Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 472/2015-T
Data da decisão: 2016-01-15  Selo  
Valor do pedido: € 9.164,54
Tema: IS – Verba 28 da TGIS
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Decisão Arbitral

 

 

I – RELATÓRIO

 

1        A… Ldª, NIPC[1] …, com sede na Rua … nº …, … …-…, apresentou um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a AT[3], com vista à anulação dos atos tributários de liquidação de imposto do selo sobre a propriedade de um imóvel inscrito na matriz sob o artigo urbano nº … da freguesia de … área do Serviço de Finanças de …, respeitante a um terreno para construção, conforme documentos de cobrança 2015… no montante de €4 582,28 respeitante à 1ª prestação e 2015… no montante de €4 582,26 respeitante à 2ª prestação, impostos referentes a 2014.

2        Que foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[4] e automaticamente notificado à AT em 24/07/2015.

3        Nos termos e para efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicado às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 21/09/2015, designado árbitro do tribunal Arlindo José Francisco, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo legalmente estipulado.

 

4        O tribunal foi constituído em 06/10/2015 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

5        Com o seu pedido, visa a requerente, a anulação do ato de liquidação de imposto do selo, referente ao ano de 2014 que recaiu sobre o VPT[5] do imóvel já identificado

6        Suporta o seu ponto de vista, em síntese, no entendimento de que o referido imóvel não poderia ser abrangido pela norma de incidência a que alude a verba 28.1 da TGIS[6], conjugada com o nº 1 do artigo 1º do CIS[7] na redação da Lei 83-C/2013 de 31 de Dezembro dado não estar prevista ou autorizada nenhuma construção seja para habitação ou para outros fins.

7        Concluindo que tal liquidação viola o princípio da legalidade e da tipicidade, a par da violação do artigo 268º nº 3 da CRP[8], dos artigos 124 e 125º do CPA[9] e artigo 77º da LGT[10], por falta de fundamentação de facto e de direito.

8        Na resposta, a requerida, em primeira linha, considera ser manifesta a inimpugnabilidade autónoma das prestações dos atos de liquidação constantes das notas de cobrança que constituem o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, ocorrendo assim, no seu ponto de vista, a exceção dilatória prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 89º do CPTA[11], aplicável ex vi artigo 29º nº 1 alínea c) do RJAT, que a verificar-se conduz à impossibilidade de apreciação do mérito da causa e à absolvição da AT da instância.

9        Cita várias decisões já proferidas no âmbito da arbitragem tributária que em situações semelhantes acolheram o ponto de vista defendido pela AT, uma vez que as notas de cobrança não são impugnáveis de per si, dado não constituírem atos de liquidação de tributos, ficando, por isso, fora da previsão do artigo 2º nº 1 alínea a) do RJAT.

10    Mesmo assim, por impugnação, vem dizer que com a alteração promovida pela já citada Lei 83-C/2013 de 31 de Dezembro, à verba 28.1 do TGIS, os terrenos para construção passaram a estar abrangidos pela incidência prevista na referida verba

 

II - SANEAMENTO

 

O tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, de acordo com o artigo 2º do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º,nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

As partes acordaram na dispensa da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, da desnecessidade da junção do Processo Administrativo e da produção de alegações escritas ou orais.

Vistas as posições coincidentes, não enfermando o processo de nulidades e apesar de ter sido suscitada, na resposta da AT, a exceção da inimpugnabilidade do objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, o tribunal, considera estarem reunidas as condições para proferir decisão, na qual a exceção será apreciada, em primeira linha.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

1 – As questões a dirimir, com interesse para os autos, são as seguintes:

 

a)      Saber se as notas de cobrança de imposto do selo, objeto do presente pedido de pronúncia arbitral são ou não impugnáveis de per si.

b)      Em caso afirmativo saber se a liquidação em causa viola o princípio da legalidade e da tipicidade, a par da violação do artigo 268º nº 3 da CRP, dos artigos 124 e 125 do CPA e artigo 77º da LGT.

c)      E a confirmarem-se os vícios da liquidação com a consequente anulação haverá ou não lugar ao reembolso dos montantes indevidamente pagos acrescidos de juros indemnizatórios.

 

2 – Matéria de Facto 

 

A matéria de facto considerada relevante e provada com base nos elementos juntos aos autos é a seguinte:

a)      A requerente era, no ano de 2014, proprietária de terreno para construção inscrito sob o artigo … da matriz urbana da freguesia de …, concelho de Tavira.

b)      Foi notificada para proceder aos pagamentos do IS[12] no montante € 4 582,28 e € 4 582,26, em ambas é mencionado o valor total da liquidação.€ 13 746,80

c)      A requerente procedeu ao pagamento das aludidas prestações

d)      O VPT do imóvel é de € 1 374 680,00.

e)      O valor económico atribuído pela requerente ao processo é de € 9 164,54 que corresponde ao somatório dos montantes das prestações aqui impugnadas.

Não existe factualidade dada como não provada que seja relevante para a decisão.

 

3        – Matéria de Direito

Quanto à exceção da inimpugnabilidade do objeto do processo, apresentado pela requerida.

Vem a AT, na sua resposta, suscitar a exceção em epígrafe, dizendo, em síntese, que os tribunais arbitrais são competentes para apreciar os atos de liquidação de tributos, ao abrigo do artigo 2º, nº 1 alínea a) do RJAT, mas já não o serão para apreciar as notas de cobrança do IS aqui em questão, dado estas, não serem atos de liquidação de tributos, mas apenas a forma do seu pagamento

 

Que pelo facto do IS, em questão, poder ser pago em prestações só há uma liquidação e não várias liquidações, suportando o seu ponto de vista no artigo 120º do CIMI[13], aqui aplicável por força do nº 7º do artigo 23º do CIS, nas decisões arbitrais já proferidas sobre esta matéria e na doutrina expendida sobre o ato tributário de liquidação do professor Casalta Navais, para concluir que sendo as notas de cobrança o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, ocorrerá a exceção dilatória prevista na alínea c) do nº1 do artigo 89º do CPTA, aplicável ex vi artigo 29º nº 1 alínea c) do RJAT.

No pedido de pronúncia arbitral, a requerente trata as notificações que recebeu, para pagamento da 1ª e 2ª prestação, como liquidação do imposto, ver artigos 2º,3º e 4º da petição.

Ainda que no artigo 7º do pedido se refira que “a liquidação ora em apreço ainda decorre do regime criado pela Lei nº 55-A/2012 de 29 de Outubro” o que poderia levar a pensar que, apesar do referido nos artigos anteriores, se pretenderia atacar o ato de liquidação, o tribunal terá que afastar essa possibilidade, dado que, o valor económico atribuído ao pedido pela requerente é de € 9 164,54 que corresponde ao somatório das 2 prestações pagas.

Refira-se ainda que a requerente apesar de ter sido notificada da resposta da AT, do despacho 12 de Novembro de 2015, conforme o SGP[14] evidencia, veio em 19 do mesmo mês juntar requerimento a concordar com as propostas da AT, no sentido de ser dispensada a junção do PA[15], de ser dispensada a reunião do artigo 18º do RJAT, bem como com a dispensa de produção de alegações escritas

Face ao exposto o tribunal considerou reunidas as condições para a prolação, pelo que cumpre decidir:

A declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de tributos cai no âmbito da alínea a) do nº 1 do artigo 2º do RJAT, porém, o objeto do pedido aqui em apreciação, dirige-se não ao ato de liquidação propriamente dito, como já se viu, mas às prestações legalmente permitidas, neste caso três, mas apenas duas estão a ser impugnadas.

O ato de liquidação do IS previsto na verba 28 da TGIS é o ato único de apuramento total do tributo a pagar, a possibilidade desse valor apurado, ser pago em prestações não significa que ocorram tantas liquidações quantas as prestações. Acompanhamos a posição preconizada no âmbito do processo 736/2014 do CAAD, que, com a devida vénia, se transcreve:

“… A fim de darmos resposta à questão que nos ocupa é pertinente ter presente o conceito de liquidação de tributos (art., 97º, nº 1,al. a) do CPPT) ou atos de liquidação de tributos (artº 2º,nº1,al.a) do RJAT).

Na lição de José Casalta Nabais “a liquidação lato sensu, ou seja, enquanto conjunto de todas as operações destinadas a apurar o montante do imposto, compreende: 1) O lançamento subjectivo destinado a determinar ou identificar o contribuinte ou sujeito passivo da relação jurídico-fiscal, 2) O lançamento objectivo através do qual se determina a matéria colectável ou tributável do imposto e, bem assim, se determina a taxa a aplicar no caso de pluralidade de taxas.3) A liquidação stricto senso traduzida na determinação da colecta através da aplicação da taxa à matéria colectável ou tributável, e 4) as (eventuais) deduções à colecta. Como decorre da noção de liquidação que nos é dada pelo ilustre professor, para cada facto tributário haverá, em princípio, uma única liquidação, pela qual se determinará a colecta a pagar. Tal é, aliás, o que decorre do art.23º, nº 7, do Código do Imposto de Selo ao dispor que” tratando-se do Imposto devido pelas situações previstas na verba nº 28 da tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente (…)” aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI”. Por sua vez, dispõe o art.113º, nº 2 do CIMI, aplicável por remissão daquela norma do Código do Imposto do Selo, que “a liquidação (…) é efectuada nos meses de fevereiro e março do ano seguinte” Da circunstância de, por força da lei, a mesma poder ser paga em várias prestações, não decorre que tenham ocorrido várias liquidações. A liquidação é só uma e só constitui ato lesivo, suscetível de ser impugnado que só pode, evidentemente, ser objecto de uma única impugnação. Naturalmente, quando a lei prevê o pagamento do valor da liquidação em várias prestações, escalonadas no tempo, a anulação do ato tributário terá consequências relativamente a todas elas, fazendo cessar a obrigação de pagar ou impondo a obrigação de restituição e de juros a cargo da ATA, em caso de pagamento pelo sujeito passivo. O que a lei não prevê, nem em sede arbitral, nem em sede de processo de impugnação judicial é a pretensão anulatória de pagamento de prestações de per si uma vez que tal efeito decorrerá apenas da anulação do ato tributário de liquidação, que como vimos, consiste na quantificação do montante total a pagar e que é apenas e tão só um único ato tributário”

Comungando desta perspetiva, forçoso é concluir ser manifesta a inimpugnabilidade de per si das prestações constantes das notas de cobrança objeto do pedido de pronúncia arbitral, procedendo assim a exceção aduzida, ficando, deste modo, prejudicado o conhecimento das restantes questões.

 

IV – DECISÃO

 

Face ao exposto, o tribunal decide o seguinte:

 

a)      Declarar procedente a exceção aduzida pela requerida, absolvendo-a da instância.

b)      Fixar o valor do processo € 9 164,54 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299º, nº 1, do CPC[16], artigo 97º-A do CPPT[17], e artigo 3º, nº2, do RCPAT[18].

c)      Fixar as custas, ao abrigo do nº4 do artigo 22º do RJAT, no montante de € 918,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo da requerente.

 

Notifique.

 

 

Lisboa 15 de Janeiro de 2016

 

Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º,nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º,nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.

 

O árbitro

 

 Arlindo José Francisco

 

 

 



[1] Acrónimo de Número de identificação de Pessoa Coletiva

[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária

[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira

[4] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa

[5] Acrónimo de Valor Patrimonial Tributário

[6] Acrónimo de Tabela Geral do Imposto do Selo

[7] Acrónimo de Código do Imposto do Selo

[8] Acrónimo de Constituição da República Portuguesa

[9] Acrónimo de Código do Procedimento Administrativo

[10] Acrónimo de Lei Geral Tributária

[11]Acrónimo de Código de Processo nos Tribunais Administrativos

[12] Acrónimo de Imposto do Selo

[13] Acrónimo de Código do Imposto Municipal sobre Imóveis

[14] Acrónimo de Sistema de Gestão Processual

[15] Acrónimo de Processo Administrativo

[16] Acrónimo de Código de Processo Civil

[17] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário

[18]  Acrónimo de Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária