Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 260/2017-T
Data da decisão: 2017-12-15  Selo  
Valor do pedido: € 10.323,20
Tema: Imposto do Selo - Verba 28.1 TGIS - propriedade vertical.
* Decisão arbitral revogada no segmento recorrido por acórdão do STA de 24 de outubro de 2018, recurso n.º 99/18.3BALSB que decide em substituição
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DECISÃO ARBITRAL

O árbitro João Taborda da Gama, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 27-06-2017, acorda no seguinte:

1.             Relatório

 

A…, NIF…, representada fiscalmente por B…, NIF…, residente na Av. …, … –…, …-… Lisboa, (doravante designada por “Requerente”), apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 26-04-2017. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 09-06-2017 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.                    Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral foi constituído em 27-06-2017.                                                   

Por despacho de 08-11-2017 foi dispensada reunião e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.                                                                                                     As Partes apresentaram alegações.                                                                                          O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro, e é competente.        

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).                                                                 O processo não enferma de nulidades.

 

 

2.                  Matéria de facto

 

2.1.            Factos provados

 

Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:

 

A)    Em 31 de dezembro de 2012, a Requerente era proprietária única do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana, sob o n.º…, da Freguesia de … e descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …, em propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, com o valor patrimonial total de €1.032.320,00;

B)    Dos referidos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, 15 divisões têm afetação habitacional;

C)    Das quinze divisões suscetíveis de utilização independente, todas – unidades R/C Direito, R/C Esquerdo, 1.º Direito, 1.º Esquerdo, 2.º Direito, 2.º Esquerdo, 3.º Direito, 3.º Esquerdo, 4.º Direito, 4.º Esquerdo, 5.º Direito, 5.º Esquerdo, 6.º Direito, 6.º Esquerdo e 7.º Andar – se encontram afetas a habitação;

D)    O somatório dos VPT atribuídos aos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente e afetação habitacional é de €1.032.320,00;

E)    O VPT atribuído a cada andar ou divisão suscetível de arrendamento separado e afetação habitacional, varia entre €44.240,00 e €72.520,00:

 

F)     O somatório das liquidações de Imposto do Selo – verba 28.1., do ano de 2012, relativas ao prédio identificado nos autos, é de €10.323,20:

 

 

Liquidações

Divisões Independentes

VPT

IS (Verba 28.1 TGIS – 1%)

Colecta

2013 …

R/C Direito

64.540,00 €

645,40 €

645,40 €

2013 …

R/C Esquerdo

53.300,00 €

533,00 €

533,00 €

2013 …

1.º Direito

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

1.º Esquerdo

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

2.º Direito

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

2.º Esquerdo

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

3.º Direito

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

3.º Esquerdo

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

4.º Direito

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

4.º Esquerdo

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

5.º Direito

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

5.º Esquerdo

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

6.º Direito

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

6.º Esquerdo

72.520,00 €

725,20 €

725,20 €

2013 …

7.º Andar

44.240,00 €

442,40 €

442,40 €

 

Total

1.032.320,00 €

10323,2

10.323,20 €

G)   Embora não se tenha conformado com a legalidade das liquidações de IS do ano de 2012, a Requerente procedeu ao pagamento voluntário dos montantes previstos nas liquidações, no valor global de €10.323,20;

H)   A Requerente apresentou, no dia 19 de agosto de 2016, um pedido de revisão oficiosa relativamente aos atos de liquidação de Imposto do Selo n.ºs 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013… e 2013…, referentes ao exercício de 2012, no montante de €10.323,20.

I)      Por Ofício de 4 de janeiro de 2017, n.º…, a Requerente foi notificada do Despacho proferido pelo Senhor Chefe de Finanças de … (em substituição), da Direção de Finanças de Lisboa, em 22 de dezembro de 2016, que determinou o indeferimento do pedido de revisão oficiosa n.º …2016… .

 

2.2.            Factos não provados

 

Não existem factos relevantes para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.

 

2.3.            Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral.

  

3.                  Matéria de direito

 

3.1.   Questão do mérito do pedido de pronúncia arbitral

 

A questão a decidir, nos termos e com os fundamentos que aqui se colocam, tem sido objeto de inúmeras decisões dos tribunais superiores no sentido sustentado pela Requerente - a título de exemplo, e por ser a mais recente, veja-se o AcSTA n.º 10090/17, de 22 de novembro (Rel.: Cons.ª Dulce Neto) no qual, além do mais, se pode ler que “a posição sustentada pela recorrente [AT] contraria frontalmente a tese doutrinal consagrada, de forma pacífica e reiterada, pelo Supremo Tribunal Administrativo, mormente no acórdão em que se ancorou a sentença recorrida, prolatado por esta Secção em 9/09/2015, no proc. nº 0899/14. Acresce que, para além desse acórdão, foram tirados inúmeros outros arestos, v. g., os mencionados na conclusão 15.ª das contra-alegações e, posteriormente, o acórdão uniformizador de jurisprudência prolatado pelo Pleno desta Secção em 29/03/2017, no proc. nº 0593/16”. É esta também a posição de inúmeras decisões proferidas pelos tribunais arbitrais constituídos no âmbito do CAAD. Seguiremos aqui a decisão n.º 93/2017-T, de 26 de junho de 2017.

A verba 28.1 da TGIS, em que se basearam as liquidações impugnadas, tinha a seguinte redação, no ano de 2012, que está em causa:

“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1. Por prédio com afectação habitacional ------------------------- 1%;”.  

Como resulta da matéria de facto fixada, está subjacente às liquidações impugnadas um prédio em propriedade vertical, que engloba várias frações autónomas destinadas a habitação, além de outras.                                                                                                                  Todas as frações destinadas a habitação têm valor patrimonial tributário inferior a €1.000.000,00.                                                                                                                  Neste tipo de situações não tem aplicação a verba 28.1 da TGIS como tem entendido reiteradamente o Supremo Tribunal Administrativo, de forma unânime.                    Entre vários, pode ver-se neste sentido o acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 29-03-2017, proferido no processo n.º 0593/16, tirado por unanimidade, em que se refere, além do mais, o seguinte:                                                                                           No artigo 67.º, n.º 2 do Código do IS, estabelece-se que «às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o Código do IMI». Deste modo parece legítimo afirmar que as opções legislativas a este propósito hão-de recolher-se no Código do IMI. Significa isto que, o legislador tributário não pretende que os conceitos em causa hajam de ser densificados por utilização de outros ramos do direito, nomeadamente o Código Civil onde uma longa tradição define com precisão o que são prédios, prédios rústicos e urbanos, como define a propriedade plena e a propriedade horizontal definindo um regime detalhado para uma e outra. O legislador efectuou, de forma clara e expressa no Código do IMI, opção por conceitos que, muitas vezes homónimos dos do Código Civil se afastam dele quanto ao seu conteúdo de molde a abarcarem mais realidades passíveis de tributação. O conceito de prédio para efeitos de IMI, art.º 2.º é tão lato que muito ultrapassa, quando não derroga mesmo, a natureza de coisa sobre que incidem os direitos reais aproximando-se mais da potencialidade económica dos bens para gerarem riqueza que, se pretende tributar, que da natureza real do direito que sobre a coisa possam ter os contribuintes. Assim, qualquer solução para a presente situação que haja de emergir dos conceitos do Código Civil quanto ao que sejam prédios e quanto à regulamentação do direito de propriedade, mostra-se desadequada. Que para o Código Civil a propriedade horizontal não se confunde com a propriedade de um imóvel em que as suas partes têm utilizações destacadas e são susceptíveis de utilização económica independente é uma evidência, mas, que nada acrescenta à solução que buscamos.                       

Tal como referido no acórdão fundamento é o legislador naquele artigo 67.º, n.º 2 do Código do IS que aponta o caminho que o julgador deve seguir em termos de clarificar a incidência objectiva do IS – verba 28 – sem que dele se possa afastar, exactamente pelas condicionantes de tipicidade legal a que estão constitucionalmente sujeitos estes tributos. Argumentar que a finalidade das matrizes é diversa, que a diferença assenta no número de cadernetas prediais emitidas serve apenas para constatar que em meros pormenores de tratamento burocrático se apreendem ténues diferenças entre as fracções dos prédios constituídos em propriedade horizontal e as partes de um prédio não constituído em propriedade horizontal mas que integra partes susceptíveis de utilização independente e com valor económico. Que são coisas diferentes ninguém dúvida, mas aqui trata-se de saber se o legislador lhes pretendeu dar um tratamento diferente para efeitos de tributação.      Tal como expresso no acórdão fundamento, pelas razões nele mencionadas que aqui reafirmamos só podemos concluir, utilizando as regras de interpretação constantes do art.º 9.º do Código Civil, estas sim aplicáveis subsidiariamente por força do disposto no art.º 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, que a solução a aplicar, neste caso à tributação em sede de IS, só pode ser a que o legislador definiu para efeitos de tributação em sede de IMI, porque esta foi a clara e expressa opção do legislador.”                                         

A fundamentação do acórdão fundamento para que se remete neste aresto é a seguinte:

«(…) cumpre reunir as conclusões que permitam, sem margem para dúvidas, decidir sobre o tema em discussão (ou seja se, para efeitos da aplicação da Verba n.º 28 da TGIS, nos casos em que um prédio com várias fracções autónomas, susceptíveis de utilização independente, não se encontre constituído em propriedade horizontal, o VPT relevante é apurado mediante o somatório dos VPTs individuais, ou, alternativamente, é individualmente considerado).                                                                                     Neste sentido, refira-se, em primeiro lugar, que a presente temática está, desde logo por força do artigo 67.º, n.º 2 do Código do IS, sujeita às normas do Código do IMI, “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI”.                                                                                        Como tal, e como já tantas vezes se mencionou, no entendimento do presente tribunal, o mecanismo para o apuramento do VPT relevante para efeitos da aludida verba, é o que se encontra estatuído no Código do IMI.                                                                 Ora, o artigo 12.º, n.º 3 do Código do IMI estabelece que “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário”.                           Desvalorizando o legislador, nos termos anteriormente mencionados, qualquer prévia constituição de propriedade horizontal ou vertical.                                                            Com efeito, para este (legislador), o que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.                                                      Refira-se que a própria ATA parece concordar com o critério exposto, razão pela qual as liquidações que a própria emite são muito claras nos seus elementos essenciais, donde resulta o valor de incidência ser o correspondente ao VPT de cada um dos andares e as liquidações individualizadas.                                                                                           Logo, se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu o critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência do novo imposto.

Assim, só haveria lugar a incidência de IS (no âmbito da Verba n.º 28 da TGIS) se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00.                                                      

Não podendo a ATA considerar como valor de referência para a incidência do novo imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de IMI (e, tal como anteriormente mencionado, este é o código aplicável às matérias não reguladas no que toca à Verba n.º 28 da TGIS). Em conclusão, o regime jurídico actual não impõe a obrigação de constituição de propriedade horizontal, pelo que a actuação da ATA traduz-se numa discriminação arbitrária e ilegal.                                

De facto, não pode a ATA distinguir onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar a coerência do sistema fiscal, bem assim como o princípio da legalidade fiscal previsto no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, e ainda os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade fiscal.             No caso em apreço, o[s] prédio[s] em causa encontrava[m]-se, à data relevante dos factos, constituído[s] em propriedade total e tinha[m] […] fracções com utilização independente, como resulta dos documentos […]. Dado que nenhuma dessas fracções tem valor patrimonial igual ou superior a € 1.000.000,00, como resulta dos documentos juntos aos autos, conclui-se pela não verificação do pressuposto legal de incidência».

Em sintonia com esta jurisprudência, as liquidações impugnadas são ilegais, por vício de violação de lei, já que não cabem no campo de aplicação da verba 28.1 da TGIS os prédios em regime de propriedade total ou vertical que integrem frações destinadas a habitação suscetíveis de utilização independente que não tenham, qualquer delas, valor patrimonial tributário superior a €1.000.000,00.

Este vício justifica a anulação das liquidações, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

3.2.    Dos juros indemnizatórios e do reembolso

Tratemos agora o pedido formulado pela Requerente de reembolso das quantias que aqui se julgaram já indevidamente liquidadas e pagas. A Requerente pede ainda juros indemnizatórios pelo pagamento indevido do Imposto de Selo.

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão, de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão». 

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária». 

Ora, é pacífico que o processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como resulta do disposto no artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo. 61.º, n.º 4 do CPPT. 

Assim, o n.º 5 do artigo. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral. 

Cumpre, assim, apreciar o pedido de reembolso do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios. 

No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, há lugar a reembolso do imposto pago, por força dos referidos artigos. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado». 

Quanto aos juros, o regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, que “1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido. 2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efetuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.”  

Ora, no caso em apreço, a ilegalidade das liquidações é totalmente imputável à AT, Requerida, face ao que foi supra dado como provado.  

Por outro lado, também a manutenção da situação ilegal, i. e., a decisão da revisão oficiosa é imputável à Administração Tributária, que a indeferiu por sua iniciativa. Assim, a Requerente tem direito aos juros indemnizatórios peticionados, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1, e 35.º, n.º 10 da LGT, do artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, do artigo 61.º, n.ºs 3 e 4, do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril (ou outra ou outras que alterem a taxa legal), desde a data referida até integral pagamento.

4.                  Decisão

Nestes termos, acorda este Tribunal Arbitral em:

(i)                 Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente anulação das liquidações impugnadas, com todas as consequências legais, desde logo o reembolso à Requerente dos montantes por ela pagos, relativamente às liquidações ora anuladas;

(ii)              Julgar procedente o pedido de condenação da Requerida no pagamento à Requerente de juros indemnizatórios, à taxa legal, sendo eles contados desde a data do respetivo pagamento até ao seu integral reembolso.

 

5.                  Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de €10.323,20 (dez mil, trezentos e vinte e três euros e vinte cêntimos).

 

6.                  Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 15 de dezembro de 2017.

 

O Árbitro,

João Taborda da Gama