Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 740/2014-T
Data da decisão: 2015-03-30  Selo  
Valor do pedido: € 15.518,40
Tema: IS – Verba 28 .1 da TGIS; Imóvel em propriedade total
Versão em PDF

 

Proc. 740/2014-T

Decisão arbitral

 

Requerentes: A... – ..., S.A. 

Requerida: AT - Autoridade Tributária e Aduaneira

 

I – RELATÓRIO

 

1.      PEDIDO

A... – ..., S.A., contribuinte n.º ..., com sede em Lisboa, na Rua …, apresentou, em 27-10-2014, ao abrigo do disposto no art.º 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), um pedido de pronúncia arbitral, em que é Requerida a AT - Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista a:

-        Anulação da liquidação de Imposto do Selo (IS), referente ao ano de 2013, efectuada com base na Verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de ... com o número ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da Freguesia de ..., ...;

-        O reconhecimento do direito da Requerente ao reembolso do montante pago respeitante às liquidações impugnadas, acrescido de juros indemnizatórios.

A Requerente alega, no essencial, o seguinte:

-        O Código do Imposto Municipal (CIMI) sobre Imóveis consagra o princípio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano, verificando-se que cada parte autónoma tem um valor patrimonial tributário (VPT) próprio, o qual é considerado para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI);

-        Além de um VPT próprio, cada parte susceptível de utilização independente é avaliada separadamente e é objecto de IMI através de uma liquidação autónoma;

-        Para efeitos de IMI, portanto, as partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente são tratadas como fracções autónomas de prédio em propriedade horizontal;

-        Consequentemente, também em Imposto do Selo as partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente deverão ser tratadas como fracções autónomas, o que implicará que, não atingindo o valor da parte do prédio, considerado separadamente, o valor de 1 000 000 de euros previsto na Verba 28.1 da TGIS, não pode haver lugar a incidência do Imposto aí previsto;

-        Procedendo de modo diverso, a Administração Tributária liquidou Imposto do Selo sobre as diversas partes susceptíveis de utilização independente mas utilizando, para determinar a incidência, o valor total do prédio, violando os princípios da justiça, proporcionalidade e igualdade fiscal consagrados nos artigos 103.º e 104.º, n.º 3 da Constituição Da República Portuguesa;

-        As liquidações em causa, ao tomarem como base o valor resultante do somatório dos valores patrimoniais tributários das partes susceptíveis de utilização independente, enfermam do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, devendo ser anuladas;

-        Sendo as liquidações ilegais, e tendo a Requerente procedido ao pagamento do imposto liquidado, deve aquela ser reembolsada das quantias indevidamente pagas, acrescidas de juros indemnizatórios.

 

 

2.      RESPOSTA

Na sua resposta ao pedido de pronúncia apresentado pelos Requerentes, a Requerida AT - Autoridade Tributária e Aduaneira pugna pela improcedência do pedido, alegando, em síntese, o seguinte:

-        A situação do prédio dos Requerentes subsume-se literalmente na previsão da verba 28.1 da TGIS;

-        Da noção de prédio do artigo 2º, n.º 4 do CIMI resulta que só as fracções de prédio em regime de propriedade horizontal são havidas como prédios;

-        A Requerente, para efeitos de IMI e de IS, não é proprietária de 12 fracções autónomas, mas de um único prédio;

-        A inscrição matricial de cada parte susceptível de utilização independente não é autónoma, por matriz, mas consta de uma descrição na matriz do prédio na sua totalidade;

-         A propriedade horizontal é um regime jurídico específico de propriedade previsto no artigo 1414.º do Código Civil, diferente da propriedade plena vertical;

-        Ao intérprete do direito não é lícito equiparar estes regimes, em consonância com a regra segundo a qual os conceitos jurídicos têm no direito tributário o sentido que lhes cabe nos ramos do direito de que são oriundos (de acordo com o art.º 11º, n.º 2 da Lei Geral Tributária);

-        O artigo 10.º do Código Civil, sobre a aplicação da analogia, determina que esta só será aplicável em caso de lacunas da lei. No caso vertente, a lei fiscal não contém qualquer lacuna.

-        Consistindo o facto tributário previsto na verba 28.1 da TGIS a propriedade de prédio urbano cujo VPT constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a 1 000 000 de euros, o valor patrimonial relevante para efeitos de incidência do imposto é o valor patrimonial total do prédio urbano, e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o compõem, ainda quando susceptíveis de utilização independente;

-        Os actos tributários impugnados não violaram qualquer preceito legal ou constitucional, devendo ser mantidos na ordem jurídica.

 

 

II – SANEAMENTO

Este Tribunal Arbitral singular foi constituído em 05.01.2015, tendo sido o Árbitro designado pelo Conselho Deontológico do CAAD, cumpridas as respectivas formalidades legais e regulamentares (artigos 11º, n-º 1, als. a) e b) do RJAT e 6º e 7º do Código Deontológico do CAAD), e é competente em razão da matéria, em conformidade com o artigo 2.º do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas.

Foi dispensada, com a concordância das partes, a realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, por ser considerada desnecessária.

As partes prescindiram de apresentar alegações escritas.

Não existem excepções nem questões prévias de que cumpra conhecer, pelo que nada obsta ao conhecimento do mérito da causa.

 

 

III – QUESTÕES A DECIDIR

São as seguintes as questões a decidir pelo Tribunal:

-        A aplicabilidade da verba 28.1 da TGIS aos prédios urbanos em propriedade plena vertical formados por partes susceptíveis de utilização independente considerados como um todo, com a consequência de que o valor patrimonial tributário a ter em conta para efeitos de incidência do imposto será, em caso de resposta afirmativa, o valor patrimonial tributário do prédio;

-        A constitucionalidade da norma de incidência contida na verba 28.1 da TGIS, se interpretada no sentido de abranger os prédios urbanos em propriedade total compostos por partes susceptíveis de utilização independente e avaliadas separadamente, em face do princípio constitucional da igualdade;

 

IV – FUNDAMENTAÇÃO

A - FACTOS PROVADOS CONSIDERADOS RELEVANTES

Com base nos documentos juntos pela Requerente e que fazem parte do processo administrativo, consideram-se provados os seguintes factos considerados relevantes para a decisão:

-        A Requerente figurava, à data do facto tributário, como proprietária de um prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de ..., concelho de ..., sob o artigo n.º ... e aí descrito como prédio em propriedade plena vertical (total), sendo composto por  fracções susceptíveis de utilização independente;

-        Oito divisões susceptíveis de utilização independente encontram-se descritas como destinadas a habitação;

-        O prédio tem um valor patrimonial tributário de 1 551 840,00 euros;

-        A Requerente recebeu notas de cobrança de Imposto do Selo, referentes à Verba 28.1 da Tabela Geral deste imposto, correspondentes às oito partes susceptíveis de utilização independente, e relativas ao ano 2013;

-         As notas de cobrança identificam-se pelos seguintes números:

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como 1º Direito;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como 1º Esquerdo;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como 2.º D;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como 2º E;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como 3.º D;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como 3.º E;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como RC D;

-        2014 ..., relativa à fracção identificada como RC E.

-        O somatório dos valores constantes das referidas notas de cobrança é de 15.518,40 euros, sendo o prazo de pagamento “Julho de 2014”;

-        A Requerente procedeu ao pagamento da totalidade do imposto liquidado;

 

Os factos provados foram-no com base nos documentos constantes do processo.

Não existem factos considerados não provados com relevância para a decisão.

 

B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

1        Questão da aplicabilidade da verba 28.1 da TGIS aos prédios urbanos em propriedade total, considerados como um todo, quando formados por partes consideradas separadamente na inscrição matricial

É o seguinte o teor da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo:

28. “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1.000.000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1     Por prédio com afectação habitacional – 1%”

A Requerente baseia parte da sua argumentação na tese de que, para efeitos de IMI, as partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente são tratadas como fracções autónomas de prédio em propriedade horizontal e que, consequentemente, também em Imposto do Selo as partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente deverão ser tratadas como fracções autónomas;

Cremos, com o devido respeito, que a tese da Requerente não é de aceitar, não sendo exacto afirmar que, para efeitos de IMI, as partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente são tratadas como fracções autónomas de prédio em propriedade horizontal;

Com efeito, o artigo 2º, n.º 4 do CIMI determina expressamente que, “para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio”. Portanto, não resta qualquer dúvida de que, para efeitos de CIMI e, consequentemente, para efeitos de IS, as fracções de prédios constituídos em propriedade horizontal são havidos como prédios.

Tal qualificação implica não só que as fracções autónomas de prédios em propriedade horizontal são avaliadas separadamente, como o imposto incide separadamente sobre cada fracção, tomando essa liquidação por base, unicamente, o valor da fracção autónoma.

Já no que diz respeito às partes susceptíveis de utilização independente integradas em prédios em regime de propriedade total, não existe no CIMI uma norma correspondente à do art.º 2º, n.º 4.

É certo que o Código do IMI determina (artigo 12º, n.º 3) que as partes de prédio susceptíveis de utilização permanente sejam consideradas separadamente na inscrição matricial, cabendo-lhes um valor patrimonial tributário próprio.

Mas diz por outro lado o artigo 7º, n.º 2, al. b) do mesmo Código que, no caso de prédio formado por partes economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes.

Portanto, enquanto as fracções de prédios em propriedade horizontal têm a consideração de prédios para efeitos de IMI, tal não acontece com as partes que compõem os prédios em propriedade total.

E não pode haver dúvida de que, não sendo as partes susceptíveis de utilização independente consideradas como prédios, e incidindo o IMI sobre o valor patrimonial dos prédios (art.º 1º do CIMI), o IMI não incide sobre as partes susceptíveis de utilização independente de prédios em propriedade total, mas sim sobre o prédio em que essas partes se integram.

É certo que a administração fiscal emite um documento de cobrança de IMI por cada parte que compõe o prédio em propriedade total, criando com isso a aparência de que o IMI incide sobre as partes susceptíveis de utilização independente. Cumpre observar que este procedimento não tem apoio directo na lei. Trata-se de uma prática da administração, reminiscente da Contribuição Predial, em que era a renda gerada por cada parte independente que determinava o valor tributável da mesma.[1] Mas não há dúvida de que, no caso de propriedade plena vertical, existe um único prédio e, consequentemente, ao mesmo deve corresponder um único acto de liquidação de IMI;

Ora, no âmbito do Imposto do Selo, o conceito de prédio é o definido no Código do IMI (por força do artigo 1.º, n.º 6 do Código do IS), pelo que as considerações expendidas anteriormente a propósito do tratamento fiscal das fracções autónomas de prédios em propriedade horizontal e das partes de prédios em propriedade total são plenamente válidas para efeitos de Imposto do Selo. Também neste imposto, o prédio urbano composto por partes consideradas separadamente na matriz predial e susceptíveis de utilização independente deve ser considerado um prédio, ao tempo que as partes que o compõem não podem receber tal qualificação;

Ora, incidindo a tributação da verba 28.1 sobre prédios, e não sobre partes de prédios, conclui-se que a mesma não pode incidir sobre as partes consideradas separadamente na matriz predial e susceptíveis de utilização independente.

E sendo assim, é o valor patrimonial tributário do prédio, e não das partes, o valor determinante para aferir a incidência do imposto;

No caso concreto, a administração fiscal considerou existir, também, um único prédio, e tomou como valor base para a liquidação o valor patrimonial tributário do prédio. Emitiu depois documentos de cobrança separados para as diferentes partes com afectação habitacional.

Há pois que concluir que a situação de propriedade de um prédio em regime de propriedade total composto por partes susceptíveis de utilização independente se subsume literalmente na previsão da verba 28.1 da TGIS.

Improcede, portanto, o pedido de anulação das liquidações em crise fundado em erro nos pressupostos de direito, concretizado na inaplicabilidade da verba 28.1 da TGIS aos prédios em propriedade total com partes consideradas separadamente na inscrição matricial.

 

2        Questão da constitucionalidade da norma de incidência contida na verba 28.1 da TGIS, quando interpretada no sentido de abranger os prédios urbanos em propriedade total considerados como um todo, quando formados por partes consideradas separadamente na inscrição matricial, em face do princípio constitucional da igualdade

A Requerente suscita a questão da violação dos princípios constitucionais da justiça, da proporcionalidade e da igualdade por parte da verba 28.1 da TGIS, quando interpretada no sentido de abranger os prédios urbanos em propriedade total compostos por partes consideradas separadamente na inscrição matricial.

Além disso, a inconstitucionalidade das normas aplicáveis ao caso concreto é matéria de conhecimento oficioso, pelo que também por essa razão sempre deveria o Tribunal Arbitral pronunciar-se sobre ela.

A questão da constitucionalidade da norma de incidência contida na verba 28.1 da TGIS foi objecto de pronúncia na decisão arbitral proferida no processo n.º 14/2014, em que fomos Árbitro e que, por não vermos razão para nos afastarmos agora da posição então adoptada, passamos a reproduzir.

O princípio da igualdade, consagrado no art.º 13º da CRP postula que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente (acórdão do TC n.º 437/2006).

No entanto, para aferir a igualdade ou diferença entre duas realidades diferentes, do ponto de vista tributário, é necessário um parâmetro – “o critério que há-de servir de base à comparação” – o qual é dado pela capacidade contributiva (acórdão do TC n.º 197/2013).

A capacidade contributiva constitui, pois – a par de outras vertentes ou funções do princípio (veja-se o acórdão do TC n.º 197/2013) – o critério através do qual há que comparar diferentes sujeitos passivos, para efeitos de determinar se os mesmos devem receber tratamento tributário idêntico ou diferente.

Desta maneira, o princípio da capacidade contributiva (numa das suas vertentes) concretiza o princípio da igualdade fiscal ou tributária (acórdão do TC n.º 84/2003), pressupondo o tratamento tributário igual em relação a pessoas com a mesma capacidade contributiva e um tratamento tributário desigual em relação a pessoas com diferente capacidade contributiva.

Em decorrência do princípio da capacidade contributiva, contribuintes com a mesma capacidade de gastar devem pagar os mesmos impostos e contribuintes com diferente capacidade de gastar devem pagar impostos diferentes (acórdão do TC n.º 197/2013).

É esta dimensão do princípio da capacidade contributiva, como proibindo o tratamento tributário diferente de pessoas com a mesma capacidade contributiva e o tratamento tributário igual de pessoas com capacidade contributiva diferente, que interessa particularmente ao caso vertente.

Está em causa, mais concretamente, a diferença de tratamento dada, pelo Código do IS na verba 28.1 da TGIS, aos prédios em propriedade horizontal e aos prédios em propriedade total, compostos por partes consideradas separadamente na inscrição matricial.

Vimos anteriormente que as fracções autónomas de prédios em propriedade horizontal são consideradas prédios para efeitos de IMI (art.º 2º, n.º 4 do CIMI), sendo-o também [para efeitos de Imposto do Selo], por força do artigo 1º, n.º 6 do Código do IS.

Sendo assim, o IS da verba 28.1, no caso de prédios em propriedade horizontal, só pode aplicar-se se o valor patrimonial tributário da fracção autónoma for igual ou superior a 1.000.000 de euros. Por outro lado, o valor resultante da soma dos valores patrimoniais tributários das diversas fracções habitacionais não pode ser tido em conta para efeitos de aplicação do imposto.

Mesmo que uma única pessoa seja proprietária de todas as fracções de um prédio em propriedade horizontal, e que a soma dos valores patrimoniais das fracções habitacionais do prédio seja igual ou superior a 1.000.000 de euros, tal proprietário não ficará sujeito a IS sobre esse património.

Ora, entre as duas situações descritas – prédio habitacional em propriedade horizontal e prédio habitacional em propriedade total composto por partes susceptíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial – não existe nenhuma diferença substancial, sendo a diferença apenas formal. Diferença formal que não afecta, de nenhum modo, a capacidade contributiva dos respectivos proprietários. 

Com efeito, a propriedade de um prédio habitacional em propriedade total, composto por partes susceptíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial, com um valor patrimonial tributário igual ou superior a 1.000.000 de euros, não revela nenhuma especial capacidade contributiva que a propriedade de várias fracções autónomas habitacionais, em que a soma dos valores patrimoniais tributários seja igual ou superior a 1.000.000 de euros, não revele também.

(…)

Outro entendimento, que procure desconsiderar a identidade substancial económica entre as situações de prédios em propriedade horizontal e de prédios em propriedade total compostos por partes susceptíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial, e atender apenas à diferença formal entre ambas as situações, resultaria numa violação do princípio da substância sobre a forma, que teria como consequência uma violação do princípio constitucional da capacidade contributiva”.

Tal como na decisão transcrita, também no caso vertente há que concluir, em face do exposto, que é procedente o pedido de anulação da liquidação impugnada fundado em violação do princípio constitucional da igualdade tributária pela norma de incidência constante da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, quando interpretada no sentido em que nela se incluem os prédios urbanos habitacionais em propriedade total compostos por partes susceptíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial.

 

 

V.                DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS

Verificada a ilegalidade do acto de liquidação impugnado, pelos fundamentos expostos, e tendo a Requerente pago integralmente o imposto liquidado, tem a Requerente direito, em conformidade com os artigos 24.º, n.º 1, al. b) do RJAT e 100.º da LGT, ao reembolso do imposto indevidamente pago, no montante de 15.518,40 euros.

Quanto aos juros indemnizatórios, o artigo 43º da LGT estipula que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

Quanto à existência, no caso, de erro imputável aos serviços, este erro considera-se verificado, segundo jurisprudência uniforme do STA (vejam-se, neste sentido, os Acórdãos do STA de 22-05-2002, Proc. n.º 457/02; de 31.10.2001, Proc. n.º 26167; de 2.12.2009, Proc. n.º 0892/09) sempre que procederem a reclamação graciosa ou impugnação da liquidação (no mesmo sentido, a decisão no processo arbitral 218/2013-T).

Por conseguinte, tem a Requerente direito a ser ressarcida através do recebimento de juros indemnizatórios, contados nos termos do art.º 43.º, n.º 1 da LGT e do art.º 61º, números 2, 3 e 5, sobre as quantias pagas referentes à liquidação anulada.

 

 

VI. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, o presente Tribunal decide:

-        Anular o acto de liquidação de Imposto do Selo referente ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da Freguesia de ..., ..., relativo ao ano de 2013, e que está na origem da emissão dos documentos de cobrança com os números 2014 ..., 2014 ..., 2014 ..., 2014 ..., 2014 ..., 2014 ..., 2014 ... e 2014 ...;

-        Condenar a Autoridade Tributária, nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 24º do RJAT, a restabelecer a situação que existiria se os actos de liquidação anulados não tivessem sido praticados, adoptando os actos e operações necessários para o efeito, através da restituição dos montantes de imposto indevidamente pagos e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios.

Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em 15.518,40 euros.

Custas: Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em 1 836,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

Registe-se e notifique-se esta decisão arbitral às partes.

 

 

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 30 de Março de 2015.

 

 

O Árbitro Único

 

 

(Nina Aguiar)

 

 

 



[1] Artigos 113.º e 123.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola (aprovado pelo Decreto Lei 45104, de 1 de Julho).