Decisão Arbitral
O tribunal arbitral em funcionamento com árbitro singular constituído no CAAD – Centro de Arbitragem Administrativa nos termos do regime jurídico instituído pelo Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro[1], para o qual foi designado pelo respetivo Conselho Deontológico, o árbitro da lista do Centro Nuno Maldonado Sousa, elabora seguidamente a sua decisão arbitral.
1.1.Relatório
1.2. Constituição do tribunal arbitral
A…, Lda., com sede na Rua…, n.º…, …, … –… Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o número único de matrícula e de pessoa coletiva…, com o capital social de € 50.000,00, sociedade unipessoal por quotas e que anteriormente se denominava B…, S.A.[2], apresentou pedido de constituição do tribunal arbitral, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do RJAT e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 Março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira[3].
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 25-06-2015 e foi notificado à AT na mesma data.
Nos termos em que dispõem as normas do artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, nº1, al. b) do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação em 26-08-2015. Em conformidade com a regra constante do artigo 11.º, n.º 1, al. c) do RJAT, o tribunal arbitral ficou constituído em 10-09-2015.
1.3. O pedido da Requerente
No seu Requerimento Inicial a Requerente peticionou declaração de ilegalidade e anulação de:
(i) Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º…, com o montante global a pagar de € 35.038,89;
(ii) Liquidação de imposto do selo[4] n.º…, com o montante global a pagar de € 2.036,50.
Para fundamentar o seu pedido a Requerente sustenta que as liquidações foram feitas tendo por base de incidência o valor patrimonial tributário do prédio urbano em causa em momento diferente daquele que é relevante para o efeito, defendendo que os citados impostos devem ser calculados com referência ao VPT[5] vigente na data da transmissão e não àquele que mais tarde resultou de avaliação subsequente a alterações feitas no imóvel. Alicerça a sua pretensão na norma do artigo 18º-3 do CIMT[6] que considera ser a aplicável.
A Requerente pediu também a condenação da AT no pagamento de indemnização pelos custos suportados ou a suportar pela Requerente com a prestação de garantia com vista à suspensão do processo executivo.
1.4. A posição da AT
A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou a sua Resposta[7] sustentando a legalidade das liquidações e defendeu a improcedência do pedido e da sua fundamentação, entendendo que o VPT relevante é aquele que vigorava no momento em que as citadas liquidações foram feitas, porque as alterações que foram efetuadas no prédio não alteraram a sua natureza. Considera por isso que é aplicável à situação a norma do artigo 18º-2 do CIMT.
1.5. Instrução do processo e alegações
Por considerar que as questões em discussão neste processo são sobretudo de direito o tribunal considerou que os autos se encontravam em estado de ser proferida decisão após a Resposta da AT, por estarem instruídos com prova documental apresentada pela Requerente e com o PA[8] da AT, que não foram objeto de impugnação, não tendo também sido requeridos nenhuns outros atos de instrução. Nesse contexto e tendo em vista evitar a prática de atos potencialmente inúteis, o tribunal convidou a Requerente e a AT a manifestarem-se sobre a necessidade de efetuar a reunião a que se refere o artigo 18º do RJAT e a necessidade de produção de alegações, orais ou por escrito, iniciando-se o período para prolação da decisão.
Decorrido a período sem que as Partes se tenham manifestado, cabe agora passar à fase da decisão.
1.6. Saneamento
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e tem competência em razão da matéria segundo dispõem as regras do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.
As Partes são titulares de personalidade e capacidade judiciárias (sendo a da AT nos termos da disciplina constante do artigo 4.º, n.º 1 do RJAT e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e do artigo 1.º, al. a) da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março), são legítimas e estão regularmente representadas.
Não há nulidades que inquinem o processo, nem questões prévias de natureza processual.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa pelo que se impõe decidir.
1.7.Decisão
1.8. Matéria de facto
1.8.1. Factos que se consideram provados
Nestes autos ficaram assentes os seguintes factos:
A. Em 26-12-2007 a Requerente era uma sociedade anónima cujo objeto social era a “gestão e investimento imobiliário, e ainda a aquisição, alienação e oneração de bens imóveis, designadamente a sua compra para revenda; a promoção, construção, comercialização e exploração de empreendimentos imobiliários e/ou turísticos”. [1º RI: doc. 5; 3º R-AT]
B. Em 26-12-2007 a Requerente adquiriu por “escritura de compra e venda”, pelo preço de 315.000,00 €, 95% do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo … da freguesia de…, descrito na … Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … e sito na Rua…, número… . [2º RI: doc. 6; 3º R-AT]
C. O prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de…, concelho de Lisboa, pelo artigo … teve origem no artigo … da freguesia de … (extinta), concelho de Lisboa. [2º RI: doc. 7; 3º R-AT]
D. Em 26-12-2007 o prédio urbano adquirido pela requerente era destinado exclusivamente a habitação [escritura pública que constitui o doc. 5 junto com o RI, p. 1vº].
E. No título de aquisição a Requerente declarou destinar a parte adquirida do prédio a revenda [escritura pública que constitui o doc. 5 junto com o RI, p. 2]
F. Quando foi celebrada a escritura de compra e venda do prédio, a caderneta predial respetiva expressava que este tinha o valor patrimonial tributário de € 22.998,66, determinado no ano de 2003. [3º RI: doc. 8; 4º R-AT]
G. Na escritura de compra e venda consta referência a que “são pagos € 3.200 e € 25,00, verbas 1.1[9] e 15.1[10] da TGIS”. [3º RI: doc. 6, p. 3; 4º R-AT]
H. Na caderneta predial urbana do artigo … da freguesia de …(extinta), concelho de Lisboa impressa no Serviço de Finanças de Lisboa –…Bairro, em 31-03-2005, na descrição do prédio, consta que este tinha 2 pavimentos e sótão; consta também que o valor patrimonial tributário era de € 22.998,66, determinado no ano de 2003; consta ainda que a afetação do prédio é a habitação. [7º RI: doc. 8]
I. O notário que celebrou a escritura de compra e venda do prédio arquivou certidão emitida pelo Serviço de Finanças de Lisboa-…, comprovativa de que a Requerente se encontrava coletada para a atividade de compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e de que exerceu normal e habitualmente essa atividade no ano anterior e declarou ter verificado por esse documento que a venda à Requerente “se encontrava isenta de IMT nos termos do artigo 7º do respetivo Código”. [4º RI: doc. 6, p. 2vº; 5º R-AT]
J. O prédio encontrava-se em ruínas à data de aquisição pela Requerente [6º RI e 7º R-AT].
K. A Câmara Municipal de Lisboa emitiu em outubro de 2007[11] o alvará de obras de demolição n.º …/… /2007, a que se refere o processo municipal que titula a execução de obras de demolição, que incidem sobre o prédio sito na Rua…, …, freguesia de… . [6º RI: doc. 11]
L. A Câmara Municipal de Lisboa emitiu em 8 de outubro de 2007 o alvará de obras de construção n.º …/…/2007, a que se refere o processo municipal que titula a execução de obras que incidem sobre o prédio sito na Rua…, …, freguesia de… . [6º RI: doc. 14]
M. Em resultado das obras efetuadas foi entregue em 16 de Dezembro de 2010, a declaração modelo 1 de IMI, tendo o prédio sido avaliado em 2 de Março de 2011, com um VPT de € 599.540,00. [8º e 9º RI e 8º R-AT].
N. Na caderneta predial urbana do artigo … da freguesia de…, concelho de Lisboa obtida via internet em 21-11-2011, na descrição do prédio, consta que este tem 5 pisos e consta também que o valor patrimonial tributário era de € 599.540,00, determinado no ano de 2010; consta ainda que a afetação do prédio é a habitação. [7º, 8º e 9º RI: doc. 15]
O. Em 16-12-2010 a Requerente procedeu à entrega da declaração modelo 1 de IMI junto do Serviço de Finanças de Lisboa – … [10º RI e 9º R-AT: PA1, pp. 71-72].
P. A Requerente ainda era dona do prédio em 28-12-2007. [10º RI e 3º R-AT]
Q. Em 14-09-2011 e com base em declaração da Requerente da mesma data foi elaborada pela AT liquidação de IMT “pela caducidade da isenção prevista no n.º 1 do artigo 7º do CIMT” relativamente à compra da parte do prédio referenciada nos autos, com o n.º de identificação …, no valor de 35.038,89 €, correspondente à coleta de 34.173,78 € calculada à taxa de 6% sobre a matéria coletável de 569.563,00, e a juros compensatórios, sendo a data limite de pagamento em 15-09-2011 [doc. 3 e PA1, pp. 10-12].
R. Em 14-09-2011 e com base em declaração da Requerente da mesma data foi elaborada pela AT liquidação de Imposto do Selo – verba 1.1, com o n.º de identificação…, no valor de 2.036,50 €, correspondente à coleta no mesmo valor, calculada à taxa de 0,008% sobre a matéria coletável de 254.563,00 € (569.563,00 € - 315.000,00 €), sendo a data limite de pagamento em 15-09-2011 [doc. 18].
S. Em 05-12-2011 foi rececionada no Serviço de Finanças de Lisboa-…reclamação graciosa datada de 02-12-2011, apresentada pela Requerente contra a liquidação de IMT e juros compensatórios, referente ao prédio referido nestes [11º RI: doc. 17 e PA1, p. 1]
T. Em 14-05-2012 a Requerente peticionou a ampliação do pedido na reclamação graciosa, de modo a incluir nele também a anulação da liquidação de Imposto do Selo n.º… . [11º RI: doc. 18].
U. A Requerente foi notificada do indeferimento da reclamação graciosa por despacho de 19-07-2012, em cuja fundamentação, para além do mais que dela consta e no que se refere em especial ao IS, se pode ler : [12º RI: doc. 19, p. 3]
1.2 A 14/5/2012, a contribuinte apresentou um documento requerendo “a ampliação do pedido da reclamação de modo a incluir também a anulação da liquidação do Imposto de Selo nº…” (com data limite de pagamento também a 15/9/2011), invocando que os fundamentos de facto e de direito de ambas as liquidações são os mesmos (fls. 139 a 142 e 146).
Trata-se, no entanto, de um diferente pedido, logo de uma diferente reclamação graciosa, como decorre, nomeadamente, do artigo 71º do CPPT.
Ainda que estivessem reunidos os demais pressupostos para a cumulação dos pedidos (não estão, desde logo por se tratar de tributos diferentes), a intempestividade do requerimento respeitante ao imposto do selo só por si não permite satisfazer a pretensão da reclamante.
V. Na fundamentação do despacho do indeferimento da reclamação graciosa de que a Requerente foi notificada, para além do mais que dela consta e no que se refere em especial ao IMT, pode-se ler: [12º RI: doc. 19, p. 3]
3.1 Sob a epígrafe “aplicação temporal das taxas”, dispõe-se no nº 2 do artigo 18º do Código de IMT, invocado pela reclamante, que se “ocorrer a caducidade da isenção, a taxa e o valor a considerar na liquidação serão os vigentes à data da liquidação”.
No nº 3 do mesmo artigo, porém, estabelece-se que, quando, na situação de caducidade referida, “e após a aquisição dos bens, tenham ocorrido factos que alterem a sua natureza, o imposto será liquidado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão”.
3.2 Prevê-se na norma citada do nº 3, como pressuposto da sua aplicação, a hipótese de ter ocorrido uma alteração da natureza do prédio objecto da transmissão, como seria o caso, referido pela própria contribuinte, de se ter adquirido um prédio rústico que entretanto foi transformado em urbano. Salvo melhor opinião, não é pressuposto da aplicação da norma apenas uma alteração do valor do prédio em consequência da realização de obras.
Ora, a contribuinte alega ter efectuado obras que alteraram o valor do imóvel. Não resulta, porém, dos autos que tenha ocorrido qualquer facto que haja alterado a sua natureza, pelo que não parece que tenha aplicação ao caso a norma citada do nº 3 do artigo 18º do CIMT.
W. .Em 19-07-2012 a Requerente intentou recurso hierárquico do indeferimento da reclamação graciosa das liquidações de IMT e de IS. [12º RI: doc. 20]
X. Por despacho de 29-12-2014 que foi notificado à Requerente, foi indeferido o recurso hierárquico e mantida a decisão tomada na reclamação graciosa. [12º RI: doc. 2]
1.8.2. Factos que se consideram não provados
Não se considera provado que a Requerente tenha prestado garantias bancárias no valor de € 44.648,18 quanto ao ato de liquidação de IMT e € 2.699,58 quanto ao ato de liquidação de IS para suspensão dos processos de execução fiscal, como afirma (14º RI), por não ter apresentado qualquer prova para sustentar a sua alegação.
Não foram invocados outros factos com interesse para a decisão da causa.
1.8.3. Fundamentação da matéria de facto provada
A convicção do tribunal assentou na prova documental constante dos autos e na posição tomada relativamente a cada facto pelas Partes nos articulados, em especial na própria declaração da AT (1º R-AT) no sentido de os factos subjacentes à liquidação não gerarem controvérsia.
1.9. Matéria de direito
Nestes autos as questões a resolver são atinentes a dois impostos; o IMT e o IS.
No que concerne ao IS impõem-se conhecer primeiramente ex officio se ocorreu a caducidade do direito da Requerente impugnar a liquidação com os fundamentos com que o faz. Improcedendo esta exceção haverá que apreciar a questão de fundo que é a de saber qual é a matéria tributável para este imposto, importando ter presente que esta é em geral determinada pelas regras do CIMT, sendo que o IMT no caso dos autos tem regulação específica para a situação de caducidade de isenção do regime da compra para revenda, que não vigora no IS. Poderá pois ter que se averiguar se a liquidação a posteriori que vigora para o IMT nos casos de caducidade da referida isenção, importa correção da primitiva liquidação de IS, se sobrevier maior VPT.
A questão de fundo a resolver em sede de IMT consiste em determinar qual a matéria coletável a considerar nos casos de caducidade da isenção do regime da compra para revenda, nas situações em que o prédio tenha sido reavaliado por ter sido sujeito a alterações e nova avaliação.
Se procederem os pedidos de anulação das liquidações haverá ainda que averiguar o direito da Reclamante a ser ressarcida dos custos com a prestação de garantia com vista à suspensão do processo executivo.
1.9.1. Caducidade (IS)
Os vícios imputados pela Requerente ao ato residem na sua anulabilidade (163º-1 CPA[12], ex-vi 29-1-d RJAT) podendo ser impugnados dentro do prazo estabelecido (163º-3 CPA, ex-vi 29-1-d RJAT). Tratando-se de tributo do Estado, o direito a essa prestação não está na disponibilidade das partes, pelo que cabe ao tribunal aplicar oficiosamente o regime legal (331º CC[13]), o que se fará.
Como se assentou na matéria de facto a liquidação de IS teve data limite de pagamento em 15-09-2011 e em 14-05-2012 a Requerente reclamou dela, peticionando a ampliação do pedido em reclamação graciosa que havia interposto.
Nesta matéria regulam:
· As normas do RJAT, designadamente a norma do seu artigo 10º-1-a) que impõe que o pedido de constituição do tribunal arbitral seja feito no prazo de 90 dias quanto aos atos suscetíveis de impugnação autónoma;
· As normas do CPPT[14] (ex-vi 10º-1-a RJAT) que no seu artigo 102º-1-a) determinam que o início da contagem do prazo coincida com o termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte;
· A norma então vigente do artigo 102º-2 CPPT (ex-vi 10º-1-a RJAT) que permitia que em caso de indeferimento de reclamação graciosa, a impugnação pudesse ser apresentada nos 15 dias após a notificação.
Nos termos do direito aplicável o prazo para impugnar a liquidação teve o seu termo inicial em 16-09-2011 e o seu termo final no 90º dia subsequente, que ocorreu em 14-12-2011, data em que caducou o direito da Requerente a impugnar a liquidação com fundamento na sua anulabilidade. É claro que a Requerente poderia ter apresentado reclamação graciosa até 03-01-2012 mas também não o fez.
Há assim que declarar a caducidade do direito da Requerente a impugnar a liquidação do IS nos termos em que o fez e absolver a AT da instância[15] nesta parte.
1.9.2. Questão de fundo (IMT): Determinação da matéria coletável nos casos de caducidade da isenção do regime da compra para revenda
As normas que disciplinam esta questão constam do capítulo IV do CIMT que estipulava (transcrevem-se apenas as partes consideradas relevantes, que são as normas que fixam as taxas e as que regulam a sua aplicação no tempo):
CAPÍTULO IV - Taxas
Artigo 17.º Taxas
1 - As taxas do IMT são as seguintes:
a) Aquisição de prédio urbano ou de fração autónoma de prédio urbano destinado exclusivamente a habitação própria e permanente:
Valor sobre que incide o IMT (em euros)
|
Taxas percentuais
|
Marginal
|
Média
|
Até 92 407
|
0
|
0
|
De mais de 92 407 e até 126 403
|
2
|
0,5379
|
De mais de 126 403 e até 172 348
|
5
|
1,7274
|
De mais de 172 348 e até 287 213
|
7
|
3,8361
|
De mais de 287 213 e até 574 323
|
8
|
|
Superior a 574 323
|
6 taxa única
|
b) Aquisição de prédio urbano ou de fração autónoma de prédio urbano destinado exclusivamente a habitação, não abrangidas pela alínea anterior:
Valor sobre que incide o IMT (em euros)
|
Taxas percentuais
|
Marginal
|
Média
|
Até 92 407
|
1
|
1
|
De mais de 92 407 e até 126 403
|
2
|
1,268 9
|
De mais de 126 403 e até 172 348
|
5
|
2,263 6
|
De mais de 172 348 e até 287 213
|
7
|
4,157 8
|
De mais de 287 213 e até 550 836
|
8
|
|
Superior a 550 836
|
6 taxa única
|
c) Aquisição de prédios rústicos - 5%;
d) Aquisição de outros prédios urbanos e outras aquisições onerosas - 6,5%.
(…)
Artigo 18.º Aplicação temporal das taxas
1 - O imposto será liquidado pelas taxas em vigor ao tempo da ocorrência do facto tributário.
2 - Se ocorrer a caducidade da isenção, a taxa e o valor a considerar na liquidação serão os vigentes à data da liquidação.
3 - Quando, no caso referido no número anterior e após a aquisição dos bens, tenham ocorrido factos que alterem a sua natureza, o imposto será liquidado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão.
O CIMT não contém a definição de prédio nem o tratamento desse conceito e por isso o legislador avisadamente elegeu desde logo o regime do CIMI para disciplinar essa matéria (1º-2 CIMT). É natural que assim seja pois é justamente no CIMI que estão consagrados os conceitos básicos que o direito fiscal utiliza para a tributação do património, como se alcança da disposição no mesmo sentido que é feita pelo artigo 1º-6 do CIS.
O direito fiscal não adotou integralmente a classificação dicotómica que o direito civil faz sobre os prédios, enquanto objeto das relações jurídicas, adaptando-a às necessidades deste ramo do direito. Para a tributação do património a conceptualização deste tema tem assento no CIMI, como reconhecem os diplomas que regulam os outros impostos com análoga incidência já citados. Com base nestas remissões pode-se afirmar que os conceitos sobre prédio são os mesmos na tributação do património, residindo a sua disciplina no CIMI.
Nos termos do CIMI prédio é afinal qualquer fração de território, incluindo as águas, plantações e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa e tenha valor económico (2º CIMI). Por sua vez os prédios podem ser rústicos ou urbanos. A lei não denomina esta divisão; apenas nos diz que os prédios podem assumir uma de duas diferentes designações – rústicos ou urbanos – e também não enuncia o critério de divisão optando por especificar em concreto que prédios têm uma designação e que prédios têm a outra.
São prédios rústicos os terrenos situados fora dos aglomerados urbanos que não sejam terrenos para construção, destinados ou destináveis a atividades agrícolas, incluindo as construções diretamente afetas a essa atividade, suas águas e plantações (3º CIMI).
Já os prédios urbanos, que são todos os outros, dividem-se em várias espécies, designadamente (i) prédios habitacionais; (ii) prédios comerciais, industriais ou para serviços; (iii) terrenos para construção; e (iv) outros (6º-1 CIMI). A especificação dos prédios urbanos é feita de acordo com o seu fim, ou porque esteja licenciado para o efeito em causa ou porque seja esse o fim a que é normalmente destinado (6º-3). Por sua vez cabem na qualificação de terrenos para construção (i) aqueles para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção; (ii) os que tenham sido declarados como tal no título de aquisição (6º-3 CIMI).
Por seu turno são classificados como outros prédios urbanos (i) os terrenos dentro dos limites dos aglomerados urbanos em que as entidades competentes ou os instrumentos de ordenamento do território vedem o loteamento ou a construção (ii) os terrenos dentro de um aglomerado urbano que não possam ter utilização geradora de quaisquer rendimentos e não estejam afetos a utilização geradora de rendimentos agrícolas; (iii) os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal fins diversos dos fins habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços (6º-4 CIMI).
É ainda admitida a classificação de prédio misto, quando o mesmo prédio disponha de parte rústica e parte urbana e nenhuma delas possa ser classificada como principal relativamente à outra (5º-1 e 2 CIMI).
Crê-se que as construções concetuais do CIMI devem ser entendidas como estruturantes da tributação do património, por várias razões. Primeiramente porque as próprias normas das leis fiscais desta área da tributação se expressam nesse sentido. Em segundo lugar porque o CIMI é um verdadeiro código na sua aceção jurídica, i.e., contém o regime nuclear das regras relativas a determinada matéria; contém a disciplina fundamental, tratando-a de forma sistemática e científica[16]. Em terceiro lugar, as normas do CIMI em causa foram elaboradas no âmbito da reforma da tributação do património, ponderadas no complexo normativo em que se integram e têm como função “consagrar os contornos precisos da realidade a tributar” (preâmbulo do CIMI).
Todo o sistema de organização da propriedade imobiliária plasmado no CIMI tem assim como finalidade a caracterização rigorosa do património imobiliário que é objeto de tributação e utiliza para isso um critério de múltiplas dimensões – a perspetiva económica. É a perspetiva económica que permite afirmar que só são prédios as frações de território suscetíveis de constituírem o património de pessoas e que tenham valor económico (2º CIMI); é a característica de terem autonomia económica que permite que o conceito de prédio abranja as águas, plantações, edifícios e construções (2º CIMI); é a utilização geradora de rendimentos agrícolas que permite qualificar os prédios como rústicos (3º-1-a CIMI); crê-se ser a mesma ótica de individualidade económica, muito mais do que jurídica, que manda tratar como um prédio cada fração autónoma dos edifícios em propriedade horizontal (2º-4 CIMI), embora para o direito civil seja apena uma unidade independente de um prédio urbano (1.414º do código Civil); parecem ser também razões de índole económica que levam a que cada parte de prédio suscetível de utilização independente seja considerada separadamente na inscrição matricial, de forma a permitir a discriminação do respetivo valor patrimonial tributário (12º-3 CIMI).
A preocupação da individualização seguindo critérios de cariz económico entende-se bem; pretende-se caracterizar cada coisa de acordo com a sua aptidão e tributá-la em conformidade. Para isso há a preocupação permanente de fazer registar o valor de cada parte que possa ser objeto de utilização diferenciada (v.g. 12º-3 CIMI).
A organização conceptual assenta assim ao nível mais elevado em dois grupos, preenchidos de acordo com a descrição exaustiva das características que conduzem ao seu agrupamento em (i) prédios rústicos e em (ii) prédios urbanos. A lei não prevê qualquer subdivisão dos prédios rústicos mas já o faz relativamente aos prédios urbanos. Os prédios urbanos dividem-se em espécies de acordo com o seu fim ou destino.
Nesta organização concetual dos prédios para efeitos de tributação do património não se refere nunca a divisão dos prédios atendendo à sua natureza. Parece assim que a natureza dos prédios não é considerado critério de filiação em qualquer das divisões em que os prédios se arrumam.
Uma busca pelos códigos que regulam a tributação do património permite localizar a utilização do termo natureza por referência a prédios ou realidades conexas, como sinónimo de essência ou estado puro (2º-2, 24º-1, 25º-b CIMI) mas sobretudo com o sentido de característica geral do grupo que pretende referenciar (2º-1, 26º-4 e 51º-2-c CIMI e 14º-2 e 3 CIMT). Este último sentido é usado especificamente na expressão consoante a natureza dos bens, análoga à que é utilizada no artigo 18º- 3 do CIMT, na norma do artigo 47º-1 do CIS, indubitavelmente para fazer a distinção entre bens imóveis e bens móveis.
Parece assim que o termo “natureza” não faz parte da “taxonomia tributária”, pois não corresponde a nenhuma classificação ou divisão conceptual dos prédios; é antes apenas um vocábulo que o legislador utiliza para referenciar determinado grupo de prédios, que organizou com um específico critério para um específica finalidade. O artigo 47º-1 do CIS é o exemplo acabado desta ideia. Para tratar os privilégios creditórios, o legislador dividiu-os no Código Civil em mobiliários e em imobiliários e quando se quis referir a cada um destes dois grupos de bens, o Código do Imposto do Selo considerou que o critério de agrupamento era a natureza dos bens. Dito de outro modo, a natureza é afinal o vínculo de pertença a determinado grupo, de acordo com o critério de divisão utilizado no caso concreto.
O regime em causa – a aplicação temporal das taxas de IMT – há de ser interpretado em obediência ao princípio da unidade do sistema jurídico (9º-1 CC). Viu-se já o entendimento que se considera existir sobre a matéria no direito fiscal em geral. Veja-se agora no caso particular das taxas de IMT.
Para aplicação das taxas de IMT o legislador não recorreu à pureza do agrupamento dos prédios em espécies, nos termos em que estas aparecem organizadas no artigo 6º-1 do IMI optando por criar um agrupamento próprio, com um critério objetivo[17], designadamente:
I. Grupo formado pela espécie dos prédios urbanos os que são destinados exclusivamente a habitação própria e permanente (17º-1-a);
II. Grupo formado pela espécie dos prédios urbanos destinados exclusivamente para a habitação, não abrangidas pela alínea anterior, que grosso modo compreende os prédios que não constituam a habitação do titular ou que mesmo sendo-o não o seja de modo permanente (17º-1-b);
III. Grupo formado pelas outras espécies de prédios urbanos (17º-1-d);
IV. Grupo formado pelos prédios rústicos (17º-1-c).
Organizados assim os prédios para efeitos da tributação em IMT, haverá que enquadrar cada prédio de acordo com a sua própria natureza, i.e., de acordo com o critério de pertença a um dos grupos.
O prédio dos autos é um prédio urbano para habitação (facto H) que se insere no grupo que se denominou de grupo II, porque é essa a sua natureza. Como não foi revendido no prazo de 3 anos operou-se a caducidade da isenção de que a Requerente tinha beneficiado (11º-5 CIMT) e o regime regra que consta da norma do artigo 18º-2 do CIMT estipula a aplicação da taxa e do VPT que estiverem em vigor à data liquidação. Assim o fez a AT.
É verdade que o prédio foi objeto de modificações e que foi feita nova avaliação que conduziu a novo VPT mas estas alterações (de configuração e de valor) não importam a alteração da sua natureza para efeitos de aplicação do IMT. O prédio da Reclamante continua a ter a mesma natureza após as obras de que foi objeto; continua a ter a natureza de prédio urbano destinado exclusivamente para habitação e é esse o critério que permite afastar a aplicação da norma do artigo 18º-3 CIMT.
Só assim não seria se o prédio passasse a ser utilizado para habitação própria do titular ou se passasse a ser um prédio urbano de diferente espécie (comerciais, industriais, serviços, terreno para construção ou outros), ou passasse a ser um prédio rústico, pois são estas as diferentes naturezas que o normativo distingue.
Tem pois que improceder nesta parte a pretensão da Requerente.
1.9.3. Outros pedidos
A obrigação de reconstituição pela AT está subordinada ao próprio âmbito da procedência (100º LGT) e sendo improcedentes os pedidos da Requerente ficam prejudicados os seus pedidos de indemnização pelos custos com garantias bancárias.
1.10. Decisão
Considerando os elementos de facto e de direito coligidos e expostos, este tribunal arbitral decide:
a) Declarar a caducidade do direito da Requerente a impugnar a liquidação do IS nos termos em que o fez e absolver a AT da instância nesta parte;
b) Julgar improcedentes os pedidos de anulação de IMT e da indemnização pelos custos com garantias bancárias e absolver a AT destes pedidos.
c) Condenar a Requerente no pagamento das custas, que se apuram no local próprio.
1.11. Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306º- 2, do CPC, ex-vi 29º-1-e) do RJAT e 97º-A, n.º 1-a) do CPPT ex-vi 3º-2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 37.075,59 €.
1.12. Custas
As custas ficam a cargo da parte que a elas tiver dado causa, entendendo-se que lhes dá causa a parte vencida (527º-1 e 2 CPC). Nestes autos e considerando a citada regra, a responsabilidade pelas custas é da Requerente, enquanto parte vencida.
Nos termos do artigo 22º-4 do RJAT e Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas que ficam a cargo da Requerente em 1 836.00 €.
Lisboa, 11 de março de 2016
O árbitro,
(Nuno Maldonado Sousa)
[1] Nesta decisão designado pela forma abreviada de uso comum “RJAT" (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária).
[2] Verificado através da inscrição AP… /2008… constante de certidão permanente, cujo código se encontra identificado no documento n.º 1 do Requerimento Inicial.
[3] Nesta decisão designada pela forma abreviada “AT” como é de uso generalizado.
[4] Nesta peça o imposto do selo é também designado pelo acrónimo “IS”.
[5] Nesta peça também se designa o valor patrimonial tributário pelo acrónimo “VPT”.
[6] Nesta peça utiliza-se o acrónimo “CIMT” para designar o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis
[7] Nesta peça designa-se também este requerimento da AT por “R-AT”.
[8] Processo Administrativo.
[9] Na redação ainda vigente a TGIS fixa a seguinte taxa: “1.1 - Aquisição onerosa ou por doação do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito sobre imóveis, bem como a resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, dos respectivos contratos - sobre o valor 0,8%”
[10] A verba 15.1 da TGIS, entretanto revogada pelo artigo 99º-2 da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, estipulava: ”Notariado e actos notariais: 15.1 - Escrituras, excluindo as que tenham por objecto os actos referidos no n.º 26, testamentos e demais instrumentos exarados nos livros de notas dos notários, incluindo os privativos - por cada instrumento € 25”
[11] Em dia determinado (anterior a dia 10) mas cuja referência é impercetível no documento junto aos autos.
[12] Nesta peça também se designa o Código do Procedimento Administrativo por CPA.
[13] Nesta peça também se designa o Código Civil por CC.
[14] Nesta peça também se designa o Código do Procedimento e do Processo Tributário por CPPT.
[15] No sentido de a caducidade do direito de invocar a anulabilidade de ato tributário originar tão-só a absolvição da instância veja-se Jorge Lopes de Sousa - Código de procedimento e de processo tributário: anotado e comentado. Vol. II. 6ª ed., Lisboa: Áreas Editora, 2011, pp. 163-164.
[16] Cfr. José de Oliveira Ascensão – O Direito – Introdução e Teoria Geral. 3ª ed., Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, pp.282-283.
[17] Nos números 4 e 7 cria um segundo agrupamento com um critério subjetivo.