DECISÃO ARBITRAL
I – Relatório
A... veio intentar a presente acção arbitral contra o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA... (C...), pedindo, a titulo principal: i) a condenação do Demandado à prática do acto administrativo de deferimento do requerimento para pagamento do suplemento de risco previsto no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, com efeito retroactivo a 9 de Novembro de 2000; ii) a condenação do Demandado ao pagamento dos juros moratórios vencidos e vincendos até integral pagamento, à taxa legal supletiva aplicável às obrigações civis, desde o dia 9 de Novembro de 2000. Subsidiariamente, por considerar que a comunicação referida no artigo 18.º da Petição Inicial consubstancia um verdadeiro acto administrativo de indeferimento do requerimento apresentado: i) a declaração de invalidade do acto administrativo consubstanciado na comunicação em causa; ii) a declaração do direito do Demandante a receber o suplemento de risco consagrado no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, com efeito retroactivo a 9 de Novembro de 2000, condenando-se o Demandado no pagamento daquele mesmo suplemento; e iii) a condenação do Demandado ao pagamento dos juros moratórios vencidos e vincendos até integral pagamento, à taxa legal supletiva aplicável às obrigações civis, desde o dia 9 de Novembro de 2000.
O Demandante alega, no essencial que, com o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos sistemas informáticos, todas as comunicações tendem a ser geridas por aqueles mesmos sistemas, de modo que não faz sentido uma distinção compartimentada entre o desempenho de funções relacionadas com sistemas de informática e o desempenho de funções relacionadas com sistemas de telecomunicações.
Atendendo à substancial similitude que existe entre as funções relacionadas com sistemas de informática e as funções relacionadas com sistemas de telecomunicações, é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da igualdade (cf. artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa), a interpretação da norma n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro que, atendendo apenas ao elemento literal, restrinja a atribuição do suplemento de risco apenas aos funcionários da C... que desempenhem funções relacionadas com as telecomunicações.
Invoca algumas decisões proferidas, quer pelos tribunais administrativos e fiscais, quer pelos tribunais arbitrais, no sentido de que não pode ser feita uma distinção entre o desempenho de funções relacionadas com sistemas de informática e o desempenho de funções relacionadas com sistemas de telecomunicações.
E que, também os tribunais arbitrais, concluem pelo reconhecimento e a afirmação de que não existe, no âmbito da Unidade de Telecomunicações e Informática (actualmente, Unidade de Sistemas de Informação e Comunicações), uma distinção entre o desempenho de funções relacionadas com sistemas de informática e o desempenho de funções relacionadas com sistemas de telecomunicações.
Mais, defende que a comunicação em causa, não consubstancia um acto administrativo de indeferimento do requerimento apresentado pelo Demandante, porquanto a mesma não consubstancia uma decisão que, no exercício de poderes jurídico-administrativos (do Exmo. Senhor Director Nacional da C...), vise produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta.
Ou seja, a comunicação em causa não consubstancia um acto administrativo para o efeito do disposto no artigo 148.º do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), mas antes um mero parecer técnico, até porque não contém as menções obrigatórias referidas nas alíneas a) a g) do n.º 1 do artigo 151.º do CPA.
Não obstante, ainda que se considerasse que a comunicação em causa consubstancia um verdadeiro acto administrativo de indeferimento do requerimento apresentado pelo Demandante, sempre enfermaria aquele acto não só de violação de lei, como, também, de violação do conteúdo essencial de um direito fundamental.
Com efeito, conforme se afirma na decisão arbitral proferida no Processo n.º 62/2015-A do CAAD, “O direito aos suplementos é um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, nomeadamente o direito a uma retribuição segundo a quantidade, qualidade e natureza do trabalho (art. 59.º da CRP)”.
Pelo que, ainda que se considerasse que a comunicação em causa consubstancia um verdadeiro acto administrativo de indeferimento do requerimento apresentado pelo Demandante), sempre enfermaria aquele acto da nulidade cominada na alínea d) do n.º 2 do artigo 161.º do CPA, ou, quando menos, de anulabilidade nos termos do artigo 163.º do CPA, por violação de Lei.
Conclui que o Demandante tem direito a auferir o suplemento de risco consagrado no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, com efeito retroactivo a 9 de Novembro de 2000, por, nesta data, o Demandante estar colocado no Departamento de Telecomunicações e Informática da C..., acrescido de juros moratórios vencidos e vincendos até integral pagamento, à taxa legal supletiva aplicável às obrigações civis, desde 9 de Novembro de 2000.
Juntou documentos.
Regularmente citado, veio o Demandado invocar a excepção da incompetência do tribunal arbitral.
Defendeu-se ainda por impugnação, alegando, no essencial que o que releva para efeitos de atribuição de um suplemento de risco de montante superior não é o facto do trabalhador se encontrar integrado no então Departamento de Telecomunicações e Informática (“DTI”), ou na então Unidade de Telecomunicações e Informática (“UTI”), e actualmente Unidade de Sistema de Informação e Comunicações (“USIC”), mas o exercício efectivo de funções expressamente e unicamente nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança.
Alega que uma coisa é a situação dos trabalhadores que exercem funções no Sector de Telecomunicações e Informática da Directoria do Norte da C..., onde apenas foi
criado um único serviço de telecomunicações e informática, sem núcleos, sendo que os trabalhadores ali colocados desenvolvem competências nas duas áreas funcionais e, por conseguinte, têm direito a auferir o suplemento de risco de montante igual ao pessoal de Investigação Criminal, tal como os restantes trabalhadores colocados nos restantes Sectores Telecomunicações e Informática (“STI”) das unidades territoriais ou locais, que apenas dispõem de um único serviço que desenvolve competências nas duas áreas funcionais (informática e telecomunicações).
Outra, bem diversa, é a situação dos trabalhadores que exercem funções na DTI/UTI/USIC, que é uma unidade de apoio à investigação criminal, que dispõe de competências vastas e diferenciadas, quer na área das telecomunicações, quer a área da informática, as quais se encontram distribuídas pelas diversas áreas e unidades orgânicas flexivas que a integram (áreas / sectores / núcleos) com competências definidas e distintas entre si.
Competências que justificam que, dentro de uma mesma unidade orgânica, existam trabalhadores com funções diversas e distintas, consoante a área / unidade orgânica flexível que integram e, por conseguinte, sujeitas igualmente a ónus diferentes, conforme a função que nela desempenham, o que determina a atribuição de suplemento de risco de montantes diferentes, graduados de acordo com o ónus da função.
Conclui o Demandante que só os trabalhadores da UTI/USIC que exercem funções na área funcional de telecomunicações podem auferir o suplemento de risco, nos termos do n.º 4 do citado artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro.
O que não é o caso do Demandante, que se encontra colocado na Área de Sistema e Aplicações Informáticas (“ASAI”) e Grupo de Gestão e Manutenção de Sistema (“GGMS”) da USIC, onde desempenha funções relacionadas com o sistema de informática, e não na Área de Equipamentos e Sistemas Especiais em cuja dependência funcionam o Sector de Controlo de Comunicações, o Grupo de Equipamento Especiais e o Grupo Forense de Perícias Informáticas.
Relativamente à alegada inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade (cf. artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa), da interpretação da norma n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro que, atendendo apenas ao elemento literal, restrinja a atribuição do suplemento de risco apenas aos trabalhadores da C... que desempenhem funções relacionadas com as telecomunicações, o Demandante defende que o princípio constitucional da igualdade ínsito no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais (proibindo, inversamente, o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais), pelo que não vê que o entendimento do Demandado atente contra o princípio da igualdade.
Por despacho arbitral de 28 de Outubro de 2022, o Demandante foi notificado para indicar os factos que entende controvertidos, essenciais para o objecto do pedido e passíveis de prova testemunhal, tendo o mesmo indicado, através de requerimento apresentado em 5 de Novembro de 2022.
No dia 6 de Janeiro de 2023 teve lugar a inquirição das testemunhas D... (engenheiro, chefe de área), E... (chefe de sector) e F... (especialista de Polícia Científica) indicadas pelo Demandante e, bem assim, declarações de parte.
As partes ofereceram atempadamente alegações finais, conforme determinado na reunião de 6 de Janeiro de 2023.
Nas suas alegações, as partes reiteraram essencialmente as suas posições expressas nos articulados.
O presente Tribunal é composto pelo árbitro singular signatário, o qual integra a lista de árbitros do CAAD em matéria administrativa, e foi constituído em 24 de Outubro de 2022, data da aceitação do encargo e da sua notificação às partes (artigo 17.º do RCAAD).
II – Saneamento
As partes gozam de personalidade e capacidade jurídica e judiciária, bem como de legitimidade ad causam, e encontram-se devidamente representadas por mandatários regularmente constituídos.
O Demandante declarou, ainda, não prescindir do direito de interpor recurso para o tribunal competente da decisão arbitral a proferir, caso não obtenha vencimento de causa, pelo que nada mais há a decidir quanto a esta questão.
Na sua contestação, o Demandado invoca a excepção da incompetência do tribunal arbitral.
Cumpre dela conhecer, na medida em que a sua eventual procedência obsta ao conhecimento do mérito da causa e conduz à absolvição do Demandado da instância (artigo 576.º, n.º 2 e promécio do artigo 577.º do Código de Processo Civil).
(i) Da incompetência do tribunal arbitral
O Demandado alega a incompetência deste Tribunal para conhecer da presente acção, por se tratar de matéria atinente ao suplemento de risco de trabalhadores da carreira de apoio à investigação criminal, ou seja, remunerações, que afigura integrar direitos indisponíveis e, por isso, afastada da esfera de competência do CAAD.
Vejamos.
De acordo com a lei, os Estatutos do CAAD e o seu Regulamento, a sua competência material inclui, nomeadamente, dirimir os litígios respeitantes a relações jurídicas de emprego público. É isto que resulta da alínea d), do n.º 1, do artigo 180.º e da alínea d), do n.º 1, do artigo 187.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, conjugado com o disposto no n.º 2 do artigo 3.º dos Estatutos do CAAD.
Não obstante, a parte final da alínea d) do artigo 180.º ressalva da competência do tribunal arbitral o julgamento de questões respeitantes a relações de emprego público quando “estejam em causa direitos indisponíveis”.
Não se discute nos presentes autos que a matéria que constitui o objecto do processo diga respeito a relações jurídicas de emprego, pelo que esse aspecto factual se mostra admitido por acordo das partes.
Tão pouco se discute nos presentes autos que está em causa a atribuição do suplemento de risco, pelo que se trata de uma prestação remuneratória, facto igualmente admitido por acordo das partes.
O Ministério da Justiça encontra-se vinculado à jurisdição do CAAD através da Portaria n.º 1120/2009, de 30 de Setembro, no que respeita à C... . [cf. alínea d) do artigo 1.º], sendo que essa vinculação diz respeito a litígios com valor igual ou inferior a € 150.000.000 e que tenham por objecto questões emergentes de relações jurídicas de emprego público [cf. primeira parte da alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo 1.º], o que sucede neste caso quanto aos dois referidos aspectos.
A segunda parte da mesma alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º da referida Portaria reitera a ressalva consagrada na parte final da alínea d) do n.º 1 do artigo 180.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pelo que a vinculação não abrange questões sobre “direitos indisponíveis”.
Quanto à questão de saber se estarão em causa “direitos indisponíveis” que façam aplicar a excepção da parte final da alínea d) do n.º 1 do artigo 180.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e a segunda parte da alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º da referida Portaria, tem sido jurisprudência uniforme do CAAD que o que verdadeiramente se pretendeu subtrair à arbitrabilidade foi os litígios cujo objectivo respeite a direitos absolutamente indisponíveis ou irrenunciáveis.
Aliás, se assim não fosse, não se compreenderia a diferença de redacção entre a alínea c) do n.º 3 e a alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009, de 30 de Setembro, as quais demonstram à saciedade que a matéria de remunerações e dos suplementos não se encontrava abrangida pela alínea a) do n.º 2, pois, se o estivesse, não careceria de autonomização expressa.
Ora, “[n]a fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” [cf. n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil].
Por isso, manifestamente não poderá entender-se que a matéria dos “direitos indisponíveis” abranja remunerações e suplementos remuneratórios.
Importa, ainda, referir que a questão da irrenunciabilidade da retribuição coloca-se essencialmente nas relações entre a entidade empregadora e o trabalhador e visa, de alguma forma, obstar à especial fragilidade do trabalhador no seu relacionamento directo com o empregador.
Já não se coloca – pelo menos não se coloca com a mesma acuidade – no caso de uma pretensão deduzida em juízo ou perante um tribunal arbitral, em que o trabalhador se encontra representado por mandatário judicial ou pelos serviços jurídicos do seu sindicato e em que a decisão adjudicatória não compete a nenhuma das partes, mas a juiz, ou a um árbitro, independente e imparcial, que decide de acordo com o direito constituído.
Pelos fundamentos que antecedem, julga-se improcedente a excepção de incompetência do Tribunal.
O Tribunal é, por isso, competente.
III – Do mérito da causa
A. Questão a decidir
As questões a decidir nos presentes autos, decorrentes da causa de pedir e dos pedidos formulados, bem como das posições assumidas pelas partes nos seus articulados e outras peças processuais são as seguintes:
a) Saber se assiste, ou não, ao Demandante o direito à atribuição do suplemento de risco consagrado no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, com efeito retroactivo a 9 de Novembro de 2000, acrescido de juros moratórios vencidos e vincendos até integral pagamento, à taxa supletiva aplicável às obrigações civis;
b) Supletivamente, saber se o acto administrativo consubstanciado na comunicação é inválido e se assiste, ou não, ao Demandante o direito à atribuição do suplemento de risco consagrado no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, com efeito retroactivo a 9 de Novembro de 2000, acrescido de juros moratórios vencidos e vincendos até integral pagamento, à taxa supletiva aplicável às obrigações civis.
B. Fundamentação
Passemos ao conhecimento dos pedidos formulados pelo Demandante.
(i) Factualidade
Face ao alegado por ambas as partes, aos documentos juntos ao processo e, bem assim, à prova testemunhal e às declarações de parte produzidas, considera-se assente a seguinte factualidade, com interesse para a decisão.
a) O Demandante é funcionário da C... com o n.º ..., tendo, desde 1 de Janeiro de 2020, a categoria profissional de Especialista de Polícia Científica (cf. Documento n.º 1, junto com a Petição Inicial).
b) O Demandante tomou posse como funcionário da C... a 2 de Dezembro de 1991, tendo sido colocado no Sector de Apoio a Utilizadores do Departamento de Organização e Informática (cf. Documento n.º 1, junto com a Petição Inicial).
c) O Demandante foi transferido, em 1 de Dezembro de 1998, para a Área de Sistemas Informáticos do Departamento de Organização e Informática (cf. Documento n.º 1, junto com a Petição Inicial), passando a exercer, entre outras, as funções de administrador de sistemas informáticos.
d) Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, foram extintos o Departamento de Organização e Informática e o Departamento de Telecomunicações, fundindo-os num novo Departamento, designado Departamento de Telecomunicações e Informática, cujas competências se encontravam previstas no artigo 43.º daquele mesmo diploma.
e) Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 37/2008, de 6 de Agosto, foi extinto o Departamento de Telecomunicações e Informática, o qual deu origem à Unidade de Telecomunicações e Informática, cujas competências estavam previstas no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 42/2009, de 12 de Fevereiro.
f) Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 137/2019, de 13 de Setembro (actual Lei Orgânica da C...) foi extinta a Unidade de Telecomunicações e Informática e criada a nova Unidade de Sistemas de Informação e Comunicações (“USIC”), cujas competências estão definidas no artigo 37.º daquele mesmo diploma.
g) Durante algum tempo, o Demandante tinha a seu cargo a gestão, a instalação e a configuração de firewalls e VPNs da C... .
h) O Demandante vem executando, entre outras funções, a instalação, configuração e gestão de activos de redes e de comunicações, tais como switch e balanceadores de carga de rede.
i) Desde 1 de Janeiro de 2020, o Demandante exerce na C... as funções inerentes à categoria profissional de Especialista de Polícia Científica (cf. Documento n.º 1, junto com a Petição Inicial).
j) Em 5 de Maio de 2022, o Demandante apresentou ao Exmo. Senhor Director Nacional da C... requerimento para pagamento do suplemento de risco previsto no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro (cf. Documento n.º 2, junto com a Petição Inicial).
k) Sobre o requerimento referido acima, não foi, até à presente data, proferida qualquer decisão de deferimento ou de indeferimento.
l) O Demandante foi informado, em 3 de Junho de 2022, do parecer do Gabinete de Assessoria Jurídica da C... relativo ao pagamento do suplemento de risco (cf. Documento n.º 3, junto com a Petição Inicial).
Não ficaram provados outros factos com interesse para os presentes autos.
A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou dos documentos juntos com a Petição Inicial e não impugnados e, bem assim, da prova testemunhal e das declarações de parte efectuadas.
(ii) Do Direito
A questão em apreço incide sobre o alegado direito do Demandante à atribuição do suplemento de risco a que alude o n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, com efeitos retractivos a 9 de Setembro de 2000, bem como ao pagamento de juros de mora vencidos e vincendos.
Alega o Demandante que não é possível distinguir, no âmbito da Unidade de Telecomunicações e Informática (“UTI”), actualmente designada por Unidade de Sistemas de Informação e Comunicações (“USIC”) em que está colocado, entre o desempenho de funções relacionadas com os sistemas informáticos e o desempenho de funções relacionadas com os sistemas de telecomunicações.
Pelo que peticiona que lhe seja reconhecido o direito a receber o suplemento de risco, que a lei reserva para os trabalhadores integrados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança.
O Demandado não concorda com a pretensão do Demandante, por entender que o que releva para aferir da atribuição do suplemento de risco igual ao da investigação criminal é o conteúdo funcional das funções efectivamente exercidas pelos trabalhadores.
Vejamos.
O Decreto-Lei n.º 138/2019, de 13 de Setembro, aprovou o novo Estatuto Profissional do Pessoal da C..., bem como o regime das carreiras especiais de investigação criminal e de apoio à investigação criminal (“EP...”), o qual entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2020.
Até à entrada em vigor do EP..., os critérios de atribuição do suplemento de risco eram, por força do disposto no artigo 91.º e 161.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 275-A/99, de 9 de Novembro, os constantes do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro.
Com fundamento no regime especial de prestação de trabalho, nos ónus inerentes ao exercício das funções, bem assim ao risco, insalubridade e penosidade que lhes estão associados, o n.º 2 do artigo 75.º do EP... vem atribuir, aos trabalhadores das carreiras especiais, o direito a um suplemento a fixar em diploma próprio, sem prejuízo do disposto no n.º 3 e n.º 4 do seu artigo 98.º.
Ora, determina o n.º 3 e n.º 4 do citado artigo 98.º do EP... o seguinte:
“3 - Até à regulamentação prevista no artigo 75.º, os trabalhadores da carreira de investigação criminal e da carreira de segurança mantém o direito ao suplemento previsto, respetivamente, nos n.ºs 3 e 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de setembro, na sua redação atual, nas condições em que o auferem na data de entrada em vigor do presente decreto-lei.
4 - O disposto no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de setembro, na sua redação atual, é aplicável aos trabalhadores da carreira de especialista de polícia científica.”.
Deste modo, continuam-se a aplicar os critérios estabelecidos no artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 302/98, de 7 de Outubro,
nos termos ali definidos.
Assim, determina o n.º 1 do citado artigo 99.º que os trabalhadores ao serviço da C... têm direito a um suplemento de risco, graduado de acordo com o ónus da função
dos diferentes grupos de pessoal.
Sendo que, no que se reporta ao pessoal de apoio à carreira de investigação criminal, o direito a auferir o suplemento de risco de valor acrescido, igual ao pessoal da carreira de investigação criminal se subjectiva com o exercício de funções que o caracterizam, nos termos do n.º 4 do referido artigo 99.º.
Com efeito, dispõe o n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro, que “Os funcionários integrados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança têm direito a suplemento de risco de montante igual ao fixado no número anterior”.
Ou seja, fixado em 25% do índice correspondente ao 1.º escalão da categoria prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 119.º e não o correspondente a 20% do índice 100 da respectiva tabela indiciária.
Com efeito, o que releva para efeitos de atribuição de um suplemento de risco de montante superior não é o facto do trabalhador se encontrar integrado no então Departamento de Telecomunicações e Informática (“DTI”), ou na então Unidade de Telecomunicações e Informática (“UTI”), e actualmente Unidade de Sistema de Informação e Comunicações (“USIC”), mas o exercício efectivo de funções expressamente e unicamente nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança.
Senão vejamos.
Alega o Demandante, no âmbito das carreiras que detinha (especialista auxiliar e posteriormente especialista adjunto, actualmente integrado na carreia especial de apoio à investigação criminal, com a categoria de especialista de polícia científica) que desempenha, desde 1 de Dezembro de 1998, tarefas que estão relacionadas tanto com o sistema informático, como com sistema de telecomunicações.
O Demandante alega, ainda, que “com o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos sistemas informáticos as comunicações tendem, de uma forma geral, a ser geridas por aqueles mesmos sistemas, de modo que não é possível uma distinção compartimentada entre o desempenho de funções relacionadas com sistemas de informática e o desempenho de funções relacionadas com os sistemas de telecomunicações”.
O Demandante alega, igualmente, que “a própria nomenclatura do Departamento que o Demandante sempre integrou (Departamento de Telecomunicações e Informática, Unidade de Telecomunicações e Informática e Unidade de Sistema de Informação e Comunicações) fundem conteúdos funcionais relacionados com as telecomunicações e com a informática”.
“Por conseguinte, atendendo à substancial similitude que existe entre as funções relacionadas com sistemas de informática e as funções relacionadas com sistema de telecomunicações, é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa), a interpretação da norma n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de setembro que, atendendo apenas ao elemento literal, restrinja a atribuição do suplemento de risco apenas aos trabalhadores da C... que desempenhem funções relacionadas com as telecomunicações.”.
Ora, a então DTI / UTI, à semelhança da actual USIC, é um departamento/unidade de apoio à investigação criminal que dispõe de competências na área das telecomunicações e na área de informática, conforme resulta dos diplomas que estabelecem a orgânica/competências dos serviços/unidades que integram a C..., designadamente, do artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 42/2009, de 12 de Fevereiro, e do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 137/2019, de 13 de Setembro.
Competências distintas que justificam que, dentro de uma mesma unidade, existam trabalhadores com funções diversas e diferenciadas consoante a área/unidade orgânica flexível que integram e, por conseguinte, sujeitas igualmente a ónus diferentes, conforme a função que nela desempenham – o que determina a atribuição de suplemento de risco de montantes diferenciados.
Na verdade, os trabalhadores colocados na então DTI / UTI, actual USIC, não exercem todos as mesmas funções. Pelo contrário, desenvolvem competências diferentes, consoante a área funcional onde estão integrados.
Assim, em linha com várias outras decisões proferidas, quer pelos tribunais administrativos e fiscais, quer pelo CAAD, atentemos no teor do acórdão do TCA Sul, de 30 de Março de 2017, (Processo n.º 11/17.7BCLSB), o qual manifestou o entendimento de que nem todos os trabalhadores da UTI têm direito a auferir o suplemento de risco de valor igual ao do pessoal de investigação criminal, mas somente aqueles que se encontram a exercer funções na área funcional de telecomunicações, atento o disposto no n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro.
Ali se conclui o seguinte:
“I- O subsídio de risco previsto no n.º 4 do artigo 99.º D.L. n.o 295-A/90, de 21 de Setembro, é atribuído aos funcionários integrados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança.
II- Estando o A. integrado na área funcional da informática e integrando o grupo de pessoal de apoio à investigação criminal tem direito a um suplemento de risco
correspondente a 20% do índice 100 da respectiva tabela indiciária, previsto no n.o 5 do referido preceito.”.
Constituiu, também, entendimento do TCA Sul que “encontrando-se a chave do presente recurso no n.º 1 do artigo 99.º que refere que “os funcionários ao serviço da C... têm direito a um suplemento de risco, graduado de acordo com o ónus da função dos diferentes grupos de pessoal”, o que permite concluir que o subsídio de risco é atribuído de acordo com o concreto ónus da função exercida, pelo que se as funções do recorrente são exercidas no domínio da informática, estando, aliás, integrado no âmbito do Grupo Forense de Perícias Informáticas, não exerce funções na área das telecomunicações, não está integrado nesta última área funcional, a sua área funcional é a informática, conforme revela, desde logo, o Grupo Forense onde está integrado, pelo que deve ser negado provimento ao presente recurso.”.
Também a decisão arbitral (Processo n.º 87/2015-A) julgou a acção improcedente por falta de fundamento legal para o pedido de reconhecimento do direito à percepção de um suplemento de risco complementar à remuneração base que aufere de montante igual ao pessoal da investigação criminal, nos seguintes termos:
“A análise da questão em apreço deverá buscar arrimo na premissa da diversidade de carreiras do pessoal da C..., consagradas nos artigos 62.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro, e que realiza em termos inequívocos a destrinça entre o pessoal de investigação criminal (cfr. artigos 65.º e ss.) e o pessoal de apoio à investigação criminal (cfr. artigos 73.º e ss.).
Assim, apesar da Unidade de Telecomunicações e Informática constituir uma unidade de apoio à investigação criminal, a definição dessa incumbência genérica do serviço não implica per se que os trabalhadores que exercem funções nesse serviço estejam integrados na carreira de investigação criminal.
Além disso, os trabalhadores que integram o pessoal de apoio à investigação criminal, que compreende as carreiras de especialista superior, de especialista, de especialista-adjunto e de segurança não desempenham todos funções na mesma matéria.
Compulsados o regime legal dos suplementos de risco dos trabalhadores que exercem funções na C..., verificamos que o montante do subsídio de risco atribuído pelo legislador ao pessoal do grupo de apoio à investigação criminal é variável em razão do conteúdo funcional da atividade que desempenham e não da unidade orgânica em que estão inseridos.
Neste contexto, o legislador conferiu ao pessoal de apoio à investigação criminal incumbido de desempenhar tarefas de conteúdo funcional na área da informática, o direito a um subsídio de risco cujo montante corresponde a 20% do índice 100 da respetiva tabela indiciária, conforme resulta do disposto no artigo 99.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 275-A/90.
Com efeito, o legislador apenas equiparou ao pessoal de investigação criminal, para efeitos de calculo do montante do subsídio de risco, os funcionários providos nas demais carreiras, mas integrado nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações ou de seguranças.
Assim, sendo o autor, como funcionário provido na carreira de especialista-adjunto integrado na área de informática, tem direito apenas ao subsídio de risco que a lei confere ao pessoal de apoio à investigação criminal, nos termos do artigo 99.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 275-A/90.”.
Assim, resulta claro que uma coisa é a situação dos trabalhadores que exercem funções no Setor de Telecomunicações e Informática da Directoria do Norte da C..., onde apenas foi criado um único serviço de telecomunicações e informática, sem núcleos, sendo que os trabalhadores ali colocados desenvolvem competências nas duas áreas funcionais e, por conseguinte, têm direito a auferir o suplemento de risco de montante igual ao pessoal de Investigação criminal, tal como os restantes trabalhadores colocados nos restantes Sector Telecomunicações e Informática (“STI”) das unidades territoriais ou locais, que apenas dispõem de um único serviço que desenvolve competências nas duas áreas funcionais (informática e telecomunicações).
Outra, bem diversa, é a situação dos trabalhadores que exercem funções na DTI / UTI / USIC, que é uma unidade de apoio à investigação criminal, que dispõe de competências vastas e diferenciadas, quer na área das telecomunicações, quer a área da informática, as quais se encontram distribuídas pelas diversas áreas e unidades orgânicas flexivas que a integram (áreas / sectores / núcleos) com competências definidas e distintas entre si.
Competências estas que justificam que, dentro de uma mesma unidade orgânica, existam trabalhadores com funções diversas e distintas, consoante a área / unidade orgânica flexível que integram e, por conseguinte, sujeitas igualmente a ónus diferentes, conforme a função que nela desempenham, o que determina a atribuição de suplemento de risco de montantes diferentes, graduados de acordo com o ónus da função.
O Demandante alega que, com o desenvolvimento, o aperfeiçoamento e a interdependência dos sistemas informáticos, as comunicações tendem a ser geridas por aqueles mesmos sistemas, de modo que não é possível uma distinção compartimentada entre o desempenho de funções relacionadas com as telecomunicações e o desempenho de funções relacionadas com a informática (cf. artigo 14.º da Petição Inicial e declarações de parte).
Alega, ainda, que para além de outras funções, vem executando a instalação, configuração e gestão de activos de redes e de comunicações, tais como switch e balanceadores de carga de rede, em particular a gestão, a instalação e a configuração de firewalls. (cf. artigos 11.º e 13.º da Petição Inicial e declarações de parte).
Com efeito, nos termos do artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 137/2019, de 13 de Setembro (“LO...”), compete à USIC, entre outras competências: instalar, explorar e manter oso sistemas de telecomunicações da C...; desenvolver, gerir e proceder à manutenção dos sistemas de informação da C..., equipamentos especiais e respectivas redes de comunicação e dos sistemas de informação da C..., seleccionando e instalando os equipamentos e os sistemas tecnológicos de suporte mais adequados, e garantindo a confidencialidade e a integridade da informação armazenada, bem como a sua transmissão de forma segura.
Como é do conhecimento geral, a instalação, configuração e gestão de activos de redes e de comunicações – tais como switch e balanceadores de carga de rede, em particular a gestão, a instalação e a confirmação de firewalls – reporta-se a equipamentos (dispositivos / ferramentas) de segurança (protecção) para computadores que integram uma determinada rede de computadores.
Também é do conhecimento geral, uma boa infraestrutura de redes garante o acesso efectivo à rede (web). Por isso, a instalação e gestão dos equipamentos em causa constitui um factor determinante para o correcto dimensionamento da estrutura, conjugando velocidade nas conexões e segurança na rede eléctrica, de modo a garantir uma boa gestão / manutenção dos sistemas e aplicações informáticas, bem como proceder à manutenção dos sistemas de informação da C... .
Efectivamente, o que releva para aferir da atribuição do suplemento de risco igual ao da investigação criminal é o conteúdo funcional das funções efectivamente exercidas pelos trabalhadores.
Ora, o Demandante encontra-se colocado na Área de Sistema e Aplicações Informáticas (“ASAI”), cujo conteúdo funcional respeita às funções tipificadas na Instrução Permanente de Serviço n.º .../2015 da UTI/USIC junta aos autos, onde desempenha funções com caracter de permanência e duradouro, relacionadas com a administração dos sistemas, domínios, base de dados e aplicações informáticas da C... .
O facto de o Demandante ter sido, durante algum tempo, subsidiariamente responsável pela instalação, configuração e gestão / manutenção de firewalls da C..., o que o levou a uma ou outra deslocação – esporádica – para apoio a operações a nível nacional, não afasta o entendimento preconizado.
Por outro lado, a razão de ser da atribuição de um suplemento de risco igual ao da investigação criminal, aos trabalhadores colocados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança, reside no facto de, por inúmeras vezes, estes terem de acompanhar a investigação criminal nas mais diversas diligências no exterior, nomeadamente, buscas, sujeitando-os, como tal, no exercício das suas funções, a uma maior perigosidade, designadamente, pela possibilidade da sua identificação como elementos da C..., podendo por esse facto sofrer represálias.
Assim, como facilmente se percebe, o legislador foi bastante claro, distinguido o que entendeu
distinguir. Quando se trata de pessoal de apoio à investigação criminal, este apenas deverá ter direito auferir do suplemento de risco nos termos do n.º 5 do citado artigo 99.º, sendo que poderá auferir um suplemento de montante igual ao pessoal da carreia de investigação criminal quando estiver integrado e a exercer funções nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança.
De onde se conclui que apenas os trabalhadores da UTI / USIC que exercem funções na área funcional de telecomunicações podem auferir o suplemento de risco, nos termos do n.º 4 do citado artigo 99.º do Decreto-lei n.º 295-A/90, de 21 de setembro.
O que não é o caso do Demandante.
O Demandante alega, ainda, que é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da igualdade (cf. artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa), a interpretação da norma n.º 4 do artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro que, atendendo apenas ao elemento literal, restrinja a atribuição do suplemento de risco apenas aos trabalhadores da C... que desempenhem funções relacionadas com as telecomunicações.
Como refere, aliás, o Demandante no artigo 27.º da Petição Inicial o princípio constitucional da igualdade ínsito no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais (proibindo, inversamente, o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais).
Atente-se, ainda, no Acórdão do STA de 22 de Maio de 2010, proferido no processo n.º 0375/09, onde se refere que:
“No entanto, tal princípio não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação do legislador, se possam (se devam) estabelecer diferenciações de tratamento, 'razoável, racional e objectivamente fundadas', sob pena de, assim não sucedendo, 'estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objectivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes'. Ponto é que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar, diz-nos J. C. Vieira de Andrade – Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, 1987, pág. 299). O que pressupõe averiguação e valoração casuísticas da 'diferença', de modo a que recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações semelhantes e diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação (cf. Acórdão n.o 351/05 do TC de 5 de Julho de 2005, com apelo a outra jurisprudência e doutrina)” [sublinhado nosso].
Não assiste, pois, razão ao Demandante nesta matéria.
Assim, atendendo aos factos provados e subsumidos os mesmos ao Direito vigente, julgo a presente acção improcedente por falta de fundamento legal para o pedido de reconhecimento do direito à percepção de um suplemento de risco complementar à remuneração base que aufere de montante igual ao atribuído ao pessoal da investigação criminal formulado pelo Demandante.
O Demandante solicitada, ainda, subsidiariamente, por considerar que a comunicação referida no artigo 18.º da Petição Inicial consubstancia um verdadeiro acto administrativo de indeferimento do requerimento apresentado, a declaração de invalidade do acto administrativo consubstanciado na referida comunicação e, bem assim, a declaração do direito a receber o suplemento de risco, acrescido dos juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa legal supletiva.
Vejamos.
O Demandante reconhece que:
“A comunicação referida no art. 18.º supra, cuja cópia já foi junta como Doc. 3, não consubstancia um acto administrativo de indeferimento do requerimento referido no art. 16.º supra.
Isto porque,
A comunicação referida no art. 18.º supra não consubstancia uma decisão que, no exercício de poderes jurídico-administrativos (do Exmo. Senhor Director Nacional da C...), vise produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta.
Ou seja, a mesma comunicação referida no art. 18.º supra não consubstancia um acto administrativo para o efeito do disposto no art. 148.º do CPA, mas antes um mero parecer técnico, até porque não contém as menções obrigatórias referidas nas alíneas a) a g) do n.º 1 do art. 151.º do CPA.”.
Ou seja,
Não só não estamos perante um acto administrativo, como pelos motivos acima explanados não era devido o deferimento do requerimento apresentado pelo Demandante, pelo que improcedem os pedidos formulados pelo Demandante a título subsidiário.
(i) Valor da causa
Nos termos do artigo 31.º a 33.º do CPTA, aplicável por força do disposto no artigo 29.º do Regulamento do CAAD, e, subsidiariamente, o artigo 300.º do Código de Processo Civil, atendendo à utilidade económica do pedido, fixo o valor do processo em € 31.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) sendo a taxa de arbitragem a calcular nos termos legais.
IV – Decisão
Atendendo aos factos provados e subsumidos os mesmos ao Direito vigente, decido julgar a presente acção improcedente por falta de fundamento legal para o pedido de reconhecimento do direito à percepção de um suplemento de risco complementar à remuneração base que aufere de montante igual ao atribuído ao pessoal da investigação criminal formulado pelo Demandante.
Fixa-se à causa o valor de € 30.000,01. A taxa de arbitragem é calculada nos termos das disposições regulamentares aplicáveis. Os encargos são suportados pelo Demandante nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 29.º do Regulamento do CAAD.
Registe, notifique e publique.
CAAD, 15 de Fevereiro de 2023
O Árbitro
(Hélder Filipe Faustino)
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.