantes elementos, conduz à sanção de ineficácia, no exclusivo âmbito tributário, dos actos ou negócios jurídicos tidos por abusivos, «efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas» (parte final do artigo 38.º, n.º 2, da LGT).

 

Apesar desta desconstrução, a análise dos elementos não pode ser estanque, pois, como realça Courinha, «a fixação de um elemento pode, na prática, depender de um outro», pelo que estes «não deixarão com frequência [...] de auxiliar-se mutuamente» ([15]).

As Partes estão de acordo quanto à necessidade de verificação cumulativa destes requisitos para aplicação da cláusula geral antiabuso.

Apreciemos, tendo este aspecto em consideração, os elementos da cláusula geral antiabuso tendo em atenção a fundamentação da decisão, os factos provados, e a argumentação jurídica das partes.

 

6.1.2. Elemento meio

 

Como se referiu, o elemento meio, que diz respeito à via livremente escolhida – acto ou negócio jurídico, isolado ou parte de uma estrutura de actos ou negócios jurídicos sequenciais, lógicos e planeados, organizados de modo unitário – pelo contribuinte para obter o desejado ganho ou vantagem fiscal. Como exige o n.º 2 do artigo 38.º, os meios relevantes para aplicação da cláusula geral antiabuso tem de ser qualificáveis como «artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas».

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que se verifica este elemento por os accionistas da A… SGPS/G… terem recorrido a um conjunto de actos e negócios jurídicos que tiveram como resultado transformar um fluxo financeiro sujeito a imposto, nos termos da alínea h) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS (o pagamento de dividendos aos accionistas da A… SGPS), noutro fluxo financeiro não sujeito (o pagamento do preço determinado no negócio de aquisição da G…).

A Autoridade Tributária e Aduaneira indica os seguintes actos e negócios

 

1. Em 2008-05-19, foi efetuado o registo na Conservatória do Registo Comercial de …, do aumento do capital, da transformação da sociedade G… em sociedade anónima e foram designados os órgãos sociais, mantendo-se o objeto social, cfr. anteriormente referido.

2. A sociedade gestora de participações sociais A… SGPS foi constituída por deliberação de 2009-05-25, registada na CRC em 2009-06-22 e iniciou atividade em 2009-06-30, com o capital social de € 71.000,00 integralmente subscrito, de acordo com o quadro 1 deste Relatório, sendo os seus 5 acionistas, comuns à G…;

3 A 30 de Setembro de 2009, três meses depois do início de actividade da A… SGPS, foram celebrados os contratos de compra e venda de ações da G… S.A;

4. O preço global definido foi de € 7.100.000,00;

5. As características particulares deste negócio foram: o diferimento do pagamento do preço "(...) a liquidar no todo ou em parte no prazo máximo de 10 (dez) anos, conforme as partes venham, a acordar."

6 A A… SGPS como sociedade gestora de participações sociais, vocacionada para o exercício de gestão de participações, não dispunha (nem dispõe) de capacidade financeira para a celebração de um negócio desta magnitude;

7. A sociedade G… não distribuiu qualquer resultado pelos seus sócios/accionistas antes do exercício de 2009. Entre 2009 e 2012, distribuiu € 4.093.448,20 para a sociedade A… SGPS, sendo que esta sociedade, neste momento, e em montante similar, inicia o pagamento aos detentores de capital, do valor da dívida gerada, aquando do contrato de alienação das partes sociais.

8. Por esta forma, os pagamentos efetuados aos detentores do capital da A… SGPS, no montante de 3.262.500,00, ficam excluídos de qualquer tributação, por quanto "vestem" a forma de pagamento por conta do contrato de alienação das partes ao invés de dividendos.

 

A Requerente defende, sobre este elemento meio, que foi constituída numa óptica e âmbito de reorganização empresarial, racionalização das operações económicas das sociedades participadas (designadamente, com o acto jurídico de transformação de sociedade por quotas em sociedade anónima), potenciação, desenvolvimento e internacionalização do mesmo, bem como, uma maior eficiência económico-fiscal tendo por referência a realização das operações subjacentes a preço de mercado e o respeito inerente pelo objecto social específico das SGPS e respectiva legislação e enquadramento jurídico-tributário.

A prova produzida corroborou manifestamente a posição da Requerente quanto à perspectiva de reorganização empresarial com que foram realizadas as operações económicas referidas, designadamente a transformação da G… de sociedade por quotas em sociedade anónima e criação da SGPS.

 

6.1.2.1. A criação da sociedade anónima como meio para obter o resultado fiscalmente favorável

 

Na verdade, por um lado, a opção pela forma de sociedade anónima é de racionalidade evidente para uma empresa que está vocacionada para ser atingir dimensão internacional, com expansão em novos mercados e para ser objecto de transacção, como se provou ter sucedido com as diligências realizadas para extensão da sua actividade a Angola e para sua aquisição pela M… e pela P… .

Como resulta da prova produzida foi mesmo esta última empresa quem sugeriu a transformação em sociedade anónima.

Por outro lado, a transformação de sociedades por quotas em anónimas, mesmo para aproveitamento de vantagens fiscais, nada tem de meio artificioso ou fraudulento, sendo mesmo incentivada essa transformação através do regime fiscal vigente até à Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, que se traduzia não tributação das mais-valias geradas com transmissão de acções detidas há mais de 12 meses (artigo 10.º, n.º 2, do CIRS, na redacção do Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de Outubro), a par da tributação da transmissão de quotas de sociedades.  

            Como refere SALDANHA SANCHES, «se o legislador, ao mesmo tempo que tributa as mais-valias das alienações das quotas, deixa por tributar as mais-valias das acções ou as tributava com uma taxa mais reduzida, não pode deixar de se aceitar fiscalmente a transformação de uma sociedade comercial em sociedade por acções mesmo que a transformação seja motivada por razões exclusivamente fiscais» ([16])

Efectivamente, «mesmo que a transformação [fosse] motivada por razões exclusivamente fiscais», é o legislador que opta, expressamente, por tributar a venda das quotas e por não tributar a venda das acções naquele contexto, conforme decorre dos artigos supra citados.

E fê-lo deliberada e insistentemente, pois trata-se de uma norma várias vezes revista e ponderada, em vários diplomas.

Na verdade, na redacção inicial do CIRS, previa-se já a tributação em IRS das mais-valias obtidas com a «alienação onerosa de partes sociais» [artigo 10.º, n.º 1, alínea b), na redacção do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro], mas excluíam-se as mais-valias provenientes da alienação de «acções detidas pelo seu titular durante mais de 24 meses» [artigo 10.º, n.º 2, alínea c)], limite temporal este que tinha como objectivo evidente afastar a exclusão da tributação relativamente a mais-valias que, no conceito então vigente, eram consideradas especulativas.

Esta regulamentação era completada com a que constava do EBF, na redacção inicial, dada pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, em que se estabelecia o seguinte:

 

Artigo 35.º (EBF)

Transformação de sociedades por quotas em sociedades anónimas

Para efeitos do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, da alínea c) do n.º 2 do artigo 10.º do Código do IRS e do artigo 34.º deste Estatuto, considera-se que a data de aquisição de acções resultantes da transformação de sociedades por quotas em sociedades anónimas é a data da aquisição das quotas que lhes deram origem.

 

Esta norma, que tinha em vista o regime transitório, era completada com uma norma idêntica de aplicação permanente, que constava do artigo 18.º, n.º 5, alínea a), do EBF.

Estas duas normas evidenciam a enorme dimensão da preocupação legislativa em incentivar a transformação de sociedades por quotas em anónimas, que vai ao ponto de afastar a tributação em sede de mais-valias mesmo em situações em que o sujeito passivo detém as novas acções resultantes da transformação por um período muito curto, inclusivamente em situações em que a venda das novas acções é feita imediatamente a seguir à transformação, pois é precisamente a situações de detenção das novas acções por curtíssimo prazo que se aplicam as normas referidas. Isto evidencia que, ponderando os valores conflituantes nesta situação, se entendeu legislativamente prescindir da tributação em sede de mais-valias, independentemente de a vantagem fiscal concedida esse fosse o único objectivo da transformação, pois se considera de superior interesse público o resultado económico alcançado, da posterior existência de uma sociedade por acções.

Com a Lei n.º 30-B/92, de 28 de Dezembro, esta alínea c) do n.º 2 do artigo 10.º passou a excluir da tributação as «acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses», aumentando, assim, o âmbito da não tributação da alienação de acções, ou, doutra perspectiva, a restrição do conceito de mais-valias especulativas.

A Lei n.º 39-B/94, de 27 de Dezembro, reafirmou a vigência deste regime, eliminando a alínea c) do n.º 2 do artigo 10.º, mas transpondo a sua redacção para a nova alínea b).

A Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, eliminou a exclusão da tributação das mais-valias provenientes da alienação de acções, mas limitou a exclusão às acções adquiridas após a sua entrada em vigor, mantendo expressamente o regime anterior para as acções adquiridas antes dessa data (artigo 4.º, n.º 5, do DL n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, na redacção dada pela Lei n.º 30-G/2000).

Este novo regime não chegou a ser aplicado, pois a Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, estabeleceu, no n.º 9 do seu artigo 147.º, que nos anos de 2001 e 2002 seria aplicável regime anterior à Lei n.º 30-G/2000 e, depois, o Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de Outubro, reintroduziu o regime de não tributação das mais-valias derivadas da alienação de «acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses», ao dar uma nova redacção à alínea a) do n.º 2 do artigo 10.º do CIRS.

Esta redacção manteve-se até à sua revogação pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho.

É, assim, manifesto, que houve uma opção legislativa deliberada, mantida com variações desde a redacção inicial do CIRS, no sentido da não tributação de algumas das mais-valias provenientes da alienação de acções, opção essa, como a da fixação de uma taxa liberatória reduzida, é justificada pela existência de uma «política de desenvolvimento do mercado financeiro», expressamente reconhecida no 5.º parágrafo do ponto 12 do Relatório do CIRS.

A «Exposição de Motivos» da Proposta de Lei n.º 1/IX, que veio a dar origem à Lei n.º 16-B/2002, de 31 de Maio, que concedeu ao Governo a autorização legislativa necessária para aprovar o Decreto-Lei n.º 228/2002 é elucidativa no sentido de se ter reconhecido que a não tributação das mais-valias não especulativas provenientes da alienação de acções era preferível à sua tributação dizendo-se:

 

Com a entrada em vigor da Lei n.º 30-G/2000, que tornou indispensável a revisão do Código de IRS operada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, foi alargado o âmbito de incidência a todas as mais-valias de valores mobiliários e eliminou-se a taxa liberatória de 10%.

Na sequência desta alteração as mais-valias de valores mobiliários são simultaneamente englobadas e sujeitas às taxas gerais progressivas, que se situam entre 12% e 40%.

Acresce que, de acordo com o artigo 3.º da Lei n.º 30-G/2000, o referido regime de tributação das mais-valias só é aplicável aos valores mobiliários adquiridos após 1 de Janeiro de 2001, mantendo-se o anterior regime de tributação para as mais-valias quanto aos adquiridos antes dessa data.

Aquele regime tributário foi contudo alterado, transitoriamente, pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2002), a qual veio estabelecer uma isenção da tributação das mais-valias relativamente a rendimentos inferiores a 2500 Euros, fazendo-se, no entanto, o englobamento, apenas, para efeitos de determinação da taxa a aplicar aos restantes rendimentos.

Considerando que o impacto desta reforma fiscal no mercado de capitais foi altamente prejudicial para os investidores, configurando-se como um desincentivo ao investimento, com todas as inerentes consequências negativas para o desenvolvimento de uma política de recuperação económica, urge revogar o regime de tributação das mais-valias aprovado pela Lei n.º 30-G/2000 e, posteriormente, acolhido pelo Decreto-Lei n.º 198/2001 e, em consequência, retomar o regime de aplicação da taxa liberatória de 10%, bem como da exclusão de tributação das mais-valias de valores imobiliários detidos pelo seu titular durante mais de 12 meses, tributando-se apenas as mais-valias especulativas.

 

O Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 228/2002, de 31 de Outubro, que reintroduziu a exclusão da tributação das mais-valias provenientes da alienação de acções detidas pelo seu titular há mais de 12 meses é também elucidativo sobre a existência desta intenção legislativa ao dizer:

O regime de tributação dos rendimentos de mais-valias derivados da alienação onerosa de valores mobiliários, aquando da entrada em vigor do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, foi significativamente alterado pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro.

Os traços mais salientes do quadro então instituído consistiram na abolição da exclusão tributária de que beneficiavam as mais-valias provenientes da alienação de obrigações e de outros títulos de dívida e da alienação de acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses, passando a incidir uma tributação generalizada sobre estes rendimentos, atenuada por uma isenção de base para os saldos positivos inferiores a determinado montante e pela consideração dos saldos positivos ou negativos em percentagem variável em função do período de detenção dos títulos pelo alienante.

Por força do estabelecimento, pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, de um regime transitório de tributação aplicável a estes rendimentos nos anos 2001 e 2002, o regime emergente da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, não chegou a ser aplicado.

O presente decreto-lei vem dar execução à autorização concedida ao Governo pela Lei n.º 16-B/2002, de 31 de Maio, no sentido da reposição, no Código do IRS, das linhas essenciais do regime de tributação destes rendimentos

 

Do ponto de vista sistemático, acresce a preferência manifestada pelo legislador pela adopção do modelo de organização societária da sociedade anónima, cuja adopção desde a redacção inicial do CIRS pretendeu fomentar e é patente no Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de Março, que reformou um vasto conjunto de leis relacionadas com as sociedades comerciais, com especial atenção para a simplificação e eliminação de actos e procedimentos registrais e notariais (artigo 1.º, n.º 1) e para as sociedades anónimas (artigo 1.º, n.º 2: «o presente decreto-lei visa ainda actualizar a legislação societária nacional, adoptando designadamente medidas para actualizar e flexibilizar os modelos de governo das sociedades anónimas»).

Explanando as razões de política económica subjacentes à reforma, o legislador afirma, no preâmbulo daquele Decreto-Lei:

 

Assim, as linhas de fundo da reforma realizada por este decreto-lei prendem-se com as seguintes ideias. De um lado, a preocupação de promover a competitividade das empresas portuguesas, permitindo o seu alinhamento com modelos organizativos avançados. A presente revisão do Código das Sociedades Comerciais assenta no pressuposto de que o afinamento das práticas de governo das sociedades serve de modo directo a competitividade das empresas nacionais. Esse é o primeiro objectivo de fundo que este decreto-lei visa prosseguir, em prol de uma maior transparência e eficiência das sociedades anónimas portuguesas. Ao encetar este caminho, Portugal colocar-se-á a par dos sistemas jurídicos europeus mais avançados no plano do direito das sociedades, salientando-se o Reino Unido, a Alemanha e a Itália como países que têm identicamente orientado reformas legislativas com base nestes pressupostos. […] Importa ainda apontar o atendimento das especificidades das pequenas sociedades anónimas como preocupação que esteve subjacente à preparação deste decreto-lei”.

 

Neste contexto, detecta-se uma opção legislativa deliberada no sentido de afastar a tributação das mais-valias não especulativas, como incentivo à criação de sociedades anónimas, formas de organização mais avançada, que proporciona tendencialmente gestão mais profissionalizada e eficiente, com benefícios para a economia em geral e, reflexamente, para o próprio interesse da tributação de rendimentos empresariais.

Por outro lado, é de notar que a afirmação do interesse público em não tributar as mais-valias não especulativas derivadas da detenção de acções foi, conscientemente, considerado superior ao da arrecadação das receitas que a tributação podia gerar e que esta afirmação foi efectuada já depois da Lei Geral Tributária ter previsto a cláusula geral antiabuso, no seu artigo 38.º, n.º 2.

Para além disso, não se vislumbra nesta actuação da Requerente, em perfeita sintonia com o desígnio legislativo que se visou atingir com criação de um regime mais favorável de tributação dos detentores de acções, o uso de qualquer meio artificioso ou fraudulento ou abuso de formas jurídicas (como exige a aplicação da cláusula geral antiabuso) já que a transformação de sociedades por quotas em sociedades anónimas está expressamente prevista na lei como um meio normal de criação de sociedades deste tipo (artigos 1.º, n. 2, e 130.º do Código das Sociedades Comerciais), inclusivamente no âmbito da tributação do rendimento [artigo 43.º, n.º 6, alínea b), do CIRS]. O que, decerto, constituiria artifício ou fraude legislativa, incompaginável com o princípio constitucional da confiança, ínsito no princípio do Estado de Direito democrático, seria incentivar legislativamente os sujeitos passivos de IRS à criação de sociedades anónimas, através do anúncio da atribuição de uma vantagem fiscal e, uma vez satisfeito o interesse público que se visava com tal incentivo, não lhes reconhecer o direito à vantagem prometida.

 

6.1.2.2. A criação da SGPS

 

A criação da SGPS também nada tem de meio artificioso ou fraudulento.

Na verdade, a própria Autoridade Tributária e Aduaneira o reconheceu ao dizer no Relatório da Inspecção Tributária:

 

Concordamos que a decisão de transformação de uma sociedade por quotas numa sociedade anónima, considerando os gastos que esta decisão tem associados, deverá estar relacionada, e tal como refere o sujeito passivo, com a abertura do capital a novos investidores, munindo as empresas de sustentabilidade financeira num mercado global. Por outro lado, a estrutura de Administração definida para estas entidades, caracterizada pela criação de um conselho de Administração e nomeação de um Presidente, permite concentrar os poderes de gestão num órgão de administração, com facilidade nas decisões rápidas e independentes.

Concordamos igualmente que a estrutura da sociedade anónima é aquela que melhor se adapta a uma empresa em crescente desenvolvimento.

 

No caso em apreço, resultou claramente da prova produzida que a G… era uma empresa tecnológica em rápido desenvolvimento, com vocação para expandir as suas actividades a novos mercados ou para ser adquirida por grupos internacionais, pelo que é evidente que a opção de criação de uma SGPS se justificava.

Como resultou provado, a criação de uma SGPS era favorável ao crescimento com novas aquisições, era benéfica em termos de imagem como sinal de organização a estruturação e por permitir segmentar os negócios, diluindo os riscos com a criação de empresas especializadas, como veio a ocorrer com a criação de duas empresas pela Requerente, como accionista único (a H… em 2009 e a L…, LDA em 2012).

Por outro lado, a argumentação da Autoridade Tributária e Aduaneira para recusar a racionalidade da criação, para além de em nada contrariar as vantagens que foram assinaladas, assenta em erros sobre os pressupostos de facto.

Com efeito, a Autoridade Tributária e Aduaneira fundamentou a sua posição nestes termos:

— Não se verificou um aumento de capital social, que permitisse dotar esta entidade de uma sustentabilidade financeira, que não tinha à data. Constata-se que o aumento de capital que existiu antes do processo de transformação foi efetuado à custa da incorporação de reservas, na verdade apenas existiu uma entrada de capital efetiva de € 200,00 (cf Ata junta ao anexo IX);

— Por outro lado, não existiu, de facto, uma abertura de capital a novos investidores. Repare-se que para perfazer o número mínimo de cinco acionistas, entram nesta sociedade E… (pai de B… - acionista maioritário) e F… (cônjuge de C…- o outro acionista maioritário) e cuja participação representa 0,2% do capital social, e

— Quanto à maleabilidade da gestão e à concentração dos poderes de gestão no órgão de administração referido pelos administradores, assistimos que esta continua a ser desempenhada, de facto, pelos acionistas maioritários: B… e C…, os quais passam de gerentes para administradores. Não existiu portanto, qualquer alteração nos órgãos de gestão.

 

Ora, no caso em apreço, o êxito posterior da Requerente, até ao presente, que foi referido pelas testemunhas O… e R…, sem qualquer indício de falta de sustentabilidade financeira, patenteia, só por si, que não era necessário qualquer aumento de capital para a assegurar.

Por outro lado, como resultou da prova produzida, existiu, de facto, intenção de abertura do capital a novos investidores, designadamente empresas multinacionais (M… e P…), sendo efectuadas diligências nesse sentido.

Para além disso, quanto à «maleabilidade da gestão e à concentração dos poderes de gestão no órgão de administração referido pelos administradores», qualquer que seja a razão por que a Autoridade Tributária e Aduaneira entende que isso é um defeito e se trata de requisitos necessários para justificar a criação de uma SGPS, o certo é que o êxito de gestão que a evolução posterior da Requerente patenteia impõe que se conclua que não houve falta do que quer que seja para que a criação da SGPS se justificasse.

Assim, está em manifesta dissonância com a realidade a conclusão a que chegou a Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório da Inspecção Tributária, de que a criação da Requerente «não foi acompanhada das alterações societárias que permitiriam a esta sociedade munir-se de uma melhor performance competitiva», pois a competitividade que posteriormente se demonstrou é uma prova indelével de não eram necessárias alterações societárias para a assegurar.

De qualquer modo, é manifesto que nestas circunstâncias, tendo a SGPS formado um grupo com a aquisição de duas outra empresas, não se vislumbra como possa duvidar-se que a criação da SGPS correspondeu a uma intenção real dos accionistas da G… de desenvolverem a sua empresa, através da transferência das acções para a Requerente.

Por isso, está afastada a possibilidade de se considerar que a criação da SGPS consubstancia a utilização de um meio artificioso ou fraudulento, ou um abuso de formas jurídicas.

 

6.1.2.3. Conclusão sobre o elemento meio

 

Conclui-se do exposto que a análise que a Autoridade Tributária e Aduaneira fez do elemento meio assenta em pressupostos que não estão em sintonia com a realidade, o que implica que o acto praticado enferme de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto.

 

6.1.3. Elemento resultado

 

O elemento resultado tem a ver com o efeito obtido escolha daquele meio, quando comparada com a carga tributária que resultaria da prática dos actos ou negócios jurídicos «normais» e de efeito económico equivalente.

Na verdade, o artigo 38.º, n.º 2, da LGT, estrutura a cláusula geral antiabuso em termos de não interferência nas opções económicas dos sujeitos passivos, ao referir que, em suma, que a tributação consistirá nos «impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico».

O artigo 63.º, n.º 9, do CPPT, vigente em 2010, esclarecia e densificava a imprescindibilidade desta equivalência ao exigir como fundamentação do acto que determina a aplicação da cláusula geral antiabuso:

a) A descrição do negócio jurídico celebrado ou do acto jurídico realizado e da sua verdadeira substância económica;

b) A indicação dos elementos que demonstrem que a celebração do negócio ou prática do acto tiveram como fim único ou determinante evitar a tributação que seria devida em caso de negócio ou acto de substância económica equivalente;

c) A descrição dos negócios ou actos de substância económica equivalente aos efectivamente celebrados ou praticados e das normas de incidência que se lhes aplicam.

 

A redacção vigente deste artigo 63.º, resultante da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, não é substancialmente diferente, quanto à referida exigência de equivalência, agora feita no seu n.º 3:

 3 - A fundamentação do projecto e da decisão de aplicação da disposição antiabuso referida no n.º 1 contém necessariamente:

a) A descrição do negócio jurídico celebrado ou do acto jurídico realizado e dos negócios ou actos de idêntico fim económico, bem como a indicação das normas de incidência que se lhes aplicam;

b) A demonstração de que a celebração do negócio jurídico ou prática do acto jurídico foi essencial ou principalmente dirigida à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em caso de negócio ou acto com idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais.

 

No caso em apreço, o acto unilateral sobre o qual a Autoridade Tributária e Aduaneira fez incidir a tributação, que é pagamento de dividendos, que se reconduz a atribuição patrimonial unilateral feita por uma sociedade em favor dos seus sócios, que continuam na titularidade das suas participações sociais, não tem fim económico equivalente a uma aquisição de acções aos sócios e respectivo pagamento, que tem como efeito a transferência das acções do património dos sócios para os da sociedade adquirente. ([17])

Para além disso, constata-se pelo quadro n.º 13, do Relatório da Inspecção Tributária, em que se indicam os pagamentos das dívidas da Requerente para com os seus accionistas que, em grande parte das situações, os pagamentos nem sequer correspondem às percentagens de participação dos accionistas no capital da Requerente ([18]), pelo que é manifesto que os efeitos económicos da criação das dívidas e respectivos reembolsos não são idênticos aos que teriam o pagamento de dividendos de acções da G… aos seus accionistas que venderam as acções à Requerente, já que, tendo todas as acções da G…a mesma categoria, proporcionariam a todos os accionistas iguais direitos ao recebimento de dividendos (como decorre do artigo 302.º do Código das Sociedades Comerciais).

Por isso, também por falta deste requisito da equivalência económica entre os negócios celebrados e os que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que deveriam ter sido praticados, a aplicação da cláusula geral antiabuso enferma de ilegalidade, por violação do preceituado no artigo 38.º, n.º 2,da LGT, conjugado com o n.º 3 do artigo 63.º do CPPT.

 

6.2. Conclusão sobre a cláusula geral antiabuso

 

Sendo cumulativos os requisitos de aplicação da cláusula geral antiabuso, a constatação da não verificação de dois dos elementos exigidos pelo artigo 38.º, n.º 2, da LGT e pelo artigo 63.º, n.º 3, do CPPT, conduz forçosamente à conclusão de que é ilegal a sua aplicação ao caso em apreço, nos termos em que foi efectuada.

Por isso, a liquidação impugnada que assentou na aplicação da cláusula geral antiabuso enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, traduzido em errada interpretação e aplicação daquelas normas, que justifica a anulação daquele acto [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), do Código do Procedimento Administrativo].

 

7. Juros compensatórios e compensação

Os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados (artigo 35.º, n.º 8, da LGT).

Tanto as liquidações de juros compensatórios como a compensação têm, como pressuposto as liquidações de IRS, pelo que enfermam dos mesmos vícios que afectam estas.

Por isso, justifica-se a anulação da liquidação de juros compensatórios e da compensação.

 

8. Juros indemnizatórios

 

A Requerente pede juros indemnizatórios, mas não se provou que tivesse sido efectuado o pagamento das quantias liquidadas.

O direito a juros indemnizatórios depende de «pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» (artigo 43.º, n.º 1, da LGT), pelo que, não se provando que foi efectuado pagamento, não pode ser reconhecido o direito a juros indemnizatórios, sem prejuízo do direito que possa assistir à Requerente em execução do presente acórdão.

 

9. Decisão  

 

 Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a)  Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)  Anular as seguintes liquidações de IRS (retenção na fonte) e juros compensatórios e respectivas notas de compensação:

– liquidação de IRS n.º 2014…, datada de 29-04-2015, no valor de € 178.450,00, e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2015…, 2015 … e 2015…, no valor global de € 30.890,71, de que resultou o valor total a pagar de € 209.340,71 (identificação de documento n.º 2015…);

– liquidação de IRS n.º 2014…, datada de 29-04-2015, no valor de € 163.400,00, e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2015 … e 2015…, no valor global de € 22.589,62, de que resultou o valor total a pagar de € 186.089,62 (documento n.º 2015…);

– liquidação de IRS n.º 2014…, datada de 29-04-2015, no valor de € 419.100,00, e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2015…, 2015 … e 2015…, no valor global de € 37.438,69, de que resultou o valor total a pagar de € 456.538,69 (documento n.º 2015…);

c)  Julgar improcedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar juros indemnizatórios.

 

10. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 851.969,02.

 

Lisboa, 26 de Abril de 2016

Os Árbitros

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

(Diogo Leite de Campos)

 

(Maria Manuela Roseiro)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Voto de vencida

 

1. Não subscrevi a presente decisão na parte em que concluiu que era ilegal a aplicação do nº 2 do artigo 38º da LGT e consequente tributação, como se fossem pagamentos de dividendos sujeitos a IRS, de montantes pagos pela SGPS aos seus accionistas a título de contrapartida pela transmissão das acções. É que, ao contrário da douta posição que fez maioria, entendi que se verifica a existência dos pressupostos de aplicação da cláusula geral anti-abuso através da reunião de todos elementos usualmente identificados pela doutrina e que vêm sendo reconhecidos pela jurisprudência.

Assim, e fundamentando:

2. Quanto ao elemento meio, considero-o verificado através da sequência de operações realizadas e respectivo contexto:1.º- Desenvolvimento pela G…, entre 2003 e 2007, sob a forma de sociedade por quotas, de uma actividade com crescente êxito na área de actividade “telecomunicações”, sendo o seu capital detido (apesar de ajustamentos verificados naquele período) pelas pessoas que são o suporte da respectiva actividade e/ou de seus familiares muito próximos, e tendo como política a não distribuição de resultados; 2º Registo em 19 de Maio de 2008 da transformação da sociedade G…, em sociedade anónima, com cinco accionistas (três da G…, Lda e dois novos sócios, mas ainda familiares muito próximos de um dos accionistas principais), com aumento de capital de seis mil para cinquenta mil euros, realizado por incorporação de reservas livres quanto ao montante de € 44.000,00 e € 200 por entrada dos novos sócios, cada um com 100 euros; 3ºConstituição em 22 de Junho de 2009 da A… SGPS, SA, com o capital de € 71.000,00, pelos cinco sócios da G…, SA, sendo a percentagem de participação no capital de cada um dos accionistas igual à por eles detida na G…, SA; 4º Celebração em 30 de Setembro de 2009, entre a A… SGPS SA, e os seus 5 accionistas, de contratos de compra e venda de acções da G…, SA, pelo preço global de € 7.100.000,00, cujo pagamento seria efectuado no prazo máximo de 10 anos, sem previsão de prazos para pagamentos, nem cláusulas relativas a juros pelo deferimento ou cláusulas indemnizatórias em caso de incumprimento; 5º Distribuição de lucros, logo a partir de 2009[19], pela G…, SA. (que nesse ano apresentava € 922.965,05 de reservas[20]) à única titular das suas acções, a A… SGPS, tendo os dividendos distribuídos entre 2009 e 2012 totalizado a quantia de € 4.093.448,20[21]; 6º Pagamento pela A… aos seus accionistas, entre 2010 e 2012, a título de prestações por conta do preço das acções da G. SA, do montante de € 3.262.500,00.

Nesta sucessão de situações e operações, com especial realce para a conjugação entre a utilização da SGPS e os contratos outorgados com seus accionistas, identifica-se uma actuação atípica, do ponto de vista da normal racionalidade da gestão, que só se compreende pela finalidade exclusivamente fiscal de transformar futuras distribuições de dividendos em pagamentos das contraprestações pela transmissão de acções.

3. Quanto ao elemento resultado, verifica-se que ocorreu a criação de uma dívida da A… SGPS, pouco depois da sua constituição, no montante de € 7,1 milhões de euros, decorrente da compra de acções da G… SA, detidas pelos mesmos accionistas da sociedade compradora, operação que veio a permitir a realização de pagamentos aos referidos accionistas com a natureza de prestações por conta do preço de venda e não como distribuição de dividendos, sem qualquer tributação em sede de IRS, nem retenção na fonte do valor legalmente devido. A não terem sido praticados os referidos actos jurídicos, haveria lugar a tributação, em sede de IRS, do rendimento de capitais inerente à distribuição de lucros/adiantamento por conta de lucros, nos termos da alínea h) do n.º 2 do artigo 5.º do CIRS, rendimento esse sujeito a retenção na fonte a taxa liberatória, nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 71.º do CIRS.

Se, como decorre da motivação dos sócios da G…, SA, junta aos autos, a criação da SGPS visava, na sequência da transformação da G em SA, a criação de um grupo económico – redimensionamento, integração, diversificação e internacionalização – cabendo à SGPS actuar como pólo centralizador de todos os lucros gerados pelo grupo, e da aquisição e venda de participações financeiras, o meio mais evidente e adequado para obtenção deste desiderato era, desde logo, a permuta de acções garantindo a neutralidade fiscal na esfera dos sócios ou a constituição através de entradas em espécie, modalidades de que não resultaria a oneração da SGPS com um endividamento excessivo por comparação com o capital social.

Em decorrência da opção tomada pelos titulares do capital da G…, SA, no processo de constituição da A… SGPS e da subsequente transmissão da totalidade das acções da G…, deixaram de estar sujeitos a tributação na distribuição de lucros, quer da G…, SA quer da A…, SGPS, durante o período em que, subsistindo a dívida da A… relativa à aquisição das acções, os accionistas estiverem a ser pagos pelo respectivo preço, sendo os resultados da A… (resultantes da canalização, como dividendos, das reservas e resultados obtidos pela sua participada) aplicados em solver a dívida e não em distribuir dividendos aos accionistas.

Pode dizer-se que dos actos e negócios jurídicos praticados decorreu como resultado a obtenção de uma vantagem fiscal.

Quanto ao “resultado não fiscal equivalente”[22] é, no caso dos autos, o efeito económico resultante da canalização de fluxos financeiros para os sócios de uma sociedade (anteriormente da G…, actualmente da A…SGPS), relativamente aos resultados obtidos pela G… no desenvolvimento da respectiva actividade, que em vez de ser efectuada a título de dividendos, é-o sob a designação de preço de acções devido à instrumentalização resultante do processo de criação e posterior contratação com a A… SGPS[23].

No caso dos autos, configura-se como muito relevante o resultado que adveio da constituição da SGPS e subsequente aquisição por esta de acções, comparando com outros meios disponíveis, mais adequados para os accionistas e para a sociedade, designadamente a operação de permuta de acções, que implicaria a exigência de continuidade da valorização das novas acções pelo valor atribuído às antigas de acordo com o nº 8 do art. 10º do CIRS, ou a realização do capital da SGPS, com entradas em espécie sob a forma de entrega de acções da G…, SA. sem criação, em qualquer dos casos, do nível de endividamento verificado e completamente escusado para a finalidade pretendida.

Atentos os objectivos declarados para a criação da SGPS mas também a inexistência de meios financeiros desta para adquirir as acções pelo preço praticado[24], a opção por um meio que implica a criação de uma dívida elevadíssima só pode ser explicada pelo objectivo de os accionistas passarem a ter acesso aos resultados gerados na sociedade G… acumulados durante anos, fazendo com que os mesmos afluíssem ao seu património através de lucros distribuídos à nova holding que, a seguir, com esses fundos, pagaria a dívida criada para com os accionistas que a haviam constituído, restringindo fortemente a capacidade financeira para atingir os objectivos pretendidos com a criação da SGPS.

4. Quanto à verificação do elemento intelectual, resulta do já dito que, apesar de os accionistas da G…, SA. terem vendido as suas acções naquela sociedade à A… SGPS, mantiveram a sua titularidade efectiva e o exercício dos mesmos direitos de voto na G…, SA, por via indirecta, através da detenção da A… SGPS, na mesma proporção de percentagem de capital social e direitos de voto, conservando portanto um poder de controlo da sociedade adquirida idêntico ao que já detinham anteriormente.

Deste modo, a verificação de identidade na estrutura accionista da A… SGPS e da G… SA antes da venda das acções desta à SGPS, projectou-se também na existência de total coincidência dos membros do conselho de administração de ambas as sociedades. Acresce que a A… SGPS não possui meios humanos e técnicos e não remunera os membros do seu conselho de administração, que recebem o respectivo pagamento na G… SA.

Se o objectivo que presidiu á criação da SGPS era alargar o âmbito do negócio mediante a aquisição de participações em novas sociedades ou permitir a entrada de novos investidores, a estrutura financeira adequada não seria a caracterizada por um elevado nível de subcapitalização, como resultou da prática seguida. O modelo adoptado visou essencialmente satisfazer os interesses dos actuais accionistas, instrumentalizando a SGPS para receberem os dividendos acumulados na G…sem serem tributados como rendimentos da categoria E de IRS.

 

A forma como a A… SGPS, após a sua constituição, adquiriu as acções da sociedade pré-existente aos seus accionistas, conduz à conclusão de que a finalidade principal e essencial da operação, a motivação principal que ditou as opções adoptadas, não foi a actividade de gestão de participações sociais mas um meio para que os accionistas pudessem receber os lucros da G… SA, camuflados de pagamento das dívidas contraídas junto dos mesmos e, dessa forma, escapando à tributação que incidiria sobre aqueles rendimentos. Como confirmaram os depoimentos de testemunhas, a actividade da G… é efectivamente muito produtiva e os esforços de parcerias foram fundamentalmente empreendidos por ela ou por causa dela.

5. Quanto ao elemento normativo, encontra-se também preenchido dada a reprovação normativo-sistemática da actuação realizada, e acima descrita, traduzida na prática de actos artificiosos, com abuso de formas jurídicas que permitiram a violação de valores do ordenamento jurídico-tributário consagrados na sujeição a tributação de rendimento de capitais, nos termos dos artigos 5º, nº 2, alínea h), e 71º, nº 3, alínea c), do CIRS.

6. Como verificado, todas as operações e actos jurídicos celebrados tiveram como únicos intervenientes os accionistas e as sociedades detidas, na totalidade, por eles.

As mesmas pessoas actuaram na qualidade de sócios, vendedores e credores da sociedade SGPS, sendo esta sociedade utilizada apenas como instrumento das intenções e resultados acima descritos, pelo que considero que se encontrava justificada uma solução conducente à aplicação do elemento sancionatório, efectuando-se tributação de acordo com as normas aplicáveis na ausência dos meios artificiosos utilizados e à não produção das referidas vantagens fiscais.

 

Manuela Roseiro



[1] Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralelo que se coloca nos processos de recurso contencioso:

                - de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em AP-DR de 12-4-2001, página 1207.

                - de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em AP-DR de 10-2-2004, página 4289.

                - de 09/10/2002, processo n.º 600/02.

                - de 12/03/2003, processo n.º 1661/02.

Em sentido idêntico, podem ver-se:

                - MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é “irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto”, e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que “não pode (…) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa”.

- MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que “as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade”.

[2] Introdução ao Direito e ao Discurso legitimador, página 235.

[3] Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil, páginas 158-159.

[4] Neste sentido, pode ver-se, entre muitos, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10-4-2002, processo n.º 026248.

[5] Cfr. SALDANHA SANCHES, J. L., Os Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra Editora, Coimbra, 2006, p. 21.

[6] Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12-02-2011, processo n.º 04255/10.

[7] Cfr. JÓNATAS MACHADO e NOGUEIRA DA COSTA, Curso de Direito Tributário, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 340-341.

[8] Cfr. SALDANHA SANCHES, J. L., Os Limites…, p. 181.

[9] Cfr. SALDANHA SANCHES, J. L., Os Limites…, pp. 21-23; ainda Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12-02-2011, processo n.º 04255/10.

[10] Cfr. SALDANHA SANCHES, J. L., Reestruturação de empresas e limites do planeamento fiscal, As duas constituições – nos dez anos da cláusula geral antiabuso, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 49-50, que afirma, a este respeito: «a consagração da cláusula geral antiabuso implica […] que a partir da sua introdução está claramente delimitado aquilo que o sujeito passivo pode e não pode fazer. As habilidades fiscais, a destreza fiscal deixam de ser possíveis (as operações artificiosas e fraudulentas que têm como fim principal ou exclusivo a obtenção de uma poupança fiscal mediante a fraude à lei) e o sujeito passivo passa a ter o seu comportamento julgado de acordo com este critério. […] a evolução da lei é clara no sentido de proporcionar fundamento legal para o planeamento fiscal, desde que seja praticado sem o abuso de formas jurídicas, sem negócios jurídicos artificiosos e fraudulentos mas limitando-se a escolher a via que se encontra aberta e que lhe permite realizar economias fiscais». Cfr, também, MARQUES, PAULO, Elogio do Imposto, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 360-364.

[11] Ou seja, a uma «actuação planeada do contribuinte que se traduz num comportamento aparentemente lícito, geradora de uma vantagem fiscal não admitida pelo ordenamento tributário» (cfr. COURINHA, GUSTAVO LOPES, Cláusula Geral Antiabuso no Direito Tributário: Contributos para a sua compreensão, Almedina, Coimbra, 2009, pp. 15-17 e 163-165; bem como Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 15-02-2011, proc. 04255/10, conclusões XIII e XIV).

[12] Tal decorre do seguinte segmento do artigo 38.º, n.º 2, da LGT: «redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios». Decorre ainda do artigo 63.º, n.º3, alíneas a) e b) do CPPT, na redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, que exigem que a Administração Tributária inclua na sua fundamentação, respectivamente, «a descrição do negócio jurídico celebrado ou do acto jurídico realizado e dos negócios ou actos de idêntico fim económico, bem como a indicação das normas de incidência que se lhes aplicam» e «a demonstração de que a celebração do negócio jurídico ou prática do acto jurídico foi essencial ou principalmente dirigida à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em caso de negócio ou acto com idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais».

[13] Cfr. COURINHA, GUSTAVO LOPES, Cláusula…, p. 180.

[14] Cfr. COURINHA, GUSTAVO LOPES, Cláusula…, p. 211.

[15] Cfr. COURINHA, GUSTAVO LOPES, Cláusula…, p. 165. Identicamente, SALDANHA SANCHES, J. L., Os Limites…, p. 170, que aponta uma «relação de conexão e interdependência em relação aos requisitos exigidos pela lei».

[16] Os Limites do Planeamento Fiscal, página 182.

[17] Neste sentido, pode ver-se o acórdão arbitral de 03-01-2015, proferido no processo n.º 240/2014-T.

[18] Por exemplo:

- em 14-05-2010 foram pagos € 130.000, no total, apenas os sócios Marco Pinto (€ 65.000), Álvaro Martins (€ 52.000), e Luís Mendes (€ 13.000), receberam quantias, nas percentagens de 50%, 40% e 10%, não correspondem às suas percentagens no capital da G…, que são idênticas às percentagens que têm no capital da Requerente, que são, respectivamente de 47,3%, 43,92% e 8,38%;

- em 20-04-2011, apenas os sócios B… e C… receberam quantias, nos montantes de € 301.000 e € 271.600, que correspondem a € 52,57% e 47,43% do que foi pago, diferentes das percentagens de 47,3% e 43,92% que detêm no capital da Requerente;

- em 19-12-2011, apenas receberam os sócios C… (€ 52.000) e D… (€ 13.000), nas percentagens de 80% e 20% do que foi pago, que não correspondem às percentagens de 43,92% e 8,38% que detêm no capital da Requerente;

- em 16-12-2011 e 29-11-2012, apenas o sócio B… recebeu.

[19] Deliberações de assembleias gerais extraordinárias de 10-11-2009 e 10-12-2009.

[20] De um resultado líquido de € 61.667,42 em 2007, a G…passou a obter nos anos seguintes resultados líquidos € 1.022.965,05 (2009); € 1.025.087,97 (2010) e € 911.967,00 (2011) e € 994.892,38 (2012).

[21] As actas das assembleias gerais da G… SA, participada pela SGPS A… a 100%, contém expressões reveladoras do entendimento de que estes dividendos se destinam a ser entregues aos ex-accionistas da G… SA, actuais accionistas da A…SGPS: por ex. as actas 14, 17, 18 onde se diz que estavam presentes os administradores do acionista único e foi deliberada a distribuição de dividendos aos accionistas ou a acta 22 onde se diz que foi decidida a distribuição à única acionista mas se refere que estavam presentes todos os accionistas. Na acta 16 diz-se que estavam presentes todos os accionistas e um dos accionistas apresentou proposta de distribuição de dividendos antecipados.

[22] Gustavo Courinha, “A Cláusula Geral Anti-abuso no Direito Tributário, Contributos para a sua compreensão”, Almedina, 2009, p. 173.

[23] A avaliação da equivalência efectuada no acórdão, no sentido de que “o pagamento de dividendos, efectuado por uma sociedade em favor dos seus sócios, não tem um fim económico equivalente à aquisição de acções aos sócios e respectivo pagamento porque no primeiro caso, os sócios continuam na titularidade das mesmas e no segundo há transferência das acções do património para a sociedade adquirente”, é efectuada comparando dois tipos de negócio em abstracto, e não atendendo “à apreciação rigorosa dos termos acordados, de onde se retira as ilações económicas, práticas, etc. das opções jurídicas escolhidas” (Gustavo Courinha, ob. cit. p. 175).

[24] Como resulta do balanço da empresa em 31-12-2009 o activo líquido da empresa era, descontando o valor das próprias acções da G…, SA (cujo preço havia que pagar), de apenas € 49.937,60 em depósitos bancários.