Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 322/2025-T
Data da decisão: 2025-12-09  IVA  
Valor do pedido: € 28.056,26
Tema: IVA – Caducidade do direito à liquidação; Prestações de serviços relacionadas com um imóvel, Vícios de procedimento; Sigilo profissional;
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SUMÁRIO:
I. Apesar do IVA ser um imposto de obrigação única, o prazo de caducidade previsto artigo 45.º, nº. 1 da Lei Geral Tributária conta-se a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.

II. O ano civil a partir do qual se conta esse prazo é o ano civil seguinte àquele em que ocorreu a dedução ao imposto pago do montante do imposto dedutível exigível no mesmo período, nascendo então o direito de crédito do contribuinte, sempre que a dedução supere o montante de imposto devido.

III. Tratando-se da prática de um acto tributário fundado em correcções quantitativas à matéria colectável determinadas por uma avaliação directa, por ocasião ou no âmbito de um procedimento de inspecção tributária e com base em dados contabilísticos apurados também por inspecção tributária à empresa relativamente à qual os actos de liquidação de IVA em falta haviam sido praticados, não existem razões que possam afastar a aplicação da regra da caducidade do direito à liquidação consagrada no artigo 45.º da Lei Geral Tributária.

IV. Nos termos do disposto no Código do IVA, são tributáveis em Portugal, as prestações de serviços relacionadas com um imóvel sito no território nacional.

V. No que diz respeito ao conceito de prestações de serviços relacionadas com um imóvel, o nº 1 do artigo 31º-A do Regulamento de Execução (UE) nº 282/2011, dispõe que os serviços relacionados com bens imóveis a que se refere o artigo 45º da Diretiva 2006/112/CE incluem apenas os serviços que tenham uma relação suficientemente direta com esses bens, considerando-se como tal a) quando derivam de um bem imóvel e esse bem é um elemento constitutivo do serviço e constitui um elemento central e essencial para a prestação dos serviços; b) quando são prestados ou destinados a um bem imóvel e têm por objeto a alteração jurídica ou material desse bem.

VI. A noção de residência ou domicílio para efeitos de delimitação da esfera de incidência das normas tributárias de cada Estado é distinta da noção de domicílio tributário de direito interno, e que é um domicilio especial pelo qual a lei se refere a um lugar determinado, o exercício de direitos e o cumprimento dos deveres estabelecidos pelas normas tributárias, localizando o sujeito passivo com vista a fixar a circunscrição territorial em cuja área se situem os serviços de administração competentes para a prática de atos relativos à situação fiscal do contribuinte.

VII. O dever de fundamentação do ato de liquidação mais não é do que uma forma de a Autoridade Tributária e Aduaneira exteriorizar os motivos porque procedeu àquela liquidação e não a qualquer outra, de modo claro, congruente e racional de molde a constituir a base que suporta a decisão.

 

DECISÃO ARBITRAL

A Árbitro Filipa Barros, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar este Tribunal Arbitral Singular, constituído a 17 de junho de 2025, decide o seguinte:

 

I.               Relatório

 

A..., S.P., RL., com NIPC ..., com sede na Rua ... n.º ..., ..., ... – ... Porto Salvo, (doravante a “Requerente”), vem, nos termos conjugados dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, alínea a), e 10.º, n.º 1, alínea a), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (“RJAT”) e 102.º, n.º 1, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), requerer a constituição do Tribunal Arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida ou AT), no qual peticionou:

i.               A declaração de ilegalidade da liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) n.º ..., referente ao período de 2023/09T, no montante total de €28.056,26, por correção ao valor do excesso a reportar existente na conta corrente de IVA (cfr. doc. n.º 2);

E em consequência:  

a.     A declaração de ilegalidade da liquidação de IVA n.º com o n.º 2025 ..., relativa ao exercício de 2024/03T, datada de 23 de janeiro de 2025 e correspondente acerto de contas FFCC – 2025..., no montante de €14.790,09; - (cfr. docs. n.º 3 e 5) e 

b.     A declaração de ilegalidade da liquidação adicional de IVA n.º 2025..., respeitante ao exercício de 2024/06T, datada de 23 de janeiro de 2025 e correspondente acerto de contas FFCC – 2025..., no montante de €13.316,17 – (cfr. docs. n.º 4 e 6 );

ii.              Finalmente, a condenação da AT numa indemnização pelo pagamento indevido do imposto, realizado a 13 de março de 2025, num total de €28.056,26, acrescido dos correspondentes juros compensatórios, à taxa legal, contados desde a data do pagamento do imposto até à data da integral restituição destas quantias; 

 

O Pedido de Pronúncia Arbitral (doravante “PPA”) tem como objeto a impugnação do IVA adicionalmente liquidado à B..., na sequência da determinação do crédito de imposto por esta invocado, nos termos e com os fundamentos expressos no Relatório de Inspeção Tributária (doravante RIT) e na Liquidação Adicional de IVA supra identificada. 

Nos termos do disposto na alínea a), do n.º 2, do artigo 6.º e da alínea a), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou a signatária como árbitro do presente Tribunal Arbitral Singular, que comunicou a aceitação do encargo no competente prazo.

Em 27-05-2025, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, à qual não opuseram recusa nos termos conjugados dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas b) e c) e 8.º do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Em consonância com a al. c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, conforme comunicação do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, o Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 17-06-2025.

Notificada para o efeito por despacho de 18-06-2025, a AT apresentou a sua resposta em 05-09-2025, defendendo-se por impugnação, e pugnando pela improcedência do pedido. Em 15-07-2025 a AT juntou aos autos um despacho derevogação parcial do ato de liquidação Adicional de IVA com o n.º ..., no qual decidiu “Revogar parte da correção efetuada, na quantia de EUR 1.560,36, na medida em que este valor respeita a correções relativas ao ano de 2020, que foram efetuadas em períodos caducados, tal como aduzido pela Requerente. Em consequência do supra exposto, o total da correção no valor de EUR 28.056,26, passará a ser de EUR 26.495,90.” 

Em 21-07-2025 a Requerente informa o Tribunal Arbitral que aceita a confissão Requerida. 

Em 08-10-2025, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, na qual foram inquiridas as três testemunhas indicadas pela Requerente. As Partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas, sucessivas, no prazo de 10 dias e, bem assim, a Requerente para proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente até ao termo do prazo de alegações. 

O Tribunal fixou que a decisão seria proferida até ao final do prazo previsto no artigo 21.º do RJAT (v. ata e gravação áudio disponíveis no SGP do CAAD).

 

II.             DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS 

 

A. Posição da Requerente

 

A Requerente assaca ao procedimento de inspeção que esteve na origem da emissão da Liquidação Adicional de IVA n.º ..., um conjunto de vícios, quer de natureza procedimental, quer de natureza material, que deverão conduzir à anulação do ato tributário de liquidação supra identificado, os quais se sintetizam em seguida:

a)    Esgotamento do prazo do procedimento de inspeção – entende a Requerente que foi incumprido, por excesso, o prazo de seis meses previsto no n.º 2 do artigo 36º do RCPITA, uma vez que, o procedimento de inspeção teve início no dia 9 de novembro de 2023 e deveria ter sido concluído até ao dia 9 de maio de 2024, sem que tivesse havido prorrogação. Acresce que após esta data foram realizados atos externos de inspeção tendo a Requerente sido notificada para prestar informações por e-mail, as quais foram fundamentais para as correções propostas no RIT. Assim, excedendo-se o prazo de seis meses, a Requerente entende que cessa o efeito suspensivo que a inspeção tem sobre o prazo de caducidade da liquidação, nos termos do artigo 46.º n.º 1 da Lei Geral Tributária. A Requerente considera ilegal a liquidação de IVA efetuada ao abrigo do procedimento inspetivo que deu lugar ao RIT – Ordem de Serviço n.º OI 2023..., iniciado a 9 de novembro de 2023, por este procedimento já se encontrar caducado, por decurso do prazo legal estabelecido para o efeito.   A Requerente indica jurisprudência segundo a qual o prolongamento do procedimento de inspeção para além do prazo legalmente estabelecido resulta em ilegalidades das liquidações de imposto subsequentes. 

b)    Caducidade do direito à liquidação do IVA – a Requerente entende que caducou o direito à liquidação do IVA relativamente às faturas emitidas pela B... até ao último dia do ano 2020, nos termos das regras previstas no artigo 45.º da LGT. A única fatura que ainda seria permitida a liquidação do IVA a que se refere o RIT seria a fatura 2021/18 emitida a 4 de maio de 2021 emitida pela B... em nome da E..., no valor de €226,45, sendo €202,25 a título de honorários e €25,20 de despesas, dando lugar a € 52,08 de IVA. A Requerente defende que a caducidade do direito à liquidação deve operar relativamente aos créditos de imposto da B... e às regularizações relativas às benfeitorias de locais arrendados, bem como em relação ao cliente C... (vide pontos V.1.1.3.3, V.1.1.3.4, V.1.1.3.5, V.12, V.1.3 e V.1.4).   

Aduz que relativamente às faturas emitidas pela B... à sua cliente F..., após 31 de dezembro de 2020, por se tratar de despesas, não incide IVA sobre essas faturas. 

Assim, o IVA eventualmente devido, por não ter caducado a respetiva liquidação, ficaria reduzido a €52,08. 

Por fim, entende que a respeito das regularizações efetuadas pela AT nos pontos V.1.2 e V.13 do RIT, a saber, “Regularizações de deduções relativas a imóveis não utilizados em fins empresariais”; e “Regularizações Indevidas por Falta de Enquadramento no n.º 3 do Art.º 78.º do CIVA”, tais regularizações enquanto atos de liquidação tributária, se encontram para todos os efeitos caducadas, pois as correspondentes faturas foram emitidas antes de 31 de dezembro de 2020.

c)     Violação da obrigação de segredo profissional dos Advogados – entende a Requerente que todos os atos de inspeção a que se refere o RIT são ilegais, padecendo de nulidade quando utilizam dados de facto da B... cobertos pela obrigação de sigilo profissional. Entre estes factos, a Requerente destaca a invocação, pela AT da prestação de serviços realizada às suas clientes, D... e E..., nomeadamente relacionados com a “defesa do CONSÓRCIO ... junto do ESTADO PORTUGUÊS no processo administrativo de audiência prévia dos interessados, na fase do projeto de decisão de indeferimento do pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados na área denominada de ..., pertencente a vários concelhos do distrito de Viseu, formulado pelo CONSÓRCIO ...; a Interposição de providencias cautelares junto dos Tribunais Administrativos Portugueses no âmbito do mesmo consórcio, dados relacionados com a alteração da composição do mesmo consórcio, com a admissão do sujeito passivo E..., o financiamentos das prestações de serviços da sociedade de advogados, entre outras informações que fazem parte do Anexo 10 do RIT, sendo estes documentos abrangidos pela obrigação de sigilo profissional da B..., com acesso restringido à D..., à E... e à F... .

Assim, o dever de sigilo profissional impõe-se à própria AT estando os seus poderes de inspeção condicionados pelo disposto nos artigos 63.º da LGT, artigos 12.º e seguintes do RCPITA, e pelo artigo 81.º do EAO. A Requerente invoca jurisprudência do TJUE, no sentido em que estando em causa a defesa de interesses privados junto do Estado (e o mesmo relativamente à AT que é um órgão do Estado), a salvaguarda do sigilo profissional impõe-se, com maior acuidade, para que o advogado possa fazer valer os direitos dos seus clientes, de acordo com a estratégia processual adequada, sem que exista o risco de vazamento de informação relevante.    

d)    Falta ou insuficiente fundamentação por parte da AT – Segundo a Requerente, o RIT não se encontra devidamente fundamentado no que respeita às liquidações de IVA contra a B..., tendo como consequência a anulação da liquidação adicional de IVA. 

A fundamentação revela-se insuficiente no que respeita à temática da violação da obrigação de sigilo profissional, relativamente à relação direta das prestações de serviços jurídicos da B... com os imóveis localizados em território nacional no âmbito dos direitos de exploração atribuídos aos consórcio de ..., carecendo o RIT de uma “abordagem adequada” da regra especial do artigo 56.º da Diretiva 2006/112/CE, não tendo a AT demonstrado que tais serviços estão relacionados com a transferência de um título de propriedade imobiliária; 

A Requerente aduz ainda que a AT não justifica as afirmações proferidas relativamente ao contrato de financiamento pretendido pela B... junto da da F..., tendo considerado que as faturas emitidas por esta correspondem à prestação de serviços e não a importâncias recebidas a título de financiamento. A AT desconsidera o contrato, e não pode utilizar determinadas informações pois “De harmonia com as declarações prestadas, o significativo atraso na faturação dos 75% financiados por esta empresa deve-se ao facto de no decorrer do processo, a F... ter procurado negociar, com a sociedade de advogados, condições especiais para a prestação dos serviços, visando a minimização dos correspondentes custos.”, porque obteve essa informação da B... já depois de se ter esgotado o prazo do procedimento de inspeção (9 de maio de 2024), como resulta dos Docs. 52 a 54.” 

 

A fundamentação é também insuficiente em relação às liquidações caducadas (não se explicita por que se corrige o valor dos reportes de crédito de imposto considerando-os como novas liquidações) e quanto às regularizações indevidas constantes do RIT, por se considerar que além da falta de fundamentação, tal IVA se encontra caducado.  A Requerente invoca que a fundamentação deve obedecer em toda a linha aos princípios da suficiência, da clareza e da congruência. Ora, no relatório, a AT extrai conclusões sem indicar premissas. Com efeito, a matéria alegada pela B..., em sede de Audição Prévia, não foi devidamente analisada. A AT limitou-se a transcrever a defesa sem a analisar, em confronto com a tese defendida pela própria AT, em atitude de claro desrespeito pelo exercício do direito ao contraditório por parte da B... . Ora, a falta de fundamentação prejudica o contribuinte de impugnar a liquidação com conhecimento suficiente dos factos invocados pela AT, o que é fundamento de invalidade da liquidação fiscal. 

 

e)    Ilegalidade da liquidação de IVA, no valor de €1.141,62 - por a AT não ter reconhecido como válida a correção da regularização efetuada pela B... relativamente ao cliente C..., que tem estatuto de residente em Angola desde 1998, não tendo a AT logrado demonstrar a residência fiscal em Portugal. 

 

f)     A ilegalidade das correções oficiosas do IVA, realizadas pela AT no RIT - no valor total de €53.984,93, posteriormente reduzidas para €20.924,56, por falta de fundamento legal. 

g)    A Requerente concluí, considerando que devem ser repostos os valores da declaração inicial de IVA correspondente o período de imposto 2023/09-T, restabelecendo-se o montante inicial € 81.040,72, em detrimento do € 52.948,46, resultantes das correções efetuadas pela AT IRS, com as demais consequências legais.  

 

B. Posição da Requerida

 

A Requerida começa por reiterar a argumentação constante do RIT, muito embora esclareça que parte das alegações da Requerente vieram a ser acolhidas, em sede do presente processo, através de Despacho do Sub-Diretor Geral da Área de Gestão Tributária dos Impostos Indiretos e Impostos Sobre Veículos (SDG-IVA-IEC-ISV), de 08-07-2025, que revogou parcialmente o ato de liquidação adicional n.º ..., na medida em que se considerou que a correção efetuada no valor de € 1.560,36, respeita a  correções relativas ao ano de 2020, que foram efetuadas em períodos caducados.   

Relativamente aos vários pontos dos pedidos da Requerente, entende a Requerida o seguinte: 

a)    Da caducidade do direito à liquidação do imposto - Tendo presente o estipulado no n.º 3 do artigo 45.º da LGT, segundo o qual, em caso de crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito, é permitido à AT sindicar a legitimidade do direito ao crédito inscrito no campo 61 da primeira declaração periódica sindicável (2020/03T) e conduzir a nova liquidação de imposto neste período se se verificar que este crédito não é legítimo. Assim, relativamente a um crédito de imposto que se mostra indevido, a AT não está limitada ao prazo de caducidade do direito à liquidação que é de 4 anos, nos termos preconizados no n.º 1 do artigo 45.º do LGT, podendo efetuar correções às declarações dos sujeitos passivos relativas a todo o período de tempo a que se reporta o reembolso, mesmo que anteriores aquele prazo de caducidade. Também como decorre do preceituado no n.º 8 do artigo 22.º do Código do IVA, os reembolsos de IVA são efetuados – quando devidos – isto é após a confirmação, no momento em que se vai apreciar um pedido de reembolso, de que no período a que ele se refere a dedução total de imposto a que haja lugar supera o montante total devido pela totalidade das operações tributáveis. Assim, não se esgotando o crédito acumulado em qualquer dos períodos anteriores a 2020, entende a AT que não se encontra precludido o direito do sujeito passivo o utilizar nem, concomitantemente o direito da AT sindicar a sua legitimidade. A AT defende que sendo pedido pelo sujeito passivo um crédito de imposto inscrito no campo 61 da DP 2020/03-T no montante de €81.494,76, este crédito, efetivamente utilizado neste período se encontra ao alcance da liquidação pela AT. No entanto, aquele crédito consubstancia também o produto do somatório do resultado de cada uma das liquidações precedentes se desconsideradas, cada uma delas, da parcela de crédito de períodos anteriores, ou seja, da liquidação dos valores apurados no período (cada período de per si) desprezando eventual parcela de crédito comunicada de período anterior por via do campo 61 da DP. 

Entende a AT que a tese supra enunciada se aplica relativamente ao IVA suportado pela Requerente entre 2015 e 2019, enquanto arrendatária de dois imóveis onde efetuou obras, tendo deduzido o correspondente IVA. Ora, perante a denúncia do contrato de arrendamento em 03-01-2022, com a correspondente entrega do imóvel arrendado, não regularizou o imposto nas benfeitorias realizadas, nos termos do n.º 5 do artigo 26.º do Código do IVA, no período 2021 12T, no valor de €5.990,08. Também neste caso, ao apreciar se se verificam todos os pressupostos do direito à dedução, a Administração Tributária não está limitada pelo prazo de caducidade do direito à liquidação, podendo efetuar correções às declarações dos contribuintes relativas ao período em relação ao qual foi exercido o direito à dedução, mesmo que anteriores àquele prazo de caducidade - artigo 45.º, n.º 3 da LGT -, o que significa que, em bom rigor, o prazo para emitir liquidações relativas a regularizações indevidamente omitidas é o de, in casu, 20 anos, nos termos do n.º 2 e n.º 8 do artigo 24.º do Código do IVA;

  

b)    Esgotamento do prazo de inspeção - O procedimento inspetivo levado a cabo pelos SIT, foi de âmbito interno, na medida em que os atos inspetivos foram efetuados exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos detidos pelos serviços e obtidos no âmbito do referido procedimento, conforme definido pelo artigo 12.º do Regime Complementar Procedimento Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA); No que tange à não conclusão do procedimento inspetivo no prazo de 6 meses, tal só tem aplicação aos procedimentos inspetivos externos, defendendo a Requerida, ao contrário do alegado pela Requerente, não foram levadas a cabo ações desta natureza;  

 

c)     Violação da obrigação de sigilo profissional dos advogados – Entende a AT que a violação do segredo profissional dos advogados se encontra desprovida de sentido. A informação utilizada e vertida no RIT diz respeito à natureza dos serviços jurídicos prestados aos adquirentes e à sua relação com um bem imóvel situado em território nacional, com o exclusivo objetivo de aplicar as regras de localização e de exigibilidade do IVA. A análise inspetiva não incidiu sobre o conteúdo estrito da consulta jurídica ou da estratégia forense em si mesma. 

  

d)    Falta de liquidação de IVA nas faturas emitidas por serviços jurídicos prestados pela B... à E..., no montante de € 20.924,56 – A Requerida defende que são localizados em Portugal os serviços jurídicos prestados pela B... ao Consórcio ..., incluindo a defesa no âmbito de um processo administrativo e numa providencia cautelar, relacionadas com a decisão do Estado Português de não prorrogar o contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata e metais associados. Por seguinte, as faturas emitidas à cliente E..., sedeada em Malta, - nas quais a Requerente não liquidou IVA por considerar as operações não são localizadas em território nacional face ao disposto na alínea a) do n.º 6 do art.º 6.º do CIVA, a contrario - encontram-se relacionados com bens imóveis localizados no território nacional e têm enquadramento na alínea q) do n.º 2 do art.º 31.º-A.  Segundo a Requerida, os serviços prestados pela B... são relacionados com direitos decorrentes de uma concessão mineira, pelo que possuem uma ligação direta e específica a um bem imóvel, envolvendo direitos administrativos de exploração de bens pertencentes ao domínio público. Com efeito, a área territorial sob a qual incidiu o exercício da atividade exploratória do Consórcio ... é constituída por bens imóveis que pertencem ao domínio público do Estado Português, no entanto, de acordo com a doutrina e jurisprudência, do direito atribuído para a sua exploração experimental resultaria um direito real de aquisição, uma vez que, o contrato de concessão celebrado concedeu ao Consórcio ... a expetativa e a consequente possibilidade de aproveitamento dos recursos geológicos extraídos, porquanto, conclui pela sujeição a IVA em Portugal, dos serviços jurídicos prestados. 

 

e)    Regularizações de imposto consideradas indevidas – respeitam a faturas emitidas a um cliente que a Requerente alega ser não residente fiscal em Portugal, tendo emitido as faturas por serviços prestados sem IVA. A este respeito, a AT alega que segundo o cadastro,  C..., estava registado, com o NIF ..., com domicílio fiscal em Portugal, enquadrado na Categoria B para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), pelo exercício da atividade de economista, e em IVA, com enquadramento no regime especial de isenção do artigo 53.º do Código do IVA, à data das operações económicas. 

 

 

f)     Dever de fundamentação - O dever de fundamentação dos atos administrativos assume uma função garantística dos particulares, visando assegurar a transparência e imparcialidade das decisões administrativas, bem como possibilitar o controlo da legalidade da tomada da decisão. Assim, deve ser possível ao destinatário do ato apreender o iter cognoscitivo e valorativo do mesmo, sendo-lhe permitido conhecer as razões de facto e de direito que conduziram à tomada de determinada decisão. O artigo 153.º, n.º 1 do CPA dispõe que a fundamentação do ato administrativo resulta da “sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão”, que se traduz numa declaração contida no próprio ato administrativo [artigo 151.º, n.º 1, alínea d), do CPA], por intermédio da qual o autor do ato justifica a sua prática e expõe as razões, de facto e de direito, da sua decisão. A Requerente tinha pleno conhecimento do procedimento de inspeção, no qual participou, tendo sido notificada para exercer o direito de audição e notificada do respetivo RIT. O RIT expõe de forma clara e suficiente os factos que suportam as correções, não tendo a Requerente identificado qualquer dúvida sobre o conteúdo do ato, tanto que procedeu à sua impugnação contenciosa, assacando-lhe diversos vícios e discutindo em detalhe cada ponto do RIT. Impõe-se concluir que foi dado integral cumprimento ao disposto no artigo 77.º da LGT.   

 

Conclui, considerando que a atuação da AT se pautou pelo cumprimento da Lei aplicável, e bem assim pelo respeito de todos os princípios jurídicos, tendo operado uma correta interpretação e aplicação dos preceitos legais, no estrito cumprimento do princípio da legalidade.  

 

III.            Saneamento 

 

O Tribunal foi regularmente constituído face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas, encontram-se regularmente representadas e o processo não enferma de nulidades.

 

IV.          Decisão da matéria de facto

1. Factos provados

 

  1. A..., SP RL, designada comercialmente por B..., é uma sociedade de advogados, registada em 2012-07-09, para o exercício de "Atividades Jurídicas", CAE 69101, em 2012-07-09, com enquadramento em IVA, no regime normal de periodicidade trimestral e em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, no regime geral de tributação; - (cfr. Processo Administrativo, doravante “PA”).
  2. Exerce a sua atividade em Porto Salvo, tendo, anteriormente, desenvolvido a sua atividade na Rua ... em Lisboa, onde realizou obras em 2015 e 2019; - (cfr. “PA”).
  3. A B... é uma sociedade de advogados, com o NIPC ..., registada na Ordem dos Advogados sob o nº .../12, com o capital social de € 50.000,00 e sede na Rua  ..., Oeiras ..., ..., ...-... PORTO SALVO; - (cfr. doc. n.º 7, junto como o Pedido de Pronúncia Arbitral, doravante “PPA”).
  4. A Requerente foi alvo de liquidações adicionais de IVA decorrentes um procedimento inspetivo, de âmbito interno, iniciado em 04-11-2023, efetuado pelos Serviços Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa (doravante SIT), com base na ordem de serviço n.º OI2023...; – (cfr. PA).
  5. O objetivo da ação inspetiva foi aferir a legitimidade de um reembolso de IVA solicitado em 2023/09-T, no montante de € 15.000,00. – (cfr. PA).
  6. A análise da ação inspetiva foi alargada ao período de tributação de 2012/12-T, considerando a data de início da formação do crédito de imposto em sede de IVA. – (cfr. PA).
  7. Em 06-11-2023 a Requerente enviou os elementos solicitados pelos SIT, tendo estes enviado novas notificações nos dias 01-12-2023 e 18-01-2024, para aferir da legitimidade do crédito de imposto; - (cfr. PA).
  8. Em 27-05-2024 os SIT notificaram a B... para lhe prestar as seguintes informações: “CONSÓRCIO ... - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS/CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE LITÍGIO: 1- Informe porque razão é que, as faturas números FA 2020/33, FA 2020/34, FA 2020/35 e FA 2020/36 foram emitidas a F... (F...), apenas, em 29/12/2020.

2- Indique o motivo pela qual não foi faturado à E..., NIF: MT..., o valor correspondente à parte financiada pela F... (valor correspondente a 75% dos honorários).

3- Relativamente aos processos em análise Acão Administrativa Consórcio ... e Interposição de providência cautelar informe se:

3.1- Já foram proferidas as sentenças finais (decisão final).

3.2- Em que data foram proferidas as decisões finais relativamente à

3.2.1- Acão Administrativa Consórcio ...; e

3.2.2- Interposição de providência cautelar;

3.3- Se as mesmas foram favoráveis ao cliente.

3.4- Remeta cópia das sentenças (finais).

3.5- Em que data cessaram os serviços com o cliente.” - (cfr. Doc. 52 junto com o PPA).

  1. Em 05-06-2024, B... respondeu às questões colocadas pelos SIT, por e-mail datado de 5 de junho de 2024; - (cfr. doc.s nºs 53 e 54 juntos com o PPA).
  2. Foi efetuada a ação inspetiva e elaborado o correspondente Relatório de Inspeção Tributária (RIT), cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e em que se refere além do mais o seguinte: 

“IV.1    - Diligencias realizadas durante a acção inspetiva

0 direito ao reembolso de IVA foi exercido na declaração periódica relativa ao período 2023-09T, tendo-se verificado que o crédito de imposto iniciou o seu período de formação a partir do período, 2012-12T. Assim, a analise aqui realizada foi alargada ao período 2012-12T, face ao disposto no n.º 3 do artigo 45.º da Lei Geral Tributaria (LGT).

Consultado o sistema informático verificamos que o valor declarado do crédito acumulado a favor do sujeito passivo assim como o valor do crédito reportado para o período seguinte diverge do processado automaticamente em um cêntimo conforme evidenciado no quadro seguinte.

 

Declarado

Process. Automatico

Valor do pedido de reembolso

15.000,00

15.000,00

Valor do crédito acumulado a favor do sujeito passivo

 

81.040,73

 

81.040,72

Valor do crédito reportado para o período seguinte

 

66.040,73

 

66.040,72

 

No dia 04/11/2023 foi remetida notificação para a caixa postal eletrónica do sujeito passivo, para proceder ao envio de elementos que permitissem aferir a legitimidade do crédito.

(...) 

V.        Descrição dos factos e fundamentos das correcções/irregularidades

Da análise efetuada no âmbito do procedimento de inspeção ao realizado com a profundidade que se considerou adequada, e considerando os esclarecimentos prestados, foram detetadas as situações irregulares que neste capítulo se descrevem e fundamentam e das quais resultam as correcções que devidamente se quantificam neste relatório.

Releva ainda referir que a fundamentação legal mencionada se reporta a legislação em vigor, a data dos factos.

V.1- IVA

V.1.1   - CONSÓRCIO ...

V.1.1.1- PRESTACAO DE SERVICOS JURÍDICOS/ REGRAS DE LOCALIZAÇÃO

No âmbito da sua atividade, a B... foi contratada (anexo 2) para a prestar os dos seguintes serviços jurídicos:

•          Elaboração da defesa do CONSÓRCIO ... junto do ESTADO PORTUGUÊS no processo administrativo de audiência prévia dos interessados, na fase do projeto de decisão de indeferimento do pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados na área denominada de..., pertencente a vários concelhos do distrito de Viseu, formulado pelo CONSÓRCIO ...;

•          interposição de uma providência cautelar nos Tribunais Administrativos Portugueses de molde a suspender a executoriedade do despacho do Sr. Secretario de Estado de Energia (SEEN), de 23.04.2018, que indeferiu o referido pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados, celebrado em 20.02.2013, entre o Estado ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ...

•          impugnação judicial perante os Tribunais Administrativos Portugueses quer do despacho do Sr. SEEn, de 23.04.2018, que indeferiu o pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados, celebrado em 20.02.2013, entre o Estado ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ..., quer a declaração de caducidade do mencionado contrato;

Parte do valor dos serviços jurídicos prestados pelo sujeito passivo B... foi faturado ao sujeito passivo E... sedeado em Malta, (sujeito passivo com numero válido no VIES ate 01/12/2021) pelo que importa, perceber, se poderão ser considerados como tendo uma relação suficientemente direta com os bens imóveis localizados no distrito de Viseu onde o CONSÓRCIO ... exerceu a atividade de exploração experimental de recursos geológicos, com vista a determinar se o território nacional é, ou não, o lugar das prestações de serviços realizadas, de acordo com o art. 47.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28.11.2006.

Quanto ao contrato de concessão importa referir:

As sociedades H... e D..., em regime de consórcio designado CONSÓRCIO DO PROJETO ... requereram junto do ESTADO PORTUGUÊS a celebração de um contrato administrativo para atribuição de uma área para exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados, denominada ..., localizada nos concelhos de ..., ..., ... e ... no distrito de Viseu, de acordo com o aviso n.º 20/2013, publicado no Diário da Republica (DR), 2ª série, n.º 2, de 02.01.2013.

Em 20.02.2013, foi celebrado um contrato administrativo entre o CONSÓRCIO ... e o ESTADO PORTUGUÊS, representado através do Ministério da Economia, de concessão de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados, a que correspondia o n.º de cadastro ... "...", localizado nos concelhos de..., ... , ... e ... no distrito de Viseu, segundo o aviso n.º 311/2013, publicado no DR, 2ª serie, n.º 97, de 21.05.2013 (anexo 3).

0 contrato celebrado estipulava que o período experimental tinha a duração de 4 anos, contados a partir da data da sua assinatura, e que a pedido devidamente fundamentado do CONSÓRCIO ... este período poderia ser prorrogado, a título excecional, por prazo não superior a 2 anos, em termos e condições a estabelecer no despacho ministerial que o concedesse.

0 CONSÓRCIO ... terá solicitado a prorrogação deste contrato administrativo, por cartas de 15.04.2016 e 14.12.2016, conforme pags. da petição

No entanto, através de consulta a internet, foi possível apurar que o CONSÓRCIO ... constituído pelas sociedades H... e D..., solicitou junto do Ministério da Economia a atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados na área denominada de ..., localizado nos concelhos de ..., ..., ... e ... no distrito de Viseu, ao abrigo do n.º 1 do art. 6.º do DL n.º 90/90, de 16.03, conforme aviso n.0 14259/2016, publicado no DR, 2a série, n.º 223, de 21.11.2016.

No referido aviso n.º 14259/2016 não consta mencionado se o pedido de atribuição de direitos de prospeção e pesquisa por parte do CONSÓRCIO ... tem como objetivo a prorrogação do contrato concessão de exploração experimental ou a concessão de exploração definitiva daquela área.

Não foi possível apurar se existe, ou não, relação com o procedimento administrativo decorrente do referido aviso n.º 14259/2016, mas o ESTADO PORTUGUES, representado pelo Sr. SEEn, por despacho, de 23.04.2018, decidiu a extinção por caducidade, por decurso do prazo de 4 anos de vigência do contrato de concessão de exploração experimental, celebrado em 20.02.2013 com o CONSÓRCIO..., de acordo com o aviso n.º 10648/2018, publicado no DR, 2ª serie, em 06.08.2018 (anexo 4).

Não concordando com a decisão do ESTADO PORTUGUÊS e pretendendo a defesa dos seus interesses perante os Tribunais Portugueses, as sociedades D... e E... que constituíam o CONSÓRCIO..., solicitaram em 25/06/2018 a B... a prestação de serviços jurídicos, tendo para o efeito, sido celebrado um contrato o qual foi aceite em 01/10/2018.

No que respeita a composição do CONSÓRCIO é de referir que:

Quando foi celebrado, em 20.02.2013, o contrato de concessão de exploração experimental entre o ESTADO PORTUGUES e o CONSÓRCIO ..., este era constituído pelos sujeitos passives H... e D... .

0 sujeito passivo D... é uma pessoa jurídica de direito privado constituída no Brasil e inscrita no CNPJ com o n.0..., com sede na avenida ..., n.º..., ..., Belo Horizonte/MG - ... Brasil.

 

De acordo com os elementos recebidos, a composição do CONSÓRCIO ... foi alterada, em 30.06.2016, com a admissão do sujeito passivo E... como consorciado, por via do Aditamento n.º 3 ao contrato de consórcio para o Projeto .... (anexo 5).

0 sujeito passivo E... é uma sociedade constituída ao abrigo da Lei das Sociedades Comerciais de Malta e registada com o n.º... na Conservatória do Registo das Sociedades Comerciais, com sede na ...  ... Malta.

No contrato de prestação de serviços jurídicos celebrado, em 01.10.2018, com o sujeito passivo B..., consta escrito que o sujeito passivo E... optou pelo seguinte endereço para correspondência, ..., Switzerland, e era representado pela sua administradora com poderes para o ato I..., em representação da J... Ltd.

0 sujeito passivo E... condicionou a sua plena participação, como investidor, no CONSÓRCIO ..., à prorrogação do contrato de concessão experimental, o que lhe foi assegurado pela D..., no Memoranda que formaliza a relação contratual entre as duas empresas.

Por deliberação do Conselho de Orientação e Fiscalização do CONSÓRCIO ..., tomada no dia 28.09.2018, o sujeito passivo H... INC. foi excluído do CONSÓRCIO.

Legislação aplicável

0 artigo 47.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28.11.2006, a que corresponde na ordem jurídica interna a al. a) do n.º 7 e a al. a) do n.º 8 ambas do art. 6.º do CIVA, estabelece que o lugar das prestações de serviços relacionadas com bens imóveis é o lugar onde esta situado o bem imóvel.

0 Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho, de 15.03.2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28.11.2006, relativa ao sistema comum do IVA, foi alterado, em 2013, pelo Regulamento de Execução (UE) n.º 1042/2013 do Conselho, de 07.10.2013.

As alterações introduzidas dizem respeito ao lugar das prestações de serviços nomeadamente, as prestações de serviços relacionadas com bens imóveis e, nesta matéria em particular, foram aditados os arts. 13.º- B, 31.º-A e 31.º-B.

 

De acordo com o art. 13.º-B consideram-se "bens imóveis":

a)        Qualquer parcela delimitada do solo, situada à sua superfície ou sob a sua superfície, que possa ser objeto de um direito real;"

Nos termos do n.º1 do art. 31.º-A:

"Os serviços relacionados com bens imóveis a que se refere o artigo 47.º da Diretiva 2006/112/CE incluem apenas os serviços que tenham uma relação suficientemente direta com esses bens. Considera-se que os serviços têm uma relação suficientemente direta com bens imóveis nos seguintes casos:

a)        Quando derivam de um bem imóvel e esse bem e um elemento constitutivo do serviço e constitui um elemento central e essencial para a prestação dos serviços;

b)        Quando são prestados ou destinados a um bem imóvel e têm por objeto a alteração jurídica ou material desse bem."

No n.º 2 do referido art. 31.º-A é referido que existe, em especial, uma relação direta com bens imóveis nas seguintes prestações de serviço:

"q) Os serviços jurídicos relacionados com a transferência de um título de propriedade imobiliária, o estabelecimento ou transferência de determinados direitos ou direitos reais sobre bens im6veis (equiparados ou não a bens corpóreos), como atividades notariais, ou a elaboração de contratos de compra e venda de bens imóveis, ainda que a operação subjacente que resulta na alteração jurídica da propriedade não se venha a verificar."

Por seu turno, no n.º 3 do mencionado art. 31.º-A é referido que o n.º 1 do artigo 31.º A não abrange:

"h) Os serviços jurídicos, com exceção dos abrangidos pelo n.º 2, alínea q), relacionados com contratos, designadamente aconselhamento sobre os termos de um contrato de transferência de bens imóveis, sobre a execução de um contrato dessa natureza ou a comprovação da sua existência, se esses serviços não estiverem especificamente relacionados com a transferência de um título de propriedade imóbiliaria."

Cumpre averiguar se os serviços prestados pelo sujeito passivo B... estão diretamente relacionados com os bens imóveis que constituem a área identificada por "..." e que se encontram localizados nos concelhos de ..., ..., ... e ... no distrito de Viseu, na qual incidiu a atividade mineira do CONSÓRCIO ... .

Recorrendo às Notas explicativas sobre as regras da UE em matéria de IVA relativas ao lugar das prestações de serviços relacionados com bens imóveis que entram em vigor em 2017 (Regulamento de Execução (UE) n.º 1042/2013 do Conselho) - págs. 17 e seguintes -, para serem considerados «bens imóveis» nos termos da al. a) do art. 13.º-B devem ser cumulativamente satisfeitas duas condições:

1)        deve ser uma parcela delimitada do solo, situada a sua superfície ou sob a sua superfície e

2)        deve poder ser objeto de um direito real.

Por «uma parcela delimitada do solo» entende-se uma, ou mais, parcelas claramente identificadas do solo que possam ser objeto de um direito real. 0 âmbito do termo «solo» é amplo, uma vez que a referência ao solo, quer à sua superfície quer sob a sua superfície, inclui efetivamente o próprio solo e tudo o que esta situado sobre a sua superfície e também o que esta situado sob a sua superfície, isto é, o subsolo.

0 subsolo abrange tudo o que está situado sob o solo. Por conseguinte, os poços de petróleo, os lençóis freáticos, os minerais e outros recursos que se encontram situados sob o solo (e também o solo sob a água) são considerados bens imóveis. Desde que estes componentes não sejam extraídos do subsolo, devem ser considerados como parte do solo, isto e, bens imóveis.

Tendo em conta a redação da al. a) do art. 13.º-B, apenas os bens imóveis que possam «ser objeto de um direito real» são abrangidos pela definição de «bens imóveis».

Apesar de a expressão «direito real» não se encontrar definida para efeitos da aplicação da Diretiva IVA, esta deve ser aplicada, para efeitos de IVA, de uma forma comum pelos Estados-Membros sem depender de definições nacionais.

Para "compreender o seu significado, é necessário consultar a definição de entrega de bens prevista no artigo 14.º da Diretiva IVA. Com efeito, recorde-se que o objetivo do Artigo 13.º-B consiste em definir o conceito de «bens imóveis», que deriva de bens corpóreos na aceção da Diretiva IVA. Entende-se por «entrega de bens» a transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como proprietário».

Segundo Jurisprudência assente do TJUE, o conceito de «entrega de bens» não diz respeito a transferência de propriedade nas formas previstas pelo direito nacional aplicável, mas inclui qualquer operação de transferência de um bem corpóreo por uma parte que confere a outra parte o poder de dispor dele, de facto, como se fosse o proprietário desse bem. Por conseguinte, pode haver uma transferência do poder de dispor de um bem corpóreo como se fosse o seu proprietário, mesmo que não exista qualquer transferência da propriedade legal do bem. 0 que importa e a «propriedade económica» ou a «posse económica»".

Os bens imóveis inalienáveis, como os bens do domínio público "são igualmente abrangidos pelo artigo 13.º-B, alínea a), mesmo quando o título sobre os mesmos não é transferível", o seu estatuto jurídico pode sofrer alterações ao longo do tempo, ao abrigo de decisões tomadas por autoridades públicas, os mesmos podem igualmente ser objeto de prestação de serviços (p. ex., obras de construção, licenças de exploração) que serão considerados serviços relacionados com bens im6veis. (cfr. pág. 19 das Notas explicativas).

Dando especial relevo a prestação de serviços jurídicos, a al. q) do n.º 2 do art. 31.º-A determina que existe uma relação direta com bens imóveis quando aqueles são "relacionados com a transferência de um titulo de propriedade imobiliária, o estabelecimento ou transferência de determinados direitos ou direitos reais sobre bens imóveis (equiparados ou não a bens corpóreos), como atividades notariais, ou a elaboração de contratos de compra e venda de bens imóveis, ainda que a operação subjacente que resulta na alteração Jurídica da propriedade não se venha a verificar."

 

Conforme decorre do enquadramento factual supra descrito, o objeto do contrato celebrado foi a exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados situados no subsolo de uma área territorial claramente identificada por "...", localizada nos concelhos de ..., ..., ... e ... distrito de Viseu a que correspondeu o n.º de cadastro ... .

Sendo aquela área territorial constituída por bens imóveis que integram o domínio público do ESTADO, ao CONSÓRCIO ... foi atribuído, em 20.02.2012, o direito de exploração dos referidos recursos geológicos através da celebração de um contrato de concessão.

Cumpre, então, averiguar se do contrato celebrado entre o ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ... resulta o nascimento de direitos reais para o CONSÓRCIO ... .

A este propósito o Tribunal da Relação de Coimbra, no Acórdao de 23.03.2021, no Processo 3915/18.6T8LRA.C1, refere o seguinte:

"Entre quem defende que através desse contrato foi constituído um direito real de aquisição está Oliveira Ascensão [1J que entende que nesta categoria se encontra o direito a mineração, em que a coisa que se vai adquirir tem existência autónoma depois da exploração o que implica a sua separação do conjunto.

Por sua vez também tem sido defendido que no caso de direito de mineração há um direito de gozo sabre uma mina cuja faculdade de fruição permite a aquisição do minério, sendo a aquisição unicamente o resultado da fruição. [2]

Atribuindo autonomia aos recursos geológicos, José Bonifácio Ramos [3] defendeu que estávamos perante um direito de exploração dos recursos geológicos consistente no aproveitamento dos mesmos, sendo eles próprios o objeto do contrato celebrado, concluiu que o direito de exploração dos recursos geológicos deve ser considerado um direito real de gozo, à semelhança, aliás com o que tinha sido defendido por Menezes Cordeiro, relativamente aos direitos de mineração e de aproveitamento de águas mineromedicinais [4]. Posteriormente, este Autor, mudou a sua posição [5], considerando haver fundamento para o classificar coma um direito real de aquisição dado que o intuito do exercício do direito não será tanto a exploração do recurso, em si mesmo, mas de obter, em momento posterior, a propriedade sobre os bens extraídos em consequência da atividade explorativa."

A área territorial sob a qual incidiu o exercício da atividade exploratória do CONSÓRCIO ... e constituída por bens imóveis que pertencem ao domínio público do ESTADO, no entanto, de acordo com a doutrina e a jurisprudência, do direito atribuindo para a sua exploração experimental resulta um direito real de aquisição, uma vez que o contrato de concessão celebrado concedeu ao CONSÓRCIO ... a expetativa e o consequente aproveitamento dos recurses geológicos extraídos

A solicitação de serviços jurídicos pelo CONSÓRCIO ... ao sujeito passivo B... para defesa dos seus interesses tem, pois, subjacente uma relação direta com bens imóveis situados no território nacional relativamente aos quais foram estabelecidos direitos reais de aquisição.

A realização das prestações de serviço quer no âmbito do processo administrativo de audiência prévia dos interessados, quer a interposição de uma providência cautelar e de uma ação administrativa no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu contestando o despacho do Sr. SEEn, de 23.04.2018, que indeferiu o pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental, celebrado em 20.02.2013, entre o Estado ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ..., encontram-se relacionados diretamente com os direitos atribuídos de exploração da área identificada por "...", localizada nos concelhos de ..., ..., ... e ... do distrito de Viseu.

Termos em se encontra preenchido um dos pontos enumerados na al. q) do n.º 2 do art. 31.º-A.

Em face do exposto, os serviços jurídicos realizados pelo sujeito passivo B... consideram-se como relacionados com bens imóveis localizados no território nacional e têm enquadramento na al. q) do n.º2 do art.º 31.º-A.

 

V.1.1.2 - CONTRATO DE PRESTACAO DE SERVICOS/CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE LITÍGIO/FATURAS EMITIDAS

Conforme já referido, para defesa dos interesses das empresas que constituem o Consórcio ... perante os Tribunais Portugueses, as clientes (consorciadas do consórcio...) celebraram com a B..., em 01.10.2018, um contrato de prestação de serviços jurídicos (o "CPSJ") (anexo 2).

No anexo n.º 1 ao contrato de prestação de serviços jurídicos, definem-se as condições especiais, relativas aos honorários devidos, pelo cliente, a título de contrapartida pela prestação de serviços jurídicos, e as despesas do processo, conforme pontos 1 a 7, a seguir identificados:

1          - Composição dos honorários;

2          - Valor da Hora de Trabalho;

3          - Condições especiais de pagamento;

4          - Financiamento dos honorários e despesas por terceiros;

5          - Despesas;

6          - Pagamento dos honorários e despesas;

7          - Prémio de Sucesso.

No ponto 4 - Financiamento dos honorários e despesas por terceiros - refere-se que, com a finalidade de ser assegurada a liquidez necessária ao desenvolvimento da atividade da B..., o cliente autorizou a B... a negociar com uma terceira empresa especializada o financiamento, no regime Third party funding,[1]  da parte não cobrada dos honorários do processo, da sua responsabilidade.

Pelo que, a B..., negociou com a empresa denominada, F... (F...)[2], com sede em Malta, o financiamento, complementar dos honorários relativos ao processo.

Com efeito, de harmonia com o considerando E. do Contrato de Financiamento de Litígio (anexo 6) "(...) a B... negociou, com os clientes, um Contrato de Prestação de Serviços Jurídicos (o "CPSJ"), através do qual os clientes apenas se propõem pagar, vinte cinco por cento (25%) dos valores correspondentes honorários dos seus advogados e a totalidade das despesas com as Demandas;

Em conformidade com o considerando F," (...) A B... necessita de um financiamento correspondente a (75%) do valor dos honorários dos seus Advogados, traduzido em adiantamentos financeiros, para apoio da tesouraria e destinado a garantir, que os seus Advogados possam assegurar a realização da totalidade dos serviços das Demandas, nos termos previstos no CPSJ, e receber os honorários que lhe são devidos pela B... (o "Financiamento”).

Nos termos do ponto 1.1.2 "(...) a financiadora aceita a responsabilidade de ter a seu cargo a gestão do Financiamento pretendido pela a B..., para apoio da sua tesouraria e para garantir que os seus advogados possam assegurar a totalidade dos serviços das Demandas, nos termos previstos no CPSJ, e receber os honorários que lhe são devidos pela B... ."

Tendo em conta os riscos envolvidos, a F... aceitou financiar os pretendidos 75% dos honorários, uma vez que a E... assumiu a responsabilidade de pagar o remanescente, à B..., conforme contrato de financiamento de litígio celebrado entre F... limited, e A..., SP. RL.

Em conformidade com o ponto 4.2.7.7.1 do contrato de financiamento "Com os valores objeto do financiamento, a Financiadora devera contribuir para a provisão inicial, a que se refere o CPSJ, celebrado entre a B... e as Clientes, no valor de setenta e cinco mil euros (€ 75.000,00), a ser paga na data da assinatura do presente contrato."

Acresce que, em conformidade com o ponto 4.2.7.7.2 "A B... poderá solicitar reforços de provisão inicial, sempre que está apresente um saldo igual ou inferior a vinte e cinco por cento (25%) do seu valor inicial.

(Ver anexo 6)

Assim, decorrente do contrato de financiamento de litígio a F... efetuou para B..., as transferências identificadas no quadro seguinte.

 

Data Mov.

 

Descrição do Movimento

Valor em EUR

27/12/2018

OPR N° …- F…LTD (MALTA)

75 000,00

14/10/2019

OPR N° …- F…LTD (MALTA)

10 000,00

15/01/2020

OPR N° …- F… LTD (MALTA)9

4 061,71

07/01/2021

OPR N° … - F… LTD

32 542,50

01/02/2021

OPR N°…- F… LTD

27 345,00

26/03/2021

OPR N° …- F… LTD

86 624,02

12/11/2021

OPR N°…- F…

6 418,28

04/01/2022

TRF CRED NAO SEPA+ RECEBIDA ...

65 002,90

(Ver anexo 7) 

Apesar de constar no contrato que "(...) o Financiamento pretendido pela a B..., é para apoio da sua tesouraria e para garantir que os seus advogados possam assegurar a totalidade dos serviços das Demandas," a maior parte dos pagamentos ocorreu posteriormente à realização dos serviços e a emissão das faturas a F..., LIMITED, conforme evidenciado no quadro seguinte.

 

Número Documento

NIF  Emitente

PaísAdquirente

Adquirente Internacional

Data de Emissão

Tipo do Documento

BaseTributável

 

IVA

 

Total

Transferência de

NDD2019/12

...

MT

...

2019-11-06

ND

244,73

0,00

244,73

15/01/2020

NDD2019/13

 

MT

 

2019-11-13

ND

244,73

0,00

244,73

NDD2019/16

 

MT

 

2019-11-13

ND

2 685,00

0,00

2685,00

NDD2019/14

 

MT

 

2019-11-13

ND

831,05

0,00

831,05

NDD2019/17

 

MT

 

2019-11-29

ND

50,00

0,00

50,00

NDD2019/20

 

MT

 

2019-12-05

ND

6,20

0,00

6,20

        Total

4061,71

 

4061,71

 

(...)

De harmonia com as declarações prestadas, o significativo atraso na faturação dos 75% financiados por esta empresa deve-se ao facto de no decorrer do processo, a F... ter procurado negociar, com a sociedade de advogados, condições especiais para a prestação dos serviços, visando a minimização dos correspondentes custos.

Nestas faturas o sujeito passivo não procedeu à liquidação de imposto, sendo que nos subpontos do ponto 4.2.7.6 - imposto sobre o Valor Acrescentado do contrato de financiamento de litígio e referido.

4.2.7.6.1- Como se trata de um financiamento e não do pagamento direto de custos, da B..., a Financiadora não deve estar sujeita ao pagamento do imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA);

4.2. 7.6.2- Caso a Autoridade Tributaria e Aduaneira de Portugal entenda que o Financiamento está sujeito ao IVA, a Financiadora devera reter o valor do IVA, e a B... deverá fazer a sua entrega ao estado Português, com recursos próprios.

De referir também que, em conformidade com o ponto 3 do anexo n.º 1 ao contrato de prestação de serviços jurídicos no qual são indicadas condição especiais de pagamento e referido:

 

a. No interesse e a pedido do cliente, a B... concordou em emitir as suas faturas, nos seguintes termos:

i) As faturas correspondentes aos honorários serão emitidas pelo valor de setenta e cinco euros (€ 75,00) por hora de trabalho, até a decisão final;

ii)  As faturas correspondentes às despesas serão emitidas pelo seu valor total,

b. 0 Cliente obriga-se a pagar a parte restante dos honorários, ou seja, duzentos e vinte cinco euros (€ 225,00)[3], até a data do trânsito em julgado da decisão final, caso esta seja favorável ao Cliente;

c. Caso a decisão final não seja favorável, a B... renuncia, desde já, ao seu direito de faturar, ao cliente, a parte dos honorários devidos e ainda não pagos.

d. Por acordo estabelecido, entre as empresas que integram o Cliente, os valores, a que se referem as alíneas anteriores, são da responsabilidade, exclusiva, da E..., pelo que a B... apenas as poderá cobrar a esta empresa, em nome de quem emitirá as correspondentes faturas.

E nos termos do n.º 6 do mesmo contrato o qual respeita a pagamento dos Honorários e despesas é estipulado que:

a.         Nos termos do acordado, em face dos números anteriores, do valor hora dos honorários e despesas, a E... pagará vinte e cinco por cento (25%) e a F... Financiará a B... dos restantes setenta e cinco por cento (75%);

b.         A título de provisão, para honorários e despesas, a E... e a F... deverão pagar em conjunto e proporcionalmente as respetivas responsabilidades, a quantia de cem mil euros

(€ 100.000,00), até à data da entrada, no tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, da Petição

inicial da Ação Administrativa;

c.         As faturas, emitidas pela B..., deverão ser pagas, pela E..., nos seguintes termos e condições:

1)        As faturas emitidas, referentes aos serviços prestados, até à data do trânsito em julgado da decisão final, ou da homologação do acordo a que as partes tenham chegado, deverão ser pagas, pela E..., nos termos previstos nas condições gerais do Contrato de Prestação de Serviços Jurídicos;

ii) Em caso de sucesso, a B... fica autorizada a emitir, a favor da E..., uma fatura correspondente às quantias objeto do financiamento, entretanto, efetuado pela F..., que deverá ser paga até ao trigésimo (30') dia subsequente ao da extinção da instância judicial.

 

Em caso de não sucesso, o cliente não terá de fazer qualquer pagamento adicional, à B..., para além dos honorários, à taxa reduzida de setenta e cinco euros (€ 75,00) por hora, e as despesas, na sua totalidade, objeto do presente Aditamento;

(Ver anexo 2)

Face ao exposto, constata-se que em caso de não sucesso[4] as importâncias recebidas da F... a título de financiamento, (75% do valor dos serviços prestados), constituem o pagamento de 75% do valor dos serviços prestados pela B... ao Cliente.

Portanto, em caso de sucesso ou insucesso a B... é sempre remunerada pelos serviços prestados.

 

Decorrente das negociações referidas nos pontos anteriores a B... emitiu:

•          à E... Ltd as faturas identificadas no Quadro I.

QUADRO I

NúmeroDocumento

NIF

Emitente

PaisAdquirente

Adquirentelnternacional

Data deEmissão

Tipo doDoc.

 

Referente a

 

Honorários 

 

Despesas

 

Total

Contabilizaçãoo honorários

Contabilizaçãodespesas

(1)

(2)

(3)

(4)

(5)

(6)

(7)

(8)

(9)

(10)

(11)

(12)

 

FA 2018/17

...

 

MT

...

 

2018-11-20

 

FT

Ação administrativa -

consórcio ...

 

0,00

 

2 244,00

 

244,00

 

 

 

FA 2018/18

 

 

MT

 

 

2018-11-30

 

FT

Ação administrativa -

Consórcio...

 

33187,50

 

2 699,60

 

35 887,10

 

72121-HMI

 

72123-DMI

 

FA 2019/3

 

 

MT

 

 

2019-02-28

 

FT

Ação administrativa -

Consórcio ...

 

2 660,00

 

456,00

 

3116,00

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

 

FA 2019/5

 

 

 

MT

 

 

 

2019-02-28

 

 

FT

Ref. Processojuridico providencia

cautelar

 

 

 

 

306,00

 

 

 

 

FA 2019/6

 

 

 

MT

 

 

 

2019-02-28

 

 

FT

Ref. Processojuridico providencia

cautelar

 

 

 

 

306,00

 

 

FA 2019/7

 

MT

 

2019-02-28

FT

 

 

 

122,40

 

 

 

FA 2019/17

 

 

MT

 

 

2019-06-03

 

FT

Ação administrativa -Cons6rio...

 

6 650,00

 

111,60

 

6 761,60

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

 

FA 2019/18

 

 

 

MT

 

 

 

2019-06-03

 

 

FT

Ref. Processojuridico providenciacautelar

 

 

6141,25

 

 

337,80

 

 

6 479,05

 

 

72121-HMI

 

 

72123 - DMI

 

FA 2019/20

 

 

MT

 

 

2019-07-08

 

FT

Ação administrativa -

Cons6rio ...

 

2 905,00

 

95,40

 

3 000,40

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

 

FA 2019/21

 

 

 

MT

 

 

 

2019-07-08

 

 

FT

Ref. Processojuridico providencia

cautelar

 

 

7 451,25

 

 

294,60

 

 

7745,85

 

 

72121-HMI

 

 

72123 - DMI

 

FA 2019/24

 

 

MT

 

 

2019-08-02

 

FT

Ação administrativa -

Consório ...

 

1 236,25

 

0,00

 

1 236,25

 

72121-HMI

 

 

 

FA 2019/25

 

 

 

MT

 

 

 

2019-08-02

 

 

FT

Ref. Processojuridico providenc,a

cautelar

 

 

303,75

 

 

118,80

 

 

422,55

 

 

72121-HMI

 

 

72123 - DMI

 

FA 2019/36

 

 

MT

 

 

2019-11-05

 

FT

Ação administrativa -

Cons6rio...

 

408,75

 

13,20

 

421,95

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

 

FA 2019/37

 

 

 

MT

 

 

 

2019-11-05

 

 

FT

Ref. Processo

juridico providenciacautelar

 

 

7 143,75

 

 

465,00

 

 

7 608,75

 

 

72121-HMI

 

 

72123 - DMI

 

 

FA 2019/45

 

 

 

MT

 

 

 

2019-12-30

 

 

FT

Ref. Processojuridico providenc,a

cautelar

 

 

12 065,00

 

 

430,80

 

 

12 495,80

 

 

72121-HMI

 

 

72123 - DMI

 

FA 2020/6

 

 

MT

 

 

2020-03-02

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

2 895,00

 

199,85

 

3 094,85

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

FA 2020/16

 

 

MT

 

 

2020-07-09

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

5 100,00

 

1 476,20

 

6 576,20

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

FA 2020/18

 

 

MT

 

 

2020-08-05

 

FT

Processo -Providencia cautelar

 

17 741,25

 

15,60

 

17 756,85

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

FA 2020/21

 

 

MT

 

 

2020-09-02

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

1 306,25

 

288,20

 

1 594,45

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

FA 2020/25

 

 

MT

 

 

2020-10-02

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

1 871,25

 

114,83

 

1 986,08

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

FA 2020/28

 

 

MT

 

 

2020-12-18

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

42,50

 

4,20

 

46,70

 

72121-HMI

 

72123- DMI

 

FA 2021/18

 

 

MT

 

 

2021-05-04

 

FT

Processo ref. A

providencia cautelar

 

201,25

 

25,20

 

226,45

 

72121-HMI

 

72123 - DMI

 

 

(...)

Anexam-se, também relativamente aos anos 2018, 2019, 2020 e 2021, cópia dos extratos das contas:

·      72121 – Honorários – Mercado Intracomunitário (anexo 9) 

·      72123 – Despesas – Mercado intracomunitário (anexo 9) 

·      À F... as faturas identificadas no quadro II.

 

QUADRO II

Faturas

Contabilização

NllmeroDocumento

NIF

Emitente

PaisAdqui.

AdquirenteInternacional

Data deEmissão

TipoDoc,

Descrição

Total

Anexo

Data

Conta

Descrição

FAA2018/10

...

MT

...

2018-12-27

FT

Adiantamento

75 000,00

10

 

 

 

FAA2019/10

 

MT

 

2019-10-14

FT

Adiantamento

10 000,00

 

 

 

 

 

 

 

FA 2020/33

 

 

 

 

MT

 

 

 

 

2020-12-29

 

 

 

FT

According tolitigationFunding ,AgreementProcessnumber0040,009

(2018)

 

 

 

107 542,50

 

 

 

10

 

 

 

31/12/2018

 

 

 

72121 - Honorários Ml

 

 

 

Acréscimos de proveitos-E... - Contrato F...

 

 

 

FA 2020/34

 

 

 

 

MT

 

 

 

 

2020-12-29

 

 

 

FT

According tolitigationFundingAgreementProcess

number0040,009

(2019)

 

 

 

27 345,00

 

 

 

10

 

 

 

30/12/2019

 

 

 

72121 - Honorários Ml

 

 

 

Acréscimos de proveitos – E...- Contrato F...

 

 

 

FA 2020/35

 

 

 

 

MT

 

 

 

 

2020-12-29

 

 

 

FT

According tolitigationFundingAgreementProcess

number

0040,010

(2019)

 

 

 

63 142,50

 

 

 

10

 

 

 

29/12/2020

 

 

 

72121 – Honorários Ml

 

 

 

F...

 

 

 

FA 2020/36

 

 

 

 

MT

 

 

 

 

2020-12-29

 

 

 

FT

According tolitigationFunding .AgreementProcessnumber0040,010

(2020)

 

 

 

86 868,75

 

 

 

10

 

 

 

29/12/2020

 

 

 

72121 - Honorários Ml

 

 

 

F...

FA 2021/10

 

MT

 

2021-02-23

FT

 

5 487,68

 

31/12/2020

72123 - Despesas Ml

Acréscimos rendimentos F...

FA2021/11

 

MT

 

2021-02-23

FT

 

816,00

 

 

72123 - Despesas Ml

 

FA 2021/14

 

MT

 

2021-04-21

FT

 

4 080,00

 

 

72123 - Despesas Ml

 

FA 2021/15

 

MT

 

2021-04-22

FT

 

1 860,40

 

 

72123 - Despesas Ml

 

FA 2021/16

 

MT

 

2021-04-29

FT

 

1173,00

 

 

72123 -Despesas Ml

 

 

As duas primeiras respeitam a adiantamentos (em conformidade com a contabilização) as 5 últimas respeitam a despesas e as restantes respeitam ao acordo de financiamento de 75% do valor dos honorários.

 

V.1.1.3 - PRESTACOES DE SERVIÇOS - MOMENTO DA EXIGIBILIDADE DO IMPOSTO

 

Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º do CIVA, estão sujeitas a imposto sabre o valor acrescentado, as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal.

Nestes termos, determina a alínea b) do n° 1 do artigo 7° do citado Código que, relativamente as prestações de serviços, o facto gerador do imposto ocorre no momento da sua realização (conclusão).

Não obstante a referida disposição, o n° 3 do mesmo artigo 7° estabelece que "Nas transmissões de bens e prestações de serviços de carácter continuado, resultantes de contratos que deem lugar a pagamentos sucessivos, considera-se que os bens são postos à disposição e as prestações de serviços são realizadas no termo do período a que se refere cada pagamento, sendo o imposto devido e exigível pelo respetivo montante".

 

lsto significa que, nestes casos (prestação de serviços de carácter continuado), o imposto é devido e exigível no termo do período a que se refere cada pagamento, considerando-se este o momento em que os bens são postos a disposição e as prestações de serviços são realizadas.

De referir que a norma legal que introduz o conceito de prestações de serviços de carácter continuado, condiciona a sua assunção à existência de um contrato prévio entre o prestador e o cliente, do qual resulte o carácter continuado do serviço contratado e se encontre acautelada a forma de pagamento no tempo.

Ora, as operações em causa têm perfeito enquadramento no n° 3 do artigo 7° do CIVA, nomeadamente, porque se está em presença de um contrato de prestação de serviços entre a B... e o seu cliente, do qual resulta o carácter continuado dos serviços contratados, encontrando-se ali acautelados os correspondentes momentos de pagamento.

Acresce que o n.º 9 deste mesmo artigo releva que, no caso destas prestações de serviços não fixarem periodicidade de pagamento ou esta for superior a 12 meses, o imposto é devido e torna-se exigível no final de cada período de 12 meses, pelo montante correspondente.

Observando-se ainda na presente situação, a obrigatoriedade de emissão de fatura ou documento equivalente nos termos do artigo 29°, n° 1, alínea b) do CIVA, e que esta, por força do disposto no n° 1 do artigo 36° do mesmo C6digo, deve ocorrer o mais tardar no 5° dia útil seguinte ao do momento em que o IVA é devido nos termos do artigo 7°, a exigibilidade do imposto ocorre no momenta da emissão da fatura se o referido prazo for respeitado ou, não o sendo, no momento em que termina [artigo 8°, n°1, alíneas a) e b)].

(...)

Refira-se também que o n.º 1 do artigo 16.º do CIVA inclui, no âmbito de incidência do IVA, qualquer contraprestação relativa a transmissões de bens ou prestações de serviços sujeitas a imposto, seja essa contraprestação obtida do adquirente dos bens, do destinatário dos serviços ou de um terceiro.

Assim sendo:

V.1.1.3.1         - PRESTACOES NÃO FATURADAS AO CLIENTE- IMPOSTO NÃO LIQUIDADO

 

Conforme já referido, para defesa dos interesses das empresas que constituem o Consórcio ...perante os Tribunais Portugueses, as clientes (consorciadas do consórcio...) celebraram com a B..., em 01.10.2018, um contrato de prestação de serviços jurídicos (o "CPSJ").

Serviços esses localizados em território nacional, conforme exposto no ponto V.1.1.1 do presente relatório, com enquadramento no n° 3 do artigo 7° do CIVA, como também já mencionado, tendo sido assinado um Contrato de Financiamento de Lítigio para apoio da tesouraria, destinando-se a garantir que os Advogados da B... possam assegurar a realização da totalidade dos serviços das Demandas, nos termos previstos no CPSJ.

Deste modo, em conformidade com as notas de honorários anexas às faturas emitidas à F..., evidenciadas no quadro infra, foram prestados serviços jurídicos entre os dias 22/08/2018 e 29/10/2020. 

 

Fatura N.0

Data

Serviços realizados entre

Valor

 

FA2020/33

 

29/12/2020

 

22/08/2018 a 17/12/2018

 

107 542,50

Em sede de IRC Rendimento em 2018

107 542,50

FA2020/34

29/12/2020

04/03/2019 a 24/10/2019

27 345,00

FA2020/35

29/12/2020

08/02/2019 a 31/10/2019

63 142,50

Em sede de IRC Rendimento em 2019

90 487,50

FA2020/36

29/12/2020

10/02/2020 a 29/10/2020

86 868,75

Em sede de IRC Rendimento em 2020

86 868,75

(Ver anexo 10)

 

Face a regra de exigibilidade prevista no n.º 3 e n.º 9 do artigo 7.º do CIVA o imposto é devido e torna­ se exigível no final de cada período de 12 meses, pelo montante correspondente.

Assim,

•          Os serviços realizados entre 22/08/2018 e 22/08/2019 deviam ter sido faturados até ao 5° dia útil seguinte, portanto em agosto de 2019.

•          Os serviços realizados entre 23/08/2019 e 23/08/2020 deviam ter sido faturados até ao 5° dia útil seguinte, logo no final de agosto de 2020.

•          Os serviços realizados entre 24/08/2020 e 24/08/2021 deviam ter sido faturados até ao 5° dia útil seguinte, portanto no final agosto de 2021.

 

0 imposto não liquidado, relativamente às prestações de serviços não faturadas ao cliente nos períodos de 2019-08, 2020-09T e 2021-09T totaliza € 40.368,11, € 23.890,91 e € 1.267,70,

respetivamente, conforme quadro infra.

 

V.1.1.3.2- PRESTAÇÕES FATURADAS AO CLIENTE E...-IMPOSTO NÃO LIQUIDADO

Atendendo a que a B... prestou ao cliente serviços jurídicos, localizados em território nacional, conforme exposto no ponto V.1.1.1 do presente relatório, e tendo em atenção as normas consagradas no CIVA, nomeadamente no que concerne quanto ao enquadramento no n° 3 do artigo 7.º do CIVA das operações em causa e, consequentemente, ao momento em que ocorre o facto gerador, a exigibilidade do imposto e a obrigação de faturação (constantes respetivamente, dos artigos 7.º e 8° alínea a) do n.º1 do art.º 29.º do CIVA), verifica-se a falta de liquidação de imposto no montante de € 25.141,30, conforme evidenciado no Quadro infra.

QUADROIV

NúmeroDocumento

NIF

Emitente

PaisAdquirente

Adquirente

lnternacional

Data deEmissão

Tipo doDoc.

 

Referente a

 

Honorários

 

Despesas

 

Total

 

IVA

(1)

(2)

(3)

(4)

(5)

(6)

(7)

(8)

(9)

(10)

(11)=(8) X 23%

 

FA2018/18

 

 

 

MT

 

 

 

2018-11-30

 

FT

Ação Administrativa  -

Consórcio...

 

33 187,50

 

2 699,60

 

35 887,10

 

7 633,13

Total 2018-12T

33 187,50

2 699,60

35 887,10

7 633,13

 

FA2019/3

 

 

 

MT

 

 

 

2019-02-28

 

FT

Ação Administrativa  -

consórcio ...

 

2 660,00

 

456,00

 

3 116,00

 

611,80

Total 2019-02

2 660,00

456,00

3116,00

611,80

 

FA 2019/17

 

 

MT

 

 

 

2019-06-03

 

FT

Ação Administrativa  -

consórcio ...

 

6 650,00

 

111,60

 

6 761,60

 

1 529,50

 

FA2019/18

 

 

MT

 

 

 

2019-06-03

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

6 141,25

 

337,80

 

6 479,05

 

1 412,49

Total 2019-06

12 791,25

449,40

13 240,65

2 941,99

 

FA 2019/20

 

 

MT

 

 

 

2019-07-08

 

FT

Ação Administrativa  -

consórcio ...

 

2 905,00

 

95,40

 

3 000,40

 

668,15

 

FA2019/21

 

 

MT

 

 

 

2019-07-08

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

7 451,25

 

294,60

 

7 745,85

 

1 713,79

Total 2019-07

10 356,25

390,00

10 746,25

2 381,94

 

FA 2019/24

 

 

MT

 

 

2019-08-02

 

FT

Ação Administrativa  -

consórcio ...

 

1 236,25

 

0,00

 

1 236,25

 

284,34

 

FA 2019/25

 

 

MT

 

 

2019-08-02

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

303,75

 

118,80

 

422,55

 

69,86

Total 2019-08

1 540,00

118,80

1 658,80

354,20

 

FA2019/36

 

 

MT

 

 

2019-11-05

 

FT

Ação Administrativa  -

consórcio ... 

 

408,75

 

13,20

 

421,95

 

94,01

 

FA2019/37

 

 

MT

 

 

2019-11-05

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

7 143,75

 

465,00

 

7 608,75

 

1 643,06

Total 2019-11

7 552,50

478,20

8 030,70

1 737,08

 

FA 2019/45

 

 

 

MT

 

 

2019-12-30

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

12 065,00

 

430,80

 

12 495,80

 

2 774,95

Total 2019-12

12 065,00

430,80

12 495,80

2 774,95

 

FA 2020/6

 

 

 

MT

 

 

 

2020-03-02

 

FT

Processo -Providencia cautelar

 

2 895,00

 

199,85

 

3 094,85

 

665,85

Total 2020-03T

2 895,00

199,85

3 094,85

665,85

 

FA 2020/16

 

 

MT

 

 

2020-07-09

 

FT

Processo -Providencia cautelar

 

5 100,00

 

1 476,20

 

6 576,20

 

1 173,00

 

FA 2020/18

 

 

MT

 

 

2020-08-05

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

17 741,25

 

15,60

 

17 756,85

 

4 080,49

 

FA 2020/21

 

 

MT

 

 

 

2020-09-02

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

1 306,25

 

288,20

 

1 594,45

 

300,44

Total 2020-09T

24 147,50

1 780,00

25 927,50

5 553,93

 

FA 2020/25

 

 

MT

 

 

2020-10-02

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

1 871,25

 

114,83

 

1 986,08

 

430,39

 

FA 2020/28

 

 

MT

 

 

2020-12-18

 

FT

Processo -

Providencia cautelar

 

42,50

 

4,20

 

46,70

 

9,78

Total 2020-12T

1 913,75

119,03

2 032,78

440,16

FA 2021/18

 

MT

 

2021-05-04

FT

 

201,25

25,20

226,45

46,29

Total 2021-06T

201,25

25,20

226,45

46,29

Total

109 310,00

7 146,88

116 456,88

25 141,30

 

V.1.1.3.3 IMPOSTO NÃO LIQUIDADO 

Em face das correções propostas nos pontos anteriores o imposto não liquidado ascende a €90.668,01, conforme quadro infra.

IMPOSTO NÃO LIQUIDADO

 

Período

QUADRO RESUMO

 

Total

Quadro Ill

Quadro IV

2018-12T

 

7 633,13

7 633,13

2019-02

 

611,80

611,80

2019-06

 

2 941,99

2 941,99

2019-07

 

2 381,94

2 381,94

2019-08

40 368,11

354,20

40 722,31

2019-11

 

1 737,08

1 737,08

2019-12

 

2 774,95

2 774,95

Total até 2019-12

40 368,11

18 435,08

58 803,18

2020-03T

 

665,85

665,85

2020-09T

23 890,91

5 553,93

29444,83

2020-12T

 

440,16

440,16

2021-06T

 

46,29

46,29

2021-09T

1 267,70

 

1 267,70

Total ate 2021-09T

25158,61

6 706,23

31 864,83

Total

65 526,71

25141,30

90 668,01

 

V.1.1.3.4-Períodos caducados - Anos 2018 e 2019

Aqui chegados, quanto ás correções propostas para os períodos de imposto anteriores a 2020, importa ter presente que, nos termos do n.º 3 do art.º 45° da LGT - Lei Geral Tributária, em caso deter sido efetuado reporte de prejuízos, bem como de qualquer outra dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.

0 que significa que é permitido a AT sindicar a legitimidade do direito ao crédito inscrito no campo 61 da primeira declaração periódica liquidável (no presente caso, 2020-03T), e conduzir a nova liquidação de imposto neste período, se se verificar que esse crédito não é legítimo.

Ou seja, relativamente a um crédito de imposto que se mostra indevido, a AT não está limitada ao prazo de caducidade do direito a liquidação que e de quatro anos (nos termos do preconizado no n.º 1 do art.º 45.º da LGT), podendo efetuar correções ás declarações dos sujeitos passivos, relativas a todo o período de tempo a que se reporta o reembolso, mesmo que anteriores àquele prazo de caducidade.

Também, como decorre do preceituado no n.º 8 do art.º 22 do CIVA, os reembolsos de IVA são efetuados - quando devidos - isto é após a confirmação, no momento em que se vai apreciar um pedido de reembolso, de que no período a que ele se refere a dedução total de imposto a que haja lugar supera o montante total devido pela totalidade das operações tributáveis.

No caso em apreço estamos na presença de um crédito (incrementado período a período desde 2012- 12T) que sucessivamente influenciou (por comunicação entre liquidações operada por via do campo 61 da declaração periódica) o resultado de cada apuramento subsequente sem nunca se esgotar (o crédito). Ora, não se esgotando o crédito acumulado (em qualquer dos períodos anteriores a 2020) entendemos que não esta precludido o direito de o sujeito passivo o utilizar nem, concomitantemente o direito da Administração Tributária sindicar a sua legitimidade.

 

Exposto o direito de analisar e corrigir períodos caducados procederemos ao Cálculo do valor a corrigir em face das correcções propostas nos pontos anteriores. As correcções propostas nos pontos anteriores totalizam € 58.803, 18 conforme quadro resumo abaixo.

IMPOSTO NÂO LIQUIDADO

 

Período

QUADRO RESUMO

 

Total

Quadro Ill

Quadro IV

2018-12T

 

7 633,13

7 633,13

2019-02

 

611,80

611,80

2019-06

 

2 941,99

2 941,99

2019-07

 

2 381,94

2 381,94

2019-08

40 368,11

354,20

40 722,31

2019-11

 

1 737,08

1 737,08

2019-12

 

2 774,95

2 774,95

Total

40 368,11

18 435,08

58 803,18

 

Conforme referido a AT não está impedida de inviabilizar a utilização do crédito, não obstante formado em períodos anteriores, num período cuja liquidação esteja ao seu alcance. Trata-se da faculdade de sindicar a legitimidade do direito de crédito que o sujeito passivo invoca quando o inscreve no campo 61 da DP de um período ao alcance da liquidação pela AT.

Da análise realizada, campo a campo e período a período, foi identificado um conjunto de imperfeições (concretizadas pela dedução indevida de imposto), conforme evidenciado no quadro supra.

Resulta assim claro que o direito de crédito inscrito no campo 61 da Declaração periódica de 2020/03T está incrementado por uma parcela de crédito que não se mostra legítima, não podendo por isso ser considerada na liquidação daquele período.

De realçar que não se esta a propor a liquidação de valores apurados em períodos fora do alcance da liquidação, a proposta queda-se em desconsiderar, no direito de crédito que o sujeito passivo declarou ter por inscrição no campo 61 da DP 2020/03T, a parcela que se demostrou não ser legítima, inexistindo, como tal, qualquer liquidação em período caducado.

No caso em apreço, o sujeito passivo declarou um direito de crédito, por inscrição no campo 61 da DP relativa a 2020/03T, no montante de EUR 81.494,76 que se erige como limite global do ajustamento que as imperfeições detetadas podem provocar neste período (limite definido pelo direito de crédito inscrito no campo 61 da DP - por isso, crédito efetivamente utilizado neste período e ao alcance da liquidação pela AT). No entanto, o montante daquele direito de crédito consubstancia também o produto do somatório do resultado de cada uma das liquidações precedentes se desconsideradas, cada uma delas, da parcela de crédito de períodos anteriores, ou seja, liquidação dos valores apurados no período (cada período de per si) desprezando eventual parcela de crédito comunicada de período anterior par via do campo 61 da DP.

Assim, conformando as valores apurados período a período (valores indevidos) com o resultado da liquidação do respetivo período (comparação com o resultado que se obtém da liquidação das operações realizadas naquele período, ou seja, com desprezo de eventual montante de crédito transitado de período anterior) garante-se que a intervenção feita no período 2020/03T (resultado do somatório das imperfeições identificadas) se queda efetivamente no crédito que o sujeito passivo utilizou (indevidamente) e que nenhuma das imperfeiçoes, se ajustadas no período em que foram detetadas provocaria, nesse período, qualquer liquidação adicional, isto se ainda estivesse ao alcance da liquidação.

(...)

Assim, o valor do direito de crédito declarado pelo sujeito passivo por inscrição no campo 61 da DP relativa a 2020/03T, no montante de EUR 81.494,76 deverá ser corrigido da parcela considerada indevida, cifrada em EUR 14.988,40, passando assim para o valor de EUR 66.506,36. Deste modo, se elimina também o efeito que indevidamente projetou (esta parcela) nas liquidações subsequentes, que a comunicação realizada por via do campo 61 das Declarações periódicas permite.

 

V.1.1.3.5- Total de correção - Falta de liquidação de imposto

 

Consequentemente, o total das correções por falta de liquidação de imposto ascende a €

46.853,23, conforme quadro infra.

IMPOSTO NAO LIQUIDADO

 

Período

QUADRO RESUM 0

 

Total

Quadro Ill

Quadro IV

Total ate 2019-12

 

14 988,40

2020-03T

 

665,85

665,85

2020-09T

23 890,91

5 553,93

29 444,83

2020-12T

 

440,16

440,16

2021-06T

 

46,29

46,29

2021-09T

1 267,70

 

1 267,70

Total ate 2021-09T

25 158,61

6 706,23

31 864,83

Total

25 158,61

6 706,23

46 853,23

 

V.1.2   - Regularizações de deduções relativas a imóveis não utilizados em fins empresariais

Conforme já referido a A...- Sociedade de Advogados, SP, RL e uma sociedade de Advogados, sendo a sua atividade restrita ao exercício de Advocacia, a qual iniciou a atividade em 09/07/2012 na Rua ... ... em Lisboa.

Atualmente, exerce a atividade num espaço de escritórios arrendado sito na Rua..., n.º..., ...-... em ... .

Ao longo do tempo o sujeito passivo celebrou diversos contratos de arrendamento. Entre outros, foi arrendado o prédio sito na Rua ... N.º..., em Lisboa (anexo 11).

Em 2015 e 2019 efetuou obras neste imóvel conforme evidenciado no quadro V (anexo 12) e nos respetivos orçamentos/propostas (anexo 13).

QUADRO V

N.0Doc.

NIF

Emitente

NIF

Adquirente

Data

Tipo

Descricao

Valor

Anexo

Doc.

Anexo

Orçamentos

 

FAC A/244

 

2015-07-15

 

FT

Obra: Rua ... N.01- Valor de adjudicação (40%), conforme nossa proposta n.0

35/2015

 

1 995,01

 

12

 

13

 

FAC A/253

 

 

 

2015-07-17

 

FT

Obra: Rua ... N.01- 4° Valor deadjudicação (40%), conforme nossa proposta n.0

365/2014

 

276,23

 

12

 

13

 

 

FAC A/294

 

 

 

 

2015-08-20

 

 

FT

Obra: Rua ... N.01- Copa Pisa 4Valor de  adjudicação (60%),conforme

nossa proposta n.0 35/2015

 

 

2 992,51

 

 

12

 

 

13

 

FAC A/295

 

 

 

2015-08-20

 

FT

Obra: Rua ... N.01- Pisa 4° -Valor de trabalhos efetuados conforme nossa

proposta n.0365/2014

 

414,34

 

12

 

13

 

 

FT A/1498

 

 

 

 

2019-07-05

 

 

FT

 

Obra - Rua ... n.4° Frente - Valor de  adjudicação (40%) cf.Proposta

257/2019, exceto item 6,2

 

 

9 653,48

 

 

12

 

 

13

 

 

FT A/1554

 

 

 

 

2019-08-07

 

 

FT

Obra Rua ... n.4° Frente -Valor de trabalhos efetuados (30%) cf.

Proposta n.0 257/2019

 

 

7 240,11

 

 

12

 

 

13

 

 

FT A/1600

 

 

 

 

2019-09-12

 

 

FT

Obra Rua ... n.4° Frente-Valor de trabalhos efetuados cf.

Proposta n.0 257/2019

 

 

5 318,42

 

 

12

 

 

13

 

 

FT A/1645

 

 

 

 

2019-10-02

 

 

FT

Obra Rua ... n.4° Frente-Valor de trabalhos efetuados de civil cf.

Item 5,6 da proposta 257/2019

 

 

1 790,97

 

 

12

 

 

13

 

 

FT A/1681

 

 

 

 

2019-10-22

 

 

FT

Obra Rua ... n.4° Frente-Valor de trabalhos efetuados cf.

Proposta n.0 599/2019

 

 

518,33

 

 

12

 

 

13

Total

30 199,40

 

 

As obras efetuadas em 2015 foram declaradas no campo 102 das respetivas D.P.s e a dedução do IVA autoliquidado foi contabilizada a debito da conta 24323132371 - Obs Tx. Nm. Autoliquidação - TT/Ded e inscrita no campo 24 das D.P's (anexo 14).

Relativamente as obras realizadas em 2019, contrariando o disposto na alínea j) do n.º 1 do art.º 2 do CIVA o sujeito passivo não procedeu à autoliquidação.

Em conformidade com o disposto no n.º 14 do art.º 78° do CIVA "Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços e os correspondentes montantes não tenham sido incluídos na declaração periódica, originando a respetiva liquidação e dedução ou o tenham sido fora do prazo legalmente estabelecido, a liquidação e a dedução são aceites sem quaisquer consequências desde que o sujeito passivo entregue a declaração de substituição, sem prejuízo da penalidade que ao caso couber."

(...)

Em 03/01/2022 o sujeito passivo entregou o imóvel ao senhorio, sendo que o contrato foi denunciado com efeitos a partir de 01/01/2022, (anexo 15);

Ora, analisado o contrato de arrendamento[5] verifica-se que as benfeitorias efetuadas pelo inquilino ficam a fazer parte do local arrendado, sem que sobre as mesmas lhe assista qualquer direito de retenção e/ou indemnização.

Face ao exposto importa atender ao disposto no artigo 26.º do CIVA. Esta norma, de natureza especial face a regularização das deduções efetuadas quanto aos bens imóveis, está direcionada para as situações em que estes bens não são utilizados em fins da empresa durante um ou mais anos civis completos após o início do período de dezanove anos civis posteriores ao ano da ocupação e relativamente aos quais houve dedução do imposto.

Ou seja, o n.º 1 do artigo 26.º do CIVA prevê as situações em que o imóvel, relativamente ao qual houve dedução do imposto, não está a ser efetivamente utilizado pelo sujeito passivo ou que, sendo utilizado, e-o em fins alheios a empresa durante 1 ou mais anos civis completos.

Com efeito, o n.º 1 do artigo 26.º do CIVA estabelece que "(a) não utilização em fins da empresa de bens imóveis relativamente aos quais houve dedução do imposto durante um ou mais anos civis completos após o início do período de 19 anos referido no n.º 2 do artigo 24.º dá lugar a regularização anual de 1/20 da dedução efetuada, que deve constar da declaração do último período do ano a que respeita".

0 espírito da lei impõe que se inclua nesta norma não só a utilização temporária do imóvel relativamente ao qual houve dedução do imposto, como os casos da sua não utilização pura e simples, uma vez que o direito a dedução pressupõe a ligação da utilização dos bens com a atividade produtiva.

0 n.º 3 do artigo 26.º do CIVA prevê a obrigação de regularização da dedução inicialmente efetuada nas situações em que há cessação de atividade do sujeito passivo durante o período de regularização e que esta será efetuada nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do mesmo diploma.

As benfeitorias realizadas que, pela sua natureza, não possam ser levantadas sem detrimento do imóvel ficam pertença desse mesmo imóvel. Nessas situações, deixando o sujeito passivo de utilizar o imóvel onde realizou as benfeitorias, deixa também de se verificar a necessária ligação do imóvel com a sua atividade produtiva, pelo que a dedução do IVA suportado em tais despesas de investimento deve seguir as normas do n.º 1 do artigo 26.º do CIVA.

Deste modo, verificando-se no caso em análise que as instalações onde foram efetuadas as benfeitorias e relativamente as quais o imposto suportado em 2015 e 2019 foi deduzido deixaram de estar afetas a atividade tributada do sujeito passivo a partir de 01/01/2022 este devia ter procedido a regularização do imposto em função do número de anos do período de regularização ainda não decorridos, nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do CIVA.

(...)

Assim, o imposto a regularizar no período 2021-12T totaliza € 5.990,08, conforme evidenciado no quadro seguinte.

(...).

V.1.3- REGULARIZACAOES INDEVIDAS POR FALTA DE ENQUADRAMENTO NO N.º 3 DO ART.º

78.º DO CIVA

0 sujeito passivo celebrou, em 25/11/2019, com o Sr. C... o contrato de prestação de serviços jurídicos para prestação de apoio jurídico no processo de arbitragem – Proc. n.º .../2019/INS/AP- C... e outros Vs. K... e Outros (anexo 16).

Decorrente do contrato supra referido foram emitidos ao cliente diversos documentos. Entre outros foram emitidas as notas de crédito identificadas no quadro infra.

Número

Documento

NIF

Emitente

NIF

Adquirente

Data de Emissao

Tipo do

Documento

BaseTributável

IVA

Total

NCA 2021/11

2021-02-10

NC

898,52

206,66

1105,18

NCA 2021/12

 

2021-02-10

NC

4 065,04

934,96

5 000,00

Total

4 963,56

1141,62

105,18

 

(...)

Em conformidade com o declarado na D.P. do período 2021-03T as notas de crédito respeitam a regularizações abrangidas pelo art.º 78 n.º 3 do CIVA (anexo 17).

 

Nos termos do n.º 3 do art.º 78.º do CIVA "3 - Nos casos de faturas inexatas que já tenham dado lugar ao registo referido no artigo 45.º, a retificação é obrigatória quando houver imposto liquidado a menos, podendo ser efetuada sem qualquer penalidade até ao final do período seguinte aquele a que respeita a fatura a retificar, e é facultativa, quando houver imposto liquidado a mais, mas apenas pode ser efetuada no prazo de dais anos."

Portanto, para aplicação do número 3, necessário é, que subjacente à emissão destes documentos existam faturas inexatas.

Ora no caso em apreço, as faturas subjacentes, são exatas, porquanto foram emitidas por adiantamentos efetuados pelo Sr.  C... o qual a data dos factos e até 15/01/2020, apesar de ser não residente, tinha domicílio em Portugal (anexo 18). A partir desta data passa a ter domicílio em Luanda (anexo 18).

Relativamente as prestações de serviços de carácter transnacional, os critérios que determinam o lugar de tributação encontram-se definidos nas alíneas a) e b) do n.º 6 do art.º 6° do CIVA, de acordo com as quais, consideram-se localizadas e tributáveis em território nacional as prestações de serviços efetuadas a:

a)        Um sujeito passivo dos referidos no n.º 5 do artigo 2.º, cuja sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, se situe no território nacional, onde quer que se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador;

b)        Uma pessoa que não seja sujeito passivo, quando o prestador tenha no território nacional a sede da sua actividade, um estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, a partir do qual os serviços são prestados.

 

Nos termos da alínea c) do n.º 11 do art.º 6° do CIVA não obstante o disposto na alínea b) do n.º 6, não são tributáveis as prestações de serviços de consultores, engenheiros, advogados, economistas e contabilistas, e de gabinetes de estudo em todos os domínios, compreendendo os de organização, investigação e desenvolvimento, quando o adquirente for uma pessoa estabelecida ou domiciliada fora da Comunidade.

 

Número Documento

 

NIF

Emitente

 

NIF

Adquirente

 

Data de Emissão

 

Tipo do Documento

 

Base Tributável

 

IVA

 

Total

FAA 2019/11

2019-11-26

FT

4 065,04

934,96

5 000,00

FAA2019/12

 

 

2019-11-29

FT

4 065,04

934,96

5 000,00

Ora como na data dos factos o cliente (particular), apesar de ser não residente, tinha domicílio em Portugal, as operações são cá localizadas.

 

 

 

Face ao exposto, por falta de enquadramento no n.º 3 do art.º 78.º do CIVA foi indevidamente regularizado no campo 40 da D.P. do período 2021-03T IVA no valor de€ 1.141,62.

(...)”

 

  1. Em 01-08-2024 o sujeito passivo foi notificado nos termos do artigo 60.º da LGT e do Regime Complementar dos Procedimentos da Inspeção Tributária e Aduaneira, para querendo, no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição; 
  2. Em 08-09-2024, o sujeito passivo vem exercer o direito de audição descordando de parte das correções propostas, mas reconhecendo que há fundamento para a regularização da correção proposta no ponto V.1.2 do RIT; 
  3. O considerando K do Contrato de Financiamento de Litígio, outorgado entre a F... e A...– Sociedade de Advogados, S.P. RL (B...), estabelece o seguinte:  “Que na Sequência dos dados obtidos através da due diligence e da análise de risco efetuada a financiadora decidiu assumir a responsabilidade e assegurar a gestão do financiamento das demandas, e de conceder o financiamento à B... por si, ou através de financiamento de terceiros.” – Cfr. Anexo 6 junto com o RIT; - (Cfr. Anexo 6 junto com o RIT);       
  4. A cláusula 4.1 do Contrato de Financiamento de Litígio outorgado entre a F... e A... – Sociedade de Advogados, S.P. RL (B...), estabelece o seguinte:  “A financiadora fica obrigada a gerir o financiamento, quer este seja feito por si, quer seja feito por terceiras entidades” – (Cfr. Anexo 6 junto com o RIT);   
  5. No seu depoimento a testemunha L... referiu o seguinte: 

O Consórcio ... solicitou serviços da B... num processo que tinha a ver com terrenos mineiros. Participei neste processo quando foi preciso arranjar financiamento para a prestação de serviços jurídicos. (...) Na altura o cliente não tinha capacidade de pagar e a B... esteve envolvida na contratação deste financiamento. Não era um financiamento bancário, era um financiamento especial para processos em litígio. Cheguei a ver o contrato. A empresa chamava-se F... . O contrato levou muito tempo a ser fechado, primeiro pagaram uns adiantamentos e depois de fechado o contrato pediram-nos que emitíssemos faturas para nos pagarem o financiamento. Na altura questionei porque não seria suficiente um recibo pelo valor acordado, e responderam que, em termos fiscais, para Malta era preciso ter uma fatura. (...) Uma parte dos honorários pagava a E... (25%) e a F... pagava 75% a título de financiamento (...) se o processo tivesse sucesso esses 75% eram reembolsados na totalidade à financiadora acrescido de um sucess fee. Se não era o risco do negócio. A financiadora perderia esses valores. A B... não prestou serviços à F..., esta era financiadora. (...) A Área administrativa emitia os relatórios das prestações de serviços e por vezes a F... não financiava. As faturas eram pedidas pela F..., na altura foi um erro, mas a fatura tinha sempre uma nota de honorários anexa com os serviços prestados ao Consórcio. Estes ficheiros anexos só serviam de base para calcular o valor do financiamento, não eram serviços prestados às F....” – (vide, depoimento da testemunha).        

  1. Em 15-01-2025 a Requerente foi notificada das correções à liquidação do IVA constantes do RIT, o qual se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais com impacto na determinação do crédito de imposto da B..., nos termos seguintes: 
  2. Liquidação adicional de Imposto sobre o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) n.º ..., referente ao período de 2023/09T, no montante de € 28.056,26, por correção ao reporte de imposto para os períodos seguintes;
  3. Liquidação adicional de IVA n.º com o n.º 2025..., relativa ao exercício de 2024/03T, no montante de € 14.790,09 a pagar;
  4. Liquidação adicional de IVA n.º com o n.º 2025..., respeitante ao exercício de 2024/06T, no montante de € 14.790,09 a pagar.
  5. Em 08-07-2025 por Despacho do Sub-Diretor Geral da Área de Gestão Tributária dos Impostos Indiretos e Impostos Sobre Veículos (SDG-IVA-IEC-ISV), foi parcialmente revogado o ato de liquidação adicional n.º ..., na medida em que se considerou que a correção efetuada no valor de € 1.560,36, respeitava a correções relativas ao ano de 2020, que foram efetuadas em períodos de imposto caducados; – (cfr. Requerimento apresentado ao CAAD pela Requerida); 
  6. Em 13-03-2025, a Requerente procedeu ao pagamento do IVA liquidado, num total de €28.056,26, 
  7. Em Requerente apresentou no CAAD, em 02-04-2025, o presente Pedido de Pronúncia Arbitral.

 

2. Factos não provados

Não existem factos essenciais não provados, uma vez que, todos os factos relevantes para a apreciação do mérito da causa foram considerados provados.

 

3. Motivação da Matéria de Facto

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

A matéria de facto foi fixada por este Tribunal e a sua convicção fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos pelas Partes, cuja autenticidade não foi impugnada. Os depoimentos das testemunhas M... e N... não revestiram relevância autónoma, pois não demonstraram ter um conhecimento direto dos factos relevantes para os autos, designadamente os termos em que foi contratada a B... pelo consórcio ... e neste âmbito a que título eram realizadas as transferências financeiras entre a sociedade F... e a B... .  As testemunhas foram ambas funcionárias administrativas da B..., no entanto, não revelaram conhecimento direto dos contratos. Os depoimentos destas testemunhas limitaram-se a oferecer factos não essenciais, nalguns casos pouco precisos, e factos que se encontram provados por documentos ou que nem sequer se apresentam como controvertidos. Assim, relativamente às operações de financiamento do litígio que envolveu o Consórcio ..., as referidas testemunhas não revelaram ao Tribunal Arbitral dispor de elementos e razão de ciência relevantes. 

 

Quanto à testemunha L..., foi consultora financeira e fiscal da B..., ao longo de muitos anos, apoiando na parte contabilística e assessorando em processos legais que tivessem uma forte componente financeira como ocorreu no processo do Consórcio ... . A testemunha descreveu com pormenor a sua intervenção no contrato de financiamento celebrado com a F... . A testemunha descreveu alguns aspetos relativos à execução contratual, desde o seu início, processo que acompanhou, nomeadamente, como e porquê foram emitidas faturas àquela entidade, a base de cálculo que era utilizada para o financiamento, a monitorização dos pagamentos que foram feitos pela referida entidade à B..., referindo que os pagamentos teriam de estar conformes ao valor da prestação de serviços jurídicos a favor do consórcio, sendo financiado o valor de 75% dos honorários faturados à E... . Pese embora tenham sido emitidas faturas à F..., a pedido desta entidade, a testemunha reiterou em vários momentos do seu depoimento não terem sido prestados quaisquer serviços jurídicos ou de outra natureza à referida entidade, em consonância com a prova documental constante dos autos.  

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada. Não se deram como provadas, nem não provadas alegações feitas pelas Partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

 

V. Objeto dos autos – Matéria de Direito 

 

São impugnadas as liquidações adicionais de IVA relativas ao período 2023/09T, 2024/03T e 2024/06T. 

O procedimento de inspeção de âmbito interno foi realizado com base na Ordem de Serviço n.º OI2023..., com o objetivo de aferir a legitimidade do reembolso de IVA tendo sido iniciado a 9 de novembro de 2023 e concluído a 15 de janeiro de 2025, data em que foi notificado à Requerente.  A análise foi alargada ao período 2012/12-T, início da formação do crédito de imposto.  

A Requerente imputa às liquidações impugnadas os seguintes vícios: 

a)    Ilegalidade da ação inspetiva pelo facto da Inspeção Tributária de carácter interno se ter convertido em inspeção externa tendo uma duração superior a seis meses e não dando cumprimento à obrigação de fundamentação do alargamento da extensão temporal da inspeção; 

b)    Caducidade do direito à liquidação do IVA relativo a todas às faturas emitidas pela B... até 31 de dezembro de 2020; 

c)     Falta ou insuficiente fundamentação do RIT;

d)    Violação do dever de Segredo Profissional dos Advogados; 

e)    Inexistência de fundamentos para a liquidação de IVA à E...; 

f)     Inexistência de fundamentos para a liquidação de IVA à F...;

g)    Correções indevidas às regularizações de IVA no âmbito de imóveis utilizados para fins empresariais; 

h)    Correções às regularizações de IVA relativas ao cliente C... .

 

Matéria de Direito

 

a)    Ilegalidade da ação inspetiva pelo facto da Inspeção Tributária de carácter interno se ter convertido em inspeção externa tendo uma duração superior a seis meses e não dando cumprimento à obrigação de fundamentação do alargamento da extensão temporal da inspeção; 

 

Antes de prosseguir na análise do vício ora em questão, convém ter presente que a alegação da Requerente, nesta matéria, se desdobra em dois pontos relacionados entre si, a saber:

a)    A caducidade do direito à liquidação; 

b)    Incumprimento de formalidades procedimentais por violação do prazo de inspeção e manipulação da caracterização de atos de inspeção interna que correspondem a atos de inspeção externa.

 

Vejamos: 

Compulsada a matéria de facto dada como provada, a conclusão a tirar terá de ser a de que tudo indica que o procedimento inspetivo não observou os formalismos legais.

Com efeito, e no que diz respeito à observância do prazo do procedimento inspetivo é patente que AT ultrapassou o prazo legal de 6 meses, previsto no artigo 36.º do RCPITA sem ter notificado a Requerente da suspensão ou prorrogação desse prazo. 

Antes de mais, dispõe o artigo 2.º do RCPIT, no seu n.º 1, que:

«O procedimento de inspeção tributária visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infrações tributárias.»

No que diz respeito ao lugar da realização, o artigo 13.º do RCPITA esclarece que:

«Quanto ao lugar da realização, o procedimento pode classificar-se em:

a) Interno, quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos;

b) Externo, quando os atos de inspeção se efetuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso.»

Do acervo normativo que se vem de expor, resulta não só que o procedimento de inspeção tributária é finalisticamente vinculado (ou seja, só poderá ser instaurado tendo em vista a prossecução de determinadas finalidades), como também que o carácter interno ou externo do mesmo não poderá ser arbitrariamente fixado pela Administração Tributária, resultando antes da necessidade ou não de realizar atos de inspeção em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso.

Acresce que o sentido útil do artigo 13.º do RCPITA, mais do que um critério eminentemente geográfico, é o de distinguir os procedimentos inspetivos consoante impliquem ou não, a disponibilidade do sujeito passivo para interações, presenciais, telefónicas ou por e-mail (por exemplo), entre a AT e o sujeito passivo. Sem prejuízo do dever de colaboração recíproca, previsto no artigo 59.º da LGT, ser compatível com qualquer um dos tipos de procedimento inspetivo adotado, para a qualificação do procedimento não é indiferente a disponibilidade interativa do sujeito passivo.

Com efeito, quando a AT pede uma informação ou a disponibilização de elementos ao sujeito passivo pode fazê-lo de duas formas: ou fazendo deslocar o inspetor às instalações do sujeito passivo, ou solicitando essas informações por escrito utilizando os meios de comunicação usuais, que in casu, se traduziu num e-mail, enviado ao sujeito passivo a 27 de maio de 2024, após ter sido esgotado o prazo máximo de 6 meses a contar da notificação do seu início (9 de novembro de 2023).  

Ora, mesmo que o pressuposto da ordem de serviço da AT seja a de promover um “procedimento interno”, o procedimento que vier a ocorrer apenas será interno se, efetivamente, vier a preencher as previsões das normas que qualificam juridicamente os tipos de procedimentos e se algum ou alguns atos necessários para apurar os factos tributários foram praticados fora desses serviços, «total ou parcialmente», está-se perante um procedimento externo.”.

Veja-se neste sentido as decisões do CAAD proferidas nos processos n.º 468/2022-T, e no processo n.º 14/2012-T, onde se refere que “A inspeção só será qualificável como interna quando foi efetuada com base em documentos não obtidos através de atos inspetivos exteriores aos serviços.” (sublinhado nosso).[6]

Por conseguinte, nos termos da al. a) e b) do artigo 13.º, não terá ocorrido, de facto, um procedimento “exclusivamente interno”, na relação jus-tributária subjacente à inspeção, em razão da interação entre os sujeitos da relação jurídica contextualizada no procedimento, e que se concretizou, conforme a própria AT admite, em pedidos de documentos adicionais e esclarecimentos ao contribuinte, antes mesmo de ter sido concedido período de audição prévia.

Por outro lado, não procede o que sustenta a AT, no sentido de não serem aplicadas normas sobre prazos, aos procedimentos internos (artigo 53.º da resposta). Haverá sempre, naturalmente, limites para os prazos da inspeção (seja interna ou externa), nos termos da lei[7] e da proporcionalidade consagrada na Constituição da República Portuguesa (cf. artigo 266.º n.º 2 da CRP).

Ora, tendo em conta os critérios expostos, ter-se-á de considerar a ocorrência de um duplo vício de procedimento. Com efeito, contrariamente ao que sustenta a AT, ocorreu uma ação de inspeção externa, visando a Requerente, e adicionalmente não foi assegurada a formalidade de notificar a prorrogação do prazo ao sujeito passivo, para além dos 6 meses, em cumprimento dos requisitos de fundamentação (que são sindicáveis), para a prorrogação do prazo, nos termos do n.º 3 do artigo 36.º RCPITA. 

Assim de salientar, que a notificação da decisão de prorrogação do prazo do procedimento (ainda que, em abstrato, se tratasse de procedimento interno) é um requisito essencial e terá de ser fundamentada na concreta verificação dos requisitos previstos na lei. Ou seja, essa decisão terá de ser sindicável, sendo certo que não existe um ato tácito, de prorrogação automática, considerando os requisitos que devem ser verificados, nos termos do artigo 130.º CPA. Acresce referir que o procedimento de inspeção interno se caracteriza por uma maior celeridade atendendo à menor complexidade das matérias a inspecionar e fruto ainda de menores exigências formais. Ora, no caso dos autos, “os atos inspetivos tiveram início em 04/11/2023 com envio da notificação para a caixa correio eletrónica do sujeito passivo a solicitar elementos para efeitos de análise do reembolso de IVA” (vide, ponto II do RIT) e foi concluído com a notificação do RIT a 15 de janeiro de 2025.    

Termos em que, - via confissão da AT na sequência da alegação da Requerente, cfr. n.º 2 do artigo 574.º CPC (aplicável ex vi o artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT) –, não houve lugar à prorrogação do prazo da inspeção tributária, nem tão pouco se encontravam verificados os requisitos de que depende a possibilidade de prorrogação. 

Se não houve prorrogação do prazo do procedimento de inspeção, isso quer dizer que este caducou findo o prazo de 6 meses fixado no artigo 36.º, n.º 2 do RCPITA, ou seja, no caso dos autos, tendo a Requerente sido notificada no dia 9 de novembro de 2023, o procedimento de inspeção deveria ter sido concluído até dia 9 de maio de 2024, data a partir da qual a AT se encontra impedida de realizar atos externos (ou internos) de inspeção, nos termos do n.º 7 do artigo 36.º do RCPITA.

 

Ora, considerando os pressupostos da ordem de serviço para a realização do procedimento de inspeção e a realidade descrita, em que foram praticados atos externos de inspeção no âmbito de um procedimento interno, e ultrapassado o prazo limite para a inspeção, as subsequentes liquidações de imposto que vieram a ser emitidas pela AT são ilegais, nos termos dos artigos 268.º n.º 2 e 3 CRP e do Acórdão do STA, proc. n.º 01101/15, de 15-06-2016, relator: Ana Paula Lobo: 

I - Na pendência do procedimento de inspeção podem ser alterados os fins e a extensão daquele, posto que tal conste de despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado, o art.º 15.º, n.º 1 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (aprovado pelo art.º 1.º do Dec-Lei n.º 413/98, de 31 de Dezembro).

 

II - Verifica-se falta de fundamentação da decisão que determinou o alargamento da acção inspectiva quando foi alargado o âmbito da acção inspectiva, sem que disso fosse dado conhecimento ao contribuinte, pois diz-se «houve necessidade de alargar o seu âmbito» quando o art.º 42.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária apenas prevê que a notificação dos actos de inspecção possa ser efectuada ou no momento da prática dos actos de inspecção ou em momento anterior e nunca em momento posterior, como aqui ocorreu.

III - Tendo em conta, que o sujeito passivo, não foi devidamente notificado através de despacho fundamentado, da alteração dos fins, do âmbito e da extensão do procedimento inspectivo pela entidade que o ordenou, todas as conclusões referentes ao relatório de inspecção, relativas a tal alargamento são ilegais e, não poderão ter validade fiscal, nem fundamentar qualquer acto de liquidação. (sublinhado nosso). 

IV - São impugnáveis os actos lesivos praticados no procedimento inspectivo, por desconformes com a lei, ofendendo, em consequência disso, os princípios constitucionais da legalidade, da proporcionalidade e da necessidade, ao causar transtornos superiores aos que a realização do direito à tributação implicava, da imparcialidade na aplicação do princípio da proporcionalidade e da garantia do sujeito passivo em ser constrangido a um procedimento inspectivo confinado aos limites fixados na lei.”[8]

 

Decorre do exposto, que a informação obtida pela AT após 9 maio de 2024, remetida pela Requerente no e-mail de 5 de junho de 2024 (doc. n.ºs 52, 53 e 54 juntos com o PPA) não poderá ser utilizada para fundamentar os atos de liquidação adicional de IVA, sendo a falta de prova de tais factos valorada à luz das regras de distribuição do ónus da prova, conforme se analisará adiante. 

 

Para além do referido, a afetação dos direitos e garantias do sujeito passivo quando é objeto de atividade inspetiva poderá, como é evidente no caso concreto, ter consequências ao nível dos prazos de caducidade envolvidos e disciplinados pelos artigos 45.º e 46.º da LGT.

Como se escreveu no processo arbitral n.º 164/2013-T:

«tem-se por bom que, tal como expressamente se refere no preâmbulo do RCPIT, a regulamentação do procedimento de inspeção tributária visa “essencialmente a organização do sistema, e consequentemente a garantia da proporcionalidade aos fins a atingir, da segurança dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários e a própria participação destes na formação das decisões.»

Ou seja, a regulamentação do procedimento de inspeção tributária tem, em primeira linha, uma finalidade essencialmente organizatória (ordenatória) e, na perspetiva dos sujeitos passivos, visará essencialmente definir quais as condições em que os efeitos jurídicos próprios de tal procedimento se refletirão, eficazmente, na sua esfera jurídica, para além de assegurar a sua participação nas decisões que venham a ser tomadas.

Deste modo, a principal finalidade, sempre na perspetiva dos sujeitos passivos, da regulamentação do procedimento de inspeção tributária, e da respetiva observância pela AT, residirá na fixação dos condicionalismos legalmente necessários para que se reflitam eficazmente na esfera jurídica dos contribuintes os efeitos jurídicos próprios do procedimento em questão, maxime a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação dos tributos pela AT, nos termos do artigo 46.ºn.º 1 da LGT, bem como a sujeição dos visados às garantias e prerrogativas da inspeção tributária (artigos 28.º e 29.º do RCPITA), e à aplicação de medidas cautelares (artigos 30.º e 31.º do RCPITA).

Assim, e no seguimento do que se vem de expor, entende-se que a violação de normas reguladoras do procedimento de inspeção tributária terá como consequência adicional a de obstar a que ocorram determinados efeitos próprios daquele procedimento, como a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação de tributos[9], muito embora, no caso em apreço, tal consequência não assuma relevância autónoma, pois a AT qualificou o procedimento de inspeção como “interno”.  

Posto isto, cumpre em seguida avaliar a exceção perentória da caducidade das liquidações, invocada pela Requerente. 

 

b)    Caducidade do direito à liquidação do IVA relativo a todas as faturas emitidas pela B... até 31 de dezembro de 2020; 

 

Segundo a Requerente são invalidas as conclusões extraídas pela AT no RIT, bem como os atos de liquidação IVA daí resultantes, relativamente às faturas emitidas pela B... até 31 de Dezembro e 2020. 

Consequentemente, a Requerente considera inválidas, por força da verificação da caducidade, as seguintes liquidações feitas pela AT no RIT nos pontos V.1.1.3.3, V. 1.1.3.4, V.1.1.3.5, V. 1.2, e ponto V.1.3.

 

Vejamos. 

O artigo 45.º da LGT estabelece o seguinte, na redação posterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, no que aqui interessa:

«Artigo 45.º

Caducidade do direito à liquidação

1. O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.

 (...)

3 - Em caso de ter sido efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.

4. O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.»

 

Para este efeito, conforme resulta do RIT, a Requerente começa por invocar a caducidade do direito à liquidação do IVA nas faturas emitidas pela B... relativamente à sua cliente E..., e nas faturas emitidas no âmbito do contrato de financiamento de litígios celebrado com a empresa F..., no montante de € 20.924,56 

Adicionalmente, no que se refere à correção das regularizações constantes do RIT, entende a Requerente que estas apenas poderiam ser feitas relativamente a faturas emitidas até ao último dia do ano 2020, estando em causa factos tributários anteriores à referida data. 

Ora, como consta do nº. 4 do art.º 45 da LGT, “o prazo de caducidade se conta nos, impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado…, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto”;

Ora, é exatamente a definição do momento dessa exigibilidade que separa as partes nos presentes autos.

Para a Requerente, nas suas operações ativas a exigibilidade nasce a partir do ano civil seguinte aquele em que se verificou o facto tributário e nas operações passivas a partir do momento em que nasce o direito a um crédito sobre o estado. 

Porém, segundo a AT, não está limitada pelo prazo de caducidade do direito à liquidação, podendo efetuar correções às declarações dos contribuintes relativas ao período em relação ao qual é pedido o reembolso, mesmo que anteriores àquele prazo de caducidade. Defende a AT na sua resposta que que “reportando-se o pedido de reembolso à globalidade das relações tributárias relativas a um determinado período o seu conteúdo definitivo está forçosamente por definir, pelo que não se pode justificar, pelas razões de segurança jurídica subjacentes ao regime de caducidade do direito de liquidação que haja restrições ao apuramento e relevância dos factos que importa apurar para as definir.” 

 Ora, conforme já decidiu o STA, no seu acórdão de 9-3-2022, proferido no processo 0415/13.4BELRS da 2ª. Secção:

II - Para exercer o seu direito à dedução do imposto suportado o sujeito passivo de I.V.A. pode, conforme as circunstâncias em que se encontre, recorrer a um de três métodos previstos na lei:

a-Método subtractivo indirecto - de acordo com este método, ao valor do imposto liquidado durante um determinado período declarativo deduz-se o valor do imposto suportado no mesmo período (cfr. Art.º 22.º, n.º1, do C.I.V.A.);

b-Método do reporte - caso o imposto a deduzir seja superior ao imposto liquidado, o sujeito passivo deverá recorrer ao método do reporte, de acordo com o qual o imposto em excesso será reportado para o período de tributação seguinte (cfr. artº.22, nº.4, do C.I.V.A.);

c-Método do reembolso - todavia, nas situações em que o imposto a deduzir seja superior ao imposto liquidado, pode o sujeito passivo optar por solicitar o reembolso do imposto, desde que se verifiquem as condições legalmente previstas no artº.22, nºs.5 e 6, do C.I.V.A. (...)

IV - Os actos de liquidação adicional de I.V.A. praticados na sequência de um procedimento de inspecção tributária, motivado por um pedido de reembolso, estão sujeitos à regra geral da caducidade do direito à liquidação, consagrada no art.º 45.º, n.º1 e 4, da L.G.T.

Deste modo, é evidente que o crédito é exigível logo que se faça o seu apuramento relativamente a cada período, cabendo ao titular desse mesmo crédito exercer a opção que pretende, a qual pode ser a exigência imediata do seu reembolso.

Por essa razão é que o artigo 22.º, n.º 1 do Código do IVA determina que a dedução nasce no momento em que o imposto dedutível se toma exigível, de acordo com o estabelecido pelos artigos 7.º e 8.º, referindo a seguir a operação que visa determinar o imposto exigível.

Ora, relativamente às faturas emitidas no decurso do ano 2020, o prazo de caducidade começou a contar a 1 de janeiro de 2021. Relativamente às faturas emitidas nos anos anteriores, o prazo de caducidade começou a correr a partir do início do ano seguinte ao da emissão dessas faturas. 

Na verdade, por força da aplicação destas normas, verificando-se a exigibilidade do IVA com a emissão das faturas à cliente E... e à financiadora de litígios F..., (artigo 8.º do Código do IVA) o prazo de 4 anos terá terminado a 31 de dezembro de 2024, relativamente a todas as faturas emitidas até, ou no decurso, do ano 2020. Assim, qualquer notificação de liquidação após 31 de dezembro de 2024, será inválida por força da caducidade relativamente a essas faturas, sendo certo que a B... foi notificada do RIT a 15 de janeiro de 2025 e dos subsequentes atos de liquidação adicional a 25 de janeiro de 2025. 

Por outro lado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que a Administração Tributária invoca, designadamente os acórdãos de 07-12-2007, processo n.º 0303/07, e de 30-09-2009, processo n.º 0682/09, foi adotada apenas relativamente a situações de indeferimento de pedido de reembolso, que se considerou serem diferentes das de emissão de liquidações, como se evidencia no primeiro daqueles acórdãos:

O prazo de caducidade do direito liquidação, atualmente previsto no art. 45.º da LGT, reporta-se a actos de liquidação de tributos, que são actos que declaram uma obrigação tributária (...). 

  É apenas em relação a estes actos de liquidação, em sentido estrito, que provocam uma modificação na situação tributária do contribuinte, definindo a existência de uma obrigação (que através desse acto se torna certa, líquida e exigível, inclusivamente por via coerciva no caso de não cumprimento voluntário), que se justifica, por evidentes razões de segurança jurídica, que se limite o período de tempo em que tais actos podem ser praticados.

   Não é esse, porém, o caso dos actos que recusam o reembolso de IVA, pois deles não resulta para os contribuintes qualquer obrigação que não tivessem anteriormente. 

  Por outro lado, o facto de o n.º 8 do referido art. 22.º incluir a expressão reembolsos são efectuados «quando devidos», não tem o mero alcance de expressar que não devem ser efectuados reembolsos indevidos (o que seria absolutamente supérfluo, pois seria inimaginável interpretar o regime de reembolsos como permitindo o pagamento de reembolsos que não fossem devidos), mas sim o de acentuar que os reembolsos não devem ser efectuados sem uma comprovação, no momento do reembolso, da verificação dos seus pressupostos, o que é corroborado pelos n.ºs 10 e 11 do mesmo artigo, ao preverem que, para efeitos de reembolso, possam ser pedidos documentos e informações adicionais, sob pena de o reembolso se considerar indevido. 

  Aliás, nem seria compreensível outro regime, pois, reportando-se o pedido de reembolso à globalidade das relações tributárias relativas a um determinado período, o seu conteúdo definitivo está forçosamente por definir, pelo que não se pode justificar, pelas razões de segurança jurídica subjacentes ao regime da caducidade do direito de liquidação, que haja restrições ao apuramento e relevância dos factos que importam para as definir.

  Para além de não haver suporte legal para aplicar o prazo de caducidade do direito de liquidação aos actos que apreciam pedidos de reembolso de IVA, por não serem actos que declaram uma obrigação tributária do contribuinte em relação à Administração Tributária, não se trata de uma situação idêntica, que justifique a aplicação analógica do referido art. 45.º.

  Na verdade, não valem em relação aos actos de recusa de reembolso as razões de segurança jurídica que justificam a limitação temporal da possibilidade de efectuar actos de liquidação, pois os actos de recusa, como actos negativos que são, não produzem nem declaram qualquer obrigação para o contribuinte.”

 

Como se vê, esta jurisprudência refere-se a pedidos de reembolso de IVA que se entendeu não serem abrangidos pela caducidade do direito de liquidação, por não valerem em relação aos atos de indeferimento, que apenas afetam a expectativa que o Sujeito Passivo tem de vir obter meios pecuniários, as mesmas razões de segurança jurídica que justificam a limitação de atos de natureza ablativa, como são os atos de liquidação, que retiram da esfera jurídica do contribuinte meios pecuniários que estavam na sua disponibilidade.

Esta distinção entre as duas situações foi recentemente reafirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 05-02-2020, processo n.º 0844/12.0BELRA 01175/17, em que se refere:  

Ora, como resulta da factualidade antes descrita, no caso em apreço não estamos perante um acto de recusa de reembolso dos montantes declarados pelo sujeito passivo com fundamento em correcções efectuadas às declarações dos contribuintes relativas ao período em relação ao qual é pedido o reembolso (caso que foi analisado e discutido no acórdão de 12 de Julho de 2007, exarado no processo 303/07, invocado pela Recorrente), mas sim perante verdadeiros actos de liquidação adicional de imposto, praticados na sequência de uma inspecção tributária motivada pelo pedido de reembolso. Quer isto dizer que, tratando-se da prática de um acto tributário fundado em correcções quantitativas à matéria colectável determinadas por uma avaliação directa, por ocasião ou no âmbito de um procedimento de inspecção tributária e com base em dados contabilísticos apurados também por inspecção tributária à empresa relativamente à qual os actos de liquidação de IVA em falta haviam sido praticados, não existem razões que possam afastar a aplicação da regra da caducidade do direito à liquidação consagrada no artigo 45.º da Lei Geral Tributária.

É certo que o IVA em falta é imputado ao último período de 2010, mas o Tribunal a quo entende, e com razão, que esse facto não é relevante para o efeito, uma vez que o prazo de caducidade se conta, segundo o n.º 4 do artigo 45.º da LGT, “a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário”, ou seja, a partir de 1 de Janeiro de 2007. Assim, a liquidação daquele IVA em falta (por omissão de operações tributárias) teria de ter sido efectuada e o respectivo acto notificado ao sujeito passivo até 31 de Dezembro de 2010, o que só veio a acontecer em 4 de Setembro de 2011.” (sublinhado nosso).  

  Na mesma linha, distinguindo as duas situações, o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo entendeu, no acórdão de 27-02-2019, processo n.º 02/18.0BALSB, que a situação analisada no referido acórdão de 2007 e a que foi objecto do acórdão arbitral de 27-06-2018, proferido no processo n.º 494/2017-T (em que foi adotada solução idêntica à que no presente acórdão se adota), não têm «suficientes pontos em comum para que se possa concluir ocorrer uma efetiva contradição entre ambas».

  Por isso, tendo a liquidação adicional de IVA sido emitida em 25-01-2025 e tendo subjacentes atos de liquidação de IVA (por omissão de liquidação por parte da Requerente) sido praticados até 31 de dezembro de 2020, tem de se concluir que ocorreu, quanto a estes atos, a caducidade do direito de liquidação, no valor correspondente, o que constitui vício de violação de lei que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

Relativamente às faturas emitidas pela B... à sua cliente E..., subsiste apenas a fatura n.º 2021/18 emitida em 4 de maio de 2021, no valor total de € 226,45, sendo € 201,25 de honorários e 25,20 de despesas (vide Quadro I do RIT). 

Adiante caberá analisar as regras de localização desta prestação de serviços jurídicos para efeitos do respetivo enquadramento, em sede de IVA, em Portugal. 

 

Relativamente às faturas emitidas pela B... à F..., no âmbito do contrato de financiamento de litígios para a defesa do interesses das empresas que constituem o consórcio de ... perante os tribunais portugueses, (vide quadro II do RIT), apenas subsistem fora do período de caducidade do imposto as faturas: FA 2021/10 (23-02-2021), no valor de € 5.487,68 (Doc. 44); FA 2021/11 (23-02-2021), no valor de € 816,00 (Doc. 45); FA 2021/14 (21-04-2021), no valor de € 4.080,00 (Doc. 46); FA 2021/15 (22-04-2021), no valor de € 1.860,00 (Doc. 47); FA 2021/16 (29-04-2021), no valor de € 1.173,00 (Doc. 48). 

Porém, tratando-se de documentos que titulam o pagamento de “despesas” e não de “honorários” (conforme resulta do Quadro II e Quadro III do RIT) relativos ao financiamento do litígio para defesa do Consórcio de ..., sobre os mesmos não incide IVA. 

Procedendo a exceção de caducidade do direito de liquidação da AT relativamente às faturas emitidas pela B... à empresa F..., as quais respeitam todas a factos tributários com data anterior a 31 de dezembro de 2020, fica prejudicado o conhecimento da legalidade das liquidações adicionais emitidas relativamente às faturas onde se encontra identificada a designação de “honorários” emitidas pela B... à F... .

Em suma, de acordo com o RIT, (Quadros I, II e III) do montante de € 20.924,56 objeto de liquidação adicional, relativamente às operações supra enunciadas, apenas subsiste IVA, por não ter caducado a respetiva liquidação, no valor identificado pela Requerente de € 52,08. 

 

Vejamos agora a questão da caducidade relativamente às regularizações constantes dos pontos V.1.2 e V.1.3 do RIT. 

Segundo a Requerente, tais regularizações apenas poderiam ser feitas relativamente a faturas emitidas até 31 de dezembro de 2020.  

Contudo, quer nas deduções efetuadas relativamente a imóveis não utilizados para fins empresarias (ponto V.1.2.do RIT) quer nas regularizações efetuadas relativamente ao cliente C... (V.1.3 do RIT), as faturas subjacentes a tais operações reportam-se a datas anteriores a 31 de dezembro de 2020, tendo, por conseguinte, operado o prazo de caducidade previsto no art.º 45º n.º 1 e 4 da LGT.    

Vejamos por separado cada uma das situações à luz da jurisprudência dos tribunais superiores supra citada. 

No primeiro caso, - ponto V.1.2 do RIT – estão em causa “benfeitorias realizadas que, pela sua natureza, não possam ser levantadas sem detrimento do imóvel ficam pertença desse mesmo imóvel. Nessas situações, deixando o sujeito passivo de utilizar o imóvel onde realizou as benfeitorias, deixa também de se verificar a necessária ligação do imóvel com a sua atividade produtiva, pelo que a dedução do IVA suportado em tais despesas de investimento deve seguir as normas do n.º 1 do artigo 26.º do CIVA.

Deste modo, verificando-se no caso em análise que as instalações onde foram efetuadas as benfeitorias e relativamente às quais o imposto suportado em 2015 e 2019 foi deduzido deixaram de estar afetas à atividade tributada do sujeito passivo a partir de 01/01/2022 este devia ter procedido à regularização do imposto em função do número de anos do período de regularização ainda não decorridos, nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do CIVA.

Nos termos do n.º 8 do art. 24º do CIVA as regularizações devem constar da declaração do último período do ano a que respeita.”

Conclui a AT que imposto a regularizar no período 2021-12T totaliza € 5.990,08.

A este respeito aduz a Requerente que as datas das faturas objeto de regularização relativas às obras realizadas nas suas instalações, constantes do Quadro VI do RIT foram emitidas em 2015 e 2019, por conseguinte a liquidação do IVA encontra-se caducada. 

A AT discorda de tal entendimento, citando o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 16-09-2021 proferido no processo n.º 339/12.2 BELRS nos termos do qual “1. A liquidação oficiosa originada na regularização da conta corrente do IVA por correção do crédito em excesso a reembolsar declarado não está sujeita ao prazo de caducidade.” 

Ora, salvo devido respeito, não se acompanha a argumentação da AT. 

Conforme referimos, consta do nº. 4 do art.º 45 da LGT, que “o prazo de caducidade se conta nos, impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado…, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto”;

Retomando a questão da exigibilidade do imposto, seguimos de perto a decisão proferida pelo CAAD, processo n.º 694/2021-T de 2022-07-10, no qual é citado um parecer elaborado pelas Professoras Clotilde Celorico Palma e Ana Perestrelo, em tudo aplicável ao caso em apreço, referindo-se, a propósito do facto a partir do qual é contado o prazo de caducidade o seguinte: «Em nossa opinião, o facto a partir do qual se deve contar o prazo de caducidade é o do momento em que se verifica que o sujeito passivo liquidou imposto deduzindo IVA constante em faturas de operações a montante, sem que tivesse ab initio direito a efetuar tal dedução (só praticava operações isentas e mesmo assim deduzia) ou, como na situação em apreço, em que comprovadamente perdeu o direito à dedução a que inicialmente tinha direito (quando deixou de praticar operações tributáveis para passar a praticar operações isentas).” (sublinhado nosso).

No mesmo sentido, explorando a importância da alteração da redação do n.º 3 do artigo 45.º da LGT, veja-se a solução preconizada no Acórdão do CAAD, processo n.º 929/2019-T de 24-07-2020: “       3.1.2. Caducidade do direito de liquidação à face do n.º 3 do artigo 45.º da LGT 

  Embora o Requerente invoque os n.ºs 1 e 4 do artigo 45.º da LGT para sustentar a caso do direito de liquidação, poderá equacionar-se também a possibilidade de aplicação do n.º 3 daquele artigo 45.º, que conduz a mesma conclusão.

Na verdade, poderá entender-se que a estes específicos casos de caducidade do direito de liquidação relativamente a deduções indevidas de IVA se aplica, antes, o n.º 3 deste artigo 45.º que, a partir da redacção introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, passou a estabelecer que, «em caso de ter sido efectuado reporte de prejuízos, bem como de qualquer outra dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito». (   ) Esta redacção manteve-se até à Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, em que este n.º 3 passou a  estabelecer que «em caso de ter sido efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito». 

Referindo-se este n.º 3 a qualquer «qualquer dedução ou crédito de imposto» (...) ele será aplicável à dedução de IVA. À face desta norma, o prazo de caducidade do direito à liquidação por dedução indevida de IVA será o prazo do exercício do direito à dedução, isto é, coincide com o prazo para exercício do direito à dedução. Por isso, quando for efectuada uma dedução indevida de IVA, a Administração Tributária só poderá exercer o direito de liquidação do IVA indevidamente deduzido, no prazo legal de exercício do direito à dedução.

Sobre o prazo de exercício do direito à dedução, estabelece o n.º 2 do artigo 98.º do CIVA que «sem prejuízo de disposições especiais, o direito à dedução (...) só pode ser exercido até ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução».(...)

«O direito à dedução nasce no momento em que o imposto dedutível se torna exigível, de acordo com o estabelecido pelos artigos 7.º e 8.º» (artigo 22.º, n.º 1, do CIVA), pelo que o nascimento do direito à dedução que se refere naquele  n.º 2 do artigo 98.º é necessariamente anterior ao momento em que o sujeito passivo está em condições de exercer esse direito, «mediante subtracção ao montante global do imposto devido pelas operações tributáveis do sujeito passivo, durante um período de declaração, do montante do imposto dedutível, exigível durante o mesmo período» (artigo 22.º, n.º 1, citado).

Por isso, para se iniciar a contagem do prazo de caducidade do direito à dedução não é necessário que ocorra o momento em que o sujeito passivo vem a estar em condições práticas de exercer o direito à dedução, iniciando-se o prazo desde o momento anterior em que o imposto dedutível se tornou exigível, normalmente no momento da emissão da factura que serve de suporte ao direito à dedução (artigo 8.º do CIVA).

Reflexamente, por força do n.º 3 do artigo 45.º da LGT, que faz o coincidir o prazo de exercício do direito à dedução e o prazo de caducidade do direito de liquidação com fundamento em dedução indevida, também este prazo de caducidade se contará a partir desse momento.

É certo que, antes do exercício do direito de dedução, a Administração Tributária não tem a possibilidade prática de controlar o seu exercício, mas é uma solução legislativa que não se pode considerar estranha no nosso direito tributário, pois é a adoptada também nos outros principais impostos, designadamente no IRC e IRS, em que o prazo de caducidade do direito de liquidação se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (artigo 45.º, n.º 4, da LGT), meses antes dos termos dos prazos para serem apresentadas as declarações de rendimentos (artigos 120.º, n.ºs 1 e 2, do CIRC e 60.º do CIRS), que permitirão à Administração Tributária exercer os respectivos direitos de liquidação. Inclusivamente, nestes casos de IRC e IRS a antecipação do termo inicial do prazo de caducidade do direito de liquidação até será maior do que resulta do n.º 2 do artigo 98.º do CIVA, pois «a dedução deve ser efetuada na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a receção das faturas» (artigo 22.,º, n.º 2, do CIVA).

  Por outro lado, o regime de contagem do prazo a partir do nascimento do direito à dedução, tem como corolário que há um único prazo de caducidade do exercício do direito à dedução relativamente a cada IVA dedutível, independentemente dos posteriores actos em que se concretiza esse exercício, designadamente declarações periódicas iniciais ou de substituição ou reporte para períodos seguintes.

Reflexamente, em face da coincidência de prazos que resulta do artigo 45.º, n.º 3, da LGT, também haverá um único prazo de caducidade do direito de liquidação por dedução indevida, contado do momento em que o IVA respectivo se tornou exigível e não um novo prazo iniciado com cada acto em que se concretizou esse exercício indevido, designadamente os sucessivos actos de reporte para períodos seguintes, nos casos em que o imposto a deduzir supere o montante devido pelas operações tributáveis, que o n.º 4 do artigo 22.º do CIVA também considera exercício do direito de dedução (como se conclui aí se dizer que «o excesso é deduzido nos períodos de imposto seguintes»).

Por isso que, não relevam para efeitos de determinar o prazo de caducidade do direito de liquidação os actos de exercício de direito à dedução: nem o acto que foi inicialmente praticado na declaração periódica, nem eventuais declarações de substituição, nem a dedução através de reporte do excesso para exercícios seguintes.” (sublinhado nosso).

Assim, tendo a liquidação adicional sido emitida em 25 de janeiro de 2025, tem de se concluir que foi emitida para além do prazo de caducidade do direito de liquidação por dedução indevida, nos termos dos artigos 45.º, n.º 3, da LGT e 98.º, n.º 2, do Código do IVA, sendo de anular a correspondente correção que totaliza o valor de € 5.990,08. 

 

Quanto às regularizações efetuadas relativamente ao cliente C... (V.1.3 do RIT), consideradas indevidas, no valor de € 1.141,62, a Requerente começa por invocar a caducidade do direito à liquidação, uma vez foram emitidas faturas com IVA por conta dos adiantamentos realizados por este cliente, anteriores ao início da prestação de serviços jurídicos, em 26-11-2019 e 29-11-2019.  Ora, defende a Requerente que tendo estes factos tributários ocorrido em momento anterior a 31 de dezembro de 2020, as correções da AT são ilegais, por força da caducidade do direito à liquidação prevista no artigo 45.º n.º 1 e 4 da LGT. 

Contudo, no caso em apreço, não se acompanha a posição da Requerente. 

Vejamos. 

Na data em que tais documentos foram emitidos, o cliente da Requerente dispunha de domicílio em Portugal, mas encontrava-se registado como Não Residente em Portugal desde 1 de junho de 1988, (vide Anexo 18 do RIT). Segundo a AT, tais faturas, emitidas com IVA, configuram documentos exatos à luz dos critérios que determinam o lugar da tributação, previstos nas alíneas a) e b) do n.º 6 do artigo 6.º do Código do IVA. 

Posteriormente, a 10-02-2021 a Requerente emitiu duas Notas de Crédito (NCA 2021/ e NCA2021/12) tendo em vista retificar as faturas anteriores e corrigir o IVA a seu favor, por se tratar de um contrato de prestação de serviços jurídicos a um cliente inscrito como não residente fiscal em Portugal. Aliás, assim estipula o artigo 29.º, n.º 7, do Código do IVA: «Quando o valor tributável de uma operação ou o imposto correspondente sejam alterados por qualquer motivo, incluindo inexatidão, deve ser emitido documento retificativo de fatura».

Por conseguinte, a Requerente por via de um documento retificativo de fatura – “nota de crédito” –, vem retificar, anulando o imposto incidente sobre a operação anterior, fazendo nascer na sua esfera, enquanto prestador do serviço, o direito à regularização, a seu favor, do IVA contido nas notas de crédito emitidas a 10-02-2021 (cfr. o artigo 78.º, n.º 2, do Código IVA).

Ora, à luz das considerações tecidas nos pontos anteriores e atendendo aos factos descritos, o prazo de caducidade do direito à liquidação do IVA incidente sobre as notas de créditos emitidas pela Requerente não se encontra ultrapassado na data da notificação do RIT a 25 de janeiro de 2025, nos termos conjugados do artigo 45.º n.ºs 1 e 4 da LGT e 29.º n.º 7 do Código do IVA. 

Nestes termos, tendo-se concluído pela não verificação da exceção perentória da caducidade, cumprirá analisar os restantes vícios imputados pela Requerente à correção do montante de IVA regularizado, respeitante ao cliente C... (V.1.3 do RIT) no valor e € 1.141,62.

 

c)     Prestação de Serviços da B... à cliente E...– Fatura FA 2021/18 – IVA no valor de €52,08. 

Conforme resulta do RIT, no âmbito da sua atividade, a B... foi contratada para prestar um conjunto de serviços jurídicos (vide anexo 2) que em parte foram faturados ao seu cliente E..., sujeito passivo sedeado em Malta, tendo emitido faturas sem IVA, quando tais serviços, estando relacionados com imóveis, se encontram sujeitos a IVA em Portugal, independentemente da localização do adquirente, por força das regras específicas previstas nos números 7 a 12º do artigo 6.º do Código do IVA. 

Relativamente à natureza dos serviços prestados, refere a AT, que a B... elaborou a defesa do Consórcio ..., num processo administrativo e numa providência cautelar, relacionados com a decisão do Estado Português de não prorrogar o contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata e metais associados celebrado em 20-02-2013 entre o Estado Português e o referido Consórcio. 

O contrato de concessão celebrado entre o Estado Português e o Consórcio ... conferiu ao Consórcio um direito de exploração experimental de recursos geológicos. 

A área de exploração territorial específica identificada como “...” encontra-se localizada nos concelhos de ..., ..., ... e ..., no distrito de Viseu, sendo esta área territorial composta por bens imóveis pertencentes ao domínio público do Estado Português.

Por conseguinte, argumenta a AT que o Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011, alterado pelo Regulamento de Execução (UE) n.º 1042/2013, vem reforçar as regras especiais previstas no artigo 6.º do Código do IVA, ao indicar que os serviços jurídicos têm uma relação direta com bens imóveis, nos casos que envolvem a transferência de um título de propriedade, o estabelecimento ou a transferência de direitos reais sobre bens imóveis. A AT concluiu que os serviços jurídicos prestados pela B... à E... estavam diretamente relacionados com bens imóveis, porque visavam a manutenção dos direitos de exploração concedidos ao Consórcio ... sobre os recursos geológicos situados na área territorial delimitada.

Assim, considerou-se que as prestações de serviços se enquadravam no artigo 31-A(2)(q)), do Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011, sendo aplicável a regra de tributação no local onde se situam os bens imóveis.

Pelo contrário, a Requerente entende que a AT não tem razão, porque os serviços jurídicos só se consideram localizados no Estado do imóvel se houver relação direta e específica com a transmissão de um título de propriedade, constituição ou transferência de direitos reais, etc. (artigo 31.º-A do Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011). 

Ora, no caso concreto, ou seja, no âmbito dos serviços prestados não existe uma relação (direta e específica) com quaisquer imóveis, mas sim a defesa dos interesses da D... e da E... perante a violação de um contrato administrativo, relacionado com a exploração experimental de “jazigos minerais”, “recursos geológicos” ou “depósitos minerais”.

Vejamos. 

De acordo com o disposto no artigo 6.º, n.º 6, alínea a ) do Código do IVA, “são tributáveis as prestações de serviços efectuadas a (…) um sujeito passivo dos referidos no n.º 5 do artigo 2.º, cuja sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, se situe no território nacional, onde quer que se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador (…)” sendo que, nos termos do disposto no nº 8, alínea a) do mesmo artigo do Código do IVA, é referido que “não obstante o disposto no n.º 6, são tributáveis as (…) prestações de serviços relacionadas com um imóvel sito no território nacional, incluindo os serviços prestados por arquitectos, por empresas de fiscalização de obras, por peritos e agentes imobiliários, e os que tenham por objecto preparar ou coordenar a execução de trabalhos imobiliários, assim como a concessão de direitos de utilização de bens imóveis e a prestação de serviços de alojamento efectuadas no âmbito da actividade hoteleira ou de outras com funções análogas, tais como parques de campismo (…)”

A este respeito, esclarece a Informação Vinculativa (IV) nº 27711 (com despacho de 2025-03-28, do Diretor de Serviços da DSIVA, por subdelegação), sobre as regras de localização das prestações de serviços relacionadas com imóveis, que são sujeitas a IVA "as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal [cf. alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do CIVA]. A prestação de serviços que se traduz na execução de trabalhos em imóvel, por parte de um subempreiteiro, ao abrigo da celebração de um "contrato de empreitada de obra particular", constitui uma prestação de serviços, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do CIVA, por se tratar de uma operação efetuada a título oneroso que não constitui uma transmissão, aquisição intracomunitária ou importação de bens. E, tratando-se de prestações de serviços relacionadas com um imóvel, há que atender às regras de localização específicas prescritas na alínea a) do n.º 7 e 8 do artigo 6.º do CIVA, as quais, sinteticamente, estabelecem que as prestações de serviços relacionadas com um imóvel se consideram localizadas e tributadas no lugar onde está situado o imóvel. (…)” (sublinhado nosso). A mesma IV refere que “sobre o conceito de prestações de serviços relacionadas com um imóvel, o n.º 1 do artigo 31.º-A do (…) Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011, dispõe que os serviços relacionados com bens imóveis a que se refere o artigo 47.º da Diretiva 2006/112/CE incluem apenas os serviços que tenham uma relação suficientemente direta com esses bens” e que “considera-se que os serviços têm uma relação suficientemente direta com bens imóveis nos seguintes casos: a) Quando derivam de um bem imóvel e esse bem é um elemento constitutivo do serviço e constitui um elemento central e essencial para a prestação dos serviços; b) Quando são prestados ou destinados a um bem imóvel e têm por objeto a alteração jurídica ou material desse bem. Mais à frente, o n.º 2 do referido artigo 31.º - A, enumera algumas prestações de serviços consideradas como sendo relacionadas com imóveis, nomeadamente as (…) que incluem (...) q) Os serviços jurídicos relacionados com a transferência de um título de propriedade imobiliária, o estabelecimento ou transferência de determinados direitos ou direitos reais sobre bens imóveis (equiparados ou não a bens corpóreos), como atividades notariais, ou a elaboração de contratos de compra e venda de bens imóveis, ainda que a operação subjacente que resulta na alteração jurídica da propriedade não se venha a verificar. (…)” (sublinhado nosso).

Com efeito, a Diretiva 2006/112/CE, no seu artigo 47º (prestações de serviços relacionadas com bens imóveis, refere que “O lugar das prestações de serviços relacionadas com bens imóveis, incluindo os serviços prestados por peritos e agentes imobiliários, a prestação de serviços de alojamento no sector hoteleiro ou em sectores com funções análogas, tais como campos de férias ou terrenos destinados a campismo, a concessão de direitos de utilização de bens imóveis e os serviços de preparação e de coordenação de obras em imóveis, tais como os serviços prestados por arquitectos e por empresas de fiscalização de obras, é o lugar onde está situado o bem imóvel”. (sublinhado nosso).

Como se refere na Decisão Arbitral proferida no âmbito do processo nº 373/2020-T, de 09-08-2021, a propósito de serviços de construção civil mas que também aborda a questão dos serviços relativos a bens imóveis para efeitos de IVA), “(…) a inexistência de uma definição de bem imóvel para efeitos de IVA no contexto europeu, com implicações nesta e em múltiplas outras questões, nomeadamente em relação a isenções e à localização das operações, suscitou a intervenção legislativa que, após alguma jurisprudência do Tribunal de Justiça (…), se materializou na alteração do acima referido Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011, pelo Regulamento de Execução (UE) n.º 1042/2013, do Conselho, de 7 de outubro de 2013, que aditou dois artigos – o artigo 13.º-B e o artigo 31.º-A – com o recorte dos conceitos de bens imóveis e de prestações de serviços relacionadas com bens imóveis para efeitos de IVA. A positivação destas noções visou assegurar o tratamento uniforme das prestações de serviços relacionadas com bens imóveis, para o que, segundo o Considerando 12) do citado Regulamento n.º 1042/2013, se tornou necessário definir o conceito de bens imóveis com a especificação da proximidade necessária para que exista uma relação com um bem imóvel, através da enumeração exemplificativa de operações caracterizadas como serviços relacionados com bens imóveis”.

Com efeito, de acordo com o disposto artigo 13.º-B do Regulamento de Execução, “para a aplicação da Diretiva 2006/112/CE, consideram-se «bens imóveis»: a) Qualquer parcela delimitada do solo, situada à sua superfície ou sob a sua superfície, que possa ser objeto de um direito real; b) Qualquer edifício ou construção fixado ao solo ou no solo, acima ou abaixo do nível do mar, que não possa ser facilmente desmantelado ou deslocado; c) Qualquer elemento que tenha sido instalado e faça parte integrante de um edifício ou de uma construção, sem o qual estes não estão completos, tais como portas, janelas, telhados, escadas e elevadores; d) Qualquer elemento, equipamento ou máquina permanentemente instalado num edifício ou numa construção que não possa ser deslocado sem destruir ou alterar o edifício ou a construção”.

Por outro lado, no contexto da aplicação das regras de localização (incidência espacial) das prestações de serviços relacionadas com bens imóveis, o nº 1 do artigo 31º-A do Regulamento de Execução determina ainda que “os serviços relacionados com bens imóveis a que se refere o artigo 47.º da Diretiva 2006/112/CE incluem apenas os serviços que tenham uma relação suficientemente direta com esses bens. Considera-se que os serviços têm uma relação suficientemente direta com bens imóveis (…) quando derivam de um bem imóvel e esse bem é um elemento constitutivo do serviço e constitui um elemento central e essencial para a prestação dos serviços, (…) quando são prestados ou destinados a um bem imóvel e têm por objeto a alteração jurídica ou material desse bem” (sublinhado nosso).

Já o seu nº 2 refere que “o n.º 1 abrange, em especial, o seguinte: (...) q) Os serviços jurídicos relacionados com a transferência de um título de propriedade imobiliária, o estabelecimento ou transferência de determinados direitos ou direitos reais sobre bens imóveis (equiparados ou não a bens corpóreos), como atividades notariais, ou a elaboração de contratos de compra e venda de bens imóveis, ainda que a operação subjacente que resulta na alteração jurídica da propriedade não se venha a verificar” (negrito nosso).

Por seu turno, no seu n.º 3 refere-se que “o nº 1 não abrange (…) a) A elaboração de plantas de um edifício ou de partes de um edifício desde que não sejam destinadas a um determinado terreno; b) A armazenagem de bens num bem imóvel, se nenhuma parte específica desse imóvel for destinada ao uso exclusivo do destinatário; c) A prestação de serviços publicitários, mesmo que envolva a utilização de bens imóveis; d) A intermediação nas prestações de serviços de alojamento no setor hoteleiro ou em setores com funções similares, como os campos de férias ou os terrenos destinados a campismo, se o intermediário agir em nome e por conta de outra pessoa; e) A colocação à disposição de um stand numa feira ou local de exposição, em conjunto com outros serviços afins destinados a permitir a exposição dos produtos, como a conceção do stand, o transporte e a armazenagem dos produtos, o fornecimento de máquinas, a instalação de cabos, os seguros e os serviços publicitários; f) A instalação ou montagem, manutenção e reparação, inspeção e fiscalização de máquinas ou equipamento que não façam, ou não venham a fazer, parte dos bens imóveis; g) A gestão de carteiras de investimentos imobiliários; h) Os serviços jurídicos, com exceção dos abrangidos pelo n.º 2, alínea q), relacionados com contratos, designadamente aconselhamento sobre os termos de um contrato de transferência de bens imóveis, sobre a execução de um contrato dessa natureza ou a comprovação da sua existência, se esses serviços não estiverem especificamente relacionados com a transferência de um título de propriedade imobiliária”.

Citando ainda a Decisão Arbitral identificada no ponto 6.21., supra, “do cotejo dos artigos 31.º-A do Regulamento de Execução e 199.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva IVA ressalta que a delimitação de prestações de serviços relacionadas com bens imóveis enumeradas no artigo 31.º-A do Regulamento tem uma latitude consideravelmente superior à dos serviços de construção, incluindo reparação, limpeza, manutenção, alteração e demolição respeitantes a bens imóveis, bem como a entrega de obras em imóveis”, previstos no artigo 199.º, n.º 1, alínea a) da Diretiva IVA, cuja interpretação está aqui em causa. No primeiro caso, são abrangidos múltiplos serviços, de natureza variável, como os referentes a projetos, hotelaria, intermediação e serviços jurídicos (...). Ainda assim, no que ao presente caso releva, interessa reter que é sempre exigida uma conexão próxima com um bem classificado como imóvel”. (sublinhado nosso). 

Importa também considerar a jurisprudência desenvolvida pelo Tribunal de Justiça sobre a noção de bens imóveis na aceção do IVA, pois embora seja anterior às definições introduzidas pelo Regulamento de Execução (UE) n.º 1042/2013 no artigo 13.º-B, está na base dessa alteração legislativa e mantêm-se atuais os seus pressupostos. No processo C-428/02, Fonden Marselisborg, com acórdão de 3 de março de 2005, sobre a qualificação de lugares para embarcações em terra e na água, o Tribunal de Justiça qualifica-os como bens imóveis, no primeiro caso porque o solo utilizado para a recolha das embarcações é um bem imóvel e no segundo caso, quanto aos lugares na água, porque o facto de o terreno da doca estar total ou parcialmente submerso não se opõe à sua qualificação como bem imóvel.

Compulsa-se a propósito do conceito dos “serviços prestados relativos a imóveis” o Acórdão, de 7 de setembro de 2006, proferido no processo C-166/05, Rudi Heger, sobre a cessão de licenças de pesca, que analisa um aspeto fundamental que se prende com o vínculo que une os serviços aos bens imóveis, para que estes possam ser considerados serviços relativos a bens imóveis, de que se transcreve um excerto (…)”: (...) “20 No que respeita ao conceito de «bem imóvel», há que referir que uma das características essenciais de um bem deste tipo é que o mesmo está ligado a uma porção determinada da superfície terrestre. A este respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu que um terreno delimitado de forma permanente, mesmo submerso, pode ser qualificado de bem imóvel […]. 21 Direitos de pesca como os adquiridos e revendidos pela Heger permitem exercer tal direito em certos sectores bem determinados do curso de água em causa. Estes direitos, que não dizem respeito às quantidades de água que correm no rio e se renovam sem cessar, mas a determinadas zonas geográficas em que os referidos direitos podem ser exercidos, estão assim ligados a uma superfície coberta de água delimitada de forma permanente. 22 Por conseguinte, os sectores do rio sobre os quais incidem as referidas licenças de pesca devem ser considerados «bens imóveis» na acepção do artigo 9.º, n.º 2, alínea a), da Sexta Directiva. 23 Nestas condições, há que verificar ainda se o vínculo que une o serviço em questão a estes bens imóveis é suficiente. Com efeito, seria contrário à economia do artigo 9.º n.º 2, alínea a), da Sexta Directiva [correspondente ao atual artigo 47.º da Diretiva IVA] incluir no âmbito de aplicação desta regra especial qualquer prestação de serviços que apresente uma conexão, mesmo muito ténue, com um bem imóvel, dado que um grande número de serviços está ligado, de uma forma ou de outra, a um bem imóvel. 24 Assim, apenas as prestações de serviços que apresentem uma relação suficientemente directa com um bem imóvel são abrangidas pelo artigo 9.º, n.º 2, alínea a), da Sexta Directiva. Tal relação caracteriza, aliás, todas as prestações de serviços enumeradas nesta disposição. 25 (..). Além disso, o local em que se situa o imóvel corresponde ao local de efectivação final do serviço” (sublinhado nosso).

Assim, pode concluir-se do acima exposto que o conceito de imóvel para efeitos de IVA não se reconduz apenas aos conceitos terreno ou edificação. O artigo 13º-B do Regulamento de execução (282/2011) recorta um conceito de imóvel de considerável latitude no qual se inscreve uma exploração mineira, situada em território nacional, pertencente ao domínio público, na medida em que se trata de um elemento ligado ao subsolo.

Acompanha-se, neste sentido, a jurisprudência citada pela Requerida na sua resposta, que resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 23-03-2021, proferido no Processo 3915/18.6T8LRA.C1, em que se conclui o seguinte:

Entre quem defende que através desse contrato foi constituído um direito real de aquisição está Oliveira Ascensão [1] que entende que nesta categoria se encontra o direito à mineração, em que a coisa que se vai adquirir só tem existência autónoma depois da exploração o que implica a sua separação do conjunto.

Por sua vez também tem sido defendido que no caso de direito de mineração há um direito de gozo sobre uma mina cuja faculdade de fruição permite a aquisição do minério, sendo a aquisição unicamente o resultado da fruição. [2]

Atribuindo autonomia aos recursos geológicos, José Bonifácio Ramos [3] defendeu que estávamos perante um direito de exploração dos recursos geológicos consistente no aproveitamento dos mesmos, sendo eles próprios o objeto do contrato celebrado, concluiu que o direito de exploração dos recursos geológicos deve ser considerado um direito real de gozo, à semelhança, aliás com que tinha sido defendido por Menezes Cordeiro, relativamente aos direitos de mineração e de aproveitamento de águas mineromedicinais [4]. Posteriormente, este Autor, mudou a sua posição [5], considerando haver fundamento para o classificar como um direito real de aquisição, dado que o intuito do exercício do direito não será tanto a exploração do recurso, em si mesmo, mas de obter, em momento posterior, a propriedade sobre os bens extraídos em consequência da atividade explorativa.

 

Pelo que, a área territorial sob a qual incidiu o exercício da atividade exploratória do Consórcio ... é constituída por bens imóveis que pertencem ao domínio público do Estado, no entanto, de acordo com a doutrina e a jurisprudência, do direito atribuído para a sua exploração experimental resulta um direito real de aquisição, uma vez que o contrato de concessão celebrado concedeu ao Consórcio ... uma expetativa relativamente ao aproveitamento dos recursos geológicos extraídos.

Como refere Requerida, os serviços jurídicos prestados ao Consórcio ... pela  B..., no âmbito de um processo administrativo de audiência de interessados e propositura de uma providencia cautelar junto dos tribunais administrativos portugueses, para defesa dos direitos atribuídos de exploração da área identificada por “...”, têm subjacente uma relação direta com bens imóveis situados em território nacional relativamente aos quais foram estabelecidos direitos reais de aquisição.

Nestes termos, face ao acima exposto, entende-se que os serviços jurídicos prestados pela B... à empresa E... (Malta) no âmbito da defesa dos interesses do consórcio de ... devem ser considerados serviços prestados sobre bens imóveis e, nessa medida, para efeitos de IVA, dizem respeito a operações localizadas em território nacional, de acordo com o Artigo 47.º da Diretiva 2006/112/CE e os artigos 6.º, n.º 7, alínea a), e 6.º, n.º 8, alínea a), do Código do IVA. 

 

Por fim, e a respeito da localização das prestações de serviços em território nacional, importa notar que a tributação em causa é legitima e decorre do disposto nos normativos legais aplicáveis, conforme supra exposto. 

Neste sentido, também não procede a alegação de duplicação de coleta invocada pela Requerente.

Consabidamente, o n.º 1 do artigo 205.º do CPPT declara que há duplicação de coleta “quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo”.

 

Como se escreve no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08-06-2022, proc. n.º 0915/11.0BEBRG: “A duplicação de coleta pode configurar-se como o equivalente, no domínio do direito fiscal, ao princípio penal da proibição do "non bis in idem", sendo causa de ilegalidade do ato tributário”; “Considerada uma heresia dentro do sistema fiscal, a duplicação de coleta implica a verificação de três identidades: do facto, do imposto e do período. Não se exige, contudo, a identidade do contribuinte (...)”.

 

Relevando imediatamente em sede de execução fiscal (cfr. arts. 175.º e 204.º, n.º 1, al. g) do CPPT), trata-se na duplicação de coleta igualmente de fundamento de ilegalidade do ato tributário, como se conclui do n.º 6 do artigo 78.º da LGT (“A revisão do ato tributário por motivo de duplicação de coleta pode efetuar-se, seja qual for o fundamento, no prazo de quatro anos”). Bem se observa, assim, a este respeito, no acórdão proferido no processo n.º 349/2018-T, deste CAAD, que: “Sendo proibida por lei a duplicação de coleta, quando ela deriva da emissão de uma nova liquidação e está pago por inteiro tributo liquidado, relativamente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo, constitui ilegalidade dessa nova liquidação, suscetível de ser invocada em processo de impugnação judicial, que pode ter como fundamento «qualquer ilegalidade» (artigo 99.º do CPPT). Uma confirmação de que a invocação da duplicação de coleta não se restringe ao processo de execução fiscal, encontra-se no n.º 6 do art. 78.º da LGT em que se prevê a possibilidade de revisão do ato tributário com esse fundamento”.

 

No caso dos autos, e ao contrário do alegado pela Requerente, não se encontra demonstrada uma situação de duplicação de coleta. 

Do probatório resulta que a Requerente emitiu as faturas sem IVA em Portugal, uma vez que, considerou as operações localizadas em Malta, sede do adquirente dos serviços (cliente E...) sem que tenha demonstrado que o adquirente dos serviços se tornou sujeito passivo pela respetiva aquisição tendo em consequência procedido à liquidação do IVA devido.  

Por conseguinte, não existe paralelismo com a jurisprudência do CAAD invocada pela Requerente, constante do Processo n.º 670/2022-T. Neste acórdão, concluiu-se por uma situação de dupla tributação, pois ficou provado que “o IVA que tinha que ser liquidado relativamente aos serviços prestados pela Requerente a que se reportam as faturas juntas como doc. n.º 4 à PI (cfr. facto provado II), cuja regularização não foi aceite,(...)” foi integralmente pago por outro sujeito passivo na decorrência da aplicação do regime de inversão do sujeito passivo, tendo sido para o efeito apresentadas as liquidações e os  documentos de pagamento, pelo que a liquidação de IVA incidente sobre a Requerente no referido acórdão, e a consequente decisão de indeferimento do pedido de reembolso formulado, traduziu-se na exigência à Requerente do mesmo imposto pago pela referida sociedade, relativamente à mesma prestação de serviços que foi realizada pela Requerente.

Assim, este resultado interpretativo não pode, no entender deste Tribunal, ser transposto para o caso aqui em apreciação desde logo porque as circunstâncias fácticas não são as mesmas na medida em que, aqui, ao contrário do que sucedia no processo invocado pela Requerente, não ficou provado o facto de o mesmo rendimento ter sido objeto de tributação na esfera da E... . 

Estão, assim, afastados os pressupostos da existência de uma situação de duplicação de coleta.

Em conclusão, improcede nesta parte o pedido da Requerente. 

 

d)    Faturas emitidas pela B... à F...

 

Sem prejuízo das considerações supra tecidas a respeito da verificação da exceção perentória de caducidade relativamente a todas as faturas emitidas pela B... à empresa F..., com a designação de “Honorários”, do RIT constam um conjunto de faturas, emitidas no âmbito do mesmo contrato de financiamento (Quadro II do RIT), com a designação de “despesas” as quais foram emitidas a partir de 1 de janeiro de 2021, pelo que as mesmas não se encontram abrangidas pela regra da caducidade. 

Ora, o pressuposto de liquidação adicional de IVA no âmbito das operações relativas à F..., passou ela consideração da existência “de facto” de uma prestação de serviços jurídicos àquela entidade, e pela desconsideração da prova documental junta autos consubstanciada na celebração de um contrato de financiamento de litígios entre a B... e a F... . 

Tendo existido transações tituladas por faturas entre a F... e a B..., a AT entendeu que a relação entre prestador e adquirente de serviços jurídicos se estabeleceu entre estas duas entidades, esquecendo toda a informação recolhida pelos SIT a propósito da defesa dos interesses do Consórcio de ... junto do Estado Português com o objetivo de prorrogação do contrato de concessão experimental para a área denominada ... . 

A título de exemplo, resulta do RIT que "(...) a B... negociou, com os clientes, um Contrato de Prestação de Serviços Jurídicos (o "CPSJ"), através do qual os clientes apenas se propõem pagar, vinte cinco por cento (25%) dos valores correspondentes honorários dos seus advogados e a totalidade das despesas com as Demandas;

Em conformidade com o considerando F," (...) A B... necessita de um financiamento correspondente a (75%) do valor dos honorários dos seus Advogados, traduzido em adiantamentos financeiros, para apoio da tesouraria e destinado a garantir, que os seus Advogados possam assegurar a realização da totalidade dos serviços das Demandas, nos termos previstos no CPSJ, e receber os honorários que lhe são devidos pela B... (o "Financiamento”). Nos termos do ponto 1.1.2 "(...) a financiadora aceita a responsabilidade de ter a seu cargo a gestão do Financiamento pretendido pela a B..., para apoio da sua tesouraria e para garantir que os seus advogados possam assegurar a totalidade dos serviços das Demandas, nos termos previstos no CPSJ, e receber os honorários que lhe são devidos pela B... ."

    A prova testemunhal produzida nos autos corrobora que a interligação entre a B... e a  F... apresenta um conteúdo definido, de natureza formal baseado num contrato de financiamento para assegurar a prestação de serviços jurídicos ao Consórcio de ... . 

Pense-se ainda que das faturas juntas aos autos e constantes do RIT resulta a descrição de “According to Litigation Funding Agreement”.

Por conseguinte, seguindo de perto as regras de distribuição do ónus de prova previstas no artigo 74.º da LGT, a Requerente demonstrou que independentemente da emissão de documentos designados por “faturas”, in casu faturas relativas a “despesas”, a relação jurídica estabelecida entre a Requerente e a F... não se reconduzia ao elemento nuclear – Prestador vs Adquirente de serviços jurídicos - que origina o facto tributário conducente à incidência de IVA, dando lugar a uma contraprestação. Tal relação jurídica, baseada na prestação de serviços, e não no mero recebimento de pagamentos, foi descrita e densificada ao longo do RIT com elementos de caráter objetivo e relação de causalidade nas operações acordadas entre a F... e os membros do Consórcio. Por seu turno, existem elementos de prova suficientes para demonstrar que a F... se apresenta como entidade financiadora de um litígio contra o Estado Português, do qual não é parte integrante.  

Acresce que a AT, não logrou fazer prova dos elementos constitutivos da prestação de serviços que alega ter existido, fazendo antes tábua rasa dos elementos basilares constantes do contrato de financiamento celebrado com a F..., e demais informação recolhida a respeito dos serviços jurídicos prestados no âmbito do Consórcio de ... . Ademais, a AT não lança um incidente de falsidade em relação à documentação/contratos analisados no âmbito do processo inspetivo. 

Ora, nos termos do disposto no artigo 3.º e 4.º do Código do IVA, este imposto tributa o fornecimento de bens e a prestação de serviços e não a mera existência de pagamentos entre duas partes, montantes que, in casu, se destinavam ao financiamento de “despesas” incorridas no âmbito da prestação de serviços jurídicos levada a cabo pela Requerente. 

Termos em que, à luz das disposições legais invocadas e dos elementos dos prova juntos aos autos, improcede a tese da Requerida neste segmento.     

 

e)    Regularizações efetuadas relativamente ao cliente C...– ponto V.1.3 do RIT – Valor de € 1.141,62,

 

No caso em apreço e conforme resulta do RIT, no âmbito da prestação de serviços jurídicos ao cliente C..., a Requerente emitiu duas faturas, com IVA, a título de adiantamentos, em 26-11-2019 e 29-11-2019. 

Na data em que tais documentos foram emitidos, o cliente da Requerente dispunha de domicílio em Portugal, mas encontrava-se registado como Não Residente, em Portugal, desde 1 de junho de 1988, (vide Anexo 18 do RIT). Segundo a AT, tais faturas, emitidas com IVA, configuram documentos exatos à luz dos critérios que determinam o lugar da tributação, previstos nas alíneas a) e b) do n.º 6 do artigo 6.º do Código do IVA.

Porém, por se tratar de um sujeito passivo não residente, em Portugal, a Requerente considerou tais facturas inexactas, tendo posteriormente, emitido duas Notas de Crédito (NCA 2021/11 e NCA2021/12) tendo em vista retificar as faturas anteriores e corrigir o IVA a seu favor. Por conseguinte, a Requerente por via de um documento retificativo de fatura – “nota de crédito” –, vem retificar, anulando o imposto incidente sobre a operação anterior, fazendo nascer na sua esfera, enquanto prestador do serviço, o direito à regularização, a seu favor, do IVA contido nas notas de crédito emitidas a 10-02-2021 (cfr. o artigo 78.º, n.º 2, do Código IVA).

Defende a AT que estando o referido adquirente dos serviços inscrito como “Não Residente”, à data das operações em causa, no entanto, com domicílio em Portugal, a regularização do IVA a favor da Requerente, titulada pelas notas de crédito, se afigura indevida, à luz das regras de localização constantes das alíneas a) e b) do n.º 6 do artigo 6.º do Código do IVA. 

Ora, salvo devido respeito, a AT não tem razão. 

Importa analisar a diferença, para efeitos de tributação, dos conceitos “residência fiscal” e “domicílio fiscal” pois, por diversas vezes, o legislador, comunitário e nacional, recorrem a conceitos de “grau de conexão” ao território nacional para determinar em função desse “grau” que tipo de obrigações são impostas a cada uma das categorias de sujeitos passivo de imposto. 

 

De notar que o Código do IVA aplica às pessoas singulares o conceito de residência habitual para determinar o seu domicílio fiscal. Por seu turno o artigo 19.º da LGT[10] aplica o conceito de domicílio, quer a pessoas singulares quer a pessoas coletivas (neste caso será a sede ou na sua falta, o estabelecimento estável) enquanto local a partir do qual se manifesta a intensão de desenvolvimento de uma atividade com carácter de habitualidade. 

Ora, no caso das pessoas singulares, podem estas dispor, em territórios distintos, de um domicílio – ou morada - e de uma residência fiscal, resultante de uma conexão territorial e económica, determinada segundo critérios legais, que implicam uma sujeição a tributação naquele território. 

Atenta a factualidade que resultou comprovada, o cliente da Requerente dispõe de domicílio em Portugal – no sentido de uma morada sita em Odivelas – merecendo no cadastro da AT, o enquadramento de “contribuinte Não Residente” desde 1 de junho de 1988. 

Acresce ao referido que a Requerida não fez prova da verificação de quaisquer de factos que, em substância, traduzam uma situação concreta de residência em Portugal (o desenvolvimento efetivo de uma atividade através de serviços prestados, contratos de trabalho, tempo de permanência efetiva em território português, entre outros) e que permitam concluir que se mostram verificados os critérios de residência fiscal, e de “residência habitual”, nos termos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS.

Efetivamente, em face da factualidade, nada há que permita sustentar, ainda que perfunctoriamente, por um lado, que o adquirente dos serviços tenha permanecido em território português mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano de 2020 e, que por outro lado, não tenha residido em Angola no mesmo período temporal. Por consequência, não se mostra verificado o critério de residência estatuído na alínea a) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS.

Centrando-nos agora na alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS, é pacífica a afirmação de que esta norma impõe três requisitos, de cuja verificação cumulativa depende a qualificação como residente: (i) a permanência em Portugal; (ii) a disposição de uma habitação; e (iii) a verificação de condições que façam supor que a habitação será mantida e ocupada como residência habitual; obviamente, tendo por base o corpo do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS, a verificação dos referidos requisitos deve ter por referência o “ano a que respeitam os rendimentos”, sendo este o espectro temporal durante o qual deve ser verificada a residência.

Ora, ainda que para efeitos de IRS, mas contribuindo para a estabilização destes conceitos, com implicações, segundo entendemos, em sede de IVA, em particular no âmbito dos adquirentes que são pessoas singulares, a doutrina e a jurisprudência têm concluído que os conceitos de domicílio fiscal e de residência fiscal, não são sinónimos.

De acordo com Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2009, p. 281, a “noção de residência ou domicílio para efeitos de delimitação da esfera de incidência das normas tributárias de cada Estado é também distinta da noção de domicílio tributário de direito interno e que é um domicilio especial pelo qual a lei refere a um lugar bem determinado, o exercício de direitos e o cumprimento dos deveres estabelecidos pelas normas tributárias, localizando o sujeito passivo com vista a fixar a circunscrição territorial em cuja área se situem os serviços de administração competentes para a prática de atos relativos à situação fiscal do contribuinte."

Assim, de um lado, podemos discernir o conceito de domicílio fiscal previsto no artigo 19.º da LGT, cuja relevância mais evidente se situa ao nível dos contactos entre o contribuinte e a AT (aliás, cabe atualmente no conceito de domicílio fiscal o domicílio fiscal eletrónico). Daí a previsão constante do artigo 43.º, n.º 2, do CPPT, no sentido de que a “falta de recebimento de qualquer aviso ou comunicação expedidos nos termos dos artigos anteriores, devido ao não cumprimento do disposto no n.º 1 [comunicação da alteração do domicílio], não é oponível à administração tributária, sem prejuízo do que a lei dispõe quanto à obrigatoriedade da citação e da notificação e dos termos por que devem ser efetuadas”. Refira-se ainda que este dever de comunicação, previsto quer no artigo 43.º, n.º 1 do CPPT, quer no então artigo 19.º, nº 3 da LGT, não é qualificado como uma formalidade ad substanciam, o que significa que a sua preterição não tem necessária e definitivamente impacto em termos de tributação ou de estabelecimento da residência fiscal do sujeito passivo. (vide, nesse sentido, os acórdãos do TCAN, processo n.º 00546/10.2BEVIS, de 17/09/2015, acórdão do TCAS, proferido no processo n.º 2369/09.7, de 11/11/2021, acórdão do TCAS, proferido no processo n.º 986/11, de 04/07/2022).

Assim, seguindo de perto a jurisprudência supra citada, a residência fiscal refere-se ao estatuto tributário (residente vs. não residente, com impacto na abrangência da tributação), enquanto domicílio fiscal refere-se ao local de referência do contribuinte para fins administrativos e de comunicação com a AT. Ainda que ambos possam coincidir, como é usual que suceda, in casu, o adquirente dos serviços encontra-se registado junto da AT como não residente em Portugal, pelo que se entende que os serviços prestados pela Requerente não são localizados e tributáveis, para efeitos de IVA, em território nacional.

Termos em que se conclui pela ilegalidade da liquidação adicional de imposto relativa ao direito à regularização do IVA invocado pela Requerente.  

 

f)     Violação da obrigação de segredo profissional dos Advogados 

 

Para além dos vícios de fundo supra analisados, vem a Requerente invocar uma ilegalidade procedimental, imputando ao relatório da AT a violação do sigilo profissional dos advogados, previsto do artigo 81.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA), considerando que, ao longo do RIT foram invocados factos relacionados com a prestação de serviços que as suas clientes D... e E... lhe confiaram. 

Nos termos do referido preceito legal, conjugado com o artigo 86.º n.º 1, alínea e) do EOA, o advogado não deve invocar publicamente, especial perante os tribunais, quaisquer negociações transacionais malogradas quer verbais quer escritas, em que tenha intervindo como advogado.  

 Assim, ao serem revelados factos e documentos no âmbito do RIT que integram o amago da representação judicial, bem como aspetos das negociações havidas por parte dos seus clientes, foi violada a confidencialidade da informação coberta pela obrigação de sigilo profissional.

Concretizando, defende a Requerente que tal violação teve lugar, designadamente, com a divulgação dos seguintes factos: 

a)    Elaboração da defesa do CONSÓRCIO ... junto do ESTADO PORTUGUÊS no processo administrativo de audiência prévia dos interessados, na fase do projeto de decisão de indeferimento do pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados na área denominada de..., pertencente a vários concelhos do distrito de Viseu, formulado pelo CONSÓRCIO ...;

b)    Interposição de uma providência cautelar nos Tribunais Administrativos Portugueses de molde a suspender a executoriedade do despacho do Sr. Secretário de Estado de Energia (SEEn), de 23.04.2018, que indeferiu o referido pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados, celebrado em 20.02.2013, entre o Estado ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ...”;

c)     Impugnação judicial perante os Tribunais Administrativos Portugueses quer do despacho do Sr. SEEn, de 23.04.2018, que indeferiu o pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados, celebrado em 20.02.2013, entre o Estado ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ..., quer a declaração de caducidade do mencionado contrato;

d)    O CONSÓRCIO ... terá solicitado a prorrogação deste contrato administrativo, por cartas de 15.04.2016 e 14.12.2016, conforme págs. da petição.

e)    De acordo com os elementos recebidos, a composição do CONSÓRCIO ... foi alterada, em 30.06.2016, com a admissão do sujeito passivo E... como consorciado, por via de aditamento ao contrato de consórcio para o Projeto ... . 

f)     O sujeito passivo E... condicionou a sua plena participação, como investidor, no CONSÓRCIO ..., à prorrogação do contrato de concessão experimental, o que lhe foi assegurado pela D..., no Memorando que formaliza a relação contratual entre as duas empresas. 

g)    Por deliberação do Conselho de Orientação e Fiscalização do CONSÓRCIO ..., tomada no dia 28.09.2018, o sujeito passivo H... INC. foi excluído do CONSÓRCIO. 

h)    A utilização, pela AT, da informação (descrição dos serviços jurídicos prestados) constante das “Notas de Honorários”, que fazem parte do Anexo 10 do RFIT, que são documentos abrangidos pela obrigação de sigilo profissional da B..., com acesso restringido à D..., à E... e à f... . Esta última por via da autorização concedida pelas clientes da B..., no CPSJ ;

i)      A alegação que a maior parte dos pagamentos ocorreu posteriormente à realização dos serviços e à emissão das faturas à F... . 

j)      A utilização de declarações prestadas relativo ao significativo atraso na faturação dos 75% de honorários financiados pela F... a qual no decurso do processo procurou negociar, com a sociedade de advogados, condições especiais para a prestação dos serviços, visando a minimização dos correspondentes custos.  

 

Por seu turno a AT justifica a invocação destes factos para descrever e qualificar a natureza dos serviços prestados pela B..., designadamente se poderão ser considerados como tendo uma relação suficientemente direta com os bens imóveis localizados no distrito de Viseu onde o CONSÓRCIO ... exerceu a atividade de exploração experimental de recursos geológicos, com vista a determinar se o território nacional é, ou não, o lugar das prestações de serviços realizadas, de acordo com o artigo  47.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28.11.2006.

Por conseguinte, segundo a AT a análise inspetiva centrou-se nos aspetos tributários das operações realizadas pela Requerente, não incidindo sobre o conteúdo estrito da consulta jurídica ou da estratégia forense em si mesmas. 

De resto, a informação utilizada – relativa à interposição de providências cautelares ou ações administrativas relacionadas com um contrato de exploração de recursos geológicos em Portugal, a cargo do Consórcio ... - foi essencial para determinar o correto lugar da prestação dos serviços de acordo regras estabelecidas no Código IVA.

Vejamos. 

 

Antes de mais, atentemos ao quadro legal aplicável.  

 

Artigo 92.º

Segredo profissional

1 - O advogado é obrigado a guardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento lhe advenha do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços, designadamente: a) A factos referentes a assuntos profissionais conhecidos, exclusivamente, por revelação do cliente ou revelados por ordem deste; b) A factos de que tenha tido conhecimento em virtude de cargo desempenhado na Ordem dos Advogados; c) A factos referentes a assuntos profissionais comunicados por colega com o qual esteja associado ou ao qual preste colaboração; d) A factos comunicados por coautor, corréu ou cointeressado do seu constituinte ou pelo respetivo representante; e) A factos de que a parte contrária do cliente ou respetivos representantes lhe tenham dado conhecimento durante negociações para acordo que vise pôr termo ao diferendo ou litígio; f) A factos de que tenha tido conhecimento no âmbito de quaisquer negociações malogradas, orais ou escritas, em que tenha intervindo. 2 - A obrigação do segredo profissional existe quer o serviço solicitado ou cometido ao advogado envolva ou não representação judicial ou extrajudicial, quer deva ou não ser remunerado, quer o advogado haja ou não chegado a aceitar e a desempenhar a representação ou serviço, o mesmo acontecendo para todos os advogados que, direta ou indiretamente, tenham qualquer intervenção no serviço. 3 - O segredo profissional abrange ainda documentos ou outras coisas que se relacionem, direta ou indiretamente, com os factos sujeitos a sigilo. 4 - O advogado pode revelar factos abrangidos pelo segredo profissional, desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho regional respetivo, com recurso para o bastonário, nos termos previstos no respetivo regulamento. 5 - Os atos praticados pelo advogado com violação de segredo profissional não podem fazer prova em juízo. 6 - Ainda que dispensado nos termos do disposto no n.º 4, o advogado pode manter o segredo profissional. 7 - O dever de guardar sigilo quanto aos factos descritos no n.º 1 é extensivo a todas as pessoas que colaborem com o advogado no exercício da sua atividade profissional, com a cominação prevista no n.º 5. 8 - O advogado deve exigir das pessoas referidas no número anterior, nos termos de declaração escrita lavrada para o efeito, o cumprimento do dever aí previsto em momento anterior ao início da colaboração, consistindo infração disciplinar a violação daquele dever.”

 

Ao nível do procedimento de inspeção dispõe o artigo 9.º do RCPITA o seguinte: 

 

“Artigo 9.º

Princípio da cooperação

1 - A inspecção tributária e os sujeitos passivos ou demais obrigados tributários estão sujeitos a um dever mútuo de cooperação. 2 - Em especial, estão sujeitos a um dever de cooperação com a inspecção tributária os serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais, as associações públicas, as empresas públicas ou de capital exclusivamente público, as instituições particulares de solidariedade social e as pessoas colectivas de utilidade pública.”

 

Por seu turno dispõe o artigo 64.º da LGT o seguinte: 

“Artigo 64.º

Confidencialidade

1 - Os dirigentes, funcionários e agentes da administração tributária estão obrigados a guardar sigilo sobre os dados recolhidos sobre a situação tributária dos contribuintes e os elementos de natureza pessoal que obtenham no procedimento, nomeadamente os decorrentes do sigilo profissional ou qualquer outro dever de segredo legalmente regulado. 

2 - O dever de sigilo cessa em caso de: a) Autorização do contribuinte para a revelação da sua situação tributária; b) Cooperação legal da administração tributária com outras entidades públicas, na medida dos seus poderes;  c) Assistência mútua e cooperação da administração tributária com as administrações tributárias de outros países resultante de convenções internacionais a que o Estado Português esteja vinculado, sempre que estiver prevista reciprocidade;  d) Colaboração com a justiça nos termos do Código de Processo Civil e mediante despacho de uma autoridade judiciária, no âmbito do Código de Processo Penal; e) Confirmação do número de identificação fiscal e domicílio fiscal às entidades legalmente competentes para a realização do registo comercial, predial ou automóvel. 

 3 - O dever de confidencialidade comunica-se a quem quer que, ao abrigo do número anterior, obtenha elementos protegidos pelo segredo fiscal, nos mesmos termos do sigilo da administração tributária. 

 4 - O dever de confidencialidade não prejudica o acesso do sujeito passivo aos dados sobre a situação tributária de outros sujeitos passivos que sejam comprovadamente necessários à fundamentação da reclamação, recurso ou impugnação judicial, desde que expurgados de quaisquer elementos susceptíveis de identificar a pessoa ou pessoas a que dizem respeito.  

5 - Não contende com o dever de confidencialidade: a) A divulgação de listas de contribuintes cuja situação tributária não se encontre regularizada, designadamente listas hierarquizadas em função do montante em dívida, desde que já tenha decorrido qualquer dos prazos legalmente previstos para a prestação de garantia ou tenha sido decidida a sua dispensa;  b) A publicação de rendimentos declarados ou apurados por categorias de rendimentos, contribuintes, sectores de actividades ou outras, de acordo com listas que a administração tributária deve organizar anualmente a fim de assegurar a transparência e publicidade.  c) A notificação, pela administração tributária, de sujeito passivo que disponibilize uma interface eletrónica para efeitos de acionar a responsabilidade solidária deste. 

6 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, considera-se como situação tributária regularizada o disposto no artigo 177.º-A do CPPT. 

7 - Para efeitos do disposto na alínea d) do n.º 2, e com vista à realização das finalidades dos processos judiciais, incluindo as dos inquéritos em processo penal, as autoridades judiciárias acedem diretamente às bases de dados da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 8 - A concretização do acesso referido no número anterior é disciplinada por protocolo a celebrar entre o Conselho Superior da Magistratura, a Procuradoria-Geral da República e a Autoridade Tributária e Aduaneira.”

 

Na situação em apreço, decorre dos factos provados, que no seguimento da ação de inspeção desencadeada à Requerente motivada por um pedido de reembolso exercido na declaração periódica relativa ao período de 2023-09-T, a AT analisou um conjunto de elementos representativos das operações ativas e que deram lugar a liquidação de imposto a favor do Estado entre os períodos de 2017 a 2023. 

Resulta do RIT que a inspeção levada a cabo pela AT, passou pela verificação das operações constantes dos Campos 3, 7, 8 e 9 e dos documentos representativos dessas operações, as quais, diziam respeito à faturação de honorários e despesas, honorários faturados ao sujeito passivo E..., financiamentos para a realização de serviços jurídicos ao consórcio de ... faturados ao sujeito passivo F... e a faturação de comparticipação de prémios de sucesso no âmbito da prestação de serviços jurídicos. 

No campo das operações passivas que deram origem a Imposto a favor do sujeito passivo foram analisados os Campos 20, 24 e Campo 40 relativo à retificação de faturas de honorários. 

Ora, no âmbito desta análise foram detetadas pela AT situações irregulares, em relação à faturação dos serviços jurídicos prestados pela B... ao sujeito passivo E..., sedeado em Malta, importando para os SIT determinar se teriam uma relação suficientemente direta com os bens imóveis localizados no Distrito de Viseu onde o Consórcio ... exerceu a atividade de exploração experimental de recursos geológicos, para efeitos de determinar o lugar da tributação, para efeitos de IVA, das prestações de serviços realizadas. 

Os SIT analisaram a composição do Consórcio de ..., identificando as entidades envolvidas, e o pedido feito por estas (H... e D...) de celebração de um contrato administrativo para a atribuição de uma área de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata e metais associados, denominado “...”, localizado nos concelhos de..., ..., ... e ... no distrito de Viseu, de acordo com o Aviso n.º 20/2013, publicado no DR, 2ª Serie, n.º 2, de 02.01.2023.

Neste âmbito foi apurada a celebração de um contrato administrativo com o Estado Português, representado através do Ministério da Economia, de concessão de exploração experimental, na área territorial supra identificada, de acordo com o Aviso n.º 311/2013, publicado no DR, 2ª série, n.º 97, de 21.05.2013.

Através de consulta a internet, foi possível apurar que o sobredito consórcio constituído pelas sociedades H... e D..., solicitou junto do Ministério da Economia a atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados na área denominada de ..., localizado nos concelhos de ..., ..., ...e ... no distrito de Viseu, ao abrigo do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 90/90, de 16.03, conforme aviso n.º 14259/2016, publicado no DR., 2ª serie, n.º 223, de 21.11.2016.

No referido aviso n.º 14259/2016 não consta mencionado se o pedido de atribuição de direitos de prospeção e pesquisa por parte do consórcio ... teve como objetivo a prorrogação do contrato concessão de exploração experimental ou a concessão de exploração definitiva daquela área.

Refere o RIT que “Não foi possível apurar se existe, ou não, relação com o procedimento administrativo decorrente do referido aviso n.º 14259/2016, mas o ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Sr. SEEn, por despacho, de 23.04.2018, decidiu a extinção por caducidade, por decurso do prazo de 4 anos de vigência do contrato de concessão de exploração experimental, celebrado em 20.02.2013 com o CONSÓRCIO ..., de acordo com o aviso n.º 10648/2018, publicado no DR, 2ª serie, em 06.08.2018 (anexo 4).

Não concordando com a decisão do ESTADO PORTUGUÊS e pretendendo a defesa dos seus interesses perante os Tribunais Portugueses, as sociedades D... e E... que constituíam o CONSÓRCIO ..., solicitaram em 25/06/2018 a B... a prestação de serviços jurídicos, tendo para o efeito, sido celebrado um contrato o qual foi aceite em 01/10/2018.

No que respeita a composição do CONSÓRCIO e de referir que:

Quando foi celebrado, em 20.02.2013, o contrato de concessão de exploração experimental entre o ESTADO PORTUGUÊS e o CONSÓRCIO ..., este era constituído pelos sujeitos passives H... INC. e D... .

0 sujeito passive D... e uma pessoa jurídica de direito privado constituída no Brasil e inscrita no CNPJ com o n.º..., com sede na avenida..., n.0..., ..., ... ...-... Brasil. De acordo com os elementos recebidos, a composição do CONSÓRCIO ... foi alterada, em 30.06.2016, com a admissão do sujeito passive E... como consorciado, por via do Aditamento n.º 3 ao contrato de consórcio para o Projeto... . (anexo 5).

0 sujeito passive E... é uma sociedade constituída ao abrigo da Lei das Sociedades Comerciais de Malta e registada com o n.º ... na Conservatória do Registo das Sociedades Comerciais, com sede na ... Malta.”

 

Tendo em conta a factualidade constante do RIT, que aliás não é posta em causa pela Requerente, bem como o quadro legal supra indicado, importa aferir se tem razão a Requerente quanto à alegação de um vício procedimental que inquina a legalidade do RIT, consubstanciado na violação do segredo profissional do Advogado, em virtude do acervo de informação e documentos solicitados pela AT, para fundamentar as correções efetuadas. 

 

O segredo profissional constitui um atributo indispensável ao exercício de qualquer profissão que pressuponha uma relação de confiança, e define-se como a proibição de revelar factos ou documentos de que se teve conhecimento em razão e no exercício de uma determinada atividade profissional.[11]

A figura do segredo profissional é fundamental para a prossecução das finalidades de interesse público da profissão de Advogado, sendo por esse motivo objeto de regulamentação e de proteção legal. 

É importante notar que o titular do direito protegido pelo direito fundamental à reserva da vida privada tutelado pelo segredo profissional, não é o profissional obrigado a sigilo, mas antes o sujeito a quem respeitam os dados cobertos pelo segredo. O sigilo imposto à entidade ou ao profissional constitui uma decorrência da sua atividade. Não se trata de um privilégio que lhe é concedido, constitui antes um dever funcional que é instrumental, protegendo indiretamente direitos fundamentais de terceiros.[12]

Como é pacífico, o dever de sigilo profissional que impende sobre o Advogado tem a sua razão de ser na necessidade de preservar o princípio da confiança, sendo que o exercício da advocacia assume reconhecido interesse público, dada a natureza social dessa função.

Como se consagra no n.º 2.3.1. do Código de Deontologia dos Advogados Europeus: “É requisito essencial do livre exercício da advocacia a possibilidade do cliente revelar ao advogado informações que não confiaria a mais ninguém, e que este possa ser o destinatário de informações sigilosas só transmissíveis no pressuposto da confidencialidade. Sem a garantia de confidencialidade não pode haver confiança. O segredo profissional é, pois, reconhecido como direito e dever fundamental e primordial do advogado. A obrigação do advogado de guardar segredo profissional visa garantir razões de interesse público, nomeadamente a administração da justiça e a defesa dos interesses dos clientes. Consequentemente, esta obrigação deve beneficiar de uma proteção especial por parte do Estado”.

E como forma de salvaguardar e proteger esse dever de sigilo profissional, acrescenta-se no n.º 2.3.2 que “O advogado deve respeitar a obrigação de guardar segredo relativamente a toda a informação confidencial de que tome conhecimento no âmbito da sua atividade profissional”, vide Decisão Sumária proferida no Tribunal da Relação do Porto, no processo n.º 868/17.1T8PRT-B.P1, datada de 24/09/2018 (Jorge Seabra).

Veja-se, no mesmo sentido, o Acórdão da Relação do Porto de 07/07/2010, processo n.º 10443/08.6TDPRT-A.P1, “O segredo profissional é um direito e um dever do advogado. Só um segredo profissional com tais contornos é verdadeiramente o garante de um interesse público que, com ele, a lei visa prosseguir e que tem uma dupla vertente: por um lado, que as partes se façam, sem qualquer receio, aconselhar o Advogado e que este possa, sem constrangimento, ser informado de tudo o que entenda ser necessário ao exercício correcto do seu múnus; por outro, que o Advogado possa, sem constrangimento, correr o caminho da livre e responsável conciliação de interesses, como forma de reduzir a conflitualidade judicial”.

Ora, a questão que está em causa nos autos é a de saber se a informação constante do RIT, relacionada com a representação pela B... dos interesses do Consórcio ..., junto dos Tribunais Administrativos Portugueses de modo a suspender a decisão do Secretário de Estado da Energia que indeferiu um pedido de prorrogação do contrato de exploração experimental de depósitos minerais, celebrado em 2013 com o Estado Português, viola o dever de sigilo previsto no artigo 92.º do EOA.

A questão, segundo formulada, pela Requerente no seu pedido, estende-se à junção de documentos que esclarecem a composição dos membros do consórcio, ao modelo de faturação acordado entre as partes e à junção das notas de honorários que foram emitidas pelas Requerente no âmbito do patrocínio judiciário promovido para Requerente. 

Ora, nº 3 do artigo 92º do EOA impede a revelação ou junção de documentos quando, face ao seu conteúdo, daí resulte a revelação de factos sujeitos a sigilo e a consequente violação do dever de segredo. 

Contudo, no caso em apreço, e conforme também resulta do RIT, a informação que permitiu contextualizar as prestações de serviços jurídicos realizadas entre a B... e os membros do Consórcio ... era, no essencial, de natureza pública, tendo sido objeto de publicação em Diário da República e passível de consulta através da internet. 

Com efeito, a celebração de um contrato administrativo para a atribuição de uma área de exploração experimental de depósitos minerais de ouro, prata e metais associados, denominado “...”, localizado nos concelhos de ..., ..., ... e ... no distrito de Viseu, foi objeto do Aviso n.º 20/2013, publicado no DR, 2ª Serie, n.º 2, de 02.01.2023.

Por seu turno, a celebração de um contrato administrativo com o Estado Português, representado através do Ministério da Economia, de concessão de exploração experimental, na área territorial supra identificada, constou do o Aviso n.º 311/2013, publicado no DR, 2ª série, n.º 97, de 21.05.2013.

A AT apurou através de informação recolhida na internet que o sobredito consórcio constituído pelas sociedades H... e D..., solicitou junto do Ministério da Economia a atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de depósitos minerais de ouro, prata, e metais associados na área denominada de..., localizado nos concelhos de ..., ..., ... e ... no distrito de Viseu, ao abrigo do n.º 1 do artigo 6.º do DL n.º 90/90, de 16.03, conforme aviso n.º 14259/2016, publicado no DR., 2ª serie, n.º 223, de 21.11.2016.

Ora, sendo estes factos públicos – na medida em resultam de processos de contratação pública do Estado Português junto de entidades privadas - não se poderá dizer como pretende a Requerente, que a revelação da existência de um contrato de exploração experimental de depósitos minerais, o objeto do contrato, a extensão e o prazo do contrato, os sujeitos intervenientes, incluindo as respetivas denominações sociais, sejam factos abrangidos pelo segredo profissional, e uma vez juntos estes factos e documentos, tal segredo se encontre violado. 

Por conseguinte, pela sua própria natureza de “Processo de Contratação Pública”, todos estes aspetos que constam do RIT, são passíveis de consulta pública. 

Acresce que não existe uma proibição geral ou generalizada de revelação do teor de toda e qualquer informação obtida por um Advogado, se assim fosse o Advogado nunca poderia elaborar uma petição inicial porque não poderia divulgar a versão dos factos que lhe foi transmitida pelo cliente – vide acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24.09.2018.

Em determinadas condições o segredo profissional pode ceder perante a necessidade de acautelar outros interesses ou direitos dignos de proteção, sendo certo que a AT em matéria de acesso a informação protegida pelo segredo não possui um direito especial, sendo aplicáveis os critérios normativos gerais, designadamente os impostos pelos princípios da CRP. 

Cabe referir, que o direito fundamental ao sigilo profissional ínsito à profissão de Advogado, tal como como acontece com outros direitos fundamentais, não consubstancia um direito absoluto e ilimitado. 

Ora, quanto à invocação do segredo profissional relativamente às faturas emitidas pela B..., o que se encontra aí documentado, salvo devido respeito, não são dados pessoais diferentes dos já conhecidos publicamente, ou estratégias processuais ou factos confidenciais que revelem o teor das negociações entre as partes, ou as posições assumidas pelos respetivos intervenientes nessas negociações. 

Com efeito, a finalidade da informação apurada pela AT foi documentar quais os pagamentos efetuados entre as partes envolvidas, e se os serviços jurídicos prestados pela B... ao Consórcio ... tinham uma relação direta com um bem imóvel situado em território português, facto este que também era de natureza pública. A AT encontra-se adstrita pelo artigo 58.º da LGT no tocante ao princípio do inquisitório e da descoberta verdade material. Ora, tal princípio em conexão com princípio do ónus da prova impõe sobre a AT a necessidade de realizar as diligências necessárias e adequadas ao apuramento da verdade material. 

Quanto à verificação de pagamentos efetuados, o Tribunal da 5ª Vara Cível da Comarca de Lisboa no processo n.º 341/99, pronunciou-se afirmando que a AT pode livremente consultar a contabilidade, os livros e recibos, sendo a invocação do dever de segredo profissional insuficiente, devendo o Advogado facultar o acesso a tal informação ao abrigo do princípio de cooperação e, em contrapartida, salvaguardar qualquer questão de confidencialidade que possa estar em causa. 

Em face do exposto, improcede, neste segmento, o pedido da Requerente. 

 

g)    Falta ou insuficiente fundamentação do RIT 

No seu pedido a Requerente invoca o vício formal, de falta de fundamentação do RIT, alicerçado no disposto nos artigos 77.º da LGT e 268.º, n.º 3 da CRP.

Para sustentar a alegada falta de fundamentação do ato, alega que as liquidações de IVA contra a B..., baseadas no RIT não se encontram devidamente fundamentadas, sendo certo que segundo a Requerente a falta de fundamentação adequada prejudica o exercício do contraditório. 

Assim, entende a Requerente que ocorreu violação do dever de fundamentação ao nível da obrigação de respeito do segredo profissional, pois a AT utilizou informações abrangidas pelo sigilo analisando o conteúdo dos serviços jurídicos prestados pela Requerente à cliente E..., justificando apenas que o fazia para aferir a localização das operações. 

Acresce que as conclusões que extrai relativamente à relação suficientemente direta dos serviços jurídicos prestados com bens imóveis não aborda adequadamente as regras de localização, designadamente o artigo 56.º da Diretiva 2006/112/CE, que estabelece que os serviços jurídicos prestados a sujeitos passivos da EU devem ser tributados no local onde o destinatário tem a sua sede.  

Além disso, não prova a transferência de um título de propriedade imobiliária, imputando a relação dos serviços com um imóvel sem nunca o identificar. 

Semelhantes deficiências de fundamentação se verificam, segundo a Requerente, no âmbito da sujeição a IVA do contrato de financiamento de litígios celebrado com a F..., como se de uma prestação de serviços se tratasse.  A AT declara factos que não justifica, como por exemplo “a maior parte do pagamento ocorreu posteriormente à realização dos serviços e à emissão das facturas à F...” ou ainda “Face ao exposto, constata-se que em caso de não sucesso, as importâncias recebidas da F... a título de financiamento, (75% do valor dos serviços prestados), constituem o pagamento de 75% do valor dos serviços prestados pela B... ao Cliente. Portanto, em caso de sucesso ou insucesso a B... é sempre remunerada pelos serviços prestados.” 

Apesar de ter transcrevido as disposições contratuais aplicáveis, a AT desconsiderou o financiamento da B..., proporcionado pela F..., sem qualquer justificação, e considerou esse financiamento como um pagamento em benefício da E... . 

A Requerente defende que a falta de fundamentação perpassa os vários pontos do RIT, estando presente nas correções dos valores de reporte de crédito de imposto sem atender às regras de caducidade, assim como na insuficiência de fundamentação nas correções efetuadas às regularizações de imposto alegadamente indevidas. 

Em suma, segundo a Requerente não é revelada “a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o ato, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente”, pelo que tais correções carecem de elementos concretos ou de base legal que permitam formular o juízo de imputação subjacente às liquidações adicionais.   

 

Mais uma vez se discorda da Requerente. 

 

De facto, a Requerente pode não concordar com a fundamentação apresentada, mas é indesmentível que ela existe, é clara, é extensa, não contraditória e congruente com a conclusão que levou aos atos de liquidação.

A fundamentação do ato de liquidação mais não é do que a forma de a “AF exteriorizar os motivos porque procedeu àquela liquidação e não a qualquer outra, de uma forma clara, congruente e racional de molde a constituir a base que suporta a decisão.[13]

O dever de fundamentação desempenha a função primordial de permitir que o destinatário do ato se inteire das razões que subjazem à decisão administrativa, permitindo o controlo da sua validade, através da análise dos respetivos pressupostos, e o acesso à garantia contenciosa, dando a conhecer ao sujeito passivo o itinerário cognoscitivo e valorativo para a AT ter decidido no sentido em que decidiu.

Segundo a jurisprudência do STA, deve considerar-se “fundamentado o ato quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível por um destinatário normal colocado na posição em que se encontra o seu real destinatário.[14]

Com efeito, esclarece a jurisprudência daquele Tribunal que a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo legal de ato, visando responder às necessidades de esclarecimento do contribuinte, permitindo-lhe conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a sua prática e por que motivo se decidiu num sentido e não noutro.[15]

Compulsados os autos arbitrais, constata-se que o RIT contém, com clareza e suficiente grau de detalhe os argumentos, de facto e de direito, nos quais a AT alicerçou as correções de IVA impugnadas, que se prendem essencialmente com o IVA devido pela Requerente no âmbito da prestação de serviços jurídicos às empresas que constituem o Consórcio ... para defesa dos seus interesses de exploração perante os tribunais portugueses. Segundo a AT, tais serviços deverão ser considerados localizados em Portugal, aplicando as normas legais vigentes. Adicionalmente, o RIT realizou correções em sede de IVA relativamente a regularizações consideradas indevidas. Do RIT consta ainda a posição da AT quanto à interpretação do artigo 45.º da LGT, fazendo-o de forma clara e fundamentada, com recurso à jurisprudência que considerou relevante em matéria de caducidade do direito à liquidação.     

Os argumentos apresentados pela AT, o seu sentido e alcance, foram devidamente percecionados pela Requerente que os refuta de forma exaustiva e circunstanciada, não se antevendo em que medida ficou comprometido o exercício do contraditório.

Acresce que a Requerente exerceu o direito de audição em momento anterior, tendo também nessa sede demonstrado entender cabalmente as correções propostas. 

Por conseguinte, improcede, pelas razões expostas, o vício de falta de fundamentação suscitado pela Requerente.

Questão distinta é a de saber se a Requerente discorda da fundamentação por não considerar verificados os pressupostos de tributação nela retratados situação que “tem já a ver com o mérito da decisão e com a legalidade «stricto sensu» do próprio ato”.[16]  Neste caso, não se trata de aferir o vício formal de ausência de fundamentação legalmente exigida, mas a validade substantiva dos atos tributários, por erro nos pressupostos de facto de direito, que foram oportunamente objeto de apreciação.

 

****

Nesse sentido, julgar-se-á parcialmente procedente o PPA apresentado pela Requerente. 

 

VI.  Pedido de juros indemnizatórios e juros compensatórios 

 

Vem a Requerente a ponto XIV do pedido peticionar que “a AT seja condenada a pagar à B... uma indemnização pelo pagamento indevido do IVA feito em 13 de março de 2025, depois de ter sido notificada para o efeito, pela AT, no valor de € 14.740.09 e de € 13.316,17, no total de € 28.056,26, acrescido dos correspondentes “juros compensatórios”, corresponde à taxa dos juros legais, contados desde a data do pagamento do imposto cobrado - 13 de março de 2025 - até à data da integral restituição destas quantias à B... .”

Ora, no que concerne ao pedido de “indemnização”, esclareça-se que o mecanismo encontrado pelo legislador fiscal para compensar os sujeitos passivos do pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, é o pagamento de juros indemnizatórios, conforme vêm descritos no artigo 43.º da LGT.

Ora, há lugar ao seu pagamento quando cumulativamente esse pagamento resulte de procedência de reclamação graciosa ou contencioso que se funde em erro sobre os pressupostos do ato impugnado, imputável aos serviços, o que significa que o ato não pode resultar de autoliquidação nem o vício de que padece consubstanciar vício de forma.

No caso em apreço, encontra-se provado que a Requerente pagou as quantias supra identificadas objeto de liquidação pela AT, no valor de no total de € 28.056,26, acrescido dos correspondentes “juros compensatórios” e tem direito ao reembolso da quantia de € 28.004,18.

Pelo que se referiu, a ilegalidade parcial do acto de liquidação é imputável à AT, pois emitiu as liquidações por sua iniciativa, com errada interpretação da lei, na parte referida.

Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT, relativamente ao montante a reembolsar.

Os juros indemnizatórios serão pagos desde a data em que a Requerente efectuou o pagamento (13 de março de 2025) até ao integral pagamento do montante que deve ser reembolsado, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

VII.  Decisão

 

Nestes termos e nos demais de direito, decide o Tribunal Arbitral o seguinte: 

 

i.               Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência: 

a.     Anular a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado n.º..., referente ao período de 2023/09T, no montante total de €28.056,26, mantendo-se a liquidação de IVA correspondente ao valor de €52,08;  

b.    Anular os atos consequentes à liquidação n.º...: 

                                                    i.     Liquidação de IVA 202403-T n.º 2025...; e 

                                                   ii.     Liquidação de IVA 202406T n.º 2025...; 

c.     Ordenar o reembolso dos montantes de IVA indevidamente liquidados; 

 

ii.              Julgar procedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios à Requerente, na proporção respeitante às liquidações anuladas, nos termos em for determinado em execução de sentença.

 

VIII.        Valor do Processo

 

Fixa-se, em conformidade com o disposto no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), que remete expressamente para o artigo 97.º-A, n.º 1, al. a), e n.º 3, do CPPT, e tendo em conta o artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, este último aplicável por força da alínea e), do n.º 1, do artigo 29.º, do RJAT, o valor do processo em € 28.056,26 (vinte e oito mil, cinquenta e seis euros, e vinte seis cêntimos).

 

IX.            Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1.530,00 nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira e da Requerente nas percentagens de 99,82%, e 0,18% respetivamente.

 

Lisboa, 9 de dezembro de 2025

 

Notifique-se.

 

A Árbitro do Tribunal Singular,

 

 

Filipa Barros

 

 



[1] Simplisticamente, pode dizer-se que se trata de uma fórmula segundo a qual uma parte num litígio recorre a uma entidade estranha à relação processual para que esta lhe financie parte dos custos da ação, das despesas e honorários de advogados

e técnicos, contra uma participação nos resultados do processo caso a parte financiada saia vencedora e assumindo o risco de perda desse "investimento" caso o autor ou demandante veja o seu pedido sucumbir.

[2] A F... é uma empresa que se dedica à atividade empresarial de financiamento de litígios por terceiros e não a um cliente a quem a sociedade de Advogados preste, diretamente, serviços jurídicos.   

[3] Isto é os 75% financiados pela F..., Limited. 

[4] Em conformidade com as declarações prestadas em 05/06/2024, ainda não foram proferidas as decisões finais no âmbito dos processos – Ação Administrativa Consórcio ...e interposição de providência cautelar – porque o Estado impôs a participação no processo de H..., a fim de que fosse garantida a legitimidade da parte demandante.  

[5] Ver cláusula 7 do contrato de arrendamento que constitui o anexo 2 - No que respeita as benfeitorias e referido que o sujeito passivo não poderá levantar as benfeitorias que ficam, por isso, a fazer parte integrante do locado, sem direito a qualquer indemnização ou alegar retenção seja a que titulo for, com exceção dos bens móveis amovíveis que sejam instalados, montados ou colocados por si dentro dos locados, que serão para todos os efeitos propriedade do sujeito passivo.

[6] Vide neste sentido, Acórdão do TCA Sul de 14-04-2015, processo n.º 05674/12. 

[7] Cf. artigo 36.º RCPITA e anotação n.º 3 ao artigo 36.º in RCPITA – Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira – Guia do Procedimento de Inspeção Tributária, 2018, Centro de Estudos Dantas Rodrigues, Rodrigues, J., Conchinha, M., Assunção, F., Monteiro, V., Garcia, L., e Miguel, J..

[8] No mesmo sentido podem ver-se os Acórdão do STA de 19-09-2018, processo n.º 01460/17, e de 04-12-2019, processo n.º 02243/16.6 BEBRG. 

[9] Esta é a interpretação que se colhe da lei e a que a jurisprudência do STA tem sufragado sem que se lhe conheça nota dissonante, vide entre outros Acórdão do STA proferido em 25-02-2015, no processo n.º 0709/14, e ainda Processo Arbitral n.º 929/2019-T, de 24-07-2020. 

[10] O artigo 19.º da LGT estipula o seguinte:

1.O domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário:

a)     Para as pessoas singulares, o local da residência habitual;

b)     Para as pessoas coletivas, o local da sede ou direção efetiva ou, na falta destas, do seu estabelecimento estável em Portugal.

2. O domicílio fiscal integra ainda o domicílio fiscal eletrónico, que inclui o serviço público de notificações eletrónicas associado à morada única digital, bem como a caixa postal eletrónica, nos termos previstos no serviço público de notificações eletrónicas associado à morada única digital e no serviço público de caixa postal eletrónica.

3. É obrigatória, nos termos da lei, a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária.

4. É ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária.

5. Sempre que se altere o estatuto de residência de um sujeito passivo, este deve comunicar, no prazo de 60 dias, tal alteração à administração tributária.

6. Os sujeitos passivos residentes no estrangeiro, bem como os que, embora residentes no território nacional, se ausentem deste por período superior a seis meses, bem como as pessoas coletivas e outras entidades legalmente equiparadas que cessem a atividade, devem, para efeitos tributários, designar um representante com residência em território nacional.

7. Independentemente das sanções aplicáveis, depende da designação de representante nos termos do número anterior o exercício dos direitos dos sujeitos passivos nele referidos perante a administração tributária, incluindo os de reclamação, recurso ou impugnação.

8. O disposto no número anterior não é aplicável, sendo a designação de representante meramente facultativa, em relação a não residentes de, ou a residentes que se ausentem para Estados membros da União Europeia ou do Espaço económico Europeu, neste último caso desde que esse Estado membro esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia.

9. O representante pode renunciar à representação nos termos gerais, mediante comunicação escrita ao representado, enviada para a última morada deste.

10. A renúncia torna-se eficaz relativamente à Autoridade Tributária e Aduaneira quando lhe for comunicada, devendo esta, no prazo de 90 dias a contar dessa comunicação, proceder às necessárias alterações, desde que tenha decorrido pelo menos um ano desde a nomeação ou tenha sido nomeado novo representante fiscal.

11. A administração Tributária poderá retificar oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor.

 

[11] Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional (TC) n.º 176/21 de 06 de abril de 2021.

[12] Idem.

[13] Acórdão do TCA Sul, proferido no processo n.º 04410/10 de 25 de janeiro de2011. 0

[14] Acórdão do STA, proferido no processo n.º 1051/09, de 17 de novembro de 2010.

[15] A título de exemplo vide os acórdãos do STA, processos n.ºs 065/09, de 15 de abril de 2009, e 01114/05, de 2 de fevereiro de 2006.

[16] Neste sentido, Acórdão do STA, proferido no processo n.º 1690/13, de 23 de abril de 2014.