SUMÁRIO
I. A norma do n.º 1 do artigo 3.º do RJAT é uma norma de competência dos Tribunais arbitrais.
II. Onde não estejam preenchidos os seus requisitos, a cumulação de pedidos é inadmissível.
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
1. No dia 7 de Janeiro de 2025, A..., S.A, com o NIF ... e sede social na ..., n.º..., ..., ...-..., ... (Requerente), apresentou requerimento de constituição de tribunal arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), e 10.º, n.º 1, al. a), e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT).
2. Pretendia “a declaração de ilegalidade e consequente anulação do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º ...2024..., bem como e em termos finais, a declaração de ilegalidade e anulação dos seguintes atos tributários em sede de IVA:
1. liquidação adicional n.º 2024 ... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024 ..., ambas referentes ao período 202001, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024... e n.º 2024..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, €2.668,00 e €389,74;
2. liquidação adicional n.º 2024 ... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024..., ambas referentes ao período 202002, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024... e n.º 2024..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, €2.667,99 e €389,73;
3. liquidação adicional n.º 2024... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024..., ambas referentes ao período 202003, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024 ... e n.º 2024..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, €46.829,80 e €6.748,62.
4. liquidação adicional n.º 2024... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024 ..., ambas referentes ao período 202004, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024 ... e n.º 2024 ..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, €2.070,00 e €291,95;
5. liquidação adicional n.º 2024... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024..., ambas referentes ao período 202005, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024... e n.º 2024..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, € 47.108,21 e € 6.520,29;
6. liquidação adicional n.º 2024 ... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024..., ambas referentes ao período 202006, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024 ... e n.º 2024..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, respetivamente, €9.798,00 e € 1.318,56;
7. liquidação adicional n.º 2024..., referente ao período 202007, e correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2024..., onde não se apurou qualquer montante a pagar.
8. liquidação adicional n.º 2024..., referente ao período 202008, e correspondente demonstração de acerto de conta n.º 2024..., onde não se apurou qualquer montante a pagar.
9. liquidação adicional n.º 2024... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024..., ambas referentes ao período 202009, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024 ... e n.º 2024 ..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, € 45.231,32 e €5.650,81;
10. liquidação adicional n.º 2024 ... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024 ..., ambas referentes ao período 202010, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024 ... e n.º 2024 ..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, €2.898,00 e € 351,56;
11. liquidação adicional n.º 2024 ... e demonstração de acerto de contas n.º 2024..., ambas referentes ao período 202011, onde não se apurou qualquer montante a pagar.
12. liquidação adicional n.º 2024... e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2024..., ambas referentes ao período 202012, e correspondentes demonstrações de acertos de contas, associadas às compensações n.º 2024 ... e n.º 2024..., através das quais foi apurado imposto a pagar no montante de, respetivamente, € 7.866,00 e € 894,78.”.
3. Nomeado os árbitros que constituem o presente Tribunal, tendo estes aceite a designação no prazo aplicável e não tendo a Requerente, nem a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT ou Requerida), suscitado qualquer objecção, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 17 de Março de 2025.
4. Seguindo-se os normais trâmites, em 6 de Maio de 2025 a AT apresentou resposta.
5. Em 26 de Maio de 2025 foi marcada a reunião do artigo 18.º do RJAT.
6. Em 25 de Junho de 2025, a AT juntou o processo administrativo (PA).
7. Em 26 de Junho de 2025 teve lugar a reunião referida em 5., em que foram prestadas declarações de parte, inquiridas as testemunhas apresentadas pela Requerente, e, entre o mais, fixado prazo para alegações, conforme acta junta aos autos e gravação da audiência.
8. Em 15 de Julho de 2025, Requerente e Requerida apresentaram alegações.
9. Em 14 de Setembro, depois de obtido o consenso do Colectivo, foi proferido o seguinte despacho, notificado no dia seguinte:
“1. Por imprevidência no momento do diagnóstico precoce, só em 31 de Julho é que o Relator se deparou com omissões no processo e concluiu que, improcedendo a invocada “inexistência” jurídica do RIT e, ou, a violação do princípio do inquisitório, que poderiam unificar o tratamento a conferir aos diferentes pedidos formulados pela Requerente, estes não preenchem os requisitos para a sua cumulação tal como estabelecidos no n.º 1 do artigo 3.º do RJAT (como se decidiu, designadamente, nos processos n.os 708/2022-T e 1062/2024-T);
2. Assim, uma vez que as férias desfasadas dos diferentes membros do colectivo impossibilitaram a formação mais atempada de uma maioria, só agora se pode determinar que – como as questões referentes à suposta dedução indevida do IVA por “irregularidades no plano formal, associadas ao incumprimento do artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do Código do IVA” (Secção A. Do Direito à Dedução do PPA, §§ 90 a 141 do PPA) e “por não ter sido respeitada a regra de inversão do sujeito passivo” (Secção A. Do Direito à Dedução, §§ 142 a 151 do PPA) não implicam “essencialmente (…)a apreciação das mesmas circunstâncias de facto e (…) a interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito”, tal como as não implicam as questões decorrentes “Da Falta de Liquidação de Imposto: Certificado de Saída para o Fornecedor Nacional” (Secção B do PPA, §§ 156 a 187 do PPA) – o Tribunal Arbitral não tem competência para apreciar tal cumulação de pedidos, pelo que cuidará apenas deste último, por ser o único que cabe dentro da sua competência em razão do valor.
3. Adicionalmente determina-se o seguinte, a ser cumprido no prazo de 10 dias:
a. Como o documento 4 do Processo Administrativo (PA) é constituído por uma única folha em branco e o documento 7 do PA, descrito como “0007 RIT 06 mail Procuração forense.pdf” é antes uma cópia de uma comunicação electrónica sobre um “requerimento de Recusa/Suspeição” que nunca foi aflorado nos autos, deve a AT proceder às correspondentes rectificações;
b. Como as referências que a Requerente faz à “pág. 97” do RIT (por 3 vezes: §§ 6, 7 e 65 do PPA), não podem ser garantidamente descodificadas (a Requerente não o juntou e o Projecto de Relatório que consta do PA só tem 84 páginas), deve a Requerente juntar aos autos a versão com a paginação que teve presente.
4. Em razão da alteração de orientação acima descrita, sujeita aos condicionamentos expostos, prorroga-se, por dois meses, o prazo fixado no n.º 1 do artigo 21.º do RJAT para a prolação da decisão, ao abrigo do seu n.º 2.”.
10. Em 29 de Setembro, a Requerente apresentou o seguinte requerimento, integrado nos autos e notificado no dia seguinte:
“A..., S.A, Requerente melhor identificada nos autos à margem referenciados, vem, ao abrigo do disposto no artigo 16.º, alínea f) do RJAT, expor e requerer o seguinte:
1. A requerente foi notificada, por meio de notificação eletrónica elaborada a 15.09.2025, do despacho proferido a 14.09.2025. NIF ... B...— Sociedade de Advogados, SP, RL. 1 — 2
2. Do ponto de vista substantivo, o teor do despacho é, salvo o devido respeito, obscuro, sendo os pontos 1 e 2 ininteligíveis, para além de a fundamentação apresentada ser gravemente insuficiente, na medida em que não permite alcançar as razões subjacentes à decisão.
3. No mais, cumpre destacar que o Relatório de Inspeção Tributária “RIT”, identificado como “Doc.15” da PI, foi apresentado pela Requerente no momento da submissão do pedido de pronúncia arbitral, encontrando-se nos autos do processo desde 14.01.2025, isto é, há mais de 8 meses (Cfr. Doc. 1-3). Nestes e nos demais termos de direito aplicáveis, que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se que o despacho de 14.09.2025 seja objeto de aclaração/reforma, com a correspondente fixação do prazo para que as partes, querendo, se pronunciem.”.
11. Tendo o Tribunal entendido que não lhe competia discutir os seus despachos com os intervenientes processuais – nem insistir no seu cumprimento, onde este não tenha ocorrido –, e tendo ficado esclarecida a remissão efectuada pela Requerente, importa apurar se pode desde já conhecer-se do mérito.
II. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
12. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e, com a limitação adiante indicada, o pedido de pronúncia contém-se no âmbito das suas atribuições.
13. Requerente e Requerida gozam de personalidade e de capacidade judiciárias, são legítimas, e encontram-se regularmente representadas.
14. Não foram invocadas excepções.
15. Como se referiu no Despacho proferido a 14 de Setembro, a Requerente invocou vícios comuns a todas as liquidações impugnadas (a “Inexistência Jurídica do Relatório de Inspeção” e, admissivelmente, a “Violação do Princípio do Inquisitório e do Direito de Participação”) e outros que eram específicos de cada um dos diferentes pedidos: não aceitação da dedução do IVA “por força do incumprimento de requisitos formais” e, “Num plano distinto”, “Falta de Liquidação de Imposto : Certificado de Saída para o Fornecedor Nacional”.
16. A admissibilidade da cumulação de pedidos, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do RJAT, supõe que “a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito.”. Ora, se seria esse o caso da inexistência jurídica do RIT, ou da violação do princípio do inquisitório, não é seguramente o caso da não aceitação da dedução do IVA “por força do incumprimento de requisitos formais” e da “Falta de Liquidação de Imposto”. O que, aliás, a própria Requerente reconheceu nas suas alegações:
“o objeto do presente litígio gira em torno de dois grandes grupos de temas: por um lado, a dedutibilidade do IVA suportado com um conjunto de prestações de serviços das quais a Requerente foi beneficiária e, por outro lado, a falta de liquidação do IVA a propósito de três faturas emitidas pela A... .”.
17. Quer dizer que improcedendo – como, ainda que só no momento da redacção da decisão, se considerou que improcediam, pelas razões infra explanadas – os vícios que podiam inquinar o próprio RIT[1], a cumulação de pedidos revelava-se inadmissível. Disso se deu conhecimento no dito Despacho de 14 de Setembro, que a Requerente considerou “obscuro”.
18. Vejamos então porque não podem proceder, nem a invocada inexistência jurídica do RIT (A.), nem a violação do princípio do inquisitório e do direito de participação (B.), e quais as consequências a retirar daí (C.).
19. A. Quanto à invocada “inexistência jurídica do RIT”
A Requerente invocou essencialmente que:
1. “por força da aplicação do artigo 62.º, n.º 6 do RCPITA e do artigo 151.º, n.º 1, al. g) do CPA, a assinatura do autor do RIT corresponde a uma menção obrigatória e indispensável que deve constar neste ato.”;
2. Sendo o RIT, “do ponto de vista substantivo e conceptual (…) um ato administrativo”, “deve respeitar as exigências impostas pelo CPA para a prática de todo e qualquer ato administrativo, nomeadamente, ao nível da verificação dos seus elementos constitutivos, a saber, a autoria, os destinatários e o conteúdo referido ao objeto (cfr. artigo 155.º, n.º 2, do CPA)”;
3. “em relação à exigência da assinatura, a doutrina é clara quanto ao facto de que “…só com ela existe ato ou decisão administrativa: um ato muito perfeito, mesmo manuscrito e em papel timbrado é um nada jurídico, se faltar a assinatura do seu autor.” (cfr. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves, João Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Comentado, Almedina, 2.ª Edição, pág. 587).”;
4. “tendo em conta que só a assinatura permite identificar o autor do ato e assegurar a sua autenticidade-, a omissão deste elemento no RIT implica que este ato seja, do ponto de vista jurídico, inexistente.”;
5. “E não se diga que a falta da assinatura do autor do RIT pode ser ultrapassada pelo facto de este ato conter as assinaturas da chefe de equipa, bem como da chefe de divisão.”, “visto que as três assinaturas exigidas pelo artigo 62.º, n.º 6 do RCPITA são cumulativas e não alternativas.”;
6. “este entendimento seria sustentar a possibilidade, que nem sequer no plano académico pode ser admitida, de existir um ato de segundo grau que aprova, valida ou ratifica um ato administrativo primário inexistente.”[2];
7. E acrescenta que “surpreendentemente e sem que exista qualquer explicação plausível para isso, o parecer do chefe de equipa é datado de 10/10/2023, pelo que foi proferido antes da conclusão do próprio RIT, a qual é datada de 11/10/2023.”;
8. Assim, conclui, “o parecer do chefe de equipa incidiu sobre um ato que era inexistente, não apenas do ponto de vista jurídico, como também e mais preocupante, do ponto de vista factual.”
Por seu turno, a Requerida obtemperou que:
i) “De acordo com o art.º 62.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), o Relatório final de inspeção deve conter, entre outros elementos, a "identificação dos funcionários que o subscreveram, com menção do nome, categoria e número profissional".”;
ii) “Não há menção específica à necessidade de assinatura do funcionário que realizou a inspeção.”;
iii) “A omissão da assinatura do técnico que elaborou o Relatório, quanto muito, poderia tratar-se de uma irregularidade de dimensão meramente formal, cuja assinatura dos superiores hierárquicos – que confere validade ao documento – a degradaria em não essencial, não penhorando em algum momento os direitos de defesa do sujeito passivo, nem subtraindo validade ao conteúdo substantivo do Relatório.”;
iv) “o Relatório final não é um ato administrativo final, mas sim um procedimento de comprovação, verificação e de informação, um conjunto de atos encetados pela Autoridade Tributária que procuram verificar o cumprimento das obrigações tributárias e a prevenir a ocorrência de infrações tributárias”;
v) “os atos tributários ou em matéria tributária que resultam do Relatório de inspeção, como os atos de liquidação adicional, são os que podem ser efetivamente impugnados, pois são estes que produzem efeitos jurídicos concretos.”.
Como se viu, as normas invocadas pela Requerente são as do artigo 62.º, n.º 6, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA) e as dos artigos 151.º, n.º 1, al. g), e 155.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo (CPA) cuja redacção é a seguinte:
- artigo 62.º (epigrafado “Conclusão do procedimento de inspecção”), n.º 6, do RCPITA “O relatório de inspecção será assinado pelo funcionário ou funcionários intervenientes no procedimento e conterá o parecer do chefe de equipa que intervenha ou coordene, bem como o sancionamento superior das suas conclusões.”;
- artigo 151.º (epigrafado “Menções obrigatórias”), n.º 1 (“Sem prejuízo de outras referências especialmente exigidas por lei, devem constar do ato:”), al. g), do CPA: “A assinatura do autor do ato ou do presidente do órgão colegial que o emana.”;
- artigo 155.º (epigrafado “Regra geral”), n.º 2, do CPA: “O ato considera-se praticado quando seja emitida uma decisão que identifique o autor e indique o destinatário, se for o caso, e o objeto a que se refere o seu conteúdo.”.
Como resulta desta última norma, o acto administrativo supõe uma decisão (“considera-se praticado quando seja emitida uma decisão”). Parece claro que o RIT não constitui uma decisão (será, mas não necessariamente, o suporte essencial da decisão), pelo que o presente Tribunal não secunda a pretensão da Requerente de retirar dessa norma a inexistência do RIT por falta de assinatura do seu identificado autor (e a identificação deste é o que, na verdade, tal norma exige, e não mais do que isso).
Por outro lado, a menção obrigatória constante da alínea g) do n.º 1 do artigo 151.º tem de ter um âmbito de cobertura idêntico ao que resulta do n.º 2 do artigo 155.º do CPA e que, de resto, corresponde à definição constante do artigo 148.º (epigrafado “Conceito de ato administrativo”) do mesmo diploma:
“Para efeitos do disposto no presente Código, consideram-se atos administrativos as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta.”.
Quer dizer que, antes de uma decisão não há propriamente um acto administrativo, mas antes um dos passos do iter que a ela levará. Assim sendo, na própria lógica da Requerente, a única norma violada pela omissão de assinatura da autora do RIT (identificada na sua página 2), é a do transcrito n.º 6 do artigo 62.º do RCPITA, que exige que o RIT seja “assinado pelo funcionário ou funcionários intervenientes no procedimento”. A questão está então em saber qual a consequência jurídica que deve corresponder a tal vício de forma, sabendo que tal RIT tem de conter, nos termos da alínea m) do n.º 3 do mesmo artigo 62.º do RCPITA, a “Identificação dos funcionários que o subscreveram, com menção do nome, categoria e número profissional;”.
Ora, parece óbvio que a informação eventualmente relevante para os destinatários do RIT (a quem este foi notificado nos termos do n.º 2 do mesmo artigo) é esta e não a presença, ou não, da assinatura da sua autora – que, de resto, pode perfeitamente ser ilegível. A exigência de assinatura, se bem se entende o desígnio do legislador, há-de estar na certificação da autenticidade do RIT, ie, na garantia de que este foi fidedigno e que há alguém que nele se reconhece e pelo qual se responsabiliza. Como, no caso dos autos, nenhuma destas questões é relevante para a Requerente – como ela própria invoca nas suas alegações (ainda que, evidentemente, a outro propósito) “a verdade é que os elementos documentais carreados para o processo (…) permitem esclarecer, sem margem para dúvidas, a substância destas operações” – não se vê que seja adequado ou proporcional que a Requerente venha a assacar inexistência ao RIT a pretexto da falta de um elemento que em nada contendeu com os seus direitos de se inteirar do que lhe era imputado e de reagir quanto a isso (excepto, diga-se, como estratégia processual para cumular indevidamente pedidos na jurisdição arbitral).
Não sendo de excluir que a falta de assinatura da autora do RIT, nas circunstâncias do caso, não correspondesse a uma mera irregularidade, certamente que não seria enquadrável como inexistência: nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 163.º do CPA (epigrafado “Atos anuláveis e regime da anulabilidade”), “São anuláveis os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção.”.
De resto, qualquer configuração de invalidade teria de ser confrontada com o entendimento jurisprudencialmente fixado de que a “preponderância do conteúdo sobre a forma” pode gerar a “inoperância da força invalidante do vício que inquina o ato”. Nesse sentido pode ver-se, por exemplo, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 19 de Outubro de 2023 (Processo n.º 687/07.3BELSB[3]), onde se escreveu:
“A teoria do aproveitamento do ato há muito é acolhida entre a doutrina e a jurisprudência e atualmente até objeto de positivação legal [cfr. art.º 163.º, n.º 5, do Código do Procedimento Administrativo (CPA)].
Nos termos da mencionada teoria, verifica-se uma inoperância da força invalidante do vício que inquina o ato, em virtude da preponderância do conteúdo sobre a forma. Assim, quando em relação a um determinado ato, que padeça de ilegalidade formal ou externa, se possa afirmar inequivocamente que o ato só podia ter o conteúdo que teve em concreto, essa invalidade não é operante, em virtude da conformidade substancial do ato praticado”[4].
Improcede, portanto, o primeiro fundamento invocado para unificar as pretensões anulatórias da Requerente[5].
20. B. Quanto à violação do princípio do inquisitório e do direito de participação[6]
A Requerente entendeu, essencialmente, que:
a. “os procedimentos tributários, nos quais se incluem, naturalmente, o procedimento de inspeção, são orientados por um conjunto de princípios, nomeadamente, o princípio do inquisitório, que impõe que a AT realize todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material.”;
b. “No âmbito do procedimento de inspeção, que é especialmente sensível já que pode culminar com a prática de atos lesivos com reflexo direto na esfera dos sujeitos passivos, o princípio do inquisitório assume particular relevância, na medida em que corresponde não só a um princípio conformador da atividade da AT, como também e acima de tudo, a uma garantia fundamental do contribuinte.”[7];
c. “no caso em análise, a AT não respeitou este princípio, tendo em conta que não inquiriu um conjunto de testemunhas que eram essenciais para a descoberta da verdade material, em especial, o representante legal da “C... Unipessoal, LDA” e o Sr. D... .”;
d. “se mesmo depois de todos os esclarecimentos e elementos documentais carreados para o procedimento inspetivo por parte da ora Requerente, a AT continuou com dúvidas quanto às faturas em causa, a verdade é que deveria ter inquirido o representante legal da “C... Unipessoal, LDA” e o Sr. D..., tal como requerido em sede de direito de audição.”;
e. “não tendo tais inquirições ocorrido e não sendo possível aplicar a teoria do aproveitamento do ato, os atos tributários ora em crise são anuláveis, atenta a violação do princípio do inquisitório, consagrado no artigo 58.º da LGT e aplicável ao procedimento inspetivo por força do artigo 6.º do RCPITA, bem como do princípio da participação, previsto no artigo 60.º da LGT e aplicável por remissão do artigo 8.º do RCIPTA.”.
Em contrapartida a Requerida entendeu, em resposta, que:
a) “dentro do princípio do inquisitório, a audição de testemunhas arroladas pelos contribuintes pode ser dispensada em determinadas circunstâncias.”;
b) “Das circunstâncias de dispensa, refira-se aquelas quando a administração tributária reuniu provas indiciárias suficientes que demonstram a consistência e seriedade dos indícios de irregularidades, como faturação incompleta.”;
c) “Acresce que quando os testemunhos não são considerados relevantes ou não contribuem significativamente para o esclarecimento dos factos em causa, a sua audição pode também ser dispensada.”, como ocorreu no caso e ficou consagrado na “parte final da “Análise do Direito de Audição” no Capítulo X” do RIT;
Ora, ainda que a Resposta da AT não o tenha sublinhado, o que levou os seus serviços de inspecção a desatenderem a solicitada audição de testemunhas, designadamente as identificadas pela Requerente, foi o enquadramento que deram às situações em apreço: como resulta do RIT, não se tratava de apurar se as facturas emitidas correspondiam ou não a transacções efectuadas (o que seria relevante para apurar da sua efectividade): tratava-se de essas facturas não terem os elementos que os serviços da AT entenderam que deviam ter. Assim, escreveu-se o seguinte no RIT:
“as faturas ou documentos equivalentes devem de ser datadas, numeradas sequencialmente, e devem obrigatoriamente conter "os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto", “a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável…”, “as taxas aplicáveis e o montante de imposto devido”, “o motivo justificativo da não aplicação do imposto, se for caso disso”, “a data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efetuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da fatura”.
As exigências relativas à emissão de faturas, elencadas no n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, visam evitar a fuga e evasão fiscais e daí terem sido estabelecidos, de uma forma pormenorizada, vários requisitos que devem na íntegra ser respeitados aquando do preenchimento das faturas sob pena de não ser possível a dedução do IVA através delas liquidado. Em igual sentido já foi decidido em diferentes processos pelo Tribunal Central Administrativo do Sul (TCA Sul) e pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA)”[8].
Ou seja: uma vez que, na óptica dos serviços, não estava em causa comprovar a existência das transacções, não houve qualquer infracção ao princípio do inquisitório, nem ao direito de participação: nenhuma testemunha poderia convencer a AT de que as facturas tinham as indicações que manifestamente não tinham e, portanto, não se tornava útil ouvi-las. Podia a AT ter configurado mal o Direito aplicável, e haver razões para que as exigências formais em relação às facturas pudessem ser dispensadas no caso – como os Tribunais poderiam averiguar, designadamente ouvindo as testemunhas –, mas isso não tem a ver com o princípio do inquisitório, nem tem a ver com o direito de participação da Requerente: tem a ver com a interpretação e a aplicação do Direito, e em relação a isso as testemunhas nada podiam adiantar.
Improcede, portanto, o segundo fundamento invocado da Requerente que permitiria unificar as suas pretensões anulatórias.
21. Consequências da improcedência de vícios alegadamente comuns às diferentes liquidações efectuadas
Adquirida, na fase da preparação da decisão, a improcedência de qualquer desses invocados vícios “comuns” pelas razões acabadas de enunciar, seguia-se uma consequência: a questão da cumulação de pedidos (que de outro modo não se autonomizaria) tinha de se colocar. Se o fundamento para a anulação das diferentes liquidações não era o mesmo, então teria de se sustentar em vícios específicos de cada uma delas. Ora, o Tribunal, por maioria, entendeu que a norma a que a jurisdição arbitral está sujeita não lhe permite decidir questões factual e juridicamente distintas, disso dando conta o Despacho de 14 de Setembro, invocando expressamente anteriores decisões do CAAD que já assim tinham decidido.
Na primeira decisão citada (proferida no processo n.º 708/2022-T), escreveu-se “Quanto à admissibilidade da cumulação de pedidos:”:
“k) Resulta do artigo 3.º, n.º 1 do RJAT que “[a] cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos e a coligação de autores são admissíveis quando a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito” (destaques do Tribunal), norma que não sofreu qualquer alteração desde a aprovação deste diploma.
l) No caso dos autos, a Requerente fundava o pedido de anulação das liquidações de IRC e IVA (i) em vícios do procedimento inspetivo (e caso esse fosse o único fundamento a exceção de ilegal cumulação seria claramente improcedente em face da letra do citado artigo 3.º, n.º 1 do RJAT) mas também (ii) em erros sobre os pressupostos de facto e de direito que imputava às mencionas liquidações, que não eram coincidentes entre si; aliás, como resulta do relatório de inspeção inserido no processo administrativo instrutor, tirando o caso de uma diminuta correção em sede de IVA, os factos que deram origem às correções efetuadas pela AT em sede de IRC e de IVA são totalmente díspares, não se verificando sequer aquela circunstância corrente na prática de um determinado custo não ser fiscalmente aceite para efeitos de IRC, numa parte, e de IVA, noutra.
m) E, portanto, afigura-se a este Tribunal que a procedência daqueles pedidos de anulação de liquidações de IRC e de IVA não dependia da apreciação das mesmas circunstâncias de facto (como sucederia caso a questão fosse a de dedutibilidade dos mesmos gastos para efeitos de IRC e de IVA, que desse origem a liquidações adicionais de ambos os impostos), pelo que, ao abrigo do artigo 3.º, n.º 1 do RJAT, a cumulação era realmente inadmissível.
n) Não olvida este Tribunal que alguma doutrina e jurisprudência arbitral defendem que, sobretudo desde a alteração ao artigo 104.º do CPPT resultante da Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro (do qual passou a constar que na impugnação judicial é admitida a cumulação de pedidos, ainda que relativos a diferentes atos desde que, cumulativamente “a) aos pedidos corresponda a mesma forma processual; e b) A sua apreciação tenha por base as mesmas circunstâncias de facto OU O mesmo relatório de inspeção tributária, OU sejam suscetíveis de ser decididos com base na aplicação das mesmas normas a situações de facto do mesmo tipo”, deve ser feita uma interpretação atualista daquele artigo 3.º, n.º 1 do RJAT.
o) Com efeito, as referidas alterações ao artigo 104.º do CPPT ocorridas em 2019 tornam, na letra da lei, a possibilidade de cumulação de pedidos mais ampla no processo de impugnação judicial face ao arbitral, o que poderia induzir o intérprete no sentido da mencionada interpretação atualista.
p) Sucede, contudo, que a mesma Lei .º 118/2019, de 17 de setembro, também alterou normas do RJAT (concretamente os seus artigos 16.º, 17.º e 27.º), mantendo intocado o artigo 3.º.
q) E, mais tarde, tanto a Lei 119/2019, de 18 de setembro, como a Lei 7/2021,de 26 de fevereiro, alteraram quer o RJAT quer o CPPT, deixando o artigo 3.º do RJAT nos mesmos exatos termos.
r) Ou seja, o legislador teve múltiplas oportunidades para uniformizar os requisitos de cumulação de pedidos patentes no RJAT e no CPPT, sem que o tenha feito.
s) Razão pela qual, fazendo boa aplicação dos cânones constantes dos n..os 2 e 3 do artigo 9.º do Código Civil, de acordo com os quais “2 - Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”, se afigura a este Tribunal que, em sede arbitral, ainda que as liquidações adicionais impugnadas resultem do mesmo relatório de inspeção, exige-se um certo grau de identidade fáctica/das circunstâncias de facto – o que é dizer, da causa de pedir.
t) Tal identidade fáctica não se verifica no caso dos autos, pelo que se decidiu neste Tribunal, em maioria, julgar procedente a invocada exceção de ilegal cumulação de pedidos e, em consequência, solicitar à Requerente que selecionasse um dos pedidos (i.e., de anulação da liquidação de IRC ou das liquidações de IVA) para ser julgado na presente ação.”.
E no Sumário da segunda dessas decisões (a proferida no processo n.º 1062/2024-T e que retomou a argumentação acabada de transcrever), escreveu-se: “A norma do n.º 1 do artigo 3.º do RJAT é uma norma definidora da competência dos Tribunais arbitrais em matéria de cumulação de pedidos e difere – de forma que não pode deixar de se considerar deliberada – da norma sobre cumulação de pedidos do CPPT.”.
Uma vez que foi esse o entendimento maioritário do Tribunal, o Despacho de 14 de Setembro indicou que o processo só poderia prosseguir quanto a um dos “dois grandes grupos de temas”, assumindo – e aí por equívoco – que só um caberia na sua competência em razão do valor: o da “falta de liquidação do IVA a propósito de três faturas emitidas pela A...”, tratado nos §§ 40 a 53 e, sob a epígrafe “Certificado de Saída para o Fornecedor Nacional”, §§156 a 187 do PPA.
Se era a isso que a Requerente se referia com a ininteligibilidade do citado despacho, tinha razão: é que, em direitas contas, também a desconsideração das facturas referentes a serviços jurídicos e de prospeção (§§ 103 a 141 do PPA, irmanadas por se lhes imputar, como indicava a Requerente no § 142 do PPA, “um incumprimento dos requisitos formais quanto à fatura”) somavam um valor que cabia nessa competência. Nesses termos, e porque não cabe ao presente Tribunal decidir a qual dos dois pedidos quer a Requerente dar preferência, fixa-se um prazo de 10 dias para optar por aquele que pretende que seja decidido por este Tribunal, sendo certo que a não exercer tal opção o Tribunal ficará impedido de conhecer qualquer deles.
Em qualquer caso, sempre ficará de fora a apreciação da “Fatura Relativa a Serviços de Construção Civil” (que, como escreveu a Requerente no mesmo § 142 do PPA, o foi “por não ter sido respeitada a regra de inversão do sujeito passivo”). Evidentemente, dada a dissemelhança de situações e de fundamentos invocados (vícios formais das facturas v. regime substantivo aplicável), considera-se despiciendo explicitar que tal questão não preenche o requisito de “que a questão jurídica a apreciar seja fundamentalmente a mesma e que a situação fáctica seja semelhante nos pontos que relevem para a decisão”[9].
Quer dizer que, quanto a tal questão, vai desde já absolvida a AT.
III. DECISÃO
Termos em que se decide:
a) Fixar um prazo de 10 dias para que a Requerente opte por aquele dos pedidos que, cabendo na competência do Tribunal em razão do valor, pretende que seja decidido, com a cominação de que, a não o fazer, o Tribunal ficará impedido de conhecer qualquer deles;
b) Absolver a AT da instância quanto ao pedido referente à Fatura Relativa a Serviços de Construção Civil;
c) Em consequência, prorrogar, por dois meses, o prazo para ser proferida a decisão final, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 21.º do RJAT.
Lisboa, 17 de Novembro de 2025
O árbitro presidente e relator
Victor Calvete
A árbitro adjunta
Sofia Quental
O árbitro adjunto
Tomás Cantista Tavares
[1] No PPA, na sequência da invocação da inexistência jurídica do RIT, a Requerente invocou no primeiro artigo da Secção em que tratava “ii. Da Violação do Princípio do Inquisitório e do Direito de Participação” que
“Mas mesmo que assim não se entenda, hipótese que apenas se admite por cautela de patrocínio, o certo é que os atos tributários ora impugnados são também afetados por vícios de natureza formal, geradores da anulabilidade das liquidações supra identificadas.”.
O destaque nesta citação, que acrescentámos, apontava para o entendimento de que tal preterição de diligências implicava uma contaminação da totalidade dos actos tributários que emanaram do RIT, embora, nas alegações, a invocação do mesmo vício se circunscreva, para retomar as palavras da Requerente, a um dos “dois grandes grupos de temas”: o da “a dedutibilidade do IVA suportado com um conjunto de prestações de serviços das quais a Requerente foi beneficiária”.
[2] Em abono, a Requerente invoca o “acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 01501/20.0BEPRT, de 08/01/2021”, onde se escreveu que “É de impossível objeto uma ratificação-sanação desprovida de ato primário sobre que possa incidir, um suposto ato administrativo que não existe como tal.”.
[4] A nota aposta a este trecho da decisão era a seguinte:
“Cfr. José Carlos Vieira de Andrade, O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina, Coimbra, 2007, pp. 329 a 336. V. a este propósito o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 28.03.2019 (Processo: 24/08.0BELRS).”.
[5] A Requerente invocou também que o RIT tem data de conclusão de 11 de Outubro de 2023 e assinatura do chefe de equipa com data de 10 de Outubro de 2023, mas não se atribui a isso nenhuma relevância face à frequência com que quem data qualquer texto incorre em lapsus calami. De resto, tais lapsos não têm qualquer previsão normativa sancionadora.
[6] Como se adiantou na nota 1, não ficou claro se a Requerente entendia que estes vícios inquinavam a totalidade das liquidações – como resultava do PPA – ou se se circunscreviam a um dos seus “dois grandes grupos de temas”: o da “a dedutibilidade do IVA suportado com um conjunto de prestações de serviços das quais a Requerente foi beneficiária”. Em todo o caso, sendo admissível o primeiro entendimento, vai ponderar-se da sua valia.
[7] Invocou em abono o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido em 24 de Abril de 2020 no processo 01089/16.6BEAVR, transcrevendo o seguinte trecho:
“O dever de inquisitório a cargo da AT situa-se a montante do ónus da prova, por isso não é possível afirmar que a AT cumpriu o ónus da prova a seu cargo quando não haja, sequer, realizado as diligências probatórias que o dever de inquisitório e de descoberta da verdade material lhe impunham.”.
[8] Seguiam-se transcrições dos Acórdãos do TCASul, nos processos n.º 187/ 04 de 9 de Janeiro de 2007, n.º 08611/15 de 11 de Janeiro de 2018 e n.º 16/11.1 de 25 de Março de 2021, do TCANorte, no processo 01645/09.9 de 15-04-2021 e do STA no processo n.º 902/07 de 31 de Janeiro de 2008.
[9] Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª Ed., Vol. II, Áreas Editora, Lisboa, 2011, anotação ao artigo 71.º.