Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 1292/2019-A
Data da decisão: 2020-02-26  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Pagamento de um subsídio mensal - Incompetência material do Tribunal Arbitral.
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DESPACHO - DECISÃO

 

I.             RELATÓRIO

 

O Demandado A... (doravante, “A...”), com sede na ..., ...-..., em Lisboa (doravante, “DEMANDADO”), é uma entidade previamente vinculada ao Centro de Arbitragem Administrativa (doravante, “CAAD”), nos termos da Portaria n.º 1120/2009, de 30.09.2009 (doravante, “Portaria n.º 1120/2009”).

 

Ao abrigo das alíneas f) e g) do n.º 1 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009 e do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do (novo) Regulamento de Arbitragem Administrativa do CAAD, com a alterações de 09.04.2018 (doravante, “REGULAMENTO”), o Demandante B... (doravante, “B...”), com sede na Rua ..., n.º..., ..., ...-..., em Lisboa, (doravante, “DEMANDANTE”), veio, em 02.09.2019, através de correio eletrónico, requerer a submissão do presente litígio ao CAAD, através de requerimento, juntando a respetiva Petição Inicial.

 

No referido articulado, o Demandante peticionou, a final, (i) a condenação do Demandado a reconhecer a todo o pessoal do C..., em exercício de funções nos estabelecimentos ... das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, o direito à perceção do subsídio mensal de fixação previsto no artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho; e (ii) a condenação do dirigente máximo do serviço da Direção-Geral D... a adotar a conduta necessária ao restabelecimento do subsídio mensal de fixação e à prática do ato administrativo conducente à perceção, processamento e pagamento do referido subsídio a todo o pessoal do C... em exercício de funções nos estabelecimentos das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.

 

Tendo sido regularmente citado, em 05.09.2019, o Demandado, em sede de contestação, a 23.09.2019, sustentou que (i) o CAAD é materialmente incompetente para decidir sobre o litígio em apreço, de acordo com a alínea c) do n.º 3 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009, e (ii) a ação deve ser julgada improcedente, por não provada.

 

No seguimento da contestação do Demandado, o Demandante apresentou, em 03.10.2019, requerimento de resposta.

 

Em 08.10.2019, o Demandado apresentou a sua resposta a este requerimento.

 

Posto isto, por requerimento de 14.10.2019, o Demandante pediu o desentranhamento deste requerimento, apresentado pelo Demandado em 08.10.2019.

 

Por correio eletrónico, datado de 04.10.2019, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD notificou o Senhor Dr. Nuno Pimentel Gomes da respetiva designação como árbitro de tribunal arbitral singular, cuja designação foi aceite em 7.10.2019.

 

Em 8.10.2019., foram as Partes notificadas da designação do árbitro, constituindo-se o Tribunal arbitral na referida data.

 

***

 

II.            DA ADMISSIBILIDADE DOS REQUERIMENTOS

 

Cumpre, desde logo, decidir a admissibilidade do requerimento apresentado pelo Demandado em 08.10.2019.

 

Neste requerimento, vem o Demandado requerer, a final, o seguinte:

“Em face do exposto, a entidade demandada oferece o merecimento de tudo quanto invocou na sua contestação e, em consequência, renova que deverá julgar-se procedente a exceção dilatória de incompetência material do CAAD e, em consequência, a entidade demandada deverá ser absolvida da instância.”.

Nesta sequência, veio o Demandante, por requerimento, por sua vez, apresentado em 08.10.2019, referir:

“(i) que, considerando que o Réu tinha suscitado matéria de exceção em sede de contestação, poderia o Autor, ao abrigo dos n.ºs 3 e 4 do artigo 3.º do CPC, responder, o que tinha feito; e (ii) o princípio da igualdade não permitiria que se pudesse responder a esta Resposta, “(…) sob pena de se estar a criar uma desigualdade substancial no uso dos meios da defesa.”, requerendo o desentranhamento do “(…) identificado requerimento anómalo, devolvendo-o à procedência”.

 

Vem, ainda, com o referido requerimento juntar cópia de uma Decisão Arbitral do CAAD, proferida no processo n.º 23/2015-A.

 

Cumpre decidir.

 

Nos termos do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento, recebida a petição inicial, o CAAD procede à citação do demandado e dos eventuais contrainteressados no prazo de 20 dias, podendo ser deduzida reconvenção no mesmo prazo.

 

Sendo remetida a contestação, caso tenha sido deduzida reconvenção, o Demandante pode responder no prazo de 20 dias a contar da data da respetiva notificação, nos termos do n.º 5 do artigo 12.º do Regulamento.

 

Assim, não se prevê no Regulamento qualquer articulado posterior à apresentação da resposta à reconvenção – que, no caso, se equipara à réplica prevista nos termos do artigo 85.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante, “CPTA”).

 

Deste modo, considerando o alegado pelo Demandante, bem como o teor dos requerimentos apresentados por si e pelo Demandado, respetivamente, em 03.10.2019 e em 08.10.2019, colocam-se duas questões: uma primeira relativamente à admissibilidade da resposta apresentada à Contestação e uma segunda relativamente à admissibilidade da resposta apresentada a esta última (resposta).

 

No que concerne à primeira, considerando que, em sede de Contestação, o Demandado suscitou uma exceção dilatória de incompetência material do CAAD para decidir sobre o litígio que lhe foi apresentado, e que, atento o teor da resposta apresentada em 03.10.2019, o Demandante respondeu à invocação desta exceção, o Tribunal Arbitral decide, ao abrigo dos princípios da autonomia arbitral na condução do processo e na determinação das regras aplicáveis e da celeridade e flexibilidade processual, previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 5.º do Regulamento, admitir o referido articulado.

 

Com efeito, pese embora o n.º 5 do artigo 12.º do Regulamento, restrinja a apresentação do referido articulado de resposta aos casos em que, em sede de contestação, o Demandado tenha apresentado pedido reconvencional, considerando que este invocou uma exceção dilatória (de incompetência material do CAAD para conhecer do presente litígio) e que a matéria de exceção admite resposta, ao abrigo do princípio do contraditório, previsto, em geral, no n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil e na alínea d) do n.º 1 do artigo 5.º do Regulamento, o desentranhamento da resposta à Contestação iria redundar, por sua vez, na atribuição de prazo para que o Demandante pudesse, se assim o entendesse, responder à exceção mencionada, o que já fez.

 

Redundaria, portanto, não só na prática de um ato inútil, como, e sobretudo, atentaria contra a celeridade e flexibilidade processuais característicos dos processos arbitrais.

 

Decide-se, assim, admitir o referido articulado de resposta à Contestação.

 

Quanto à segunda questão – a de saber se é admissível a apresentação de resposta à resposta apresenta à Contestação –, cumpre, desde logo, sublinhar que, à semelhança do que se expôs relativamente àquele articulado, o artigo 12.º do Regulamento não prevê, também ele, a apresentação desta resposta (cujo teor, em abstrato, se assemelharia à tréplica prevista nos termos do n.º 6 do artigo 85.º-A do CPTA).

 

Com efeito, não tendo sido apresentado pedido reconvencional pelo Demandado, o Demandante não alegou, por sua vez, quaisquer exceções que devessem ser objeto de resposta em articulado subsequente.

 

Ademais, atento o teor do articulado de resposta à resposta apresentada à Contestação, constata-se que o mesmo reitera o já anteriormente exposto em sede de Contestação.

 

Pelo que, considerando que, in casu, não haveria matéria cujo teor devesse ser, ao abrigo do princípio do contraditório, objeto de resposta (por articulado ou por outro meio), e que, atento o disposto no artigo 12.º do Regulamento, tal articulado não se encontra previsto, deve o mesmo ser desentranhado dos presentes autos.

 

***

 

III.          DA EXCEÇÃO DILATÓRIA DE INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL ARBITRAL

 

Estando perante uma questão respeitante a uma relação jurídica de emprego público – a de saber se todo o pessoal do C... em exercício de funções nos estabelecimentos ... das Região Autónomas da Madeira e dos Açores tem direito à perceção do subsídio mensal de fixação –, pode ser, em abstrato, constituído tribunal arbitral para o seu julgamento, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 180.º do CPTA.

 

Trata-se, assim, de uma matéria arbitrável.

 

Foi, contudo, invocada pelo Demandando uma exceção dilatória de incompetência do CAAD para conhecer o presente litígio.

 

Alega, em síntese, que, tendo o A... se pré-vinculado à resolução por via arbitral através do CAAD de questões jurídicas de emprego público, por via do disposto na Portaria n.º 1120/2009, de 30 de setembro, esta vinculação não abrange os litígios referentes a remunerações e suplementos, como é aqui o caso.

 

Seria, assim, o CAAD materialmente incompetente.

 

Em resposta, o Demandante invoca uma Decisão arbitral / Sentença, proferida por tribunal constituído sob a égide do CAAD, em 01.07.2019, requerendo a improcedência da referida exceção.

Cumpre decidir.

 

Nos termos do n.º 1 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009, de 30 de setembro, é estabelecido que:

“[p]ela presente portaria vinculam-se à jurisdição do Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD os seguintes serviços centrais, pessoas colectivas públicas e entidades que funcionam no âmbito do A...: (…) f) A Direcção-Geral D...; g) A Direcção-Geral ...(…)”.

 

Sucede, contudo, que determinados litígios são expressamente excluídos do âmbito da referida vinculação.

 

Assim dispõe o n.º 3 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009 o seguinte:

“Tendo em conta a natureza do vínculo de nomeação da relação jurídica de emprego público e as funções em causa, o disposto no número anterior é aplicável aos litígios relativos às carreiras de inspecção da Inspecção-Geral dos ..., de investigação criminal da ... e do pessoal do C... da Direcção-Geral dos ... excepto no que respeita a: (…) c) Remunerações e suplementos (…);”.

 

A presente petição inicial destina-se não só ao reconhecimento a todo o pessoal do C... em exercício de funções nos estabelecimentos da Madeira da Região Autónoma da Madeira e da Região Autónoma dos Açores o direito à perceção do subsídio mensal, previsto nos termos do artigo 80.º do Decreto-Lei n.º 204-A/2001, de 26 de julho, como à condenação do dirigente máximo do serviço da Direção Geral de D... a adoção de uma conduta necessária ao restabelecimento do identificado subsídio e à prática do ato administrativo conducente à perceção, processamento e pagamento do mesmo a todo o pessoal do C... em exercício de funções nos estabelecimentos ... da Região Autónoma da Madeira e da Região Autónoma dos Açores.

 

A causa de pedir está, por sua vez, necessariamente conexionada com matéria atinente à perceção, processamento e pagamento de um subsídio (mensal), que pode ser concebido como uma remuneração adveniente de um determinado estatuto.

O litígio em questão está, portanto, intimamente relacionado com questões atinentes a remunerações e suplementos.

 

A exclusão destes litígios do âmbito da vinculação da Direção-Geral dos ... e da Direcção-Geral de ... ao CAAD e, por sua vez, a inexistência de qualquer convenção de arbitragem determinam, assim, que in casu o Tribunal arbitral não seja materialmente competente.

 

Veja-se, neste sentido, a mais recente jurisprudência do CAAD, como seja a Decisão Arbitral / Sentença, de 10.11.2019, (TIAGO LEOTE CRAVO), proferida no âmbito do processo n.º 11/2019-A, e a Decisão Arbitral / Sentença, de 20.12.2019, (VASCO XAVIER MESQUITA), proferida no âmbito do processo n.º 1284/2019-A, ambos disponíveis em www.caad.org.pt.

 

Pelo que, à luz da alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º da Portaria n.º 1120/2009, o CAAD é materialmente incompetente para dirimir o presente litígio, devendo, por isso, o demandado ser absolvido da instância.

 

 

IV.          DECISÃO

 

Nos termos e com os fundamentos expostos, decide-se:

a)            Declarar a incompetência material do Tribunal Arbitral do CAAD, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 3 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009;

 

b)           Absolver da instância o Demandado.

 

Os encargos devem ser suportados em partes iguais, pelo Autor e pelo Réu, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 29.º do Regulamento de Arbitragem do CAAD.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 26 de fevereiro de 2020

 

 

O Árbitro único

 

(Nuno Pimentel Gomes)