Decisão Arbitral
I – RELATÓRIO
A… – …, SA – Em Liquidação, contribuinte n.º …, com sede na …, Edifício …, Piso …, … …, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º n.º 1 a) e 10.º n.º 1 a), ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, abreviadamente designado por RJAT), notificada das decisões de indeferimento das reclamações graciosas n.ºs …2014…, …2014…, …2014…, …2014…, …2014… e …2014…, vem peticionar a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de Imposto Único de Circulação (IUC) que se encontram enumerados no Anexo VIII do Pedido, para os quais se remete e se dão por integralmente reproduzidos, efetuados pela Autoridade Tributária e Aduaneira e relativos ao anos de 2009 a 2012, no valor global de € 6.294,26, incluindo juros compensatórios.
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O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 15-12-2014.
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Nos termos do disposto nos artigos 5.º, n.º 2, al. a), 6.º, n.º 1 e 11.º. n.º 1, al. a) do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 05-02-2015 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.
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Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 20-11-2014.
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Por despacho de 21-04-2015, o tribunal dispensou a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como as alegações finais.
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O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
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As alegações que sustentam o pedido de pronúncia arbitral do Requerente são, em súmula, as seguintes:
Alegações da Requerente
10.1 A título prévio, a Requerente alega a sua legitimidade processual para apresentar o pedido de pronúncia arbitral relativo às liquidações do imposto ora impugnadas, notificadas à sociedade B… – …, SA, por o conjunto dos seus ativos, passivos, direitos e responsabilidades terem sido incorporados, em 2001, na esfera da sociedade C… – …, Lda., que, por sua vez, foi incorporada, em 2003, pela ora Requerente, no âmbito de um processo de fusão, conforme documentos comprovativos que junta.
10.2 Em conformidade, nos termos do artigo 65.º da LGT, a Requerente é parte legítima no presente processo.
10.3 Alega ainda a Requerente estarem preenchidos os pressupostos legais para a cumulação de pedidos, nos termos conjugados dos artigos 104.º do CPPT e artigo 3.º n.º 1 do RJAT.
10.4 A Requerente é uma instituição financeira de crédito que se dedicava a celebração, entre outros, de contratos de locação financeira, tendo por objeto veículos automóveis.
10.5 No exercício da sua atividade, a Requerente celebrou diversos contratos de locação financeira que tinham como objeto os veículos automóveis coma as matriculas melhor identificadas na Tabela Anexa que se junta como Anexo VIII.
10.6 Sucede, porém, que aquando do termo desses contratos de locação financeira, a Requerente vendeu os respetivos automóveis aos contribuintes identificados nas faturas de vendas, cujas cópias se juntam como Anexo IX.
10.7 Ora, dispõe o artigo 3.º do CIUC que “são sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos.”
10.8 Ao afirmar que “são sujeitos passivos do imposto as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”, o artigo 3.º n.º 1 do Código do IUC consagra uma presunção ilidível, conforme dispõe o artigo 73.º da LGT.
10.9 Para ilidir a presunção, a Requerente demonstrou que a titularidade do veículo pertence a um terceiro, apresentando, para o efeito, as faturas de venda das viaturas em momento anterior ao que ocorreu a liquidação do imposto.
10.10 Assim, não se considerando preenchidos os pressupostos que fundamentam a relação jurídico-tributária, in casu, a imputação à Requerente da responsabilidade do IUC nos anos fiscais de 2009 a 2012 e respeitantes aos veículos em causa, jamais a Autoridade Tributária Aduaneira poderia vir a exigir-lhe tal imposto por manifesta falta de responsabilidade subjetiva pelo seu pagamento (artigos 1.º, 3.º e 19.º do CIUC).
10.11 Invoca ainda as Decisões Arbitrais n.ºs 26/2013-T, 27/2013-T e 246/2014-T, deste CAAD, em que se decidiu em sentido idêntico.
10.12 Termina requerendo a anulação das liquidações de IUC objecto do presente processo com fundamento em errónea qualificação dos factos tributários nos termos conjugados dos artigos 3.º e 19.º do CIUC e do artigo 99.º, al. a), do CPPT.
Resposta da Requerida
11.1 Na resposta, a título prévio, a Requerida defende-se por exceção, invocando a impropriedade imparcial do meio processual porque, no âmbito das reclamações graciosas n.ºs …2014…, …2014…, …2014… e …2014… objeto imediato do pedido de pronúncia arbitral, a Requerida não se pronunciou sobre o mérito do pedido e consequentemente não emitiu um juízo sobre a legalidade dos atos tributários subjacentes.
11.2 Ora, não tendo as quatro decisões de indeferimento proferidas nestas reclamações procedido a uma efetiva apreciação da legalidade dos atos de liquidação do IUC, por falta do pressuposto processual da legitimidade da ora Requerente, então o meio de reação nunca poderia ser o pedido de pronúncia arbitral mas a ação administrativa especial.
11.3 Assim, o Tribunal singular constituído é materialmente incompetente para apreciar e decidir parte do objeto do litígio o que consubstancia uma exceção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT e do artigo 29.º, n.º 1, al. a) e e), do RJAT.
11.4 Acrescenta ainda que, relativamente às reclamações graciosas n.ºs …2014… e …2014…, cumprirá dizer que as liquidações foram enviadas à sociedade B… – …, SA.
11.5 Ora, alega a Requerente que todo o património da B… passou a integrar a esfera da sociedade C… – …, Lda, na sequência de um contrato de trespasse celebrado em 13 de setembro de 2001.
11.6 Verifica-se, no entanto, que os anexos 3 e 4 do contrato de trespasse que discriminavam os contratos de locação financeira e as viaturas objeto de trespasse não constam do processo administrativo nem do pedido de pronúncia arbitral, pelo que não logrou a Requerente provar que as liquidações impugnadas dizem respeito a contratos de locação financeira transmitidos pelo contrato de trespasse.
11.7 O que equivale a dizer que a Requerente carece de legitimidade processual, o que constitui uma exceção dilatória, nos termos do artigo 577.º, al. e), do CPC, que dá lugar à absolvição da instância, nos termos do artigo 278.º, n.º 1, al. d) do mesmo diploma legal.
11.8 Na defesa por impugnação, a AT reconhece a existência da jurisprudência citada pela Requerente mas relembra a inexistência de precedente jurídico em Portugal.
11.9 Por outro lado, lembra existir uma linha de jurisprudência relevante no que se refere à prova documental cabal para ilidir a presunção constante do registo (vide processos n.ºs 126/2014-T e 220/2014-T).
11.10 Em termos materiais, a AT entende que o legislador tributário ao estabelecer no art.º 3.º, n.º 1 quem são os sujeitos passivos do IUC estabeleceu expressa e intencionalmente que estes são os proprietários (ou nas situações previstas no n.º 2 as pessoas aí mencionadas), considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados.
11.11 O legislador não usou a expressão “presume-se” como poderia ter feito, por exemplo, nos seguintes termos: “são sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, presumindo-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”.
11.12 Assim, a redação do art.º 3.º do CIUC corresponde a uma opção clara de política legislativa acolhida pelo legislador, pelo que entender que aí se consagra uma presunção seria inequivocamente efetuar uma interpretação contra legem.
11.13 Em conformidade, este entendimento já foi adoptado pela Jurisprudência dos nossos tribunais, transcrevendo, para tanto, parte da sentença do tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida no Processo nº 210/13.0BEPNF. (Cfr. art.º 56.º da Resposta)
11.14 Sobre o elemento sistemático de interpretação, a Requerente alega que a solução propugnada pela Requerente é intolerável, não encontrando o entendimento por esta sufragado qualquer apoio legal. (Art.º 25.º da Resposta)
11.15 Por fim, atentos à “ratio”, dos debates parlamentares em torno da aprovação do presente regime, resulta claramente que o regime de tributação automóvel aprovado estabelece que o IUC “passou a ser devido pelas pessoas que figuram no registo como proprietárias dos veículos” (artigo 46.º).
11.16 Acrescenta ainda que, admitindo-se, por hipótese académica, ser admissível a ilisão da presunção, importa ainda apreciar os documentos juntos pela Requerente.
11.17 Alega, desde logo, que as faturas por si só não constituem documento idóneo para comprovar a venda dos veículos, uma vez que, tratando-se de um contrato sinalagmático, não revelam, por si só, uma imprescindível e inequívoca declaração de vontade por parte do pretenso adquirente.
11.18 Sem prejuízo, no que diz respeito ao valor probatório das faturas juntas no Anexo 7, são as mesmas impugnadas por existirem sérias dúvidas quanto à sua veracidade, a saber: (i) todas as faturas supostamente emitidas nos anos de 1993, 1994, 1995, 1996 e 1997 foram emitidas pela Requerente ainda antes da sua própria constituição em 1998; O mesmo se passa com as faturas referentes aos veículos com as matriculas …-…-…, …-…-…, …-…-…, …-…-…, …-…-… e …-…-…, ainda que emitidas em 1998, foram-no em data anterior à constituição da empresa; todas as faturas supostamente emitidas nos anos de 1993, 1994, 1995, 1996, 1997, 1998, 1999 e 2000 forma emitidas pela Requerente ainda antes da C…, Lda, ter adquirido os respetivos direito por meio do contrato de trespasse; todas as faturas supostamente emitidas pelos anos de 2001 e 2002 foram emitidas pela Requerente ainda antes sequer de ter ocorrida a fusão por incorporação da C…, Lda; Todas as faturas emitidas nos anos de 1993, 1994, 1995, 1996 e 1997 contém números de telefone com 9 dígitos, códigos postas com 7 dígitos e expressão em euros quando tais realidades são posteriores; etc...
11.19 Todas as incoerência detetadas levam a concluir que estes documentos não podem beneficiar da presunção de verdade a que alude o artigo 75.º da LGT.
11.20 Quanto à responsabilidade pelo pagamento das custas judiciais: não foi a Requerida quem deu azo à dedução do pedido de pronúncia arbitral mas sim a Requerente que só alegou a pretensa transmissão da propriedade após a liquidação do imposto.
11.21 Consequentemente, deverá a Requerente ser condenada ao pagamento das custas arbitrais, em linha com o decidido em questão similar no âmbito do Processo n.º 72/2013-T deste Centro de Arbitragem.
Tudo visto, cumpre proferir decisão final.
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
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A Requerente é uma instituição financeira de crédito que tinha por objeto social a prática das operações permitidas aos bancos, com exceção da receção de depósitos.
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A Requerente incorporou por fusão, em 2003, a sociedade C… – …, Lda., que, por sua vez, adquiriu, em 2001, por contrato de trespasse o conjunto dos seus ativos, passivos, direitos e responsabilidades à sociedade B… – …, S.A..
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A sociedade B… – …, SA, foi notificada das liquidações oficiosas de IUC, juntas como doc. n.ºs 1 a 85.
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Da notificação das liquidações oficiosas, a Requerente apresentou as correspondentes reclamações graciosas que viriam a indeferidas.
B. DO DIREITO
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DA EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL ARBITRAL
As questões de determinação da competência dos tribunais de conhecimento prioritário e de conhecimento oficioso, nos termos dos arts.º 13º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e do art.º 578º do Código de Processo Civil (CPC) por aplicação subsidiária do art.º 29º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributaria (RJAT), importa, face ao exposto, apreciar a presente exceção dilatória.
A Requerida alega que o presente tribunal arbitral é materialmente incompetente para apreciar e decidir a parte do litígio relativa às liquidações objeto das reclamações graciosas n.ºs …2014…, …2014…, …2014… e …2014…, o que consubstancia, quanto a esta parte do pedido, uma exceção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT e do artigo 29.º, n.º 1, al. a) e e), do RJAT.
A Requerida suscita a questão da incompetência do presente tribunal arbitral pelo mesmo ter por objeto imediato a decisão de indeferimento das reclamações graciosas n.ºs …2014…, …2014…, …2014… e …2014…, sem que nestas tenha havido uma efetiva apreciação da legalidade dos atos de liquidação do IUC, objeto mediato do pedido de pronúncia arbitral.
Cumpre, para esclarecida decisão, enquadrar devidamente a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.
A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, está em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), cujo n.º 1, alínea a) confere aos tribunais arbitrais competência para a apreciação da pretensão de declaração de ilegalidade de atos de liquidação e de autoliquidação de tributos.
Em segundo lugar, a competência dos tribunais arbitrais é também limitada pelos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, através da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, já que o 4.º do RJAT estabelece que “a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos”.
Assim, o artigo 2.º da Portaria 112-A/2011, de 22 de março, determina a vinculação da AT vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com exceção das expressamente previstas nas alíneas a) a d) deste artigo.
Deve-se entender que a competência dos tribunais arbitrais “restringe-se à atividade conexionada com atos de liquidação de tributos, ficando fora da sua competência a apreciação da legalidade de atos administrativos de indeferimento total ou parcial ou de revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da Administração Tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação do ato de liquidação, a que se refere a alínea p) do n.º 1 do art. 97.º do CPPT” (Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária in Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, p. 105).
Mais, quanto ao que aqui nos traz, “Relativamente às decisões de indeferimento de reclamações graciosas que, à face do teor literal do artigo 102.º, n.º 2, do CPPT, serão impugnáveis sempre através de processo de impugnação judicial, poderá ver-se, para o processo judicial tributário, uma exceção a essa repartição dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e da ação administrativa especial. Mas, no que concerne aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD essa exceção será irrelevante, pois resulta da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT que, em relação a atos de liquidação, autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta, apenas se inclui nas suas competências a declaração da sua ilegalidade e não a apreciação da legalidade de atos que não comportem essa apreciação. Isto é, não poderão ser apreciadas as decisões de indeferimento de reclamações graciosas em si mesmas, designadamente as que não conheceram do mérito do ato de liquidação que é objeto de reclamação...” (Idem, p. 125).
Ora, in casu, as reclamações graciosas foram indeferidas liminarmente por falta de legitimidade da Requerente., pelo que é claro que a Administração Fiscal não apreciou a legalidade da liquidação.
Por esta razão, terá que se considerar que o presente tribunal é incompetente para decidir nos termos peticionados pela Requerente quanto às liquidações oficiosas objeto das reclamações graciosas n.ºs …2014…, …2014…, …2014… e …2014….
Em conclusão, é este Tribunal Arbitral materialmente incompetente para apreciar e decidir parcialmente o pedido objeto do litígio sub juditio, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 4.º, n.º 1, ambos do RJAT e dos artigos 1.º e 2.º, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, o que consubstancia uma exceção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576º, n.ºs 1 e 2 do CPC ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT e artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT, que obsta ao conhecimento do pedido e à absolvição da instância da AT, nos termos dos artigos 576º, n.º2 e 577º, alínea a) do CPC, ex vi artigo 29º, nº1, alíneas a) e e) do RJAT.
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DA EXCEPÇÃO DE ILEGITIMIDADE PROCESSUAL DA REQUERENTE
Alega ainda a Requerida a ilegitimidade processual da Requerente por as liquidações oficiosas não lhe serem destinadas.
De acordo com a documentação apresentada pela Requerente, em 13 de setembro de 2001, foi celebrado um contrato de trespasse entre a B… – …, S.A., e a C… – …, Lda., através do qual a “B…” transmite a sua atividade e estabelecimento comercial à “C…” (cláusula primeira do contrato).
Em concreto, especifica o n.º 2 da Cláusula Primeira deste contrato que são transmitidos os ativos relativos aos contratos de locação de automóveis constantes do anexo III (al. b)) e respetiva propriedade das viaturas (al d)) constantes no Anexo IV junto ao contrato de trespasse.
Estes anexos não foram, todavia, juntos pela Requerente ao processo.
Em 20 de Fevereiro de 2002, a B… – …, S.A., foi extinta (vide Anexo I do Pedido Arbitral).
Posteriormente, em 11 de dezembro de 2013, a C… – …, Lda, foi incorporada pela Requerente num processo de fusão.
É sabido que as liquidações oficiosas objeto mediato do presente pedido de pronúncia arbitral foram notificadas à sociedade B…– …, S.A., por ser esta sociedade que constava do título de propriedade do veículo.
Atendendo a que não foram juntos os anexos identificativo das viaturas e respetivos contratos de locação financeira que constam do contrato de trespasse, não pode o presente tribunal presumir que as viaturas objeto do presente processo foram transmitidas pela sociedade B… – …, S.A. à sociedade C… – …, Lda. Não sendo, em termos hipotéticos, impossível a transmissão a uma terceira entidade, em data anterior ou posterior à celebração do contrato de trespasse, não logrou a Requerente provar que efetivamente adquiriu, nos termos descritos, a propriedade das viaturas.
Não tendo sido, por outro lado, efetuado o registo de transmissão de propriedade dos veículos à data da celebração do contrato de trespasse, é legítima a dúvida sobre se as liquidações poderão respeitar a outros contratos e veículos que não aqueles que foram objeto do contrato de trespasse.
Chegados aqui é necessário aferir se a Requerente dispõe de legitimidade processual.
O autor será parte legítima quando tem interesse direto em demandar (artigo 30.º do CPC). Diz-nos o artigo 9.º do CPTA que o autor (legitimidade ativa) é considerado parte legítima quando alegue ser parte na relação material controvertida. Para tal, “Recai sobre o interessado o ónus de alegar os factos que integram a sua legitimidade...” (Jorge Lopes de Sousa, no Código do Procedimento e Processo Tributário, I volume, 6.ª edição, anotação 2 ao art.º 9.º, pág. 113).
Assim, não tendo a Requerente comprovado ser a legítima titular dos contratos de locação financeira e das viaturas, não dispõe de legitimidade processual para requerer a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação supra identificados.
Pelo exposto, a falta de legitimidade processual constitui uma exceção dilatória que dá lugar à absolvição da instância, nos termos do artigo 577.º al. e) do CPC, ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT e artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT, que obsta ao conhecimento do pedido e à absolvição da instância da AT, nos termos dos artigos 576º, n.º2 e do CPC, ex vi artigo 29º, nº1, alíneas a) e e) do RJAT.
A verificação das exceções de incompetência parcial do tribunal arbitral e de ilegitimidade da Requerente, deixa obviamente prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas nos autos.
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D. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:
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Julgar procedente a exceção de incompetência material do tribunal para conhecer do pedido de declaração de ilegalidade das liquidações oficiosas objeto das reclamações graciosas n.ºs …2014…, …2014…, …2014… e …2014… e, em consequência, absolver parcialmente a Requerida da instância;
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Julgar procedente a exceção de ilegitimidade processual da Requerente e absolver a Requerida da Instância;
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Julgar, em consequência, prejudicado o conhecimento da questão de mérito;
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Condenar a Requerente ao pagamento das custas do processo, no montante de € 612,00.
E. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 6.294,26, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
F. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi integralmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa
20 de dezembro de 2015
O Árbitro
(Amândio Silva)