Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 347/2016-T
Data da decisão: 2017-01-24  IRC  
Valor do pedido: € 275.844,33
Tema: IRC – Gastos; Sociedade desportiva; Preços de transferência; Aquisição de serviços de intermediação na contratação de jogadores de futebol; Aquisição de direitos de imagem de jogadores de futebol; Mais-valias
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Decisão Arbitral

 

            Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelos outros Árbitros), Prof. Doutor Rui Duarte Morais e Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 16-09-2016, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

           

A…, NIF…, com sede no …, …, …, …, …(doravante A… ou Requerente), veio, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, na alínea b) do n.º 2, do artigo 6.º, e na alínea a) do n.º 1 e do n.º 2, do artigo 10.º, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), deduzir pedido de anulação parcial da liquidação de IRC e juros compensatórios n.º 2016 … (documento n.º 2016 …), no valor total de 1.090.191,05€, que inclui imposto, derrama, outros acrescidos e juros (compensatórios e de mora), relativa ao exercício de 2012.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

A Requerente designou como Árbitro o Prof. Doutor Rui Duarte Morais, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b), do RJAT.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-07-2016.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e do n.º 3 do RJAT, e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro o Dr. Emanuel Augusto Vidal Lima.

Os Árbitros designados pelas Partes acordaram em designar o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa como árbitro presidente, que aceitou a designação.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 31-08-2016.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 16-09-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que suscitou a excepção da intempestividade e caducidade do direito de acção e defendeu que o pedido deve ser julgado improcedente.

A Requerente respondeu à excepção e requereu a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira como litigante de má-fé.

Por despacho de 14-11-2016, foi decidida a improcedência da excepção e do pedido de condenação por litigância de má-fé.

            Em 02-12-2016, realizou-se uma reunião em que foram inquiridas as testemunhas e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.

            As Partes apresentaram alegações.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

            As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

Não há obstáculos à apreciação do mérito da causa.

 

2. Matéria de facto

 

            2.1. Factos provados

 

            Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)      A Requerente é a sociedade desportiva que agrega a actividade de futebol profissional masculino do B…;

b)      O A… foi alvo de uma inspecção tributária à sua actividade relativa ao ano de 2012 – que culminou num relatório final de inspecção, que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 II.3.1. Identificação e domicílio

O sujeito passivo (SP) A…, com o número de identificação fiscal (NIF) … é uma sociedade anónima desportiva, constituída por escritura pública de 1998-06-26.

Resultou da personalização jurídica da equipa de futebol sénior do B…, nos termos da alínea b) do n.º 3 do Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de abril - Regime Jurídico das SAD.

Tem sede e domicílio fiscal no …, …, …, …, …, …-… …, na área do Serviço de Finanças de …-… .

II.3.2. Atividade exercida

O sujeito passivo encontra-se inscrito para o exercício da atividade a que corresponde o CAE "… -Atividades dos clubes desportivos", desde 1998-06-26.

A sociedade tem por objeto social "a participação na modalidade de futebol e participações desportivas de carácter profissional, a promoção e organização de espetáculos desportivos e o fomento e desenvolvimento de atividades relacionadas com a prática desportiva profissionalizada da respetiva modalidade".

A A… é uma sociedade desportiva que se rege pelo regime jurídico especial estabelecido no Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de abril, de acordo com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 107/97, de 16 de setembro.

As sociedades desportivas são um tipo de sociedades subsidiariamente reguladas pelas regras gerais aplicáveis às sociedades anónimas, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro, com as alterações que lhe foram introduzidas por legislação posterior, e pela legislação complementar aplicável às sociedades anónimas, como seja o Código de Valores Mobiliários, mas com algumas especificidades decorrentes das especiais exigências fia atividade desportiva que constitui o seu principal objeto.

III.3.3. Enquadramento tributário

A A…, enquanto pessoa coletiva, encontra-se sujeita, por força do quadro legal vigente em Portugal a diversos tributos, nomeadamente a IRC e a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).

De acordo com o artigo 3.º do Código do IRC, trata-se de uma entidade residente que exerce, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, o que a torna um sujeito passivo de imposto e dele não isento.

No que se refere ao IVA, trata-se de um sujeito passivo de imposto e dele não isento, nos termos do artigo 2º do Código do IVA, enquadrado no regime normal de tributação com periodicidade mensal.

III.3.4. Detentores do capital

No início do período em análise, o capital social da A… totalmente subscrito e realizado, no montante de 5.835.420 EUR, estava representado por 1.167.084 ações ordinárias nominativas, de valor nominal de 5 EUR cada.

No período de tributação de 2012, após realizações de capital no montante de 164.580 EUR, subscrito integralmente pelo B…, o capital realizado atingiu os 6.000.000 EUR.

As ações detidas pelo B… são da categoria A, com direito de veto em geral. As restantes ações são da categoria S e tem o direito normal: 10 ações = 1 voto.

(...)

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

 

III.1. IRC-GASTOS NÃO ACEITES FISCALMENTE

O n.º 1 do artigo 17.º do Código do IRC estabelece que o resultado líquido do período determinado com base na contabilidade é uma das componentes do lucro tributável, constituída por elementos positivos (rendimentos ou ganhos) e elementos negativos (gastos ou perdas).

Para definir quais são estes elementos negativos, o n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC enuncia, como critério geral, que se consideram como gastos ou perdas, aqueles que, devidamente comprovados, sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos ou ganhos sujeitos a imposto e para a manutenção da respetiva fonte produtora.

O aspeto fundamental da consideração fiscal dos gastos empresariais assenta no conceito da sua indispensabilidade inerente ao n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Trata-se, antes de mais, de garantir que sucedeu um consumo de um bem ou serviço na esfera da empresa e depois comprovar que o consumo desse bem ou serviço se mostra adequado ao encargo suportado e aos fins empresariais, como sejam a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou a manutenção da fonte produtora.

Nestes termos, o tema "indispensabilidade" só se coloca perante gastos ou serviços efetivamente comprovados.

Nos casos em que a presunção da veracidade declarativa seja afastada, cabe ao sujeito passivo o ónus da prova de que os encargos contabilizados correspondem inequivocamente a serviços prestados e, caso seja provada a sua existência, que correspondem a encargos indispensáveis para a obtenção dos seus rendimentos.

De acordo com o artigo 74.º da LGT "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque", sendo certo que ao sujeito passivo cabe o ónus da prova da indispensabilidade dos gastos registados, para efeitos de determinação da matéria coletável em sede de IRC e que esses gastos existiram de facto, sob pena da respetiva despesa não ser fiscalmente dedutível.

III.1.1. GASTOS RELATIVOS À AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS DE INTERMEDIAÇÃO NA CONTRATAÇÃO DE JOGADORES

O sujeito passivo considerou como gasto encargos suportados na aquisição/ renovação dos direitos de contratação dos jogadores identificados, com serviços de intermediação / representação prestados por agentes de jogadores/empresários desportivos na celebração desses negócios.

Da análise documental efetuada verificou-se que os registos dos valores no ativo intangível, relativo às prestações de serviços de intermediação/representação, se encontram geralmente suportado por "acordos" celebrados entre a A… e o agente / empresa do agente, onde o SP se compromete a pagar àquele(a) se o jogador assinar / renovar contrato com a A… .

Analisando os contratos de trabalho desportivo celebrados entre a A… e cada um dos jogadores, verifica-se que, em grande parte deles, ficou expresso que a participação do agente era feita em nome e em representação do jogador, tendo ficado confirmado, pelas várias entidades que assinaram o contrato, que o agente agiu em representação do jogador.

Noutras situações, em que o contrato de trabalho desportivo é omisso ou não refere que o agente representava o jogador, ficou confirmado, por outras fontes, que serão expostas caso a caso, que o agente agiu em representação do jogador e não da A… .

Assim, resulta dos "acordos" que a A… aceita suportar os encargos de intermediação / representação efetuada em nome dos jogadores.

Ora, para um encargo configurar um gasto, ele deve corresponder, inelutavelmente, ao consumo de um bem / serviço na esfera dessa entidade.

Por conseguinte, não tendo o consumo do serviço ocorrido em representação da A…, não se podem considerar estes encargos como gastos fiscais do SP, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Acerca da entidade representada

O (novo) Regulamento FIFA, relativo aos Agentes de Jogadores, aprovado pelo Comité Executivo da FIFA em 2007-10-29 e com entrada em vigor em 2008-01-01, preconiza que a remuneração do agente seja efetuada exclusivamente pelo seu cliente.

Repare-se que o Regulamento dos Agentes, no n.º 8 do seu artigo 19.º, ainda com o intuito de evitar conflitos de interesses, impõe a proibição da "dupla representação" e determina que um agente de jogadores só poderá representar ou gerir os interesses de uma das partes envolvidas na operação.

Mas não são só os Regulamentos FIFA que impõem tal disposição.

O Regime Jurídico do Contrato de Trabalho Desportivo e do Contrato de Formação Desportiva (RJCTD), publicado com a Lei n.º 28 /98, de 26 de junho, prevê no n.º 2 do artigo 22.º que "a pessoa que exerça a atividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da relação contratual"."

Consequentemente, nos termos do n.º 1 do artigo 24.º do RJCTD, "só podem ser remuneradas pela parte que representam".

Esta situação anómala, de o clube / SAD remunerar o agente do jogador, é algo usual, para a qual João Leal Amado tem alertado: «(...) as ambiguidades e indefinições que frequentemente rodeiam a atividade de empresários/intermediários refletem-se, não apenas na circunstância de estes poderem desempenhar funções em proveito de qualquer das partes, mas inclusive no facto, claramente anómalo, de tais empresários, mesmo quando prestem os seus serviços ao praticante, por vezes serem remunerados pelo clube (!) ou até verem a sua remuneração dividida (ou multiplicada) por ambos intervenientes (...).

O enquadramento da atividade dos empresários desportivos na celebração de contratos de cedência, aquisição e renovação dos direitos desportivos dos jogadores, foi esclarecido com a publicação da Circular n.º 15/2011 da DGCI.

A questão fulcral para a aceitação do encargo na esfera da A… seria saber quem o agente representava e que considerou indispensável incluí-lo no negócio.

Esta questão foi cabalmente respondida pelo SP aquando da celebração dos contratos com cada jogador onde, de forma expressa, ficou declarado, por todas as partes, que o agente representou o jogador.

Em outros casos, em que não ficou contratualmente expressa a representação em nome do jogador, comprovou-se, por outros documentos, que o agente/representante representava de facto o jogador.

No que diz respeito ao enquadramento jurídico-tributário deste encargo, dispõe a alínea c) do n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRC que, "os encargos que incidam sobre terceiros que a empresa não esteja legalmente autorizada a suportar", não são dedutíveis para a determinação do lucro tributável.

Correspondendo os encargos em causa à remuneração do empresário desportivo enquanto representante do jogador no negócio, aqueles encargos configuram encargo do jogador e não da A… .

Assim, só poderia vir a constituir-se encargo da A…, se tivesse ficado legalmente previsto, nomeadamente em contrato assinado com o jogador, que caberia ao SP suportar o encargo devido com a representação do jogador, ou seja, a cedência de dívida do jogador para a A… .

Neste caso, também não poderia deixar de ser considerado como um rendimento a tributar na esfera do jogador, sujeito a retenção na fonte a efetuar pela entidade patronal, o que, de acordo com os registos contabilísticos do SP, não aconteceu.

Conclusão

Os agentes representaram os jogadores e não a A…, pelo que foram os jogadores que impuseram a sua presença no negócio.

Não tendo o serviço sido prestado em representação da A…, não corresponde ao consumo de um serviço na esfera do SP, donde não configura um gasto comprovada mente indispensável para a realização dos rendimentos ou para a manutenção da fonte produtora, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Por outro lado, tendo o agente agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA impõem que aquele só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRC, este encargo não poderia ser dedutível para a determinação do lucro tributável.

III.1.1.1. Gastos relativos à contratação de "F…"

No período de tributação de 2012, a A… contabilizou o seguinte lançamento, relativo a amortização dos gastos referentes à aquisição dos direitos desportivos económicos e à alienação dos mesmos direitos desportivos do jogador F…:

Do montante de 53.742,47 EUR, registado a débito da conta 64.3141, o valor de 6.250,00 EUR corresponde à amortização de 25% de ¼ dos gastos na intermediação, no valor total de 100.000.00 EUR, relacionados com a aquisição dos direitos financeiros e desportivos do jogador.

O valor em causa, de 100.000,00 EUR, foi contabilizado a título de prestação de serviços de intermediação na aquisição dos direitos de inscrição do jogador, conforme "Acordo" assinado em 2008-07-24, entre a A… e G… Advogados Associados, representada por H… .

Do documento em causa consta que: «O primeiro outorgante obriga-se a pagar ao segundo outorgante a quantia de 100.000,00 Euros (...), pela sua intervenção na aquisição dos direitos de inscrição desportiva do atleta F….»

Os direitos desportivos e financeiros do jogador F… foram adquiridos pela A… ao I…, conforme "Contrato de cedência de direitos desportivos" assinado em 2008-07-24. Este contrato não faz referência à intervenção de qualquer agente.

O n.º 1 do artigo 28.º do Regulamento FIFA, relativo aos Agentes de Jogadores, que entrou em vigor em 2008-01-01, estatui a obrigatoriedade de que, em qualquer contrato em que o agente intervenha em representação dos interesses do clube, aquele agente deve estar identificado como tal.

Maqueta data de 2008-07-24, a A… celebrou com o jogador F… um "Contrato de trabalho desportivo".

Na cláusula décima-primeira consta que: «As partes declaram que o presente contrato foi celebrado sem a intervenção de agentes de jogadores.»

Conforme consta do relatório da inspeção tributária, que concluiu sobre a ação de inspeção tributária credenciada peta Ordem de Serviço n.º … 2012 …:…

«Por outro lado, foi possível detetar referências em líquido da internet de que o Sr. H… age como empresário do jogador: «O F… fez um bom trabalho no … durante o campeonato português, e isso despertou interesse de outros clubes”, disse H…, empresário do jogador, que segue para Portugal e irá acompanhar o jogador na apresentação à nova equipe», (vide notícia completa em http://br.esportes.yahoo.com...».

Fazendo uma pesquisa pela Internet, encontramos muitas outras notícias da mesma data, em que é referido o nome de H…, como empresário, agente, procurador ou “manager” do jogador:

i) 2008-…-…, notícia Primeira Liga; «H…, procurador do atleta, sustenta que do empréstimo é negociável, (...)»;

ii) 2008-…-…, Manchete / A Bola: «Sondagem a F…(...) O B… fez recentemente uma sondagem junto do agente do atleta, H…. (...)»

iii) 2005-…-…, notícia Desportivo Paulense: «F… por quatro épocas (...) A transferência do centro campista (...) ficou ontem estabelecida durante uma reunião entre o presidente do …, J…, o "manager", K…, e o procurador do atleta, H…, que detém 12,5 por cento do passe.»

iv) 2008-…-…, notícia Mais Futebol:«o meia-atacante F…, de 25 anos, foi negociado por seu empresário H…, com o B… por 1 milhão de euros para atuar por quatro temporadas.»™.

Face aos documentos descritos e existindo a indicação expressa de que o advogado H…, representante da G…, Advogados Associados, teria representado o jogador e não a A…, resultou, do confronto entre a factualidade descrita e a alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, o afastamento da presunção de veracidade contabilística dos encargos contabilizados como referentes a um serviço prestado em representação do SP.

Assim, no âmbito do procedimento de inspeção ao exercício de 2008, foi o SP notificado para «comprovar, por escrito, a indispensabilidade dos encargos suportados no valor de €100.000,00, com o contrato celebrado com a G… Advogados Associados, datado de 24/07/2008, para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora»

Na resposta àquela notificação, o SP alegou que «A B… na expectativa de concretizar uma elevada mais valia com a cedência dos direitos detidos sob o atleta F…, outorgou contrato com a G… Advogados para melhor atingir os seus objetivos» e que «As negociações foram sempre conduzidas desde o Brasil por esta sociedade que, apenas não aparece mencionada no contrato de trabalho do atleta em causa uma vez que, a sua atuação foi na intermediação entre a B… e o I…».

No âmbito de procedimentos de inspeção posteriores, em resposta a notificações idênticas, a A… manteve a mesma resposta. Não apresentou quaisquer documentos / elementos que pudessem comprovar que o "agente" estava a representar a A… e/ou que afastassem o envolvimento do "agente" com o jogador.

O "acordo" com a entidade G… Advogados Associados, que a A… apresenta, foi celebrado na mesma data que celebrou o "Contrato de trabalho desportivo" com o jogador.

Atendendo à mesma data de celebração de ambos os contratos, não se pode deixar de concluir que não permitiriam uma margem temporal de negociação entre entidades que não estivessem vinculadas já entre si.

Neste contexto, está colocada em causa a realização de um serviço à A… e a sua indispensabilidade.

Tendo sido ilidida a presunção de veracidade de que a contabilidade e o acordo exibido poderiam gozar, competiria ao SP comprovar que tal encargo consubstanciava operações na realidade efetuadas ao serviço da A… e que este era indispensável à realização dos seus rendimentos, o que não sucedeu.

Conclui-se, portanto, pela não aceitação como gasto fiscal, sendo de acrescer, para efeitos de determinação do lucro tributável, o valor de 6.250,00 EUR.

III.1.1.2. Gastos de amortização na contratação de L… No período de tributação de 2012, o A… contabilizou como gasto o valor global de 44.375,00 EUR, referente à amortização de 16,66% dos encargos relacionados com a contratação do jogador L…:

O valor contabilizado do ativo intangível foi apurado da seguinte forma:

Em 2008-12-12 o SP celebrou, com a entidade M…, Lda., com o NIF/NIPC…, representada pelo seu gerente único N…, um "Acordo" pelo qual se obriga a pagar, àquela entidade, a quantia de 35.000,00 EUR.

Em 2009-01-05 o SP celebrou, com o jogador de futebol L…, um contrato de trabalho desportivo, pelo qual o jogador se obriga a exercer a sua atividade de jogador de futebol profissional ao serviço do SP, a vigorar de 2009-01-01 até 2014-06-30.

Conforme cláusula décima-terceira deste contrato, o mesmo «foi celebrado com a intervenção de N…, Agente Licenciado pela Federação Portuguesa de Futebol, com a licença n.º…, em representação do Jogador».

Conclui-se, portanto, que o serviço prestado por M…, Lda., na pessoa do seu gerente único N…, não foi prestado em representação da A… .

De facto, conforme o contrato assinado pelo jogador, aquele agente agiu "em representação do jogador", pelo que aquela despesa de 35.000,00 EUR não pode ser aceite como gasto fiscal da A…, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Por outro lado, mesmo que assim não fosse, tendo o agente agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA impõem que aquele só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do artigo 45.º do Código do IRC, aquele encargo não seria fiscalmente dedutível para efeito da determinação do lucro tributável.

Assim, conclui-se que a amortização daquela despesa não pode ser aceite como gasto fiscal, sendo de acrescer ao quadro 07 da declaração modelo 22, para efeitos da determinação do lucro tributável.

Calcula-se a seguir o valor correspondente a amortização daquele valor de 35.000,00 EUR, alegadamente pagos à M…, deduzidos do valor de 10.000,00 EUR referentes à comparticipação do … Sport Clube:

(35.000,00 - 10.000,00) X 16,6(6)% = 4.166,67 EUR

III.1.1.3. Gastos relativos à contratação de O… No período de tributação de 2012, a A… contabilizou o seguinte lançamento, relativo à amortização dos direitos de utilização desportiva do jogador O…:

Do montante de 57.666,67 EUR, registados a débito da conta 64.3141, o valor de 7.666,67 EUR corresponde a 1/3 do valor de um "Acordo" celebrado e assinado em 2010-06-25, com a entidade P…, Ltda., com sede no Brasil, representada pelo seu administrador Q… .

Nos termos desse acordo, a A… obrigava-se a pagar ao segundo outorgante, a quantia de 23.000,00 EUR, «pela sus intervenção na aquisição dos direitos de inscrição desportiva do atleta O…».

O n.º 1 do artigo 28.º do Regulamento FIFA, relativo aos Agentes de Jogadores, que entrou em vigor em 2008-01-01, estatui a obrigatoriedade de que, em qualquer contrato em que o agente intervenha em representação dos interesses do clube, aquele agente deve estar identificado como tal.

Na mesma data de 2010-06-25, a A… celebrou um outro "Acordo", com a entidade R…, Ltda., também com sede no Brasil, para a aquisição dos direitos desportivos e 95% dos direitos económicos do jogador O… .

Analisando o documento verifica-se que este não faz referência a qualquer agente ou intermediário.

Na mesma data de 2010-06-25, a A… celebrou, com o jogador O…, um contrato de trabalho desportivo, para vigorar até 2013-06-30.

Conforme a cláusula décima-segunda, este contrato foi celebrado com a intervenção de Q…, agente licenciado pela Federação Brasileira de Futebol, em representação da A… .

O "Acordo" com a entidade P…, Ltda., que a A… apresenta, foi celebrado na mesma data que celebrou o "Acordo", com a entidade R…, Ltda., e na mesma data em que celebrou o contrato de trabalho desportivo com o jogador.

Atendendo à mesma data de celebração de todos os contratos, não se pode deixar de concluir que não permitiriam uma margem temporal de negociação entre entidades que não estivessem já vinculadas entre si.

Neste contexto, está colocada em causa a realização de um serviço à A… e a sua indispensabilidade.

Compulsando a informação nas notícias que circularam na Internet à data dos factos, encontram-se diversos artigos de imprensa, pela leitura dos quais se pode comprovar que Q…, administrador da P…, Ltda., era já na altura representante do jogador:

a) Em 2010-…-…, notícia publicada pelo jornal Record «O… pode ser jogador do B… a partir da próxima época. Record sabe que os … avançaram pelo jogador de 25 anos, que é agenciado por Q… e que chegaria ao … a custo zero». A mesma notícia consta nos líquidos "Futebol Nacional" e "….com".

b) Em 2010-…-…: publicação no sítio do jornal Record, que se refere ao agente do jogador «Q…, o mesmo empresário cie O…». A mesma notícia consta do sítio "….com".

Face aos documentos descritos e existindo a indicação de que Q… teria representado o jogador e não a A…, resultou do confronto entre a factualidade descrita e a alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, o afastamento da presunção de veracidade contabilística dos encargos contabilizados como referentes a um serviço prestado em representação do SP.

Tendo ficado demonstrado que o agente Q…, administrador da P…, Ltda., representava o jogador e não a A…, conclui-se, portanto, pela não aceitação como gasto fiscal, sendo de acrescer, para efeitos de determinação do lucro tributável, o valor de 7.666,67 EUR

III.1.1.4. Gastos de amortização na contratação de S…

O sujeito passivo contabilizou como gasto do período, o valor de 37.500,00 EUR, referente à amortização de 25% dos encargos relacionados com a contratação do jogador S…:

Em 2010-05-21, a A… celebrou um "Acordo" com a T…, Lda., com o NIF…, representada pelo seu diretor U… .

Nos termos desse "Acordo", a A… pretendia «contratar o atleta S…, para as Épocas 2010/2011, 2011/2012, 2012/2013 e 2013/2014, e para isso recorreu aos serviços prestados pela segunda outorgante.» e «Pelos serviços prestados segunda outorgante, peta sua intervenção na aquisição do atleta S…, a primeira outorgante terá de pagar a quantia de 150.000,00€ (...)».

Conforme "Contrato de sociedade por quotas" assinado em 2010-09-13, que consta do portal do Ministério da Justiça, são sócios da sociedade T…, Lda., U… e V… .

Na mesma data, 2010-05-21, a A… celebrou com o jogador S…, de nacionalidade nigeriana, um "Contrato de trabalho desportivo".

Nos termos da cláusula décima-terceira do mesmo, o «contrato foi celebrado com a intervenção de (...)V…, Agente licenciado pela Canada CSA, com a Licença n.º …, em representação do segundo outorgante».

No contrato de trabalho desportivo celebrado entre o jogador e a A… ficou confirmado, pelas várias entidades intervenientes – jogador, A… e agente - que o agente V… agiu em representação do jogador e não da A… .

Para além do descrito, constatou-se que o agente V… é sócio da empresa T…, Lda., com a qual U… aparece a cobrar os serviços acima descritos, pelo que a intervenção da empresa neste processo se confunde com a representação do agente do jogador.

Resulta do "Acordo" conjugado com o "Contrato de trabalho desportivo" que a A… aceita suportar os encargos de representação / intermediação efetuada em nome do jogador. Ora, para um encargo configurar um gasto, aquele deve corresponder ao consumo de um bem / serviço na esfera da entidade.

Nos termos do n.º 2 do artigo 22.º da Lei n.º 28 /98: «A pessoa que exerça a atividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da relação contratual.»

O serviço não foi prestado em representação da A…, pelo que não pode ser aceite como gasto fiscal da A…, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Por outro lado, mesmo que assim não fosse, tendo o agente agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA impõem que aquele só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do artigo 45.º do Código do IRC, aquele encargo não seria fiscalmente dedutível para efeito da determinação do lucro tributável.

Assim, a amortização daquela despesa não pode ser aceite como gasto fiscal, sendo de acrescer ao quadro 07 da declaração modelo 22, para efeitos da determinação do lucro tributável, o valor de 37.500,00 EUR.

III.1.1.5. Gastos relativos à intermediação na contratação de W…

No período de 2012, a A… contabilizou o seguinte lançamento, relativo à amortização dos direitos desportivos e à alienação dos mesmos direitos desportivos do jogador W…:

Do valor de 430.000,00 EUR registado no imobilizado, 380.000 EUR são devidos pela assinatura do "Acordo de cedência de direitos financeiros", assinado, em 2010-07-01, com a X…, com sede no Brasil, referente à aquisição de 60% dos direitos financeiros do jogador.

O valor restante de 50.000 EUR é referido no "Acordo" celebrado, na mesma data, entre o SP e a entidade Y…, Unipessoal, Lda., com o NIF…º

Conforme se pode constatar, o ativo incorpóreo em causa foi vendido à …, Futebol, SAD, em 2012-08-31.

Do montante de 23.888,89 EUR, registado a débito da conta 64.3141, o valor de 2.777,78 EUR corresponde à amortização de 1/6 (dois meses) da percentagem anual de 33,33%, relativa do valor referido no "acordo" feito com a entidade Y…, Unipessoal, Lda., no montante de 50.000,00 EUR.

Nos termos do referido "Acordo" feito com a Y…, Unipessoal, Lda., a A… pretendia contratar o jogador, «e para isso recorreu aos serviços prestados pelo segundo outorgante».

Pela cláusula primeira do referido "Acordo" a A… «obriga-se a pagar ao segundo outorgante a quantia de 50.000,00 Euros».

Na mesma data, 2010-07-01, o SP celebrou com o jogador um "Contrato de trabalho desportivo".

Conforme a cláusula décima-terceira, o «contrato foi celebrado com a intervenção de Z…, Agente n.º…, Licenciado, pela Federação Brasileira de Futebol, em representação do segundo outorgante», ou seja em representação do jogador.

No contrato de trabalho desportivo celebrado entre a A… e o jogador ficou confirmado, pelas várias entidades intervenientes, jogador, W… e agente, que o agente agiu em representação do jogador e não da A… .

Conforme consta do relatório de inspeção da ação credenciada pela Ordem de Serviço n.º OI 2012…, nos termas da procuração denominada de "Instrumento Particular de Procuração", emitida por Z…, agente de jogadores de jogadores de futebol, onde este «constitui e nomeia o Sr. AA… (...) como seu bastante procurador, a quem dá poderes, em carácter exclusivo, para o fim especial de represente-lo perante o A… para quaisquer assuntos e negociações referentes ao atleta W…, podendo celebrar os instrumentos necessários entre o outorgante e o A….», «constatou-se que o AGENTE FIFA estabeleceu uma procuração para o Y… no sentido de este representar o AGENTE FIFA nas negociações entre o jogador e a A…, com poderes para celebrar todos os contratos necessários.»

Assim, a A… aceitou suportar os encargos da intermediação / representação praticada em nome do jogador, efetuada através dos serviços prestados por Y…, no valor global de 50.000,00 EUR.

Ora, um encargo para configurar um gasto deve corresponder, inelutavelmente, ao consumo de um bem/serviço na esfera de uma entidade.

Neste conspecto, Y… representou o jogador e não a A…, pelo que foi o jogador que impôs a sua presença nas negociações.

Por conseguinte, não tendo o serviço sido prestado em representação da A…, não corresponde ao consumo de um serviço na esfera desta, donde não configura um gasto comprovadamente indispensável para a realização de rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Por outro lado, tendo o "agente" agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA, impõem que este, só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 45º do CIRC, este encargo também não poderia ser dedutível para efeitos da determinação do lucro tributável.

Em conclusão, conclui-se pela não aceitação como gasto fiscal, sendo de acrescer, para efeitos da determinação do lucro tributável, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC e da alínea c) do n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRC, o montante de 2.777,78 EUR.

III.1.1.6. Gastos relativos à contratação do jogador BB… No período de 2012, a A… contabilizou o seguinte lançamento, relativo a amortização dos direitos desportivos e rescisão do contrato de trabalho desportivo do jogador BB..:

O valor de 12.500.00 EUR, registado a débito da conta 64.3141, corresponde à amortização 1/3 (quatro meses) do valor referente ao "acordo" celebrado com CC…, em 2010-04-12.

O valor de 62.500,00 EUR, registado a débito da conta 63.8202, corresponde ao remanescente (20 meses) do valor do referente ao mesmo acordo.

Em 2010-04-12, a A… (primeiro outorgante) celebrou um "Acordo" com CC…, de nacionalidade espanhola, agente licenciado pela Real Federação Espanhola de Futebol, com a licença n.º…, (segundo outorgante).

Nos termos desse "Acordo", CC…: «representa o Jogador e intermediou a sua transferência para a primeira outorgante».

Como contrapartida pela assinatura do referido "Acordo" o SP comprometeu-se a pagar a CC… a quantia de 300.000,00 EUR, em duas épocas.

Conforme é referido no próprio "Acordo", o agente "representa o jogador", ou seja o agente agiu em representação do jogador e não da A… .

Na mesma data, 2010-04-12, a A… celebrou com o jogador BB…, de nacionalidade espanhola, (segundo contraente), um "CONTRATO DE TRABALHO DESPORTIVO"."

Nos termos da cláusula décima-terceira do mesmo, o «contrato foi celebrado com a intervenção de ... CC…, Agente Licenciado pela Real Federação Espanhola de Futebol, com a Licença n.º…, em representação do segundo outorgante».

Nos termos do n.º 2 do artigo 22.º da Lei n.º 28/98: «A pessoa que exerça a atividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da relação contratual.»

Resulta do "Acordo" que a A… aceita suportar os encargos de representação / intermediação efetuada em nome do jogador. Ora, para um encargo configurar um gasto, aquele deve corresponder ao consumo de um bem / serviço na esfera da entidade.

O serviço não foi prestado em representação da A…, pelo que não pode ser aceite como gasto fiscal da A…, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Por outro lado, mesmo que assim não fosse, tendo o agente agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA impõem que aquele só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do artigo 45.º do Código do IRC, aquele encargo não seria fiscalmente dedutível para efeito da determinação do lucro tributável.

Assim, a amortização daquela despesa não pode ser aceite como gasto fiscal, sendo de acrescer ao quadro 07 da declaração modelo 22, para efeitos da determinação do lucro tributável, o valor de (12.500,00 + 62.500,00 =) 78.000,00 EUR.

III.1.1.7. Gastos de amortização na contratação do jogador DD…

No período de tributação de 2012, o SP A… contabilizou como gasto, o valor global de 63.962,50 EUR, referente à amortização dos direitos referentes ao jogador DD…:

Do montante global referido no parágrafo anterior, destacamos o valor de 25.000,00 EUR, correspondente à amortização de 25% do valor de 100.000,00 EUR, que o SP contabilizou como gastos relativos à intermediação na contratação do jogador.

Em 2011-06-08, a A… assinou um "Acordo", com a entidade EE…, com sede em … e o NIF…, representada pelo agente FIFA FF… .

Dos considerandos do referido "Acordo" consta que: «A primeira outorgante pretende contratar o jogador DD…, e para isso recorreu aos serviços prestados pelo segundo outorgante.»

Conforme a cláusula primeira do "Acordo": «A primeira outorgante obriga-se a pagar ao segundo outorgante, pelos serviços prestados pela sua intervenção na aquisição dos direitos de inscrição desportiva do atleta DD…, a quantia de 100.000,00€ (...)».

Na mesma data, 2011-06-30, a A… celebrou com o jogador DD…, com o NIF…, um "Contrato de Trabalho Desportivo", por quatro épocas, com início em 2011-07-01 e termo em 2015-06-30.

Conforme consta da cláusula décima-terceira do referido contrato: «O presente contrato foi celebrado com a intervenção de FF…, Agente Licenciado pela Federação Portuguesa de Futebol, com a Licença n.º…, em representação do segundo outorgante.»

Verifica-se que FF…, que representou a EE… na assinatura do "Acordo" com a A…, aparece na celebração do "Contrato de Trabalho Desportivo" como representante do jogador.

Nos termos do n.º 2 do artigo 22.º da Lei n.º 28 /98: «A pessoa que exerça a atividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da relação contratual.»

Resulta do "Acordo" que a A… aceita suportar os encargos de representação / intermediação efetuada em nome do Jogador. Ora, para um encargo configurar um gasto, aquele deve corresponder ao consumo de um bem / serviço na esfera da entidade.

O serviço não foi prestado em representação da A…, pelo que não pode ser aceite como gasto fiscal da A…, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Por outro lado, mesmo que assim não fosse, tendo o agente agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA impõem que aquele só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRC, aquele encargo não seria fiscalmente dedutível para efeito da determinação do lucro tributável.

Assim, a amortização daquela despesa não pode ser aceite como gasto fiscal, sendo de acrescer ao quadro 07 da declaração modelo 22, para efeitos da determinação do lucro tributável, o valor de 25.000,00 EUR.

III.1.2. CORREÇÕES PROPOSTAS RELATIVAMENTE ÀS MAIS-VALIAS APURADAS

No período de 2012, o sujeito passivo apurou e registou mais-valias, conforme mapa modelo 31 que apresentou.

Desse mapa consta o apuramento de mais-valias resultantes da alienação dos jogadores GG…, W… e F… .

III.1.2.1. Gastos relativos à contratação de GG…

No período de 2012, a A… contabilizou o seguinte lançamento, relativo à alienação do jogador GG… para o HH…Ltda., de …:

O valor de 83.500,00 EUR, registado a débito da conta 78.714, corresponde a 50% dos alegados gastos na contratação / intermediação, que se descrevem a seguir:

Em 2011-06-30, a A… assinou um "Acordo", com a EE…, NIF…; a II…, com sede em …, Brasil, representada por JJ…; e a KK…, com sede em…, Brasil, representada por LL…, (segundos outorgantes).

Do documento em causa consta que: «A primeira outorgante pretende contratar o jogador GG…, e para isso recorreu aos serviços prestados pelas segundas outorgantes em conjunto, nomeadamente, para efeitos de intermediação e auxílio na referida contratação».

Na mesma data, 2011-06-30, a A… celebrou com o jogador GG…, de nacionalidade brasileira, um "Contrato de Trabalho Desportivo", por duas épocas, com início em 2011-07-01 e termo em 2013-06-30.

Conforme consta da cláusula décima-segunda do referido contrato: «As partes declaram que o presente contrato foi celebrado sem a intervenção de agentes de jogadores.»

O n.º 1 do artigo 28.º do Regulamento FIFA, relativo aos Agentes de Jogadores, que entrou em vigor em 2008-01-01, estatui a obrigatoriedade de que, em qualquer contrato em que o agente intervenha em representação dos interesses do clube, aquele agente deve estar identificado como tal.

O "Acordo" com as entidades EE…, II…, e KK…, Ltda., que a A… apresenta, foi celebrado na mesma data em que celebrou o "Contrato de Trabalho Desportivo" com o jogador.

Atendendo à mesma data de celebração de todos os contratos, verifica-se que tal não permitiria uma margem temporal de negociação entre entidades que não estivessem vinculadas já entre si.

Da Internet retiramos uma notícia, publicada no líquido da EE…, onde se pode ler: «O central de 23 anos representado pela EE… assinou um contrato de 4 anos com o multimilionário clube Russo. / A carreira de GG… teve uma ascenção meteórica no último ano, muito por culpa da EE… que reconheceu o seu grande valor aquando da sua passagem pelo …, onde disputava o modesto Campeonato Estadual de …, tendo de imediato na passada época 2011/2012 colocado o jogador na Europa para jogar no B… (...)».

De várias fontes de informação, acessíveis pela Internet, nomeadamente no líquido "Mais Futebol" comprova-se que é referido o nome de FF… como agente do jogador: «O B… garantiu esta terça-feira dois reforços para a próxima temporada: o guarda-redes MM… e o central GG…, apurou o Maisfutebol. Os dois jogadores são representados por FF…. (...) FF… é sócio e gerente da EE…, Lda.

No líquido "TransferMarket" na Internet constam os dados do jogador GG…, entre os quais consta o seu empresário II… que, conjuntamente com a EE…, constituem os segundos outorgantes mencionados no "Acordo" atrás referido.

Verifica-se, pois, que aqueles segundos outorgantes do referido "Acordo" tinham uma ligação empresarial com o jogador e não com a A… .

A A… aceita suportar os encargos de representação / intermediação efetuada em nome do jogador. Ora, para um encargo configurar um gasto, aquele deve corresponder ao consumo de um bem / serviço na esfera da entidade.

O serviço prestado pelos representantes/agentes do jogador, não foi prestado em representação da A…, pelo que não pode ser aceite como gasto fiscal da A…, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC.

Tendo o agente agido em representação do jogador, tanto a lei portuguesa como os regulamentos FIFA impõem que aquele só pode ser remunerado pelo jogador, pelo que, nos termos da alínea c) do artigo 45.º do Código do IRC, aquele encargo não seria fiscalmente dedutível para efeito da determinação do lucro tributável.

Aquele valor de 83.500,00 EUR está a influenciar o montante das mais-valias apuradas pelo SP, não tendo nesse apuramento sido aplicado qualquer coeficiente de correção monetária, por não ser aplicável.

Conclui-se, portanto, pela não aceitação como gasto fiscal, sendo de acrescer, para efeitos de determinação do lucro tributável, o valor de 83.500,00 EUR, registado a débito da conta… .

III.1.2.2. Mais-valias apuradas na alienação de W…

No período de 2012, a A… contabilizou o seguinte registo, relativo à alienação dos direitos desportivos do jogador W…:

Conforme descrito no ponto III.1.1.5. deste relatório, para cuja fundamentação remetemos, do montante de 430.000,00 EUR registado no imobilizado o valor de 50.000 EUR corresponde a um "Acordo" celebrado em 2010-07-01, entre o SP e a entidade Y…, Unipessoal, Lda., com o NIF/NIPC… .

Do montante de 119.444,45 EUR, registado a débito da conta 78.714, o valor de 13.888,89 EUR corresponde a 10/36 (meses ainda não amortizados) do valor de 50.000,00 EUR, relativo ao referido "Acordo".

Dado que aquele valor de 13.888,89 EUR está a influenciar o montante das mais-valias apuradas pelo SP e que nesse apuramento foi aplicado o coeficiente de 1,04 ao valor de aquisição, nos termos do artigo 47.º do Código do IRC, deve aquele valor ser corrigido para (13.888,89 x 1,04 =) 14.444,44 EUR.

Conforme fundamentado no ponto III.1.1.5, os encargos suportados relativos ao referido "Acordo" não são aceites como gasto fiscal, pelo que se propõe a correção ao lucro tributável declarado pelo SP sendo de acrescer ao quadro 07 da declaração modelo 22, o valor de 14.444,44 EUR.

III.1.2.3. Mais-valias apuradas na alienação de F… No período de tributação de 2012, a A… contabilizou o seguinte registo, relativo à alienação dos direitos desportivos do jogador F…:

Conforme foi descrito no ponto III.1.1.1 deste relatório, para cuja fundamentação remetemos, no de 107.484,94 EUR registado a débito da conta 78.714, o valor de 12.500,00 EUR corresponde a 50% de ¼ dos gastos na intermediação, no valor total de 100.000,00 EUR, relacionados com a aquisição dos direitos financeiros e desportivos do jogador.

O valor em causa, de 100.000,00 EUR, foi contabilizado a título de prestação de serviços de intermediação na aquisição dos direitos de inscrição do jogador, conforme "Acordo" assinado em 2008-07-24, entre a A… e G…, Advogados Associados.

Dado que aquele valor de 12.500,00 EUR está a influenciar o montante das mais-valias apuradas pelo SP e que nesse apuramento foi aplicado o coeficiente de 1,04 ao valor de aquisição, nos termos do artigo 47.º do Código do IRC, deve aquele valor ser corrigido para (12.500,00 x 1,04=) 13,000,00 EUR.

Conforme fundamentado no ponto III.1.1.1, os encargos suportados relativos ao referido "Acordo" não são aceites como gasto fiscal, pelo que se propõe a correção ao lucro tributável declarado pelo SP sendo de acrescer ao quadro 07 da declaração modelo 22, o valor de 13.000,00 EUR.

III.1.3. GASTOS RELATIVOS À AQUISIÇÃO DE DIREITOS DE IMAGEM DE JOGADORES

No período de 2012, a A… considerou como gasto os encargos alegadamente suportados com a aquisição de direitos de imagem de alguns jogadores.

Da legislação

O n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 28 /98, de 26 de junho, que veio estabelecer um novo regime jurídico de trabalho do praticante desportivo e do contrato de formação desportiva, dispõe que; «Todo o praticante desportivo profissional tem direito a utilizar a sua imagem pública ligada à prática desportiva e a opor-se a que outrem a use ilicitamente para exploração comercial ou para outros fins económicos».

No entanto no n.º 2 do mesmo artigo «fica ressalvado o direito do uso de imagem do coletivo dos praticantes o qual poderá ser objeto de regulamentação em sede de contratação coletiva".

Por sua vez, o Contrato Coletivo de Trabalho (CGT) celebrado entre a Liga Profissional de Futebol Profissional e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, consagra que:

a) «O direito ao uso e exploração da imagem do jogador compete ao próprio no plano meramente individual, podendo este ceder esse direito ao clube ao serviço do qual se encontra durante a vigência do respetivo contrato», (n.º 2 do artigo 38.º do CCT);

b) «Fica ressalvado o direito do uso de imagem do coletivo dos jogadores de uma mesma equipa por parte do respetivo clube ou sociedade desportiva», (n.º 3, do artigo 38.º do CCT);

c) «A exploração comercia! da imagem dos jogadores de futebol enquanto coletivo profissional será da competência do SJPF (Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol)», (n.º 4 no artigo 38.º do CCT).

A circular n.º 17/2011, de 2011-05-19, da DGCI, veio esclarecer que: «O direito de imagem de um jogador, enquanto elemento de uma equipa, transmite-se implicitamente para o Clube/SAD com o qual celebrou um contrato de trabalho desportivo, conforme dispõe o artigo 10.º da Lei n.º 28/98, de 26 de Junho, passando o Clube/SAD a deter e a poder explorar o direito de imagem do jogador integrado na equipa.»

Conclui-se que, os direitos de imagem relativos ao jogador enquanto elemento integrante do coletivo/equipa, são, inevitável e indissociavelmente, transmitidos com a celebração do contrato de trabalho desportivo.

Caso contrário, qualquer clube / SAD teria sempre que contratualizar a aquisição dos direitos de imagem de todos os jogadores, para efeitos de exploração, por exemplo, de uma transmissão televisiva ou da publicidade estática que explora nos estádios.

No que diz respeito ao direito de imagem desse jogador enquanto parte integrante do coletivo de uma mesma equipa, este encontrava-se assegurado pela A…, desde que havia celebrado com o jogador um contrato de trabalho desportivo, conforme resulta do n.º 2 do artigo 10.º da Lei n.º 28/98, conjugado com o n.º 3 do artigo 3.º do CCT.

Quanto ao direito de imagem individual do jogador, refere a mesma circular, que «O direito de imagem disponível, que o jogador pode ceder mediante contrato a um clube/SAD ou a uma entidade não desportiva, residente ou não residente, no território nacional, será o seu direito de imagem individual.»

E; «O Clube/SAD residente em território português que adquire a uma outra entidade os direitos de imagem de um jogador com o qual vai celebrar um contrato de trabalho desportivo, deve poder comprovar a mínima adequação entre a sua exploração e os encargos suportados, para que estes possam ser considerados como gastos nos termos do artigo 23.º do Código do IRC.»

Da análise dos documentos de suporte aos lançamentos contabilísticos, balancete de encerramento do período e do "Relatório e Contas Anual" do período 2011, não foram encontrados quaisquer rendimentos auferidos em consequência da exploração dos direitos de imagem individual dos jogadores em questão.

Também da análise dos relatórios de contas anuais e das declarações anuais apresentadas, relativos aos anos seguintes, não constam, nos períodos posteriores, quaisquer rendimentos auferidos em consequência da exploração dos direitos de imagem individual dos jogadores em questão.

O sujeito passivo não logrou demonstrar ter efetuado a sua exploração comercial, nem apresentou qualquer fatura / nota de débito a cobrar a participação do jogador em qualquer evento, não resultando, assim, qualquer rendimento concretizável como incremento patrimonial da A… .

Caso a A… explorasse os direitos de imagem individual de algum jogador, em campanhas publicitárias, sessões de fotografia, entre outras, em que este participasse, conseguiria objetivamente distinguir os rendimentos obtidos com essas operações dos restantes rendimentos, pois haveria que emitir faturação para essas atividades, conseguindo estimar claramente os rendimentos obtidos relacionados com os encargos suportados.

Propriedade dos direitos

Nos pressupostos dos contratos celebrados a título de cedência dos direitos de exploração de imagem de jogador profissional de futebol é referido que o alienante é detentor dos direitos de imagem, voz e de utilização do nome do jogador profissional de futebol e que, por aquele contrato, a empresa cede a A… os direitos de exploração comercial, em conjunto ou individualmente, da imagem pública do jogador profissional do B… .

Todavia, qual a origem deste direito na esfera da entidade alegadamente alienante?

Constata-se que as empresas cedentes dos direitos de uso de imagem aqui visadas são representadas pelos próprios jogadores (vide assinaturas dos contratos, pela segunda outorgante) o que revela, seguramente, uma relação estreita (senão estrita) com os próprios jogadores.

Note-se ainda que, o plano de pagamentos segue o contratado entre a A… e os jogadores, conforme se retira: «No caso de caducidade ou rescisão de contrato de trabalho desportivo mantido entre a Primeira Outorgante e o Terceiro, deixarão de ser elegíveis prestações que não se tenham entretanto vencido no âmbito deste contrato».

Posto isto, nada garante que sob a aparência de utilização do direito de imagem não se oculta uma realidade diferente, consistente no pagamento de importâncias a outro título, como a remuneração do serviço profissional dos jogadores, pois a A… paga montantes sobre direitos relativamente aos quais não registou qualquer rendimento, e não possui nem montou estrutura empresarial adequada para a sua exploração.

Conclusão

O n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 28 /98, prevê que todo o praticante desportivo profissional tem direito a utilizar a sua imagem pública ligada à prática desportiva e a opor-se a que outrem a use ilicitamente para exploração comercial ou para outros fins económicos.

Todavia, ficou ressalvado o direito de uso da imagem do coletivo dos participantes, que pertence aos clubes / SAD, ou seja, o direito ao uso da imagem dos jogadores, inseridos na equipa, encontra-se associado ao exercido do vínculo laborai estabelecido e, pela celebração do contrato de trabalho, passa para a esfera dos clubes / SAD.

O jogador mantém o direito ao uso e exploração da sua imagem no plano meramente individual, podendo este ceder esse direito ao clube, ao serviço do qual se encontra durante a vigência do respetivo contrato.

Nos termos do ponto 7 da circular n.º 17/2011, do Gabinete do Diretor-Geral da Direção Geral dos Impostos (atual AT): «O Clube/SAD residente em território português que adquire a uma outra entidade os direitos de imagem de um jogador com o qual vai celebrar um contrato de trabalho desportivo, deve poder comprovar a mínima adequação entre a sua exploração e os encargos suportados, para que estes possam ser considerados como gastos nos termos do artigo 23.º do Código do IRC.»

Ao adquirir aos jogadores F… e NN… os seus direitos de imagem no plano meramente individual, caberia ao sujeito passivo comprovar a indispensabilidade de celebrar um contrato de aquisição destes direitos aos jogadores, o que não sucedeu, pois, não foi comprovada a racionalidade económica subjacente a um negócio em que a A… não procedeu à sua exploração comercial no sentido de maximizar os respetivos rendimentos, nem demonstra ter envidado esforços para a sua exploração.

III.1.3.1. Direitos de imagem de "F…"

No período de 2012, a A… considerou como gasto do período, registado a débito da conta de gastos "…- FSE, trabalhos especializados", por contrapartida da conta de fornecedores "…-…, fornecedores de investimentos, mercado nacional",60 o montante de 210.000,00 EUR, referente à aquisição dos direitos de imagem do jogador F...:

Em 2011-03-18, a A… assinou um "Aditamento e Renovação do Contrato de Trabalho Desportivo", com o jogador profissional de futebol F…, também conhecido como "F…".

Em 2011-06-21, a A… celebrou com a entidade OO…, Ltda., com sede em…, Brasil, um "Contrato de Cedência de Direitos de Exploração de Imagem de Jogador Profissional de Futebol".

Peto segundo outorgante, a sociedade OO…, Ltda., assinou o contrato o próprio jogador F…:

Pela cláusula terceira desse contrato aquela entidade cede à A… os direitos de exploração comercial, em conjunto ou individualmente, da imagem pública» do jogador.

A cláusula quinta do contrato define «Como contrapartida pela prestação dos serviços identificados na antecedente cláusula terceira, a Primeira Outorgante obriga-se a pagar ao Segundo a quantia global de 1.055.000,00 € (...)», repartidos por quatro épocas.

Porém, da análise efetuada à contabilidade, não se detetou qualquer rendimento associado à exploração desses direitos.

Já em ações de inspeção anteriores foi verificada situação semelhante, embora com um contrato de cedência dos mesmos direitos em que era cedente uma outra entidade, "PP…, Ltda.", também representada pelo próprio jogador.

No que diz respeito ao direito de imagem desse jogador enquanto parte integrante do coletivo de uma mesma equipa, este encontrava-se assegurado pela A…, desde que havia celebrado com o jogador um contrato de trabalho desportivo, conforme resulta do n.º 2 do artigo 10.º da Lei n.º 28 /98, de 26 de junho, conjugado com o n.º 3 do artigo 3.º do CCT.

O sujeito passivo não logrou demonstrar ter efetuado a sua exploração comercial, nem apresentou qualquer fatura/nota de débito a cobrar a participação deste jogador em qualquer evento, não resultando, assim, qualquer rendimento concretizável como incremento patrimonial da A… .

Daqui não resulta que tenha havido qualquer exploração comercial da imagem do jogador, que justifique os encargos assumidos.

De sublinhar o facto que caso a A… explorasse os direitos de imagem individual de algum jogador em campanhas publicitárias, sessões de fotografia, entre outras, em que este participasse, conseguiria objetivamente distinguir os rendimentos obtidos com essas operações dos restantes rendimentos, pois haveria que emitir faturação para essas atividades, conseguindo estimar claramente os rendimentos obtidos relacionados com os encargos suportados.

A A… não apresenta qualquer estrutura empresarial preparada para a exploração de um negócio com estas características.

Conforme registado em ações de inspeção anteriores, a A… veio apontar a campanha publicitária "…", para demonstrar a exploração destes direitos. No entanto, foi possível identificar outros jogadores envolvidos na campanha "…" mas para a maioria deles não se detetou a celebração de qualquer acordo, autónomo ao contrato de trabalho desportivo, de aquisição de direitos de imagem referentes aos jogadores.

Da análise dos documentos de suporte aos lançamentos contabilísticos e do balancete de encerramento do período de 2012 não foram encontrados quaisquer rendimentos auferidos em consequência da exploração dos direitos de imagem individual do jogador em questão.

O sujeito passivo não apresentou quaisquer documentos comprovativos da efetiva exploração dos direitos de imagem individuais adquiridos, sendo de realçar que não se pode afirmar existir plena exploração dos direitos adquiridos por ter efetuado uns calendários onde aparece o jogador, na qualidade de elemento da equipa, nem através de ações onde este terá aparecido em campanhas nas escolas pois destas situações não resultam quaisquer rendimentos para a A… que justifiquem a manutenção deste encargo.

Na cláusula segunda, ponto 2, do contrato celebrado a título de "Contrato de Cedência de Direitos de Exploração de Imagem de Jogador Profissional de Futebol" é referido que: «A Segunda Outorgante é detentora, em exclusivo, dos direitos de imagem, voz e utilização do nome profissional do Terceiro Outorgante enquanto jogador profissional de futebol».

Na cláusula terceira, ponto 1: «Pelo presente contrato a Segunda Outorgante cede à Primeira, que aceita, os direitos de exploração comercial, em conjunto ou individualmente, da imagem pública do Terceiro Outorgante como jogador de futebol profissional do B…»,

Todavia, qual a origem deste direito na esfera da segunda outorgante, ou seja, na entidade OO…, Ltda.?

Constata-se que a empresa cedente do direito de uso de imagem aqui visada é representada pelo próprio jogador, conforme se vê na assinatura do contrato, pelo jogador em representação da segunda outorgante, o que revela uma relação estreita, senão estrita entre a entidade "cedente" dos direitos de imagem e o próprio jogador.

Note-se ainda que o contrato de cedência dos direitos de imagem segue o contratado entre a A… e o jogador: «O presente contrato (...) será válido durante o período em que o Terceiro Outorgante mantiver em vigor o contrato de trabalho desportivo com a Primeira Outorgante, caducando automaticamente quando terminar, independentemente do motivo, o referido contrato (...).»

Posto isto, nada garante que, sob a aparência de utilização do direito de imagem, não se oculte uma realidade diferente, consistente no pagamento de importâncias a outro título, como a remuneração do serviço profissional do jogador, pois a A… paga montantes sobre direitos relativamente aos quais não registou qualquer rendimento, e não possui nem montou estrutura empresarial adequada para a sua exploração.

Em conclusão, não tendo sido comprovada a indispensabilidade de a A… suportar os gastos em causa, para a obtenção de rendimentos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora, de acordo com o n.º 1 do artigo 23º do CIRC, não são fiscalmente aceites os encargos no montante de 210.000,00 EUR.

III.1.3.2. Direitos de imagem de NN…

No período de 2012, a A… considerou como gasto do período o montante de 200,000,00 EUR, referentes à alegada aquisição, à entidade QQ…, Lda., com o NIF…, dos direitos de imagem do Jogador NN…:

Para além do contrato de trabalho desportivo entre o SP e o jogador NN…, foi celebrado um outro contrato com a QQ…, Lda., relativo à aquisição dos direitos de imagem do jogador, pelo valor de 600.000,00 EUR, sendo 200.000,00 EUR para cada uma das épocas 2010/2011, 2011/2012 e 2012/2013 e desde que o contrato de trabalho desportivo com o jogador se mantivesse válido:

Os sócios da sociedade QQ…, Lda., são o próprio jogador, com 50% do capital social, e o seu cônjuge, com os restantes 50% do capital social.

Porém, da análise efetuada a contabilidade, não se detetou qualquer rendimento associado à exploração desses direitos.

Do confronto entre a factualidade descrita e a legislação aplicável, conforme a alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, resultou o afastamento da presunção da boa fé de que os encargos contabilizados são correspondentes a gastos comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos da A… .

Pois, no que diz respeito ao direito de imagem desse jogador enquanto parte integrante do coletivo de uma mesma equipa, este encontrava-se assegurado pela A…, desde que havia celebrado com o jogador um contrato de trabalho desportivo, conforme resulta do n º 2 do artigo 10.º da Lei n.º 28 /98, de 26 de junho, conjugado com o n.º 3 do artigo 3.º do CCT.

O sujeito passivo não logrou demonstrar ter efetuado a sua exploração comercial, nem apresentou qualquer fatura / nota de débito a cobrar a participação deste jogador em qualquer evento, não resultando, assim, qualquer rendimento concretizável como incremento patrimonial da A… .

Daqui não resulta que tenha havido qualquer exploração comercial da imagem do jogador, que justifique os encargos assumidos

De sublinhar o facto de que, caso a A… explorasse os direitos de imagem do jogador em campanhas publicitárias, sessões de fotografia, entre outras, em que este participasse, conseguiria objetivamente distinguir os rendimentos obtidos com essas operações dos restantes rendimentos, pois haveria que emitir faturação para essas atividades, conseguindo estimar claramente os rendimentos obtidos relacionados com os encargos suportados

A A… não apresenta qualquer estrutura empresarial preparada para a exploração de um negócio com estas características.

Conforme registado em ações de inspeção anteriores, a A… veio apontar a campanha publicitária "…", para demonstrar a exploração destes direitos. No entanto, foi possível identificar outros jogadores envolvidos na campanha "…", sendo que para a maioria deles não se detetou a celebração de qualquer acordo autónomo ao contrato de trabalho desportivo, de aquisição de direitos de imagem referentes aos jogadores.

Da análise dos documentos de suporte aos lançamentos contabilísticos e do balancete de encerramento do período de 2012 não foram encontrados quaisquer rendimentos auferidos em consequência da exploração dos direitos de imagem individual do jogador em questão.

O sujeito passivo não apresentou quaisquer documentos comprovativos da efetiva exploração dos direitos de imagem individuais adquiridos, sendo de realçar que não se pode afirmar existir plena exploração dos direitos adquiridos por ter efetuado uns calendários onde aparece o jogador, na qualidade de elemento da equipa, nem através de ações onde este terá aparecido em campanhas nas escolas pois destas situações não resultam quaisquer rendimentos para a A… que justifiquem a manutenção deste encargo.

Na cláusula segunda, § 2, do contrato celebrado a título de "Contrato de Cedência de Direitos de Exploração de Imagem de Jogador Profissional de Futebol' é referido que: «A Segunda Outorgante é detentora, em exclusivo, dos direitos de imagem, voz e utilização do nome profissional do Terceiro Outorgante enquanto jogador profissional de futebol»,

Na cláusula terceira, § 1: «Pelo presente contrato a Segunde Outorgante cede à Primeira o direito de exploração comercial, em conjunto ou individualmente, da imagem pública do Terceiro Outorgante como jogador de futebol profissional do B…, (,..)».

Todavia, qual a origem deste direito na esfera da segunda outorgante, ou seja, na entidade QQ…, Lda.?

Constata-se que a empresa cedente do direito de uso de imagem aqui visada é representada pelo próprio jogador, conforme se vê na assinatura do contrato, pelo jogador em representação da segunda outorgante, o que indicia uma relação estreita, senão estrita, entre a entidade "cedente" dos direitos de imagem e o próprio jogador.

Note-se ainda que o contrato de cedência dos direitos de imagem segue o contratado entre a A… e o jogador: «O presente contrato (...) será válido durante o período em que o Terceiro Outorgante mantiver em vigor o contrato de trabalho desportivo com a Primeira Outorgante, caducando automaticamente quando terminar, independentemente do motivo, o referido contrato (...).»

Posto isto, nada garante que, sob a aparência de utilização do direito de imagem, não se oculte uma realidade diferente, consistente no pagamento de importâncias a outro título, como a remuneração do serviço profissional do jogador, pois a A… paga montantes sobre direitos relativamente aos quais não registou qualquer rendimento, e não possui nem montou estrutura empresarial adequada para a sua exploração.

Em conclusão, não tendo sido comprovada a indispensabilidade de a A… suportar os gastos em causa, para a obtenção de rendimentos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora, de acordo com o n.º 1 do artigo 23º do CIRC, não são fiscalmente aceites os encargos no montante de 200.000,00 EUR.

(...)

III.4. JUROS DE OPERAÇÕES COM ENTIDADES RELACIONADAS

Na contabilidade do SP existe uma conta SNC "…- Acionistas / sócios, outras operações ativas, A…" que, no encerramento do período de tributação de 2012, evidenciava um saldo devedor de 5.364.239,55 EUR.

Considerando que em ações de inspeção anteriores se verificou existirem relações especiais entre as duas entidades, foi incluída nesta ação de inspeção externa uma análise desta situação com maior profundidade.

No ponto III.1.1.3 do relatório de inspeção tributária, elaborado no âmbito da ação de inspeção credenciada pela Ordem de Serviço n.º OI 2012…, da Unidade dos Grandes Contribuintes, cujo extraio se anexa e passa a fazer parte do presente relatório, está descrita a evolução do saldo daquela conta da contabilidade, até ao período de 2010/2011.a?

Da análise dos lançamentos efetuados na conta…, em questão, e que constam do extrato de conta-corrente anexo, verifica-se que, para além das transações suportadas pelo "Protocolo" celebrado com o B…, a débito e a crédito, estão aqui registadas outras operações entre o SP e o B… .

Destes registos salientam-se, nomeadamente, diversos valores que dizem respeito a dívidas do B… a entidades também devedoras do SP, relativamente às quais se procedeu, por acordo tripartido, ao encontro de contas na esfera do SP, liquidando este as dívidas do B… a entidades terceiras, tendo, consequentemente, o B… passado a constituir-se como devedor junto do SP, através do registo na conta de empréstimos… .

Dos lançamentos contabilísticos da A… constam, também, registos de movimentos bancários a favor do B…, sem corresponderem a qualquer venda de bens ou prestação de serviços.

Pelo exposto, as operações acima mencionadas, quer quanto aos valores do protocolo, que o SP não chegou a receber, quer pelas outras operações praticadas, acima mencionadas, configuram efetivos empréstimos entre estas duas entidades, conforme foi assumido pelo SP na sua contabilidade.

No entanto, conforme se comprova pela análise da contabilidade do SP e pelas informações prestadas pelos seus representantes, as duas entidades envolvidas não acordaram nem praticaram qualquer remuneração para os referidos empréstimos.

III.4.1. Da subordinação das operações vinculadas ao princípio da plena concorrência

O princípio da plena concorrência, como garantia da neutralidade do ponto de vista fiscal, está instituído no ordenamento jurídico nacional, pelas normas inscritas no artigo 63.º do Código do IRC.

Define que nas operações comerciais, incluindo operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efetuadas entre um sujeito passivo de IRC e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.

Em conformidade com a alínea a) do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC, existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra.

Tal considera-se verificado, designadamente, entre uma entidade e os titulares do respetivo capital que detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto.

De acordo com informação recolhida verifica-se que, à data de encerramento do período, o B… era detentor de uma participação de 36% no capital social do SP e que o presidente e os vogais das administrações de ambas as entidades são as mesmas pessoas.

Pelo que se conclui que entre o SP (A…) e o B… existem relações especiais, de acordo com a alínea a) do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC, na medida em que o B… detém 36% do capital social da A…, ao que acresce o facto de que serem comuns as pessoas que compõem as administrações de ambas as entidades.

Assim, as operações de financiamento efetuadas pelo SP ao B…, atrás descritas, constituem operações vinculadas, nos termos das alíneas b) e d) do n.º 3 do artigo 1º da Portaria 1446-C /2001, do Ministério das Finanças, conjugadas com a alínea a) do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC, que se encontram subordinadas ao princípio da plena concorrência estatuído no n.º 1 do artigo 63.º do Código do IRC.

Assim, deveriam ser contratados e aceites termos e condições idênticos aos que seriam contratualizados, aceites e praticados por entidades independentes em operações comparáveis.

As referidas operações de financiamento, efetuadas pelo SP (A…) ao B…, não foram remuneradas na esfera da primeira.

Ora, tivessem as operações de financiamento sido praticadas entre entidades independentes, estas não estariam dispostas a assumir os encargos relativos à manutenção de um saldo devedor constante e com tendência crescente sem qualquer tipo de remuneração, diga-se juro, daquele saldo.

No caso em análise, a A…, para financiamento da sua atividade corrente, também necessita de recorrer ao financiamento, pois os fluxos por ela gerados e a composição do capital social não lhe permitem deter meios monetários suficientes para financiar a sua atividade.

Situação agravada pelo facto de o SP estar a financiar a atividade do B… ao conceder-lhe que os montantes significativos em dívida continuem a aumentar.

De facto, como é normal, pelos financiamentos obtidos a A… paga a remuneração, ou seja juros, considerada adequada à sua relação com a entidade financiadora independente.

O que é razoável, entre entidades independentes, é que quem empresta exija ser remunerado e quem obtém o empréstimo aceite remunera-lo, o que não aconteceu nas operações de empréstimo concedidas pelo SP (A…) ao B… .

Daqui se conclui que a A… deveria ter acordado com o B… condições que estabeleceria com uma qualquer entidade não vinculada.

Ao permitir que o B… mantenha um saldo elevado e crescente, em dívida, sem que exista qualquer plano de pagamentos estabelecido nem qualquer entrave para a manutenção de operações entre ambos, o SP (A…) está claramente a operar em situação de exceção, motivada pelas relações especiais existentes entra elas, violando o princípio da plena concorrência, previsto no n.º 1 do artigo 63.º do Código do IRC.

III.4.2. Da violação do princípio da plena concorrência

De acordo com o atrás descrito, o débito do B… para com o SP (A…) resulta, em parte das definidas como relações comerciais entre ambos, ao abrigo do "Protocolo", mas também de outros valores cedidos pela última, designadamente, de depósitos de valores em contas do B… e do pagamento de dívidas desta entidade.

Quanto aos valores cedidos, resulta claro que se trata de empréstimos. O sujeito passivo contabilizou-os como tal, perspetivando uma cedência temporária, com vista a suprir as dificuldades de tesouraria do B… .

Quanto às relações comerciais, há a referir que estes valores a débito resultam de 20% das quotas cobradas aos sócios, valor correspondente à redução dos preços dos bilhetes que a A… aplica, nos jogos em casa, aos sócios do B… .

Acontece que o B… não entrega à A… o remanescente, do encontro de contas de direitos e obrigações resultantes do protocolo, concluindo-se que os lançamentos têm sempre subjacente um encontro em conta-corrente.

Não existe qualquer contrato que indique a forma de pagamento e o prazo do mesmo, o que se concretiza na evolução crescente do saldo da conta SNC… .

Por conseguinte, de acordo com os elementos relatados, verifica-se que a A…, ao permitir ao B… saldos elevados, mantendo as relações comerciais sem qualquer alteração, mesmo quando o saldo passou, entre 1998 e 2012, de credor de 412.841,64 EUR, para um saldo devedor de 5.364.239,55 EUR, se encontra, inequivocamente, a financiar a atividade do clube.

O B… tem apurado resultados líquidos positivos de forma constante, nos exercícios/períodos de 2000 a 2012, e detém 36% do capital da A…, tendo uma imagem económica que lhe permitiria ter capacidade para recorrer ao crédito no mercado, se em tal estivesse interessado.

Também, não se vislumbra qualquer investimento de monta que originasse necessidades financeiras avultadas, de forma a justificar minimamente a manutenção daquele saldo elevado.

O facto de as ações de gestão da administração da A…, na condução dos destinos da sociedade, poderem ser considerados legítimos em face do Direito Comercial, não implica que a Administração Fiscal as aceite sem a produção de consequências de âmbito fiscal.

Na jurisprudência portuguesa tem sido defendido que, nas relações entre entidades do mesmo grupo, os encargos / rendimentos associados deverão ser analisados numa perspetiva individualizada de cada entidade, em detrimento de uma ótica de grupo.

Assim, o serviço de financiamento aqui em questão, não tendo sido acordadas condições que se estabeleceriam entre entidades independentes, não cumpre o princípio da plena concorrência estabelecido no n.º 1 do artigo 63.º do Código do IRC.

III.4.3. Determinação do preço de plena concorrência

«O regime dos preços de transferência tem como paradigma o princípio de plena concorrência, em torno do qual se foi firmando um amplo consenso internacional por se entender que a sua adoção permite não só estabelecer uma paridade no tratamento fiscal entre as empresas integradas em grupos internacionais e empresas independentes como neutralizar certas práticas de evasão fiscal e assegurar a consequente proteção da base tributável interna.»

De acordo com o n.º 2 do artigo 63.º do Código do IRC, o SP deve adotar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, o método capaz de assegurar o melhor grau de comparabilidade entre as operações em causa e outras, que lhe sejam idênticas, em situação normal de mercado.

No mesmo sentido, estipula o n.º 1 do artigo 4.º da Portaria n.º 1446-C/2001, que deve ser adotado o método mais apropriado a cada operação, para a determinação das condições que seriam normalmente acordadas.

De acordo com o n.º 2 do referido artigo 4.º, considera-se como método mais apropriado o que seja suscetível de dar a estimativa mais aproximada dos termos e condições que seriam normalmente praticados.93

No n.º 3 do artigo 63.º do Código do IRC são identificados alguns métodos que podem ser utilizados na determinação do preço de transferência, nomeadamente o método do preço comparável de mercado.94

III.4.4. O método do preço comparável de mercado (MPCM)

Compara o preço pago por bens, direitos ou serviços transferidos, numa operação vinculada, com o preço pago por bens, direitos ou serviços transferidos numa operação comparável entre entidades não vinculadas.

Trata-se de um método de base transacional que, de acordo com o n.º 1 do artigo 6.º da Portaria n.º 1446-C/2001, requer um elevado grau de comparabilidade entre operações ao nível do objeto e demais termos e condições da operação, bem como da análise funcional das entidades intervenientes.

Desde que seja possível identificar operações comparáveis em mercado aberto, o método do preço comparável de mercado constitui o meio mais direto e fiável de aplicação do princípio da plena concorrência, devendo ser-lhe dada preferência sobre os demais.

Este método deve ser utilizado, designadamente, quando:

a) O sujeito passivo ou uma entidade pertencente ao mesmo grupo realiza uma operação da mesma natureza que tenha por objeto um serviço similar, em quantidade ou valor análogos e em condições substancialmente idênticas, com uma entidade independente no mesmo mercado ou em mercado similar (comparáveis internos);

b) Uma entidade independente realiza uma operação da mesma natureza que tenha por objeto um serviço similar, em quantidade ou valor análogos e em condições substancialmente idênticas, no mesmo mercado ou similar (comparáveis externos).

No caso em apreciação, a aplicação deste método é viabilizada pela possibilidade de comparação da remuneração obtida pelo SP A…, nos financiamentos concedidos ao B…, (remuneração nula), com o custo de financiamento suportado pela A…, aquando da obtenção de fundos, de montantes e por prazos semelhantes aos concedidos ao clube.

Face ao exposto, tendo em conta a informação comparável disponível, o MPCM revela-se o mais apropriado, em conformidade com o previsto no n.º 2 do artigo 4.º da Portaria, pelo que será utilizado para a pesquisa de condições que seriam praticadas entre entidades independentes em operações similares às aqui analisadas.

III.4.5. Análise dos comparáveis

Tal como referido nos parágrafos anteriores, o MPCM pode ser utilizado comparando as condições ocorridas numa operação vinculada com as condições praticadas numa operação realizada com uma entidade independente.

De acordo com o n.º 3 do artigo 4.º da Portaria, duas operações podem ser comparáveis se forem substancialmente idênticas.

De forma a concluir se são comparáveis as operações financeiras vinculadas e as operações financeiras realizadas entre entidades não relacionadas, dever-se-ão considerar os seguintes fatores de comparabilidade:

a) Natureza das operações;

b) Moeda utilizada nas operações;

c) Notação de risco da entidade mutuária;

d) Prazo de reembolso;

e) Existência de garantia.

 

De acordo com os fatores de comparabilidade acima discriminados, podem ser utilizados comparáveis internos para concluir acerca das condições de plena concorrência.

Na situação controvertida, pretende-se analisar a comparabilidade entre o preço a praticar pelo SP A… na operação de financiamento ao B…, (sem remuneração associada), com o custo de financiamento suportado pela A… aquando da obtenção de fundos.

Esta pretensão é corroborada pelo § 7.34 do relatório da OCDE de 1995, nos termos do qual: «(...) é possível que o valor de mercado de serviços intragrupo não seja superior às despesas incorridas pelo fornecedor de serviços. Este caso pode apresentar-se quando, por exemplo o serviço não corresponde a uma atividade normal ou recorrente do fornecedor, mas é fornecido ocasionalmente aos membros do grupo (...) a título de comodidade.»

Ou seja, uma entidade independente não estaria disposta a praticar um "pricing" (preço ou retorno), numa operação de financiamento ativa, que não lhe garantisse, pelo menos, a recuperação dos gastos incorridos para a sua realização.

Para o efeito, procedeu-se à análise de operações praticadas pelo SP A… com entidades não relacionadas, com o objetivo de as utilizar como operações comparáveis.

De acordo com as operações constantes na conta "…- Financiamentos obtidos, Instituições de crédito e sociedades financeiras, Empréstimos bancários, Mercado nacional, Médio/longo prazo", foram selecionados, como comparáveis internos, os empréstimos obtidos pela A…, a médio/longo prazo, junto de entidades independentes, ainda vigentes no período de tributação de 2012/13.

Tomando por base as cópias dos contratos, fornecidas pelo SP, relativos aos empréstimos supra referidos, foram tomadas como comparáveis as seguintes operações:

a) Conta SNC …- Contrato de abertura de crédito em conta corrente n.º 205/…: Crédito em conta corrente, obtido junto da RR…, até ao montante de 2.000.000 EUR, destinado a apoio de tesouraria, celebrado em 2008-05-28, pelo prazo de seis meses, renovável por sucessivos e iguais períodos, nas condições estipuladas contratualmente, remunerado à taxa Euribor a três meses, acrescida do spread de 1,5%, com a taxa anual efetiva inicial de 6,5777%."

b) Conta SNC …- Financiamento n.º EC…3/08: Contrato de financiamento, obtido junto do Banco SS…, até ao montante máximo global de 750.000 EUR, para apoio de tesouraria, celebrado pelo prazo de 90 dias, reutilizável, remunerado à taxa Euribor a três meses, acrescida do spread de 1,5%, com a taxa anual efetiva de 6,1175%.

c) Conta SNC …-Contrato de mútuo e fiança n.º 205/…: Destinado a apoio à tesouraria, obtido junto da RR…, até ao montante de 1.000.000 EUR, destinado a apoio de tesouraria, celebrado em 2012-05-04, peto prazo de quatro meses, remunerado à taxa Euribor a três meses acrescida do spread de 8,5%, com a taxa anual efetiva inicial de 11,7418%.

Os empréstimos identificados constituem formalmente empréstimos a curto prazo, com período inferior ou igual a um ano. Contudo, dada a sua consecutiva renovação ao longo dos períodos económicos, como reconhecido pelo próprio SP ao optar pela sua contabilização na conta SNC "…-Empréstimos bancários de médio e longo prazo", verifica-se que são, de facto e na substância, empréstimos de médio / longo prazo.

Da análise dos referidos contratos, constata-se que as operações financeiras identificadas reúnem os fatores de comparabilidade:

a) Quanto à natureza das operações e de acordo como o descrito, quer nas operações vinculadas quer nas operações não vinculadas, trata-se de operações de crédito;

b) A moeda utilizada nas operações é a mesma: o Euro;

c) Quanto à notação de risco da entidade mutuária e atendendo designadamente ao disposto no parágrafo 7.13 do Relatório da OCDE de 1995, são suscetíveis de utilização como comparáveis os empréstimos contraídos pela A…, junto das entidades independentes;

d) Relativamente ao prazo de reembolso já ficou demonstrado nos parágrafos anteriores que, quer as operações vinculadas em análise, quer as operações tomadas como comparáveis, se referem, de facto, a empréstimos a médio / longo prazo;

e) Quanto à existência de garantias, deve referir-se que, foram analisados os três contratos existentes em vigor no exercício económico em análise, verificando-se que de todos consta a existência de livrança avalizada ou fiança.

Conforme explicitado no parágrafo 1.45 do Relatório da OCDE de 1995, a fixação dos preços de transferência não é uma ciência exata, pelo que a aplicação do método mais adequado conduz a um intervalo de valores, ou intervalo de plena concorrência.

Qualquer valor que se obtenha dentro do intervalo de plena concorrência poderá ser considerado abrangido pelo princípio de plena concorrência, mas «na medida em que for possível distinguir os diferentes tipos de intervalo, o ajustamento deve ser operado utilizando o ponto de intervalo que melhor reflita os factos e as circunstâncias da operação vinculada em apreço».

III.4.6. Quantificação dos efeitos do incumprimento do princípio da plena concorrência

Os contratos anteriormente referidos traduzem um spread médio de 2,973%, conforme cálculos apresentados no quadro seguinte:

O valor do "spread médio" é obtido pela média ponderada dos produtos do spread de cada empréstimo pelo valor do saldo médio em dívida de cada empréstimo durante o ano, conforme demonstração de cálculos em anexo.

Quanto à questão das garantias, para que os contratos sejam comparáveis, sem quaisquer reservas, com a operação em análise, deve referir-se que, caso não existissem os avais / fianças, o valor do spread seria, em princípio, mais elevado, pelo que não resulta, no caso concreto, prejuízo para o SP.

De acordo com o exposto, para obtenção do preço que seria praticado entre entidades independentes, foi considerada a Euribor a três meses - média mensal, informação obtida no sítio do Banco de Portugal na lnternet, acrescido de um spread de 3,7979%, tendo sido apurados juros no montante de 219.597,41 EUR, conforme demonstração que se anexa.

Considerando as condições de plena concorrência, conclui-se que o resultado fiscal da A… se encontra subvalorizado naquele montante de 219.597,41 EUR.

III.4.7. Preços de transferência - Conclusão

Face ao descrito nos pontos anteriores e cumprindo a fundamentação conforme estatuído no n.º 3 do artigo 77.º da LGT, ou seja: descrição das relações especiais, indicação das obrigações não cumpridas pelo SP, aplicação dos métodos previstos na lei e quantificação dos respetivos efeitos, relativamente às operações efetuadas entre o SP e o B…, conclui-se:

O facto de as ações de gestão da administração da A…, na condução dos destinos da sociedade, serem legítimas à luz do Direito Comercial, não implica que a Administração Fiscal as aceite sem produção de quaisquer consequências de âmbito fiscal.

Para as operações objeto desta ação de inspeção deve ser feita uma análise numa perspetiva individualizada de cada empresa, em detrimento de uma ótica de gestão de grupo.

Ficou demonstrado que as operações em causa configuram empréstimos a médio / longo prazo. Desta atuação conclui-se que o objetivo das operações em causa é financiar a atividade do clube, decorrente das restantes operações estabelecidas entre as entidades relacionadas.

As operações em causa operaram-se entre entidades relacionadas, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC.

Efetuada uma pesquisa, no sentido de encontrar comparáveis, no âmbito da metodologia de determinação do preço de plena concorrência, segundo o método do preço comparável de mercado, foram identificadas várias operações que, dadas as suas caraterísticas, podem ser tomadas como comparáveis.

Conclui-se que se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes seria remunerada à taxa Euribor a três meses, acrescida de spread de 3.7979%.

Considerando as condições de plena concorrência, conclui-se que o resultado fiscal da A… se encontra subvalorizado, pelo que se propõe o acréscimo ao lucro tributável declarado no período de 2012, nos termos do n.º 1 do artigo 63.ºdo Código do IRC, no montante de 219.597,41 EUR.

Não são propostas correções, de natureza correlativa, em relação à entidade B…, com o NIF/NIPC…, dado que esta entidade tem isenção definitiva relativa às atividades culturais, recreativas e desportivas, nos termos do artigo 11.º do Código do IRC.

(...)

III.6. RESUMO DAS CORREÇÕES PROPOSTAS

III.6.1. IRC

III.6.1.1. IRC - Correção ao lucro tributável

As correções propostas ao lucro tributável, em sede de IRC, descritas e fundamentadas nos capítulos III.1 e III.4 deste relatório, a acrescer no quadro 07 da declaração modelo 22, resumem-se no quadro seguinte:

III.6.1.2. IRC - Correção aos prejuízos dedutíveis

Já no relatório da ação de inspeção ao período de 2010, no âmbito da ordem de serviço n.º OI 2012…, da Unidade dos Grandes Contribuintes da AT, se havia feito a atualização das correções dos prejuízos dedutíveis em sede de IRC:

VIII.1 - Prejuízos fiscais

O sujeito passivo apurou lucro tributável de € 4.309.733,77, que após as correções propostas neste relatório se calculou no montante de € 5.729.358,02 (cfr. anexo 57-1 tis). A A… considerou na modelo 22 como prejuízos (fiscais, a reportar para o exercício de 2010, o valor de € 9.785.526,89, no entanto, considerando as correções praticadas pela inspeção em exercícios anteriores a A… apenas tinha como prejuízos (iscais a reportar o valor de € 7.588.364,66 (vide anexo 57). Dos prejuízos fiscais considerados pela inspeção e de acordo com as correções ao exercício de 2010, foram consumidos € 5.729.358,02 remanescendo o valor de € 1.859.006,65 a deduzir em exercícios futuros

No documento de correção elaborado em resultado do relatório da ação de inspeção ao período de 2011, no âmbito da ordem de serviço n.º OI 2015…, da Direção de Finanças de…, foram deduzidos ao lucro tributável aí apurado, os remanescentes 1.859.006,65 EUR dos prejuízos dedutíveis:

Em consequência, verifica-se não existirem prejuízos fiscais em saldo, de períodos anteriores, passíveis de influenciar o lucro tributável apurado no período de 2012, em análise neste relatório.

III.6.1.3. IRC - Correção ao imposto

As correções propostas, em sede de imposto, às retenções de IRC que deveriam ter sido feitas e não foram, são as que constam do capítulo III.2, e resumem-se no quadro seguinte:

 

c)      Na sequência da inspecção a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidações de IRC e juros compensatórios que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido:

d)      A Requerente, tendo em vista aceder a jogadores de futebol em boa relação qualidade/preço, contrata normalmente serviços de profissionais especializados para o efeito (agentes de futebol), com indicação do seu perfil e características;

e)      A Requerente entende que, por o B… ser um clube de considerável êxito desportivo, se for directamente ao mercado contratar jogadores, dirigindo-se a estes ou aos clubes respectivos, faria contratos com preços superiores aos que consegue obter através de agentes, por o interesse na contratação inflacionar o preço;

f)       A Requerente sonda verbalmente vários agentes, por vezes cinco ou seis, tendo em vista a contratação de cada jogador, apenas formalizando contrato de intermediação com o agente que lhe indicar o jogador que vier a ser contratado;

g)      Os serviços do agente são, em geral, contactados verbalmente, por via telefónica, pelo presidente do clube, sendo celebrado contrato escrito, com indicação da remuneração do agente, apenas quando já está praticamente assente a contratação de um determinado jogador;

h)      Os agentes não se limitam a apresentar para contratação jogadores com quem tenham alguma relação;

i)       A Requerente não sabe, quando contacta os agentes, se as empresas têm ou não contratos de representação com jogadores com as características pretendidas, apenas averiguando se os jogadores têm representantes quando ocorre a formalização de contratos com os jogadores;

j)       A Requerente não dispõe de meios próprios de prospecção de jogadores que satisfaçam as suas necessidades e considera que seria demasiado oneroso dispor desses meios, designadamente observadores (olheiros) espalhados pelo mundo;

k)      Consumado cada negócio de contratação de jogadores, com a intervenção do agente, a Requerente paga-lhe a comissão respectiva e indica a sua intervenção no contrato escrito da contratação do jogador;

l)       Há agentes que não representam jogadores, fazendo apenas serviços de prospecção;

m)   Já sucedeu que dois agentes apresentassem o mesmo jogador;

n)      Os pagamentos aos agentes apenas ocorrem quando há contrapartida por serviços prestados;

o)      Foi nesses termos que intervieram como agentes e foram efectuados pagamentos pela Requerente às empresas:

–EE…, Lda (representada por FF…) para a contratação do jogador DD…, que tinha como empresário FF…, indicado como tal no contrato celebrado;

–T…, Lda (representada por U…), para a contratação do jogador S…, que tinha como empresário V… (sócio da T…, Lda), indicado como tal no contrato celebrado;

–TT…, Lda (representada por UU…), para a contratação do jogador VV…, sendo aquele UU… indicado como seu empresário em páginas informáticas de órgãos de informação, mas não sendo indicado como tal no contrato celebrado;

–EE…; II… (representada por JJ…) e KK… (representada por LL…) para a contratação de GG…, sendo indicada no site da EE… que o empresário do jogador era FF…, gerente da EE…, não sendo indicado como tal no contrato celebrado;

p)      Por vezes, os agentes sugerem jogadores em representação destes, sem prévio contacto da Requerente, situações em que a Requerente não paga qualquer comissão ao agente;

q)      A Requerente tem patrocinadores que, por vezes, pretendem utilizar jogadores de futebol mais mediáticos em acções de promoção e normalmente é incluída nos contratos com os patrocinadores uma cláusula que impõe a Requerente disponibilizar dois jogadores para essas acções;

r)       Os contratos com patrocinadores são financeiramente importantes para a Requerente, recebendo só do mais importante, € 1.000.000,00 relativamente ao ano 2012;

s)      Além da cedência de jogadores para acções dos patrocinadores, a Requerente tem outros clientes, de camarote, que tem direito a utilização de jogadores em acções de promoção dos seus produtos;

t)       A Requerente considerava que os jogadores F… e NN…, pelo seu curriculum profissional (internacionais pelas equipas principais de Brasil e Portugal, respectivamente) eram os mais pretendidos para eventos de marketing e manutenção e angariação de patrocinadores, pelo que, para além da sua contratação, adquiriu os seus direitos de imagem para o período em que foram contratados;

u)      O jogador F… havia já cedido os seus direitos de imagem a uma sociedade com sede e direcção efectiva no Brasil, a OO…, Lda, pelo que a Requerente adquiriu a esta empresa aqueles direitos, autoliquidando o IVA correspondente, no valor de € 70.150,00, distribuído por vários meses de 2012, em função das tranches de pagamento, que depois deduziu;

v)      O jogador NN… havia já cedido os seus direitos de imagem a uma sociedade com sede e direcção efectiva em Portugal, a QQ…, Lda, pelo que a Requerente adquiriu a esta empresa aqueles direitos, autoliquidando o IVA correspondente, no valor de € 46.000,00, distribuído por vários meses de 2012, em função das tranches de pagamento, que depois deduziu;

w)    Nos contratos de cedência de direitos de imagem, foram os próprios jogadores F… e NN… que assinaram pela OO… e QQ…, respectivamente;

x)      A aquisição dos direitos de imagem foi efectuada pela Requerente tendo em vista evitar que os jogadores a quem os adquiriu, que considerou mais mediáticos, se pudessem associar a marcas concorrentes dos patrocinadores da Requerente ou recusem participar em campanhas de promoção de produtos dos patrocinadores, o que poderia prejudicar a manutenção e obtenção de patrocínios;

y)      Os contratos com os patrocinadores são feitos por dois ou três anos, não constando deles os nomes dos jogadores que serão pretendidos para acções de promoção dos produtos patrocinados;

z)      Está subjacente aos contratos de patrocínios a possibilidade de utilização de jogadores em acções de promoção dos produtos dos patrocinadores, sendo nos contratos mais recentes incluída uma cláusula específica prevendo a obrigação de serem cedidos jogadores para essas acções;

aa)  A aquisição dos direitos de imagem de jogadores com a consequente disponibilidade destes para acções de promoção de produtos de patrocinadores constitui uma mais-valia nas negociações de patrocínios, pelo interesse que têm os patrocinadores de poderem dispor de jogadores mais mediáticos em acções de promoção dos seus produtos;

bb)  O jogador NN… participou em acções de promoção da marca de cervejas…, designadamente sessões de autógrafos, no âmbito do contrato celebrado pela Requerente com a empresa que a comercializa;

cc)  A autonomização da Requerente, SAD, e do B… foi efectuada por imposição legal, tratando a Requerente do futebol profissional e o Clube dos escalões de formação e modalidades amadoras;

dd)  Há apoios financeiros da Requerente ao B…, por via de empréstimos não remunerados, sendo acordado que os juros são donativos efectuados pela SAD;

ee)  Esses apoios financeiros eram tratados contabilisticamente como empréstimos;

ff)     Não foi equacionada a cobrança de juros pelos empréstimos, pois o clube também ajuda a SAD, designadamente, cedendo o estádio pela quantia de € 15.000,00 por ano, que é considerada irrisória, e cedendo jogadores das camadas jovens sem encargos para a SAD;

gg)  O Clube tem como receitas principais as quotizações dos associados e subsídio para apoio ao desporto juvenil, pago pela Câmara Municipal de …;

hh)   A Requerente prestou garantia para suspender processos de execução fiscal instaurados para cobrança coerciva das quantias liquidadas (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

ii)     Em 27-06-2016, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.

 

 

2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base no Relatório da Inspecção Tributária, documentos juntos ao pedido de pronúncia arbitral e documentos que constam do processo administrativo, que foram afirmados pela Requerente e não são questionados pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

As testemunhas inquiridas aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos sobre que depuseram.

A prova testemunhal esclareceu que a Requerente tem interesse em adquirir direitos de imagem dos jogadores de futebol com maior mediatismo, para não correr o risco de que eles venham a patrocinar produtos de marcas concorrentes das dos seus patrocinadores ou de que venham a recusar participar em campanhas de promoção de produtos dos patrocinadores, o que poderia prejudicar a manutenção e angariação de patrocínios, que constituem uma considerável receita para a Requerente (depoimentos das testemunhas WW…, XX… e YY…).

A prova testemunhal esclareceu também as razões por que a Requerente utiliza os serviços de agentes para contratar jogadores e as relações entre a Requerente e o B… (depoimentos das testemunhas XX… e YY…).

 

 

 

3. Matéria de direito

 

 

   A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou várias correcções a matéria tributável de IRC da Requerente, relativamente ao exercício de 2012, que constam do Relatório da Inspecção Tributária.

No presente processo, a Requerente impugna a liquidação apenas relativamente a algumas das correcções que lhe estão subjacentes:

A – Gastos não aceites fiscalmente, nos termos do art. 23.º do CIRC, relativos a pagamento a empresários de futebol, em duas matérias:

a) Relativos à aquisição de serviços de intermediação na contratação de diversos jogadores (III.1.1 do doc. n.º 1, p. 11 a 28);

b) Correções às mais-valias apuradas na alienação de jogadores (III.1.2 do doc. n.º 1, p. 28 a 32).

B – Gastos não aceites, nos termos do art. 23.º do CIRC, relativos à aquisição de direitos de imagem de vários jogadores (III.1.3 do doc. n.º 1, p. 32 a 41);

C – Imputação de juros, nos termos do art. 63.º do CIRC, em operações com entidades relacionadas, a saber o B…- Clube (III.4 do doc. n.º 1, p. 7o a 8o).

 

           

3.1. Gastos relativos à aquisição de serviços de intermediação de empresários de futebol na contratação de diversos jogadores

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou como gastos os pagamentos efectuados a agentes que tiveram intervenção nas contratações doe vários jogadores.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, em suma, o seguinte:

 

– o sujeito passivo considerou como gasto encargos suportados na aquisição/ renovação dos direitos de contratação dos jogadores identificados, com serviços de intermediação / representação prestados por agentes de jogadores/empresários desportivos na celebração desses negócios;

– da análise documental efectuada verificou-se que os registos dos valores no activo intangível, relativo às prestações de serviços de intermediação/representação, se encontram geralmente suportado por "acordos" celebrados entre a A… e o agente / empresa do agente, onde o SP se compromete a pagar àquele(a) se o jogador assinar / renovar contrato com a A… .

– analisando os contratos de trabalho desportivo celebrados entre a A… e cada um dos jogadores, verifica-se que, em grande parte deles, ficou expresso que a participação do agente era feita em nome e em representação do jogador, tendo ficado confirmado, pelas várias entidades que assinaram o contrato, que o agente agiu em representação do jogador;

– noutras situações, em que o contrato de trabalho desportivo é omisso ou não refere que o agente representava o jogador, ficou confirmado, por outras fontes, que o agente agiu em representação do jogador e não da A…;

– assim, resulta dos "acordos" que a A… aceita suportar os encargos de intermediação / representação efectuada em nome dos jogadores;

– para um encargo configurar um gasto, ele deve corresponder, inelutavelmente, ao consumo de um bem / serviço na esfera dessa entidade;

– o Regulamento FIFA aprovado pelo Comité Executivo da FIFA em 2007-10-29 e com entrada em vigor em 2008-01-01, preconiza que a remuneração do agente seja efectuada exclusivamente pelo seu cliente e proíbe a dupla representação, pelo que um agente de jogadores só poderá representar ou gerir os interesses de uma das partes envolvidas na operação;

– o Regime Jurídico do Contrato de Trabalho Desportivo e do Contrato de Formação Desportiva (RJCTD), publicado com a Lei n.º 28 /98, de 26 de Junho, prevê no n.º 2 do artigo 22.º que "a pessoa que exerça a atividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da relação contratual" e estabelece no n.º 1 do artigo 24.º do RJCTD, que "as pessoas singulares ou colectivas que exerçam a actividade de intermediários, ocasional ou permanentemente, só podem ser remuneradas pela parte que representam só podem ser remuneradas pela parte que representam";

– em vários contratos foi referido expressamente que o agente representou o jogador;

– em outros casos, em que não ficou contratualmente expressa a representação em nome do jogador, comprovou-se, por outros documentos, que o agente/representante representava de facto o jogador;

– a alínea c) do n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRC que, "os encargos que incidam sobre terceiros que a empresa não esteja legalmente autorizada a suportar", não são dedutíveis para a determinação do lucro tributável;

– correspondendo os encargos em causa à remuneração do empresário desportivo enquanto representante do jogador no negócio, aqueles encargos configuram encargo do jogador e não da A… .

 

Resulta da prova testemunhal produzida que a Requerente não possui meios próprios para sondagem do mercado de jogadores de futebol, pelo que contactou vários agentes tendo em vista concretizar a contratação de jogadores com as características que pretendia, o que é seu procedimento habitual, ficando a formalização por escrito dos contratos com os agentes e o pagamento pelos serviços prestados dependente da concretização das contratações dos jogadores.

Em face desta forma de procedimento, as conclusões que a Autoridade Tributária e Aduaneira retirou no sentido da inexistência de serviços de intermediação, por haver coincidência entre datas da celebração dos contratos com os jogadores e as dos respectivos contratos com agentes não têm fundamento consistente, pois a celebração destes contratos é feita na sequência de contactos verbais anteriores, que só se materializam em contratos formais, nos casos em que os serviços prestados conduzem à contratação de jogadores.

Por isso, a coincidência de datas, não permite concluir que não houve actividade de intermediação anterior.

Não resulta da prova testemunhal que, em qualquer dos casos, tenham sido os jogadores que impuseram a presença dos agentes a quem a Requerente efectuou pagamentos, nem que a Requerente tivesse celebrado qualquer contrato ou efectuado qualquer pagamento relacionado com a representação dos jogadores.

Assim, resulta da prova testemunhal produzida que houve efectivamente serviços prestados à Requerente pelos agentes, conexionados com a actividade da Requerente.

Mas, sem prejuízo destas considerações gerais sobre a prova testemunhal produzida, importa apreciar os fundamentos invocados pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente a cada uma das situações.

 

 

3.1.1. Gastos relativos à contratação de "F…"

 

Relativamente à contratação do jogador F… foi celebrado do em 24-07-2008, entre a A… e G…, Advogados Associados, representada por H…, um acordo relativo a serviços de intermediação.

A Autoridade Tributária e Aduaneira encontrou referências na internet no sentido de o referido H… ser empresário do jogador.

Independentemente da falta de fiabilidade de informações que circulam na internet, cuja correspondência à realidade não se pode considerar demonstrada, constata-se que não foi com o H…, mas sim com a sociedade de advogados referida que foi celebrado o contrato de intermediação, pelo que nem sequer se verifica uma situação de dupla representação, pois uma pessoa colectiva não se confunde juridicamente com as pessoas singulares que intervêm em sua representação.

Por outro lado, os artigos 22.º, n.º 2, e 24.º n.º 1, da Lei n.º 28 /98, de 26 de Junho, apenas proíbem que as pessoas singulares ou colectivas que exercem a actividade de empresário desportivo sejam remuneradas e ajam em nome e por conta de mais que uma parte na relação contratual, situação que não se verifica quando intervêm simultaneamente uma pessoa colectiva que age no interesse e por conta de uma sociedade desportiva e uma pessoa singular que representa o jogador.

Para além disso, a eventualidade de os regulamentos da FIFA serem mais exigentes e por razões de transparência proibirem situações de possíveis conflitos de interesses entre representantes de jogadores e dos clubes que os contratam é irrelevante, para efeitos de IRC, pois aqueles regulamentos não produzem quaisquer efeitos fora da esfera desportiva.

De qualquer forma, no caso em apreço, a Requerente efectuou o pagamento à sociedade referida, que não representou o jogador, pelo que não era este quem devia efectuar aquele pagamento.

Uma pessoa colectiva não se confunde juridicamente com as pessoas singulares que intervêm em sua representação" e não existem no processo quaisquer elementos que permitam concluir que a actividade da sociedade em questão, desenvolvida em prol dos interesses do B…, se pode confundir com a actividade desenvolvida pelo um seu representante legal (ou um sócio) em prol do jogador.

Consequentemente não se está perante uma situação enquadrável na alínea c) do n.º 1 do artigo 45.º do Código do IRC.

Por isso, a correcção efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito ao assentar num juízo sobre a existência de uma situação de dupla representação e ao entender que a Requerente efectuou um pagamento que cabia ao jogador suportar.

 

3.1.2. Gastos de amortização na contratação de L…

Em 12-12-2008, a Requerente celebrou, com a entidade M…, Lda., representada pelo seu gerente único N…, um "Acordo" pelo qual se obriga a pagar, àquela entidade, a quantia de 35.000,00 EUR.

Em 05-01-2009, a Requerente celebrou, com o jogador de futebol L…, um contrato de trabalho desportivo, pelo qual o jogador se obriga a exercer a sua actividade de jogador de futebol profissional ao seu serviço, a vigorar de 2009-01-01 até 30-06-2014.

Este contrato foi celebrado com a intervenção de N…, em representação do Jogador.

Também aqui, se está perante entidades distintas, uma sociedade por quotas que agiu no interesse da Requerente e uma pessoa singular que agiu em representação do jogador.

O pagamento em causa foi efectuado à pessoa colectiva referida, que não interveio em representação do jogador, pelo que era a Requerente e não este quem devia efectuar o pagamento.

Assim, pelo que se referiu no ponto anterior, a correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

 

 

3.1.3. Gastos relativos à contratação de O…

 

A Requerente celebrou um acordo em 25-06-2010, com a entidade P…, Ltda., com sede no Brasil, representada pelo seu administrador Q…, nos termos do qual se obrigava a pagar àquela entidade, a quantia de 23.000,00 EUR, pela sua intervenção na aquisição dos direitos de inscrição desportiva do atleta O… .

Na mesma data, a Requerente celebrou um outro acordo contrato com a entidade R…, Ltda., também com sede no Brasil, para a aquisição dos direitos desportivos e 95% dos direitos económicos do jogador O… .

Ainda na mesma data, a Requerente celebrou com o jogador O…, um contrato de trabalho desportivo, para vigorar até 30-06-2013.

A Autoridade Tributária e Aduaneira concluiu, com base em notícias recolhidas da internet, que Q…, administrador da P…, Ltda., era já na altura representante do jogador, e que tive intervenção em representação deste e não da Requerente.

Também neste caso, valem as considerações atrás efectuadas sobre a falta de confirmação da fiabilidade das informações obtidas através da internet, e sobre a distinção jurídica entre a sociedade P…, Ltda e o seu administrador Q… .

Sendo o pagamento efectuado à sociedade e resultando da prova testemunhal produzida que esta prestou serviços à Requerente, não há fundamento para concluir que a Requerente pagou serviços de representação do jogador.

Por isso, também esta correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

 

 

3.1.4. Gastos relativos à contratação de S…

            Em 21-05-2010, a A… celebrou um acordo com a T…, Lda., representada pelo seu director U…, visando o utilizar os serviços desta para a contratação do jogador S… .

            Aquela sociedade tem como sócios, além do referido director, V… que interveio como representante do jogador no contrato de trabalho desportivo celebrado entre este e a Requerente.

            Também neste caso, há distinção entre a sociedade e o referido V…, pelo que não se pode considerar demonstrado que o pagamento efectuado pela Requerente à sociedade se destinou a pagar ao representante do jogador.

Assim, também neste caso, sendo o pagamento efectuado pela Requerente à sociedade e resultando da prova testemunhal produzida que esta prestou serviços à Requerente, não há fundamento para concluir que a Requerente pagou serviços de representação do jogador.

Por isso, também esta correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

 

 

3.1.5. Gastos relativos à intermediação na contratação de W…

 

A Requerente celebrou, em 01-07-2010, um acordo a sociedade Y…, Unipessoal, Lda., visando a contratação do jogador W…, obrigando-se a pagar àquela sociedade a quantia de 50.000,00 Euros.

Na mesma data, a Requerente celebrou com o jogador um "Contrato de trabalho desportivo", em que interveio Z…, em representação do jogador.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que o agente agiu em representação do jogador e não da A…, por o referido Z… ter nomeado AA… como procurador, para o representar perante o A… para quaisquer assuntos e negociações referentes ao atleta W… .

Assim, concluiu a Autoridade Tributária e Aduaneira que «a A… aceitou suportar os encargos da intermediação / representação praticada em nome do jogador, efectuada através dos serviços prestados por AA…, no valor global de 50.000,00 EUR» e que «AA… representou o jogador e não a A…, pelo que foi o jogador que impôs a sua presença nas negociações».

Não há fundamento para a conclusão retirada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois dos próprios termos em que a Autoridade Tributária e Aduaneira descreve a situação se conclui que não foi o jogador quem impôs a presença do AA… nas negociações, que foi decidida pelo representante do jogador Z…, com quem a Requerente não tem qualquer relação perceptível.

Assim, a correcção em casa enferma de erro sobre os pressupostos de facto.

 

3.1.6. Gastos relativos à contratação do jogador BB…

Em 12-04-2010, a Requerente celebrou um acordo com CC…, em que se refere que este «representa o Jogador e intermediou a sua transferência para a primeira outorgante». Como contrapartida pela assinatura deste acordo, a Requerente comprometeu-se a pagar a CC… a quantia de 300.000,00 EUR, em duas épocas.

Na mesma data, a Requerente celebrou com o jogador BB… um contrato de trabalho desportivo.

Referindo-se no contrato celebrado entre a Requerente e o CC… que este representa o jogador, a remuneração pelos serviços de intermediação apenas podem ser pagos pelo jogador, por força do disposto nos artigos 22.º, n.º 2, e 24.º, n.º 1, da Lei n.º 28/98, que estabelecem que «a pessoa que exerça a actividade de empresário desportivo só pode agir em nome e por conta de uma das partes da relação contratual» e que «as pessoas singulares ou colectivas que exerçam a actividade de intermediários, ocasional ou permanentemente, só podem ser remuneradas pela parte que representam».

Em face deste regime, tem de se concluir que as despesas com contratos de intermediação em que os serviços sejam prestados pelos representantes dos jogadores, só podem ser pagas por estes.

É indiferente, à face deste regime, que o representante do jogador também tenha prestado serviços à entidade desportiva que o contrata, pois resulta do n.º 1 do artigo 24.º que, a serem remunerados esses serviços, a remuneração incumbe ao jogador.

Por isso, quanto a este ponto, a correcção efectuada tem suporte legal no artigo 45.º, n.º 1, alínea c), do CIRC, que estabelece que «não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável» os «encargos que incidam sobre terceiros que o sujeito passivo não esteja legalmente autorizado a suportar».

No caso em apreço, a lei não autoriza a Requerente a suportar as despesas referidas, sendo indiferente, por isso, que ele resulte também da Circular n.º 15/2011, que, como refere a Requerente, ela não tem efeito vinculativo para os contribuintes.

A tese da Requerente de que o artigo 45.º, n.º 1, alínea c), do CIRC está subordinado à regra da indispensabilidade que consta do artigo 23.º, n.º 1, do mesmo Código e é afastada quando a indispensabilidade se verifique não é correcta.

Na verdade, o artigo 23.º indica quais as despesas que, por passarem o teste da indispensabilidade para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, são qualificáveis como gastos. O artigo 45.º elenca os encargos especiais que, apesar de serem contabilizados como gastos (isto é, passaram o teste da indispensabilidade) não são dedutíveis. Com efeito, se o artigo 45.º estivesse subordinado e fosse derrogado pela regra da indispensabilidade, ele seria inútil, pois a dedutibilidade sempre dependeria exclusivamente da indispensabilidade. Por outro lado, é manifesto que entre os encargos que no artigo 45.º, n.º 1, do CIRC se indicam como indedutíveis, se incluem alguns que superam manifestamente o teste da indispensabilidade, como é o caso do próprio IRC e impostos que incidam sobre os lucros, que são encargos legalmente obrigatórios para quem desenvolve actividade empresarial.

Assim, a Autoridade Tributária e Aduaneira tem razão quanto a esta correcção.

 

 

3.1.7. Gastos de amortização na contratação do jogador DD…

Em 08-06-2011, a Requerente celebrou um acordo, com a entidade EE…, Lda, representada pelo agente FIFA FF… . Dos considerandos do referido "Acordo" consta que: «A primeira outorgante pretende contratar o jogador DD…, e para isso recorreu aos serviços prestados pelo segundo outorgante

Conforme a cláusula primeira do Acordo, «A primeira outorgante obriga-se a pagar ao segundo outorgante, pelos serviços prestados pela sua intervenção na aquisição dos direitos de inscrição desportiva do atleta DD…, a quantia de 100.000,00€ (...)».

Na mesma data, 30-06-2011, a A… celebrou com o jogador DD…, um "Contrato de Trabalho Desportivo", por quatro épocas, com início em 2011-07-01 e termo em 30-06-2015.

Na cláusula décima-terceira do referido contrato indica-se que ele foi celebrado com a intervenção de FF…, em representação do segundo outorgante.

Não se verifica, nesta situação, a dupla representação, nem se demonstra que a Requerente tenha efectuado qualquer pagamento ao referido FF…, que não se confunde com a sociedade referida.

Assim, pelo que já se referiu, esta correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto.

           

 

3.2. Questões do erro no cálculo das mais-valias

 

3.2.1. Mais-valias respeitantes à contratação dos jogadores W… e F… «F»

 

A Requerente suscita subsidiariamente a questão do erro no cálculo das mais-valias relativamente à contratação dos jogadores W… e F… «F », derivada da não consideração como gastos das despesas com os agentes que prestaram serviços à Requerente nas respectivas contratações.

Procedendo o pedido de pronúncia arbitral quanto à não consideração como custos das despesas com agentes relativas a tais contratações, fica prejudicado o conhecimento dessas questões subsidiariamente suscitadas.

 

 

3.2.2. Mais-valias respeitantes à contratação do jogador GG…

 

No período de 2012, a A… contabilizou o valor de € 83.500,00 relativo a 50% dos gastos na contratação/intermediação do jogador GG… para o HH… Ltda., de… .

Aquele valor de € 83.500,00 influenciou o montante das mais-valias apuradas pela Requerente.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que o gasto referido não pode ser aceite por os representantes/agentes do jogador (EE…, II…, e KK…, Ltda) terem agido em representação do jogador e não da Requerente.

A Autoridade Tributária e Aduaneira retirou tal conclusão do facto de os contratos com estas entidades e o jogador terem a mesma data que «não permitiria uma margem temporal de negociação entre entidades que não estivessem vinculadas já entre si».

Como se referiu, a prova produzida testemunhal produzida é no sentido de, relativamente a cada pretendida contratação de jogadores, as entidades que intervêm como agentes em representação da Requerente serem contactadas verbalmente, só se formalizando contrato de intermediação com a entidade ou entidades que intervieram relativamente ao jogador que que vai ser contratado.

Por isso, a coincidência de datas, não permite concluir que não houve actividade de intermediação anterior prestada à Requerente por aquelas entidades.

Por outro lado, os factos em que a Autoridade Tributária e Aduaneira se baseou para concluir que aquelas entidades representavam o jogador GG… não permitem tal conclusão, com um mínimo de segurança.

Na verdade, desde logo, o contrato celebrado refere que a Requerente «recorreu aos serviços prestados pelas segundas outorgantes em conjunto, nomeadamente, para efeitos de intermediação e auxílio na referida contratação» e que «as partes declaram que o presente contrato foi celebrado sem a intervenção de agentes de jogadores››, o que confirma a tese da Requerente.

Por outro lado, no que concerne à notícia em que se refere que o jogador é representado pela EE…, que consta de uma página informática cuja idoneidade informativa é desconhecida, reporta-se a uma contratação do jogador por um clube russo, posterior à da Requerente e que nada tem a ver com esta contratação nem com a alienação, pois a alienação efectuada pela Requerente reporta-se à HH… Ltda, de… . Para além disso, é a própria Autoridade Tributária e Aduaneira que, logo a seguir, diz que o jogador era representado por FF…, sócio e gerente da EE…, Lda. Pelo que já se disse, a representação por uma pessoa singular que é sócio e gerente de uma empresa não se confunde com a representação pela empresa, que é uma pessoa colectiva. No caso, a Requerente pagou à empresa e não ao alegado representante do jogador.

Para além disso, esta informação é contraditória com a informação que a Autoridade Tributária e Aduaneira refere a seguir, extraída de uma página informática que não se encontra disponível («http://www.transfermarkt.pt/… /pro%EF%AC%81l/spiele…»), segundo a qual o jogador seria representado pela II… .

Finalmente, quanto à KK…, Ltda que também foi paga pelos serviços de intermediação a Autoridade Tributária e Aduaneira não indica qualquer motivo para duvidar da sua prestação de serviços à Requerente, não aventando sequer que se tratasse de uma terceira representante do jogador. O que, desde logo, implicaria que pelo menos uma parte dos gastos fosse aceite.

Neste contexto, tem se concluir que há, pelo menos, fundadas dúvidas sobre se alguma destas empresas representava o jogador, sendo certo que não há qualquer fundamento sério para duvidar do que consta do contrato, que é a que foram prestados serviços em conjunto por aquelas três empresas, facto que é corroborado pela prova testemunhal.

Conclui-se, assim, que esta correcção relativa às mais-valias derivadas da alienação do jogador GG… é ilegal.

 

 

3.3. Gastos relativos à aquisição dos direitos de imagem de jogadores

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira, aplicando a Circular n.º 17/2011, de 19-05-2011, da DGCI, entendeu que não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável da Requerente os encargos que suportou com a aquisição de direitos de imagem dos jogadores F… «F » e NN…, pelas seguintes razões, em suma:

– os direitos de imagem relativos ao jogador, enquanto elemento integrante do colectivo/equipa, são, inevitável e indissociavelmente, transmitidos com a celebração do contrato de trabalho desportivo;

– quanto ao direito de imagem individual do jogador, refere a mesma circular, que «O direito de imagem disponível, que o jogador pode ceder mediante contrato a um clube/SAD ou a uma entidade não desportiva, residente ou não residente, no território nacional, será o seu direito de imagem individual;

– o Clube/SAD residente em território português que adquire a uma outra entidade os direitos de imagem de um jogador com o qual vai celebrar um contrato de trabalho desportivo, deve poder comprovar a mínima adequação entre a sua exploração e os encargos suportados, para que estes possam ser considerados como gastos nos termos do artigo 23.º do Código do IRC

– não foram encontrados quaisquer rendimentos auferidos em consequência da exploração dos direitos de imagem individual dos jogadores em questão, nem se demonstra que tenham sido realizados esforços para a sua exploração, pelo que não houve qualquer exploração comercial da imagem dos jogadores, que justifique os encargos assumidos;

– a A… veio apontar a campanha publicitária "…", para demonstrar a exploração destes direitos, mas foi possível identificar outros jogadores envolvidos na campanha "…" e para a maioria deles não se detectou a celebração de qualquer acordo, autónomo ao contrato de trabalho desportivo, de aquisição de direitos de imagem referentes aos jogadores;

– não foi comprovada a indispensabilidade de a A… suportar os gastos em causa, para s obtenção de rendimentos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora, de acordo com o n.º 1 do artigo 23º do CIRC, não são fiscalmente aceites os encargos com a aquisição dos direitos de imagem.

 

Para ser satisfeito o requisito da indispensabilidade previsto no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, basta que os gastos sejam efectuados no interesse da empresa e estejam conexionados com a sua actividade, independentemente de com eles terem, sido ou não obtidos proveitos ou se ter confirmado a sua relevância para a manutenção da fonte produtora.

Na verdade, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24-09-2014, processo n.º 0779/12, citado pela Requerente «o entendimento que a doutrina e a jurisprudência têm vindo a adoptar para efeito de averiguar da indispensabilidade de um custo (cfr. art. 23.º do CIRC na redacção em vigor em 2001), a AT não pode sindicar a bondade e oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa, sob pena de se intrometer na liberdade e autonomia de gestão da sociedade» e «um custo será aceite fiscalmente caso, num juízo reportado ao momento em que foi efectuado, seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros, ainda que se venha a revelar uma operação económica infrutífera ou economicamente ruinosa, e a AT apenas pode desconsiderar como custos fiscais os que não se inscrevem no âmbito da actividade do contribuinte e foram contraídos, não no interesse deste, mas para a prossecução de objectivos alheios (quando for de concluir, à face das regras da experiência comum que não tinha potencialidade para gerar proveitos)».

Resultou da prova testemunhal produzida que a aquisição de direitos de imagem dos jogadores referidos e apenas desses está efectivamente conexionada com os proveitos obtidos pela Requerente, pois tem em vista assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de contratos celebrados com patrocinadores, criar condições para os realizar em condições mais favoráveis e potenciar a obtenção de novos patrocinadores.

Por outro lado, provou-se que a Requerente deu efectiva utilização aos direitos de imagem adquiridos, utilizando directamente os jogadores referidos em acções de promoção própria, cedendo os jogadores para acções de patrocinadores e clientes de camarote.

De qualquer forma, independentemente da utilização que veio a ser dada aos jogadores, a prova testemunhal produzida aponta manifestamente no sentido de a mera titularidade dos direitos de imagem ser uma vantagem na negociação de patrocínios, obtenção de novos patrocinadores e fidelização dos existentes, o que, por si só, justifica que se atribua a essas despesas a natureza empresarial que justifica um juízo de indispensabilidade para a formação dos proveitos.

O documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, que não foi impugnado confirma que a Requerente cedeu pelo menos a um dos patrocinadores o direito de «utilizar a imagem dos jogadores profissionais de futebol e dos membros da equipa técnica (...) (respeitando os contratos de imagem de cada um desses jogadores e dos membros de equipa técnica) para três campanhas de comunicação por ano, com um máximo de duração, de duas semanas, por cada campanha».

Assim, tem de se concluir que as correcções efectuadas relativas à aquisição de direitos de imagem, que assentaram na irrelevância daqueles direitos para a obtenção de proveitos ou manutenção da fonte produtora enfermam de vício de erro sobre os pressupostos de facto.

 

 

3.4. Juros de operações com entidades relacionadas (B…- Clube)

 

Um dos sócios da Requerente, com mais de 10% do seu capital social é a associação desportiva de utilidade pública, B… (doravante Clube).

No final de 2012, o Clube era detentor de uma participação de 36% no capital social da Requerente e o presidente e os vogais das administrações de ambas as entidades são as mesmas pessoas.

No encerramento do período de tributação de 2012, verificava-se um saldo devedor de € 5.364.239,55 do Clube para com a Requerente, sem que fossem cobrados juros.

A Requerente contabilizou os valores cedidos ao B… como empréstimos, perspectivando a sua cedência temporária para suprir dificuldades de tesouraria do Clube, mas não há qualquer contrato que indique a forma de pagamento e o prazo para o fazer.

 

 

3.4.1. Posições das Partes

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, em suma:

– a Requerente e o Clube são entidades relacionadas para efeitos do artigo 63.º do CIRC, pelo que as operações entre elas estão sujeitas ao princípio da plena concorrência e deveriam ser contratados e aceites termos e condições idênticos aos que seriam contratualizados, aceites e praticados por entidades independentes em operações comparáveis;

– pelos financiamentos obtidos a Requerente paga a remuneração, ou seja juros, considerada adequada à sua relação com a entidade financiadora independente.

– o que é razoável, entre entidades independentes, é que quem empresta exija ser remunerado e quem obtém o empréstimo aceite remunera-lo, o que não aconteceu nas operações de empréstimo concedidas pelo SP (A…) ao B…;

– ao permitir que o B… mantenha um saldo elevado e crescente, em dívida, sem que exista qualquer plano de pagamentos estabelecido nem qualquer entrave para a manutenção de operações entre ambos, o SP (A…) está claramente a operar em situação de excepção, motivada pelas relações especiais existentes entra elas, violando o princípio da plena concorrência, previsto no n.º 1 do artigo 63.º do Código do IRC;

– o Clube tem apurado resultados líquidos positivos de forma constante, nos exercícios/períodos de 2000 a 2012, e detém 36% do capital da A…, tendo uma imagem económica que lhe permitiria ter capacidade para recorrer ao crédito no mercado, se em tal estivesse interessado;

– na determinação do preço comparável de mercado deverá ter-se em conta que uma entidade independente não estaria disposta a praticar um "pricing" (preço ou retorno), numa operação de financiamento activa, que não lhe garantisse, pelo menos, a recuperação dos gastos incorridos para a sua realização;

– os empréstimos identificados constituem formalmente empréstimos a curto prazo, com período inferior ou igual a um ano, mas, dada a sua consecutiva renovação ao longo dos períodos económicos, como reconhecido pela própria Requerente, ao optar pela sua contabilização na conta SNC "…-Empréstimos bancários de médio e longo prazo", verifica-se que são, de facto e na substância, empréstimos de médio / longo prazo;

– os empréstimos contraídos pela Requerente traduzem um spread médio de 2,973%;

– o valor do "spread médio" é obtido pela média ponderada dos produtos do spread de cada empréstimo pelo valor do saldo médio em dívida de cada empréstimo durante o ano;

– quanto às garantias, para que os contratos sejam comparáveis, sem quaisquer reservas, com a operação em análise, deve referir-se que, caso não existissem os avais / fianças, o valor do spread seria, em princípio, mais elevado, pelo que não resulta, no caso concreto, prejuízo para o Sujeito Passivo;

– para obtenção do preço que seria praticado entre entidades independentes, foi considerada a Euribor a três meses - média mensal, informação obtida no sítio do Banco de Portugal na lnternet, acrescido de um spread de 3,7979%, tendo sido apurados juros no montante de € 219.597,41.

 

A Requerente defende, em suma:

– ciente da sua responsabilidade social, decidiu conceder um apoio ao Clube, perante o interesse público da sua actividade, numa modalidade de mecenato em espécie, pela qual abdicou de cobrar juros sobre os empréstimos que lhe concederia;

– na mira de ajudar o clube, não foi ao ponto de fazer donativos dos valores - mas concedeu-lhe antes um empréstimo ou mútuo;

– perante as circunstâncias do caso (o clube é uma instituição de bem social, com interesse público), também não foi ao ponto de exigir um juro como faria a qualquer outra empresa a quem mutuasse o dinheiro;

– a requerente e o Clube poderiam ter convencionado um juro (do valor arbitrado agora pela AT) e depois a SAD decidia fazer um donativo desse mesmo montante ao clube, dada a relevância pública da sua actividade;

– em vez disso - sendo economicamente equivalente - decidiu não cobrar qualquer juro, como um donativo em espécie;

– entre o Clube e a Requerente, para lá das relações accionistas e identidade de nome, existem muitas outras relações económicas - em que o Clube beneficia a SAD, mas sem se estabelecer a contrapartida devida, designadamente arrendamento do estádio a valor inferior ao do mercado, não pagamento ao clube pela formação promovida pelo Clube, se algum jogador júnior do Clube passar à condição de sénior e passar a militar nos quadros da SAD e;

– a lógica entre a SAD e o clube não é a de estabelecer um pricing detalhado para todas as prestações interconexas - mas de promover um são equilíbrio, numa lógica global das prestações e números analisados, sem necessidade de se concretizar os valores ao cêntimo;

– a correcção de preços de transferência tem natureza quantitativa (preços e valores) e não qualitativa (requalificação dos negócios em relações especiais);

– no caso dos autos, a correcção por preços de transferência tem uma natureza qualitativa - sendo por isso manifestamente ilegal;

– no caso dos autos não está em causa um empréstimo sem juros (que têm de ser estabelecidos pelo art. 63.° do CIRC); está em causa um donativo em espécie;

– os casos excepcionais em que é possível não atender à estrutura adoptada pelo contribuinte referem-se, apenas, às situações em que e (i) há uma discordância entre a forma da operação e a sua substância económica, e (ii) aos casos, em que não existe discrepância entre a forma e a substância, mas em que a estrutura adoptada impede a Administração Fiscal de determinar um preço adequado;

– a liquidação impugnada é ilegal, porque se convocou o art. 63.° do CIRC para requalificar a operação em causa (ficciona-se um mútuo oneroso quando 0 que existiu foi um donativo em espécie) - algo que está expressamente vedado ao instituto dos preços de transferência;

– mesmo que se aplique o regime dos preços de transferência a liquidação é ilegal;

– a AT, ao proceder a uma análise de preços de transferência, nas operações entre o Clube (sócio) e a Requerente (visada) - teria de rever todas as operações efetuadas entre ambas as entidades, sem se circunscrever apenas àquelas que gerariam liquidações adicionais a favor dos cofres do Estado;

– teria de atender, em concreto, ao facto da renda da sublocação do Estádio, paga pela Requerente a favor do Clube ser de 15 mil euros por ano, de valor muito inferior ao preço de mercado comparável e ainda ao não pagamento ao Clube pela formação de jogadores em benefício da SAD e pelo não pagamento pela SAD como contrapartida da utilização do nome, e sinais distintivos do Clube;

– o acto tributário teria assim de os avaliar- e a dificuldade não é impedimento para a realização do acto tributário: foi isso o que o Fisco fez na imputação de juros de financiamento; e o que assumiu sempre na fundamentação - e o A… aceita - que a matéria de preços de transferência não é uma ciência exacta, mas com uma incontornável álea de valoração;

– quantificando o preço destas três operações em relações especiais, obteria um valor total de acréscimo de custos da Requerente que neutralizaria o acréscimo de proveitos promovido pelo acto tributário;

– e, perante isso, uma de duas: ou faria o encontro de contas entre os dois movimentos financeiros e fiscais contraditórios (proveitos e custos) - nem efectuando qualquer liquidação adicional;

– ou se a efectuasse, teria de mensurar e quantificar também os custos destas três operações, que diminuiriam significativamente o imposto a pagar (não se trata de valores baixos ou imateriais);

– donde, o acto impugnado é manifestamente ilegal: a actuação da AT é ilegal face aos pressupostos de facto e direito em que assentou, por manifesta parcialidade e desconsideração de outras operações de preços de transferência em relações especiais entre os mesmos intervenientes, que implicariam um acréscimo substancial dos custos fiscais da Requerente, que neutralizariam o efeito fiscal da liquidação com base em preços de transferência.

 

 

3.4.2. Decisão da questão dos preços de transferência

 

O artigo 63.º do CIRC estabelece o seguinte:

 

1 – Nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.

2 – O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais, tendo em conta, designadamente, as características dos bens, direitos ou serviços, a posição de mercado, a situação económica e financeira, a estratégia de negócio, e demais características relevantes dos sujeitos passivos envolvidos, as funções por eles desempenhadas, os activos utilizados e a repartição do risco.

3 – Os métodos utilizados devem ser:

a) O método do preço comparável de mercado, o método do preço de revenda minorado ou o método do custo majorado;

b) O método do fraccionamento do lucro, o método da margem líquida da operação ou outro, quando os métodos referidos na alínea anterior não possam ser aplicados ou, podendo -lo, não permitam obter a medida mais fiável dos termos e condições que entidades independentes normalmente acordariam, aceitariam ou praticariam.

4 – Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:

a) Uma entidade e os titulares do respectivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10 % do capital ou dos direitos de voto;

b) Entidades em que os mesmos titulares do capital, respectivos cônjuges, ascendentes ou descendentes detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10 % do capital ou dos direitos de voto;

c) Uma entidade e os membros dos seus órgãos sociais, ou de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, e respectivos cônjuges, ascendentes e descendentes;

d) Entidades em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha recta;

e) Entidades ligadas por contrato de subordinação, de grupo paritário ou outro de efeito equivalente;

f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos temos em que esta é definida nos diplomas que estatuem a obrigação de elaborar demonstrações financeiras consolidadas;

g) Entidades entre as quais, por força das relações comerciais, financeiras, profissionais ou jurídicas entre elas, directa ou indirectamente estabelecidas ou praticadas, se verifica situação de dependência no exercício da respectiva actividade, nomeadamente quando ocorre entre si qualquer das seguintes situações:

1) O exercício da actividade de uma depende substancialmente da cedência de direitos de propriedade industrial ou intelectual ou de know-how detidos pela outra;

2) O aprovisionamento em matérias-primas ou o acesso a canais de venda dos produtos, mercadorias ou serviços por parte de uma dependem substancialmente da outra;

3) Uma parte substancial da actividade de uma só pode realizar-se com a outra ou depende de decisões desta;

4) O direito de fixação dos preços, ou condições de efeito económico equivalente, relativos a bens ou serviços transaccionados, prestados ou adquiridos por uma encontra-se, por imposição constante de acto jurídico, na titularidade da outra;

5) Pelos termos e condições do seu relacionamento comercial ou jurídico, uma pode condicionar as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheios à própria relação comercial ou profissional.

h) Uma entidade residente ou não residente com estabelecimento estável situado em território português e uma entidade sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável residente em país, território ou região constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.

5 – Para efeitos do cálculo do nível percentual de participação indirecta no capital ou nos direitos de voto a que se refere o número anterior, nas situações em que não haja regras especiais definidas, são aplicáveis os critérios previstos no n.º 2 do artigo 483.º do Código das Sociedades Comerciais.

6 – O sujeito passivo deve manter organizada, nos termos estatuídos para o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º, a documentação respeitante à política adoptada em matéria de preços de transferência, incluindo as directrizes ou instruções relativas à sua aplicação, os contratos e outros actos jurídicos celebrados com entidades que com ele estão em situação de relações especiais, com as modificações que ocorram e com informação sobre o respectivo cumprimento, a documentação e informação relativa àquelas entidades e bem assim às empresas e aos bens ou serviços usados como termo de comparação, as análises funcionais e financeiras e os dados sectoriais, e demais informação e elementos que tomou em consideração para a determinação dos termos e condições normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes e para a selecção do método ou métodos utilizados.

7 – O sujeito passivo deve indicar, na declaração anual de informação contabilística e fiscal a que se refere o artigo 121.º, a existência ou inexistência, no período de tributação a que aquela respeita, de operações com entidades com as quais está em situação de relações especiais, devendo ainda, no caso de declarar a sua existência:

a) Identificar as entidades em causa;

b) Identificar e declarar o montante das operações realizadas com cada uma;

c) Declarar se organizou, ao tempo em que as operações tiveram lugar, e mantém, a documentação relativa aos preços de transferência praticados.

8 – Sempre que as regras enunciadas no n.º 1 não sejam observadas, relativamente a operações com entidades não residentes, deve o sujeito passivo efectuar, na declaração a que se refere o artigo 120.º, as necessárias correcções positivas na determinação do lucro tributável, pelo montante correspondente aos efeitos fiscais imputáveis a essa inobservância.

9 – Nas operações realizadas entre entidade não residente e um seu estabelecimento estável situado em território português, ou entre este e outros estabelecimentos estáveis daquela situados fora deste território, aplicam-se as regras constantes dos números anteriores.

10 – O disposto nos números anteriores aplica-se igualmente às pessoas que exerçam simultaneamente actividades sujeitas e não sujeitas ao regime geral de IRC.

11 – Quando a Direcção-Geral dos Impostos proceda a correcções necessárias para a determinação do lucro tributável por virtude de relações especiais com outro sujeito passivo do IRC ou do IRS, na determinação do lucro tributável deste último devem ser efectuados os ajustamentos adequados que sejam reflexo das correcções feitas na determinação do lucro tributável do primeiro.

12 – Pode a Direcção-Geral dos Impostos proceder igualmente ao ajustamento correlativo referido no número anterior quando tal resulte de convenções internacionais celebradas por Portugal e nos termos e condições nas mesmas previstos.

13 – A aplicação dos métodos de determinação dos preços de transferência, quer a operações individualizadas, quer a séries de operações, o tipo, a natureza e o conteúdo da documentação referida no n.º 6 e os procedimentos aplicáveis aos ajustamentos correlativos são regulamentados por portaria do Ministro das Finanças.

 

 

A Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro, regulamenta este regime, concretizando, designadamente, os métodos utilizáveis.

No caso em apreço, as Partes estão de acordo quanto à existência de relações especiais entre a Requerente e o B…, o que é patente à face das alíneas a) a d) do n.º 4 deste artigo 63.º.

Também não é suscitada qualquer divergência quanto ao método utilizado pela Autoridade Tributária e Aduaneira para determinar empréstimos comparáveis nem a taxa de juro que seria acordada entre entidades independentes.

A divergência da Requerente com a Autoridade Tributária e Aduaneira assenta, em primeiro lugar, na interpretação das operações em causa, que a Autoridade Tributária e Aduaneira entende serem mútuos sem juros e a Requerente entende que se trata de «donativos em espécie (por empréstimos sem juros)» (artigo 261.º do pedido de pronúncia arbitral). A Requerente imputa vício à correcção efectuada ao abrigo do artigo 63.º, por entender que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma requalificação da operação, não permitida neste regime.

Subsidiariamente, para o caso de se entender que a correcção efectuada não enferma deste vício, a Requerente imputa-lhe vícios de violação dos princípios da legalidade, justiça, boa-fé e imparcialidade, elencados no artigo 55.º da LGT).

 

 

3.4.2.1. Questão da requalificação das operações a que foi aplicado o regime dos preços de transferência

 

A realidade económica que as operações em causa consubstanciam é a de transferências pecuniárias da Requerente para o B…, com obrigação de restituição a médio ou longo prazo, sem qualquer contrapartida directa, como a própria Requerente reconhece ao referir que fez um donativo dos potenciais juros.

A tese da Autoridade Tributária e Aduaneira de que se está perante empréstimos sem juros está em perfeita sintonia com esta realidade económica.

Aliás, a própria Requerente, embora em defenda que «não está em causa um empréstimo sem juros (que têm de ser estabelecidos pelo art. 63.° do CIRC); está em causa um donativo em espécie» (artigo 263.º do pedido de pronúncia arbitral), afirma também que «decidiu fazer donativos em espécie (por empréstimos sem juros)» (artigo 261.º do pedido de pronúncia arbitral), pelo que a diferença, se existe, será meramente terminológica, pois «empréstimos sem juros» não são económica nem juridicamente diferentes de «donativos em espécie (por empréstimos sem juros)».

A Autoridade Tributária e Aduaneira considerou como base da correcção a realidade económica que as operações em causa consubstanciam, que é a de transferências patrimoniais da Requerente para o B…, com obrigação de restituição a médio ou longo prazo, sem qualquer contrapartida directa, como a própria Requerente reconhece ao referir que fez um donativo.

Nem há razão para controvérsia sobre a qualificação das operações referidas, pois, independentemente das denominações que a Requerente e a Autoridade Tributária e Aduaneira lhe atribuam, está-se perante a materialidade de contratos de mútuo, que é um tipo de contratos especialmente definido e regulado nos artigos 1142.º a 1151.º do Código Civil. A não existência de juros conexionados com os empréstimos não altera a qualificação das operações como mútuo, pois a existência de juros não é elemento imprescindível deste contrato típico, prevendo-se expressamente no artigo 1145.º do Código Civil que o mútuo pode ser gratuito ou oneroso. Isto é, o animus donandi quanto à retribuição do empréstimo, não altera a natureza do contrato, designadamente não o transformando noutro contrato típico, como é o de doação (artigos 940.º e seguintes do Código Civil).

Por isso, não tem razão a Requerente ao defender que «a AT não pode ficcionar um empréstimo sem juros, quando o que ocorreu foi um donativo em espécie», pois este «donativo em espécie» associado ao empréstimo de dinheiro (com obrigação de restituição), consubstancia, por força dos artigos 1142.º e 1145.º do Código Civil, um contrato típico de mútuo gratuito, que se reconduz, precisamente, a um empréstimo sem juros.

Estas operações enquadram-se manifestamente no n.º 1 do artigo 63.º do CIRC, pois está-se perante operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e uma outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual se verifica situação de relações especiais.

Por isso, nesses empréstimos que a Requerente efectuou deveriam ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.

A circunstância de existirem benefícios com relevância patrimonial proporcionados pelo Clube à Requerente (designadamente, relativos à utilização do estádio, cessão gratuita de jogadores formados pelo Clube e permissão para uso do logotipo e insígnia do Clube) não dispensa a Requerente do cumprimento da obrigação que decorre do n.º 1 do artigo 63.º do CIRC, pois, pelo contrário, o que desta norma decorre é que também relativamente a estas «operações sobre bens, direitos ou serviços» se estende a obrigação de serem «contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis».

A eventualidade de o valor económico dos juros imputados não se afastar do preço de mercado dessas três prestações, não afasta a obrigação de a Requerente dar cumprimento daquela regra do n.º 1 do artigo 63.º do CIRC, bem com das regras instrumentais que constam dos n.ºs 6 e 7 do mesmo artigo, pois essa alegada equivalência apenas é apurável, obviamente, depois da determinação dos preços de plena concorrência, com aplicação dessas regras, não podendo ser suprida, à face da lei, por um juízo genérico, subjectivo e não demonstrado no sentido da aproximação dos valores das prestações recíprocas.

Sendo assim, a correcção efectuada não foi de natureza qualitativa, pois a Autoridade Tributária e Aduaneira não deu aos mútuos (que foram contabilizados como empréstimos pela Requerente), qualquer outra qualificação jurídica, antes quantificou o valor de juros que seria presumivelmente contratado, aceite e praticado em contratos de mútuo comparáveis, celebrados entre entidades independentes.

 

 

3.4.2.2. Questão da violação dos princípios da legalidade, justiça, boa-fé e imparcialidade

 

            A Requerente defende o seguinte, em suma:

 

– a Autoridade Tributária e Aduaneira deve pautar a sua actuação pelo cumprimento integral da lei fiscal (artigo 10.º do CPPT), em ordem à descoberta da verdade material (artigo 6.º do RCPIT), devendo observar os mais elevados padrões de legalidade, justiça, boa-fé e imparcialidade (art. 55.° da LGT);

– a Autoridade Tributária e Aduaneira, ao proceder a uma análise de preços de transferência, nas operações entre o Clube (sócio) e a Requerente (visada) - teria de rever todas as operações efetuadas entre ambas as entidades, sem se circunscrever apenas àquelas que gerariam liquidações adicionais a favor dos cofres do Estado;

– teria de atender, em concreto, ao facto da renda da sublocação do Estádio, paga pela Requerente a favor do Clube ser de 15 mil euros por ano, de valor muito inferior ao preço de mercado comparável;

– e ainda ao não pagamento ao Clube pela formação de jogadores em benefício da SAD e pelo não pagamento pela SAD como contrapartida da utilização do nome, e sinais distintivos do Clube;

– estes três activos - numa lógica de preços de transferência - teriam de possuir um valor económico, correspondendo a um inegável aumento dos custos fiscais da Requerente;

– o acto tributário teria assim de os avaliar – e a dificuldade não é impedimento para a realização do acto tributário: foi isso o que o Fisco fez na imputação de juros de financiamento; e o que assumiu sempre na fundamentação – e o A… aceita – que a matéria de preços de transferência não é uma ciência exacta, mas com uma incontornável álea de valoração;

– quantificando o preço destas três operações em relações especiais, obteria um valor total de acréscimo de custos da Requerente que neutralizaria o acréscimo de proveitos promovido pelo acto tributário;

– e, perante isso, uma de duas: ou faria o encontro de contas entre os dois movimentos financeiros e fiscais contraditórios (proveitos e custos) - nem efectuando qualquer liquidação adicional;

– ou se a efectuasse, teria de mensurar e quantificar também os custos destas três operações, que diminuiriam significativamente o imposto a pagar (não se trata de valores baixos ou imateriais);

– donde, o acto impugnado é manifestamente ilegal: a actuação da AT é ilegal face aos pressupostos de facto e direito em que assentou, por manifesta parcialidade e desconsideração de outras operações de preços de transferência em relações especiais entre os mesmos intervenientes, que implicariam um acréscimo substancial dos custos fiscais da Requerente, que neutralizariam o efeito fiscal da liquidação com base em preços de transferência.

 

Os artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT, impõem à Administração Tributária que observe os princípios da legalidade, justiça, boa-fé e imparcialidade, invocados pela Requerente.

A Requerente entende que esses princípios foram violados invoca por a Autoridade Tributária e Aduaneira não ter realizado todas as diligências que entende serem necessárias para a descoberta da verdade material, designadamente para possibilitar a aplicação das regras dos preços de transferência às operações entre a Requerente e o B…  relativas ao subarrendamento do estádio, cedência de jogadores e não pagamento pela SAD como contrapartida da utilização do nome, e sinais distintivos do Clube.

No âmbito da inspecção tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira deve realizar oficiosamente todas as diligências que se afigurem adequadas para a descoberta da verdade, oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objectivo, como lhe é imposto pelos artigos 58.º da LGT e 6.º do RCPIT.

Mas, tratando-se de um dever imposto à Autoridade Tributária e Aduaneira, só ocorrerá violação deste princípio quando se puder concluir que foram omitidas diligências que, à face da informação procedimental de que a Autoridade Tributária e Aduaneira dispunha, deveria ter considerado adequadas para a descoberta da verdade.

Na verdade, a inspecção tributária, como a generalidade da actividade procedimental da Autoridade Tributária e Aduaneira está subordinada aos princípios da proporcionalidade, da eficiência e da praticabilidade (artigo 46.º do CPPT), pelo que não lhe é exigível que leve a cabo uma completa e exaustiva análise da situação tributária dos contribuintes, com a realização de todas as diligências imagináveis, mas apenas aquelas que, à face da informação disponível, a Autoridade Tributária e Aduaneira deveria ter considerado potencialmente úteis para o objectivo a atingir.

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou várias correcções, no âmbito do IRC, do IVA e do Imposto do Selo, e, segundo refere no Relatório da Inspecção Tributária, não detectou outras: «Relativamente às verificações e validações efetuadas, de acordo com o plano de inspeção, não foram detetadas outras irregularidades nem são propostas outras correções, além das que a seguir se descrevem e fundamentadamente se quantificam e propõem no próximo capítulo III deste relatório (página 10 do Relatório da Inspecção Tributária).

Assim, só se poderá concluir pela omissão do referido dever de realizar diligências tendentes a averiguar se deveriam ser efectuadas outras correcções no âmbito de preços de transferência se havia informação procedimental que permitisse concluir que eram necessárias e possíveis outras correcções.

Ora, no caso em apreço, não se encontra no Relatório da Inspecção Tributária nem consta do processo qualquer prova de que, quando efectuou a inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira tinha informação que lhe permitira concluir que, no ano de 2012, poderia haver lugar a outras correcções no âmbito de preços de transferência, designadamente quanto ao subarrendamento do estádio, cedência de jogadores e não pagamento pela SAD como contrapartida da utilização do nome, e sinais distintivos do Clube.

Com efeito, nenhum dos documentos procedimentais que constam dos autos faz referência àquelas relações entre a Requerente e o B… .

Por outro lado, em matéria de preços de transferência, a lei impõe aos sujeitos passivos especiais deveres de documentação e explicitação das operações realizadas com entidades com quem tenham operações especiais, indicados nos n.ºs 6 e 7 do artigo 63.º do CIRC, em que se inclui a indicação de todos os contratos e actos jurídicos praticados e a referência aos comparáveis utilizados para determinar os preços adoptados e, no caso em apreço, não se demonstra que tenham sido cumpridos esses deveres, em relação a qualquer das eventuais operações dos tipos referidos realizadas no execução de 2012, entre a Requerente e o B… .

Para além disso, a Requerente foi notificada para exercer o direito de audição e exerceu-o pronunciando-se apenas sobre as correcções relativas a Imposto do Selo, não aludindo sequer a quaisquer outras correcções a efectuar no âmbito de preços de transferência.

Neste contexto, não se pode censurar a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira por não ter realizado diligências que lhe permitissem aperceber-se de que havia outras correcções a fazer em matéria de preços de transferência.

            Assim, não se pode considerar demonstrada a invocada omissão do dever de realização de diligências invocada pela Requerente e, consequentemente, não ocorre a violação dos princípios da legalidade, justiça, boa-fé e imparcialidade que a Requerente faz decorrer daquela omissão.

 

 

4. Juros compensatórios

 

            A Requerente defende que é ilegal a liquidação de juros compensatórios.

            O artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária».

            Por isso, na medida em que a liquidação impugnada assenta em correcções ilegais é também ilegal a liquidação.

            No que concerne às correcções que não se consideram ilegais, a exigência de juros compensatórios depende de o retardamento da liquidação ser imputável à Requerente.

A responsabilidade objectiva é excepcional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (art. 483.º, n.º 2, do CC) e, por isso, deverá entender-se que, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um «facto imputável ao sujeito passivo» quando puder formular-se um juízo de censura em relação à conduta do próprio sujeito passivo.

Por outro lado, se é certo que, relativamente à responsabilidade pelo cumprimento de obrigações vigora no direito civil uma regra de responsabilidade do devedor «pelos actos dos representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor» (artigo 800.º, n.º 1, do Código Civil), que será subsidiariamente aplicável em matéria de responsabilidade pelo cumprimento das obrigações tributárias ( [1] ), também o é que, no específico caso da responsabilidade por juros compensatórios, o referido artigo 35.º, n.º 1, da LGT afasta a aplicabilidade daquela regra, ao restringir a responsabilidade aos casos em que o facto é imputável ao sujeito passivo. Isto é, à face deste regime legal, a responsabilidade do sujeito passivo pelas próprias obrigações tributárias não depende de culpa sua, mas já depende desta a responsabilidade por juros compensatórios.

Nesta linha, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender, uniformemente, que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte. ( [2] )

Como actos imputáveis aos contribuintes, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, devem considerar-se os praticados pelos técnicos oficiais de contas com o seu acordo expresso ou tácito, sendo admissível também a imputabilidade ao contribuinte nos caso de existir culpa in eligendo, justificada pelo facto de que o contribuinte ter uma relativa liberdade para escolher os técnicos oficiais de contas.

No caso em apreço, como se vê pela posição que assume no presente processo, em que defende que legalidade da contabilização dos gastos relativos à contratação do jogador BB… , a ilegalidade que neste acórdão se reconhece é imputável à Requerente.

            No que concerne à correcção relativa aos preços de transferência, resulta dos autos que a Requerente, no que concerne aos empréstimos que efectuou ao B… não deu cumprimento às obrigações que lhe são impostas pelo artigo 63.º do CIRC, designadamente pelos seus n.ºs 1, 6 e 7, pelo que não pode também deixar de formular-se um juízo de censura à sua actuação, já que é manifesto que é exigido o cumprimento daquelas obrigações relativamente a todas as operações realizadas com o Clube.

            Por isso, havendo culpa da Requerente no retardamento da liquidação na parte em que assenta na correcção efectuada em matéria de preços de transferência respectiva, é legal a liquidação de juros compensatórios, na parte correspondente.

 

 

5. Indemnização por garantia indevida

 

A Requerente formula pedido de indemnização por prestação de garantia indevida.

O artigo 171.º do CPPT, estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».

O pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido artigo 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.

O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do artigo 53.º da LGT, que estabelece o seguinte:

Artigo 53.º

Garantia em caso de prestação indevida

            1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.

            2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

            3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

            4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.

 

No caso em apreço, os erros subjacentes às liquidações impugnadas são imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, pois elas foram da sua iniciativa e a Requerente em nada contribuiu para que esses erros fossem praticados.

Por isso, a Requerente tem direito a indemnização pelos prejuízos que resultaram da prestação da garantia prestada, na proporção em que procede a sua pretensão anulatória.

No entanto, conclui-se do valor da garantia prestada, superior ao das liquidações que estão em causa no presente processo, que os processos de execução fiscal com ela conexionados não terão em vista apenas a cobrança coerciva das quantias decorrentes das liquidações que são objecto do presente processo.

Assim, não havendo elementos que permitam determinar o montante da indemnização, a condenação terá de ser efectuada com referência ao que vier a ser liquidado em execução do presente acórdão [artigos 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil e 565.º do Código Civil, aplicáveis nos ternos do artigo 2.º, alínea d), da LGT].

 

 

6. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

·         Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto às correcções respeitantes aos gastos relativos à contratação dos jogadores F… (F), L…, O…, S…, W…, DD… e GG…;

·         Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto às correcções respeitantes aos gastos relativos à aquisição de direitos de imagem dos jogadores F… (F) e NN…;

·         Anular a liquidação de IRC e juros compensatórios na parte correspondente às correcções referidas;

·         Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à correcção respeitante aos gastos relativos à contratação do jogador BB… e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos de anulação da liquidação de IRC e juros compensatórios, na parte respectiva;

·         Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à questão dos preços de transferência e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos de anulação da liquidação de IRC e juros compensatórios, na parte respectiva;

·         Julgar parcialmente procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira em indemnização pela garantia prestada, relativamente à parte que respeita a execuções instauradas para cobrança das quantias liquidadas pela liquidação de IRC e juros compensatórios impugnada e na proporção em que procede a sua pretensão anulatória;

 

 

7. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 275.844,33.

 

Lisboa, 24 de Janeiro de 2017

 

 

Os Árbitros

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

(Rui Duarte Morais)

 

 

(Maria Manuela do Nascimento Roseiro)

(Vencida conforme declaração junta)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Declaração de voto

 

Pese embora a douta fundamentação da decisão que fez maioria, não a subscrevo integralmente por divergências relativamente a alguns aspectos, designadamente quanto à interpretação da situação de facto.

Fundamentando a minha posição quanto à análise das diferentes questões decididas, tal como identificadas no ponto 3. do Acórdão, distingo:

1. Gastos relativos à aquisição de serviços de intermediação de empresários de futebol na contratação de diversos jogadores

No caso da contratação do jogador BB… (ponto 3.1.6.), tendo em conta que o jogador celebrou um contrato com o agente CC…, e que a A…, ao mesmo tempo que assinou contrato de trabalho desportivo, pagou ao referido agente admitindo que este representava o jogador, decidiu-se que face à representação do jogador pelo empresário em causa, as despesas com contratos de intermediação só poderiam ser pagas pelo jogador, de acordo com o disposto nos artigos 22.º, n.º 2, e 24.º, n.º 1, da Lei n.º 28/98. Defendeu-se claramente, neste caso, que face ao regime legal aplicável é indiferente que o representante do jogador também tenha prestado serviços à entidade desportiva que o contrata, pois resulta do n.º 1 do artigo 24.º que, a serem remunerados esses serviços, a remuneração incumbe ao jogador. Em consequência da verificação desta situação, veio a aceitar-se a correcção efectuada pela AT quanto à não aceitação das despesas deduzidas pela Requerente, na medida em que, para além do elenco de despesas consideradas, de acordo com o disposto no artigo 23.º do CIRC, indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, terá que se atender à previsão de não dedutibilidade de certos encargos enunciados no artigo 45º do CIRC. Entre eles, na alínea c) do nº 1 do referido artigo, encontram-se os «encargos que incidam sobre terceiros que o sujeito passivo não esteja legalmente autorizado a suportar» (n.º 1, alínea c), pelo que, ainda que os encargos com a contratação do jogador tenham sido assumidos pela entidade empresarial e considerados indispensáveis, não podem ser deduzidos.

Concordo inteiramente com esta decisão e fundamentação, considerando que a mesma deveria ter sido aplicada ao caso de outros jogadores.

É que nos casos dos jogadores F… (F), L…, O…, W…, DD…, foi considerado na presente decisão que a correcção à matéria colectável assentara em erro sobre os pressupostos, em síntese, porque: as informações sobre a representação dos jogadores careciam de fiabilidade; ainda que fossem verdadeiras o facto de as Partes (SAD e jogador) serem representadas um por uma sociedade e outro por sócio da mesma, não constituiria dupla representação vedada pelo artigo 22º, nº 2, e 24º, nº 1, da Lei nº 28/98, de 26/6 (norma que apenas proíbe que as pessoas singulares ou colectivas que exercem a actividade de empresário desportivo sejam remuneradas e ajam em nome e por conta de mais que uma parte na relação contratual); uma maior exigência eventualmente resultante dos Regulamentos da FIFA não produz efeitos fora da esfera desportiva, mas em qualquer dos casos, os pagamentos ou foram feitos à sociedade representante da SAD, e não ao representante do jogador (casos dos jogadores F…, L…, O…, S… e DD…) ou, apesar de as Partes serem representadas pela mesma pessoa, esta agiu por procuração do representante do jogador e não teria qualquer relação perceptível com este (caso de W…), pelo que não se verificaria a situação prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 45º do CIRC. [3]

Mas quanto a estas situações, apesar de possível circulação de erradas informações na internet e nos media, não nos parece que repetidas notícias, em diversos órgãos de comunicação ou sites desportivos, possam ser totalmente afastadas pelo depoimento de testemunhas apresentadas pela Requerente. E é a interpretação desses depoimentos, na sua globalidade e inter-relação, conjugada com a experiência que decorre de leituras de factos descritos quotidianamente na imprensa assim como de doutrina lida sobre a matéria, que nos leva a ter muitas dúvidas sobre alguns dos factos considerados provados na decisão, assim como a decorrente aplicação de direito.

Causa-me bastante estranheza a coincidência, existente na generalidade dos casos sub judice, verificada no momento da outorga do contrato de trabalho desportivo entre a SAD e os jogadores, quanto à representação de uma das Partes por uma sociedade e representação da outra Parte por um sócio da mesma sociedade, acontecendo mesmo casos em que é a mesma pessoa física a assumir esse duplo papel…

Apesar da existência do écran da personalidade jurídica colectiva, torna-se extremamente pouco crível que nas negociações não tenha sido compreendido (como sustentado por uma das testemunhas) que a respectiva representação se processava através de agentes, cujos substractos físicos e psicológicos exerciam a sua actividade no seio de uma mesma entidade societária. Ou seja, a representação da SAD e do jogador era efectuada por pessoas físicas/seres humanos (quando não uma mesma e única pessoa física) actuando ora sob a capa de sociedade ora a título individual.

Tal situação, pese embora a questão formal da diferente personalidade jurídica, parece configurar uma situação de eventual conflito de interesses e dupla representação (art.261.º, n.º 1 Código Civil), rejeitada pelas disposições aplicáveis, designadamente o art. 22.º, n.º 2, da Lei nº 28/98, de 26/6, ao pretender assegurar a melhor defesa dos interesses do jogador. Ora esta finalidade parece exigir que os interesses autónomos do jogador sejam, em termos de actuação material, defendidos por um agente diferente daquele que defende os interesses da outra parte, não bastando que uma pessoa singular actue sob diferentes chapéus, num caso na qualidade de representante da sociedade de que é sócio, noutro caso, como pessoa singular, ela própria[4].  

Na situação, considero que os elementos probatórios trazidos ao processo foram insuficientes para destruir as fundadas dúvidas manifestadas pela Requerida com base na inspecção tributária, e normais em situações como estas no mundo desportivo[5], e que levam às restrições quanto a dupla representação, quer por razões de transparência desportiva e tutela de interesses dos desportistas [6] como por razões fiscais[7].

Assim, atendendo à realidade económica e aos fundamentos expostos supra, considerando que bastaria a intervenção de o agente representante do jogador para a realização da intermediação e concretização do negócio e, na ausência de demonstração de prestação concreta de serviços à SAD, não aceitaria os custos correspondentes.

2. Mais-valias respeitantes à contratação de jogadores

Decidiria esta questão – relativa ao cálculo das mais-valias derivadas das alienações de jogadores W…, F… (F) e GG…– de acordo com a solução dada, de acordo com o acima exposto, aos gastos com despesas com serviços de agentes nas aquisições dos mesmos jogadores, afastando-me também aqui da solução que fez maioria.

3. Gastos relativos à aquisição dos direitos de imagem de jogadores

Em síntese, a presente decisão arbitral considerou provado que a aquisição pela SAD de direitos de imagem dos jogadores F… e NN… foi um gasto no interesse da empresa e conexionada com a respectiva actividade, com vista a assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de contratos celebrados com patrocinadores. Porque os direitos de imagem adquiridos teriam sido utilizados com intervenção directa dos jogadores em acções de promoção própria, cedendo-os para acções de patrocinadores e clientes de camarote, constituindo a mera titularidade dos direitos de imagem uma vantagem na negociação de patrocínios, obtenção de novos patrocinadores e fidelização dos existentes, encontrar-se-ia justificada a natureza empresarial dos gastos e a sua indispensabilidade nos termos do artigo 23º do CIRC.

Atendendo à situação de facto, verifica-se contudo: por um lado, os testemunhos apresentados foram demasiado vagos (concretamente, e sem documentação comprovativa, foi apenas referida a participação de um dos jogadores em sessão de autógrafos num evento de um patrocinador), e por outro, verifica-se que, em qualquer dos casos em discussão, os direitos de imagem foram adquiridos a sociedades detentoras desses direitos representadas na assinatura dos contratos pelos próprios jogadores (sócios ou gestores das referidas sociedades titulares dos direitos).

Esta situação suscita-me as maiores dúvidas sobre a real actividade das empresas detentoras dos direitos de imagem dos jogadores pelo que considero que teria exigido não apenas uma demonstração da indispensabilidade de custos assumidos e da utilização pela Requerente da imagem dos atletas (que, aliás, não creio que resulte inequívoca das declarações das testemunhas, todas ligadas profissionalmente à SAD) como a clara comprovação da qualificação da situação[8].

Que este tipo de prática é uma realidade que suscita dúvidas fundadas comprova-o a lei actualmente vigente que apenas permite a dedução de gastos com exploração dos direitos de imagem dos agentes desportivos num montante em percentagem correspondente a 20 % do respectivo total (nº 2 do artigo 2º da Lei nº 56/2013, de 14 de Agosto. Esta restrição foi justificada, pelo Grupo de Trabalho que procedeu à análise do regime jurídico e fiscal das sociedades desportivas[9], precisamente pelo reconhecimento das dificuldades existentes e encontra-se expressamente afirmada na Exposição de Motivos da Proposta de Lei apresentada pelo Governo na AR [10], onde se disse: “Deste modo, pretende-se que o novo regime passe a atribuir relevância fiscal às importâncias pagas pelas sociedades desportivas, a título de direitos de imagem, uma vez que tais pagamentos constituem, para as entidades referidas, uma inevitabilidade. Naturalmente que, com o objectivo de garantir o combate à fraude e à evasão fiscais, estabelece-se um critério objectivo, de natureza percentual, que permita a aceitação como custo fiscal, até ao respectivo limite, dos montantes envolvidos. (sublinhados nossos)[11].

No caso dos autos, não estava em vigor a Lei nº 56/2013, de 14/08, não se prevendo então na lei em vigor (Decreto-Lei nº 103/97, de 13 de Setembro) nada sobre a matéria. Dada a existência de desconfianças justificadas (confirmadas pelas preocupações manifestadas pelo Grupo de Trabalho referido e posteriormente pelo legislador) cremos que seria exigível, numa situação destas, uma comprovação clara da própria relação comercial subjacente à ligação entre jogador e sociedade interposta e entre esta e o clube ou sociedade desportiva, comprovando-se documentalmente as operações e funções desempenhadas[12].

Por estas razões e na ausência de prova adequada, de acordo com o exposto, não aceitaria os custos relativos à aquisição pela Requerente dos direitos de imagem individual dos jogadores.

4. Juros de operações com entidades relacionadas (B-Clube)

Concordo, neste ponto, inteiramente com o teor da presente decisão.

 

 

Manuela Roseiro

 

 

 

 

 



[1]              Aliás, a responsabilidade do sujeito passivo pelo cumprimento das obrigações tributárias, mesmo nos casos de «violação pelos técnicos oficiais de contas dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos» está ínsita no n.º 3 do art. 24.º da LGT, em que se prevê que, nestes casos, a responsabilidade destes técnicos é meramente subsidiária, não excluindo a responsabilidade originária dos próprios contribuintes.

[2]              Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:

– de 20-3-1996, processo n.º 20042, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-3-1998, página 1067;

– de 2-10-1996, processo n.º 20605, publicado em Apêndice ao Diário da República de 28-12-1998, página 2707;

– de 18-2-1998, processo n.º 22325, publicado em Apêndice ao Diário da República de 8-11-2001, página 553;

– de 3-10-2001, processo n.º 25034, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.º 492, página 1615, e publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2080;

– de 29-1-2003, processo n.º 1647/02, publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-3-2004, página 164;

– de 12-3-2003, processo n.º 26800, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.º 506, 219 e publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-3-2004, página 545;

– de 19-11-2008, processos n.ºs 325/08 e 576/08;

– de 11-3-2009, processo n.º 961/08.

[3] A situação de GG… apresenta-se como mais confusa mas a questão da dupla representação é idêntica à dos outros jogadores, pelo menos relativamente a uma das entidades destinatárias de pagamentos por intermediação na contratação.

[4] Aliás estranha-se o facto de o sócio-gerente exercer actividade de empresário desportivo em concorrência com a sociedade (cf. artigo 180º, nº 1, do CSC), indiciando fortemente que os interesses de ambos estão alinhados (sob pena de a sociedade poder exigir que os negócios efectuados pelo sócio, por conta própria, fossem considerados efectuados por conta da sociedade).

[5] Ou seja, libertar o jogador do encargo de remunerar o empresário desportivo que o represente, o clube ou sociedade desportiva permite-lhe com isto obter uma remuneração acessória. Por isso a aceitação da desta prática, seria admissível se a importância fosse tributada em sede de IRS, sob a categoria de trabalho dependente, nos termos do artigo 2º do CIRS, ou seja, a admissão da dedução para efeitos de IRC no clube ou sociedade desportiva seria dependente da respectiva tributação em sede de IRS ao jogador em causa.

[6] As preocupações manifestadas são também da FIFA, quer no “FIFA Players’ Agents Regulations”, actualizado em 2008 (vigente ao tempo dos factos) quer FIFA Regulations on Working with Intermediaries”, entrado em vigor a 1 de Abril de 2015. Quanto à relevância das regras da FIFA, com interesse, Acórdão da Relação de Lisboa, de 14 de Outubro de 2008, proc. 7929/2008.

[7] Como evitar que rendimentos de trabalho (benefício correspondente à assunção pelo clube ou SAD do pagamento da comissão devida pelo jogador ao intermediário) sejam abatidos como custo da entidade pagadora sem sofrerem a correspondente tributação pelo trabalhador.

 

[8]Como referido por Abílio Rodrigues, in O Regime Fiscal das Sociedades Desportivas e o Enquadramento Tributário da Atividade dos Empresários Desportivos, Tese de Mestrado, FDUP, 2012: “qualificam-se valores como correspondentes a exploração de direitos de imagem, quando na realidade não o são”, e, indica como a maior preocupação nesta matéria a “incorreta qualificação dos encargos das sociedades desportivas, através do recurso a esquemas de fraude fiscal, nomeadamente pela utilização de sociedades interpostas”, sendo “frequentemente utilizada pelas sociedades desportivas, a qualificação de montantes correspondentes a salários de jogadores, a título de exploração de direitos de imagem, para com isso atingir vantagens de ordem fiscal”, como dedução de custos, diminuição substancial de encargos associados à tributação e às contribuições para a Segurança Social. (estudo citado, pp. 37 e ss.)

[9] Criado por despacho do Ministro competente, de 16 de Setembro, publicado no DR 2.ª Série, n.º 184, de 23 de Setembro. Nele se concluiu: “É o caso, por exemplo, das importâncias pagas pelas sociedades anónimas desportivas, a título de direitos de imagem, situação em que a Administração Fiscal exige a demonstração da indispensabilidade e da utilização da imagem dos atletas, sob pena de tais importâncias não serem aceites como gasto para efeitos fiscais. Considerando que tais pagamentos constituem, para as sociedades anónimas desportivas, uma inevitabilidade, entende-se que têm de ser considerados relevantes do ponto de vista fiscal, devendo, no entanto, estabelecer-se um critério objectivo, de natureza percentual, que permita a aceitação como custo fiscal, até ao respectivo limite, dos montantes envolvidos”.

[10] Proposta de Lei nº 119/XII, [DAR II série A N.º50/XII/2 2012.12.12 (pág. 101-107)] e que deu origem à Lei 56/2016.

[11] O nº 2 do artigo 2º da Lei nº 56/2013, diz “ Sem prejuízo do disposto no artigo 23.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (Código do IRC), os montantes pagos pela sociedade desportiva a título de exploração dos direitos de imagem dos agentes desportivos são considerados gastos em percentagem correspondente a 20 % do respetivo total. “sem prejuízo do disposto no artigo 23.º do Código do Imposto sobre as Pessoas Coletivas (IRC)”.

[12] Ou seja, que não se trata de uma situação como a descrita também por Abílio Rodrigues: “os direitos de imagem dos jogadores de futebol são frequentemente detidos por sociedades interpostas que, não desempenhando qualquer atividade comercial relacionada com a exploração dos mesmos, recebem a esse título, por parte dos clubes ou sociedades desportivas, montantes que na realidade correspondem a remunerações pelo trabalho do jogador mais penalizadas do ponto de vista fiscal”. (sublinhado nosso).