Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 431/2025-T
Data da decisão: 2025-11-26  IRS  
Valor do pedido: € 70.511,91
Tema: IRS. Artº. 51º. do CIRS. Encargos com a valorização dos bens. Meios de prova. Tempestividade do PPA; Falta de fundamentação. Violação do princípio da legalidade e da natureza jurídica das orientações genéricas
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SUMÁRIO: 

1.     Não existe falta de fundamentação de um ato administrativo em matéria fiscal que consista na liquidação de um imposto, quando o sujeito passivo bem compreendeu as razões que permitiram à administração fiscal praticar o ato, contra o mesmo apresentando pedido de pronúncia arbitral de um modo detalhado e exaustivo relativamente ao teor das despesas por si realizadas e ao seu devido enquadramento legislativo.

2.     Mesmo que a própria entidade que praticou o ato reconheça que essa fundamentação é sucinta e que a mesma só posteriormente à prática do ato tenha reforçado essa fundamentação, isso não significa que ela fosse inexistente, nem tão pouco apenas posterior ao ato administrativo em matéria fiscal aqui em causa.

3.     Ou seja, o facto de o Tribunal considerar a ato como bem fundamentado antes da sua prática, mesmo que tal fundamentação seja sucinta e ainda que apenas reforçada depois de praticado o ato, não permite concluir que o mesmo ato só foi devidamente fundamentado depois.

4.     Não constitui violação do princípio da legalidade quando apenas se invoca o facto de se entender que a fundamentação do ato está limitada exclusivamente ao teor de informações genéricas e administrativas por parte da autoridade tributária, mesmo considerando que as mesmas não constituem disposições de valor legislativo, mas não são as únicas que contribuíram para fundamentar as decisões proferidas e o ato se encontra de outro modo - que não apenas por remissão – devidamente fundamentado.

5.     O facto de um sujeito passivo ter adquirido em 2017  um prédio, composto de parte rústica e urbana, e tendo declarado em 2023 apenas a venda da parte correspondente à descrição predial urbana sem fazer qualquer referência à parte rústica, não prejudica o apuramento da mais valia realizada, porquanto a mesma, nos termos do nº. 1 do artº. 43º. do CIRS constitui um saldo, em 

nada limitando a dedução dos eventuais encargos com a valorização do imóvel rústico, não expressamente   incluído na Declaração Modelo 3 do IRS, porquanto ao urbano foi imputado o valor total de venda dos dois imóveis.

6.     Quando o sujeito passivo adquire um imóvel que não esteja finalizado, mesmo que sem licença de utilização e antes de se entregar a Declaração Modelo I do IMI, as despesas que suportou com o acabamento do imóvel adquirido, devem ser consideradas relevantes para efeitos da tributação em mais-valias da sua posterior venda, nos termos do disposto no artº. 51º. do CIRS, apesar de apenas expressamente consagradas no nº. 3 do artº. 46º. daquele mesmo Código.

7.     A alínea a), do nº. 1 do artº. 51º. do CIRS, não exige que para que os encargos com a valorização dos imóveis, para que sejam aceites para efeitos da determinação das mais valias sujeitas a imposto, que o sujeito passivo comprove o pagamento efetivo desses encargos, se prova complementar for apresentada de que o sujeito passivo “realizou” efetivamente tais encargos com a essa valorização.

8.     Devem ser aceites, para efeitos do disposto no artº. 51º. do CIRS, os encargos suportados pelo sujeito passivo, mesmo que as faturas que os titulam não preencham os requisitos previstos no nº. 5 do artº. 36º. do CIVA, porquanto a fatura é um de muitos outros elementos em causa suscetível de conduzir à prova dos encargos realizados, sem que resulte do Código do IRS a exigência formal de que a fatura deve obedecer aos mesmos requisitos que se encontram previstos para a sua validação em termos do Código do IVA.

9.     A aquisição de eletrodomésticos, árvores, flores e plantas, não devem ser consideradas para os efeitos da aplicação do artº. 51.º do CIRS pretendidos, atendendo a que estamos perante a aquisição de bens autonomizáveis, que não passam a fazer parte integrante do imóvel podendo dele ser destacados.

10.  Da previsão do art. 51º, nº 1, al. a) do CIRS, que permite a consideração dos encargos efetivamente suportados que sejam suscetíveis de valorizar economicamente o bem alienado, devem excluir-se as simples despesas de manutenção e conservação.

 

DECISÃO ARBITRAL

I - RELATÓRIO

1.             Em 29 de abril de 2025, A..., contribuinte n.º ..., residente em..., ... (...), França, de ora em diante designado por Requerente, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes, todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (“RJAT”), em conjugação com o artigo 99.º e com a alínea a) do n.º 1 do artigo 102.º do Código do Procedimento e Processo Tributário (“CPPT”), aplicável por força do disposto na alínea a) do nº. 1 do artigo 10.º do RJAT, apresentou o presente pedido de pronuncia arbitral, com vista à anulação da liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2024..., no valor de € 70.511,91, e da correspondente liquidação de juros compensatórios, ato praticado pela Senhora Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira com referência ao ano de 2023.

2.             O Requerente é representado, no âmbito dos presentes autos, pelos seus mandatários, Dr. ... e Drº. ..., e a Requerida, a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT) é representada pelo Drº. ... e pela Drª. ... .

3.              Verificada a regularidade formal do pedido apresentado, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, foram os signatários designados pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, e aceitaram o cargo, no prazo legalmente estipulado, não se tendo as partes oposto a tal nomeação. 

4.             O Tribunal Arbitral foi constituído no dia 14 de julho de 2025, na sede do CAAD, sita na Avenida Duque de Loulé, n.º 72-A, em Lisboa, conforme comunicação da constituição do tribunal arbitral que se encontra junta aos presentes autos.

5.             Nesse mesmo dia 14 de julho o Tribunal lavrou o seguinte Despacho:

“Nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17º, do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária), notifique-se a Sra. Diretora Geral da AT (Autoridade Tributária e Aduaneira) para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer a produção de prova adicional.”

6.             No dia 2 de outubro de 2025, a Requerida solicitou a prorrogação do prazo para apresentação da Resposta na presente ação arbitral por 15 dias, por forma a garantir o exercício eficaz do seu direito de defesa.

7.             Por Despacho do dia 6 de outubro de 2025, considerando as razões invocadas pela AT, o Tribunal aceitou o pedido apresentado e procedeu à prorrogação do prazo para apresentação da Resposta, por 10 (dez) dias, a partir do seu termo final.

8.             No dia 10 de outubro, a Requerida apresentou a sua Resposta e juntou o processo administrativo, tendo-se defendido por impugnação.

9.             No dia 15 de outubro de 2025, o Tribunal lavrou o seguinte Despacho:

I - A reunião do Tribunal com as partes (artigo 18º, do RJAT)

À luz do disposto nos artigos 16º-c), do RJAT e do princípio da proibição da prática de atos inúteis, fica dispensada a reunião do Tribunal com as partes, considerando (i) que se trata, no caso, de processo não passível duma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comummente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais e (ii) que não há exceções ou questões prévias a debater e decidir.

II – Alegações finais

Mostrando-se concluída a fase instrutória do processo, ambas as partes apresentarão, no prazo simultâneo de 15 (quinze) diasalegações finais escritas, de facto (factos essenciais que consideram provados e não provados) e de direito, formulando expressamente as respetivas conclusões. 

 

III – Data para prolação e notificação da decisão final

Fixa-se o dia 7-1-2026, como data limite previsível para a prolação e notificação da decisão arbitral final.            

IV – Taxa de arbitragem remanescente – Pagamento - Prazo

A Requerente deverá efetuar o pagamento do remanescente da taxa arbitral (artigo 4º-3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária) no prazo para apresentação das alegações finais (15 dias).

V – Apresentação dos articulados em formato “word”           

À luz do princípio da cooperação [cfr artigo 7º, do CPC], convidam-se ambas as partes a remeter ao CAAD cópias dos respetivos articulados, em formato editável (de preferência, em “Word”) com vista a facilitar e abreviar a tarefa de elaboração do acórdão final no que respeita sobretudo à fixação da matéria de facto.

10.          Em 5 de novembro de 2025, tanto a Requerente como a Requerida, apresentaram as respetivas alegações.

 

II - A REQUERENTE SUSTENTA O SEU PEDIDO DA SEGUINTE FORMA:

1.              A Requerente começa por referir o facto de que, sendo o prazo final para pagamento voluntário do imposto o dia 27 de janeiro e o prazo para apresentação do PPA de três meses, o mesmo terminaria no dia 28 de abril de 2025, dia em que se verificou o fenómeno conhecido por “apagão”, que impediu ”… o ora Requerente e os seus mandatários de, entre outras coisas, ter acesso ao portal das finanças, consultar o processo e respetiva documentação que se encontrava guardada numa base de dados que só é possível consultar com acesso à internet, consultar jurisprudência essencial à conclusão do Pedido, proceder ao pagamento da taxa de arbitragem, etc.”

2.              Invoca factos, legislação e Despachos ministeriais, para defender a tempestividade da apresentação do PPA.

3.              Passa ao relato dos factos que estiveram na origem da liquidação impugnada, começando por referir que em 25 de janeiro de 2017 adquiriu pelo preço de € 475.000,00 (quatrocentos e setenta e cinco mil euros) um prédio misto, sito em  ... freguesia de ..., concelho de Lagos, para o qual deslocou a residência da sua família, apesar do mesmo não estar concluído, por ter sido comprado na sequência da insolvência do promotor imobiliário, porquanto, nomeadamente não possuía aquecimento, sistema de refrigeração, cozinha, estando o terreno envolvente vazio e sem manutenção.

4.              Razão pela qual foi, então, necessária uma transformação completa por forma a tornar-se na residência principal do Requerente e da sua família, o que obrigou à realização de obras de grande envergadura. A saber:

- Arquitetura paisagística de aproximadamente 7.000 m² de um total de 8.800 m², caminhos pavimentados, muros de contenção, terraços, sistema completo de climatização, painéis solares térmicos, piso radiante, cozinha equipada, acabamentos interiores e jacuzzi.

5.              Tais obras estão quantificadas no quadro junto ao PPA no ponto 21 do mesmo, cujas faturas, dado o seu volume e tamanho, o Requerente se compromete a apresentar em Tribunal, o que fez posteriormente, tendo procedido igualmente à junção de inúmeras fotografias dos prédios em questão.

6.              No dia 4 de maio de 2023, o ora Requerente alienou o referido imóvel, através de escritura pública de compra e venda, pelo preço de € 1.170.000,00 (um milhão cento e setenta mil euros) – cfr. Documento n.º 4.

7.              Em 26 de agosto de 2024, o Requerente procedeu à entrega da Declaração Modelo 3 de IRS para o ano de 2023, acompanhada o respetivo Anexo G.

8.              De maneira a clarificar a referida Divergência de IRS, referente ao ano de 2023, o Requerente e a AT trocaram diversa correspondência por meios eletrónicos, em que o Requerente:

a). Enviou um anexo comprovativo das despesas iniciais com a aquisição do imóvel, que totalizam € 27.550,19, e

b). um resumo do e-fatura, onde se podem ver os valores referentes às obras realizadas, e

c). a indicação do modo como se poderia proceder à junção das faturas, tendo em vista justificar as despesas realizadas, já que, por ser demasiado grande não lhe seria possível enviar o ficheiro digitalizado.

9.             Por seu turno, Autoridade Tributária referiu que o Requerente deveria:

a). Substituir a modelo 3 e colocar em despesas e encargos o valor de 27.549,51€ (IMT + Iselo + registos). e, 

b). considerou que as restantes despesas não são indissociáveis da operação da venda, de acordo com o disposto na informação vinculativa 2511/2018 de 22.08.2018”, e que

c). “Não é necessário o envio dos documentos, reitera-se a informação dada anteriormente pelo que deve substituir a declaração com os valores informados. “

10.           A AT clarificou que:

“Nos termos da informação vinculativa 2511/2018 de 22/08/2018 a aquisição de materiais separadamente da mão de obra, não são elegíveis no âmbito do disposto no art.º 51 do CIRS. As obras efectuadas no jardim não são dedutíveis pois são espaço exterior e não a habitação própria e permanente (CAAD 257/2021- T). Consultada a base de dados da AT verifica-se igualmente que não foi apresentada qualquer modelo 1 do IMI a comunicar alterações no imóvel de acordo com o disposto na informação vinculativa 569/2019 de 18.04.20”

11.           No dia 16 de outubro de 2024, o Requerente foi notificado pela AT para exercer o direito de audição prévia, designadamente para comprovar as despesas e encargos no montante de € 269.342,77, as quais, no seu entender, não eram aceites fiscalmente (cfr. Documento n.º 5).

12.           O Requerente exerceu o correspondente direito de audição (cfr. Documento n.º 6), por forma a comprovar as despesas.

13.           Em resposta, o Requerente foi notificado da Decisão final nos termos da qual a Autoridade Tributária manteve o seu entendimento, não aceitando as despesas, com base na seguinte argumentação (cfr. Documento n.º 7):

““Os meros materiais adquiridos separadamente da mão-de-obra; aquisição de eletrodomésticos, móvel de cozinha não são elegíveis para efeitos do estabelecido no artº. 51 do CIRS. Os arranjos exteriores bem como as restantes obras efectuadas não são indissociáveis da operação de alienação nem configuram despesas de valorização do imóvel.

De acordo com o disposto no artigo 51 do Código do IRS para determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação do imóvel, como seja, entre outras, o IMT, o Imposto do Selo, as despesas com a escritura e registo do imóvel, e o valor da comissão paga à imobiliária por intermediação no negócio.

Dado o exposto e tendo em atenção os factos e fundamentos invocados propõe-se o deferimento parcial da pretensão do contribuinte devendo o valor das despesas declaradas de 296.892,28 € ser corrigidas para 28 103,01 €. “

14.           Na sequência desta decisão, a Autoridade Tributária emitiu o ato de liquidação de IRS objeto do presente pedido arbitral (cfr. cit. Documento n.º 1).

15.           O Requerente começa a sua defesa invocando a “falta de fundamentação da decisão notificada, bem como dos respetivos atos de liquidação.”, invocando para o efeito o disposto no artº. 263º., nº. 3 da CRP, ao nº. 1 do artº. 77º. da LGT, o artº. 152 do CPA.

16.           O Requerente entende que:

“…sobre a entidade decisora impende o dever legal de não só indicar todos os factos, de forma clara e coerente, mas também de indicar e sustentar as suas conclusões com as correspondentes disposições legais.”

17.           E do mesmo modo:

“Com efeito, só com a indicação de todas as razões, de facto e de direito, poderiam os Autores, em consciência, aferir da legalidade dos argumentos invocados pela entidade decisora, maxime a Ré, e, assim, optar pela contestação ou acatamento da referida decisão.”

18.           De seguida, o Requerente invoca a violação do princípio da legalidade e da natureza jurídica das orientações genéricas.

19.           Tomando por pano de fundo diversa jurisprudência que vem citada a transcrita, com o enquadramento legislativo do disposto no nº. 3 do artº. 266º. da CRP e do artº. 3º., nº. 1 do CPA, e respetivos pensamentos doutrinários adicionais, o Requerente conclui quanto a esta matéria:

“i) a Requerida está vinculada ao princípio da legalidade na sua atuação, e

 ii) as orientações administrativas veiculadas sob a forma de circular da Autoridade Tributária não constituem disposições de valor legislativo que possam ser, única e exclusivamente, objeto e critério de fundamentação das decisões proferidas.”:

20.           E continua:

“Com efeito, ao fundamentar a sua decisão nas informações vinculativas e não na legislação aplicável ao caso concreto ou na jurisprudência dos Tribunais Superiores, a ora Requerida violou flagrantemente o princípio da legalidade, o que faz com que a Liquidação objeto do presente Pedido padeça de erro sobre os pressupostos de direito, devendo ser anulado também por estas razões, ao abrigo do disposto no artigo 163.º do CPA.”

21.           De seguida, o Requerente clarifica o modo como entende que o ato de liquidação de IRS objeto do presente PPA é ilegal.

22.           Traça o enquadramento legislativo da questão em torno da interpretação e aplicação de diversas disposições do CIRS, a saber: alínea a) do nº. 1 do artº. 9º, alínea a), do nº. 1 do artº. 10º., nº. 1 do artº. 43º. e respetiva alínea b) e artº. 51º. 

23.           Para de seguida passar a uma clarificação jurisprudencial das normas assinaladas e do enquadramento das despesas por si efetuadas no imóvel alienado.

24.           Começando pelo disposto no artº. 51º. do CIRS, com base no qual o Requerente entende que:

“…o legislador previu duas diferentes realidades suscetíveis de originar acréscimo ao valor de aquisição dos bens imobiliários que estão na base da mais-valia a apurar, a saber:

 - Os encargos suportados nos últimos 12 anos com a valorização dos bens (constante da primeira parte);

- As despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação das situações constantes da al. a) do n.º 1 do artigo 10º do CIRS (constante do segundo segmento do preceito);

25.           Com base em jurisprudência que cita, o Requerente entende que:

““al. a) do art. 51º do CIRS não restringe os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, às valorizações materiais ou físicas daqueles, antes abrangendo também os encargos efectivamente suportados que os valorizem economicamente” [Acórdão do STA no processo n.º 0587/11, de 21/03/2012, disponível em www.dgsi.pt]”

26.           Para concluir pela referenciada distinção entre “"encargos com a valorização dos bens", comprovadamente realizados, e “despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação". Na primeira estatuição do normativo enfoca-se a valorização do próprio bem, enquanto que na segunda, o enfoque está na aquisição e alienação do bem.” [Acórdão do TCAS no processo n.º 05182/11, de 03/03/2016, disponível em www.dgsi.pt]” 

27.           De seguida, o Requerente referencia jurisprudência aplicável às diversas aquisições por si efetuadas, e ao seu enquadramento no disposto no artº. 51º. do CIRS, no contexto do cálculo das mais valias na alienação de imóveis.

28.           Aquisição e instalação de um fogão de encastre:

Decisão do CAAD favorável ao Requerente:

““Novamente ressalvado o respeito devido, não se pode ratificar este entendimento, uma vez que a modernização de um fogão encastrado, como de qualquer outro elemento fixo ao imóvel, será, efetivamente, um encargo que aporta a valorização do bem imóvel.(...)” [Decisão arbitral no Processo n.º 154/2019-T, de 02/12/2019, disponível em https://www.caad.org.pt/]”

29.           Obras efetuadas no Jardim:

O Requerente referencia a posição da AT sobre este tipo de despesas do seguinte modo:

“No Ofício que fundamenta o ato de liquidação objeto do presente Pedido, a Autoridade Tributária invoca a Decisão Arbitral proferida no processo n.º 257/2021- T, dizendo que “as obras efetuadas no jardim não são dedutíveis pois são espaço exterior e não a habitação própria e permanente” se a mesma decisão apenas se refere a que as despesas têm de ser indissociáveis do bem alienado, mas por referência ao regime do reinvestimento. Em sentido oposto pode invocar o Requerente a Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 407/2023 (aliás mais recente que o invocado pela Autoridade Tributária) onde se refere: “(…) para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS as despesas suportadas (…) devem ser consideradas para efeitos de aplicação da norma, por passarem a estar integradas no mesmo, as despesas com trabalhos de construção de jardim e arranjos exteriores no imóvel alienado (…) (…) Termos em que, no que respeita a esta última questão, só é julgado procedente o pedido de consideração das despesas com trabalhos de construção de jardim e arranjos exteriores no imóvel alienado (…)”

30.           Diz o Requerente:

“Ora, como se pode ver pela jurisprudência meramente exemplificativa acima transcrita, as despesas que o ora Requerente pretende que sejam consideradas para efeitos do cálculo das mais valias são comumente aceites pela jurisprudência.”

31.           E qual o pendor dessa jurisprudência que vai de encontro aos interesses do Requerente?

32.           O Requerente referencia aquele que vem sendo o entendimento da jurisprudência dos tribunais superiores e do próprio CAAD, em como a: 

“al. a) do art. 51º do CIRS não restringe os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, às valorizações materiais ou físicas daqueles, antes abrangendo também os encargos efetivamente suportados que os valorizem economicamente” [ Acórdão do STA no processo n.º 0587/11, de 21/03/2012, disponível em www.dgsi.pt].

33.           E continua:

“Isto significa que, nos termos deste preceito, que o legislador distingue duas situações: "encargos com a valorização dos bens", comprovadamente realizados, " e “despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação". Na primeira estatuição do normativo enfoca-se a valorização do próprio bem, enquanto que na segunda, o enfoque está na aquisição e alienação do bem.” [Acórdão do TCAS no processo n.º 05182/11, de 03/03/2016, disponível em www.dgsi.pt]

34.           Nesta senda e contrariamente ao entendimento da Requerida, o Requerente cita uma Decisão do CAAD que permite enquadrar como despesa de valorização do imóvel a compra de um fogão de encastre, que cita:

“Novamente ressalvado o respeito devido, não se pode ratificar este entendimento, uma vez que a modernização de um fogão encastrado, como de qualquer outro elemento fixo ao imóvel, será, efectivamente, um encargo que aporta a valorização do bem imóvel. (...)” [Decisão arbitral no Processo n.º 154/2019-T, de 02/12/2019, disponível em https://www.caad.org.pt/]

35.           Neste contexto, o Requerente referencia decisões jurisprudenciais que dando conta das dúvidas de interpretação da norma em causa – artº. 51º do CIRS – entende que a sua redação concede uma razoável margem interpretativa.

36.           Por outro lado:

“…Não admitir a dedução de encargos efectivamente suportados que contribuem para a ocorrência do rendimento – neste caso, para a ocorrência do aumento do valor do imóvel que permitiu realizar mais-valia, na sua alienação ― é violar um princípio económico e técnico da tributação do rendimento, o que só razões muito ponderosas poderiam justificar e haveria, por certo, de ser expressamente reflectido no texto legislativo.(...)”[ Decisão arbitral no Processo n.º 26/2018-T, de 23/11/2018, disponível em https://www.caad.org.pt/]

37.           O Requerente continua citando jurisprudência, nomeadamente em relação ao conceito de ”valorização”.

 “Neste âmbito, o STA pronuncia-se sobre o conceito de “valorização” e afirma que, “atentando na letra da lei (encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos) não pode deixar de concluir-se, desde logo, que o encargo há-de estar ligado à valorização do bem alienado. Ou seja, não estão incluídos encargos que tenham por escopo a mera preservação do valor do bem, mas, tão só os que se destinem a aumentar esse valor.” – cf. Acórdão do STA, processo n.º 0587/11, de 21 de março de 2012. É, assim, de concluir que as reparações levadas a efeito no prédio em causa não se subsumem ao conceito de “encargos com a valorização dos bens” e, por conseguinte, não devem ser adicionadas ao valor de aquisição do imóvel.”[ Decisão arbitral no Processo n.º 25/2018-T, de 25/18/2018, disponível em https://www.caad.org.pt/ 6].

38.           Entendimento este com o qual o Requerente não concorda, chamando em seu auxílio o Prof. XAVIER DE BASTO (IRS: Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos, Coimbra Editora, 2007, pp. 460-465.), que consagra o seguinte entendimento:

“«Se o objectivo da norma fosse atender só às valorizações materiais ou físicas e excluir os demais encargos, tê-lo-ia dito expressamente. Bem ao invés, o uso de uma formulação aberta ― “encargos com a valorização dos bens” ― parece indiciar que se não quis restringir o alcance da norma, como pretende o citado despacho da administração fiscal. Por outro lado, a dedução de encargos ― através, neste caso, da sua adição ao valor de aquisição ― é solução que decorre do princípio da tributação do rendimento líquido. Não prever a dedução de encargos efectivamente suportados que contribuem para a ocorrência do rendimento ― neste caso, para a ocorrência do aumento do valor do imóvel que permitiu realizar mais-valia, na sua alienação ― é violar um princípio económico e técnico da tributação do rendimento, o que só razões muito ponderosas poderiam justificar e haveria, por certo, de ser expressamente reflectido no texto legislativo.»” …tiveram por estrita finalidade a preservação do valor do bem e não a valorização acrescida deste, entendida como algo que se deve traduzir num incremento de valor e não na mera manutenção ou preservação de valor.

39.           E, com o mesmo propósito, MANUEL FAUSTINO (em comentário ao ac. Do TCAS, de 25/1/2005, no rec. nº 00297/03, por nós relatado), discordando do que refere ser uma visão exclusivamente jurídica da interpretação do conceito de valorização.

40.           Dando conta de uma outra situação concreta, as relativas às obras efetuadas no jardim, o Requerente cita:

“Em sentido oposto pode invocar o Requerente a Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 407/2023 (aliás mais recente que o invocado pela Autoridade Tributária) onde se refere: “(…) para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS as despesas suportadas (…) devem ser consideradas para efeitos de aplicação da norma, por passarem a estar integradas no mesmo, as despesas com trabalhos de construção de jardim e arranjos exteriores no imóvel alienado (…) (…) Termos em que, no que respeita a esta última questão, só é julgado procedente o pedido de consideração das despesas com trabalhos de construção de jardim e arranjos exteriores no imóvel alienado (…)””

41.           O Requerente também referencia jurisprudência que refuta a necessidade destas despesas pressuporem a incorporação física e permanente dos bens que constituíram o objeto da remodelação levada acabo no imóvel.

42.           E, quanto a este aspeto, conclui o Requerente:

“Aqui chegado, atenta a jurisprudência abundante e tendencial no sentido de uma interpretação menos restritiva dos encargos suportados com a valorização do imóvel, afigura-se seguro que os trabalhos/serviços efetuados originam – num plano de normalidade e juízo de razoabilidade - uma valorização ao Imóvel em causa, devendo por isso ser considerados para efeito do cálculo das mais valias, com a consequente anulação do ato de liquidação adicional de IRS objeto do presente Pedido (cfr. cit. Documentos n.ºs 1 e 3)”

43.           O Requerente defende a ilegalidade da liquidação de juros compensatórios e requer o pagamento de juros indemnizatóriossobre os montantes indevidamente pagos, calculados à taxa legal até à data de processamento da nota de crédito (cfr. artigo 61.º, n.º 5 do CPPT, ex vi do artigo 24.º, n.º 5 do RJAT). 

44.           Para terminar:

“Termos em que se requer a vossas exas. a admissão do presente pedido de pronúncia arbitral, nos termos e para os efeitos do regime jurídico da arbitragem em matéria tributária, devendo o mesmo ser julgado procedente, por provado e fundado, com a consequente anulação do ato de liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares n.º 2024..., no valor de € 70.511,91, e da correspondente liquidação de juros compensatórios, praticados pela senhora diretora-geral da autoridade tributária e aduaneira com referência ao ano de 2023, com as necessárias consequências legais.”

45.           Nas suas alegações, para além de reiterar tudo o que deixou expresso no PPA, o Requerente formulou as seguintes conclusões:

“I. A presente Impugnação tem por objeto imediato o ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2024..., no valor de € 70.511,91, e da correspondente liquidação de juros compensatórios, praticados pela Senhora Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira com referência ao ano de 2023 (cfr. cit. Documento n.º 1 junto aos autos);

II. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, por verificação de justo impedimento decorrente do apagão nacional ocorrido no último dia do prazo, à luz do artigo 140.º do CPC, conjugado com os artigos 279.º do Código Civil e 20.º do CPPT, bem como das comunicações oficiais que prorrogaram prazos até 30 de abril;

III. Mostra-se assente a factualidade relevante: aquisição, em 2017, de imóvel incompleto na sequência de insolvência do promotor; realização, entre 2017 e 2023, de obras estruturais e de benfeitorias extensas; alienação em 04.05.2023; atuação colaborante do Requerente no procedimento e recusa injustificada da AT em receber e apreciar a documentação;

IV. A decisão que sustentou a liquidação padece de falta de fundamentação, por se limitar a remeter para informações vinculativas e orientações internas, sem densificação fáctico-jurídica individualizada das despesas e sem exame dos documentos ofertados, violando os artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º da LGT e 152.º-153.º do CPA;

V. É irrelevante a fundamentação a posteriori aduzida em resposta contenciosa, sendo a validade do ato aferida pelos fundamentos contemporâneos da sua prática, conforme jurisprudência uniforme do STA sobre a inadmissibilidade de motivação superveniente;

 VI. A AT violou o princípio da legalidade ao erigir orientações administrativas e informações vinculativas em critério decisório substitutivo da lei, quando tais instrumentos não têm eficácia externa nem vinculam os tribunais, incorrendo em erro sobre os pressupostos de direito (artigos 266.º, n.º 2, da CRP, e 3.º, n.º 1, do CPA);

VII. O artigo 51.º, n.º 1, alínea a), do CIRS consagra um conceito aberto de “encargos com a valorização dos bens”, abrangendo valorizações físicas e económicas comprovadas no período legal, não impondo elenco taxativo nem requisito de incorporação material permanente;

VIII. A distinção legislativa entre “encargos com a valorização” e “despesas inerentes à aquisição e alienação” não legitima leituras restritivas; a primeira categoria tem por enfoque o incremento de valor do bem; a segunda, os custos transacionais, ambas operando para tributar rendimento líquido; IX. A prova carreada demonstra obras de climatização integral, painéis solares térmicos, piso radiante, cozinha equipada, acabamentos interior/exterior e arranjos exteriores integrados (caminhos, muros, terraços, paisagismo), todos com aptidão objetiva para aumentar o valor económico do imóvel;

 X. Os arranjos exteriores funcionalmente integrados – arquitetura paisagista, muros de contenção, pavimentos e terraços – concorrem para a qualificação do bem e a sua valorização no mercado, devendo ser atendidos como encargos de valorização nos termos do artigo 51.º do CIRS;

XI. A aquisição de materiais separadamente da mão-de-obra não é critério legal de exclusão; desde que demonstrada a afetação e integração na obra do imóvel alienado, tais dispêndios qualificam como encargos de valorização;

XII. A invocação da falta de apresentação do Modelo 1 de IMI é alheia ao regime do artigo 51.º do CIRS e não condiciona o reconhecimento de encargos de valorização para efeitos de apuramento de mais-valias, tratando-se de obrigação declarativa autónoma em sede de IMI;

XIII. A AT preteriu o dever de exame efetivo da prova, omitindo a análise diferenciada entre conservação/manutenção e valorização, e recusou injustificadamente a receção de documentos relevantes, inquinando o procedimento e o ato;

XIV. O ónus probatório do Requerente quanto à realização, afetação e integração dos encargos encontra-se cumprido por faturas, comprovativos e elementos complementares; competia à AT ilidir especificamente essa prova, o que não ocorreu;

XV. A presunção de veracidade das declarações e da escrita (artigo 75.º da LGT) não foi abalada por indícios sérios, seguros e consistentes; faltando tais indícios, impõe-se aceitar os encargos documentalmente comprovados;

XVI. A transposição de critérios do CIMI ou de obrigações patrimoniais para restringir o artigo 51.º do CIRS é indevida por diversidade de teleologia e estrutura normativa;

XVII. A leitura restritiva perfilhada pela AT contraria o princípio da tributação do rendimento líquido, conduzindo à tributação de capacidade contributiva inexistente, o que a lei e a jurisprudência rejeitam;

XVIII. O salto quantitativo do preço de alienação, em curto intervalo temporal e sem fatores alternativos plausíveis, evidencia o nexo causal económico entre as intervenções realizadas e a valorização do imóvel;

XIX. A suficiência descritiva das faturas deve ser aferida teleologicamente: à luz dos documentos complementares e da finalidade de controlo, é possível identificar natureza, local e integração dos bens/serviços no imóvel, cumprindo o standard probatório exigível;

XX. A recusa liminar da AT em receber a documentação e a subsequente desconsideração em bloco das despesas violam o princípio do inquisitório e o dever de colaboração, com reflexo invalidante no ato de liquidação;

XXI.A remissão para informações vinculativas (v.g., 2511/2018; 569/2019) não substitui a subsunção casuística ao artigo 51.º do CIRS nem autoriza regras de exclusão apriorística (materiais, exteriores, etc.) alheias ao texto legal;

XXII. A exigência de incorporação física e permanente no imóvel para qualificação como “encargo de valorização” não dimana da lei nem se coaduna com a finalidade de tributar o ganho líquido;

XXIII. Os encargos em causa devem acrescer ao valor de aquisição, com redução consequente do ganho tributável, impondo-se a anulação da desconsideração global de € 268.789,02; 

XXIV. A liquidação de juros compensatórios carece de demonstração cumulativa de facto imputável, nexo causal com o retardamento e juízo de censura (artigos 91.º do CIRS e 35.º da LGT); a decisão não densifica tais pressupostos, padecendo de falta de fundamentação; XXV.A atuação do Requerente foi diligente e de boa-fé, tendo solicitado canal para remessa de documentação e enfrentado recusa prévia; inexiste culpa que suporte juros compensatórios.

XXVI. A liquidação de juros compensatórios não é automática nem acessória inevitável de correções; exige fundamentação própria, ausente no caso, impondo-se a sua anulação;

XXVII. Anulada a liquidação principal, caduca por acessoriedade a liquidação de juros compensatórios;

XXVIII. Verificada a ilegalidade e tendo havido pagamento em prazo, são devidos juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43.º e 100.º da LGT e 24.º, n.º 5, do RJAT, desde a data do pagamento indevido até à emissão da nota de crédito;

XXIX. A reconstituição plena do statu quo ante impõe a restituição integral do imposto indevidamente pago e dos juros indemnizatórios, com recálculo do ganho tributável considerando todos os encargos de valorização comprovados;

XXX. A decisão a proferir deve privilegiar a verdade material e a teleologia do regime das mais-valias, rejeitando formalismos ou orientações internas sem suporte legal;

XXXI. Em síntese, devem ser julgadas procedentes as presentes alegações, anulando-se a liquidação de IRS n.º 2024... (2023) e a correspondente liquidação de juros compensatórios, com condenação da AT no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios legais, e ordenando-se o recálculo do ganho com consideração integral dos encargos de valorização comprovados.”

46.           Para terminar:

“Termos em que, e nos mais do pedido de pronúncia arbitral, deverá o presente pedido ser julgado procedente, por provado e fundado, com a consequente anulação do ato de liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares n.º 2024..., no valor de € 70.511,91, e da correspondente liquidação de juros compensatórios, praticados pela senhora diretora-geral da autoridade tributária e aduaneira com referência ao ano de 2023, com as necessárias consequências legais.”

 

 

III - NA SUA RESPOSTA A REQUERIDA, INVOCOU, O SEGUINTE:

1.             A primeira questão levantada pela Requerida tem a ver com o facto do Requerente ter adquirido um prédio misto, com parte rústica e urbana, aos quais atribuiu preço diferenciado em  escritura pública (€ 375.000,00 e € 100.000,00, respetivamente) e ter procedido à venda nas mesmas circunstâncias (€ 895.000,00 e € 275.000,00, respetivamente), com liquidação de imposto (IMT e IS) para ambos os prédios, mas na sua Declaração Modelo Anexo G, ter apenas identificado a alienação de um único imóvel, pela globalidade do preço que resulta da soma do preço de venda do prédio rústico e do prédio urbano (€ 1.170.000,00).

2.             Contudo, a Requerida apenas considera que este facto se ficou a dever a lapso do Requerente no preenchimento da Declaração Modelo 3 de IRS do ano de 2023, nenhuma outra consequência daqui retirando, a não ser mais adiante quando coloca a hipótese dos encargos em causa dizerem respeito ou à parte rústica ou à parte urbana do prédio.

3.             A Requerida refere que foi instaurado no Serviço de Finanças (SF) de Portimão um procedimento de gestão de divergências em nome do Requerente, concernente ao IRS relativo ao ano de 2023, na sequência do qual foi oficiosamente elaborada pelos serviços tributários em 09-12-2024 uma declaração modelo 3 de IRS em nome do Requerente e também respeitante ao ano de 2023, acompanhada do respetivo Anexo G.

4.             Do campo 4001 do quadro 4 do anexo G, que acompanhou a declaração oficiosa mencionada no artigo anterior, os serviços fiscais fizeram constar as mesmas datas e valores de alienação e aquisição do imóvel que o contribuinte havia já feito constar de idênticos campo e quadro do anexo G que acompanhou a declaração modelo 3 que entregou em 26-08-2024, mas todavia aqueles serviços corrigiram o montante relativo a despesas e encargos suportados com a alienação e/ou alienação e/ou valorização do imóvel transmitido do valor de € 296.892,28 para o valo de € 28.103,01.

5.             Face à invocada falta de fundamentação, a Requerida contrapõe que as razões pelas quais a AT procedeu às correções assinaladas estão devidamente fundamentadas, “Sendo a fundamentação congruente, clara e compreensível, ainda que sucinta.”, invocando também que, de acordo com jurisprudência do STA, essa fundamentação tem que permitir ao sujeito passivo contestar o ato tributário em causa, tendo ”… contra o mesmo apresentando pedido de pronúncia arbitral no qual, ao longo de quase cento e vinte pontos, explanava as suas razões.

6.             Por outro lado, a Requerida também invoca que o Requerente, apesar de invocar a falta de fundamentação, não ter requerido a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, nos termos previsto no nº. 1 do artº. 37º. do CPPT.

7.               Atendendo a que o Requerente invoca que essa fundamentação não se pode fazer com remissão para orientações genéricas e informações vinculativas, a entidade Requerida esclarece:

a). As orientações genéricas (epígrafe do artº. 68º-A da LGT), conforme o seu próprio nome indica, configuram-se como instrumentos aplicáveis a uma pluralidade de situações que sejam subsumíveis ao respetivo âmbito;

b). As informações vinculativas (epígrafe do artº. 68º do mesmo diploma) incidem sobre uma determinada situação concreta, sendo prestadas a requerimento dos particulares, do qual terão de constar os factos cujo enquadramento, qualificação ou decorrência tributária o interessado pretenda ver esclarecido.

8.              Referindo a diversidade dos institutos, a Requerida salienta que o legislador consagrou uma recomendação à AT de converter umas noutras, ao ter determinado no nº. 3 do artº. 68º.A da LGT que:

““3 - A administração tributária deve proceder à conversão das informações vinculativas ou de outro tipo de entendimento prestado aos contribuintes em circulares administrativas, quando tenha sido colocada questão de direito relevante e esta tenha sido apreciada no mesmo sentido em três pedidos de informação, ou seja, previsível que o venha a ser.”

9.              Embora entenda que, no caso dos presentes autos, a fundamentação do ato não se limitou a remissão para essas informações vinculativas, o que é facto é que as mesmas referem situações em tudo semelhantes àquelas que estão a ser objeto de divergência com o sujeito passivo.

10.           Passa de seguida a entidade Requerida à análise das circunstâncias resultantes do facto do imóvel adquirido não se encontrar finalizado no momento da respetiva aquisição, facto que terá estado na origem da realização de obras de melhoramento e valorização daquele de maior envergadura, sendo que a Requerida entende que as obras de construção ou de valorização do imóvel têm diferentes enquadramentos normativos.

11.           Ou seja:

“Já que as despesas com obras de construção surgem previstas na letra do nº 3 do art. 46.º do CIRS, enquanto as de valorização dos imóveis (tipo de despesa a que o contribuinte se reportou quer na última coluna do campo 4001 do quadro 4 do anexo G que entregou juntamente com a declaração modelo 3 que, em seu nome, apresentou relativamente ao ano de 2023 foram objeto de consideração legislativa na al. a) do nº 51º do mesmo compêndio.”

12.           Ora, defende a Requerida, que as despesas que o contribuinte declarou em sede de IRS corresponde ao tipo de despesas que está previsto na alínea a) do nº. 1 do artigo 51º. do respetivo código, que consagra o seguinte:

“Despesas e encargos

 1 - Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:

a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º”.”

13.           Para concluir:

“Da necessidade de comprovação dos encargos realizados com a valorização do bem cuja alienação gerou mais-valias resulta que:

 - A ocorrência das operações consubstanciadas em tais encargos tem de estar documentalmente comprovada (através da emissão das correspondentes faturas).

 - E que o montante constante de cada qual foi efetivamente suportado (o que é comprovável pela emissão do correspondente recibo ou fatura-recibo).”

14.           Ou seja, a Requerida entende que a aceitação das despesas, sob o ponto de vista documental, para além da apresentação das respetivas faturas, carece da exibição dos respetivos recibos de quitação comprovativos de que o pagamento das mesmas foi devidamente efetuado.

15.           Conclui a Requerida que:

“…era ao ora Requerente que competia efetuar a prova cabal e inequívoca que os valores constantes das faturas cujas cópias anexou ao requerimento tramitado em 14.05.2025 foi efetivamente pago às entidades que as emitiram.”

16.           Assim sendo, a Requerida exclui da lista de faturas elaborada pelo sujeito (Vd. Docº.nº. 3) todas aquelas relativamente às quais não tenham sido apresentada a respetiva prova de pagamento.

17.           Ao que acrescenta, como requisito adicional, que as mesmas faturas devem cumprir obrigatoriamente com o disposto no nº. 5 do artº. 36º. do Código do IVA, donde constam os elementos que essas mesmas faturas devem conter.

18.           De seguida, a entidade Requerida, face à natureza das despesas realizadas com base na documentação enviada pelo Requerente, faz a sua análise quanto à aceitação ou não das mesmas para os efeitos pretendidos, ou seja, a consideração das mesmas ao abrigo do disposto no artº., 51º. do CIRS, tendo em vista o cálculo das mais valias na alienação de um imóvel em 2023 propriedade do Requerente.

19.           Vamos por partes 

A). Faturas emitidas por:

- B..., NIF ..., de € 8 850,00.

- C..., NIF ..., de € 11.950,00. 

- D..., NIF..., de € 14.462,50.

Referentes a: venda das plantas e/ou flores e atividade de manutenção de jardins.

Valor em causa: € 35.262,50.

20.           Relativamente a estas faturas/recibos de modelo oficial, as razões que estão na origem da recusa da aceitação de tais despesas, já foram anteriormente abordadas, mas podem sintetizar-se do seguinte modo: 

a). As suas datas encontram-se compreendidas dentro do período de 12 anos previsto no artº. 51º. do CIRS).

b). As atividades exercidas pelos emissores dos recibos dizem respeito a “plantação e manutenção de jardins (CAE 81300)” e “comércio a retalho de flores, plantas, sementes e fertilizantes (CAE 47761)”, sendo que da faturação da venda das plantas e/ou flores não resulta provado onde foram colocadas ou plantadas, não havendo prova de que, sendo perecíveis, se à época da vanda do imóvel ainda existiam, valorizando ou não o mesmo.

21.           A favor da sua não aceitação invoca ainda um Decisão do CAAD:

“Acresce que na parte inicial do ponto 3 do sumário da decisão proferida pelo CAAD no âmbito do processo que nele correu termos sob o nº 407/2023-T (árbitro Dra. Elisabete Flora Cardoso), pode ler-se:

 “3 – Não podem ser consideradas para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS as despesas suportadas com elementos autonomizáveis que não passam a fazer parte integrante do imóvel.”

22.           Já quanto à atividade de manutenção de jardins, invoca a Requerida outra decisão do CAAD. A saber:

“Efetivamente, no sumário do proc. tramitado no CAAD sob o nº 802/2022-T, decidido em 17- 08-2023 pelo árbitro Dr. André Festas da Silva pode ler-se: “Deverão ser considerados como abrangidos pela previsão do art. 51º, nº 1, al. a) do CIRS os encargos efetivamente suportados que sejam suscetíveis de valorizar economicamente o bem alienado, excluindo-se as simples despesas de manutenção e conservação, elementos decorativos autónomos e destacáveis do imóvel ou eletrodomésticos.””

23.           Para concluir a Requerida do seguinte modo:

“Por conseguinte, as faturas-recibo emitidas pelos três senhores acima indicados, relativamente ao exercício das atividades de venda de flores, plantas, sementes e fertilizantes e de plantação e manutenção de jardins (o Sr. D... só por esta última) são insuscetíveis, pelos motivos acabados de indicar, de poder ser consideradas para os efeitos previstos na al. a) do nº 1 do art.º 51.º do CIRS.”

B). 7 Faturas emitidas por:

E..., NIF...;

Referentes a: exercício da atividade de remodelações e construções.

Valor em causa: € 50.122,50

24.           Vejamos única razão da sua não aceitação pela Requerida:

a). A inexistência de recibo ou qualquer outro comprovativo do pagamento das quantias em causa.

 

C). 3 Faturas, 1 fatura anulada, 2 recibos e uma nota de crédito emitidas por:

F..., Lda., NIF... . 

Referentes a:  aquisição de uma lareira, respetivo vidro e cobertura, dois chapéus e respetivas bases, cadeirões e almofadas.

Valor em causa: € 8.725,70 

Fatura nº. 457 emitida em 15.7.2019, no valor de € 3.329,10, com respetivo recibo nº 160/2019. 

Fatura nº. 525 emitida em 14.8.2019, no valor de € 1.017,50, com respetivo recibo nº 184/2019.

Fatura nº. 323 de 24.6.2019 e respetiva Nota de Crédito, no valor de € 1.050,00;

Fatura nº. 455 emitida em 15.7.2019, no valor de € 3.329,10, anulada.

25.           As faturas foram emitidas em 15.7.2019 e 14.8.2019, e relativamente às mesmas também foram emitidos os respetivos recibos.

26.            Tratando-se de bens móveis ou eletrodomésticos (a lareira), a Requerida invoca a seu favor duas decisões do CAAD. A saber:

“Ora, conforme se pode ler nos sumários das decisões proferidas pelo CAAD nos processos que apreciou sob os números 407/2023-T e 802/2022-T, despesas com a aquisição de bens que não passem a fazer parte integrante dos imóveis (ou destes destacáveis) bem como eletrodomésticos – estes, ainda que encastráveis - não podem ser considerados para efeitos da previsão constante da al. a) do nº 1 do art. 51º do CIRS.”

27.           A Requerida refere ainda que a nota de crédito reporta-se à fatura emitida por aquela sociedade em 24-06-2019 sob o nº 323, na qual não foi indicado qualquer bem transacionado ou serviço prestado, nem dela consta qualquer indicação à morada do cliente ou local de prestação de serviço ou descarga (ou sequer à mera entrega) de bens comercializados, pelo que não pode, por isso, ser considerado o montante dela constante (€ 1.050) pare efeitos de encargos previstos na al. a) do nº 1 do art.º 51º do CIRS.

28.           Por seu turno, a Fatura nº. 455 emitida em 15.7.2019, no valor de € 3 329.10 foi objeto de anulação, conforme consta expressamente da mesma. 

 

D). Três transferências bancárias a favor de Y..., no valor de € 6.039,30.

29.           Nesta situação, não foram apresentados elementos relativos à operação comercial que terá estado na base da realização destas transferências, pelo que não é possível saber a que aquisições de bens ou prestação de serviços as mesmas se reportam, onde e quando tais aquisições ou prestações terão tido lugar.

 

E). 4 Faturas emitidas por G..., de H..., NIF... .

Relativas a fornecimento de bens, com indicação da montagem de apenas 1.

Valor em causa: € 28.934,72.

30.           Neste caso, a Requerida invoca como fundamento da não aceitação destas despesas a informação vinculativa nº 2511/2018, sancionada por despacho proferido em 22-08-2018 pela Sra. Diretora da Direção de Serviços do IRS, que determina o seguinte entendimento:

 “….quando se trata de materiais adquiridos para a realização da obra, separadamente da mão-de-obra, porque a mera aquisição dos mesmos não basta para comprovar a realização das referidas obras no imóvel alienado, não podem tais encargos (meros materiais adquiridos) ser considerados como elegíveis para efeitos do estabelecido no artigo 51.º do Código do IRS.”, entendimento este que foi objeto de confirmação recente, podendo ser consultado no ponto 2 da informação vinculativa nº 27918, sobre a qual foi proferido despacho (por subdelegação de competências) pela Sra. Chefe de Divisão de Conceção da Direção de Serviços do IRS em 10- 03-2025.

31.           Mas, mesmo para os casos que com custo de aquisição dos bens é mencionado igualmente a respetiva instalação, as mesmas não podem ser aceites, por inexistência de recibo comprovativo do respetivo pagamento.

 

F). Três faturas-recibo e duas faturas simplificadas emitidas por I..., Lda., NIF... .

Referentes a aquisição de árvores de fruto

Valor em causa: € 837,13.

32.             Ora, neste caso, apesar de constarem de fatura/recibo tais despesas, conforme já se deixou exposto, o CAAD, ao decidir o processo que nele correu termos sob o nº 407/2023-T, pronunciou-se no sentido de não poderem ser consideradas, para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS, as despesas suportadas com a aquisição de árvores.

33.            Para além disso, as faturas simplificadas em causa não indicam o local de descarga das mesmas (nem tão pouco a morada do adquirente), o que torna impossível determinar onde iriam as mesmas ser plantadas e também não foram acompanhadas de qualquer recibo ou outro documento relativo ao pagamento das quantias delas constantes. 

 

G). Duas faturas-recibo e duas faturas emitidas por J..., Unipessoal, Lda.

Referente a artigos de mobiliário doméstico e ortopédicos

No valor de: € 5.334, 00.

34.           Uma destas faturas - referência VD 2017/C513, datada de 21-06-2017 - foi emitida a “zeros”, pelo que não cumpre analisá-la para os efeitos pretendidos pelo Requerente. 

35.           Por seu turno, as duas faturas-recibo, reportam-se a adiantamentos (não especificando de que operação económica, qual a respetiva data e envolvendo que bens, artigos e/ou serviços) e, bem assim, a colchões e espreguiçadeiras “...”.

36.           E a Requerida já defende que os “elementos autonomizáveis que não passam a fazer parte integrante do imóvel” ou bens “autónomos e destacáveis do imóvel”, obviamente não pode a aquisição dos mesmos ser considerada como encargo enquadrável na previsão contida na al. a) do nº 1 do art.º 51.º do CIRS. (vd. sumários das decisões proferidas pelo CAAD no âmbito dos processos ali instaurados sob os números 407/2023-T e 802/2022T).

37.           O mesmo raciocínio é feito para a fatura emitida em 09- 02-2017 sob a referência VD 2017C/139, uma vez que a mesma se reporta a um adiantamento (não especificando a que transação, bens ou serviços respeita) e à aquisição de um colchão.

 

H). Cinco faturas-recibo emitidas por K..., S.A., NIF... .

Referentes a: aquisição de diferentes tintas, rolos, trinchas e fitas.

No valor de: € 1.402, 22.

38.            Neste caso, a não aceitação das despesas está reportada ao entendimento já vertido na informação vinculativa nº 2511/2018, de 22-08-2018, entendimento este que se mantém na atualidade, sendo exatamente este o teor da parte final do ponto 2 da informação prestada em sede do procedimento de pedido de informação vinculativa nº 27918, de 10-03- 2025.

39.           Por outro lado, da identificada faturas-recibo não consta qualquer referência ao local de descarga (ou simples entrega) dos bens nelas descritos, o que torna impossível determinar onde é que os bens mencionados nestas faturas foram utilizados e/ou aplicados.

 

I). Fatura emitida por Piscinas L..., Lda., NIF ... em 21-10-2017 sob o nº 2017/75

Referente a: aquisição de um tubo, com elevador para cobertura e suporte de toalhas.

No valor de: € 7.000,00.

40.           Não pode ser considerada esta despesa para os fins pretendidos, porquanto a mesma não refere o local de entrega, descarga ou instalação dos bens aos quais se reporta, sem que também nada conste relativamente à respetiva instalação, nem tenha sido emitido o respetivo recibo.

 

J). Três faturas emitidas por M..., Lda., NIF... .

Referentes a: aquisição de vários tipos de bens, a saber: Tubos, trincha, cola, vaselina, diluente, etc.

No valor de: € 375,51.

41.           Esta despesa não pode ser aceite, porque tem por base a emissão de faturas que titulam a aquisição de bens separada da mão-de-obra necessária para a respetiva integração na obra (produto final), sendo que as mesmas também não surgem acompanhadas de qualquer recibo ou outro elemento demonstrativo do efetivo pagamento das quantias nelas mencionada.

 

K). Quatro documentos emitidos por N..., Lda., NIF... .

Referentes a: aquisição de lâmpadas led suspensas

Orçamento A02/95 no valor de € 9.796,95 (referente à Fatura A02/196), Fatura A02/196 no valor de: € 9.796,95, Fatura/Recibo A02/28 no valor de € 4 898,48 (Relativo a Adiantamento do orçamento A02/95) e Nota de Crédito A02/51 no valor de € 4 898,48.

Valor em causa: € 9.796,95. 

42.           Do conjunto de documentos emitidos (fatura/recibo, nota de crédito e orçamento) resultam diversas consequências.

43.           A nota de crédito NC A02/51, emitida pelo valor de € 4.898,48, reporta-se à fatura-recibo ADI 02/28, de ambas constando o mesmo montante, sendo que funcionam como contrapartida entre si, pelo que se não irá contabilizar o valor em ambas referido (€ 4.898,48), para efeitos do disposto na al. a) do nº 1 do art.º 51º do CIRS.

44.           Por sua vez, a fatura A02/196 emitida em 27-06-2019, da qual consta reportar-se ao orçamento A02/95, orçamento esse que surge titulado no documento com a referência ORC A02/95, datado de 16-05-2019, segundo o qual o mesmo seria válido por 30 dias, que se dão por ultrapassados, tendo a Requerida concluído que a sua validade expirou, ainda para mais quando não foi junto qualquer elemento que comprove que aquele orçamento foi assinado pelas partes contratantes e, consequentemente, por elas aceite, a que acresce ainda o facto da fatura e orçamento se reportarem à aquisição de elementos em suspensão para lâmpadas LED, nada constando dos mesmos quanto à respetiva instalação.

45.           Por seu turno, de referir ainda que a fatura A02/196 surge desacompanhada de qualquer recibo ou comprovativo de pagamento da quantia nela mencionada.

 

L). Um orçamento, uma fatura-recibo (emitida em 14-02-2017 sob a referência FR001.0170020) e uma fatura (data da de 15-03-2017, com a referência FT001.010170052) emitidas por O..., Lda., NIF ... e um comprovativo de Transferência bancária a favor de O..., Lda. 

Referente a: eletrodomésticos.

Valor em causa: € 5.450,00.

46.            Embora neste caso a fatura-recibo, que se reporte à adjudicação do orçamento, venha acompanhada do comprovativo da transferência bancária, porque se trata da aquisição de eletrodomésticos (placa, exaustor, forno, microondas, frigorífico e máquinas de lavar louça e roupa e de secar roupa), tal despesa tem que ser afastada, como já anteriormente a Requerida tinha referido.

47.           Nomeadamente, conforme resulta do sumário da decisão do processo que a apreciou sob o nº 802/2022-T, bem como no ponto 3 do sumário da decisão do processo nº 407/2023-T, em linha, aliás, com jurisprudência que há muito vinha seguindo, pois já na decisão proferida em 30-09-2015 no âmbito do proc. nº 129/2015-T (árbitro Dra. Alexandra Gonçalves Marques) se pode ler (pág. 22 da versão em PDF constante do ‘site’ do CAAD):

 “Com efeito, os custos incorridos com eletrodomésticos (documento 4), embelezamento de varanda (doc. 20) ou a aquisição de lâmpadas (doc. 21) não podem ser tidos como encargos com a valorização dos bens ou mesmo como despesas inerentes à alienação porque estamos perante bens que são autónomos e separáveis da fração, não contribuindo para a sua valorização (…)”

48.           Se toda esta argumentação não bastasse para que bem se compreendesse a posição da Requerida, a mesma ainda salienta que, para mais, o orçamento em questão nem sequer está assinado.

49.           A Requerida invoca os mesmos argumentos para excluir a fatura emitida pela mesma entidade em 15-03-2017, que para além de também reportar a eletrodomésticos, não foi acompanhada de qualquer recibo ou comprovativo de pagamento.

 

M). Um orçamento e uma fatura emitidos por P..., Lda., NIF ...

Referente a: aquisição de saicos de madeira.

No valor de € 66.20.

50.           O orçamento, com o nº 902 e datado de 10-05-2018 menciona ter a validade de 30 dias, sendo que a fatura com o nº 1260 tem a data 15-06-2018, pelo que também neste caso a data de emissão da fatura ocorreu para além do final do prazo de validade do orçamento, não tendo sido junto ao mesmo qualquer elemento comprovativo da respetiva assinatura ou qualquer outro elemento demonstrativo da respetiva aceitação pelas partes contratantes.

51.           Por seu turno, a fatura reporta-se à aquisição de saicos para madeira, que consiste num impregnante, utilizado para proteção das madeiras.

52.           Ora, entende a Requerida, se as despesas com eletrodomésticos não podem ser aceites por constituírem “bens que são autónomos e separáveis da fração”, naturalmente que o mesmo entendimento terá de prevalecer quanto a mobiliário (igualmente bens móveis, autónomos e separados do imóvel em que estão colocados). E se assim se deve entender quanto aos móveis, logicamente que tal posição terá de prevalecer quanto a simples consumíveis destinados a aplicar nesses mesmos móveis (no caso, um protetor da madeira do qual são feitos).

53.           Por outro lado, esta fatura também não foi acompanhada de qualquer recibo ou comprovativo de pagamento.

 

N). Quatro faturas no valor de € 529,76, € 352.89, € 228,00 e € 691,84 euros e Notas de Crédito no valor de € 529,76, € 352,89 e € 177,97 emitidos por Q..., S. A., NIF... . 

Referentes a: aquisição de varões, suporte de parede, tampão, cavalete, nível, apliques, espelho, pasta, torneiras, chuveiro, etc.

54.           A fatura nº 201800403/005031, de 27-04-2018 nem sequer apresenta a identificação do adquirente, nem o seu NIF, pelo que – realça a Requerida - seria desde logo insuscetível de ser considerada para efeitos da norma à qual nos temos vindo a reportar, a qual exige que os encargos, para que possam ser considerados à luz da sua letra, tenham sido comprovadamente efetuados, pelo que resulta impossível demonstrar quem suportou a despesa titulada pela fatura.

55.            Por outro lado, nenhuma destas faturas vem acompanha de recibo ou comprovativo do pagamento.

 

O). Catorze faturas simplificadas emitidas por R..., C. R. L.., NIF... .

Referentes a: aquisição de varas, luvas, telas, fio, fita isoladora, rede, grampos, cabos para enxada, casquilho, etc.

No valor de € 1.329,63. 

56.            Desde logo, a natureza das luvas ou de cabos para enxada (ou mesmo estas, se fosse o caso), enquanto bens móveis, as afasta da possibilidade de valorização de qualquer bem imóvel, quando nem sequer é demonstrada a ligação ao imóvel alienado ou (eventualmente nos casos da rede e das varas) a respetiva instalação no mesmo. 

 

P). Sete faturas e doze faturas simplificadas emitidas por S..., Lda., NIF... . 

Referentes a: aquisição de bens tubos, tampões, uniões, luvas, fitas (de teflon e isoladora), válvula, abraçadeira, tomadas de carga, pilha, casquilho, torneira, etc.

Tela, pregos, válvulas, uniões, tampões, abraçadeiras, rolha, caixas, tubos, estaca, fio, torneira, pilha, fitas, luva, casquilho, etc. 

No valor de € 2.001,35.

57.           Uma vez mais estamos perante faturas referentes a aquisições de bens, separadamente da mão-de-obra inerente à respetiva instalação, que não são suscetíveis de demonstrar a comprovada valorização do imóvel, quando nem sequer são acompanhadas do respetivo recibo ou comprovativo do pagamento, pelo que as mesmas não podem ser aceites para os fins pretendidos.

58.           Salienta ainda a Requerida que a fatura emitida por S..., Lda. em 31-07-2018, no valor de € 553,26, não tem identificação do adquirente dos bens nela mencionados, nem o respetivo NIF.

59.           Reportando-se à numeração das faturas emitidas não por este fornecedor, a Requerida constata que corpo do nº 5 do art.º 36.º do CIVA é claro quando determina que as faturas devem ser emitidas sequencialmente, o que não aconteceu no caso concreto.

60.           Quanto às doze faturas simplificadas emitidas por S..., Lda, a Requerida salienta que parte delas estão total ou parcialmente ilegíveis, embora  nalgumas se consiga perceber que se trata de aquisição de tela, pregos, válvulas, uniões, tampões, abraçadeiras, rolha, caixas, tubos, estaca, fio, torneira, pilha, fitas, luva, casquilho, etc., mas em que o Requerente não comprovou a sua efetiva instalação no imóvel cuja alienação gerou mais-valias.

 

Q). Oito faturas e cinco Recebimentos emitidos por T..., Lda., NIF... .

Referentes a: “arranjos exteriores”.

No valor de € 39.342,20. 

61.           Estamos perante trabalhos realizados conforme diferentes orçamentos (que identificam), os quais mencionam também constar em anexo, que, no entanto, não obstante o teor do descritivo das duas ditas faturas, nenhum orçamento foi junto às mesmas e desse modo não estão especificados o tipo de arranjos a que se referem, aplicando aqui a Requerida a jurisprudência que resulta do  ponto 2 do sumário da decisão proferida pelo CAAD em 21-06-2024 (árbitro Dr. José Sampaio e Nora) no processo com o nº 628/2023-T, onde se pode ler:

 “2. Não é suficiente para preencher tal ónus a simples junção de faturas ou recibos, que não descrevem as obras realizadas no prédio alienado, não sendo possível a demonstração de que as mesmas tenham valorizado a fração vendida.”

62.           Para além disso, três das oito faturas não foram acompanhadas de qualquer recibo ou comprovativo de pagamento dessas mesmas quantias.

 

R). Duas faturas e sete faturas-recibo emitidas por U..., Unipessoal, Lda., NIF... .

Referentes a: serviços efetuados com recurso a mini-escavadora, utilização de um camião pequeno, aquisição de terra e pedra grossa.

No valor de € 5.812,70.

63.           Quanto a esta despesa, a Requerida entende que da simples menção a serviços de escavadora e utilização de camião, só por si, não especifica em que tarefas se traduziram os mesmos, nomeadamente não se refere o que se escavou e porquê, do mesmo modo que nada se diz sobre a razão pela qual foi necessário utilizar uma camião.

64.           A Requerida entende que também neste caso não se descrevem as obras efetuadas no prédio alienado, de acordo com a expressão constante do ponto 2 do sumário da decisão proferida pelo CAAD no proc. nº 628/2023-T, já várias vezes referenciado.

65.           Tendo esta empresa também emitido faturas relativamente à venda de terra para jardim, a Requerida refere que vai tratar esta questão conjuntamente com a abordagem efetuada a propósito de outro fornecedor.

66.           Acresce, ainda, que as duas faturas, acima identificadas, não foram acompanhadas de recibos ou outros documentos demonstrativos do efetivo pagamento das quantias delas constantes.

67.           Relativamente às faturas-recibo, uma - a nº 59, datada de 22-05-2019 - reporta-se à aquisição de uma planta ornamental, a qual não pode ser aceite, nomeadamente com base na jurisprudência do CAAD já referenciada, donde consta que:

“3 – Não podem ser consideradas para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS as despesas suportadas com elementos autonomizáveis que não passam a fazer parte integrante do imóvel (eg. as despesas com eletrodomésticos encastráveis e com árvores e plantas decorativas).” (Vd. Acórdão do CAAD no Procº. nº. 407/2023)

68.           O mesmo raciocínio se aplica à fatura-recibo emitida em 10-10-2019, sob o nº 107, porquanto esta reporta-se à aquisição de um bem (casca de pinho), já que não faz sentido defender para a casca de pinho um entendimento diferente do que seria sustentado no caso de aquisição da árvore da qual a mesmo é extraída, ou seja: o pinheiro.

69.           Não sendo as despesas com aquisição de árvores aceites neste contexto, muito menos seria a respetiva casca dele extraída, que ganha assim autonomia.

70.           As restantes quatro-faturas recibo anexas pelo Requerente emitidas U..., Unipessoal, Lda reportam-se à aquisição de terra para jardim. 

71.           Como a Requerida desconhece se a terra foi colocada na parte rústica ou urbana, dada a natureza mista do prédio alienado, coloca as duas hipóteses.

72.           Tendo sido a terra colocada na parte rústica, não sabe a Requerida como a mesma poderia ter contribuído para valorizar essa parte, já que a mesma se reporta a uma construção rural e duas parcelas consignadas a cultura arvense, pelo que não é tal despesa aceitável para os fins pretendidos.

73.           Por seu turno, se a terra tivesse sido colocada na parte urbana do prédio, sabendo-se que o mesmo se destina a habitação, a Requerida reporta-se aos critérios de valorização dos imóveis previsto no CIMI, para concluir que da observação dos fatores constantes da Tabela I anexa ao artº. 43º do CIMI, a existência de jardim não constitui critério majorativo a ponderar para efeitos de determinação do valor patrimonial do prédio urbano destinado a habitação.

74.           Em nada contribuindo para a valorização do prédio urbano, a despesa com a aquisição da terra de jardim não pode ser considerada ao abrigo da previsão constante da al. a) do nº 1 do art.º 51º do CIRS. 

 

S). Uma fatura emitida por V...; Lda., NIF..., emitida em 09-08-2019 sob o nº 2019/135.

Referente a: aquisição de uma porta, um móvel de cozinha e uma cobertura.

No valor de € 13.072,44. 

75.            A despesa com o móvel e cobertura, porque se trata de aquisição de bens separada da mão-de-obra necessária à respetiva instalação, não é passível de ser considerada como despesa de valorização de um imóvel. 

76.           O mesmo acontece com a cozinha, por se tratar de um bem móvel, que não constitui parte integrante do mesmo.

77.           Ainda que assim não fosse, acresce que esta fatura foi anexa sem que qualquer recibo ou comprovativo de pagamento do valor dela constante fosse conjuntamente apresentado.

 

T). Duas faturas emitidas por W..., Unipessoal, Lda., NIF ... em 11-03-2019 e 13-07-2019 sob os números 1 1/4 e 1 1/192, respetivamente;

Referentes a: “serviços de eletricidade”. 

No valor de € 4.797,01.

78.           Nesta situação, a impossibilidade da Requerida para qualificar a despesa para os efeitos pretendidos, resulta do facto da fatura não descrever que serviços foram prestados, pelo que se torna impossível apurar se aqueles contribuíram ou não para a valorização do imóvel onde foram prestados.

79.            O que tem cobertura no entendimento do CAAD, vertido no ponto 2 do sumário da decisão proferida no processo nº 628/2023-T, segundo o qual:

 “2. Não é suficiente para preencher tal ónus a simples junção de faturas ou recibos, que não descrevem as obras realizadas no prédio alienado, não sendo possível a demonstração de que as mesmas tenham valorizado a fração vendida.”

80.            Ver, no mesmo sentido, a Decisão do CAAD no Procº. nº 129/2015-T, que refere o seguinte:

““No que respeita á fatura nº (segue identificação da mesma; nosso parêntesis), a mesma não permite documentar a relação entre esse encargo e a valorização do imóvel porque a mesma não indica o imóvel objeto de restauro, carecendo ainda da descrição dos serviços prestados. (…) Falta, pois, a conexão entre o encargo constante do documento em causa e a valorização da fração.”

81.           Por seu turno, se tais serviços se destinaram a reparações ou manutenção do sistema elétrico do imóvel, a prestação de tais serviços não concorreu para a valorização daquele, porque as despesas de conservação e manutenção do imóvel, estão excluídas da previsão do artº. 51º, nº 1, al. a) do CIRS. (Vd. decisão proferida no CAAD no processo nº 802/2022-T).

82.           Por outro lado, a fatura emitida em 11-03-2019, não indica o local da prestação de serviços, nem a morada do cliente, sendo que se não se sabe quais os serviços prestados, não se fica também a saber onde aqueles foram prestados.

83.           Por outro lado, a fatura emitida 13-07-2021, além de não indicar também o local de prestação dos serviços, apresenta uma morada de cliente sita no estrangeiro – concretamente, em França.

84.           Sobre tudo isto acresce, como em muitos outros casos, o facto de ambas as faturas terem sido apresentadas sem que lhes fosse junto qualquer recibo ou elemento comprovativo do efetivo pagamento das quantias delas constantes.

 

U). Vinte e uma faturas-recibo emitidas por X..., Lda., NIF ... no período compreendido entre 11-04-2018 e 08-11-2019;

Referentes a:  aquisição de árvores e plantas, a saber: Jacarandás, oliveiras, choupos, sobreiros, alfarrobeiras, aceres, palmeiras, ciprestes e vários tipos de plantas de menor dimensão, como sálvia, aloe vera, buganvíleas, lavanda, murta, tomilho, alecrim, diferentes variedades de arbustos, etc.

No valor de € 24.640,36.

85.           Nesta situação, a morada que consta das faturas é em França, e em doze daquelas faturas consta situar-se o local de descarga dos bens nelas mencionados nessa mesma morada (sita em França), pelo que conclui a Requerida que, assim sendo, resulta impossível estabelecer qualquer conexão entre as quantias mencionadas nas mesmas com operações passíveis de determinar uma hipotética valorização do imóvel alienado (localizado no concelho de Lagos, distrito de Faro, no Sul de Portugal).

86.           Ora, ao longo da sua Resposta já por diversas vezes a Requerida referenciou que a aquisição de árvores ou plantas não pode se aceite para efeitos de aplicação do artº. 51º. do CIRS, oque também é aqui o caso.

87.           Esta é a análise detalhada de cada uma das despesas que a AT corrigiu, com os respetivos fundamentos. 

88.           De referir que o Requerente, nas suas alegações, faz uma síntese da posição da Requerida e elabora o quadro que se junta:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

B...

 

C...

 

D...

 

 

E...

 

 

F...

 

K...

 

 

L...

 

M...

 

N...

 

 

Q...

 

 

Y...

G...

 

 

I...

 

 

J...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

P...

 

 

 

 

 

 

X...

 

W...

 

V...

 

U...

 

 

T...

 

S...

 

R...

 

Q...

 

 

 

89.             Terminada esta exaustiva análise da faturação em causa, a Requerida vem defender a legalidade da liquidação dos juros compensatórios, igualmente contestada pelo Requerente, alegando que os mesmos só seriam de liquidar no caso de ter resultado prejuízo para a Fazenda Pública por facto imputável ao então reclamante (ou seja, ele próprio) e consequentemente a título de culpa, circunstância a que a AT não fez qualquer referência, reforça o agora Requerente.

90.           O Requerente invoca, assim, que o ato de liquidação de juros compensatórios padece de vício de forma, por falta de fundamentação e de violação de lei, por ofensa ao disposto nos artigos 91º do CIRS e 35º, nº 1 da LGT.

91.           Se quanto à falta de fundamentação da liquidação dos juros compensatórios a Requerida remete para a mesma argumentação que utilizou em defesa da fundamentação do próprio ato tributário, já quanto ao facto da AT nada referir quanto ao nexo de causalidade entre a sua atuação e o retardamento da liquidação, a Requerida deixa expresso que, relativamente ao requisito da culpa, bem como quanto à não censurabilidade da sua conduta, é a jurisprudência dos tribunais superiores da orgânica judicial administrativa e tributária que tem considerado necessária a respetiva observância.

92.           Isto, porque a Requerida entende que a norma que considera devidos esses juros – o nº 1 do art. 35º da LGT – se basta com a existência de um facto imputável aos sujeitos passivos do qual resulte o retardamento (total ou parcial da liquidação de imposto).

93.           Em defesa da sua posição quanto ao nexo de causalidade, invoca o aresto produzido no âmbito do processo que correu termos no STA sob o nº 2577/12.9BELRS, onde se pode ler consistir aquele nexo num “nexo subjetivo baseado na culpa, na modalidade de erro de conduta, traduzido no incumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação fiscal acessória de apresentar a declaração de rendimentos num determinado prazo e de, nessa declaração, informar com verdade, por uma certa forma e com observância dos critérios impostos pelas leis fiscais.”

94.           O que leva a Requerida a concluir, face ao comportamento do Requerente, que (e ao invés do alegado pelo contribuinte nos artigos 99.º e 108.º do requerimento) dúvidas não restam quanto ao nexo de causalidade entre a sua atuação e o atraso na liquidação (correta) do imposto, bem como à sua culpa (ao declarar erradamente o valor de despesas e encargos suportados com a valorização do imóvel posteriormente alienado).  

95.           Por seu turno, relativamente ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios, a Requerida entende não serem os mesmos devidos, porquanto não se mostra verificado o preenchimento do requisito que exige a existência de um erro na liquidação imputável aos serviços, conforme impõe o nº. 1 do artº. 43º. da LGT para que tal pagamento fosse devido.

96.           Conclusão final da Requerida:

“Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o pedido ser julgado improcedente, com as devidas consequências legais.”

97.           Por seu turno, nas suas alegações, a Requerida não só reitera tudo o que abordou ao longo da sua Resposta, como formula as seguintes conclusões:

“A. O Requerente deduziu pedido de pronúncia arbitral que tem por objeto o ato de liquidação de IRS n.º 2024... e correspondente acerto de contas n.º 2024.30978685, referentes ao ano de 2023 requerendo a respetiva anulação, com as devidas consequências legais.

B. Para o desiderato pretendido sustenta que ato impugnado padece de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, advogando que a desconsideração das despesas suportadas com a suposta valorização de um imóvel, no montante de € 268.789,02, é ilegal.

C. Mais sustenta, de entre o mais, que que o ato impugnado e respetivo ato de juros compensatórios padecem de falta de fundamentação.

D. O ato de liquidação impugnado não padece do erro sobre os pressupostos de facto e de direito, por desconsideração das supostas despesas com a valorização do imóvel, nos termos e fundamentos aduzidos em sede das supra Alegações e da Resposta apresentada, que se dá por reproduzida.

E. No que concerne aos vícios de falta fundamentação apontados, é de salientar que os atos elencados se encontram condignamente fundamentados de forma clara, suficiente e congruente, tendo o Requerente compreendido as razões da respetiva decisão e emissão, conforme se discorre do próprio requerimento de pronuncia arbitral e participação detida em sede do procedimento de gestão de divergência.

F. Em todo caso, em momento algum, o ora Requerente demonstrou – ou sequer alegou – ter lançado mão do mecanismo previsto no nº 1 do art. 37º do CPPT, pelo que não colhe o argumento no qual defende terem os atos em menção sido efetuados sem a devida fundamentação.

G. Quanto às alusões que o Requerente faz sobre a natureza jurídica das orientações genéricas, acusando a AT de fundamentar a sua decisão nas informações vinculativas, cumpre advogar que a decisão do procedimento de gestão de divergências (subjacente à elaboração da liquidação por ele contestada) não foi fundamentada apenas em informações vinculativas.

H. Na fundamentação daquela foram mencionadas informações deste tipo porquanto a natureza da situação em apreço era semelhante à situação objeto da prestação das informações ali referidas, o que se efetuou por facilidade de exposição, visto o tema já haver sido tratado, o que é natural, pois o art.º 51º do CIRS, invocado pelo ora Requerente, é uma das normas do CIRS, relativamente ao qual mais pedidos de informação vinculativa têm sido apresentados junto da AT.

I. Circunstância que, todavia, constitui uma mais-valia para o contribuinte, pois poderá consultar o teor de cada informação vinculativa mencionada, visto aquelas serem objeto de publicação no Portal das Finanças, assim decidindo se concorda com a aplicação da doutrina vertida pela AT através da informação vinculativa identificada pelos serviços tributários ao seu caso concreto, ou dela discorda. J. Mas alegar que a decisão tomada em sede de procedimento de divergências foi tão só fundamentada no teor de informações vinculativas é absolutamente redutor, pelo que deve decair tal argumento. K. Improcedem, igualmente, todos os demais vícios imputados ao ato de liquidação de juros compensatórios, nos termos e fundamentos aduzidos em sede das supra Alegações e da Resposta apresentada, que se dá por reproduzida.

L. Não se mostra verificado o preenchimento do requisito que exige a existência de um erro na liquidação imputável aos serviços previsto no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, pelo que deve decair o pedido de atribuição de juros indemnizatórios formulado.”

 

IV – SANEAMENTO

 

O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 5.º e 6.º, todos do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas, encontram-se regularmente representadas e o processo não enferma de nulidades.

 

 

V - MATÉRIA DE FACTO

 

Para a convicção do Tribunal Arbitral, relativamente aos factos provados, relevaram os documentos juntos aos autos e o processo administrativo.

 

Ademais, é de salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e distinguir a matéria provada da não provada, tudo conforme o artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e o artigo 607.º, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT. 

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 511.º, n.º 1, do anterior CPC, correspondente ao artigo 596.º do atual CPC).

 

Assim, atendendo às posições assumidas pelas partes nos respetivos articulados (pedido de constituição arbitral e Resposta da Requerida) e à prova documental junta aos autos, consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

a.              Factos dados como provados 

 

Com interesse para a decisão, dão-se por provados os seguintes factos: 

 

A)            No dia 25 de janeiro de 2017, o Requerente adquiriu, mediante escritura pública, pelo preço de € 475.000,00 (quatrocentos e setenta e cinco mil euros), “o prédio misto composto por cultura arvense, cultura arvense de regadio, construção rural e moradia unifamiliar de três pisos, tipo T-quatro com garagem, sito em ..., na freguesia de ..., concelho de Lagos; inscrito na respetiva matriz com os artigos urbano ... e rústico ... secção R com o valor patrimonial tributário, respetivamente, de € 213.440,00 e de € 511,99, sendo o artigo urbano vendido pelo preço de trezentos e setenta e cinco mil euros e o artigo rústico pelo preço de cem mil euros; descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagos sob o número ..., da freguesia de ..., aí registado a favor da Caixa Agrícola pela inscrição Ap. mil e oitenta e um, de um de Julho de dois mil e dezasseis” (cfr. Documento n.º 2). 

B)            O Requerente deslocou para este imóvel a sua residência com a família, apesar do mesmo não estar concluído, por ter sido comprado na sequência da insolvência do promotor imobiliário, porquanto, nomeadamente não possuía aquecimento, sistema de refrigeração, cozinha, estando o terreno envolvente vazio o sem manutenção (factos não questionados pela Requerida).

C)            Dessa situação resultou necessária uma transformação completa por forma a tornar-se na residência principal do Requerente e da sua família, o que obrigou à realização de obras de grande envergadura, nomeadamente:

 Arquitetura paisagística de aproximadamente 7.000 m² de um total de 8.800 m², caminhos pavimentados, muros de contenção, terraços, sistema completo de climatização, painéis solares térmicos, piso radiante, cozinha equipada, acabamentos interiores e jacuzzi (facto não contestado pela Requerida e constante das mais de duas centenas de faturas, recibos, orçamentos, comprovativos de pagamento, etc, junto aos autos).

D)            No dia 4 de maio de 2023, o Requerente alienou o referido imóvel, através de escritura pública de compra e venda, pelo preço de € 1.170.000,00 (um milhão cento e setenta mil euros) (cfr. Documento n.º 4).

E)            Em 28 de agosto de 2024, o Requerente procedeu à entrega da Declaração Modelo 3 de IRS para o ano de 2023, a qual se fazia acompanhar pelo Anexo G.

F)             No quadro 4 do referido anexo G, o Requerente mencionou haver procedido à transmissão apenas de um imóvel, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de Lagos, sob o artigo ..., não fazendo qualquer referência ao artigo rústico, mas colocando como valores de aquisição e de venda a totalidade dos valores constantes das respetivas escrituras públicas de compra e venda. (Probatório A e D).

G)            O Requerente verificou, no website da Autoridade Tributária, a existência de Divergência de IRS, referente ao ano de 2023, com o seguinte conteúdo: “Relativamente aos imóveis alienados ou afetados a atividade profissional, existe necessidade de comprovação das despesas declaradas.”

H)            De maneira a clarificar a referida Divergência de IRS, referente ao ano de 2023, o Requerente e a AT trocaram diversa correspondência por meios eletrónicos, tendo o Requerente entregue uma primeira resposta, com o seguinte conteúdo:

“Exmos. Senhores, em resposta à vossa comunicação sobre a divergência, envio em anexo o comprovativo das despesas iniciais com a aquisição do imóvel, que totalizam 27.550,19€, assim como um resumo do e-fatura, onde podem ver os valores referentes às obras realizadas. Gostaria de explicar que este imóvel era a minha única habitação em Portugal, portanto, todas as faturas submetidas estão relacionadas com a reabilitação da casa. Estou à disposição para qualquer esclarecimento adicional.”

I)              A Autoridade Tributária, respondeu a esta justificação, por correspondência eletrónica, no sentido de que o Requerente deveria:

“Substituir a modelo 3 e colocar em despesas e encargos o valor de 27.549,51€ (IMT + Iselo + registos). As restantes despesas não são indissociáveis da operação da venda de acordo com o disposto na informação vinculativa 2511/2018 de 22.08.2018”

J)             O Requerente solicitou à AT a indicação do modo como se poderia proceder à junção das faturas, tendo em vista justificar as despesas realizadas, já que, por ser demasiado grande, não seria possível enviar o ficheiro digitalizado.

K)            Ao que a AT respondeu:

“Não é necessário o envio dos documentos, reitera-se a informação dada anteriormente pelo que deve substituir a declaração com os valores informados. “

L)             De seguida, o Requerente respondeu à AT nos seguintes moldes:

“Venho por este meio solicitar um esclarecimento claro sobre o motivo pelo qual me foi comunicado, no seguimento desta divergência, que não seria necessário enviar as faturas das obras. Não compreendo essa resposta, uma vez que estas faturas dizem respeito a obras de valorização, que são indissociáveis do imóvel. Sem essas intervenções, não teria sido possível alcançar a valorização do imóvel que originou a mais-valia em questão”.

M)           O Requerente obteve da AT a seguinte resposta:

“Nos termos da informação vinculativa 2511/2018 de 22/08/2018 a aquisição de materiais separadamente da mão de obra, não são elegíveis no âmbito do disposto no art.º 51 do CIRS. As obras efectuadas no jardim não são dedutíveis pois são espaço exterior e não a habitação própria e permanente (CAAD 257/2021- T). Consultada a base de dados da AT verifica-se igualmente que não foi apresentada qualquer modelo 1 do IMI a comunicar alterações no imóvel de acordo com o disposto na informação vinculativa 569/2019 de 18.04.20”.

 

N)            No dia 16 de outubro de 2024, o Requerente foi notificado para exercer o direito de audição prévia, designadamente para comprovar as despesas e encargos no montante de € 269.342,77, as quais, no seu da ATr, não eram aceites fiscalmente (cfr. Documento n.º 5).

O)            O Requerente exerceu o correspondente direito de audição (cfr. Documento n.º 6), por forma a comprovar as despesas.

P)             Em resposta, o Requerente foi notificado da Decisão final nos termos da qual a Autoridade Tributária manteve o seu entendimento, não aceitando as despesas, com base na seguinte argumentação (cfr. Documento n.º 7):

“Os meros materiais adquiridos separadamente da mão-de-obra; aquisição de eletrodomésticos, móvel de cozinha não são elegíveis para efeitos do estabelecido no artº. 51 do CIRS. Os arranjos exteriores bem como as restantes obras efectuadas não são indissociáveis da operação de alienação nem configuram despesas de valorização do imóvel.

De acordo com o disposto no artigo 51 do Código do IRS para determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação do imóvel, como seja, entre outras, o IMT, o Imposto do Selo, as despesas com a escritura e registo do imóvel, e o valor da comissão paga à imobiliária por intermediação no negócio.

Dado o exposto e tendo em atenção os factos e fundamentos invocados propõe-se o deferimento parcial da pretensão do contribuinte devendo o valor das despesas declaradas de 296.892,28 € ser corrigidas para 28 103,01 €. 

Q)             Na sequência desta decisão, a Autoridade Tributária emitiu o ato de liquidação de IRS objeto do presente pedido de pronúncia arbitral (cfr. cit. Documento n.º 1).  

R)            O Requerente juntou aos autos a seguinte documentação: 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

R...

 

W...

 

T...

 

Q...

 

H.../G...

 

E...

 

B...

 

 

 

 

 

X...

 

S...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

N...

 

 

 

M...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

C...

 

Y...

 

K...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

S)             Tais documentos permitem extrair as seguintes referencias: 

 

B...

 

Y...

J...

K...

 

 

L...

 

M...

 

N...

 

 

Q...

 

 

G...

 

 

I...

 

 

C...

 

D...

 

 

E...

 

 

F...

 

 

 

 

 

 

 

 

 

P...

 

 

Q...

 

 

R...

 

T...

 

 

U...

 

 

V...

 

 

W...

 

X...

 

 

S...

 

 

 

 

 

a.          Factos dados como não provados.

 

Como referido, relativamente à matéria de facto dada como assente, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada tal como dispõe o artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e o artigo 607.º, n.ºs 2, 3 e 4 do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT. 

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram, como acima se referiu, escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, não existindo outra factualidade alegada que seja relevante para a correta composição da lide processual.

 

VI - DO DIREITO 

i). Questões decidendas

1.             A título introdutório entende o presente Tribunal que deve, desde já, referir que se reserva, conforme jurisprudência do STA, ao direito de apreciar apenas os argumentos formulados pelas partes que entende pertinentes para a apreciação da questão aqui em causa, o que fará depois de ter identificado as partes e o objeto do litígio, ter enunciado as questões decidendas, e, depois de fundamentar a decisão discriminando os factos provados e os não provados, mais, indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas correspondentes e, por fim, apresentando a sua conclusão final (decisão).

2.             Nestes moldes são várias as questões que importa dirimir, nomeadamente a tempestividade da apresentação do PPA, a falta de fundamentação do ato, a sua fundamentação à posteriori, o vício de violação do princípio da legalidade.

3.              Por outro lado, relativamente às despesas em si, importa ponderar o conceito de despesas de valorização e se o mesmo inclui as despesas suportadas com a própria construção do imóvel, se nas despesas apresentadas com base em fatura é obrigatória a apresentação do comprovativo do pagamento, a questão dos bens adquiridos isolados da prestação de serviços para incorporação no imóvel, a validade dos orçamentos não assinados e o valor probatórios de todos os elementos juntos aos autos, incluindo a relevância das fotografias.

 

ii). Pressupostos da decisão

 

A). Tempestividade da apresentação do PPA.

1.              Quanto a este aspeto o Requerente refere que, tendo presente que a data limite de pagamento teve o seu termo no dia 27 de janeiro de 2025 e que, no dia 28 de abril de 2025, final do prazo para apresentação do PPA, ocorreu um “apagão“ em todo o território nacional que impediu os mandatários de submeter o PPA pelos meios habituais, deve considerar-se tal motivo como suscetível de preencher o conceito de justo impedimento e, consequentemente, considerar-se, como tempestivo,  o Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado no dia 29 de abril, ou seja, no dia seguinte ao último dia do prazo.

2.              A Requerida, ao longo de todo o processo, não se pronunciou sobre esta questão, nem tão pouco invocou a intempestividade da apresentação do presenta PPA.

3.              Contudo, tal situação é de conhecimento oficioso por parte do Tribunal (Vd. nº. 3 do artº. 140º. do CPC).

4.              São os seguintes os factos dados por assentes:

a). Termo do prazo /data limite de pagamento: 27 de janeiro de 2025;

b) Data da ocorrência do denominado “apagão”: 28 de abril de 2025;

c). Data de entrega do PPA:  dia 29 de abril de 2025.

5.              Atendendo a que, nos termos do disposto no artº. 10º. do RJAT, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral, deve ser apresentado no prazo de 90 dias contados a partir da verificação dos factos previsto no artº. 102º., nº. 1, alínea e) do CPPT, o presente PPA deveria ter sido precisamente entregue até ao dia 28 de abril, dia em que ocorreu o fenómeno identificado como “apagão”.

6.              De acordo com o disposto no artigo 140.º do CPC, aplicável ex-vi em função do disposto no artº.  do RJAT:

 “Considera-se «justo impedimento» o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários que obste à prática atempada do ato”.

7.              Tratando-se de um de um prazo substantivo, podemos concluir, como o faz o Requerente, que o mesmo termina apenas no dia seguinte àquele em que se verificou o justo impedimento, ou seja, no dia 29 de abril, aplicando-se as regras do procedimento tributário (artigo 20.º, n.º 1 do CPPT e 279.º do CC).

8.              O Tribunal dá por verificado o justo impedimento, pelo que considera como tempestiva a apresentação do presente PPA.

 

B). Falta de fundamentação do ato.

9.              São conhecidas as posições das partes quanto a este aspeto.

10.           O Requerente invoca que a fundamentação do ato não é congruente, nem tão-pouco clara, por violação do disposto no artº. 268º., nº. 1 da CRP, do artº. 77º. nº. 1 da LGT e artº. 152º. do CPA.

11.           Na abordagem doutrinária, o Requerente refere, em sede de alegações, que:

““importa, pois, que o contribuinte destinatário da decisão fique minimamente ciente do iter volitivo da administração no que concerne à determinação da matéria coletável. A violação destes requisitos da decisão implica a respetiva ilegalidade, fundamento da subsequente anulação em sede de impugnação judicial da correspondente liquidação – artigos 89º e 120º, alínea c)” (cfr. ALFREDO DE SOUSA e J. PAIXÃO, Código de Processo Tributário Anotado, 2ª Ed. pág. 165)” 

12.           Ora, por seu turno, a Requerida defende que as razões pelas quais a AT corrigiu o valor de despesas e encargos com a valorização do imóvel surgem assim claramente explicadas nas diversas notificações enviadas ao Requerente que se dão como provadas, considerando a fundamentação congruente, clara e compreensível, ainda que sucinta.

13.           E cita, em defesa da sua posição, diversa jurisprudência. Nestes termos:

“Segundo abundante jurisprudência do STA, “a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo legal de ato e visa responder às necessidades de esclarecimento do Administrado”, cfr., entre outros, os Acórdãos do STA de 26-5-2004 (proc. nº 742/03), de 27-4- 2005 (proc. nº 7/02), de 4-10-2006 (proc. nº 90/06) e de 15-11-2006 (proc. nº 759/06) e outros arestos naquele mencionados, orientação que o STA continuou a perfilhar, como demonstra a jurisprudência mais recentemente firmada nos Acórdãos proferidos em 09-11-2016, 07-06-2017 e 21-06-2017, no âmbito dos processos números 01118/15, 0723/15 e 068/17, respetivamente.”

14.           Face ao exposto, este Tribunal manifesta-se no sentido de acompanhar a posição da Requerida, porquanto importa salientar que o Requerente bem compreendeu as razões que permitiram à administração praticar o ato, tendo trocado imensa correspondência com a AT na fase administrativa do processo, e, tendo contra o mesmo apresentando pedido de pronúncia arbitral de um modo detalhado e exaustivo relativamente ao teor das despesas por si realizadas e ao seu devido enquadramento legislativo.

15.           De referir, ainda, que a AT deu conta ao sujeito passivo do devido enquadramento deste tipo de despesas no estatuído no artº. 51º. do CIRS, quer diretamente, quer por intermédio de remissão para diversa jurisprudência e doutrina administrativa sobre situações em tudo idênticas à dos presentes autos.

16.           Nos exemplos dados, estão analisadas as compras e prestações de serviços, face à sua natureza específica e aos fins a que se destinam, bem como aos aspetos formais da prova apresentada e dos requisitos legais da sua aceitação como despesas de valorização do imóvel alienado, para cálculo da tributação em sede de mais valais imobiliárias.

17.           Conclui, assim, o Tribunal que a ato administrativo em causa, que levou à liquidação do imposto aqui impugnado, está devidamente fundamentado, face aos requisitos legais aplicáveis e à melhor doutrina e jurisprudência prevalecente, igualmente identificada por ambas as partes.

18.           Razão pela qual não assiste razão ao Requerente quanto a esta questão.

 

C). Fundamentação à posteriori.

19.           E será essa fundamentação à posteriori, questiona o Requerente.

20.           Pensamos que não.

21.           Todo a vasta troca de comunicações entre a AT e o contribuinte durante o procedimento administrativo e levada ao probatório, é anterior ao ato de liquidação aqui controvertido.

22.           E, sendo verdade, como a própria Requerida reconhece, que essa fundamentação é sucinta, isso pode explicar que, consequentemente, em sede de Resposta e de alegações finais, a entidade Requerida tenha reforçado essa fundamentação. Mas tal não significa que fosse anteriormente inexistente, como já se viu, nem tão pouco posterior ao ato administrativo aqui em causa.

23.            Admitimos que, quando o Requerente caracteriza a fundamentação à posteriori do ato administrativo, tem para si que antes da sua prática o mesmo não se encontrava devidamente fundamentado.

24.           Ou seja, o Requerente só considera que o ato está fundamentado à posteriori, face à posição defendida pela Requerida já em sede judicial e não na fase administrativa anterior à data da liquidação do imposto em causa.

25.           O facto do Tribunal considerar o ato como bem fundamentado antes da sua prática, deixa antever dificuldades, nesta sede, à posição do Requerente, em considerar que o mesmo só foi devidamente fundamentado depois.

26.           Razão pela qual não assiste razão ao Requerente neste particular.

 

D). Violação do princípio da legalidade e as orientações genéricas.

27.           O Requerente funda a sua argumentação quanto a este aspeto no seguinte:

“Do que fica dito permite-nos concluir que i) a Requerida está vinculada ao princípio da legalidade na sua atuação, e ii) as informações vinculativas e as orientações administrativas veiculadas sob a forma de circular da Autoridade Tributária não constituem disposições de valor legislativo que possam ser, única e exclusivamente, objeto e critério de fundamentação das decisões proferidas. Com efeito, ao fundamentar a sua decisão nas informações vinculativas e não na legislação aplicável ao caso concreto ou na jurisprudência dos Tribunais Superiores, a ora Requerida violou flagrantemente o princípio da legalidade, o que faz com que a Liquidação objeto do presente Pedido padeça de erro sobre os pressupostos de direito, devendo ser anulado também por estas razões, ao abrigo do disposto no artigo 163.º do CPA.”

28.           Não há dúvidas de que a Autoridade Tributária e Aduaneira está vinculada ao princípio da legalidade.

29.           Mas, no caso concreto, a sua violação, invocada pelo Requerente, tem por base o facto de se entender que a fundamentação do ato está limitada exclusivamente ao teor de informações genéricas e administrativas, quando as mesmas não constituem disposições de valor legislativo que possam ser, única e exclusivamente, objeto e critério de fundamentação das decisões proferidas.

30.           Mesmo que se considerasse como menos própria tal fundamentação, o que poderá não ser o caso, sempre se diga que o Tribunal considerou a fundamentação suficiente e não limitada a tais remissões, o que, desde que não utilizadas de modo exclusivo, são complemento válido da fundamentação do ato.

31.           Podemos, por isso concluir, que não estamos perante qualquer situação porventura violadora do princípio da legalidade, pelo que improcede o argumento invoca pelo Requerente.

 

E). A aquisição de dois imóveis e a Declaração de venda de apenas um.

32.           Como vem referido, a Requerida dá conta de que o Requerente adquiriu em 2017 um prédio misto e, aquando da venda em 2023, apenas declarou a parte correspondente à descrição predial urbana, sem fazer qualquer referência à parte rústica.

33.           Ou seja, o Requerente no dia 25 de janeiro de 2017, mediante escritura pública, pelo preço de € 475.000,00 (quatrocentos e setenta e cinco mil euros) adquiriu um prédio misto, com parte rústica e urbana, tendo a escritura imputado € 375.000,00 à parte urbana e € 100.000,00 à parte rústica (Cf. Docº. nº. 2), como é obrigatório por lei e nomeadamente para pagamento do correlativo IMT, já que o mesmo onera estas transmissões a taxas diferentes.

 

34.           E, no dia 4 de maio de 2023, o Requerente alienou o referido imóvel, através de escritura pública de compra e venda, pelo preço de € 1.170.000,00 (um milhão cento e setenta mil euros) (cfr. Documento n.º 4), tendo a escritura imputado € 895.000,00 à parte urbana e € 275.000,00 à parte rústica (Cf. Docº. nº. 4), como é obrigatório por lei e nomeadamente, como vimos, para pagamento do correlativo IMT.

35.           A própria Requerida não nos tira quaisquer outras consequências deste facto, a não ser na análise detalhada que faz de cada uma das faturas em causa colocando duas hipóteses, de a compra, por exemplo, de terra de jardim, se destinar à parte rústica ou à parte urbana do prédio misto.

36.           Ora, na Declaração Modelo 3 do IRS, o Requerente colocou como valor de aquisição € 475.000,00 e como valor de alienação € 1.170.000,00, nada ficando assim por declarar.

37.           Sabendo-se que o apuramento das mais-valias em sede de IRS se faz com referência a um saldo (Vd. nº. 1 do artº 43º. do CIRS), nenhuma outra consequência iremos daqui extrair para aferição da elegibilidade das despesas em causa no apuramento das mais-valias obtidas com a venda do património propriedade do Requerente que, como se sabe e consta da respetiva da escritura de venda, continuou a ser composto por um prédio misto com parte rústica e urbana.

38.           Acresce que, a natureza mista do imóvel, poderá ter estado na origem do lapso cometido no preenchimento da Declaração Modelo 3 do IRS, por parte do Requerente.

39.           Concluímos, assim, que relativamente a todas estas questões aqui levantadas, nada se encontra que possa levar o Tribunal a pôr em causa a legalidade da liquidação impugnada.

 

 

iii). Relativamente às despesas em concreto 

 

A). Conceito de despesas de valorização.

40.           Face a tudo o exposto, importa constatar que existe um grande fosse entre as partes na definição dos conceitos aqui utilizados, como na sua aplicação prática, bem como na leitura que cada uma das partes faz da jurisprudência e doutrina proferidas sobre a matéria.

41.           O Requerente valoriza jurisprudência que reconhece que a definição do conceito de encargos com a valorização dos bens deixa dúvidas de interpretação e concede uma razoável margem interpretativa quanto à amplitude do que deverá considera-se dentro de tal conceito, tanto mais que, do mesmo, o legislador não nos dá quaisquer pistas exemplificativas, como o faz  em muitas outras referencias normativas, nomeadamente nos códigos fiscais, mas não só..

42.           Por outro lado, entende também que o rendimento a tributar em sede de mais valias, deve ser um rendimento líquido, necessariamente correspondente à capacidade contributiva efetivamente adquirida, repercutindo-se positivamente no valor económico do imóvel, incrementando desse modo o respetivo preço de venda.

43.           Já se referiu, igualmente, que o Requerente cita alguma doutrina que se opõe à consideração do conceito de valorização, em que não estão incluídos os encargos que tenham por escopo a mera preservação do valor do bem, mas tão só os que se destinem a aumentar esse valor.

44.           Pelo que os autores citados, em contraposição dessa jurisprudência, apelam ao uso de uma formação aberta do conceito de valorização dos bens, remetendo para o respeito pelo princípio económico e técnico da tributação do rendimento, afastando-se duma interpretação exclusivamente jurídica deste conceito.

45.           Por seu turno, AT, em tudo se afastando deste conceito, assume uma posição absolutamente formalista, restrita à simples análise da prova documental, sem qualquer outro tipo de enquadramento económico, no que à contribuição das despesas efetuadas possa ter, no que à valorização dos bens alienados diga respeito.

46.           A aferição da dimensão desse fosso pode fazer-se pela simples constatação de que o Requerente entende que todas as despesas por si realizadas têm enquadramento no disposto no artº. 51º, do CIRS e, por seu turno, a Requerida entende que nenhuma dessas despesas contribui para a valorização do imóvel nos termos legais.

47.           E isto tudo, no que à posição da Requerida diz respeito, tendo por pano de fundo, mais de duas dezenas de fornecedores e mais de duas centenas de documentos….

48.           Ou seja, o Requerente entende que em nada claudicou no seu propósito, mesmo nas situações em que da fatura consta a entrega dos materiais numa morada em França, ou mesmo sem que delas conste o local de entrega dos materiais, nas situações em que os adiantamentos ou as faturas são anulados por notas de crédito ou mesmo quando de tais faturas não consta a identificação do adquirente, etc

49.           Por seu turno, para um imóvel comprado por € 475.000,00 em 2017 e vendido 6 anos depois por bem mais do que o dobro do preço (€ 1.170.000,00), a Requerida entende que das mais de 200 faturas apresentadas pelo Requerente, no valor total de € 269.342,77, nem uma única pode ser aceite para os pretendidos fins.

50.           Nesse caso, outros fatores externos terão sido os únicos responsáveis pela valorização do imóvel gerador de tamanha mais valia. O simples decurso do tempo, os famosos “ganhos trazidos pelo vento”, a especulação imobiliária, o boom turístico no Algarve, o regime do Visa Gold ou o regime do residente não habitual …, 

51.           Tudo, menos as despesas feitas no imóvel, independentemente do formalismo da documentação de suporte, que aliás não constitui o único meio de prova admitido.

52.           Consideramos que, face ao exposto, o Tribunal na sua decisão terá que encontrar um equilíbrio entre as duas posições, entre a mera análise formalista da prova documental produzida afastando qualquer outra de forma redutora, como o peso excessivo de um conceito de valorização económica, sem nos afastarmos da necessidade de encontrarmos encargos comprovadamente suportados pelo Requerente, que os houve, tendo como pano de fundo o seu enquadramento no disposto no artº. 51º. do CIRS.

53.           Também se diga que, do lado do Requerente, a extensa reportagem fotográfica junta aos autos, sem que se faça uma conexão direta entre cada uma das despesas e as respetivas fotografias, em pouco adianta ao Tribunal para aferir da contribuição de cada uma delas para a valorização do imóvel.

B). Venda de materiais separados da mão de obra.

54.           Foi referenciado que a AT não aceita que a compra de materiais efetuada separadamente da correlativa prestação de serviços para que os mesmos sejam incorporados o imóvel, concorra para a quantificação da valorização do imóvel aquando da sua venda.

55.           Contudo, temos que reconhecer que o bom senso nos recomenda alguma prudência na aplicação deste critério, porquanto não deixa de ser usual que os contribuintes adquiram os diversos materiais para incorporação e valorização de um prédio, com total autonomia em relação aos prestadores de serviços que os vão utilizar ou incorporar no imóvel.

C). Aquisição de um prédio inacabado e elegibilidade das despesas de construção.

56.           Por outro lado, vem anotado pelo Requerente que à data da compra, o imóvel não se encontrava concluído.

57.            Ou seja, o Requerente terá adquirido um imóvel em construção e não um imóvel acabado, com a emissão da respetiva licença de utilização e entrega da correspondente Declaração Modelo I do IMI.

58.           Parece entender-se, da posição da defendida pela Requerida, que a mesma não concorda com a consideração para os efeitos aqui em causa, das despesas efetuadas pelo Requerente que tenham a ver com o acabamento da construção em curso, considerando que tais despesas têm cobertura no disposto no nº. 3 do artº. 46º, do CIRS, ficando por isso fora do conceito de despesas com a valorização, aplicado pelo artº. 51º. do CIRS.

59.           Contudo, a Requerida não vai até às últimas consequências quanto a este argumento que utiliza, porquanto, não distingue em concreto, quantificando-as, as despesas que considera como sendo de construção, isolando-as das restantes, que assim seria consideradas como de valorização.

60.           Dito de outro modo, sem identificar as despesas que considera imputáveis à construção do imóvel a Requerida, muitas das vezes, parece não pôr em causa que se trate de efetivas despesas de valorização do mesmo, embora a maior parte delas ou quase todas, não possam ser aceites por falta de requisitos formais dos documentos apresentados, sem qualquer outro tipo de ponderação.

61.           Do mesmo modo que o legislador fiscal considerou que o valor de aquisição de um imóvel construído pelo próprio, seria o correspondente à soma do valor de aquisição do terreno e dos custos com a sua construção (Vd. nº. 3 do artº. 46º. do CIRS), nada nos impede de aceitar, ainda em sede de IRS, que as despesas que o Requerente suportou com os acabamentos do imóvel adquirido, possam vir a ser consideradas relevantes para efeitos da tributação em mais-valias da sua posterior venda e no contexto do disposto no artº. 51º. do CIRS.

62.           Mas, nem o próprio Requerente faz essa distinção, nem quantifica o respetivo valor, pretendendo considerar toda a despesa feita a título de valorização do imóvel em causa.

63.           Desse modo, o Tribunal não irá efetuar qualquer diferenciação das despesas efetuadas, todas elas sendo submetidas ao crivo da análise quanto à sua contribuição efetiva para a valorização do imóvel alienado, naturalmente em função da prova efetuada, cabendo tal ónus ao Requerente.

D). Obrigatoriedade da apresentação de comprovativos do pagamento do preço dos bens e serviços adquiridos para valorização do imóvel.

64.           A Requerida impõe como requisito essencial para a consideração dos valores objeto de faturação das obras em causa, que o Requerente tivesse exibido prova documental de que as mesmas tinham sido objeto de pagamento.

65.           Trata-se de uma questão importante, porquanto a Requerida utiliza este argumento em variadíssimas situações, e nomeadamente sempre que para a exclusão da despesa não encontra melhor argumento.

66.           Vejamos o que diz a lei:

Artigo 51.º Despesas e encargos 

1 - Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:

 a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º” (sublinhada nosso).

67.           E a Requerida, depois de discorrer acerca da quitação, conclui que:

“Pelo que a simples junção de cópias de faturas não basta para comprovar - requisito exigido pela al. a) do nº 1 do art. 51º do CIRS - a existência de custos relativos a encargos suportados com a valorização do prédio misto supra identificado.”

68.           Face ao exposto, podemos referir que para que estejamos perante um custo, como refere a Requerida, não é necessário que o pagamento do mesmo esteja comprovado.

69.           Por outro lado, se relativamente aos encargos com a valorização do imóvel, a lei refere que são aceites aqueles que tiverem sido “comprovadamente realizados nos últimos 12 anos”, mas 

70.           já quanto à indemnização pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º do CIRS, a lei já refere “comprovadamente paga”, podendo concluir-se, neste caso, que o pagamento é condição indispensável exigida por lei para a elegibilidade da despesa com tais indemnizações.

71.           Caso o legislador pretendesse que a exigência de pagamento fosse extensiva a todos os encargos, teria expresso essa sua vontade de outro modo, nomeadamente alargando essa exigência a todos as situações previstas nessa alínea do artº. 51º. do CIRS e não a limitando às indemnizações.

72.           Concluímos, por isso, que para estes efeitos, no que aos encargos com a valorização do imóvel diz respeito, basta que que os mesmos tenham sido comprovadamente realizados.

73.           E, nesse caso, funcionará qualquer meio de prova, nomeadamente documental, testemunhal e pericial.

74.           De entre a prova documental suscetível de comprovar o encargo, sempre se poderá acrescentar os comprovativos do respetivo pagamento, mas os mesmos nunca serão só por si suficientes, se não se comprovar também que, embora pagos, os bens em causa foram incorporados no imóvel a que se destinavam tendo em vista a sua valorização.

75.           Tanto mais que, ditam as regras de bom senso, caso o Requerente não tivesse procedido ao pagamento dos materiais e dos serviços em causa, o mais provável seria que nem os materiais tivessem sido entregues nem os serviços prestados, e mesmo que assim não fosse, sempre os diversos fornecedores e prestadores de serviços teriam oportunidade de demandar judicialmente o Requerente em prol do pagamento do que lhes era devido, servindo naturalmente o imóvel em causa como bem suscetível de penhora em caso de persistência da ausência dos respetivos pagamentos – o que admitimos possa não ter ocorrido, nomeadamente face à ausência de qualquer referência a ónus e encargos na escritura de venda (Vd. Doc nº. 4).

76.           Por outro lado, reproduzindo a jurisprudência a invocada pela Requerida, não podemos chegar à mesma conclusão. Senão vejamos:

“Por outro lado, entende o STA, conforme jurisprudência vertida no Acórdão proferido em 11-10- 2018 no âmbito do processo que ali correu termos sob o nº 02773/11.6BEPRT 0501/18, que: “Deve considerar-se que existiu pagamento efetivo da despesa cuja elegibilidade é questionada, se a mesma se mostrar comprovada pela emissão, no período elegível, da respetiva fatura, do cheque para pagamento da mesma e do correspondente recibo de quitação.” 

77.           Pelo que aqui se refere, conseguimos concluir sobre os requisitos que se torna necessário dar por verificados para que se considerar que exista efetivo pagamento, mas, nada aqui se diz sobre a obrigatoriedade de apresentação de comprovativo do pagamento para os encargos referenciados no artº. 51º. do CIRS serem fiscalmente relevantes.

78.           E, mais adiante, continua o acórdão citado pela Requerida:

 “Por outro lado, quando a lei exige ainda que essa despesa para além de realizada esteja “paga” quer dizer que a respetiva obrigação esteja cumprida. Como o cumprimento se presume com a quitação (art. 786º, 1, do C. Civil), a prova do cumprimento da obrigação é feita através do recibo de quitação. Daí que para efeitos contabilísticos a despesa seja justificada com dois documentos: a fatura e o recibo ou documento de quitação. A nosso ver, para efeitos de elegibilidade da despesa é quanto basta: que a despesa tenha ocorrido no período elegível e nesse período o credor tenha emitido o recibo de quitação.”

79.           Também aqui apenas se refere que, quando se exige que a despesa, para além de “realizada” esteja “paga”, a prova poderá ser feita por intermedio da exibição do respetivo documento de quitação. Mas do mesmo modo, também aqui nada se diz sobre a obrigatoriedade de apresentação de comprovativo do pagamento para os encargos referenciados no artº. 51º. do CIRS.

80.           Razão pela qual o Tribunal não pode consentir na conclusão que foi daqui retirada pela Requerida, e que é a seguinte:

“Pelo que se conclui que era ao ora Requerente que competia efetuar a prova cabal e inequívoca que os valores constantes das faturas cujas cópias anexou ao requerimento tramitado em 14.05.2025 foi efetivamente pago às entidades que as emitiram.”

E). Exigência de que as faturas obedeçam aos requisitos previstos no nº. 5 do artigo 36º. do Código do IVA. 

81.           Do mesmo modo, também não concordamos com a exigência imposta pela Requerida para aceitação dos encargos em causa, quando defende que os mesmos, para além de terem que estar suportados em faturas, devem as mesmas exibir os requisitos previstos no nº. 5 do artº. 36º. do CIVA.

82.           Importa considerar que, nestas circunstâncias, a fatura é um de muitos outros elementos em causa suscetível de conduzir à prova dos encargos realizados, sem que resulte do Código do IRS a exigência formal de que a fatura deve obedecer aos mesmos requisitos dos que se encontram previstos para a sua validação em termos do Código do IVA.

F). Aquisição de eletrodomésticos, árvores, flores e plantas.

83.           Quanto a estas aquisições, a entidade Requerida entendo que as mesmas não devem ser consideradas para os efeitos pretendidos, atendendo a que estamos perante a aquisição de bens que não passam a fazer parte integrante do imóvel podendo dele ser destacados, socorrendo-se para o efeito de diversas decisões arbitrais. A saber:

Ponto 3 do sumário da decisão proferida pelo CAAD no âmbito do processo que nele correu termos sob o nº 407/2023-T (árbitro Dra. Elisabete Flora Cardoso), pode ler-se:

“3 – Não podem ser consideradas para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS as despesas suportadas com elementos autonomizáveis que não passam a fazer parte integrante do imóvel (eg. as despesas com eletrodomésticos encastráveis e com árvores e plantas decorativas).”

84.           Quanto a este aspeto, nomeadamente face à citada jurisprudência, entendemos que assiste razão à Requerida, não podendo tais despesas ser aceites para estes efeitos.

 

G). Despesas de manutenção.

85.           No mesmo sentido do atrás defendido, a que se acrescentam as despesas de manutenção, a Requerida invoca:

O sumário do proc. tramitado no CAAD sob o nº 802/2022-T, decidido em 17- 08-2023 pelo árbitro Dr. André Festas da Silva pode ler-se:

“Deverão ser considerados como abrangidos pela previsão do art. 51º, nº 1, al. a) do CIRS os encargos efetivamente suportados que sejam suscetíveis de valorizar economicamente o bem alienado, excluindo-se as simples despesas de manutenção e conservação, elementos decorativos autónomos e destacáveis do imóvel ou eletrodomésticos.”

86.           Efetivamente, imporá recordar que as despesas de conservação e manutenção, têm um tratamento autónomo em sede de IRS, nomeadamente quando são consideradas como gastos para apuramento dos rendimentos prediais na Categoria F, nos termos do disposto no artº. 41º do respetivo Código.

87.           Razão pela qual devem ser afastadas do âmbito de aplicação do artº. 51º. do CIRS, assim garantindo uma certa harmonia no sistema. 

H). Relevância das notas de crédito.

88.           Conforme resulta das mais elementares regras contabilísticas, nunca poderão relevar para este efeito, o valor constante das faturas que posteriormente tenham sido alvo da respetiva emissão da nota de crédito a favor do Requerente, situação que não corresponde a qualquer encargo por ele efetivamente suportado.

89.           Abordados os critérios de aferição da aceitação destes encargos suportados para efeito de valorização do imóvel, tendo em vista o apuramento da mais-valia realizada com a sua venda, pode o Tribunal agora proceder à sua aplicação perante cada uma dessas despesas em concreto.

90.           Procederemos a essa análise, fornecedor a fornecedor.

A). Faturas emitidas por:

-B..., NIF..., de € 8 850.00

-C..., NIF..., de € 11 950,00. 

-D..., NIF..., de € 14 462.50.

Referentes a: venda das plantas e/ou flores e atividade de manutenção de jardins.

Valor em causa: € 35 262.50.

91.           Face aos critérios enunciados o Tribunal não pode aceitar a relevância destas despesas, não tendo o Requerente apresentado prova da colocação destes bens no imóvel e atendendo igualmente à sua natureza completamente autonomizável em relação ao mesmo (vd. ponto 3 do sumário da decisão proferida pelo CAAD no Procº. nº 407/2023-T (árbitro Dra. Elisabete Flora Cardoso), e no sumário do proc. tramitado no CAAD sob o nº 802/2022-T, decidido em 17- 08-2023 pelo árbitro Dr. André Festas da Silva pode ler-se: “Deverão ser considerados como abrangidos pela previsão do art. 51º, nº 1, al. a) do CIRS os encargos efetivamente suportados que sejam suscetíveis de valorizar economicamente o bem alienado, excluindo-se as simples despesas de manutenção e conservação, elementos decorativos autónomos e destacáveis do imóvel ou eletrodomésticos.””

92.           Concordamos, por isso, com a entidade Requerida quando conclui que:

“Por conseguinte, as faturas-recibo emitidas pelos três senhores acima indicados, relativamente ao exercício das atividades de venda de flores, plantas, sementes e fertilizantes e de plantação e manutenção de jardins (o Sr. D... só por esta última) são insuscetíveis, pelos motivos acabados de indicar, de poder ser consideradas para os efeitos previstos na al. a) do nº 1 do art.º 51.º do CIRS.”

B). 7 Faturas emitidas por:

E..., NIF...;

Referentes a: exercício da atividade de remodelações e construções.

Valor em causa: € 50 122,50

93.           Sendo que a única razão apontada pela Requerida para a não aceitação destas despesas, tem a  ver com a inexistência de recibo ou qualquer outro comprovativo do pagamento das quantias em causa, e atendendo a que as mesmas se referem a uma prestação de serviços de remodelação e construção, sendo as mesmas realizadas no imóvel objeto de alienação, devem ser aceites como elemento de valorização do imóvel vendido.

94.           Esta conclusão também resulta do facto do Requerente não possuir outra habitação à qual essa despesa pudesse ser imputada e que a valorização do imóvel é evidente face à comparação entre o valor de compra e de venda e que a mesma não teria sido possível, ou pelo menos dessa dimensão se este tipo de despesas não tivessem sido realizadas.

95.           Razão pela qual aceitamos a despesa no montante de € 50 122,50.

 

C). 3 Faturas, 1 fatura anulada, 2 recibos e uma nota de crédito emitidas por:

F..., Lda., NIF.... 

Referentes a:  aquisição de uma lareira, respetivo vidro e cobertura, dois chapéus e respetivas bases, cadeirões e almofadas.

Valor em causa: € 8 725,70 (sem a fatura anulada: € 5 396,6)

Fatura nº. 457 emitida em 15.7.2019, no valor de € 3.329,10, com respetivo recibo nº 160/2019. 

Fatura nº. 525 emitida em 14.8.2019, no valor de € 1.017,50, com respetivo recibo nº 184/2019.

Fatura nº. 323 de 24.6.2019 e respetiva Nota de Crédito, no valor de € 1.050,00;

Fatura nº. 455 emitida em 15.7.2019, no valor de € 3.329,10, anulada.

96.           Para além das faturas que foram anuladas pela emissão das respetivas notas de crédito, que naturalmente não podem ser consideradas por não corresponderem a um encargo efetivo, o valor eventualmente sobrante, se o houver, diz respeito à aquisição de uma lareira, que face à posição defendida para a generalidades das despesas que dizem respeito aos bens autonomizáveis, não podem ser aceites para os fins pretendidos. 

 

D). Três transferências bancárias a favor de Y..., no valor de € 6.039.30.

97.           O Tribunal concorda com a posição defendida pala Requerida, porquanto nesta situação, não foram apresentados elementos relativos à operação comercial que terá estado na base da realização destas transferências, pelo que não é possível saber a que aquisições de bens ou prestação de serviços as mesmas se reportam, onde e quando tais aquisições ou prestações terão tido lugar.

 

E). 4 Faturas emitidas por G..., de H..., NIF ....

Relativas a fornecimento de bens, com indicação da montagem de apenas 1.

Valor em causa: € 28 934,72.

98.           O Tribunal não acolhe em absoluta a tese de que a venda de materiais sem a mão de obra, não deve ser aceite, mas como, neste caso, a AT dá por adquirido que um dos bens foi montado, não há razões para suspeitar que os restantes não o tenham sido, sabendo-se que se trata de ar condicionado, tendo o mesmo contribuído para a valorização do imóvel, não sendo muito habitual a sua remoção em caso de venda da propriedade.

99.           Razão pela qual aceitamos a despesa no montante de € 28 934,72.

 

F). Três faturas-recibo e duas faturas simplificadas emitidas por I..., Lda., NIF... .

Referentes a aquisição de árvores de fruto

Valor em causa: € 837,13.

100.          Esta despesa não é aceite pelas razões já invocadas na Decisão proferida acima na análise da alínea A).

 

G). Duas faturas-recibo e duas faturas emitidas por J..., Unipessoal, Lda.

Referente a artigos de mobiliário doméstico e ortopédicos

No valor de: € 5 334, 00.

101.        Uma destas faturas - referência VD 2017/C513, datada de 21-06-2017 - foi emitida a “zeros”, pelo que não pode ser aceite para os efeitos pretendidos pelo Requerente. 

102.        Por seu turno, as duas faturas-recibo, reportam-se a adiantamentos (não especificando de que operação económica, qual a respetiva data e envolvendo que bens, artigos e/ou serviços) e, bem assim, a colchões e espreguiçadeiras “Escandinavia” a que se aplica a doutrina dos bens autonomizáveis, pelo que não pode ser aceite para os fins pretendidos.

103.        Este tipo de despesas em nada contribui para a valorização do imóvel, tanto mais que na sequência da venda do mesmo, tais bens podem perfeitamente ser removidos e acompanhar os respetivos proprietários para outra habitação. E não consta do processo que o imóvel tenha sido vendido com o respetivo recheio. Razões pelas quais esta despesa também não pode ser aceite.

 

H). Cinco faturas-recibo emitidas por K..., S.A., NIF... .

Referentes a: aquisição de diferentes tintas, rolos, trinchas e fitas.

No valor de: € 1 402, 22.

104.         O Tribunal não encontra forte sustentação da parte da Requerida para a não aceitação desta despesa, sendo de admitir que a utilização de tinta, tem como pressuposto a valorização do bem aquando da sua venda, constituindo um elemento importante na análise da sua atratividade por parte do potencial comprador.

105.        Razão pela qual aceitamos a despesa no montante de € 1 402, 22

 

I). Fatura emitida por L..., Lda., NIF ... em 21-10-2017 sob o nº 2017/75

Referente a: aquisição de um tubo, com elevador para cobertura e suporte de toalhas.

No valor de: € 7 000,00.

106.        Esta despesa não é aceite pelas razões já invocadas na Decisão proferida acima na análise da alínea A).

 

J). Três faturas emitidas por M..., Lda., NIF ... .

Referentes a: aquisição de vários tipos de bens, a saber: Tubos, trincha, cola, vaselina, diluente, etc.

No valor de: € 375,51.

107.        O Tribunal tem que admitir, pelas regras de bom senso,  que este tipo de despesas é usual nas obras de construção e valorização dos imóveis e como tal entendemos que deve ser aceite, sendo que a sua não aceitação por parte da AT tem por base o fato das mesmas titularem a aquisição de bens separada da mão-de-obra necessária para a respetiva integração na obra (produto final), não surgem acompanhadas de qualquer recibo ou outro elemento demonstrativo do efetivo pagamento das quantias nelas mencionada, o que já admitimos como critérios insuficientes para o seu afastamento  do âmbito das pretensões do Requerente.

108.        Razão pela qual aceitamos a despesa no montante de € 375,51.

 

K). Quatro documentos emitidos por N..., Lda., NIF... .

Referentes a: aquisição de lâmpadas led suspensas

Orçamento A02/95 no valor de € 9 796.95 (referente à Fatura A02/196), Fatura A02/196 no valor de: € 9 796.95, Fatura/Recibo A02/28 no valor de € 4 898,48 (Relativo a Adiantamento do orçamento A02/95) e Nota de Crédito A02/51 no valor de € 4 898,48.

Valor em causa: € 9 796,95. 

109.        Do conjunto de documentos emitidos (fatura/recibo, nota de crédito e orçamento) resultam diversas consequências.

110.        A nota de crédito NC A02/51, emitida pelo valor de € 4.898,48 reporta-se à fatura-recibo ADI 02/28, de ambas constando o mesmo montante, sendo que funcionam como contrapartida entre si, pelo que se não irá contabilizar o valor em ambas referido (€ 4.898,48) para efeitos do disposto na al. a) do nº 1 do art.º 51º do CIRS.

111.        Neste aspeto o Tribunal não pode deixar de concordar com a entidade Requerida, porquanto não resulta qualquer encargo para o Requerente, visto que a fatura foi anulada pela emissão da nota de crédito.

112.        Mas, já quanto à a fatura A02/196 emitida em 27-06-2019, da qual consta reportar-se ao orçamento A02/95, orçamento esse que surge titulado no documento com a referência ORC A02/95, datado de 16-05-2019, temos que dar a despesa como aceite, porquanto não podemos aderir à tese de qua a validade do orçamento foi ultrapassada e como tal a despesa da aquisição de lâmpadas não pode ser aceite.

113.        Pelo que aceitamos a despesa da fatura Fatura/Recibo A02/28 no valor de € 4.898,48 (que corresponde a metade do valor orçamentado, no montante do Orçamento A02/95 no valor de € 9 796.95) e não aceitamos a despesa por inexistente com a outra fatura por ter sido emitida uma nota de crédito NC A02/51, pelo mesmo valor de € 4.898,48 

114.        Razão pela qual apenas aceitamos a despesa no montante de € 4.898,48.

L). Um orçamento, uma fatura-recibo (emitida em 14-02-2017 sob a referência FR001.0170020) e uma fatura (data da de 15-03-2017, com a referência FT001.010170052) emitidas por Q..., Lda., NIF ... e um comprovativo de Transferência bancária a favor de Q..., Lda. no valor de  5.450.00. 

Referente a: eletrodomésticos.

Valor em causa € 5.450, 00. 

115.         A despesa com a aquisição de eletrodomésticos, pelas razões já atrás invocadas, não tem acolhimento no âmbito da interpretação e aplicação do disposto no artº. 51º. do CIRS, o que é jurisprudencialmente suportado, em nada contribuindo para a valorização do imóvel, sendo bastas vezes removido aquando da sua venda.

 

M). Um orçamento e uma fatura emitidos por P..., Lda., NIF ... 

Referente a: aquisição de saicos de madeira.

No valor de € 66.20.

116.        Trata-se da aquisição de saicos para madeira, que consiste num impregnante, utilizado para proteção das madeiras, não se vislumbrando em que medida a mesma pode contribuir para a valorização do imóvel alienado.

 

N). Quatro faturas no valor de € 529,76, € 352.89, € 228.00 e € 691,84 euros e Notas de Crédito no valor de € 529.76, € 352.89 e € 177.97 emitidos por Q..., S. A., NIF... . 

Referentes a: aquisição de varões, suporte de parede, tampão, cavalete, nível, apliques, espelho, pasta, torneiras, chuveiro, etc.

117.        As faturas aqui em causa deram lugar à emissão de outras tantas notas de crédito, que praticamente anulam o valor faturado, não possuindo os documentos em causa qualquer indicação quanto à identidade do adquirente, razão pela qual não podem ser aceites para o fim pretendido.

 

O). Catorze faturas simplificadas emitidas por R..., C. R. L.., NIF....

Referentes a: aquisição de varas, luvas, telas, fio, fita isoladora, rede, grampos, cabos para enxada, casquilho, etc.

No valor de € 1 329,63. 

118.         Neste particular, o Tribunal adere à posição defendida pela Requerida, porquanto a natureza dos bens em causa (luvas ou de cabos para enxada), enquanto bens móveis autonomizáveis, as afasta da possibilidade de valorização específica de qualquer bem imóvel.

 

P). Sete faturas e doze faturas simplificadas emitidas por S..., Lda., NIF... . 

Referentes a: aquisição de bens tubos, tampões, uniões, luvas, fitas (de teflon e isoladora), válvula, abraçadeira, tomadas de carga, pilha, casquilho, torneira, etc.

Tela, pregos, válvulas, uniões, tampões, abraçadeiras, rolha, caixas, tubos, estaca, fio, torneira, pilha, fitas, luva, casquilho, etc. 

No valor de € 2 001,35.

119.        Uma vez mais, estamos perante faturas referentes a aquisições de bens autonomizáveis, suscetíveis de utilização por terceiros, desenquadrados com o imóvel de que se pretende que sejam valorização e como tal não podem ser aceitas, isto, nalgumas delas, para além da ausência de identificação do adquirente e de não se mostrarem muito legíveis noutras.

 

Q). Oito faturas e cinco Recebimentos emitidos por T..., Lda., NIF... .

Referentes a: “arranjos exteriores”.

No valor de € 39 342,2. 

120.        Efetivamente, da análise da documentação junta, referente a “arranjos exteriores”, não resultam especificados o tipo de arranjos a que se referem, sendo de acompanhar a posição da Requerida que invoca em favor dessa desconsideração da despesa o ponto 2 do sumário da decisão proferida pelo CAAD em 21-06-2024 (árbitro Dr. José Sampaio e Nora) no processo com o nº 628/2023-T, onde se pode ler:

 “2. Não é suficiente para preencher tal ónus a simples junção de faturas ou recibos, que não descrevem as obras realizadas no prédio alienado, não sendo possível a demonstração de que as mesmas tenham valorizado a fração vendida.”

 

R). Duas faturas e sete faturas-recibo emitidas por U..., Unipessoal, Lda., NIF... .

Referentes a: serviços efetuados com recurso a mini-escavadora, utilização de um camião pequeno, aquisição de terra e pedra grossa.

No valor de € 5 812,7.

121.        Quanto a esta despesa, a Requerida entende que a simples menção a serviços de escavadora e utilização de camião, só por si, não especifica em que tarefas se traduziram os mesmos, nomeadamente não se refere o que se escavou e porquê, do mesmo modo que nada se diz sobre a razão pela qual foi necessário utilizar uma camião, posição à qual aderimos.

 

122.        Relativamente às faturas-recibo, uma - a nº 59, datada de 22-05-2019 - reporta-se à aquisição de uma planta ornamental, a qual não pode ser aceite, nomeadamente com base na jurisprudência do CAAD já referenciada, donde consta que:

“3 – Não podem ser consideradas para efeitos de aplicação do artigo 51.º do CIRS as despesas suportadas com elementos autonomizáveis que não passam a fazer parte integrante do imóvel (eg. as despesas com eletrodomésticos encastráveis e com árvores e plantas decorativas).” (Vd. Acórdão do CAAD no Procº. nº. 407/2023)

123.        O mesmo raciocínio se aplica à fatura-recibo emitida em 10-10-2019, sob o nº 107, porquanto esta reporta-se à aquisição de um bem (casca de pinho).

124.        As restantes quatro-faturas recibo anexas pelo requerente emitidas U..., Unipessoal, Lda reportam-se à aquisição de terra para jardim, que em nada contribuindo para a valorização do prédio urbano, a respetiva despesa com a sua aquisição não pode ser considerada ao abrigo da previsão constante da al. a) do nº 1 do art.º 51º do CIRS. 

 

S). Uma fatura emitida por V...; Lda., NIF..., emitida em 09-08-2019 sob o nº 2019/135. 

Referente a: aquisição de uma porta, um móvel de cozinha e uma cobertura.

No valor de € 13.072,44. 

125.         Tratando-se de bens necessários para equipar uma habitação, sem cuja existência a mesma perde a sua completa funcionalidade, de acordo com um princípio de valorização mais económica dos bens imóveis, esta despesa é de aceitar para os fins pretendidos.

126.        Razão pela qual aceitamos a despesa no montante de € 13.072,44. 

 

T). Duas faturas emitidas por W..., Unipessoal, Lda., NIF ... em 11-03-2019 e 13-07-2019 sob os números 1 1/4 e 1 1/192, respetivamente;

Referentes a: “serviços de eletricidade”. 

No valor de € 4 797,01.

127.        Nesta situação, a impossibilidade da Requerida para qualificar a despesa para os efeitos pretendidos, resulta do facto da fatura não descrever que serviços foram prestados, pelo que se torna impossível apurar se aqueles contribuíram ou não para a valorização do imóvel onde foram prestados.

128.         Por seu turno, se tais serviços se destinaram a reparações ou manutenção do sistema elétrico do imóvel, a prestação de tais serviços não concorreu para a valorização daquele, porque a despesas de conservação e manutenção do imóvel, estão excluídas da previsão do artº. 51º, nº 1, al. a) do CIRS. (Vd. decisão proferida no CAAD no processo nº 802/2022-T).

129.        Por outro lado, a fatura emitida em 11-03-2019 não indica o local da prestação de serviços, nem a morada do cliente, sendo que se não se sabe quais os serviços prestados, nem se fica também a saber onde aqueles foram prestados.

130.        Também a fatura emitida 13-07-2021, para além de não indicar o local de prestação dos serviços, apresenta uma morada de cliente sita no estrangeiro – concretamente, em França.

131.        Razão pela qual estas despesas não podem ser aceites, reconhecendo como válidos os argumentos apresentados pela Requerida.

 

U). Vinte e uma faturas-recibo emitidas por X..., Lda., NIF ... no período compreendido entre 11-04-2018 e 08-11-2019;

Referentes a:  aquisição de árvores e plantas, a saber: Jacarandás, oliveiras, choupos, sobreiros, alfarrobeiras, aceres, palmeiras, ciprestes e vários tipos de plantas de menor dimensão, como sálvia, aloe vera, buganvíleas, lavanda, murta, tomilho, alecrim, diferentes variedades de arbustos, etc.

No valor de € 24 640,36.

132.        Nesta situação, a morada que consta das faturas é em França, e em doze daquelas faturas consta situar-se o local de descarga dos bens nelas mencionados nessa mesma morada (sita em França), pelo que em circunstância alguma esta despesa poderia vir a ser aceite, atenta também a sua natureza, como analisado anteriormente.

133.        Esta é a conclusão a que Tribunal chega relativamente a cada uma das despesas apresentadas, o que se pode resumir no seguinte quadro:

Alínea

Fornecedores

Valores

Valor aceite pelo Tribunal

(A)

B...  (...)

€ 8 850,00

NÃO ACEITE

(A)

C... (...)

€ 11 950,00

NÃO ACEITE

(A)

D... (...)

€ 14 462.50

NÃO ACEITE

(B)

E... (...)

€ 50 122,50

€ 50 122,50

(C)

F..., Lda. (...)

€ 8 725,70

NÃO ACEITE

(D)

Y...

€ 6039.30

NÃO ACEITE

(E)

G... (...)

€ 28 934,72

€ 28 934,72

(F)

I..., Lda. (...)

€ 837,13

NÃO ACEITE

(G)

J..., Unip., Lda.

€ 5 334, 00

NÃO ACEITE

(H)

K..., SA (...)

€ 1 402, 22

€ 1 402, 22

(I)

L..., Lda. (...)

€ 7 000,00

NÃO ACEITE

(J)

M... Lda. (...)

€ 375,51

€ 375,51

(K)

N... Lda. (...)

€ 9 796,95

€ 4.989,48 NÃO ACEITE

€ 4.989,48 ACEITE

 

(L)

Q..., Lda (...)

€ 5 450, 00

NÃO ACEITE

(M)

P..., Lda. (...)

€ 66.20

NÃO ACEITE

(N)

Q…, SA (…)

Faturas: € 1802,49;

Notas de Crédito: € 1060,62

NÃO ACEITE

(O)

R..., CRL (...)

€ 1 329,63

NÃO ACEITE

(P)

S..., Lda. (...)

€ 2 001,35

NÃO ACEITE

(Q)

T..., Lda. (...)

€ 39 342,2

NÃO ACEITE

(R)

U..., Unip., Lda. (...)

€ 5 812,7

NÃO ACEITE

(S)

V..., Lda. (...)

€ 13 072,44

€ 13 072,44

(T)

W..., Unip., Lda. (...)

€ 4 797,01

NÃO ACEITE

(U)

X... Lda. (...)

€ 24 640,36

NÃO ACEITE

 

134.         Assim, para um total de despesas corrigidas pela AT no montante de € 269.342,77, o Tribunal entende que cumprem os requisitos impostos pelo disposto no artº 51º. do CIRS encargos suportados pelo Requerente no montante de € 98.896.87, donde resulta que fica por aceitar o montante de € 170.445,90.

135.        Desse modo, o valor aceite corresponde a 36% (trinta e seis por cento) do valor total das correções, enquanto que o valor não aceite corresponde a 64% (sessenta e quatro por cento) desse mesmo valor, o que importa ponderar em sede de distribuição do encargo com a taxa arbitral.

 

VII – DOS JUROS COMPENSATÓRIOS

1.             Quanto a este aspeto, importa salientar que, à semelhança do que se decidiu para a liquidação do imposto, o Tribunal entende estar também a liquidação de juros compensatórios devidamente fundamentada, razões não havendo para a sua anulação por esse motivo.

2.             Outrossim, os juros serão anulados e devidamente quantificados em sede de execução de sentença na parte em que o Requerente obteve ganho de causa, por anulação das correções efetuadas pela AT, devendo ser mantidos proporcionalmente quanto à restante parte.

 

VIII – DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS

1.              Como se sabe, determina o artigo 24.º, n.º 5 do RJAT que:

 “É devido o pagamento de juros indemnizatórios, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.

2.               Por seu turno, a LGT estipula como regra no artigo 43.º que:

 “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” (n.º 1) e que “A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios” (n.º 4).

3.              Por seu turno, invoca o Requerente com razão que o pagamento de juros indemnizatórios ao contribuinte que pagou indevidamente uma prestação tributária está compreendido no dever de reconstituição do statu quo ante que nasce para a Administração Tributária em resultado de uma decisão administrativa, judicial ou arbitral anulatória do ato tributário de liquidação.

4.              Considera-se ainda que o artigo 100.º da LGT, em moldes semelhantes ao artigo 24.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, dispõe que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.

5.               Contudo, no caso concreto, não ficou demonstrado que houve lugar ao pagamento do imposto cuja anulação o Requerente aqui solicita, porquanto o Docº. 8 que se protestou juntar aquando do PPA e que daria a prova dessa realidade não chegou a ser junto aos autos pelo Requerente 

6.              Mas não havendo dúvidas que uma parte da prestação tributária em causa,  cuja existência se deve exclusivamente a uma incorreta aplicação do quadro legal por parte dos serviços da Autoridade Tributária, nos termos da legislação supra referida, tem o Requerente direito ao pagamento de juros indemnizatórios, calculados em sede de execução de sentença e provado que fique o pagamento do imposto e juros compensatórios aqui em causa, desde a data do efetivo pagamento pelo sujeito passivo, até à data da emissão da respetiva nota de crédito, calculados os mesmos à taxa de juros prevista no artº. 61.º, n.º 5 do CPPT, ex vi do artigo 24.º, n.º 5 do RJAT. 

 

IX – DECISÃO

1.             Nestes moldes o Tribunal conclui pela tempestividade da apresentação do PPA, pela inexistência de vício de fundamentação, quer do ato de liquidação do imposto, quer do ato de liquidação dos juros compensatórios, pela inexistência de fundamentação à posteriori e pela inexistência de qualquer vício de violação do princípio da legalidade, pelo que por estas razões o ato tributário em causa seria de manter.

2.             Contudo, pelas razões expostas, e que resulta da análise dos diversos encargos suportados pelo contribuinte com a valorização do imóvel alienado, o Tribunal reconhece a ilegalidade de parte da liquidação do imposto, por violação do disposto no artº. 51º. do CIRS, que quantifica no montante de € 98.896.87, que corresponde a 36% da totalidade as despesas corrigidas pela Autoridade Tributária.

3.             Em sede de execução de sentença será calculado e devolvido o imposto e juros compensatórios, desde que provado o seu pagamento pelo contribuinte, tendo o mesmo direito ao recebimento de juros indemnizatórios, nos termos expostos.

4.             Razão pela qual o presente Tribunal Coletivo decide:

 

a). Considerar o pedido e pronuncia arbitral parcialmente procedente e anular parcialmente a liquidação do imposto e juros compensatórios.

b). Condenar a AT ao pagamento de juros indemnizatórios relativamente ao valor de imposto a devolver, nos termos e taxa referenciadas, em sede execução de sentença e desde que comprovado o efetivo pagamento do imposto e respetivos juros compensatórios.

 

X. VALOR DOO PROCESSO

Fixa-se o valor do processo em € 70.511,91 (setenta mil quinhentos e onze mil e noventa e nove cêntimos) nos termos artigo 97.º-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, porquanto o mesmo corresponde ao valor das correções á matéria coletável do IRC que estão em causa e foi aceite pelas partes.

 

XI. CUSTAS

Custas a cargo da Requerida na proporção de 36% no montante de € 881,28 (oitocentos e oitenta e um euros e vinte e oito cêntimos) e de 64% a cargo do Requerente, no montante de € 1.566,72 (mil quinhentos e sessenta e seis euros e setenta e dois cêntimos), de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do RJAT, do artigo 4.º do RCPAT, e da Tabela I anexa a este último.

 

Notifique-se.

Lisboa, 26 de novembro de 2025

 

***

O Tribunal Arbitral Coletivo

 

 

 

(Juiz José Poças Falcão)

 

 

 

(Drª. Rita Guerra Alves)

 

 

 

(Jorge Carita)

Relator