SUMÁRIO:
O Tribunal Arbitral singular não dispõe de competência para decidir o pedido de pronúncia arbitral em que é requerida a declaração da prescrição de dívidas tributárias e da ilegalidade de atos do órgão da execução fiscal.
DECISÃO ARBITRAL
O árbitro Dr. António Cipriano da Silva, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral singular no processo identificado em epígrafe, acorda no seguinte:
I. Relatório
1. Em 12 de junho de 2025, A..., contribuinte fiscal nº ..., com domicílio Rua ..., ... Barcarena (doravante “Requerente”) ao abrigo do artigo 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral apresentando pedido de pronúncia arbitral (“PPA”) em que é demandada a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT” ou “Requerida”) com vista à declaração da ilegalidade da decisão de indeferimento de prescrição de dividas por reversão - oficio 2025..., formulando como pedido:
a) Que seja admitido o presente pedido de pronúncia arbitral;
b) Que seja declarado que as dívidas fiscais revertidas no âmbito dos processos de execução fiscal identificados se encontram prescritas, com todas as consequências legais daí decorrentes, designadamente a extinção da execução fiscal e a extinção da responsabilidade do Requerente;
c) A declaração de prescrição das dívidas fiscais acima indicadas, no montante global de 37.283,54€, por se encontrar decorrido o prazo legal de prescrição nos termos do artigo 48.º da LGT;
d) A condenação da AT em custas arbitrais, se for caso disso.
2. No dia 16 de junho foi aceite o pedido de constituição de Tribunal Arbitral.
3. No dia 25 de agosto de 2025 foi constituído o Tribunal Arbitral.
4. Em 25 de agosto de 2025, foi a Requerida notificada nos termos e para os efeitos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT para, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e para remeter ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo.
5. Em 30 de setembro de 2025 a Requerida juntou aos autos a sua resposta.
6. Em 06 de outubro de 2025 o Requerente foi notificado para no prazo de 15 dias, se pronunciar, querendo, sobre a matéria da exceção suscitada pela Requerida na sua resposta.
7. Em 31 de outubro de 2025 o Tribunal arbitral dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18º RJAT, notificando as partes para, querendo, apresentarem alegações finais escritas (simultâneas) no prazo de 10 dias.
8. Em 10 de novembro o Requerente juntou aos autos as suas alegações.
9. Em 14 de novembro a Requerida juntou aos autos as suas alegações.
II. Posição das partes
II.1. Posição da Requerente
a) A Requerente deduziu junto da AT pedido de prescrição de dividas nos termos do artigo 48.º e 49.º da LGT, alegando em suma, que nunca foi notificado da reversão das dividas, tendo sido notificado do Despacho de Indeferimento da prescrição por reversão –NOTIFICAÇÃO DE DECISÃO FINAL – Processo ...2015... e outros, por oficio 2025..., relativa à liquidação de IVA e IRS, dos anos de 2005 a 2007.
b) Alega a que a sociedade B..., Lda., NIPC ..., foi objeto de diversos processos de execução fiscal, por dívidas de IVA respeitantes aos anos de 2005 a 2007, totalizando o montante de 37.283,54€. Atento ao cargo de gerência exercido pelo Requerente à data dos factos, a Administração Tributária (AT) decidiu proceder à reversão da execução fiscal.
c) Entende o Requerente que no caso em apreço, não se verifica qualquer ato interruptivo ou suspensivo validamente notificado ao Revertido, sendo certo que, desde a citação, decorreu mais de uma década sem diligência da AT.
d) O Requerente entende que a AT, laborou em erro na interpretação e aplicação do Direito, designadamente do disposto nos artigos 49º da LGT e 326º e 327º do Código Civil, por considerar que devia ter em consideração que a citação pode ter um efeito interruptivo de carácter duradouro do prazo da prescrição.
e) Defende ainda que o Requerente que o órgão de execução fiscal – AT, estava obrigado a decidir sobre a declaração em falhas, a qual teria efeitos relevantes para a contagem do prazo de prescrição. Referindo que nada mais foi dito pelo órgão de execução fiscal na sua decisão, designadamente no que tange à declaração em falhas de cada um dos processos de execução fiscal em relação aos quais não foi reconhecida a prescrição e suas consequências.
f) Defendendo o Requerente, que quando foi apresentado o requerimento a arguir a prescrição das dividas fiscais, já tinha decorrido prazo muito superior ao prazo prescricional de oito anos previsto no artigo 48.º da LGT, prazo igualmente aplicável aos respetivos juros, atento o disposto no artigo 189º e artigo 35º, n.º 8, da LGT, que determina que na falta de regime especial para a prescrição dos juros aplica-se o regime próprio das dívidas tributárias a que se reportam, tal como também já tinha decorrido prazo superior a oito anos desde a data em que se efetuaram as citações do Executado no âmbito dos processos de execução fiscal em apreço.
g) Concluído o Requerente que as dívidas fiscais revertidas no âmbito dos processos de execução fiscal identificados se encontram prescritas, com todas as consequências legais daí decorrentes, designadamente a extinção da execução fiscal e a extinção da responsabilidade do Requerente.
II.2. Posição da Requerida
Por seu turno, a Requerida fundamenta a sua posição nos seguintes termos:
a) A Requerida alega a exceção de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral referindo que de acordo com a normais legais em vigor que regulam as matérias em que o CAAD tem jurisdição, não se encontra abrangida no âmbito da competência material as matérias relativas às atuações dos órgãos de execução fiscal e, muito menos, a declaração de prescrição das dividas tributárias.
b) Referindo a Requerida que a matéria dos presentes autos não se encontra prevista no Artigo 2.º do RJAT nem na portaria de vinculação da AT, pelo que não está abrangida pela jurisdição do CAAD.
c) Entendo que resulta, de forma clara, pacífica, legal e jurisprudencialmente que a Requerida não se encontra vinculada à jurisdição arbitral no âmbito da matéria relacionada com o processo executivo.
d) Concluindo que a incompetência do tribunal constitui uma exceção dilatória de conhecimento oficioso que determina a absolvição da instância nos termos do artigo 576.º e alínea a) do art.º 577.º do Código de Processo Civil (CPC) aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do Regime Jurídico de Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT).
e) Mais alegando que os processos executivos em causa na presente ação, não se encontram prescritos, devendo, como tal, manterem-se na ordem jurídica.
III. Saneamento
III.1 Constituição do tribunal e sujeitos processuais
O tribunal arbitral foi regularmente constituído, como se dispõe nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), e 4.º, ambos do RJAT. 12.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (vd. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
III.2 Questão prévia: exceção dilatória de incompetência material absoluta do Tribunal Arbitral
A Requerida na sua contestação alegou a exceção de incompetência material absoluta do Tribunal Arbitral.
A competência material dos tribunais é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria, pelo que se impõe a sua apreciação previamente, conforme resulta do cotejo dos artigos 16.º do CPPT e 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – CPTA, ex vi alínea c) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
A competência dos Tribunais Arbitrais é delimitada no RJAT e completada pela Portaria n.º112-A/2011, de 22 de Março que estabelece:
Artigo 2º do RJAT - Competência dos tribunais arbitrais e direito aplicável
1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:
a) A declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;
b) A declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem
à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais;
Artigo 4.º do RJAT - Vinculação e funcionamento
1 - A vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.
Artigo 10.º - Pedido de constituição de tribunal arbitral
1 - O pedido de constituição de tribunal arbitral é apresentado:
a) No prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos n.os 1 e 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quanto aos actos susceptíveis de impugnação autónoma e, bem assim, da notificação da decisão ou do termo do prazo legal de decisão do recurso hierárquico;
b) No prazo de 30 dias, contado a partir da notificação dos actos previstos nas alíneas b) e c) do artigo 2.º, nos restantes casos.
Artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março
Objeto da vinculação
Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas
a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto- Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com exceção das seguintes:
a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
b) Pretensões relativas a atos de determinação da matéria coletável e atos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indiretos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;
c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indiretos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação;
d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efetuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira.
e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição anti-abuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo.
Artigo 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março
Termos da vinculação
1 - A vinculação dos serviços e organismos referidos no artigo 1.º está limitada a litígios de valor não superior a (euro) 10 000 000.
(….)
A determinação da competência do tribunal terá de se delimitar pela análise do pedido do autor e pela causa de pedir em que este se apoia na petição inicial. Seguindo a jurisprudência do CAAD no processo 262/2018-T “é à face do pedido ou conjunto de pedidos que formulou o autor que se afere a adequação das formas de processo especiais, designadamente o processo arbitral.”
É consensual que existe uma identidade entre os campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral.
Refira-se nesse sentido a Decisão Arbitral n.º 809/2019-T:
“O facto de a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT fazer referência aos nºs 1 e 2 do artigo 102.º do CPPT, em que se indicam os vários tipos de atos que dão origem ao prazo de impugnação judicial, inclusivamente a reclamação graciosa, deixa perceber que serão abrangidos no âmbito da jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD todos os tipos de atos passíveis de serem impugnados através processo de impugnação judicial, abrangidos por aqueles n.ºs 1 e 2, desde que tenham por objeto um ato de um dos tipos indicados naquele artigo 2.º do RJAT.”
Bem como a Decisão Arbitral nº 17/2022-T:
“23.Ou seja, significa isto que, em consonância com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, a opção do legislador foi no sentido de existir uma identidade entre os campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral (veja-se, no mesmo sentido a decisão arbitral proferida no âmbito do Proc. 809/2019-T).
24. Ou seja, se um determinado ato é suscetível de ser impugnado em processo judicial tributário através de impugnação judicial, então o Tribunal Arbitral será competente para apreciar a legalidade desse mesmo. Do mesmo modo, se um determinado fundamento é passível de ser invocado em sede de impugnação judicial, então o Tribunal Arbitral terá, igualmente, competência para apreciar esse fundamento.”
No caso em apreço, o Requerente apresenta como pedido no PPA:
a) Que seja admitido o presente pedido de pronúncia arbitral;
b) Que seja declarado que as dívidas fiscais revertidas no âmbito dos processos de execução fiscal identificados se encontram prescritas, com todas as consequências legais daí decorrentes, designadamente a extinção da execução fiscal e a extinção da responsabilidade do Requerente;
c) A declaração de prescrição das dívidas fiscais acima indicadas, no montante global de 37.283,54€, por se encontrar decorrido o prazo legal de prescrição nos termos do artigo 48.º da LGT;
O Requerente no introito do PPA justifica o seu pedido nos termos do disposto dos artigos 2º nº1 a) e 10º do RJAT, juntando como doc nº1 – Oficio nº2025... da AT (decisão de indeferimento de pedido de prescrição dos processos de execução fiscal nº ...2005...; ...2005...; ...2006...; ...2006...; ...2006...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...) indicando no nº 1º e 2º do PPA:
“ O Requerente deduziu a Prescrição das Dividas nos termos do artigo 48.º e 49.º da LGT, por ter decorrido o prazo para pagamento das mesmas, alegando em suma, que nunca foi notificado da reversão das dividas, tendo sido notificado do Despacho de Indeferimento da prescrição de devidas por reversão –NOTIFICAÇÃO DE DECISÃO FINAL – Processo ...2015.. e outros, oficio 2025..., relativa à liquidação de IVA e IRS, dos anos de 2005 a 2007, foi notificado do indeferimento da sua pretensão, em 2 de junho, conforme DOC. 1 que se junta e aqui se da como integralmente reproduzido.
O Requerente, não se conformando com a decisão da AT, vem da mesma e nestes termos, impugnar, da decisão da Repartição de Finanças que indeferiu a extinção por prescrição das dívidas fiscais revertidas.”
Termos em que é absolutamente claro que o Requerente fixa o seu pedido na ilegalidade do ato administrativo em matéria tributável - oficio 2025..., praticado pelo órgão de execução fiscal que indeferiu o pedido de declaração de prescrição de dividas de IVA e IRS dos anos de 2025 a 2007 (por efeitos de reversão das dívidas da sociedade B..., lda) dos processos de execução fiscal nº ...2005...; ...2005...; ...2006...; ...2006...; ...2006...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007...; ...2007... .
Não indica o Requerente qualquer ato específico de liquidação em crise, fixando o objeto do PPA na ilegalidade do ato administrativo em matéria tributável praticado pelo órgão de execução fiscal que indeferiu a prescrição de dividas que se encontram em sede de processos de execução fiscal.
O pedido de pronúncia arbitral nos termos do disposto na aliena a) do nº1 do artigo 2º do RJAT, à semelhança do impugnação judicial dos artigos 99º CPPT, fixa-se no julgamento de legalidade de atos de liquidação e não da reclamação ou impugnação de atos do órgão de execução fiscal. Estabelece-se como competência material para o foro da arbitragem tributária a apreciação da legalidade ou ilegalidade do ato de liquidação, no sentido da análise intrínseca da validade formal e material do ato de liquidação.
Sucede, que a prescrição em si não contende com a legalidade da liquidação, mas apenas com a exigibilidade da obrigação tributária por ela criada. A prescrição extingue o direito do Estado à “cobrança” do imposto, não tendo a sua análise a ver com a validade ou existência do ato tributário. Nestes termos, a prescrição não é fundamento de impugnação de ato tributário, devendo ao invés ser motivação para efeitos de oposição à execução.
Dito isto, e com carácter excecional, a prescrição poderá ser conhecida em processo de impugnação judicial e igualmente na jurisdição arbitral, de forma incidentalmente e como pressuposto da utilidade ou não do prosseguimento da lide.
Vide nesse sentido Jorge Lopes de Sousa (in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, 2010, pp.23-24):
“O STA vem entendendo que o processo de impugnação judicial não poder ter por objeto direto o conhecimento da prescrição da obrigação tributária, por este processo visar apreciar a legalidade ou ilegalidade do ato de liquidação, como decorre do preceituado nos arts. 99º e 124º do CPPT.
No entanto deverá entender-se que a prescrição poderá ser conhecida oficiosamente no processo de impugnação judicial, como pressuposto da questão da utilidade ou não do prosseguimento da lide, de que o tribunal deve conhecer oficiosamente”
Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade (in Contencioso Tributário II - Processo, Arbitragem e Execução, Almedina, 2017, pp. 226):
“As ilegalidades que são fundamento da impugnação judicial serão apenas aquelas que afetam a validade do acto impugnado e não aquelas que afetam, por sua vez, a exigibilidade da dívida tributária ou que digam respeito à eficácia ou ineficácia do acto. Estas questões poderão ser conhecidas em sede de oposição à execução fiscal, mas já não no âmbito da impugnação judicial”
E o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nº 01/99.0BUPRT 08-01-2020 refere:
“Como este Supremo Tribunal tem vindo a afirmar desde há muito, uniforme e reiteradamente, a prescrição da obrigação tributária não é fundamento de impugnação judicial, motivo porque nela não deve ser conhecida oficiosamente, sem prejuízo de aí poder ser conhecida a título incidental, enquanto pressuposto da utilidade da lide, este sim de conhecimento oficioso.
Sobre a questão, ficou dito no acórdão de 7 de Fevereiro de 2007, proferido no processo com o n.º 980/06 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/cedd724eaaed289c80257295003cb2f6.): «Como é sabido, trata-se na impugnação judicial de um contencioso de anulação, que não de plena jurisdição – cfr. Alberto Xavier, Aspectos Fundamentais do Contencioso Tributário, p. 43 e ss. –, sendo o seu objecto o acto tributário, através de “qualquer ilegalidade” ou “vício”, em vista da sua “anulação total ou parcial”. Assim, se o pedido impugnatório procede, o tribunal anula o acto, pela existência de qualquer ilegalidade. Pelo que tem este tribunal entendido que a prescrição da obrigação tributária – “da dívida exequenda”, na expressão legal, embora de conhecimento oficioso, não é fundamento de impugnação judicial mas de oposição à execução fiscal. Na verdade, não pode confundir-se a validade do acto tributário com a sua eficácia.
[…]
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à “cobrança” do imposto e não tendo pois a ver com a sua validade ou existência do acto tributário e, em consequência, com a sua legalidade, não é fundamento de impugnação judicial mas de oposição à execução».
Prossegue o mesmo acórdão, ponderando a prescrição, não como fundamento de impugnação judicial, «mas apenas como sustentáculo da inutilidade da lide e consequente extinção da instância», com a afirmação de que, então, esse conhecimento se fará «plenamente dentro da legalidade» e porque, verificada a prescrição da obrigação tributária, «a lide impugnatória não tem qualquer utilidade». E explica porquê:
«Na verdade, a sua procedência não teria quaisquer consequências, uma vez que já não poderia, mercê da predita prescrição da dívida, ser instaurada execução fiscal, que se instaurada, logo soçobraria, mesmo sem oposição, dado o carácter oficioso do conhecimento da mesma.
Ou seja: a questão não radica na inclusão da prescrição da obrigação tributária em termos de ilegalidade da liquidação mas, em termos processuais, da utilidade da lide impugnatória que, assim, não pode ter qualquer reflexo na relação substancial respetiva, pelo que a sua continuação seria pura inutilidade”
No caso dos autos, o Requerente não alega a ilegalidade de qualquer ato específico de liquidação, fixando o seu pedido e causa de pedir, no ato de indeferimento de prescrição em processo executivo, não existindo assim substância para análise da legalidade de ato tributário nos termos da competência legal atribuída à arbitragem tributária nos termos do artigo 2º do RJAT. O Requerente pretende reclamar/impugnar ato de órgão de execução fiscal, matéria que se encontra excluída da arbitragem tributária.
Não podendo sequer a prescrição ser conhecida de forma incidental como pressuposto da utilidade ou não do prosseguimento da lide por não existir em termos concretos ato tributário de liquidação objeto do pedido.
O tribunal arbitral singular não dispõe de competência para decidir o pedido de pronúncia arbitral em que é requerida a declaração da prescrição de dívidas tributárias e da ilegalidade de atos do órgão da execução fiscal, pretensões lícitas para as quais existem meios processuais próprios, da competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Encontrando-se os Tribunais Arbitrais adstritos a decidir nos termos do direito constituído (artigo 2.º, n.º 2, do RJAT) e sendo o objeto do processo conformado pelo pedido ou efeito jurídico pretendido e pela causa de pedir que o sustenta, deverá concluir-se que não constando a pretensão formulada nos autos do elenco das competências legalmente atribuídas a estes tribunais, não poderá o presente Tribunal Arbitral singular, conhecer do pedido, por este não se enquadrar na competência legal atribuída a este.
Com base nos fundamentos enunciados supra, decide-se julgar verificada a exceção dilatória de incompetência material absoluta do Tribunal Arbitral nos termos da alínea a) do nº4 do artigo 86º do CPTA aplicável ao presentes autos via artigo 29º nº1 c) do RJAT, o que obsta que o Tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância.
IV. Decisão
Em face do supra exposto, decide-se julgar verificada a exceção dilatória de incompetência material absoluta do Tribunal Arbitral, absolvendo-se a Requerida da instância.
V. Decisão
Termos em que se decide julgar totalmente improcedente o PPA.
VI. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em €37.283,54 (trinta e sete mil duzentos e oitenta e três euros e cinquenta e quatro euros) nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das e alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
VII. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 1.836,00 nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos processos de Arbitragem Tributária.
Dado que o PPA foi julgado improcedente são as custas decorrentes do presente processo arbitral a cargo na totalidade ao Requerente.
Lisboa, 21 de novembro de 2025
O Árbitro
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(António Cipriano da Silva)