DECISÃO ARBITRAL
1. Relatório
A…, contribuinte n.º…, residente na Rua…, … –…, em Alfragide, doravante designado por Requerente, submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista à anulação do ato tributário de liquidação de IRS de 2012, com o n.º 2013…, no valor de € 7.690,02.
A Requerente fundamenta a ilegalidade do ato tributário, assente na errónea quantificação e qualificação dos rendimentos sujeitos a tributação pela AT, porquanto e sintetizando, desconsiderou ilegalmente, em violação do disposto na al. a) do artigo 51º do CIRS, a dedução ao rendimento tributável das despesas e encargos suportados pela impugnante, necessários e inerentes à alienação e aquisição dos bens ou direitos de que emergiu o rendimento obtido, despesas e encargos esses no valor de € 16.326,84 e que se compõem do pagamento de IMT, Imposto do Selo e emolumentos registais e honorários.
Assim não se entendendo, subsidiariamente pede que se considere a dedução ao valor de realização do valor proporcional, quando aplicável, das despesas e encargos supra referidos suportados pelo Requerente, necessários e inerentes à alienação e aquisição dos bens ou direitos de que emergiu o rendimento obtido, em função da diferença entre os bens ou direitos por ele recebidos e os bens ou direitos por ele transmitidos.
A Autoridade Tributária e Aduaneira, por seu turno, apresentou Resposta, na qual em suma, defendeu a conformidade legal da liquidação objeto destes autos, pugnando assim pela improcedência dos pedidos formulados, sustentando em síntese, que ao abrigo do normativo em que igualmente se apoia o Requerente, apenas são passíveis de dedução fiscal os encargos associados ao imóvel alienado por via de permuta.
O árbitro único foi designado em 27.08.2015.
Em conformidade com o previsto no artigo 11º n.º 1 alínea c) do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 23.09.2015.
Foi agendada primeira reunião do tribunal arbitral, a qual foi dada sem efeito face ao posicionamento das partes, tendo este tribunal singular prescindido da formulação de alegações, dada a controvérsia nos presentes autos se centrar em matéria de direito.
2. Saneamento
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4º e 10º n.º 1 e 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março), tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado tempestivamente. O processo não enferma de nulidades.
Não tendo sido erigidas exceções, nada obsta a que se conheça do mérito do pedido de pronúncia arbitral formulado pelo Requerente.
3. Matéria de facto
3. 1. Factos provados:
Analisada a prova documental produzida, o posicionamento das partes face à factualidade trazida a estes autos, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:
1. Através de escritura pública de permuta lavrada a 2 de Abril de 2012, o ora Requerente – primeiro outorgante - deu ao segundo outorgante de tal ato, metade indivisa dos prédios urbanos inscritos na matriz predial urbana da freguesia de … sob os artigos … e…, pelo valor de € 34.546,14 e € 174.355,86, respetivamente.
2. Por sua vez, o ora Requerente, nesse mesmo ato notarial, recebeu em troca, do segundo outorgante, metade indivisa do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … sob o artigo…, pelo valor de € 426.716,18.
3. Em face da permuta realizada, o Requerente pagou ao segundo outorgante o montante de € 217.014,18 em dinheiro, correspondente ao diferencial entre o valor atribuído entre as metades indivisas entregues - € 208.906,00 - e o valor atribuído à metade indivisa recebida - € 426.716,18.
4. Em face da permuta levada a efeito, o Requerente pagou IMT no valor de € 14.157,92 e Imposto do Selo, no montante de € 1.742,51.
5. O Requerente despendeu o valor de € 176,41, correspondente a metade dos honorários notariais devidos pela celebração da escritura pública de permuta.
6. Em resultado da versada escritura pública de permuta, foi efetuado o competente registo junto da Conservatória do Registo Predial relativo ao artigo … da freguesia do…, registo esse que teve um custo em sede de emolumentos, no montante de € 250,00.
7. O Requerente veio a apresentar, em 31.05.2013, declaração Modelo 3 de IRS, juntando o anexo G, declaração essa da qual resultou um valor a favor da Autoridade Tributária de € 2.276,70.
8. Em 6 de Novembro de 2013 foi apresentada declaração de IRS de substituição, sem que tivesse sido lançado qualquer valor de despesas e encargos nos campos 401 e 402 do Anexo G, o que originou a emissão da liquidação n.º 2013…, com o valor a pagar de €7.690,02.
9. Em 22 de Novembro do referido ano, o Requerente apresenta Reclamação Graciosa, pugnando pela consideração dos itens referidos em 4.e 5. enquanto despesas e encargos, a qual foi objeto de indeferimento.
10. Em face do indeferimento da pretensão reclamatória, o Requerente deduz Recurso Hierárquico, o qual foi objeto de indeferimento expresso, comunicado através de ofício datado de 3 de Junho de 2015.
11. Em 3 de Julho de 2015 vem o Requerente apresentar o presente Pedido de Pronúncia Arbitral, tendo pago a respetiva taxa de justiça inicial.
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.
3.2. Fundamentação da matéria de facto provada:
No tocante aos factos provados, a convicção do árbitro fundou-se na prova documental junta aos autos e bem assim no posicionamento assumido por Requerente e Requerida quanto aos factos trazidos a estes autos arbitrais.
4. Matéria de direito:
4.1.Objeto e âmbito do presente processo
Constitui questão decidenda nos presentes autos a de saber se as verbas no valor de € 16.326,84 documentalmente trazidas a este processo pelo Requerente poderão ou não constituir despesas e encargos a que alude o disposto no artigo 51º do CIRS e, em tal medida, acrescerem ou não ao custo de aquisição dos bens para efeitos de mais-valias e assim eventualmente influenciarem a liquidação de IRS do ano de 2012.
4.2. Da consideração das despesas e encargos para efeitos de determinação das mais-valias nos termos da al. a) do artigo 51º do CIRS:
Vejamos então o enquadramento legal em que se circunscreve a questão a decidir nestes autos.
Dispõe o artigo 51º do CIRS, o seguinte:
Artigo 51.º
Despesas e encargos
“Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:
a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º;
b) As despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à alienação, nas situações previstas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 10.º “
Sendo que, por sua vez, preceitua o artigo 10º do versado compêndio legal, no tocante às alíneas referidas no supra citado normativo, que:
Artigo 10.º
Mais-Valias
“1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário;
b) Alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 81.º do Código do IRC, seja considerado como mais-valia; (Redação dada pela lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro);
c) Alienação onerosa da propriedade intelectual ou industrial ou de experiência adquirida no sector comercial, industrial ou científico, quando o transmitente não seja o seu titular originário;”
Do cotejo dos normativos vindos de citar, temos, desde logo, por seguro, que o eventual acréscimo ao valor de aquisição relaciona-se, no caso da alínea a) do artigo 51º do CIRS, com as despesas e encargos incorridas relativamente a mais-valias resultantes de bens imobiliários, ao passo que, nas situações a que se refere a alínea b) dessa mesma norma, apenas será aplicável a situações em que estejam em causa mais-valias que têm por base bens mobiliários.
Assim, atenta a dicotomia que decorre das versadas alíneas a) e b) desse mesmo artigo 51º, não poderemos deixar de afastar da apresente apreciação o disposto na alínea b), porquanto no caso em análise se está perante mais-valias que têm na sua génese a transmissão de bens imobiliários, cumprindo, pelo exposto, atentar na versada alínea a).
Por outro lado, ainda no âmbito da alínea a) do artigo 51º do CIRS, o legislador previu duas diferentes realidades suscetíveis de originar acréscimo ao valor de aquisição do bens imobiliários que estão na base da mais-valia a apurar, a saber:
- os encargos suportados nos últimos 5 anos com a valorização dos bens (constante da primeira parte);
- as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação das situações constantes da al. a) do n.º 1 do artigo 10º do CIRS (constante do segundo segmento do preceito);
Ora, as verbas trazidas aos presentes autos pelo Requerente como pretensamente conferindo o direito a acrescer ao valor de aquisição, manifestamente não se enquadram na noção de encargos de valorização dos bens, na medida em que tais encargos se reconduzem às despesas decorrentes de obras de beneficiação realizadas num imóvel.
Restando, assim, atentar na eventual subsunção à previsão normativa constante da segunda parte do disposto na al. a) do artigo 51º do CIRS
Desde logo, da leitura da referida alínea e em particular da sua segunda parte, colhe-se imediatamente a opção legislativa que presidiu à redação da norma, no sentido de lançar mão de conceitos indeterminados em detrimento de uma eventual tentativa de formular um rol de despesas que pudessem taxativamente integrar as despesas passíveis de acrescer ao valor de aquisição dos bens.
Tal técnica legislativa propicia assim a dedutibilidade de qualquer gasto que se venha a entender a coberto desse mesmo conceito indeterminado constante da norma legal, o que se entende ser, de resto, apropriado no sentido de permitir acautelar, em abstrato, a elegibilidade de um diferente espetro de despesas em função do caso concreto em que a questão se coloque, não limitando assim ab initio através de cláusula fechada a consideração hipotética de determinadas despesas.
Assim, temos em primeiro lugar a fixação pelo legislador do requisito atinente à necessidade, sendo que para a verificação de tal necessidade dever-se-á estar perante um gasto absolutamente indispensável em ordem à obtenção do rendimento, o qual será, a jusante, objeto de tributação em sede de mais-valias.
Por outro lado, as despesas a que se refere o legislador na al. a) do artigo 51º do CIRS devem ser igualmente efetivas, isto é, gastos cuja realização foi incorrida pelo sujeito passivo e cuja comprovação quanto à sua realização e consumação seja isenta de dúvida.
Pouco ou nenhum sentido faria, de resto, que assim não fosse e, ao invés, se admitisse a dedutibilidade de verbas cuja sua realização não fosse certa, comprovável e de facto suportada pelo sujeito passivo, sob pena de desvirtuação do princípio da capacidade contributiva, o qual, como é consabido, tem consagração constitucional ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 104º da Constituição.
Por último, erige o legislador um terceiro requisito o qual se prende com o facto de as despesas terem de ser inerentes à aquisição e à alienação.
Na falta de outros elementos que concorressem a um sentido menos imediato do texto da lei, o intérprete deve optar pelo sentido que melhor e imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, na pressuposição decorrente do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
Ante tal princípio interpretativo das normas legais, deve entender-se por tal adjetivo algo que está intimamente unido, que é intrínseco ou inseparável.
A propósito da dilucidação de tal conceito de despesas e em particular no que respeita ao requisito de inerência a que alude o legislador, têm vindo a pronunciar-se os tribunais superiores, nomeadamente o Tribunal Central Administrativo (Sul e Norte) e bem como assim, o Supremo Tribunal Administrativo.
Considerou o Supremo Tribunal Administrativo[1], a propósito do conceito de inerente, o qual igualmente consta da alínea b) do preceito em análise, que: “O qualificativo "inerente", logo etimologicamente - in re - contem, a se, uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável.”
Mais densificando no corpo do aresto já identificado, novamente a propósito da característica e requisito da inerência, o seguinte: “E, pelo contrário, há-de entender-se que ela não só traz em si um quid significante acrescentativo, como é mesmo a verdadeira subordinante do preceito. Não basta, pois, como aliás se refere na sentença, que as despesas sejam conexas à obtenção do rendimento; é necessário que elas dele sejam indissociáveis.”
Concluindo assim o versado aresto que “Nos termos do disposto no artº 51º, al. b) do CIRS, para efeitos de tributação da mais-valia respetiva, só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes.”
Propendendo em idêntico sentido ao do já citado acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, o Tribunal Central Administrativo do Sul[2] veio a entender:
“1. Artigo 51º nº1 a) do C.IRS - as despesas suportadas pelo sujeito passivo que podem ser deduzidas ao valor de aquisição do imóvel para efeitos de mais-valias;
2. No critério legal, só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes. Tal critério contém uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável. A despesa há-de ser integrante da própria alienação. Não se vê, efectivamente, que outro sentido se possa atribuir à expressão “inerentes à alienação”; Não basta, pois, que as despesas sejam conexas à obtenção do rendimento, é necessário que elas dele sejam indissociáveis.”
Por tudo quanto supra se vem expondo e face à jurisprudência supra citada, a qual de perto acompanhamos e secundamos, não poderá deixar de se firmar que toda e qualquer despesa a que se refere a al. a) do artigo 51º do CIRS, para alcançar o patamar de dedutibilidade, por via da sua adição ao valor de aquisição do bem em causa, não poderá deixar de revestir cumulativamente características de indispensabilidade, certeza quanto à sua realização e indissociabilidade ou inseparabilidade para com a obtenção do rendimento.
Sendo assim, será ante o confronto com tais requisitos que terá de ser aferida a cabimentação legal das despesas invocadas como dedutíveis pelo Requerente para efeitos de tal normativo.
Importa, no entanto, e antes de tal exercício, igualmente dilucidar a questão sobre quais os bens imobiliários a que se refere o legislador na al. a) do n.º 1 do artigo 10º, por remissão da al. a) do artigo 51º, ambos do CIRS, firmando estarmos in casu no domínio da tributação sobre incrementos ou acréscimos patrimoniais, os quais verão a sua tributação ser efetuada em sede de IRS, categoria G, por força do preceituado no artigo 10.º, n.º1, do CIRS, desde que não devam ser considerados rendimentos de outras categorias.
As mais-valias caraterizam-se pelo facto dos proveitos não decorrerem de qualquer atividade do sujeito passivo, antes radicando da ideia de ocasionalidade e não expectabilidade da sua ocorrência e formação.
Assim, estamos perante a tributação de ganhos decorrentes do aumento patrimonial do sujeito passivo, o que trará, por consequência, o aumento da capacidade contributiva, pelo que o ganho obtido, isto é, a mais-valia realizada, será sujeita a imposto, em sede de IRS, pela categoria G.
Neste conspecto, dúvidas não soçobram quanto a que bens, in casu imobiliários, terão de se verificar os requisitos de necessidade, efetividade e inerência a que alude o legislador: ao bem ou bens que deram origem ao incremento patrimonial objeto de tributação em sede de IRS, categoria G.
O que vale por afirmar, que o triplo crivo e vínculo cuja aferição se impõe efetuar para efeitos de eventual acréscimo ao valor de aquisição, terá de recair sobre os bens alienados e não sobre quaisquer outros bens.
Podendo, no entanto, em conformidade com o expendido na al. a) do artigo 51º do CIRS, tais despesas terem tido lugar, quer no momento da aquisição, como no momento da alienação, desde que se refiram ao bem imobiliário alienado e que está na base do incremento patrimonial objeto de tributação pela categoria G.
De resto, este mesmo entendimento vem sendo sufragado pela jurisprudência dos tribunais superiores, não podendo deixar-se de citar trecho do sumariado pelo Tribunal Central Administrativo Norte: “Nos termos do artigo 48º (hoje 51º) do CIRS, na determinação das mais valias sujeitas a imposto, ao valor da aquisição acresceriam as despesas inerentes à alienação, nas situações previstas nas alíneas b), c) do nº 1 do artigo 10º, o que implica que tais despesas teriam de respeitar ao imóvel alienado e não a outro.”[3]
No caso dos autos vindo de citar, estavam em causa despesas que o sujeito passivo considerava elegíveis e as quais se reportavam a bens adquiridos e não ao imóvel objeto de alienação.
Para maior clareza, não deixaremos de aqui deixar citado trecho com relevância para a presente decisão arbitral:
“Na sentença recorrida, escreveu-se o seguinte: “A única questão em causa nos autos consiste em saber se os custos indicados pelo impugnante relativos à aquisição e alienação dos imóveis referidos devem ou não ser tidos em conta para efeitos de determinação do montante de mais valias sujeito a tributação.
A Administração Fiscal não considerou tais encargos e despesas por entender não serem relativos ao imóvel alienado mas a outros adquiridos pelo impugnante.
O art. 48° (actual 51°) do CIRS estabelecia o seguinte:
“Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescerão:
a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à alienação, nas situações previstas na alínea a) do n° 1 do artº. 10°;
b) As despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à alienação, nas situações previstas nas alíneas b) e c) do n° 1 do artº 10°.”
No caso vertente, temos que as despesas são imputadas da seguinte forma:
1) despesas relacionadas com a aquisição das fracções “AT”, ”Bl” e 7”:
a) emolumentos notariais 251.555$00;
b) sisa 391.700$00;
c) selo 5.136$00;
2) despesas relacionadas com a alienação da fracção “BH”:
a) amortização do empréstimo 3.586.383$60
Assim, os custos referidos em 1) não podiam ser tomado em consideração, por força do disposto no artº. 48°, uma vez que não se reportavam ao imóvel alienado mas à aquisição das fracções adquiridas por escritura de compra e venda de 14/01/1998 pelo que não merece qualquer censura a actuação da Administração Fiscal.”
Doutrina esta, dimanante do aresto que antecede que em absoluto acompanhamos, porquanto o sentido literal e contextual da concatenação de ambos os preceitos legais nos segmentos vindos de analisar, não poderá deixar de se aferir a partir da tríplice condicionante constante da al. a) do artigo 51º do CIRS reportada ao bem ou bens imobiliários objeto de alienação e que estão na base do cálculo das mais-valias obtidas e não a um qualquer outro bem exógeno à obtenção do rendimento sujeito a tributação pela categoria G.
Descendo ao caso dos vertentes autos e às concretas despesas cuja consideração fiscal se peticiona pelo Requerente para efeitos de acréscimo ao valor de aquisição dos prédios alienados – dado ao segundo outorgante em troca de um outro – não podemos deixar de concluir que os valores respeitantes quer ao IMT, quer ao Imposto do Selo e bem assim os emolumentos registais suportados, não logram enquadrar-se na norma erigida pelo legislador na al. a) do artigo 51º do CIRS, com remissão para a al. a) do n.º 1 do artigo 10º do referido compêndio legal.
E não logram tal enquadramento e subsunção à norma de previsão porquanto no caso das despesas vindas de elencar, estamos perante gastos incorridos com um bem imobiliário adquirido pelo Requerente e não com despesas com o bem objeto de alienação e que no caso correspondem a dois artigos matriciais.
Razão pela qual, não se estando perante despesas ocorridas relativamente aos imóveis objeto de alienação e consequentemente que estão na origem do apuro de mais-valias, inquinada está a possibilidade do Requerente poder ver contempladas tais verbas enquanto acréscimo ao valor de aquisição de tais bens imobiliários, por desconformidade com o disposto nos artigos 51º, al. a e 10º, n.º 1 al. a), ambos do CIRS.
Censura alguma merecendo assim a liquidação objeto destes autos no que a este concreto segmento do pedido de pronúncia arbitral diz respeito, improcedendo em decorrência os pedidos formulados pelo Requerente com tal objeto.
Por fim, insurge-se o Requerente igualmente contra a desconsideração conferida pela Autoridade Tributária relativamente aos honorários notariais suportados pelo Requerente, visto que quanto aos demais honorários notariais não custeados por este, pela fundamentação já supra alinhada, estão prejudicados.
A este respeito, na esteira da factualidade dada por provada – vide ponto 5. – está-se perante um gasto efetivamente incorrido em virtude da celebração de escritura pública de permuta, em que o ora Requerente, além do mais, alienou dois prédios em troca de um outro.
Se é certo que não se está perante uma escritura de compra e venda, mas antes perante uma permuta, não é menos objetivo constatar que foi por via de tal ato notarial que o Requerente logrou obter a alienação de tais dois prédios urbanos na parte de que era titular e, nessa medida, gerar o incremento patrimonial que o ordenamento fiscal sujeita a tributação em sede de mais-valias, categoria G.
Tendo a Requerente suportado metade de tais honorários notariais devidos ao notário emitente de tal documento de quitação, apenas se poderá ter por efetiva a despesa atinente ao valor que veio a ser realmente suportado pelo sujeito passivo e aqui Requerente (enquanto beneficiário da dedutibilidade do respetivo valor em sede de apuro de mais-valias), no caso, € 176,41.
Ora, neste conspecto, não poderá deixar de se concluir no sentido que tal despesa de honorários notariais, no valor de € 176,41, é não só efetiva, por certa e comprovada que esta se encontra, como igualmente absolutamente necessária e inerente, na medida em que indissociável, para a obtenção do incremento patrimonial sujeito a tributação, cujo facto tributário ocorreu por via desse mesmo ato notarial através do qual o Requerente, entre o mais, alienou metade indivisa sobre dois prédios urbanos de que era proprietário.
Importa ainda, ter em consideração o modo de repartição de tal despesa, face ao facto de se estar perante a alienação num mesmo ato notarial relativa (a parte de) dois prédios urbanos.
De acordo com o Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro, nomeadamente da conjugação dos seus artigos 3º e n.º 2 do artigo 11º a contrario, resulta que se está perante a tributação de um único ato notarial, razão pela qual, na falta de especificada discriminação da fatura/recibo notarial, deverá a imputação relativa a cada uma das alienações objeto de quantificação para efeitos em sede de mais-valias ser efetuada em partes iguais, porquanto o valor atribuído aos imóveis não constituir critério para a fixação dos respetivos honorários notariais.
Face ao exposto, não poderá deixar de recair sobre a liquidação objeto destes autos um juízo de ilegalidade, por erro na qualificação e quantificação do ato tributário, no segmento em que não fez acrescer tal despesa relativa a honorários notariais, no valor de € 176,41, ao valor de aquisição das metades indivisas sobre os dois prédios urbanos por esse ato notarial pelo Requerente alienadas, devendo, em consequência, ser parcialmente anulada a liquidação de IRS de 2012 em causa e substituída por outra que faça acrescer tal despesa, em partes iguais a cada um dos valores de aquisição das metades indivisas dos prédios objeto de tributação no ato tributário que está na base da mais-valia em apreço nesta pronúncia arbitral.
5. DECISÃO:
Em face do supra exposto, decide este tribunal arbitral singular julgar o Pedido de Pronúncia Arbitral parcialmente procedente relativamente ao valor de aquisição que está na base das mais-valias sujeitas a tributação.
Em consequência, decide-se anular parcialmente o ato tributário de liquidação de IRS de 2012, com o n.º 2013…, no qual foi apurado imposto a pagar no valor de €7.690,02, com base no vício de violação de lei, por erro na qualificação e quantificação do ato tributário, na parte em que:
a) Não foi considerado e acrescido ao valor de aquisição das metades indivisas dos prédios alienados, os honorários notariais suportados pelo Requerente, no montante de € 176,41, em violação do disposto na al. a) do artigo 51º do CIRS despesa essa que se deverá repartir em partes iguais pelo valor de aquisição de cada uma das metades indivisas transmitidas pelo Requerente.
Fixa-se o valor do processo em €7.690,02 (setenta mil, oitocentos e oitenta e nove euros e trinta e quatro cêntimos), nos termos do artigo 97.°-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelas partes na proporção do decaimento, ou seja, em 3% para a Requerida e 97% para o Requerente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se esta decisão arbitral às partes e, oportunamente, arquive-se o processo.
Lisboa, 23 de Março de 2016
O árbitro singular
(Luís Ricardo Farinha Sequeira)
Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, com versos em branco e por mim revisto.
[1] Ac. STA, de 18 de Novembro de 2009, no âmbito do proc. n.º 0585/09.
[2] Ac. TCA Sul, proc. n.º 06824/13, de 14.04.2015.
[3] Ac. TCA Norte, proc. n.º 252/04, de 17.12.2004.