DECISÃO ARBITRAL
I. Identificação das Partes e objeto do litígio
A... veio interpor “ação administrativa de reconhecimento do direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça”, contra o B... .
A final, pede o “reconhecimento do direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 a serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça”.
O Ministério demandado defendeu-se por exceção e por impugnação.
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Nestes termos, o objeto do litígio nos presentes autos é a discussão do alegado direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 a serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça, ou seja, saber se existem deveres vinculados que se impõe ao Ministério Réu nesta matéria.
II. Tramitação Processual
O Sindicato interpôs a presente ação pedindo o reconhecimento do direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça, pretendendo, portanto, o Demandante, que aqueles que se candidataram no movimento de 2019 sejam efetivamente promovidos para os lugares vagos.
Distribuído o processo, foi o Réu, Ministério Demandado, citado para contestar.
O Réu apresentou contestação, defendendo-se por exceção, onde alegou a ilegitimidade ativa do Sindicato, pedindo, a final, a sua absolvição da instância, e por impugnação, reclamando a improcedência do pedido.
Juntou dentro do respetivo prazo o processo administrativo.
Findos estes articulados, o processo foi concluso ao árbitro designado, que proferiu despacho inicial, tendo entendido o Tribunal ter condições para conduzir e decidir o presente processo com base na prova documental junta, tendo dispensado a realização de audiências de prova.
As partes foram notificadas para, querendo, se pronunciarem quanto ao mecanismo de adequação formal, simplificação e agilização processual proposto, bem como quanto à dispensa de realização de audiências de prova e de qualquer outra prova que não documental. Foram ainda notificadas para alegarem, querendo.
Usado o contraditório contra a exceção alegada e apresentadas as alegações por ambas as partes, o Tribunal conheceu da exceção invocada pelo Demandado, tendo proferido despacho de aperfeiçoamento da P.I..
Despacho que foi cumprido, tendo sido dada a conhecer a nova P.I.ao Demandado, que remeteu para a contestação já anteriormente apresentada.
III. Saneamento do processo
Foi designado árbitro singular e constituído este Tribunal Arbitral, que é absolutamente competente.
O processo, isento de nulidades que o invalidem, é o próprio e as partes legítimas e capazes, estando representadas por mandatários (advogado do Sindicato Autor e licenciada em Direito designada pelo Demandado).
Não há exceções ou questões prévias a apreciar.
IV. Fundamentação
a) Dos Factos
No artigo 20.º da contestação, o B... admitiu, por acordo, a factualidade invocada pelo Autor nos artigos 7.º a 16.º da P.I., tendo, ainda, esclarecido que a DGAJ não solicitou despacho prévio favorável à promoção de oficiais de justiça para as categorias de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
Por outro lado, consta do processo administrativo (PA), documentos que revelam factos com interesse para os presentes autos, pelo que, da conjugação de tudo, consideramos os seguintes factos como provados:
1) A DGAJ publicitou em 29-03-2019 no seu site a informação que o movimento ordinário de oficiais de justiça realiza-se anualmente no mês de junho e o prazo para candidatura decorre entre 1 e 30 de abril.
2) Nesse comunicado, é referido pelo Senhor Diretor-geral da Administração da Justiça que “o movimento anual de 2019 considerará os lugares vagos existentes nesta data, os eventuais lugares criados após esta data e, bem assim, as vagas que venham a emergir das colocações do próprio movimento.
3) Em 5.7.2019 foi publicitado o Ofício-circular n.º 16/2019 da DGAJ a divulgar o projeto do movimento anual dos oficiais de 2019.
4) Muitos oficiais de justiça, em sede de audiência prévia, carrearam para o procedimento os seus argumentos de facto e direito que, no seu entendimento, obrigavam a DGAJ a preencher os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça, via promoção nos termos do EFJ.
5) O A. enviou à Senhora ..., com conhecimento ao Diretor-geral da Administração da Justiça, uma exposição sobre a ilegalidade da DGAJ não efetuar promoções para escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretários de justiça no movimento de 2019.
6) Tendo o A. obtido do R. a seguinte resposta: A realização de promoções não se encontra na disponibilidade da DGAJ.
Na verdade a Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, veio estipular no n.º 5 do artigo 16.º que as promoções, designadamente, para as categorias de acesso nas carreiras especiais não revistas, podem ser efetuadas no ano de 2019, desde que seja proferido despacho prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pela área em que se integra o órgão ou serviço (no caso em apreço a Justiça), e pela área das Finanças e da Administração Pública. Mais se determinou, no n.º 9 do referido artigo 16.º, que todas as promoções efetuadas sem autorização ministerial são nulas, fazendo incorrer os seus autores em responsabilidade civil, financeira e disciplinar.
Como se sabe, o despacho da Senhora Secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, datado de 2 de abril de 2019, no qual foi fixado também o número máximo de 240 promoções para o ano de 2019, limitou-se às categorias de escrivão adjunto e de técnico de justiça adjunto.
Deste modo, e ao contrário do que vem afirmado, existe impedimento legal para a realização de promoções às categorias de secretário de justiça, escrivão de direito e técnico de justiça principal.
7) Por despacho de 9 de agosto de 2019 do Diretor-Geral da Administração da Justiça, foi aprovado o Movimento Anual dos Oficiais de Justiça de 2019 publicado no dia 30.8.2019 no Aviso (extrato) n.º 13633-B/2019 do Diário da República n.º 166/2019, 2.º Suplemento, Série II.
8) No movimento anual dos Oficiais de Justiça de 2019, a Direção-Geral da Administração da Justiça não efetuou promoções para os lugares vagos ou preenchidos em substituição de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
9) Há lugares vagos ou lugares preenchidos por oficiais de justiça em substituição, nos termos do disposto no artigo 49.º do EFJ, que não constam preenchidos no movimento de 2019, apesar de Oficiais de Justiça de categoria imediatamente inferior, com o curso válido, terem concorrido para os mesmos no movimento de 2019.
10) A DGAJ não solicitou despacho prévio favorável à promoção de oficiais de justiça para as categorias de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
11) Por Ofício de 7 de fevereiro de 2019, do Chefe de Gabinete da Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, foi enviada à DGAJ cópia do ofício n.º..., do Gabinete da Senhora Secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, datado de 5 de fevereiro de 2019, assim como expediente que o acompanhava (Página 1 do PA).
12) No ofício n.º..., do Gabinete da Senhora Secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, datado de 5 de fevereiro de 2019, consta “parecer favorável às promoções até ao limite de 240 oficiais de justiça nas categorias de escrivão-adjunto e técnico de justiça-adjunto, sob condição de cabimentação prévia da respetiva despesa” (Página 2 do PA).
13) O despacho favorável do Senhor Secretário de Estado do Orçamento, datado de 4 de fevereiro de 2019 e com o n.º ... (Página 5 do PA), teve por base um parecer interno, onde se dá conta que o processo já havia sido solicitado anteriormente e analisado no ano de 2018, ao abrigo do n.º 9 do artigo 18.º da LOE 2018, norma semelhante à aplicada, artigo 16.º da LOE 2019 (Páginas 3 e 4 do PA).
b) Do Direito
Conforme referido no Despacho de convite ao aperfeiçoamento da P.I., o Demandante circunscreveu os autos a uma tutela de eventuais direitos dos candidatos não promovidos no movimento de 2019(movimento anual de oficiais de justiça), apresentando um único pedido, o reconhecimento do “direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 a serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça”, e identificando (na “segunda” P.I.) cada um desses candidatos cujos interesses defende no presente processo.
Em causa está, pois, o alegado direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 a serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça, sendo certo que, tendo em conta a causa de pedir e pedido formulado pelo Autor, de reconhecimento de direito (e não de impugnação do ato administrativo que aprovou o Movimento Anual de Oficiais de Justiça de 2019)o que está em causa é saber se existem deveres vinculados que se impõe ao Ministério Réu nesta matéria. Designadamente, e este é o cerne da questão, saber se existia a obrigação legal de solicitar a obtenção dos Pareceres Prévios dos membros do Governo responsáveis pela área em que se integra órgão, serviço ou entidade em causa e pela área das Finanças e Administração Púbica, para o preenchimento de todas as vagas então identificadas.
Na verdade, sob pena de o pedido ter sido mal formulado (tese que a Entidade Demandada deixa, ao de leve, alegado no artigo 19.º da contestação), está em causa saber se o direito invocado pelo Sindicato em defesa de cada um dos seus associados identificados na P.I. – direito de serem promovidos - resulta diretamente da lei e, em particular, se no Movimento Anual de Oficiais de Justiça de 2019 decorria da legislação então vigente a obrigação de solicitar a obtenção dos Pareceres Prévios dos membros do Governo competentes, para o preenchimento de todas as vagas, e consequente obrigação de promoção de oficiais de justiça às categorias de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
Ou seja, ao invés do que conjetura o Demandado no artigo 19.º da contestação, o Demandante não ataca diretamente a decisão sobre o Movimento Anual de Oficiais de Justiça de 2019, sendo que à data da entrada da P.I. em juízo, ainda estava em tempo para o efeito (pelo que não se coloca a questão prevista no n.º 2 do artigo 38.º do CPTA, que expressamente dispõe não poder ser obtido por outros meios processuais o efeito que resultaria da anulação do ato inimpugnável), mas antes apresenta um pedido que não se subsume à impugnação do ato ou condenação à prática de ato devido. A presente ação administrativa tem outra pretensão (acima identificada).
Compete, pois, aqui, sobretudo, perceber se há um direito à promoção dos Oficiais de Justiça e, em particular, à luz da legislação então vigente, se existe uma obrigação legal de solicitar a obtenção dos Pareceres Prévios para o preenchimento de todas as vagas, com implicação direta na situação jurídica destes candidatos no Movimento de 2019,àscategorias de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
Destarte, o reconhecimento do “direito dos Oficiais de Justiça que se candidataram no movimento de 2019 a serem promovidos para os lugares vagos...”, conforme peticionado, não terá impacto direto no ato administrativo praticado, pois as categorias aqui em causa são outras e a causa de pedir distinta, conforme acima identificado.
Entende, assim, o Tribunal, que não é o ato administrativo que está em causa nos autos, daí o despacho de aperfeiçoamento não ter tido (também) qualquer convite quanto ao pedido formulado na P.I.
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Nesta perspetiva, identificada a causa de pedir, cumpre analisar, em primeiro lugar, o direito à promoção, para tentar perceber se ele resulta diretamente da lei, o que reclama, desde logo, um passeio pelo Estatuto dos Funcionários de Justiça (EFJ), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 343/99, de 26 de agosto.
De acordo com o artigo 3.º do EFJ, o grupo de pessoal Oficial de Justiça compreende várias categorias, a saber: secretário de tribunal superior, secretário de justiça, escrivão de direito, escrivão-adjunto, escrivão auxiliar, técnico de justiça principal, técnico de justiça-adjunto e técnico de justiça auxiliar.
Os requisitos de acesso encontram-se previstos nos artigos 9.º e seguintes.
A Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) realiza movimentos dos oficiais de justiça para o preenchimento de lugares que se encontrem vagos ou que venham a vagar no decurso do movimento, sendo os movimentos ordinários efetuados anualmente, no mês de junho, publicitando-se os lugares previsivelmente a preencher, podendo haver, ainda, movimentos extraordinários (cfr. artigo 18.º).
Relativamente ao provimento, o artigo 40.º estipula que “sem prejuízo do disposto quanto às situações de disponibilidade e de supranumerário, gozam de preferência, sucessivamente:
a) Os oficiais de justiça que requeiram a transferência ou a transição, exceto se possuírem na categoria classificação inferior a Bom;
b) Os oficiais de justiça que requeiram a promoção para lugares de secretarias de tribunais instalados em comarcas periféricas quando, no requerimento a que se refere o n.º 1 do artigo 19.º, assumam o compromisso de permanência em qualquer daquelas comarcas pelo período de três anos;
c) Os funcionários de justiça habilitados nos termos do artigo 31.º que requeiram a nomeação em vagas de escrivão auxiliar ou de técnico de justiça auxiliar no quadro de pessoal da secretaria do tribunal a que pertencem”.
Foi, pois, ao abrigo destes normativos estatutários que o Movimento de 2019 foi lançado, sendo certo que, como explica o Demandado, os movimentos podem determinar, no fim de uma série de atos e operações materiais, a colocação de oficiais de justiça nos lugares requeridos pelos mesmos, por meio de transferência, transição ou promoção, como acabado de lembrar. Três meios, portanto, previstos naquele EFJ.
Mas isto não equivale a um “direito à promoção”.
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Recordando o que a Constituição da República Portuguesa estipula quanto à Liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública, nomeadamente no artigo 47.º n.º 2 da CRP, todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, e em regra por via de concurso(carregado nosso) – norma integrada na Parte I [Direitos e Deveres Fundamentais], Título II [Direitos, Liberdades e Garantias], Capítulo I [Direitos, Liberdades e Garantias Pessoais], da CRP.
Desta forma, o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, constitui um verdadeiro direito subjetivo pessoal, que beneficia do regime jurídico reservado aos direitos, liberdades e garantias fundamentais (cfr. artigo 18.º da CRP). Porém, conforme jurisprudência assente, nomeadamente do Tribunal Constitucional, este direito fundamental não se traduz num direito pessoal a obter um emprego na função pública, antes pretende evidenciar que “esta implica uma relação de emprego acessível a todos os cidadãos e não uma relação de confiança política”; ora, “embora o preceito refira expressamente apenas o direito de acesso, o certo é que o respetivo âmbito normativo abrange também o direito de ser mantido nas funções e, ainda, o direito às promoções dentro da respetiva carreira. Parece pacífico entre os tratadistas, na verdade, que ao consagrar um amplo direito de acesso à função pública, o legislador constitucional não procurou apenas tutelar o direito de ingresso na mesma, mas, igualmente, o direito de progresso no interior da respetiva carreira”(Acórdão do TCANorte de 14/96/2007, proc. 00480/99. Neste sentido, ver, por todos, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, volume I, págs. 652 a 662; e PAULO VEIGA MOURA, Função Pública – Regime Jurídico, Direitos e Deveres dos Funcionários e Agentes, Coimbra Editora, 2.ª edição- 2001, 1.º volume, págs. 421 a 425).
Efetivamente, conforme ensinam GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, o progresso na carreira profissional é um dos “níveis de realização” em que se desdobra a “liberdade de escolha da profissão”, consagrada, como direito fundamental, no referido artigo 47.º da Constituição, e que não consiste apenas, conforme referem, “em poder escolher livremente a profissão desejada”. Também o âmbito normativo-constitucional do n.º 2 do mesmo preceito, embora expressamente referente ao direito de acesso à função pública, abrange, segundo os mesmos Autores, o direito às promoções dentro da carreira.
Do exposto, resulta claro que a progressão na carreira é um direito, que constitui uma contrapartida da dedicação ao serviço público e um importante estímulo para os funcionários e agentes, “estímulo esse que radica numa previsão de sucessivas melhorias remuneratórias, obtidas mediante o avanço de escalão dentro da mesma categoria, avanços a que os funcionários ou agentes vão acedendo, em princípio, à medida que perfazem determinados módulos de tempo”, conforme expresso no Acórdão do TCANorte que vimos seguindo. Dúvidas inexistem que o que está aqui plasmado é uma situação dinâmica, consagrada como estímulo de natureza horizontal, a qual se consubstancia num melhoramento da remuneração do trabalhador que mantém a mesma categoria e exerce as mesmas funções.
Contudo, o “direito à carreira” não é necessariamente, como têm evidenciado diversos Autores, um “direito à promoção”, esclarecendo VEIGA E MOURA que “o nosso ordenamento jurídico não assegura a nenhum funcionário ou agente o direito de aceder à categoria superior da respetiva carreira, pelo que não há um direito à promoção mas apenas uma expectativa jurídica em ser promovido” (Função Pública...,cit., pág. 423, com carregado nosso. No mesmo sentido, cfr. Parecer nº 99/98, de 25 de Fevereiro, do Conselho Consultivo da PGR); há, portanto, uma clara ideia de não automatismo da promoção (à qual se contrapõe, no entanto,“a faculdade garantida por lei ao funcionário que integre um quadro de progredir em vantagens profissionais, segundo a sua capacidade e o seu tempo de serviço”, conforme ensinava MARCELLO CAETANO, em Manual de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 1980, volume II, págs. 785 e segs).
Posto isto, forçoso é admitir que o direito à progressão na carreira não é o mesmo que um direito à promoção, que não é um direito absoluto, dependendo, antes, de uma globalidade que integra várias componentes (neste sentido, também Acórdão do STA de 27/05/2003, proc. 01526/02) e, portanto, qualquer trabalhador (qualquer candidato) o que tem – no máximo – é uma expectativa jurídica à promoção ou ao acesso a categoria superior.
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Ora, esta evidência genérica permite-nos saltar para o caso em análise, em que o Demandante entende que (1) a DGAJ tinha a obrigação legal, atento os n.ºs 1 e 5 do artigo 16.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro (LOE 2019), de “desencadear em tempo, todos os procedimentos para o preenchimento de todos os lugares dos quadros dos tribunais de secretário de justiça, escrivão de direito e técnico de justiça principal vagos ou preenchidos via substituição, nos termos do artigo 49.º do EFJ” e, em consequência, que (2) os seus associados identificados na P.I., que se candidataram no movimento de 2019, tinham o direito a serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
Partindo, portanto, da asserção de que nenhum funcionário ou agente tem “direito à promoção”, cumpre analisar, agora, se, neste caso concreto, face às normas legais então vigentes, os associados do Demandante, identificados na P.I., tinham, de facto, o direito a serem promovidos no movimento de 2019para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça.
Ora, a resposta a este pedido formulado, de “reconhecimento de direito”, passa por perceber se a DGAJ tinha a obrigação legal de solicitar a obtenção dos Pareceres Prévios dos membros do Governo responsáveis pela área em que se integra órgão, serviço ou entidade em causa e pela área das Finanças e Administração Púbica, para o preenchimento de todas as vagas de secretário de justiça, escrivão de direito e técnico de justiça principal, previstas nos mapas de oficiais de justiça dos Tribunais.
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Assim, cientes de que inexiste um “direito à promoção”, teremos de aquilatar se, ainda assim, o B..., nesta matéria, estava ao abrigo de deveres vinculados e, portanto, deveria ter solicitado – ao invés do que confessadamente fez – os Pareceres prévios impostos no invocado artigo 16.º, n.º 5 da LOE de 2019 (Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro).
Conforme facto provado (documentalmente), o processo que deu origem ao movimento anual dos oficiais de justiça de 2019 vinha sendo preparado há algum tempo, mais propriamente, pelo menos, desde o ano de 2018, ao abrigo do n.º 9 do artigo 18.º da LOE 2018 (Páginas 3 e 4 do PA), norma semelhante à aplicada e invocada pelo Demandante, o artigo 16.º da LOE 2019.
Ora, dispunha a LOE 2018 (Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro):
CAPÍTULO III
Disposições relativas à Administração Pública
SECÇÃO I
Carreira e estatuto remuneratório dos trabalhadores do setor público
Artigo 18.º
Valorizações remuneratórias
1 - Para os titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 2.º da Lei n.º 75/2014, de 12 de setembro, são permitidas, nos termos dos números seguintes, a partir do dia 1 de janeiro de 2018 e não podendo produzir efeitos em data anterior, as valorizações e acréscimos remuneratórios resultantes dos seguintes atos:
a) Alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível ou escalão;
b) Promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos, incluindo nos casos em que dependam da abertura de procedimentos concursais para categorias superiores de carreiras pluricategoriais, gerais ou especiais, ou, no caso das carreiras não revistas e subsistentes, incluindo carreiras e corpos especiais, para as respetivas categorias de acesso.
(...)
7 - As valorizações remuneratórias resultantes dos atos a que se refere a alínea a) do n.º 1 produzem efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018, sendo reconhecidos todos os direitos que o trabalhador detenha, nos termos das regras próprias da sua carreira, que retoma o seu desenvolvimento.
8 - O pagamento dos acréscimos remuneratórios a que o trabalhador tenha direito nos termos do número anterior, é faseado nos seguintes termos:
a) Em 2018, 25 % a 1 de janeiro e 50 % a 1 de setembro;
b) Em 2019, 75 % a 1 de maio e 100 % a 1 de dezembro.
9 - Para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1, as promoções, independentemente da respetiva modalidade, incluindo mudanças de categoria ou posto e as graduações, dependem de despacho prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pela área em que se integra o órgão, serviço ou entidade em causa e pela área das finanças e da Administração Pública, com exceção dos órgãos e serviços das administrações regional e local, em que a emissão daquele despacho compete ao presidente do respetivo órgão executivo das regiões autónomas e das autarquias locais.
10 - O disposto no número anterior é também aplicável nos casos em que a mudança de categoria ou de posto dependa de procedimento concursal próprio para o efeito, incluindo procedimento próprio para obtenção de determinados graus ou títulos, desde que exigidos para integração em categoria superior, situação em que o despacho a que se refere o número anterior deve ser prévio à abertura ou prosseguimento de tal procedimento.
11 - Aos procedimentos internos de seleção para mudança de nível ou escalão são aplicáveis as regras previstas nos n.ºs 9 e 10.
(...)
13 - Os atos praticados em violação do disposto no presente artigo são nulos e fazem incorrer os seus autores em responsabilidade civil, financeira e disciplinar.
14 - Para efeitos da efetivação da responsabilidade financeira a que se refere o número anterior, consideram-se pagamentos indevidos as despesas realizadas em violação do disposto no presente artigo.
Conforme referido no Parecer da DGAEP (Páginas 3 e 4 do PA), esta norma é semelhante à que no ano seguinte saltou para a LOE 2019, Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, através do disposto no artigo 16.º:
Artigo 16.º
Valorizações remuneratórias
1 — Para os titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 2.º da Lei nº 75/2014, de 12 de setembro, em 2019 são permitidas as valorizações e acréscimos remuneratórios resultantes dos atos previstos nos números seguintes.
(...)
5 — São também permitidas, em todas as carreiras que o prevejam, valorizações e acréscimos remuneratórios resultantes de promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos, incluindo nos casos em que dependam da abertura de procedimentos concursais para categorias superiores de carreiras pluricategoriais, gerais ou especiais, ou, no caso das carreiras não revistas e subsistentes, incluindo carreiras e corpos especiais, para as respetivas categorias de acesso, assim como de procedimentos internos de seleção para mudança de nível ou escalão, que tenham despacho prévio favorável dos membros do Governo responsáveis pela área em que se integra o órgão, serviço ou entidade em causa e pela área das finanças e Administração Pública, com exceção dos órgãos e serviços das administrações regional e local, em que a emissão daquele despacho compete ao presidente do respetivo órgão executivo das regiões autónomas e das autarquias locais.
(...)
9 — Os atos praticados em violação do disposto no presente artigo são nulos e fazem incorrer os seus autores em responsabilidade civil, financeira e disciplinar.
10 — Para efeitos da efetivação da responsabilidade financeira a que se refere o número anterior, consideram-se pagamentos indevidos as despesas realizadas em violação do disposto no presente artigo.
Destas normas, no entendimento do Demandante, resultará que o preenchimento dos lugares de Oficiais de Justiça, previstos nas Portarias n.º 84/2018 e 118/2019, a efetuar, em regra, pelo “movimento” previsto no supracitado artigo 18.º do EFJ, será “obrigatório”, o que forçaria o Demandado a solicitar os “Pareceres Prévios” acima identificados.
Contudo, diga-se já, entende este Tribunal que assim não sucede.
A Portaria n.º 84/2018, de 27 de março, fixa os mapas de pessoal das secretarias dos tribunais administrativos e fiscais, enquanto a Portaria n.º 118/2019, de 18 de abril, fixa (altera) o mapa de pessoal dos tribunais judiciais de primeira instância. Como se sabe, o mapa de pessoal é um mero (mas importante) instrumento de gestão, normalmente de elaboração anual (cfr. artigo 29.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 25/2014, de 20 de junho), que contém a indicação do número de postos de trabalho de que o órgão ou serviço carece para o desenvolvimento das suas atividades (permanentes ou temporárias).
Porém, o seu preenchimento não é obrigatório nem a sua aprovação significa que todos os lugares previstos têm (embora se possa admitir que devessem) obrigatoriamente de estar preenchidos e, muito menos, preenchidos através de “promoção” (um dos três meios previstos no EFJ, conforme já acima identificado); as vagas são preenchidas de acordo as “possibilidades” superiormente definidas e disponibilidades orçamentais, entre outros fatores que fazem parte de uma globalidade de que depende o preenchimento das vagas existentes. Por isso é que, muitas vezes, as previsões dos mapas não se encontram totalmente ocupadas. Esta é, aliás, infelizmente, a “regra”, designadamente na Justiça (mas não só), onde é habitual o número de vagas previsto encontrar-se deficitariamente preenchido (inclusivamente quanto ao número de Juízes); como se pode ver na monografia Organização e Funcionamento da Justiça Administrativa e Tributária (Coords. António Cândido de Oliveira e Carlos José Batalhão, AEDREL, 2019) e nos dados estatísticos oficiais, em https://dgaj.justica.gov.pt/Portals/26/5-TRIBUNAIS/Recursos%20Humanos%20nos%20tribunais/Mapa%20Pessoal%20com%20percentagens%20-%20TAFs.pdf?ver=2019-06-03-091133-437 (quanto aos lugares de oficiais de justiça previstos para os tribunais administrativos) e em https://dgaj.justica.gov.pt/Portals/26/5-TRIBUNAIS/Recursos%20Humanos%20nos%20tribunais/Mapa%20Pessoal%20com%20percentagens%20-%20Resumo%20Comarcas.pdf?ver=2019-06-03-091134-970 (para as comarcas judiciais), o défice do “exercício em funções” (titulares e não titulares) para as previsões dos mapas é gritante...
O que significa, claramente, que, tal como inexiste um “direito à promoção”, também não existe, em geral, um “dever de promoção”.
E isso resulta, de forma bem percetível, nos normativos indicados precisamente pelo Demandante e acima transcritos.
Os n.ºs 1 e 5 do artigo 16.º da LOE 2019 (e constavam, também, como vimos, da LOE 2018) estabelecem uma mera possibilidade, que estava há muito afastada por razões de emergência económico-financeira, como se sabe. Ou seja, com estes normativos o legislador afastou a proibição de valorizações remuneratórias que há anos vinham vigorando, ano após ano, tendo retomado essa possibilidade a partir de 1 de janeiro de 2018, embora de forma ainda “tímida”.
Recordando o trajeto legislativo em causa, registe-se que o artigo 24.º, n.º 1 da Lei do Orçamento de Estado para 2011 (Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro) veio vedar a prática de quaisquer atos que consubstanciem valorizações remuneratórias.
Com a Lei do Orçamento de Estado para 2017 (Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro), manteve-se a proibição, mas, tal como se estabeleceu no n.º 1, do artigo 19.º, anunciou-se que “sem prejuízo da eliminação progressiva das restrições e da reposição das progressões na carreira a partir de 2018...” e estabeleceram-se algumas especificidades, que tornaram o regime estabelecido diferente do regime especial (de pura proibição) que vigorou até então.
Na verdade,“durante o ano de 2017 foram prorrogados os efeitos dos artigos 38.º a 42.º, 44.º a 46.º e 73.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro” (cfr. n.º 1 daquele artigo 19.º), embora os números seguintes do normativo tivessem já alguma “abertura”, pelo que apenas com a LOE de 2018 é que regressou a possibilidade de haver valorizações remuneratórias (obrigatórias e outras), embora, como se disse, ainda de forma algo tímida.
E a LOE de 2019 manteve essa possibilidade.
Possibilidade que está, no entanto, delimitada pela mesma fonte normativa (a LOE 2019), no artigo 37.º, de acordo com o qual, para o ano de 2019, ficava o Governo com a obrigação de, até final de junho, lançar “os procedimentos de acesso às categorias de adjunto e de admissão para ingresso dos oficiais de justiça que se revelem indispensáveis ao funcionamento dos tribunais, ao processo de ajustamento ao mapa judiciário e à execução do Programa Justiça + Próxima prosseguido pelo ...”.
Aqui sim, estamos perante poderes vinculados, impendendo sobre o Demandado a obrigação de, até final de junho de 2019, ter lançado o procedimento identificado no artigo 37.º, precisamente o Movimento Anual dos Oficiais de Justiça de 2019, para preenchimento das vagas de escrivão adjunto e de técnico de justiça adjunto.
Apenas para estes existia uma obrigação legal de proceder ao procedimento que possibilitasse aquela promoção.
Daqui se depreende, portanto, inexistir qualquer poder vinculado para o Demandado quanto aos Oficiais de justiça nas categorias de secretário de justiça, escrivão de direito e técnico de justiça principal.
Tudo isto, como também resulta do artigo 37.º da LOE 2019, sem prejuízo da mudança de categorias prevista no artigo 12.º do Estatuto dos Funcionários de Justiça (EFJ).
E para que se perceba o trajeto legislativo recordado, permita-se, ainda, lembrar a Proposta de LOE 2020, a qual, precisamente no artigo 16.º, prevê que seja “a partir do ano de 2020 (é) retomado o normal desenvolvimento das carreiras, no que se refere a alterações de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível ou escalão, passando o pagamento dos acréscimos remuneratórios a que o trabalhador tenha direito a ser feito na sua totalidade”.
É este o percurso legislativo que as valorização remuneratórias tiveram nas várias LOE até hoje.
Pois bem,
Percorrido este caminho, chegamos, pois, ao destino fulcral dos presentes autos: ao invés do alegado pelo Demandante, não existia uma obrigação legal de solicitar a obtenção dos Pareceres Prévios para o preenchimento de todas as vagas para as categorias de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça. Por isso, enquadrado pelo princípio da legalidade, o objeto do procedimento de promoção cingiu-se, conforme despacho da Senhora Secretária de Estado da Administração e Emprego Público, de 2 de abril de 2019, às categorias de escrivão adjunto e de técnico de justiça adjunto.
Tal como referiu a entidade Demandada nas suas alegações, mesmo que se identifiquem necessidades de oficiais de justiça indispensáveis ao funcionamento dos tribunais, no que se reporta a outras categorias, tal como plasmado nos mapas de pessoal fixados nas Portarias acima nomeadas, tais necessidades não têm de ser todas preenchidas, como demonstrado, e muito menos o teriam pela via da “promoção”, em 2019, ano em que apenas estavam autorizados – como obrigação - até final de junho, “os procedimentos de acesso às categorias de adjunto e de admissão para ingresso dos oficiais de justiça que se revelem indispensáveis ao funcionamento dos tribunais, ao processo de ajustamento ao mapa judiciário e à execução do Programa Justiça + Próxima prosseguido pelo Ministério...” (artigo 37.º da LOE 2019).
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Resolvida a questão central , o Tribunal ainda se pronuncia sobre a alegação do Demandante (artigo 27.º da P.I.) de que o não preenchimento dos lugares vagos contrariará alguns princípios com assento constitucional, nomeadamente os princípios da igualdade e proporcionalidade, para expressar que, não obstante tal alegação, há uma evidente falta de concretização e densificação do alegado, não se vislumbrando que se verifique qualquer violação desses princípios constitucionais.
Aliás, o Demandante começa as tentativas de fundamentar o alegado com a invocação de um Acórdão do TCANorte (artigo 29.º da P.I.), de forma totalmente descontextualizada, pois a situação nele decidida não tem qualquer paralelo com o objeto da presente demanda. Depois, apresenta uma tese peregrina, conforme já evidenciado supra, relativamente à “dispensa” de parecer prévio, sendo que o Tribunal julga que o parecer prévio para o preenchimento dos lugares seria sempre obrigatório à luz do n.º 5 do artigo 16.º da LOE 2019, sendo nulas todas as promoções que não cumpram tal formalidade (conforme expressamente dispõe o n.º 9 daquele normativo). Por fim, discorre (finalmente) sobre os princípios invocados, mas de forma genérica e abstrata, embora acertada, nunca concretizando e densificando as demonstrações teóricas, nomeadamente subsumindo-as ao caso concreto, como deveria.
De qualquer forma, sempre se recordará, como a jurisprudência tem vindo a afirmar repetidamente, que o princípio da igualdade, como limite da discricionariedade legislativa (e administrativa), não exige o tratamento igual de todas as situações, mas implica, antes, que sejam tratados igualmente os que se encontram em situações iguais e tratados desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de maneira a não serem criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento material bastante. O princípio da igualdade não proíbe que se estabeleçam distinções, mas sim distinções desprovidas de justificação objetiva e racional – ver, entre muitos outros, AC TC nº 468/96, de 14.03.96, Processo nº 87/95; AC TC nº 1057/96, de 16.10.96, Processo nº 347/91 e AC TC nº 128/99, de 03.03.99, Processo nº 140/97; AC TC nº 254/2000, de 23.05.2000; AC TC nº 426/2001, de 16.11.2001.
A este propósito, tem o Supremo Tribunal Administrativo afirmado, em consonância com o entendimento pacífico do Tribunal Constitucional e da doutrina, que as exigências do princípio da igualdade se reconduzem, no fundo, à proibição do arbítrio, não impedindo, pois, em absoluto, toda e qualquer diferenciação de tratamento, mas apenas as diferenciações materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou justificação objetiva e racional, como são as baseadas nos motivos indicados no preceito constitucional (artigo 13.º. Cfr., entre outros, o Acórdão do STA de 14 de Maio de 2008).
Significa isto que, mesmo que detetada, na lei, uma situação geradora de desigualdade, tudo estará em saber se essa desigualdade se revela como discriminatória e arbitrária, por desprovida de fundamento material bastante atenta a natureza e especificidade da situação, os efeitos tidos em vista pelo legislador, e o conjunto de valores e fins constitucionais.
Nada disto é demonstrado pelo Demandante...
Por sua vez, o princípio da proporcionalidade, como exigência dirigida ao legislador, ou seja, como sub-princípio do princípio do Estado de Direito [artigo 2.º da CRP], e, portanto, como parâmetro de controlo jurisdicional da atividade legislativa (e administrativa), reconduz-se essencialmente a uma proibição do excesso.
Como observa GOMES CANOTILHO, “o controlo judicial baseado no princípio da proporcionalidade não tem extensão e intensidade semelhantes consoante se trate de atos legislativos, de atos da administração ou de atos de jurisdição. Ao legislador […] é reconhecido um considerável espaço de conformação […] na ponderação dos bens quando edita uma nova regulação. Esta liberdade de conformação tem especial relevância ao discutir-se os requisitos da adequação dos meios e da proporcionalidade em sentido restrito. Isto significa que perante o espaço de conformação do legislador, os tribunais se limitem a examinar se a regulação legislativa é manifestamente inadequada”(em Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição, 2000, págs. 270 e 271; ver, ainda, a este propósito, Acórdão do TC n.º 187/01, de 26 de junho de 2001).
Face a este pertinente conteúdo dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, resulta não se vislumbrar razões para violação no caso concreto, seja pelo legislador da LOE de 2019, seja pelo Demandante na sua atuação, que se julga absolutamente conforme, precisamente, com o disposto nessa LOE, para além de, como já referido, tais razões também não se encontrarem densificadas pelo Demandante.
Assim, sempre se dirá que não basta invocar a verificação em abstrato de qualquer violação de princípio ínsito em lei ordinária ou inconstitucionalidade, importando que a sua verificação seja densificada e demonstrada, subsumida ao caso concreto, o que não ocorreu.
Como tem vindo a ser reconhecido pela generalidade da Jurisprudência (ver o Acórdão do TCASul n.º 02758/99, de 19 de fevereiro de 2004), “não é de conhecer por omissão de substanciação no corpo de alegação, a violação dos princípios Constitucionais, designadamente por interpretação desconforme mormente à Lei Fundamental, se o Recorrente se limita a afirmar a referida desconformidade de interpretação e de aplicação, sem apresentar, do seu ponto de vista, as razões de facto e de direito do discurso jurídico fundamentador nem, sequer, a modalidade a que reverte o vício afirmado.”
No mesmo sentido aponta, igualmente, o Acórdão do Colendo STA n.º 00211/03, de 29 de abril de 2003, onde se refere que “por omissão de substanciação no articulado inicial e nas alegações de recurso, não é de conhecer da questão da inconstitucionalidade e/ou interpretação desconforme à CRP de normas de direito substantivo …, na medida em que a Recorrente se limita a afirmar, conclusivamente, a referida desconformidade sem que apresente, do seu ponto de vista, as razões de facto e de direito do discurso jurídico fundamentador nem, sequer, a que modalidade reverte o vício afirmado”.
Assim, até por falta de concretização e densificação do alegado, não se vislumbra que se verifique qualquer violação de princípios, mormente constitucionais.
V. Decisão Arbitral
À luz dos fundamentos expostos, julgo totalmente improcedente a presente ação interposta pelo Sindicato Demandante, e, em consequência, não reconheço o direito dos Oficiais de Justiça, associados do Sindicato Demandante e melhor identificados na P.I., que se candidataram no movimento de 2019, a serem promovidos para os lugares vagos de escrivão de direito, técnico de justiça principal e secretário de justiça
Encargos nos termos previstos no artigo 29.º n.º 5 do RCAAD, tendo em conta o valor do processo, anteriormente já decidido.
Deposite-se, registe-se e notifiquem-se as partes.
Porto, 22 de março de 2020
O Árbitro,
Carlos José Batalhão