Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 201/2017-T
Data da decisão: 2017-09-28  IMI  
Valor do pedido: € 2.052,02
Tema: IMI – Classificação de prédios urbanos, posto de abastecimento de combustíveis
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Decisão Arbitral

 

 

I – RELATÓRIO

 

  1. A…, SA NIPC[1]…, com sede na Avª … nº…, …, área do … serviço de finanças de Lisboa, apresentou um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a ATA[3], com vista a declaração de ilegalidade do ato de fixação do VPT[4] do prédio urbano de que é proprietária, inscrito sob o artigo … da respetiva matriz da União de freguesias … e …, do concelho de Cascais, que foi fixado em 2ª avaliação no montante de € 526 160,00, com a consequente repetição do ato de avaliação e classificação do imóvel como prédio comercial, fixando-se o inerente VPT de € 1 55 660,00.
  2.  Que o pedido foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[5] em 24/03/2017 e notificado à ATA na mesma data.
  3. Nos termos e para efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicado às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 17/05/2017, designado árbitro do tribunal Arlindo José Francisco, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo legalmente estipulado.
  4. O tribunal foi constituído em 01/06/2017 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
  5. Com o seu pedido, visa a requerente, a anulação do ato de fixação do VPT do aludido imóvel, a sua classificação como comercial e a repetição do procedimento de avaliação com a fixação do VPT em € 155 660,00.
  6. Suporta o seu ponto de vista, em síntese, em erros de facto e de direito no ato de fixação do VPT quer na 1ª quer na 2ª avaliação, tendo a comissão de avaliação, desconsiderado o artigo 6º do CIMI[6] e inúmeras decisões arbitrais.
  7. A referida comissão seguiu o Manual de Avaliações, classificando o imóvel como “outros”, quando o mesmo, no entender da requerente e de acordo com o artigo 6º do CIMI, apenas poderá ser classificado de “comercial”, devendo o seu VPT ser apurado nos termos do artigo 38º do referido Código.
  8. Sustenta que o imóvel em questão é composto por edifícios (cafetaria, armazém dois casinhotos) e terreno, no qual estão instaladas, as estruturas de equipamento (cobertura metálica, tanques, bombas de combustível, arruamentos, passeios e zonas verdes.
  9. Trata-se, portanto, de uma estação de serviço, licenciada para uma atividade comercial (venda de combustíveis, alimentos e bebidas) pelo que o imóvel só poderá ser classificado como urbano “comercial”, concluindo pela ilegalidade das avaliações, praticadas à luz do Manual de Avaliações e artigo 46º, nº 2 do CIMI.
  10.  Na resposta, a requerida, e também em síntese, diz que o imóvel é um posto de  abastecimento de combustível o que considera relevante para a sua classificação como “outros”, ao abrigo do nº 4 do artigo 6º do CIMI, abarcando as construções licenciadas para esse fim que, do seu ponto de vista, não são fins habitacionais, comerciais, industriais ou serviços.
  11. Nesta perspetiva, a ATA, na determinação do VPT optou por aplicar o método do custo adicionado do valor do terreno, previsto no nº 2 do artigo 46º do CIMI, em detrimento do método de a avaliação previsto no artigo 38º do CIMI.
  12.  O método de avaliação utilizado, desconsiderou qualquer implantação e tratou o terreno isoladamente, tal como é exigido, tendo em conta as áreas médias de construção admitidas para a zona envolvente, segundo os índices do PDM[7].
  13.  Concluindo com o suporte do Acórdão do STA[8] de 10 de Abril de 2013, no processo 0770/12 que acolhe, na perspetiva da requerida o método utilizado nas avaliações.

 

 

II - SANEAMENTO

O tribunal foi regularmente constituído.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º, nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

Face à resposta da requerida, o tribunal proferiu, em 04/07/2017, despacho em que considerou desnecessária a realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, bem como a produção de alegações orais ou escritas e concedeu 10 dias para as partes se pronunciarem sobre este entendimento e para a requerida juntar o PA.

Em 12/07/2017 a requerida juntou o PA[9].

 

 

 

Por despacho de 20/07/2017, tendo em conta a junção do PA, o silêncio das partes, quanto à desnecessidade da reunião do artigo 18º do RJAT bem como da produção de alegações, o tribunal considerou reunidas as condições para proferir decisão e fixou o dia 28/09/2017 para o efeito.

Deste modo, não enfermando o processo de nulidades e não tendo sido invocadas exceções, cumpre decidir.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

  1. – A questão a dirimir, com interesse para os autos, é a seguinte:

 

  1. Se o ato de fixação do VPT do imóvel em questão está ferido de vícios de facto e de direito que conduzam à sua anulação.
  2. Em caso afirmativo se deverá repetir o procedimento de avaliação com a fixação de novo VPT.

 

2– Matéria de Facto

 

  1. A requerente apresentou em 22 de Dezembro de 2014 requerimento a solicitar a correção da avaliação levada a efeito em 2008 ao imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da União de freguesias … e …, uma vez que na mesma o imóvel foi classificado como “outros” quando o mesmo deveria ter sido considerado como comercial, apresentando conjuntamente a respetiva declaração modelo I de IMI[10].

 

  1. Deste procedimento foi determinado um VPT para o imóvel de € 483 150,00, mantendo-se a classificação do imóvel como “outros”, tendo a requerente apresentado um pedido de 2ª avaliação por discordar da classificação e, no qual procurou demonstrar que o prédio deveria ser classificado como comercial e ser avaliado nos termos do nº 1 do artigo 38º do CIMI e não da forma prevista no nº2 do artigo 46º do mesmo diploma, como aconteceu.
  2. Do pedido da 2ª avaliação não só se manteve a classificação do imóvel como “outros” como resultou da mesma, um VPT de € 526 160,00, tendo o representante da requerente na Comissão que procedeu a esta avaliação lavrado um voto de vencido, por considerar que, dada a natureza comercial do imóvel, a sua avaliação deveria seguir a forma prevista no nº 1 do artigo 38º do CIMI já citado.
  3. Nas avaliações, como já se viu, o prédio foi sempre classificado como “outos” com a justificação de corresponder a um posto de combustível, pelo que se aplicou na avaliação o método do custo de construção previsto no artigo 46º nº2 do CIMI.
  4. O imóvel em questão é constituído por dois edifícios destinados a cafetaria e armazém, dois casinhotos e terreno, no qual estão implantados tanques de combustível, bombas de combustível, cobertura metálica, arruamentos, passeios, zonas verdes e acessos para abastecimento dos veículos.
  5. O Alvará de Utilização nº … emitido pela Câmara Municipal de Cascais em 27/12/2002 consta que o prédio tendo em conta a sua composição destina-se a “Posto de Abastecimento de Combustíveis”.

A matéria de facto dada como provada resulta dos elementos juntos aos autos, não se considerando existir factos não provados que sejam relevantes para a decisão.

 

3- Matéria de Direito

 

O que importa apurar é saber se avaliação aqui em causa padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, ao partir da classificação do imóvel como urbano “outros” enquanto imóvel licenciado como “posto de Abastecimento de Combustíveis” ou se, pelo contrário, o mesmo deveria ter sido considerado como um imóvel “comercial”.

 É que a classificação que for atribuída à realidade fática existente irá condicionar o método a utilizar na respetiva avaliação, isto é, na primeira hipótese será utilizado o método previsto no nº 2 do artigo 46º do CIMI, utilizado pela requerida, na segunda hipótese será utilizado o previsto no nº 1 do artigo 38º do mesmo diploma como pretende a requerente.

Teremos que observar o que nos diz o CIMI, nomeadamente o seu artigo 6º quanto à classificação dos prédios urbanos. De acordo com o seu nº 1 os prédios urbanos dividem-se:

  1. Habitacionais;
  2. Comerciais, industriais ou para serviços;
  3. Terrenos para construção;
  4. Outros.

O nº 2 do mesmo artigo estabelece que habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal, cada um destes fins.

Os classificados como “outros” são definidos pelo critério residual constante no nº 4 do referido artigo 6º, no que se reporta aos edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no nº 2 e ainda os mencionados no nº 3 do referido normativo.

Ora serão prédios com destino comercial, aqueles cuja utilização permite a prática de atos de comércio, regulados pela lei comercial, nomeadamente os previstos no artigo 463º do Código Comercial.

Nesta perspetiva, a venda de combustíveis, exercida pela requerente no prédio em questão, consubstancia objetivamente a prática de atos de comércio, dado que a venda de produtos adquiridos para esse fim são vendas comerciais e, por sua vez, tais atos são praticados por uma sociedade comercial que, nos termos do nº 2 do artigo 13º do Código Comercial, é considerada comerciante.

No caso concreto, não colhe a argumentação de que não basta a prática de atos comerciais num imóvel para que este seja automaticamente classificado de comercial, fazendo a comparação com uma praça de touros, que do ponto de vista deste tribunal, não é semelhante, não se aplicando o decidido no Acórdão do STA, proferido no processo 0770/12 de 10/04/2013 dado estarmos perante realidades diversas e incomparáveis.

 Um “posto de abastecimento de combustíveis” é uma realidade complexa que comporta para além das unidades de abastecimento, outros edifícios e estruturas integradas (como lojas de conveniência, cafetaria, postos de lavagem de veículos, etc.) que no seu conjunto estrutural acrescido da clientela, formam o estabelecimento comercial.

No caso em apreço estamos perante um imóvel estruturado como estabelecimento comercial e não vislumbramos qualquer impedimento para que na sua avaliação se aplique o método previsto no artigo 38º do CIMI já citado.

Aliás é basta a jurisprudência arbitral no sentido de considerar os postos de abastecimento de combustíveis como prédios urbanos comerciais.

Também o TCA[11] do Sul, proferiu acórdão em 04 de Junho de 2015 no processo 08035/14, onde decidiu que apenas se poderá classificar um prédio urbano na espécie “outros”, prevista na alínea d) do nº1 do artigo 6º do CIMI, quando o edifício ou construção não seja de classificar na espécie comerciais, industriais ou para serviços.

Como já se viu o prédio em questão é uma estrutura complexa, constituído por dois edifícios, destinados a cafetaria e armazém, dois casinhotos, tanques, bombas de combustível, arruamentos, passeios, zonas verdes e locais de passagem de veículos para compra de combustíveis que, no seu conjunto, são parte do estabelecimento comercial, logo não se vê qualquer motivação que impeça a sua classificação como prédio comercial e como tal que a determinação do seu VPT tenha de ser feita nos termos previstos no artigo 38º do CIMI.

IV – DECISÃO

Assim o tribunal decide:

  1. Declarar o pedido de pronúncia arbitral procedente, com a consequente declaração de ilegalidade do ato de avaliação aqui posto em crise, determinando a sua anulação.
  2. Determinar a repetição do procedimento de avaliação em conformidade com a qualificação do prédio como “prédio comercial” e aplicação dos critérios previstos no artigo 38º do CIMI, com a redação em vigor à data dos factos.
  3. Fixar o valor do processo em € 2 052,02 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299º, nº 1, do CPC[12], artigo 97º-A do CPPT[13], e artigo 3º, nº2, do RCPAT[14].
  4. Fixar as custas, ao abrigo do nº4 do artigo 22º do RJAT, no montante de € 612,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo da requerida.

 

Lisboa, 28 de Setembro de 2017

 

Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º, nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.

O árbitro

 

 Arlindo José Francisco

 



[1] Acrónimo de Número de identificação de Pessoa Coletiva

[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária

[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira

[4] Acrónimo de Valor Patrimonial Tributário

[5] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa

[6] Acrónimo de Código do Imposto Municipal sobre Imóveis

[7] Acrónimo de Plano Diretor Municipal

[8] Acrónimo de Supremo Tribunal Administrativo

[9] Acrónimo de Processo Administrativo

[10] Acrónimo de Imposto Municipal sobre Imóveis

[11] Acrónimo de Tribunal Central Administrativo

[12] Acrónimo de Código de Processo Civil

[13] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário

[14] Acrónimo de Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária