Processo arbitral n.º 29/2012-T
Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutor Fernando Borges de Araújo e Dr. João Marques Pinto (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
1 – Relatório
O…, com sede na Rua …, NIF … apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a), 10.º, n.º 2, e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante denominado RJAT), com vista à declaração de ilegalidade parcial do acto tributário consubstanciado na liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.º …, de 7-12-2005, na demonstração de liquidação de juros n.º … e na demonstração de acerto de contas n.º …, ambas datadas de 15-12-2005, todas referentes ao exercício de 2003.
O pedido é formulado contra a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT).
A Autoridade Tributária e Aduaneira manteve o acto impugnado.
Em 6-4-2006, o Requerente interpôs impugnação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal de …, que aí correu termos com o n.º … BEPRT.
O Requerente juntou ao presente processo cópia de requerimento apresentado no Tribunal Administrativo e Fiscal do … para efeito de extinção da instância naquele processo n.º … BEPRT, bem como cópia do comprovativo da entrega desse documento, em 4-5-2012.
Como fundamentos do pedido, o Requerente alegou, em suma, o seguinte:
– Na sequência de exame à escrita o Requerente, de que resultaram alterações ao lucro tributável por si apurado na declaração periódica mod. 22, foi notificado dos actos referidos de que resulta o dever de pagamento da quantia de € 402.038,75, liquidada adicionalmente, relativamente ao exercício de 2003;
– Relativamente a este exercício de 2003, foi fixada uma matéria colectável de € 19.231.934,41 e uma colecta de € 5.769.580,32, a que acrescem, a respectiva derrama no montante de € 556.904,62 e juros compensatórios no montante de € 28.050,13;
– O Requerente discorda de algumas das correcções em que se baseou a liquidação adicional, designadamente as indicadas no ponto III do relatório final da inspecção tributária sob os números 1.1.1.1. (despesas com cursos), 1.1.1.5.1. (provisão relativa a despesas com o crédito e juros vencidos), 1.1.1.5.2. (taxa de provisão de créditos de cobrança duvidosa que se encontram enquadrados na “Classe de risco 1”,), e 1.1.1.6. (relativa a Benefícios fiscais – Criação de Emprego para jovens), bem como da desconsideração de pagamentos por conta, no valor de € 281.298,00.
O Senhor Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que:
– Suscitou uma questão prévia, defendendo que deve ser suspensa a instância arbitral até que o Requerente proceda à junção da prova da promoção da extinção da instância no processo de impugnação judicial n.º … BEPRT, que correm termos da … Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de …;
– Invocou excepção de intempestividade e inutilidade superveniente da lide relativamente aos pagamentos por conta efectuados pela sociedade …, S.A., no montante de € 101.798,00;
– Invocou excepção de inutilidade superveniente da lide relativamente aos pagamentos por conta no montante de € 179.500,00, referentes a 2003;
– Defendeu-se por impugnação quanto às questões das correcções, pronunciando-se no sentido da improcedência do pedido.
O pedido de suspensão da instância arbitral foi considerado prejudicado, por decisão de 23-5-2012, uma vez que, em 4-5-2012, o Requerente apresentou documentos comprovativos de ter requerido a extinção da instância no processo n.º … BEPRT, que correu termos da … Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de ….
O Requerente pronunciou-se por escrito sobre as questões prévias suscitadas, antes da realização da reunião prevista no art. 18.º do RJAT.
Nesta reunião decidiu-se corrigir um lapso material manifesto da acta de constituição do tribunal arbitral no que concerne à indicação e identificação do Requerente que é o …, NIPC … (e não … , NIPC …, como naquela acta foi incorrectamente indicado).
Não havendo provas a produzir, decidiram os árbitros, nos termos do art. 18.º, n.º 1, alínea a), do referido DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, o prosseguimento do processo sem alegações orais.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (art.s 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
Com base no processo administrativo junto fixa-se a seguinte matéria de facto com relevo para a decisão:
a) Em 28-5-2004, o Requerente …, S.A., apresentou declaração de rendimentos de IRC, mod. 22, relativa ao exercício de 2003, determinando o imposto a pagar de € 2.143.988,37, em que, além do mais, declara ter efectuado pagamentos por conta no montante de € 301.798,00 (documento n.º 4 junto com a petição inicial e fls. 41-43, 72 e 73 da 1.ª parte do PA digitalizado, cujo teor se dá como reproduzido);
b) Relativamente àquele exercício, a Administração Tributária efectuou uma demonstração de liquidação n.º … , que foi objecto de reclamação graciosa, apresentada a 18-5-2005, autuada no Serviço de Finanças do … (actual Serviço de Finanças do …), com o n.º …, que não foi decidida antes de 10-4-2006 (artigos 10.º e 11.º da resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira e artigos 21.º da resposta do Requerente às questões prévias);
c) Os Serviços de Inspecção Tributária efectuaram uma análise à referida declaração mod. 22 de 2003 tendo projectado efectuar correcções à matéria colectável, ao lucro tributável e ao imposto apurado naquela declaração (fls. 75 da 1.ª parte do PA digitalizado);
d) O Requerente foi notificado para o exercício do direito de audição sobre tal projecto de correcções, pronunciando-se sobre elas em 5-11-2005 (fls. 75 da 1.ª parte e 33-42 da 2.ª parte do AP digitalizado);
e) Na sequência do exercício do direito de audição, foram determinados os seguintes valores corrigidos, com a respectiva fundamentação (fls. 75-116 da 1.ª parte do AP digitalizado, cujo teor se dá como reproduzido ):
f) Na sequência destas correcções, foi elaborada a demonstração de liquidação de IRC n.º …, de 7-12-2005, a demonstração de acerto de contas n.º … e as demonstrações de liquidação de juros compensatórios n.º … e de acerto de contas n.º … (n.º de compensação …, efectuada em 15—12-2005), de que resulta o valor a pagar de € 402.039,75, calculado com base no aumento do imposto no montante em € 478.425,19, acrescido de juros compensatórios no montante de € 28.050,13,e diminuído do estorno de € 104.435,45, resultante da anterior liquidação n.º …, relativa ao mesmo ano de 2003; aquele valor de € 478.425,19 foi determinado tendo por pressupostos, além do mais, não ter o Requerente efectuado pagamentos especiais por conta e ter efectuado um pagamento por conta no valor de € 20.500,00; (documento n.º 2 junto com a petição inicial e fls. 71 e 72 da 1.ª parte do PA digitalizado, cujos teores se dão como reproduzidos);
g) O Requerente foi notificado dos actos referidos na alínea anterior e de que o prazo para pagamento da quantia de € 402.039,75 terminava em 23-1-2006 (página 4 do documento n.º 2, junto com a petição inicial);
h) Em 10-4-2006, o Requerente apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do … impugnação judicial tendo por objecto a demonstração de liquidação de IRC n.º …, de 7-12-2005, a demonstração de acerto de contas n.º … e a demonstração de liquidação de juros compensatórios n.º … (fls. 5 e seguintes do processo administrativo), processo este que ainda não tinha sido decidido à data em que o Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral;
i) A …, S.A., efectuou pagamentos por conta relativos ao ano de 2003 nos valores de € 50.899,00, em 30-7-2003 (fls. 60 do PA digitalizado), € 50.899,00, em 26-9-2003 (fls. 61 da 1.ª parte e folhas 73-74 da 2.ª parte do PA digitalizado);
j) Por escritura de 11-12-2003, …, S.A, foi incorporada no …, S.A. (fls. 64 e seguintes do PA digitalizado);
k) O Requerente efectuou pagamentos relativos ao ano de 2003 nos valores de € 20.500,00, em 15-7-2003 (pagamento por conta), de € 20.500,00, em 31-10-2003, e de € 159.000,00, em 27-2-2004 (pagamentos especiais por conta), no montante global de € 200.000,00 (folhas 70-72 da 2.ª parte do PA digitalizado);
l) Em 25-1-2012, o Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral (registo da petição inicial).
m) O Requerente no exercício de 2003 efectuou despesas com funcionários seus respeitantes a inscrições, matrículas, propinas e mensalidades de cursos de pós-graduação, mestrados, doutoramentos e licenciaturas aqueles serviços indicadas nas folhas 118 a 127 da 1.ª parte do PA digitalizado, cujo teor se dá como reproduzido;
n) A Administração Tributária corrigiu o lucro tributável no montante de € 107.064,67, relativamente às despesas indicadas na alínea anterior;
o) Em 4-5-2012, o Requerente apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do … requerimento no processo n.º … BEPRT, pedindo a extinção da instância.
Factos não provados: Não há factos com potencial relevo para a decisão da causa que não se tenham provado.
Fundamentação da decisão da matéria de facto: A fixação da matéria de facto baseou-se nos documentos indicados relativamente a cada um dos pontos e no acordo das partes.
3. Questões prévias
3.1. Questão da intempestividade do pedido de pronúncia arbitral relativamente aos pagamentos por conta efectuados pela sociedade …, S.A., no montante de € 101.798,00
A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que é intempestivo o pedido de pronúncia arbitral, quanto à não consideração dos pagamentos por conta, por a sua não consideração se reportar ao acto tributário consubstanciado na demonstração de liquidação n.º…, que foi objecto de reclamação graciosa, apresentada em 18-5-2005, autuada no Serviço de Finanças do … (actual Serviço de Finanças do …), com o n.º …, e que, à data da apresentação da impugnação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal do …, em 10-4-2006, já tinha decorrido o prazo de 90 dias para impugnar o indeferimento tácito daquela reclamação graciosa, nos termos do art. 102.º do CPPT.
O Requerente pronunciou-se sobre esta questão prévia dizendo, em suma, que aquela liquidação n.º … também não considerava os referidos pagamentos por conta, mas que no presente processo é impugnada a liquidação adicional n.º … .
O processo de impugnação judicial que a Autoridade Tributária e Aduaneira refere, que é o processo n.º … BEBRT, não tem por objecto a demonstração de liquidação n.º …, mas sim a demonstração de liquidação de IRC …, de 7-12-2005, a demonstração de acerto de contas n.º … e a demonstração de liquidação de juros compensatórios.
Da eventual intempestividade para impugnar aquela demonstração de liquidação n.º … não resulta a intempestividade para impugnar estes outros actos tributários, pois o prazo da respectiva impugnação conta-se, nos termos do art. 102.º, n.º 1, alínea a), do CPPT, a partir do termo do prazo que foi fixado para pagamento voluntário da quantia liquidada.
O termo do prazo de pagamento voluntário da quantia liquidada pelo acto que o Requerente impugnou no Tribunal Administrativo e Fiscal do … e cuja legalidade pretende ver declarada por este tribunal arbitral ocorreu em 23-1-2006, como resulta da matéria de facto fixada.
Assim, sendo de 90 dias o prazo de impugnação judicial, contado a partir do termo do prazo de pagamento voluntário [art. 102.º, n.º 1, alínea a), do CPPT], a impugnação que foi apresentada no Tribunal Administrativo e Fiscal do …, em 10-4-2006, foi tempestivamente apresentada.
Questão diferente da intempestividade, que é aferida pelo próprio acto que é impugnado, é a de saber se o acto agora impugnado o podia ser por vícios de que já enfermava um acto anterior não tempestivamente impugnado. Esta não é uma questão de intempestividade, mas sim a de saber qual o âmbito da impugnabilidade deste novo acto.
No entanto, tal questão só seria pertinente se em vez de um indeferimento tácito da reclamação graciosa se estivesse perante um indeferimento expresso.
Na verdade, o indeferimento tácito (que é conceito que ainda subsiste no contencioso tributário, apesar de ter sido abandonado no âmbito do contencioso administrativo, com a reforma de 2002/2004) não é um acto administrativo, mas sim uma mera ficção jurídica destinada a possibilitar ao interessado o acesso aos tribunais, para obter tutela para os seus direitos ou interesses legítimos, nos casos de inércia da Administração Tributária sobre pretensões que lhe foram apresentadas. ( 1 )
O indeferimento tácito, consubstanciado pela falta de decisão no prazo legal, gera para requerente da decisão da reclamação graciosa uma mera faculdade de acesso à via contenciosa.
Por isso, do não uso dessa faculdade não advêm consequências negativas para o interessado, a nível dos direitos de impugnação contenciosa que têm relativamente a actos expressos que, posteriormente ao indeferimento tácito, venham a regular novamente a situação jurídica regulada pelo acto anterior. Designadamente a não impugnação no prazo legal de indeferimento tácito não tem como corolário a caducidade do direito de vir a impugnar um posterior acto expresso de indeferimento que venha a ser praticado, depois do termo do prazo legal de decisão, ou qualquer novo acto que venha regular a situação jurídica a que se reportava o indeferimento tácito.
Por outras palavras, com o indeferimento tácito não se forma o chamado «caso decidido» ou «caso resolvido», que se reconduz à estabilização do regime de uma situação jurídica, por preclusão do direito de impugnação do acto administrativo ou tributário que determina tal regime, pois aquela estabilização apenas se pode produzir como efeito de acto administrativo ou tributário definidor de uma situação jurídica e não com base numa mera ficção de acto, que nada define sobre tal situação.
De qualquer forma, improcede a questão prévia de intempestividade, que foi a suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
3.2. Questão da inutilidade superveniente da lide do pedido de pronúncia arbitral relativamente aos pagamentos por conta efectuados pela sociedade …, S.A., no montante de € 101.798,00
A Autoridade Tributária e Aduaneira coloca a questão prévia da inutilidade superveniente da lide quanto aos pagamentos efectuados pela sociedade …, S.A., invocando que tais pagamentos já foram restituídos ao Requerente através de reembolso, regularizado a 30-9-2011.
O Requerente manifestou-se sobre esta questão dizendo, em suma, que se mantém a utilidade da impugnação da liquidação n.º … com esse fundamento, quer se entenda que esta é revogatória da anterior liquidação n.º … (situação em que é aquela a que passa a enfermar da ilegalidade), quer se entenda que aquela apenas vem confirmar esta, pois, nesta hipótese a liquidação agora impugnada vem alterar a situação do Requerente, designadamente influenciando o montante dos juros indemnizatórios englobados na quantia indicada como devendo ser paga.
Não tem razão a Autoridade Tributária e Aduaneira, quanto a esta questão prévia, pois a simples restituição do valor dos pagamentos efectuados, a ter ocorrido, não retira utilidade ao presente processo, uma vez que a eventual ilegalidade da não consideração na liquidação das quantias pagas por aquela sociedade terá influenciado o valor da liquidação e o cálculo dos respectivos juros compensatórios.
Por outro lado, se a liquidação referida não for anulada, na parte correspondente a tais pagamentos, subsiste na ordem jurídica o dever de o Requerente pagar a quantia liquidada que emana da liquidação.
Por isso, o Requerente mantém interesse em ver anulada a liquidação nessa parte.
Improcede, por isso, esta questão prévia de inutilidade superveniente da lide suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
3.3. Questão da inutilidade superveniente da lide aos pagamentos, no montante de € 179.500,00, efectuados pelo Requerente, relativamente ao ano de 2003.
Defende a Autoridade Tributária e Aduaneira que há inutilidade superveniente da lide quanto à questão relativa a estes pagamentos, por se tratar de pagamentos especiais por conta que foram utilizados pelos serviços da Administração Tributária de acordo com as regras que decorrem do respectivo regime legal, nas liquidações de IRC referentes a 2004 e 2007.
O Requerente afirma sobre esta questão, em suma, que, tanto quanto é do seu conhecimento, aquele montante não foi utilizado naquelas liquidações e que a não consideração desses pagamentos nos actos impugnados é ilegal, mesmo que tenham sido considerados em liquidações posteriores.
Também quanto a esta questão a Autoridade Tributária e Aduaneira não tem razão, pois valem aqui as considerações que se fizeram no ponto anterior sobre a manutenção da utilidade da lide, por o Requerente ter interesse em ver anulada a obrigação de pagamento das quantias correspondentes, que emana da liquidação cuja ilegalidade pretende ver declarada, bem como em ver anulada a influência que a não consideração de tais pagamentos teve no cálculo dos juros compensatórios.
Improcede, por isso, também esta questão prévia.
4. Matéria de direito
4.1. Despesas relativas a «cursos e seminários»
Foi corrigido o lucro tributável relativamente a despesas com «cursos e seminários» no montante de € 107.064,67.
O Requerente discorda da correcção efectuada pela Administração Tributária relativamente no ponto 1.1.1.1. do relatório de inspecção, que se reporta a despesas relativas a funcionários do Requerente com Cursos e Seminários, respeitantes a inscrições, matrículas, propinas e mensalidades de cursos de pós-graduação, mestrados, doutoramentos e licenciaturas diversas.
A Administração Tributária considerou tais despesas como não susceptíveis de serem fiscalmente aceites como custos fiscais, nos termos dos artigos 42.º, n.º 1, alínea c), e 23.º, n.º 1, ambos do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).
4.1.1. Posição do Requerente
A posição do Requerente sobre esta questão é, no essencial, a seguinte:
– Tratando-se as despesas em apreço de encargos suportados com a formação e valorização profissional dos próprios funcionários do sujeito passivo, há que concluir pela indispensabilidade daquelas despesas para a obtenção dos ganhos sujeitos a imposto e pala a manutenção da fonte produtora;
– Do incremento das competências técnicas e da formação específica dos funcionários de qualquer entidade decorre, necessariamente, um aumento de produtividade e, logo, a obtenção de maiores ganhos;
– Será este o entendimento que subjaz à circunstância da própria Administração Tributária vir, através da Circular n.º 6/91 (DGCI SAIR), pugnar pela aceitação como custo fiscal das despesas incorridas pelos sujeitos passivos com acções de formação profissional feitas aos seus próprios funcionários;
– A circunstância de o beneficiário imediato daquela despesa ser outrem que não o Requerente, não constitui obstáculo, à face do art. 42.º, n.º 1, alínea c), do CIRC a que seja o Requerente a suportar tal custo, pois o alcance desta disposição não é a de impor uma limitação ao artigo 23.º do CIRC, mas antes a da salvaguarda do princípio aí estabelecido, que é o da aceitação de encargos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos; pretende-se com a mencionada alínea que na determinação do lucro tributável da empresa se aceitem encargos que não lhe digam respeito, desde que se verifiquem os pressupostos previstos no citado artigo 23.º do CIRC.
4.1.2. Posição da Autoridade Tributária e Aduaneira
A Autoridade Tributária e Aduaneira entende, em suma, que
– Trata-se de encargos que incidem sobre terceiros e que fiscalmente o … não está autorizado a suportá-los e, não tendo ficado provada a indispensabilidade dos mesmos para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, não foram os enunciados custos considerados dedutíveis para efeitos fiscais;
– A directriz administrativa que consta da Circular n.º 6/91 (DGCI SAIR) respeita apenas aos procedimentos a adoptar em matéria de tributação dos subsídios concedidos pelo Fundo Social Europeu, destinados à valência de formação profissional, efectuada pelas entidades patronais aos seus funcionários, que nada tem de correspondência fáctica à situação em apreço;
– Estatui o n.º 1 do artigo 23.º do CIRC que se consideram custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, decorrendo da lei que só relevam os encargos que sejam determinantes para aquele fim. E que a relevância fiscal de um custo depende da prova da sua necessidade, adequação, normalidade ou da produção do resultado sendo que a falta destas características poderá gerar dúvidas sobre se a causa é ou não empresarial.
– Não obstante a relevância assumida pela realidade jurídico-económica subjacente às normas fiscais, a lei exige a comprovação da indispensabilidade do custo na obtenção dos proveitos e não apenas a mera comprovação da possibilidade de obtenção desses proveitos;
– Por esse prisma, os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou seja, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo, assim se aproximando as categorias económicas e fiscais, mediante uma interpretação prevalentemente lógica e económica da causalidade legal de acordo com a qual o gasto imprescindível é todo o custo realizado em ordem à obtenção de ingressos e que represente um decaimento económico para a empresa.
– Donde que, por princípio, a dedutibilidade fiscal do custo depende, tão só, de uma relação causal e justificada com a actividade da empresa, assim se excluindo do conceito de indispensabilidade unicamente os actos desconformes com o escopo social, aqueles que não se inserem no interesse da sociedade, sobretudo porque não visam o lucro.
– A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa e esta indispensabilidade verifica-se sempre que – por funcionamento da teoria da especialidade das pessoas colectivas – as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respectivo escopo societário e, em especial, desde que se conectem com a obtenção de lucro.
– A interpretação para a indispensabilidade deve ser aferida, para além de casuisticamente, sempre de modo a não colocar em causa o princípio da tributação real das empresas e, por inerência, a sua capacidade contributiva, a ponto de que a pretexto de uma suposta indispensabilidade se ouse mitigar a base tributável do sujeito passivo, atenta a não exclusão de gastos afastados pela lei, não obstante a forte motivação que convença de que eles foram incorridos para além do objectivo social, ou seja, na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, desviante, face às necessidades e capacidades objectivas da empresa.
– No que respeita a este primeiro crivo — ie. a indispensabilidade — os gastos sub judicio de modo algum se esgotam nos interesses do Requerente, antes pelo contrário, são sublinhados, sim, na esfera de terceiros e no interesse destes, implicando que não se tenha verificado in casu a bondade que, face ao postulado da indispensabilidade, seria exigida para a respectiva elegibilidade fiscal.
– E, ainda que, por mera hipótese, se alvitrasse o preenchimento da indispensabilidade, mesmo assim facilmente se via o impedimento fiscal no sentido em que os encargos de terceiros não são atendidos, excepto caso haja lugar à obrigação legal de os suportar, o que, conforme resulta dos autos, não sucede in casu, ademais porque em momento algum o Requerente, representou essa obrigatoriedade legal de repercussão.
4.1.3. Decisão da questão das despesas relativas a «cursos e seminários»
O art. 23.º, n.º 1, do CIRC, na redacção vigente em 2003, estabelece o princípio de que «consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora»,
São indispensáveis para realização dos proveitos as despesas sem as quais a empresa não poderia exercer a sua actividade nem obter os proveitos ou ganhos que obteve.
Não afasta uma conclusão no sentido dessa indispensabilidade a eventualidade de a empresa poder prosseguir a sua actividade sem realizar determinadas despesas, mas apenas um juízo no sentido de as despesas em causa não terem potencialidade para influenciar positivamente a obtenção de proveitos. No mínimo, numa situação em que a matéria tributável é positiva, uma conclusão no sentido da dispensabilidade das despesas para a obtenção do lucro tributável, teria de assentar numa demonstração de que mesmo que não tivessem sido efectuadas as despesas em causa poderiam ser obtidos os proveitos ou ganhos que foram efectivamente obtidos.
O que significa que só é de afastar uma conclusão no sentido da indispensabilidade das despesas para a obtenção dos proveitos ou ganhos se se puder afirmar que essas despesas não tinham potencialidade para os influenciarem positivamente.
Na verdade, não é necessário para atribuir relevância fiscal às despesas efectuadas, demonstrar que os cursos de formação de funcionários produziram efectivamente um resultado positivo. Basta que sejam actos que possam ser aceites como actos de gestão, actos do tipo dos que uma empresa realize com o objectivo de incrementar os proventos e com tendencial potencialidade para propiciar tal incremento. Nesta matéria, o controle da Administração Tributária tem de ser um controle pela negativa, eliminado como custos apenas os que claramente não tenham potencialidade para gerar incremento dos ganhos, não podendo «o agente administrativo competente para determinar a matéria colectável arvorar-se a gestor e qualificar a indispensabilidade ao nível da boa e da má gestão, segundo o seu sentimento ou sentido pessoal; basta que se trate de operação realizada como acto de gestão, sem se entrar na apreciação dos seus efeitos, positivos ou negativos, do gasto ou encargo assumido para os resultados da realização de proveitos ou para a manutenção da fonte produtora» (VÍTOR FAVEIRO, Noções Fundamentais de Direito Fiscal Português, volume II, página 601).
O contribuinte, no exercício da liberdade de iniciativa económica nos quadros definidos na Constituição e na Lei que lhe é reconhecida pela Constituição da República Portuguesa [arts. 61.º, n.º 1, e 80.º, alínea c)], tem, em princípio, o direito de definir com relevância fiscal as estratégias empresariais que julgue adequadas e de escolher os meios para atingir os resultados que almeja, desde que não esteja prevista qualquer limitação justificada pela necessidade de assegurar a concomitante realização de outros valores com consagração constitucional, como, por exemplo, os interesses ecológicos ou os direitos dos trabalhadores. Incluir-se-á no núcleo essencial de tal direito, a liberdade dos agentes económicos formularem e concretizarem as suas opções de gestão, quando estas não afectem qualquer dos interesses constitucionais que se pretendem assegurar. Sendo certo que as exigências da tributação, necessária para assegurar o funcionamento geral do Estado, podem justificar limitações aos custos relevantes para efeitos fiscais, estas têm de decorrer da Constituição ou da Li, como impõem quelas normas constitucionais.
A esta luz, sendo a regra a liberdade de iniciativa económica e devendo a tributação das empresas incidir fundamentalmente sobre o seu rendimento real (art. 104.º, n.º 2, da CRP), a norma do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, na redacção vigente em 2003, ao limitar a relevância dos custos aos «que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora» tem de ser entendida como permitindo a relevância fiscal de todas as despesas efectivamente concretizadas que sejam potencialmente adequadas a proporcionar proveitos ou ganhos, independentemente do êxito ou inêxito que em concreto proporcionaram.
A própria letra daquele n.º 1 do art. 23.º aponta decisivamente nesse sentido com a utilização do tempo verbal futuro «forem», em vez do tempo passado «foram»: a perspectiva adequada para apreciar a indispensabilidade das despesas para a obtenção dos proveitos é do agente económico no momento em que agiu, quando apenas há a possibilidade de as opções empresariais a tomar virem a produzir proveitos e não a da fiscalização tributária, agindo na presença dos resultados obtidos, apreciando a relevância que as despesas tiveram efectivamente para eles serem atingidos.
A esta luz, é de concluir que são de considerar indispensáveis para a realização dos proveitos as despesas que, no momento em que são realizadas, se afigurem como potencialmente geradoras de proveitos, o que tem como corolário só poder ser eliminada a relevância fiscal de um custo quando for de concluir, à face das regras da experiência comum, que não tinha potencialidade para gerar proveitos, isto é, quando se demonstrar que o acto que gera os custos não pode ser considerado como um acto de gestão, por não poder esperar-se, com probabilidade aceitável, que da despesa efectuada possa resultar um proveito. ( 2 )
Nem outra solução seria razoável, em face da periodicidade anual do apuramento da matéria tributável e o facto de os resultados positivos das despesas efectuadas por vezes só se revelarem passados vários, o que impede que o apuramento da influência de algumas despesas na formação dos proveitos seja apurável no fim de cada ano fiscal.
Desta perspectiva, é evidente que não pode afastar-se a possibilidade abstracta de as despesas com a formação de pessoal e sua valorização profissional influenciarem positivamente a obtenção dos proveitos.
Na verdade, até é de presumir o contrário, à face das regras da vida e da experiência, desde que se trate de formação relacionada com o tipo de actividade que a empresa que suporta as despesas desenvolve, pois é notório que a qualificação profissional é a forma mais segura de obter bons resultados, pelo menos numa perspectiva de médio ou longo prazo, que, naturalmente, o direito fiscal não pode deixar de aceitar.
Se não fosse evidente que a formação e valorização profissional tem potencialidade para influenciar positivamente a produtividade e consequente obtenção de proveitos, bastaria ter presente que a própria lei o reconhece implicitamente em várias disposições legais, para não poder aceitar-se a posição adaptada pela Autoridade Tributária e Aduaneira no sentido de que nenhuma das despesas de formação referidas no relatório da inspecção pode considerar-se indispensável para o Requerente obter os proveitos que obteve.
Na verdade, em relação aos funcionários da própria Autoridade Tributária e Aduaneira, o art. 7.º, n.º 1, alínea e), do DL n.º 118/2011, de 15 de Dezembro, reconhece a potencialidade positiva da formação, ao estabelecer como um dos seus princípios orientadores, «o princípio da valorização dos recursos humanos, que visa aumentar a motivação e a participação activa dos trabalhadores, através, designadamente, da sua formação e qualificação permanente, de formas de organização do trabalho que lhes permitam pôr à prova a sua capacidade e criatividade, de mobilidade profissional e de adequados planos de carreira baseados no mérito».
O mesmo está expressamente reconhecido relativamente aos magistrados judiciais e do Ministério Público, para quem a lei até estabelece a obrigatoriedade da formação contínua, ao longo da carreira (art. 10.º-B do Estatuto dos Magistrados Judiciais e art. 88.º-A do Estatuto do Ministério Público, nas redacções da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto).
Tanto basta para concluir que não pode aceitar-se a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira que se reconduz ao entendimento de que nenhum dos cursos de pós-graduação, mestrado e doutoramento referidos no relatório da inspecção tributária tem potencialidade para influenciar os proveitos obtidos pelo Requerente no ano em causa e nos futuros.
Por outro lado, as exigências de formação e valorização profissional, a nível da sua qualidade, não são as mesmas para todos os tipos de empresa, pelo que não pode não encontrar-se uma fórmula passe partout para preencher o conceito de indispensabilidade, válida simultaneamente para uma micro-empresa de bairro e uma grande empresa com actividade a nível nacional.
Assim, uma intervenção da Administração Tributária corrigindo a declaração de rendimentos do contribuinte com fundamento em não se comprovar a indispensabilidade de determinados custos para a obtenção dos proveitos não poderá deixar de assentar numa análise casuística da empresa e cada uma das despesas ou tipos de despesas em causa.
As exigências de um banco são notoriamente grandes a nível da formação de funcionários, por poderem ser economicamente importantes quer as consequências negativas das deficiências de formação, quer os efeitos positivos da qualidade da formação e, por isso, é perfeitamente compreensível que a estratégia empresarial do Requerente, numa área económica consabidamente concorrencial, passe por ministrar aos seus funcionários formação ao maior nível universitário. Pelo menos, é seguro que será ousado e infundado afirmar que essa formação não pode ser considerada pelo Requerente como um investimento tendencialmente potenciador dos seus proveitos futuros.
Eventualmente, poderá suceder que algum ou alguns dos actos de formação referidos pudesse considerar-se desnecessário para a obtenção de proveitos, mas, não sendo aceitável uma posição global de rejeição da relevância desses cursos para potencializar os proveitos, por contrariar a presunção natural que aponta no sentido contrário, impunha-se à Administração Tributária, no mínimo, analisar pormenorizadamente cada um dos custos ou cada tipo de custos invocados pelo Requerente e explicitar as razões porque, ao arrepio daquela regra da experiência, entendia que não havia potencialidade para um banco aproveitar da formação de nível superior que financiou.
Na verdade, se é certo que há um ónus de comprovar a indispensabilidade dos custos para a realização dos proveitos sujeitos a imposto, como resulta do teor expresso do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, também é certo que, havendo uma presunção natural no sentido de as despesas de formação do pessoal ao serviço do Requerente terem potencialidade para incrementar os seus proveitos, o dever probatório do contribuinte está, em princípio, satisfeito, cabendo então à Administração Tributária, pelo menos, tornar duvidosa a adequação da aplicação dessa presunção ao caso em apreço, designadamente indicando qualquer circunstancialismo especial que justificasse que se desconfiasse da correspondência dessa presunção à realidade, em sintonia com o princípio geral de direito probatório enunciado no art. 346.º do CC.
Por outro lado, não se pode afastar a dedutibilidade das despesas referidas com base no art. 42.º, n.º 1, alínea c), do CIRC, qualquer estabelece que «não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício» «os impostos e quaisquer outros encargos que incidam sobre terceiros que a empresa não esteja legalmente autorizada a suportar», pois nem se apurou sequer se foram os funcionários que decidiram frequentar os custos ou se foi por imposição do Requerente que o fizeram, situação em que os respectivos custos não lhe podiam deixar de ser imputados. Se foi o Banco quem contratou e inscreveu os seus funcionários, o encargo é dele e não destes.
Assim, não se demonstrou que, no caso em apreço, os encargos em causa incidissem sobre os funcionários do Requerente, pois isso só sucederia se tivessem sido estes e não o Requerente a assumir perante as instituições de ensino em causa a iniciativa de os cursos serem ministrados.
Por tudo o exposto, é de concluir que o acto de liquidação enferma de vício de erro sobre os pressupostos de direito [arts. 23.º, n.º 1, e 42.º, n.º 1, alínea c) do CIRC, na redacção vigente em 2003], ao não considerar como custos as referidas despesas de formação e valorização profissional de funcionários do Requerente, vício esse que justifica a sua anulação (art. 135.º do Código do Procedimento Administrativo).
4.2. Questão da provisão a 100% de despesas com crédito vencido
A correcção referida no ponto 1.1.1.5.1. do relatório de inspecção baseia-se no facto de o Requerente ter provisionado a 100% o montante de € 111.022,14 correspondente ao saldo da conta 289 — “Despesas de Crédito Vencido”, relativo a despesas incorridas com o crédito e juros vencidos.
A Administração tributária efectuou tal correcção por entender que tal provisão não podia ser fiscalmente relevada, porquanto, não só não consubstanciava um crédito propriamente dito, mas também porque o Plano de Contas para o Sistema Bancário (PCSB) não prevê classes de risco para este tipo de despesas.
4.2.1. Posição do Requerente
O Requerente defende o seguinte:
– Tal entendimento afigura-se ao Requerente carecer de suporte legal porque o conceito de crédito vencido tem, para efeitos prudenciais, um sentido lato, abarcando capital, juros e despesas incorridas com o crédito e juros.
– Em função do risco associado a este crédito, define o Banco de Portugal políticas prudentes, ponderando diferentes níveis mínimos de provisionamento;
– O risco é medido à luz de vários critérios, como a duração da mora, a existência ou não de garantia, a natureza dessa mesma garantia, aspectos subjectivos relacionados com a natureza do devedor/garante e até a sua localização geográfica;
– E é neste contexto que surgem as designadas “Classes de Risco”.
– Ou seja, precisamente porque em determinadas circunstâncias um juízo prudente não obriga a que o nível de provisionamento tenha de ser efectuado pela totalidade a 100%.
– Contudo, isso não significa que todos os riscos possam ser gradualmente provisionados.
– Com efeito, o Banco de Portugal obriga os intermediários financeiros a registarem certas despesas na conta 289.
– Esta conta não está subdividida em classes de risco, não porque o Banco de Portugal entenda que estes montantes não comportam risco e, consequentemente, não devem constar da base de incidência da provisão para crédito vencido, mas sim, porque o risco de não recebimento destas despesas é mais elevado do que o risco associado ao crédito que as originou.
– Basta pensar que, em sede de execução de um qualquer bem penhorado ao respectivo devedor, o resultado da sua venda em hasta pública, é, primeiramente, afecto à amortização do capital, posteriormente aos juros, e só o remanescente, quando exista, é utilizado para pagamento das despesas.
– Daí que o Banco de Portugal imponha que estes valores sejam provisionados a 100%.
– Tal, aliás, pode ser aferido observando os modelos oficiais dos mapas de provisões do Banco de Portugal.
– Por esta razão, não pode a provisão em apreço, desde logo, deixar de ser relevada corno custo fiscal, e consequentemente a liquidação deverá ser anulada na parte que ora se contesta.
– Acresce que, ainda que este não se afigurasse ser o entendimento que melhor se retira do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal, ainda assim, outros haverá bem mais consentâneos com as normas contabilísticas e fiscais e com a natureza das despesas em apreço, que não aquele de que se socorre a Administração Tributária para promover a correcção em análise.
– Com efeito, bastará, para tanto, atentar na norma do n.º 4, do Capítulo VII, do PCSB, que dispõe, a dado passo, que o registo dos juros de crédito vencido e, bem assim, “(...) as respectivas despesas passará a ser realizado, a título de «pro memória», nas contas extrapatrimoniais «993 — Juros vencidos» e «994 — Despesas de crédito vencido»”
– De tal dispositivo se infere que, à semelhança do que sucede com os juros relativos a crédito sem garantia, também o proveito correspondente às despesas em que se tenha incorrido com referência àquele crédito ou juros, quando a cobrança daquelas não se faça até ao final do terceiro mês, deve ser imediatamente anulado.
– Ou seja, no plano do resultado do exercício a que aquelas despesas respeitam inexistirá qualquer proveito a elas referente susceptível de tributação em sede de IRC.
– Na verdade, naqueles casos, tal tributação do proveito correspondente só ocorrerá se e quando aquela despesa foi cobrada.
– Caso não fosse de aceitar o entendimento em que suportou a constituição da referida provisão, sempre se deveria proceder nos termos agora expostos, isto é, através da anulação do proveito respeitante à despesa.
– De todo o modo, no plano fiscal, fosse por via da constituição da provisão nos termos efectuados pelo Requerente, fosse por via da anulação do proveito correspondente ao débito da despesa, o resultado da operação seria sempre igual.
– Efectivamente, de uma ou de outra forma, inexiste qualquer proveito a tributar.
– A persistir-se nesta correcção a Administração Tributária está, por um lado, a violar o disposto no artigo 6.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), que determina a sujeição expressa de toda a sua acção no âmbito do procedimento inspectivo ao princípio da verdade material, designadamente, à realização oficiosa de todas as iniciativas adequadas a esse objectivo e, por outro, a violar o artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, que impõe a tributação das sociedades pelo lucro real.
– Por último, sempre seria possível entender-se o disposto no Aviso 3/95 do Banco de Portugal no sentido de impor o provisionamento, ainda que noutros termos, daquelas despesas.
– Com efeito, como se alcança do n.º 6 do citado Aviso “para efeitos do disposto nos n.ºs 3.º, 4.º, e 7. º, são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga.”
– Nestas prestações de serviços incluem-se, obviamente, as despesas referentes ao crédito e aos juros em análise debitados aos clientes.
– Isto é, por força do citado normativo impor-se-ia a constituição da provisão para despesas nos mesmos termos em que teria de ser constituída para o crédito vencido.
– Ou seja, de acordo com as classes de risco previstas no n.º 3.º do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal.
– Se é certo que por efeito da antiguidade das despesas em questão a provisão a constituir na sua totalidade poderia não corresponder ao valor total daquelas despesas, uma vez que nem todas seriam susceptíveis de ser enquadradas na classe IV ou V, consoantes os casos, não é menos verdade que o Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal impõe, de acordo com aquele entendimento, a sua constituição.
– Pelo que, ainda que todo o invocado supra fosse improcedente, sempre prevaleceria este último entendimento, por força do qual a Administração Tributária não poderia, nos termos em que o fazem esses serviços, desconsiderar fiscalmente a provisão em apreço.
– Efectivamente, se se admite, como se referiu, que a provisão em análise, de acordo com este último entendimento, poderia ser excessiva em virtude da menor antiguidade de algumas despesas, não é menos verdade que o montante destas despesas é provisionável.
– O que não pode suceder é que se desconsidere totalmente a provisão em apreço sob pena de manifesta violação do disposto no Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal e no artigo 34.º, n.º 1, alínea d) do CIRC.
4.2.2. Posição da Autoridade Tributária e Aduaneira
A Autoridade Tributária e Aduaneira diz o seguinte, sobre esta questão:
– De acordo com os elementos constantes nos autos, afere-se que os serviços de inspecção tributária, em conformidade com o disposto no ponto 1 do número 3.º do Aviso 3/95 de 30 de Junho do Banco de Portugal, e da alínea d) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC, procederam à correcção fiscal no montante de € 111.022,14, tendo por fundamento que apenas são provisionáveis os créditos e juros vencidos nas diferentes classes de risco, e que o saldo da conta 289 (despesas com credito vencido), não obstante estarem relacionadas com o crédito vencido, não consubstanciam a natureza de crédito propriamente dito, não sendo susceptível de provisionamento, não prevendo, concomitantemente, o Plano de Contas para o Sistema Bancário (PCSB), classes de risco para esse tipo de despesas.
– Ao contrário dos argumentos aduzidos, o conceito de crédito vencido não contém um sentido tão lato como o Requerente pretende fazer crer, abrangendo para além de capital e juros, as despesas incorridas com o crédito e juros.
– O entendimento propugnado pelo Requerente, não encontra qualquer respaldo ou guarida quer na letra quer no espírito das normas emanadas pelo Banco de Portugal.
– Com efeito, prescreve o ponto 1 do número 3.º do Aviso 3/95 de 30 de Junho do Banco de Portugal, que “Para efeitos da constituição das provisões para crédito vencido, os vários tipos de crédito são enquadrados nas classes de risco indicadas no número seguinte, as quais reflectem o escalonamento dos créditos e dos juros vencidos em função do período decorrido após o respectivo vencimento ou o período decorrido após a data em que tenha sido formalmente apresentada ao devedor a exigência da sua liquidação”.
– Ora, quer da análise do n.º 1 do número 3, quer do Aviso 3/95 de 30 de Junho do Banco de Portugal, no seu conjunto, é peremptório que a provisão para crédito vencido, se reconduz exclusivamente a capital mais juros, não fazendo qualquer menção expressa relativamente às despesas incorridas com crédito e juros.
– Pelo que, o entendimento que o Requerente faz ao incluir nas provisões para crédito vencido para além do capital e juros as despesas incorridas com crédito e juros, não encontra na letra do citado Aviso 3/95 de 30 de Junho do Banco de Portugal, o mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, o que só por si afasta liminarmente, tal entendimento, por contrário ao estatuido no disposto no artigo 9.º do Código Civil.
– Por outro lado, argumento aduzido pelo Requerente que a conta 289 está subdividida em classes de risco, porque o risco de não recebimento dessas despesas é mais elevado do que o risco associado ao crédito que as originou e que a imposição do provisionamento dessas despesas poderá ser aferido por observação dos modelos oficiais dos mapas de provisão do Banco de Portugal, é igualmente despiciendo.
– De facto, o saldo da conta 289 (despesas com credito vencido), não obstante estarem relacionadas com o crédito vencido, não consubstanciam a natureza de crédito propriamente dito, não sendo susceptível de provisionamento.
– Acresce ainda, que o PCSB não estatui classes de risco para esse tipo de despesas.
– De facto, da análise efectuada aos referidos mapas de provisão do Banco de Portugal, constata-se ainda que os mesmos não fazem qualquer menção aquele tipo de despesas, mas apenas à subdivisão da Classe 1 em crédito ao consumo e outros créditos.
– Note-se ainda que, o Aviso 3/95 do Banco de Portugal, também não faz qualquer referência àquele tipo de despesas.
– Logo, improcede o argumento invocado pelo Requerente, porquanto, não encontra guarida quer na letra do Aviso 3/95 do Banco de Portugal quer nas normas do PCSB.
– Invoca ainda o Requerente que não se poderá aceitar que a Administração Tributária, em função da desconsideração fiscal da provisão, venha a determinar a tributação de um proveito inexistente, e consequentemente, de um lucro não real.
– Ora, relativamente à questão em apreço, salienta-se que, o que o Requerente não devia olvidar, é que a não aceitação da constituição ou reforço da provisão, traduz-se tão somente na não aceitação da antecipação do reconhecimento de um custo, caso ele venha a existir no futuro.
– Da mesma forma se irá desconsiderar, permitindo a sua dedução, o proveito que vier a ser gerado pela utilização da reposição dessa mesma provisão, não resultando dai qualquer prejuízo para o Requerente.
– Logo, é manifestamente descabido o argumento aventado pelo Requerente sendo igualmente infundado o argumento da violação do princípio da descoberta da verdade material estatuído no disposto no artigo 6.º do Regime Complementar de Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT) e no n.º 2 do artigo 104.º da Lei Geral Tributária (LGT).
– Por último, invoca o Requerente que ainda que não seja possível o provisionamento nos termos propostos, sempre o provisionamento das aludidas despesas seria possível, à luz do número 6.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal.
– Todavia, também aqui falecem os argumentos expostos.
– Estatui o número 6.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal que” Para efeitos do disposto nos nºs 3.º, 4.º e 7º são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga, conforme se depreende do n.º 6 do Aviso 3/95 do Banco de Portugal, são equiparadas a crédito as posições credoras das instituições resultantes da prestação de serviços, da venda de activos e de outras operações de natureza análoga”.
– No entender do Requerente as aludidas despesas incluem-se naquelas prestações de serviços, e por força do citado normativo impor-se-ia a constituição da provisão para despesas nos mesmos termos em que teria de ser constituída para o crédito vencido, ou seja, de acordo com as classes de risco previstas no número 3.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal.
– Todavia, se por um lado o número 6.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal impõe a constituição de provisões, por outro lado e, por efeito da antiguidade das despesas em questão, a provisão a constituir na sua totalidade poderia não corresponder ao valor total daquelas despesas, uma vez que nem todas seriam ser susceptíveis de serem enquadradas na Classe IV ou V, a fim de ter provisionamento integral.
– Aliás, em abono da verdade na nova redacção do número 3.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal, aquelas despesas ainda que enquadradas na Classe IV, nunca poderiam ser provisionadas a 100% mas apenas a 75%.
4.2.3. Decisão da questão da provisão relativa a despesas com crédito vencido
4.2.3.1. Questão da legalidade da constituição da provisão
As provisões constituem uma categoria específica de «custos ou perdas» indicados no art. 23.º, n.º 1, alínea h), do CIRC, na redacção vigente em 2003.
O «regime das provisões», na redacção do CIRC vigente em 2003, constava dos arts. 34.º a 38.º do CIRC, sendo naquele primeiro artigo que se indicavam as «Provisões fiscalmente dedutíveis».
A correcção relativa à provisão efectuada pelo Requerente relativamente a despesas com crédito vencido foi efectuada com os fundamentos de apenas serem provisionáveis os créditos e juros vencidos nas diferentes classes de risco e de que as despesas com crédito vencido, não obstante estarem relacionadas com o crédito vencido, não têm a natureza de crédito propriamente dito, pelo que não serão susceptíveis de provisionamento, não prevendo o Plano de Contas para o Sistema Bancário (PCSB), classes de risco para esse tipo de despesas, no âmbito da conta 289.
Do corpo do n.º 1 do art. 34.º do CIRC, na redacção vigente em 2003, em que se referia que «Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões», resulta que, na falta de norma especial que preveja regime diferente, apenas as provisões que tenham enquadramento em qualquer das suas disposições são fiscalmente dedutíveis.
Entre os vários tipos de provisões aí indicados, apenas é de aventar a possibilidade de enquadramento na alínea d) do n.º 1 desse art. 34.º, nessa redacção vigente em 2003, que, no que aqui interessa, atribuía relevância fiscal às provisões «que, no âmbito da disciplina definida pelo Banco de Portugal, e por força de uma imposição de carácter genérico e abstracto, tiverem sido obrigatoriamente constituídas pelas empresas sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de instituições de crédito e de outras instituições financeiras com sede em outro Estado membro da União Europeia, com excepção da provisão para riscos gerais de crédito».
O regime das provisões das instituições de crédito e sociedades financeiras vigente em 2003 consta do Aviso de Banco de Portugal n.º 3/95, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 30 de Junho de 1995 ( 3 ), e do Plano de Contas para o Sistema Bancário, aprovado pelo Banco de Portugal pela Instrução n.º 4/96, ao abrigo da competência que lhe é atribuída pelo art. 115.º, n.º 1, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro. ( 4 )
Não existia, em 2003, qualquer disposição que impusesse, expressamente, a constituição de provisões relativas a despesas com créditos vencidos. Designadamente, nenhum daqueles diplomas faz qualquer referência a provisões para despesas com créditos vencidos, mas apenas a provisões relativas aos créditos vencidos e juros vencidos.
Por outro lado, não se pode entender, como pretende o Requerente, que o conceito de «crédito vencido» abranja «o capital, juros e despesas incorridas com o crédito e juros», pois o Plano de Contas para o Sistema Bancário utiliza cumulativamente os conceitos «crédito vencido», «juros vencidos» e «despesas de créditos vencidos» (por exemplo, na «Lista e âmbito das contas», classe 2, conta 28 e subcontas 287, 288 e 289) e o Aviso do Banco de Portugal n.º 3/95 também utiliza os conceitos de «crédito vencido» e «juros vencidos» (ponto 3.º, n.º 1), o que conduz à conclusão que o conceito de «crédito vencido» se reporta apenas ao próprio crédito que dá origem aos juros e às despesas.
No que concerne aos mapas de provisões (aprovados pela Instrução n.º 9/2003, do Banco de Portugal) ( 5 ), não se encontra qualquer referência a provisões para despesas com créditos vencidos.
Também não se pode entender, como pretende o Requerente, que a não subdivisão da conta 289 em classes de risco, como se prevê para as provisões, seja devida a um pretenso maior risco de não cobrança das despesas do que não cobrança do crédito e juros, pois não corresponde à realidade o pressuposto de que o Requerente parte de que «em sede de execução de um qualquer bem penhorado ao respectivo devedor, o resultado da sua venda em hasta pública, é, primeiramente, afecto à amortização do capital, posteriormente aos juros, e só o remanescente, quando exista, é utilizado para pagamento das despesas».
Na verdade, desde logo, não há qualquer regime especial de preferência relativo a vendas em hasta pública de bens penhorados, pois a hasta pública deixou de ser forma de venda de bens penhorados em execuções comuns com a reforma do processo civil operada pelo DL n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, e pelo DL n.º 180/96, de 25 de Setembro. ( 6 ) No que concerne ao processo de execução fiscal, a modalidade de venda em hasta pública foi abandonada com a reforma do CPPT, operada pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho.
Por outro lado, os regimes de imputação de pagamentos, em caso de arrecadação de receitas insuficiente para pagamento da dívida exequenda e do acrescido estão previstos no art. 785.º, n.º 1, do Código Civil e nos artigos 40.º, n.º 4, da LGT e 262.º, n.º 2, do CPPT e, em qualquer dos casos, as despesas e os encargos têm preferência de pagamento em relação ao próprio crédito principal.
Por isso, sendo maior o risco de não cobrança das despesas do que o de não cobrança do crédito com que estão relacionadas, não se justificaria uma provisão de 100% para as despesas, nos casos em que para o crédito está prevista uma provisão menor, em face da classe de risco em que se integra. O facto de na conta n.º 289, relativa a «Despesas de crédito vencido», prevista no Plano de Contas para o Sistema Bancário, não se fazer referência a classes de risco leva a concluir, como defende a Autoridade Tributária e Aduaneira, que não se consideraram tais despesas como provisionáveis.
4.2.3.2. Questão da anulação contabilística do proveito correspondente às despesas com crédito vencido
O Requerente defende, subsidiariamente, que, a não se considerar legalmente admissível a constituição da provisão referida, o proveito correspondente às despesas com créditos vencidos, sem garantia, deve ser imediatamente anulado, quando a cobrança daquelas não se faça até ao final do terceiro mês posterior ao vencimento do crédito.
A Administração Tributária nada diz sobre esta questão, inclusivamente não pondo em causa que as despesas referidas se reportam a créditos vencidos há mais de três meses, sem garantia, pelo que se trata de matéria de facto que, por força das regras da experiência, que estão subjacentes à regra do n.º 2 do art. 490.º do CPC, deve considera-se assente.
O Plano de Contas para o Sistema Bancário estabelece, no ponto 4 ii) do Capítulo VII, relativamente à «contabilização de juros e de despesas após o vencimento» o seguinte:
São transferidos para a conta "288 – Juros vencidos a regularizar", os juros vencidos na data em que a cobrança se deveria ter efectivado ficando a aguardar, pelo período máximo de 3 meses, a respectiva regularização contabilística, de acordo com os critérios estabelecidos a seguir.
Os juros de créditos sobre ou com garantia das entidades indicadas no Aviso nº 3/95 que rege a constituição de provisões continuarão a ser contabilizados como proveitos, com contrapartida nas respectivas subcontas da conta "28 – Crédito e juros vencidos", durante todo o tempo em que os créditos se mantenham nesta situação.
Igual tratamento será dado aos juros de créditos com garantias reais até que seja atingido o limite de cobertura, prudentemente avaliado.
As despesas relativas a estes créditos cujos juros são incorporados na conta de resultados serão registadas na conta "289 – Despesas de crédito vencido".
A regularização dos juros relativos aos restantes créditos vencidos será efectuada através de débito das respectivas contas de proveitos se se referirem ao exercício em curso. Caso contrário será debitada a conta "6718 – Perdas relativas a exercícios anteriores". O registo destes juros, bem como das respectivas despesas passará a ser realizado, a título de "pro memória", nas contas extrapatrimoniais "993 – Juros vencidos" e "994 – Despesas de crédito vencido".
Resulta da parte final destas directivas contabilísticas que, como defende o Requerente, as despesas de crédito vencido sem garantia, ao fim de 3 meses, ficam apenas registadas em conta extrapatrimonial.
Sobre as contas extrapatrimoniais, refere-se na Classe 9 do Anexo à instrução n.º 4/96, do Banco de Portugal:
As contas desta classe registam as responsabilidades ou compromissos assumidos pela instituição ou por terceiros perante esta e que não estão relevados em contas patrimoniais, nomeadamente: as responsabilidades por assinatura, os compromissos financeiros relacionados com acordos e facilidades de crédito irrevogáveis, os compromissos decorrentes de contratos relativos a operações a prazo sobre divisas, taxas de juro e cotações, as compras e vendas de activos com opção ou compromisso firme de recompra, os valores dados e recebidos a título de garantia, as obrigações relacionadas com a prestação de serviços bancários (de administração, de guarda e cobrança de valores, etc.).
Prevêem-se ainda outras contas destinadas a fornecer informação complementar que é exigida para efeitos de publicidade externa e a considerada de utilidade para a gestão das próprias instituições.
Como se vê pelo transcrito ponto 4 ii) do Capítulo VII do Plano de Contas para o Sistema Bancário, o efeito do registo das despesas com crédito vencido em conta extrapatrimonial, que acompanha o registo dos respectivos juros noutra conta extrapatrimonial, é o de o respectivo montante ser debitado da respectiva conta de proveitos ou da conta «6718 – Perdas relativas a exercícios anteriores», o que implica, em qualquer dos casos, que o valor daquelas despesas não releve positivamente para efeitos da determinação do lucro tributável do ano em que deve concretizar-se tal débito.
Na verdade, as contas extrapatrimoniais destinam-se a fornecer informação relativa a eventos que possam implicar ulteriores modificações do património para efeitos de publicidade externa e de gestão das instituições, mas não relevam para efeitos de patrimoniais, não sendo consideradas no apuramento do balanço, pelo que não constituem um valor a considerar na determinação do lucro tributável.
Por isso, tem razão o Requerente ao defender que, a não se atribuir relevância fiscal ao provisionamento das referidas despesas de crédito vencido, deverá entender-se que o valor destas despesas não releva para efeitos fiscais, por dever ser transferido para uma conta extrapatrimonial (sem prejuízo de, eventualmente, vir a ser considerado se se concretizar a sua cobrança).
É de colocar, porém, a questão da possibilidade de consideração deste regime contabilístico na apreciação da legalidade do acto de liquidação, numa situação em que ele não foi aplicado pelo contribuinte ao elaborar a sua contabilidade, pois, em vez de registar aquelas despesas numa conta extrapatrimonial, efectuou uma provisão.
De harmonia com o preceituado no art. 17.º, n.º 1, do CIRC, «o lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código».
As correcções que aqui se permitem à Administração Tributária concernem à relevância fiscal dos dados contabilísticos e não à elaboração ou alteração da própria contabilidade, que é tarefa de que estão legalmente incumbidos os sujeitos passivos. A Administração Tributária não pode alterar a contabilidade dos contribuintes, o que se compreende, desde logo, tendo presente o facto de ela não relevar apenas para fins fiscais, mas também, e primacialmente, para revelar a situação real das empresas, exigida pela necessidades do comércio jurídico.
Porém, embora o objecto do processo de impugnação judicial seja o acto ou actos impugnados, é seguro que não está afastada a possibilidade de serem tidos em conta na apreciação da sua legalidade, a nível de vício de erro sobre os pressupostos de facto, elementos não considerados no acto de liquidação e não revelados no procedimento tributário, como revela o art. 59.º do CPPT, que, depois de estabelecer a regra de que «o apuramento da matéria tributável far-se-á com base nas declarações dos contribuintes, desde que estes as apresentem nos termos previstos na lei e forneçam à administração tributária os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária» (n.º 2), permite a substituição de declarações «até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto de liquidação, para a correcção de erros ou omissões imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto de montante inferior ao liquidado com base na declaração apresentada» [n.º 3, alínea b), subalínea II) do mesmo artigo], possibilidade esta que tem como corolário a invalidade do acto de liquidação que foi praticado com base nos elementos inicialmente declarados.
É, aliás, esta distinção entre erros de facto dos actos de liquidação imputáveis aos serviços (os que decorrem da divergência entre os pressupostos de facto do acto e a «realidade» revelada pelos elementos a que a Administração Tributária tem acesso durante o procedimento tributário de liquidação) e os erros de factos não imputáveis aos serviços (os não detectáveis pela Administração Tributária à face dos elementos que constam do processo de liquidação) que está subjacente ao regime de juros indemnizatórios previsto no art. 43.º, n.º 1, da LGT e releva para outros efeitos, como os previstos nos arts. 53.º, n.º 2, e 78.º, n.º 1, da mesma Lei.
Por outro lado, o art. 58.º da LGT e o art. 6.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, definindo os princípios do inquisitório e da verdade material, impõem à administração tributária a realização oficiosa de todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material, a nível do apuramento da situação tributária do contribuinte, o que permite concluir que é dever da Administração Tributária, no âmbito do apuramento da matéria tributável, não só retirar relevância fiscal aos elementos de facto resultantes de actos dos contribuintes que os favoreçam indevidamente, mas também atribuir relevância tributária a situações de facto que os favoreçam, independentemente de estes terem praticado os actos que deveriam evidenciá-las.
Isto é, o mesmo dever de busca da verdade material que permite à Administração Tributária retirar relevância contabilística a erros praticados pelo contribuinte na elaboração da contabilidade que o favoreçam, também lhe impõe que atribua relevância a outros erros contabilísticos que o prejudiquem.
Assim, não havendo obstáculo à relevância fiscal da situação de facto concernente à referidas despesas com crédito vencido (aliás, a Autoridade Tributária e Aduaneira nem colocou qualquer obstáculo a tal relevância), é de concluir que tem razão o Requerente quanto a este ponto, pelo que é de declarar a ilegalidade da liquidação impugnada ao dar relevo positivo ao valor das referidas despesas, no montante de € 111.022,14, na fixação da matéria tributável que lhe está subjacente.
4.3. Questão da provisão para créditos de cobrança duvidosa
No que concerne à correcção que consta do relatório da inspecção no ponto 1.1.1.5.2., relativa a excesso na provisão para créditos de cobrança duvidosa, foi efectuada uma correcção no valor de € 52.819,30, referindo os serviços da Administração Tributária que a mesma colhe fundamento na circunstância de o Requerente ter, no que “(...) diz respeito aos créditos vencidos sobre um mesmo cliente que se encontram enquadrados na “Classe de risco 1”, isto é, que entraram em incumprimento há menos de três meses, verificou-se que o banco para o cálculo da provisão, aplicou aos créditos vincendos a taxa correspondente a essa classe de risco” quando, por força do disposto no n.º 5 do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal, “(...) deveria ter aplicado metade das taxas de provisionamento (...)“.
4.3.1. Posição do Requerente
– Basta atentar no teor no n.º 5 do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal, para constatar que não assiste razão a esses serviços quanto a esta correcção.
– Com efeito, dispõe aquele n.º 5 que os “(...) créditos de cobrança duvidosa (..) devem ser provisionados a uma percentagem não inferior a 50% da percentagem média de cobertura por provisões para crédito vencido (...)“.
– Isto é, no citado Aviso impõe-se, tão somente, um limite mínimo de provisionamento e não um limite máximo, sendo que, atento o seu teor e tendo presente as razões prudenciais que enformam o regime em apreço, nos casos em que as instituições financeiras aplicam percentagem superior, como no presente, obviamente que a respectiva provisão continua a coberto da disciplina imposta pelo Aviso n.º 3/95 e, por consequência, a tratar-se de provisão fiscalmente relevante nos termos do artigo 34.º, n.º 1, alínea d), cio Código do IRC.
4.3.2. Posição da Autoridade Tributária e Aduaneira
– Relativamente à questão em epígrafe vem o Requerente discordar dos fundamentos constantes da correcção em apreço, sustentado no simples facto, de que relativamente à provisão em apreço não basta atentar com o disposto no número 5.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal — no qual dispõe que os créditos de cobrança duvidosa devem ser provisionados a uma percentagem não inferior a 50% da percentagem média de cobertura por provisões para crédito vencido -, alegando que o aludido Aviso impõem apenas um limite mínimo e não um limite máximo.
– Destarte, não lhe assiste razão.
– Com efeito, de acordo com o disposto no número 4.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal: “São considerados outros créditos de cobrança duvidosa os seguintes:
a) As prestações vincendas relativas a operações de crédito em que se verifique que as prestações em mora de capital e juros excedem 25% do total do capital em dívida acrescido dos juros vencidos;
b) As prestações vincendas de todos os créditos concedidos a um mesmo cliente, quando o valor global das prestações em mora de capital e juros relativos a esse mesmo cliente represente pelo menos 25% do total do capital em dívida acrescido dos juros vencidos.”
– Aqui chegados, cumpre realçar que a parte vincenda dos créditos deve ser reclassificada como crédito vencido apenas e só para efeitos de provisionamento.
– Refere o número 5.º do aludido Aviso que o provisionamento dos créditos de cobrança duvidosa abrangidos pelo número 4.º deverá ser feita da seguinte forma:
1) Às prestações vincendas, a que se refere a alínea a) do n.º 1 do n.º 4.º, aplicam-se as tabelas previstas para o crédito vencido (n.º 3.º do Aviso)
ii) Aos créditos vincendos, a que se refere a alínea b) do mesmo n.º 1, aplicam-se metade das taxas de provisionamento aplicáveis aos créditos vencidos.
– Constitui fundamento para a correcção em apreço, o facto de os créditos vincendos sobre um mesmo cliente que se encontram enquadrados na Classe de Risco 1, isto é que entraram em incumprimento há menos de 3 meses, e que para cálculo da provisão o Requerente aplicou aos créditos vencidos a taxa correspondente a essa classe de risco.
– Ora, por se tratarem de créditos vencidos sobre o mesmo cliente deveria o Requerente ter aplicado metade das taxas de provisionamento de acordo com o ponto 2 do número 5.º do Aviso 3/95.
– Entende o Requerente, que o Aviso 3/95 apenas impõem um limite mínimo de provisionamento e não um limite máximo, sendo que nos casos em que as instituições financeiras aplicam uma percentagem superior, a respectiva provisão continua a coberto da disciplina imposta pelo citado aviso e, consequentemente, a tratar-se de uma provisão fiscalmente relevante, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC.
– Todavia, o argumento evidenciado pelo Requerente falece liminarmente.
– Desde logo, e como o Requerente bem sabe, a disposição legal contida no número 5.º do Aviso 3/95 a que faz alusão, não se encontrava em vigor no exercício em causa, ou seja no exercício de 2003, sendo apenas aplicável nos exercícios anteriores.
– Com efeito, e conforme ficou bem vincado em sede de resposta ao exercício do direito de audição, o número 5.º do citado Aviso 3/95 do Banco de Portugal, foi alterado pelo Aviso 8/03 de 08 de Fevereiro.
– Ora, o número 4.º do citado Aviso 8/03 de 08 de Fevereiro prescrevia que “Este aviso entra em vigor no último dia do mês em que for publicado, com excepção da alteração agora introduzida no nº 1 do nº 4.º do aviso nº 3/95, a qual entra em vigor seis meses após aquela data.”
– Daí que, é inequívoco que no caso sub judice, e aquando da constituição da provisão já não se encontrava em vigor a redação dada pelo número 5.º do Aviso 3/95 do Banco de Portugal, mas sim a nova redação dada pelo ponto 2 do número 5.º do Aviso 8/03 de 08 de Fevereiro.
– Ora, prescreve o ponto 2 do número 5.º do Aviso 8/03 de 08 de Fevereiro que “Os créditos vincendos, a que se refere a alínea b) do mesmo nº 1, ficam sujeitos à aplicação de metade das taxas de provisionamento aplicáveis aos créditos vencidos, servindo, como início do prazo de contagem, a data de verificação da condição estabelecida nessa alínea”.
– Ou seja, a nova redacção dada pelo ponto 2 do n.º 5.º do Aviso 8/03 de 08 de Fevereiro, definiu uma nova taxa de provisionamento a aplicar.
– Assim, o ponto 2 do número 5.º refere peremptoriamente que os créditos vincendos, a que se refere a alínea b) do ponto 1 do número 4.º, ficam sujeitos à aplicação de metade das taxas de provisionamento aplicáveis aos créditos vencidos.
– Logo, decaem liminarmente os argumentos aduzidos pelo Requerente.
– Por último e em abono da verdade, e como refere o relatório de inspeção tributária, tal interpretação foi a seguida pelo Requerente, na medida em que relativamente aos créditos vincendos sobre um mesmo cliente, quando o crédito e juros vencidos de todas as operações se encontram enquadrados em qualquer uma das classes de risco, à exceção da Classe 1, aplicou sempre metade das taxas de provisionamento.
4.3.3. Decisão da questão da provisão para créditos de cobrança duvidosa
A posição correcta sobre esta questão é a adoptada pela Administração Tributária.
Na verdade, na redacção do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal invocada pelo Requerente que, era a redacção inicial, estabelecia-se, n.º 5.º ponto n.º 1 que «os créditos de cobrança duvidosa a que se refere o nº 4.º devem ser provisionados a uma percentagem não inferior a 50% da percentagem média de cobertura por provisões para crédito vencido relativa ao cliente em questão».
Com a redacção introduzida pelo Aviso do Banco de Portugal n.º 8/2003, publicado no DR, I Série-B, nº 33, de 8-2-2003, aquele n.º 5.º passou a estabelecer, no que aqui interessa, que «os créditos abrangidos pelo disposto no n.º 4.º ficam sujeitos ao seguinte regime de provisionamento: (...) «2 – Os créditos vincendos, a que se refere a alínea b) do mesmo n.º 1, ficam sujeitos à aplicação de metade das taxas de provisionamento aplicáveis aos créditos vencidos, servindo, como início do prazo de contagem, a data de verificação da condição estabelecida nessa alínea».
De harmonia com o disposto no n.º 4 deste Aviso do Banco de Portugal n.º 8/2003, este aviso entrou em vigor no último dia do mês em que foi publicado, com excepção da alteração introduzida no n.º 1 do n.º 4.º do Aviso n.º 3/95, a qual entrou em vigor seis meses após aquela data.
Assim, as alterações introduzidas por este Aviso n.º 8/2003 no Aviso n.º 3/95 entraram em vigor em 28-2-2003, antes da constituição das provisões em causa, pelo que lhes é aplicável o novo regime.
Por isso não tem razão o Requerente, quanto a esta questão, pelo que improcede, na parte respectiva, o pedido de declaração de ilegalidade do acto impugnado.
4.4. Questão da correcção relativa a benefícios fiscais – Criação de Emprego para Jovens
A inspecção tributária desconsiderou para efeitos de determinação do lucro tributável a quantia de € 135.090,53 deduzida pelo Requerente a título de benefício fiscal obtido com a criação líquida de emprego para jovens, benefício esse criado pela Lei n.º 72/98, de 3/11, que aditou o artigo 48.º-A ao Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de que 1 de Julho, benefício esse que consta do artigo 17.º do EBF após a revisão daquele diploma operada pelo Decreto-Lei n.º 198/01, de 3 de Julho, e, actualmente, do seu artigo 19.º após a sua republicação pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de Junho.
Refere a Administração Tributária, fundamentando esta correcção, o seguinte:
– Quanto à correcção prevista no ponto 1.1.1.6. do relatório da inspecção, relativa a Benefícios fiscais – Criação de Emprego para jovens, baseou-se no facto de os serviços da Administração Tributária, aquando da validação “(...) do cálculo do beneficio fiscal sancionado no art. 17.º do EBF (...)“ efectuado pelo sujeito passivo, terem constatado que “os valores das remunerações ilíquidas da maioria dos colaboradores que transitaram do … aquando da fusão, ocorrida em 2002/12/20, era superior ao valor constante do anexo J e no entendimento desses serviços que o conceito de remuneração, previsto no artigo 2.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), apenas inclui todas as importâncias abonadas aos empregados e como tal consideradas para efeitos de IRS, o Requerente, no cálculo do beneficio fiscal, apenas deveria ter considerado as remunerações declaradas no respectivo anexo J da declaração anual, pelo que, ao assim não proceder, incorreu na violação do artigo 17.º do EBF.
4.4.1. Posição do Requerente
– Ao contrário do que entendem os serviços da Administração Tributária, para efeitos de cálculo do beneficio previsto no artigo 17.º do EBF, não são de considerar somente as remunerações ilíquidas constantes do Anexo J correspondentes à remuneração tal como surge definida no artigo 2.º do CIRS, mas sim uma realidade mais abrangente, como são os “encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho”.
– Por encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho deve entender-se tudo aquilo que constitui remuneração nos termos do artigo 2.º do Código do IRS e, bem assim, o IRS suportado pelo trabalhador mas pago pela entidade patronal e ainda os encargos sociais obrigatórios.
– Trata-se este, aliás, de conceito que mereceu expressa consagração por parte da Administração Tributária no despacho ministerial datado de 5-3-1999.
– Sucede que, no caso em apreço, o Requerente, conhecedor dos precisos termos daquele conceito e em cumprimento do mesmo, relevou para efeitos de apuramento do montante daquele beneficio fiscal, quer as remunerações suportadas, tal como surgem definidas no artigo 2.º do Código do IRS, quer os restantes encargos com a criação dos referidos postos de trabalho compreendidos, designadamente, no próprio conceito previsto no citado despacho ministerial.
– É evidente que os montantes a considerar como base de apuramento daquele benefício não têm, necessariamente, aliás como sucede no caso vertente, que ser coincidentes com os constantes do Anexo J, uma vez que naquele Anexo não são reflectidas todas as componentes das retribuições atribuídas aos trabalhadores.
– Com efeito, do campo 05 daquele Anexo J, devem apenas constar a totalidade das remunerações pagas e sujeitas a imposto ou isentas mas sujeitas a englobamento.
– Assim, encontram-se excluídas daquele anexo, designadamente, as importâncias pagas a título de subsídio de a1imentação, na parte isenta.
– Sucede que, as importâncias pagas, designadamente, a este título, no obstante no terem cabimento no Anexo J, integram o montante representativo das remunerações a computar no valor total dos encargos que devem ser evidenciados para efeitos de apuramento do beneficio previsto no artigo 17.º do EBF.
– Ora, será exactamente a importâncias dessa natureza que respeitarão as diferenças entre os montantes das retribuições constantes do Anexo J e aquelas que foram relevadas pelo oro Requerente no apuramento do quantitativo total das remunerações a considerar para apuramento do beneficio previsto no artigo 17.º do EBF.
– A relevação, para efeitos daquele benefício previsto no artigo 17.º do EBF, de todos os montantes suportados, quer a título de retribuição, como sejam os casos, designadamente dos salários, subsídios de refeição, subsídio de caixa, quer a título de outros encargos, como seja o caso, das contribuições mensais para a Segurança Social, foi efectuada no estrito cumprimento da legislação e instruções de natureza fiscal, nomeadamente, do artigo 17.º do EBF, do artigo 2.º do Código do IRS e do Despacho Ministerial datado de 05.03.1999.
– Assim, afigura-se ao Requerente evidente que inexiste qualquer erro no apuramento do montante do benefício fiscal respeitante à criação líquida de postos de trabalho para jovens.
– E, a haver erro, o mesmo sempre seria insusceptível, tal como o fazem esses serviços, de ser demonstrado através da invocação de discrepâncias com os montantes inscritos no Anexo J.
– Efectivamente, se este Anexo J, pela informação e montantes que se exige ao próprio contribuinte que nele inscreva, é susceptível de suportar e de fornecer vários elementos à Administração Tributária, não só no que respeita, em concreto, à eventual aferição da regularidade do imposto devido, mas também à situação específica dos contribuintes, já é, pelo que acima se expôs, insusceptível de ser utilizado para efectuar “testes de congruência” com os valores constantes no campo 234 da declaração de rendimentos modelo 22.
– Assim, a invocação, tal como o fazem esses serviços, de que os montantes das remunerações inscritos no Anexo J não coincidem com os que são relevados para efeitos do apuramento do benefício respeitante à criação líquida de emprego para jovens, não demonstra absolutamente nada.
– Por consequência, não constitui elemento bastante para sequer questionar, quanto mais ilidir, a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes prevista, designadamente, nos artigos 74.º e 75.º da Lei Geral Tributária, não tendo invertido por esse motivo, no caso concreto, o ónus da prova que continua a recair sobre a Administração Tributária.
– Pelo que, tendo o Requerente apurado correctamente, com referência ao exercício de 2003, o montante do beneficio fiscal previsto no artigo 17.º do EBF e não tendo os serviços da Administração Tributária demonstrado de forma sustentada a existência de qualquer incorrecção, deverá a correcção no montante de € 135.090,53 ser anulada e, consequentemente, anulada a liquidação adicional de imposto quanto a esta parte.
4.4.2. Posição da Autoridade Tributária e Aduaneira
– Entende o Requerente que a Administração Tributária incorreu em erro de aplicação do direito aos factos, invocando o disposto no então artigo 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais em articulação com o disposto no artigo 2.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), bem como o entendimento sancionado pelo SEAF por despacho de 05/03/1 999.
– Em causa está o regime jurídico do benefício fiscal em apreço na parte respeitante aos encargos elegíveis para efeitos da competente majoração.
– A correcção controvertida resulta de a inspecção tributária ter verificado que “o valor das remuneraçõ3es ilíquidas da maioria dos colaboradores que transitaram do … aquando da fusão, ocorrida em 2002/12/20” considerado pelo Requerente no cálculo do benefício fiscal obtido com a criação líquida de emprego “era superior ao valor constante do anexo J” da declaração anual de informação contabilística e fiscal.
– Mais, o anexo 5 daquele relatório evidencia, precisamente, que as correcções introduzidas apenas respeitam aos encargos suportados com remunerações, mantendo ilesos os demais encargos considerados pelo Requerente.
– O Requerente discorda da correcção efectuada, por considerar que conceito de remuneração previsto no artigo 2.º do CIRS não se confunde com o conceito de encargos com a criação líquida de postos de trabalho a que alude o artigo 17.º do EBF.
– Em abono da sua tese invoca a doutrina administrativa plasmada no despacho de SEAF de 05/03/1999, mais sustentando que a AT ao fundamentar a sua correcção na mera incongruência entre os valores declarado no anexo J da declaração anual de informação contabilística e fiscal e a importância considerada no cálculo daquele benefício não demonstrou de forma sustentada qualquer erro no cálculo do benefício fiscal em apreço, pelo que deverá ser anulada a liquidação adicional na parte correspondente a esta correcção.
(...)
– Prevê aquele benefício fiscal a majoração em 50% dos encargos suportados pela entidade empregadora com trabalhadores admitidos por contrato sem termo, com idade não superior a 30 anos, cujos postos de trabalho corresponderam a criação líquida de emprego no respectivo ano de admissão, sendo aplicável durante o período de 5 anos a contar do início da vigência do respectivo contrato de trabalho.
– O benefício fiscal em apreço pretende incentivar a criação de emprego para jovens concedendo às entidades empregadoras um benefício que se traduz na possibilidade de majorar os encargos suportados com trabalhadores elegíveis que sejam fiscalmente dedutíveis ao lucro tributável, à luz do disposto no artigo 23.º do CIRC.
– Assim sendo, os encargos gerados com aqueles postos de trabalho elegíveis, susceptíveis de majoração ao abrigo do então artigo 17.º do EBF, são os encargos que a empresa suporta com os trabalhadores e que sejam dedutíveis ao abrigo do artigo 23.º do CIRC, quer tenham a natureza de remuneração nos termos do disposto no artigo 2.º do CIRS, quer se trate de encargos sociais que a empresa está legalmente obrigada a suportar.
– No conceito de remuneração para efeitos de IRS incluem-se todas as importâncias abonadas ao trabalhador em virtude da relação de trabalho dependente, nos termos e com os limites consignados no n.º 2 e nas várias alíneas do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS.
– Por sua vez, de acordo com o artigo 119.º do CIRS (anterior artigo 114.º antes da revisão do articulado efectuada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 03/07), as entidades que paguem ou coloquem à disposição rendimentos da categoria A de IRS, sujeitos a imposto ou isentos mas sujeitos a englobamento, estavam obrigadas à entrega, para efeitos estatísticos e de controlo, do então anexo J da declaração anual de informação contabilística e fiscal.
– Nestes termos, é bem de ver que não tem razão o Requerente ao considerar que a correcção proposta pela inspecção tributária ignorou encargos elegíveis para efeitos do pretendido benefício fiscal uma vez que, conforme supra exposto, a majoração prevista no artigo 17.º do EBF aplica-se aos encargos com postos de trabalho elegíveis que sejam dedutíveis ao abrigo do artigo 23.º do CIRC, aqui se compreendendo as remunerações compreendidas no n.º 2 e n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, bem como os encargos obrigatórios com segurança social.
– Desde logo, resulta do teor do respectivo relatório que a mesma compreendeu a análise ao dossier fiscal e às listagens discriminativas por empregado e demais elementos solicitados no decurso da acção inspectiva, e que os valores desconsiderados incidiram apenas sobre os montantes de remunerações ilíquidas, em virtude de estas apresentarem no anexo J da declaração anual valores inferiores aos que foram reflectidos no cálculo do benefício fiscal.
– Isso mesmo é evidenciado pelo respectivo anexo 5, conforme supra se referiu.
– Assim sendo, não foram corrigidos outros encargos considerados pelo Requerente mas apenas os suportados com as remunerações pagas aos trabalhadores elegíveis, as quais, para efeitos do disposto no artigo 23.º do CIRC, compreendem todas as remunerações sujeitas a IRS e, como tal, declaradas no referido anexo J.
– Quanto ao despacho do SEAF, de 5-3-1999, a que alude o Requerente, o mesmo esclareceu, quanto à interpretação e aplicação do artigo 17.º do EBF, que “a criação líquida de postos de trabalho será aferida em relação a cada exercício, desde o primeiro até ao último dia de cada período de tributação para os exercícios seguintes”, devendo “corresponder à diferença positiva entre o número de contratações efectuadas no exercício e o número de saídas de trabalhadores no mesmo exercício”, concluindo que “a aferição da criação líquida de postos de trabalho se fará no final de cada exercício.
– Este entendimento superiormente sancionado versa, assim, sobre questão distinta da que vem suscitada nos autos, uma vez que respeita à elegibilidade de um posto de trabalho para a criação líquida de emprego e não à elegibilidade dos encargos suportados para efeitos do cálculo do benefício fiscal.
– Concluindo, inexiste qualquer falta de fundamentação da correcção efectuada, sendo que as considerações tecidas pelo Requerente e a total omissão de esclarecimentos adicionais sobre os encargos que elegeu no cálculo de benefício fiscal em discussão não permitem concluir em sentido diverso daquele que foi acolhido na liquidação controvertida.
4.4.3. Decisão da questão da correcção relativa a benefícios fiscais – Criação de Emprego para jovens
Esta questão reconduz-se a saber se é correcta actuação da Administração Tributária ao efectuar uma correcção dos encargos indicados pelo Requerente com a criação de novos postos de trabalho, por esses encargos serem superiores aos indicados pelo Requerente no anexo J, apresentado nos termos do art. 119.º do CIRS.
O art. 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais na redacção resultante da renumeração efectuada pelo DL n.º 198/2001, de 3 de Julho (anterior artigo 48.º-A) e da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, vigente em 2003, estabelecia o seguinte:
Artigo 17.º
Criação de empregos para jovens
1 – Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado.
3 – A majoração referida no n.º 1 tem lugar durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho.
No n.º 1 deste artigo faz-se referência aos «encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho» e no n.º 2 apenas se estabelece um limite máximo para os encargos mensais por posto de trabalho, que é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado.
Para além deste limite que consta do n.º 2, não há qualquer suporte no texto deste artigo para qualquer restrição aos encargos relevantes para efeitos do benefício fiscal, designadamente a limitação que defendeu a Administração Tributária, de apenas serem relevantes os encargos que relevam para efeitos de IRS, à face do art. 2.º do CIRS e as contribuições para a segurança social.
Essa restrição veio a ser efectuada, de facto, com a redacção dada a este art. 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que, na alínea c) do novo n.º 2, estabeleceu que se consideram «encargos os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade».
Mas, como resulta do teor expresso da línea e) do artigo 88º da Lei nº 53-A/2006, «a nova redacção do artigo 17.º aplica-se relativamente a períodos de tributação que se iniciem após a entrada em vigor».
Por isso, não há qualquer suporte legal para aplicar este novo conceito restrito de encargos ao período de tributação de 2003.
A correcção da matéria tributável do Requerente efectuada pela Administração Tributária, quanto a este ponto, assentou apenas na divergência entre os encargos indicados pelo Requerente na sua declaração mod. 22 e os rendimentos indicados no anexo J.
O anexo J, autonomizado pela Portaria n.º 51/2004, de 16 de Janeiro, aplicável às declaração apresentadas após 1-1-2004, destinava-se a indicar os rendimentos e as retenções na fonte, nos termos do art. 119.º do CIRS ( 7 ), em que apenas se previa, quanto a rendimentos enquadráveis na categoria A de IRS, a comunicação de rendimentos sobre que tivesse havido retenção na fonte, para além dos especificados nos n.ºs 4), 5), 7), 8) e 9) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º».
Como bem refere o Requerente, a criação de postos de trabalho gerava outros encargos, designadamente subsídios de almoço, que não tinham de ser comunicados nos termos do referido art. 119.º do CIRS, através do referido anexo J.
Por outro lado, do art. 23.º do CIRC não se pode concluir que não haja outros encargos com a criação de postos de trabalho que não relevem como tal para efeito de fixação da matéria colectável, pois a alínea d) do n.º 1 deste artigo, para além de ter natureza meramente exemplificativa, refere como susceptíveis de relevância os «encargos de natureza administrativa, tais como remunerações, ajudas de custo, pensões ou complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social», o que não exclui, antes pelo contrário, os subsídios de almoço, que se reconduzem a um tipo especial de ajudas de custo e até podem ser substituídos por estas.
De qualquer forma, é evidente a natureza exemplificativa da lista de tipos de encargos que consta daquela alínea d) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC (como se depreende da expressão «... tais como ...») e os subsídios de almoço enquadram-se no conceito de «encargos de natureza administrativa» e são análogos, pelo menos, às ajudas de custo, aí explicitamente indicadas.
Por isso, não havendo suporte legal para excluir do benefício fiscal referido estes outros encargos, não sujeitos a comunicação através do referido anexo J, não podia a Administração Tributária concluir que o benefício fiscal apenas abrangia os encargos indicados neste anexo J.
Tanto basta para concluir pela ilegalidade da actuação da Administração Tributária, quanto a este ponto.
4.5. Questão da desconsideração de pagamentos por conta
4.5.1. Posição do Requerente
– No que concerne à desconsideração de pagamentos por conta, o Requerente na declaração de rendimentos modelo 22 referente ao exercício de 2003 declarou ter efectuado para aquele exercício pagamentos por conta no valor total de € 301.798,00.
– Sucede que, de acordo com a nota demonstrativa da liquidação sub judice, apenas foi relevado pela Administração Tributária para o exercício de 2003 um pagamento por conta, no valor de € 20,500,00.
– O Requerente efectuou, com referência ao exercício de 2003, três pagamentos por conta, em 15-7-2003, 31-10-2003 e 27-1-2004, nos montantes de € 20.500,00, € 20.500,00 e € 159.000,00, respectivamente.
– Para além da desconsideração parcial daqueles pagamentos, foram também desconsiderados os dois pagamentos por conta, efectuados pela sociedade …, em 31-7-2003 e 30-9-2003, no montante de € 50.899,00 cada um. ( 8 )
– E nem sequer se diga que a não relevação destes últimos pagamentos por conta se deve à circunstância de não terem sido efectuados pelo Requerente.
– Com efeito, a sociedade … mediante operação de fusão ocorrida em Dezembro de 2003, foi incorporada no …, oro Requerente, o qual incorporou no seu património a totalidade dos elementos do seu activo e passivo da sociedade.
– No tocante à referida operação, todas as operações realizadas no exercício de 2003 pela sociedade incorporada (…) passam a ser consideradas, do ponto de vista contabilístico, como efectuadas por conta da sociedade incorporante a partir de 1 de Janeiro daquele ano, considerando-se como cessada nesta data, por conseguinte, para efeitos contabilísticos, toda a actividade desenvolvida pela … no ano de 2003.
– Por força dos efeitos retroactivos da fusão, as operações de apuramento do lucro do exercício e da colecta do imposto sobre ele incidente são efectuadas como se de única entidade fiscal se tratasse, relevando para o efeito o conjunto dos resultados contabilísticos apurados pelas duas entidades no decurso desse período,
– Reconhecendo-se, igualmente, em contrapartida, idêntico procedimento para as operações subsequentes à determinação da colecta, como o seja, designadamente, a dedução àquela da parcela do imposto antecipadamente pago no decurso do exercício, por conta desses mesmos resultados.
– Tudo se processando, assim, como se desde o início do período de tributação, existisse um único sujeito passivo fiscalmente relevante.
– De resto, é esse, que não outro, o sentido do artigo 68.º do Código do IRC, designadamente quando se estabelece no n.º 8 que “os resultados realizados pelas sociedades a fundir ou a cindir durante o período decorrido entre a daí a fixada no projecto e a data da produção de efeitos jurídicos da operação são transferidos para efeitos de serem incluídos no lucro tributável da sociedade beneficiária respeitante ao mesmo período de tributação em que seriam considerados por aquelas sociedades “.
– Encontrando-se, aliás, esta questão já resolvida por Despacho do Subdirector-Geral do IRC, de 19-3-2004, proferido no processo n.º 3529/2003, no qual se reconheceu, com referência aos pagamentos especiais por conta, que, “verificados os requisitos exigidos pelo n.º 7 do artigo 68.º do Código do IRC’, a fusão reporta os seus efeitos fiscais à data constante do projecto de fusão, sucedendo a sociedade incorporante nos direitos e obrigações das sociedades incorporadas,” bem como que, “tendo estas sociedades efectuado os Pagamentos Especiais por Conta, (PEC) em data posterior àquela a que a fusão se reporta, a dedução dos mesmos é efectuada à colecta apurada pela sociedade incorporante, relativa ao respectivo exercício que, por sua vez, nos termos do n.º 8 do mesmo preceito, engloba os resultados realizados pelas sociedades incorporadas durante o período decorrido entre a data fixada no projecto e a data de produção de efeitos jurídicos da operação”.
– Pelo que, se assim é quanto aos Pagamentos Especiais por Conta, por maioria de razão será quanto aos Pagamentos por Conta.
– Assim sendo, também os pagamentos realizados pela sociedade … não podem deixar de ser relevados para efeitos de apuramento de imposto a pagar a final para o exercício de 2003 pelo Requerente.
– Ora, demonstrada a efectiva realização dos pagamentos por conta pelo Requerente (quer enquanto …, quer como sociedade …), a presente liquidação ao não levar em consideração os referidos pagamentos, incorre em violação de lei, bem como dá causa a duplicação de colecta na medida em que vem exigir da mesma entidade o pagamento de imposto que esta já havia satisfeito respeitante ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo, razão pela qual deve a mesma ser também por esta razão anulada.
4.5.2. Posição da Autoridade Tributária e Aduaneira
A Autoridade Tributária e Aduaneira não contesta a relevância dos pagamentos referidos pelo Requerente, juntando mesmo documentos com que pretende demonstrar que já os levou em consideração, reembolsando o Requerente em 30-9-2011, quanto à quantia de € 101.798,00, relativa a pagamentos efectuados pela …, e considerando os dois pagamentos especiais por conta efectuados pela próprio Requerente, no valor total de € 179.500,00 (os outros € 20.500,00 pagos pelo Requerente a título de pagamento por conta, foram considerados na liquidação) nas liquidações de 2004 e 2007.
4.5.3. Decisão da questão dos pagamentos
As partes estão de acordo quanto ao facto de os pagamentos referidos terem sido efectuados.
Esses pagamentos, tanto os pagamentos por conta, como os pagamentos especiais por conta, deveriam ter sido considerados ao elaborar a liquidação [arts. 83.º, n.º 2, alínea e), e 97.º, n.º 5, do CIRC, na redacção vigente em 2004], pelo que, não o tendo sido, esta enferma de ilegalidade.
Por isso, procede a pretensão do Requerente, nesta parte, sem prejuízo de, no caso de algum ou alguns ou todos esses pagamentos já terem sido reembolsados ou considerados posteriormente em outras liquidações, isso deva ser considerado, no âmbito da execução do presente acórdão.
Termos em acordam em
– julgar improcedentes as questões prévias da intempestividade do pedido de pronúncia arbitral e da inutilidade superveniente da lide relativamente aos pagamentos por conta efectuados pela sociedade …, e da inutilidade superveniente da lide relativamente aos pagamentos no montante de € 179.500,00, efectuados pelo Requerente, relativamente ao ano de 2003 (pontos 3.1, 3.2, e 3.3. deste acórdão);
– julgar procedente o pedido quanto à questão das despesas relativas a «cursos e seminários» no montante de € 107.064,67 (referida nos pontos 4.1., 4.1.1., 4.1.2., 4.1.3. deste acórdão) e declarar da ilegalidade do acto de liquidação na parte correspondente a essas despesas;
– julgar procedente o pedido quanto à questão da despesas com crédito vencido, no montante de € 111.022,14 (referida nos pontos 4.2, 4.2.1., 4.2.2., 4.2.3.1., e 4.2.3.2. deste acórdão) e declarar da ilegalidade do acto de liquidação na parte correspondente a essas despesas;
– julgar improcedente o pedido quanto à questão da ilegalidade da provisão para créditos de cobrança duvidosa no valor de € 52.819,30 (pontos 4.3., 4.3.1., 4.3.2., 4.3.3. deste acórdão), absolvendo a Autoridade Tributária e Aduaneira do mesmo;
– julgar procedente o pedido quanto à questão da ilegalidade da correcção relativa a benefícios fiscais – Criação de Emprego para Jovens, no montante de € 135.090,53 (pontos 4.4., 4.4.1., 4.4.2., e 4.4.3. deste acórdão) e declarar a ilegalidade do acto de liquidação na parte correspondente à correcção da matéria tributável efectuada quanto a essas despesas;
– julgar procedente o pedido quanto à questão da desconsideração dos pagamento por conta no montante de € 101.798,00 efectuados pela … e dos pagamentos especiais por conta efectuados pelo Requerente, no montante de € 179.500,00, referida nos pontos 4.5., 4.5.1., 4.5.2. e 4.5.3. deste acórdão, e declarar a ilegalidade do acto de liquidação na parte correspondente à não consideração de tais pagamentos.
Valor do processo: De harmonia com o disposto no art. 315.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 402.039,75.
Custas: Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 6.732,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, na proporção de 92,32% a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira e 7,68% a cargo do Requerente.
Lisboa, 15-6-2012
Os Árbitros
Jorge Lopes de Sousa (árbitro presidente e relator)
Prof. Doutor Fernando Borges de Araújo (árbitro)
Dr. João Marques Pinto (árbitro)