Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 97/2021-T
Data da decisão: 2021-12-10  IRC  
Valor do pedido: € 93.291,64
Tema: IRC - Royalties; Crédito de imposto por dupla tributação jurídica internacional.
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Sumário:

I. Os rendimentos auferidos em virtude de um contrato de afretamento e de um protocolo de acordo de cedência de pessoal técnico conexo com o contrato de afretamento são qualificáveis para efeitos da CDT celebrada entre Portugal e Moçambique como royalties;

II. Em caso de conflito entre as normas da CDT e as normas do Código do IRC relativas à dedução do crédito de imposto por dupla tributação jurídica internacional devem prevalecer as primeiras ao abrigo do disposto no artigo 8.º, da CRP e no artigo 1.º, n.º 1, da LGT.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os Árbitros Alexandra Coelho Martins, José Eduardo Mendonça da Silva Gonçalves e Carla Castelo Trindade, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral colectivo, decidem no seguinte:

 

I. RELATÓRIO

 

1. A..., S.A., com sede na ..., ...-... ..., ..., Aveiro, pessoa colectiva ..., vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º-A, n.º 2, e 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à declaração de ilegalidade da decisão proferida pelo Senhor Director de Finanças de Aveiro que indeferiu o pedido de revisão oficiosa n.º ...2020... no qual se contestou a legalidade do acto de autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”) relativo ao período de tributação de 2013, na parte em que não reflectiu a dedução à colecta do imposto sobre o rendimento pago em Moçambique.

 

            2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 16 de Fevereiro de 2021 pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) e automaticamente notificado à Requerida.

 

            3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

            Em 11 de Maio de 2021, as partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

 

            4. Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo ficou constituído em 31 de Maio de 2021.

 

            5. A Requerente veio sustentar a procedência do seu pedido, em síntese, tendo em conta os seguintes argumentos:

            Começou a Requerente por referir que no período de tributação de 2013 auferiu rendimentos em Moçambique pela prestação de serviços de afretamento de navio e de cedência de pessoal técnico à sociedade de direito moçambicano B..., S.A. (“B...”). Segundo a Requerente, esses rendimentos foram qualificados em Moçambique como royalties e sujeitos a tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRPC”) por via de retenção na fonte à taxa liberatória de 10% em conformidade com o disposto no artigo 12.º, n.º 2, da Convenção entre a República Portuguesa e a República de Moçambique para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e Prevenir a Evasão Fiscal na redacção conferida pelo protocolo que reviu essa mesma convenção  (“CDT”).

            De acordo com a Requerente, a tributação suportada em Moçambique não foi reflectiva na autoliquidação de IRC do ano de 2013, já que não se efectivou naquele acto a dedução de um crédito pelo IRPC suportado. Entendeu a Requerente que aquele acto de autoliquidação era parcialmente ilegal, uma vez que fazia prevalecer a aplicação do artigo 91.º, n.º 1, do Código do IRC sobre a aplicação do artigo 23.º, n.º 1, da CDT que, enquanto norma de direito internacional, prevalece sobre a primeira nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”). Quer isto dizer que, para a Requerente, o acto de autoliquidação era ilegal na medida em que materializava uma limitação da dedução de crédito de imposto ao valor correspondente ao IRPC incidente sobre o rendimento líquido gerado em Moçambique, ao arrepio da norma da CDT que impunha a dedução integral do IRPC incidente sobre os rendimentos ilíquidos gerados naquele Estado.

            Acresce que, no entender da Requerente, também era ilegal a decisão do procedimento de revisão oficiosa referente acto de autoliquidação de IRC do período de 2013 que indeferiu o pedido da Requerente com base no entendimento de que os rendimentos em causa não eram qualificáveis como royalties na acepção do artigo 12.º, n.º 3, da CDT e, nessa medida, não existia sequer o direito à dedução do crédito de imposto por dupla tributação internacional. Para a Requerente, aqueles rendimentos eram efectivamente royalties para efeitos da CDT, já que o afretamento traduzia a concessão do uso de um equipamento industrial ou comercial e a cedência de pessoal técnico traduzia a transmissão de informações técnicas (Know-how), de carácter preparatório e auxiliar, à tripulação moçambicana (da empresa “afretadora”), por forma a permitir-lhe manobrar o navio afretado.

            Nesta medida, concluiu a Requerente que o IRPC suportado pelos royalties auferidos deviam ter sido integralmente deduzidos à colecta de IRC do período de tributação de 2013.

           

            6. A Requerida, tendo sido devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual se defendeu por impugnação, tendo concluído pela improcedência da presente acção e, consequentemente, pela sua absolvição do pedido. A Requerida sustentou a sua resposta, sumariamente, com base nos seguintes argumentos:

            Referiu a Requerida que a qualificação dos rendimentos não era um tema controvertido, uma vez que os mesmos se enquadravam no conceito de royalties previsto no artigo 12.º, n.º 3, da CDT. Em todo o caso, o mesmo já não sucedia quanto à determinação do crédito de imposto, relativamente ao qual a Requerida entendeu que a posição sufragada pela Requerente assentava numa interpretação formalista e assente unicamente na prevalência do direito internacional sobre o direito interno de forma a garantir um direito absoluto à dedução mesmo quando os rendimentos obtidos e tributados em Moçambique não originem qualquer colecta de IRC e de derrama municipal por os gastos suportados para a sua obtenção serem iguais ou superiores.

            Prosseguiu a Requerida ao salientar que o artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT não se referia a “rendimentos ilíquidos”, mas tão só a “rendimentos”, já que esta norma tem subjacente o pressuposto de que o Estado da residência tributa o sujeito passivo com base no seu rendimento líquido. De acordo com a Requerida essa interpretação é congruente com os comentários à Convenção Modelo OCDE e do Modelo de Convenção das Nações Unidas que esclarecem que nos casos em que o crédito de imposto é efectivado pelo método da imputação normal a dedução concedida tem como limite a fracção de imposto do Estado da residência imputável ao rendimento proveniente do Estado da fonte. E essa congruência, de acordo com a Requerida, era ainda demonstrada pelo facto de naqueles comentários se referir que a Convenção Modelo OCDE não determina as regras concretas sobre o cálculo e funcionamento do método de imputação normal, o que revela a intenção da sua regulação pela legislação nacional.

            Entendeu assim a Requerida que a limitação imposta pela alínea b), do n.º 1, do artigo 91.º, do Código do IRC mantinha plena aplicabilidade, de tal forma que os rendimentos de royalties obtidos em Moçambique seriam tributados em Portugal pelo valor líquido dos encargos suportados para a sua obtenção, razão pela qual não seria dedutível a totalidade do IRPC suportado. Caso contrário, no entendimento da Requerida, a dedução do crédito de imposto não teria já a função de eliminação da dupla tributação jurídica internacional mas sim a imputação do imposto pago no estrangeiro à colecta do IRC gerada por outros rendimentos, já que se poderia estar a conferir um crédito de imposto quando o rendimento líquido auferido no estrangeiro é nulo.

 

            7. Por despacho proferido em 8 de Julho de 2021, foi dispensada a realização da reunião a que alude o artigo 18.º, do RJAT ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo e da celeridade, simplificação e informalidade processuais, previstos nos artigos 16.º, alínea c) e 29.º, n.º 2, ambos do RJAT, tendo-se ainda notificado a Requerida para proceder à junção aos autos do processo administrativo (“PA”).

 

            8. Por despacho proferido em 15 de Setembro de 2021 foi concedido um prazo adicional de 10 dias para a Requerida proceder à junção aos autos do PA e foi concedida às partes a faculdade de, querendo, apresentarem alegações, determinando-se ainda que a prolação da decisão ocorreria até à data limite prevista no artigo 21.º, n.º 1, do RJAT. A Requerente e a Requerida vieram apresentar alegações, respectivamente, em 14 de Outubro de 2021 e em 28 de Outubro de 2021, onde reiteraram os argumentos expostos nas peças processuais já anteriormente apresentadas.

 

II. SANEAMENTO

 

            9. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 4.º, e 5.º, todos do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de nulidades.

Não foram alegadas pelas partes, nem identificadas quaisquer excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e que cumpra conhecer.

 

III. DO MÉRITO

 

III.1. MATÉRIA DE FACTO

III.1.1. Factos provados

 

10. Analisada a prova produzida no âmbito do presente Processo Arbitral, com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:

  1. A Requerente é uma sociedade anónima de direito português que exerce a actividade de pesca marítima (CAE principal 03111) e que está enquadrada para efeitos de tributação no regime normal mensal de IVA, desde 1 de Janeiro de 1986, e no regime geral de IRC, desde 1 de Janeiro de 1989;
  2. A Requerente dispõe de contabilidade organizada, de acordo com o regime legal aplicável, e apura anualmente o seu lucro tributável nos termos normais;
  3. No desenvolvimento da sua actividade, a Requerente celebrou com a sociedade de direito moçambicano B..., um contrato de afretamento de navio e um protocolo de acordo de cedência de pessoal técnico (cfr. documentos 4 e 5 juntos pela Requerente aos autos);
  4. No período de tributação de 2013 a sociedade B... entregou à Requerente, pelos serviços que esta lhe prestou, os seguintes montantes:

 

Montante de serviços prestados

Data de Pagamento

€ 168.329,15

2013-09-21

€ 287.383.15

2013-09-21

€ 218.062,40

2013-11-15

€ 259.141,58

2013-12-18

 

  1. Sobre esses montantes incidiu IRPC que foi liquidado e cobrado pela B... enquanto substituta tributária, através de retenção na fonte a título definitivo à taxa liberatória de 10%, no montante global de € 93.291,64 (cfr. documentos 6 a 9 juntos pela Requerente aos autos);
  2. Em 29 de Maio de 2014 a Requerente apresentou a declaração modelo 22 n.º ... referente ao período de tributação de 2013 (cfr. documento 3 junto pela Requerente aos autos);
  3. Na declaração modelo 22 referida no ponto anterior a Requerente apurou uma matéria colectável não isenta de € 505.348,45, uma colecta de IRC de € 126.337,11 e uma derrama municipal de € 7.317,07 (cfr. documento 3 junto pela Requerente aos autos);
  4. Na declaração modelo 22 referida no ponto f) a Requerente não reflectiu a dedução do crédito de imposto relativo às retenções na fonte suportadas a título de IRPC no montante global de € 93.291,64 (cfr. documento 3 junto pela Requerente aos autos);
  5. Da referida declaração modelo 22 resultou a liquidação de IRC n.º 2014... que deu origem à nota de cobrança n.º 2014... e ao valor total a pagar de € 263,16 com os devidos acertos (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  6. A Requerente procedeu ao pagamento voluntário daquele acto de liquidação em 4 de Agosto de 2014 (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  7. Em 29 de Maio de 2018 a Requerente apresentou um pedido de revisão oficiosa do acto de autoliquidação de IRC referente ao período de tributação de 2013 (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  8. Em 9 de Outubro de 2018 a Requerente foi notificada através do ofício da Direcção de Finanças de Aveiro n.º ..., de 8 de Outubro de 2018, do projecto de decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa e da informação fundamentante (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  9. Por ofício de 12 de Novembro de 2018, a Requerente foi notificada do despacho da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças de Aveiro, que indeferiu o pedido de revisão oficiosa, com fundamento na inexistência de erro imputável aos serviços para efeitos da 2.ª parte, do n.º 1, do artigo 78.º, da Lei Geral Tributária (“LGT”) (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  10. Em 4 de Fevereiro de 2019 a Requerente deduziu pedido de constituição de tribunal arbitral tendo em vista a declaração de ilegalidade do acto de autoliquidação de IRC referente ao período de tributação de 2013 e da decisão de indeferimento que recaiu sobre o pedido de revisão oficiosa que teve aquele acto enquanto objecto (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  11. Em 19 de Dezembro de 2019 foi proferida decisão arbitral que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela Requerente e que ordenou a anulação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa no segmento em que decidiu pela ausência da verificação dos pressupostos para a revisão oficiosa do acto de autoliquidação designadamente, a inexistência de erro imputável aos serviços (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  12. Para cumprimento dessa decisão arbitral foi instaurado o procedimento de revisão oficiosa n.º ...2020... (cfr. PA junto pela Requerida aos autos);
  13. Por ofício de 20 de Outubro de 2020 a Requerente foi notificada para, querendo, exercer o direito de audição prévia quanto ao projecto de decisão do procedimento de revisão oficiosa referido no ponto anterior (cfr. documento 2 e PA juntos, respectivamente, pela Requerente e pela Requerida aos autos);
  14. A Requerente não exerceu o referido direito de audição prévia (cfr. documento 2 e PA juntos, respectivamente, pela Requerente e pela Requerida aos autos);
  15. Do projecto de decisão notificado à Requerente constava, para além do mais, a seguinte fundamentação:

“21 – Dificilmente se poderia concluir, neste contexto, que o fretamento se traduz no uso ou concessão de uso de um equipamento industrial ou comercial para efeito da previsão do artigo 12º, n.º 3 da CDT, quando é certo que as royalties se reportam a uma categoria de rendimentos que provêm do uso de direitos de propriedade intelectual, industrial e de transmissão de informação, e no que se refere especificamente à propriedade industrial (aqui se incluindo a indústria e o comércio) corresponde a direitos privativos sobre os processos técnicos e de produção e desenvolvimento da riqueza, tendo por objecto as invenções, as patentes, as marcas, os modelos de utilidade, os modelos e desenhos industriais, os nomes e as insígnias de estabelecimento, os logotipos e as denominações de origem (artigos 1º e 3º do Código de Propriedade Industrial).

22 - Note-se que, os rendimentos provenientes do uso ou concessão de uso de equipamento industrial, comercial ou científico nem sequer con[s]tam do parágrafo 2º do artigo 12º da Convenção Modelo, passando a sua tributação a ser regulada como lucros das empresas nos seus artigos 5º e 7º, e não se compreende que a sua inclusão na CDT, ao arrepio do direito convencional comum, escape ao sentido geral da norma, que aponta para a qualificação como royalties de direitos de propriedade intelectual, de propriedade industrial ou de transmissão de informação;

23 - Por conseguinte, a referência ao uso ou concessão de uso de equipamento industrial, no artigo 12º,  n.º 3 da CDT, não pode entender-se como incluindo o típico contrato de fretamento, quando esta figura se carateriza pela simples utilização ou exploração de um navio para uma afetação marítima e se encontra regulada, desde há muito, no Código Comercial (artigos 541º  a 561º) e em subsequente legislação avulsa.

24 - Não tem relevo, neste circunstancialismo, que a retribuição do fretamento seja calculada através de uma percentagem do valor da produção vendida no mercado moçambicano ou internacional, visto que o contrato está sujeito ao princípio da liberdade de forma e nada obstava a que as partes fixassem um custo variável em função dos resultados da exploração em vez de preço predefinido de acordo com outros critérios de avaliação;

25 - Não podendo o contrato em causa ser qualificado como uso ou concessão de uso de um equipamento industrial, para efeitos do artigo 12º , n.º 3 da CDT, fica excluída a possibilidade de aplicação da segunda parte desse preceito, que engloba no termo royalties os pagamentos efetuados a título de remuneração por assistência técnica que se lhe encontre conexa;

26 - Em qualquer caso, os contratos de fretamento em causa não envolvem qualquer transferência de tecnologia ou de informação tecnológica, mas a mera integração nas tripulações das embarcações fretadas de tripulantes estrangeiros para efeito de colaborarem na preparação técnica dos tripulantes locais e assegurarem as condições técnico-produtivas da exploração do navio, e que são remunerados pela sociedade afretadora mediante o pagamento dos correspondentes salários no âmbito de uma mera relação laboral. Sendo que, os pagamentos que têm por base uma percentagem da produção, constituem a remuneração do próprio fretamento e não de qualquer tipo de colaboração ou apoio técnico que seja prestado pelos tripulantes estrangeiros:

27 – Termos em que se conclui pela não aplicabilidade ao caso da regra do artigo 12º n.º 3, da CDT, não só porque o contrato de fretamento não preenche o qualificativo de royalties, como também porque a prestação de serviços por tripulantes estrangeiros, no âmbito desse contrato, ou a prestação de serviços no quadro de contrato de cedência de pessoal técnico ou de assistência técnica se reconduz a uma mera relação laboral que não se enquadra no conceito típico de assistência técnica para os efeitos previsto[s] nesta disposição.

28 – E sendo assim, não há lugar à dedução na liquidação de IRC, do crédito de imposto por dupla tributação internacional, sendo à Requerente que cabe acionar os meios administrativos ou judiciais de garantia junto do Estado moçambicano por cobrança de imposto em desconformidade com a convenção para evitar a dupla tributação.

29 - Fica prejudicado assim, o conhecimento da questão de ilegalidade da liquidação por violação do artigo 23º n.º 1, alínea a) da Convenção, bem como dos pedidos de reembolso

2.4 Juros Indemnizatórios:

Não são devidos juros indemnizatórios, em virtude de a decisão projetada ser no sentido do indeferimento do pedido.”

  1.  Por ofício de 26 de Novembro de 2020 foi a Requerente notificada de que em 24 de Novembro de 2020 tinha sido proferido pelo Director de Finanças de Aveiro despacho de indeferimento do procedimento de revisão oficiosa n.º ...2020... com base na fundamentação constante do projecto de decisão anteriormente notificado à Requerente (cfr. documento 1 e PA juntos, respectivamente, pela Requerente e pela Requerida aos autos);
  2. Em 15 de Fevereiro de 2021 a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

III.1.2. Factos não provados

 

11. Com relevo para a decisão da causa, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

III.1.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

12. Ao Tribunal incumbe o dever de seleccionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (“CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

 Assim sendo, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram seleccionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é determinada tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objecto do litígio, conforme decorre do artigo 596.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

Considerando as posições assumidas pelas partes nas respectivas peças processuais, o disposto nos artigos 110.º, n.º 7 e 115.º, n.º 1, ambos do CPPT, a prova documental e o PA junto aos autos, consideraram-se provados e não provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

Não se consideraram provadas nem não provadas as alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

III.2. MATÉRIA DE DIREITO

 

III.2.1. Considerações prévias sobre a ordem de conhecimento dos vícios alegados

 

            13. Quanto à ordem de conhecimento dos vícios dispõe o artigo 124.º, do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e c), do RJAT que o Tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação. Quanto a estes últimos, a apreciação dos vícios é feita pela ordem indicada pela Requerente, desde que se estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público. Na falta da referida relação, deverão ser conhecidos prioritariamente os vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, uma tutela dos interesses ofendidos mais estável ou eficaz.

            Neste sentido, será apreciada em primeiro lugar a ilegalidade relativa à errónea qualificação dos rendimentos obtidos pela Requerente a título de afretamento de navio e de cedência de pessoal técnico e, em segundo lugar, a ilegalidade referente à violação do direito à dedução do crédito de imposto conferido pelo artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT.

           

III.2.2. Errónea qualificação dos rendimentos obtidos pela Requerente a título de afretamento de navio e de cedência de pessoal técnico

 

            14. A Requerida, contrariamente ao por si defendido na decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, veio, na Resposta apresentada nesta ação, reconhecer que assiste razão à Requerente em relação à qualificação dos rendimentos obtidos em Moçambique, no montante de € 93.291,64, como royalties, afirmando no artigo 8.º daquele articulado que “A qualificação dos rendimentos não está em causa, na sequência da pronúncia da Direcção de Serviços das Relações Internacionais da AT, que os incluíu no conceito de royalties vertido no n.º 3 do art.º 12.º da CDT entre Moçambique e Portugal, na redacção dada pelo art.º 7.º do Protocolo de 2009.”

            E, de facto, assim é. Os rendimentos de fonte moçambicana auferidos pela Requerente em resultado do contrato de afretamento de navio e do protocolo de acordo de cedência de pessoal técnico celebrados com a sociedade B... são efectivamente subsumíveis ao conceito de “royalties”, nos termos do artigo 12.º, n.º 3, da CDT, e não enquadrados para efeitos de tributação enquanto “lucros das empresas” nos termos do artigo 7.º, da CDT.

            À data dos factos, dispunha-se no n.º 3, do artigo 12.º, da CDT na redacção conferida pelo protocolo que reviu a referida convenção[1] que “O termo ‘royalties’, usado neste artigo, significa as retribuições de qualquer natureza atribuídas pelo uso ou pela concessão do uso de um direito de autor sobre uma obra literária, artística ou científica, incluindo os filmes cinematográficos, bem como os filmes ou gravações para transmissão pela rádio ou pela televisão, de uma patente, de uma marca de fabrico ou de comércio, de um desenho ou de um modelo, de um programa de computador, de um plano, de uma fórmula ou de um processo secreto, bem como pelo uso ou pela concessão do uso de um equipamento industrial, comercial ou científico ou por informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico. O termo ‘royalties’ inclui também os pagamentos efectuados a título de remuneração por assistência técnica prestada em conexão com o uso ou a concessão do uso dos direitos, bens ou informações anteriormente referidos”. (destaque nosso)

            Tendo em conta que por via da celebração do contrato de afretamento a Requerente se vinculou a colocar à disposição da sociedade B... um navio e a conceder o respectivo uso para a captura, por esta última, da quota de pesca de camarão de superfície e gamba, os rendimentos derivados desse contrato são qualificáveis como royalties. Isto na medida em que o afretamento do navio consubstancia o uso ou a concessão do uso de um “equipamento industrial ou comercial”, subsumindo-se, nessa medida, ao elemento gramatical da norma. Por conseguinte, e ao contrário do sufragado na decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa contestado nos presentes autos, é irrelevante que o conceito de royalties constante do parágrafo 2.º do artigo 12.º, da Convenção Modelo OCDE não inclua o uso ou a concessão do uso de um equipamento industrial ou comercial, na medida em que a referida qualificação decorre expressamente da CDT celebrada entre Portugal e Moçambique e é quanto a esse concreto quadro normativo que a posição jurídico-tributária da Requerente terá de ser aferida.

            Já no que respeita aos rendimentos resultantes do protocolo de acordo de cedência de pessoal técnico, é necessário aferir se estão em causa rendimentos derivados de assistência técnica ou da prestação de serviços técnicos, porquanto apenas os primeiros são subsumíveis ao conceito de royalties constante do n.º 3, do artigo 12.º, da CDT.

            Quanto à concretização normativa destes conceitos, referiu-se no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18 de Junho de 2013, proferido no âmbito do processo n.º 04075/10 que “a prestação de serviços que é objecto do contrato de assistência técnica não tem carácter autónomo e independente, antes sendo complementar ou acessória de outra operação prevista no mesmo contrato ou em contrato separado. (…) A “assistência técnica” distingue-se da prestação de serviços técnicos (engineering), pois enquanto neste último caso a prestação de serviços constitui-se como objecto principal do contrato em causa, no primeiro a prestação de serviços é meramente instrumental relativamente ao objecto principal do contrato que consiste na transmissão de uma informação tecnológica (Know how). No contrato de prestação de serviços técnicos as partes querem a própria execução de um determinado serviço e não uma “assistência” na aquisição de informação tecnológica; no contrato de “assistência técnica” as partes querem uma informação tecnológica, a qual é conjugada com a prestação de um serviço complementar ou instrumental”.

            A este respeito Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, Almedina, 2.ª edição actualizada, 2014, p. 705 salienta ainda que a assistência técnica se caracteriza pelo “(…) facto de uma empresa colocar pessoal qualificado à disposição do cliente, quando tal seja necessário para a própria transferência dos conhecimentos e experiências cedidos [neste caso o uso ou a concessão do uso do navio fretado] e não corresponda a uma obrigação de fazer que constitua o objecto principal do contrato”.

            Tendo por base estas concretizações normativas, da análise do protocolo de acordo de cedência de pessoal técnico celebrado entre a Requerente e a B... resulta que a Requerente irá ceder à B... “uma equipa de pessoal especializado na produção de camarão, gamba e respectiva fauna” cuja principal função é “transmitir conhecimento especializados aos companheiros de trabalho moçambicanos” e “ajudar a B... na gestão e controlo da actividade da Equipa Técnica, objectivando a maximização dos resultados do seu desempenho profissional”.

            Ora, conforme se compreende, a ratio inerente aos serviços prestados com a cedência de pessoal técnico consiste na transmissão, a título complementar ou acessório, de informações técnicas e de conhecimento especializado que permita optimizar o objecto principal do contrato que se traduz no afretamento do navio à tribulação moçambicana. Por esta razão, aqueles serviços são enquadráveis como “assistência técnica” para efeitos do n.º 3, do artigo 12.º, da CDT.

            Aqui chegados, conclui-se que os rendimentos de fonte moçambicana auferidos pela Requerente em resultado do contrato de afretamento de navio e do protocolo de acordo de cedência de pessoal técnico celebrados com a sociedade B... eram efectivamente subsumíveis ao conceito de “royalties” nos termos do artigo 12.º, n.º 3, da CDT.

            Qualificação essa que, como acima se referiu, a própria AT assume e reconhece como correcta na sua resposta e, bem assim, nas suas alegações finais ao referir que “Quanto às questões a decidir, embora a Requerente continue a dar relevo à que se prende com a qualificação dos pagamentos efectuados pela B... como royalties, à luz da definição dada pelo n.º 3 do art.º 12.º da Convenção para evitar a dupla tributação entre Portugal e Moçambique (adiante somente CDT), a Requerida reitera que, nesta fase, essa divergência está ultrapassada”.

            Em face do exposto, conclui-se pela ilegalidade do fundamento da inaplicabilidade do artigo 12.º, n.º 3, da CDT aos rendimentos por aferidos pela Requerente.

 

III.2.3. Violação do direito à dedução do crédito de imposto conferido pelo artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT

 

            15. Ainda que na fundamentação da decisão de indeferimento se tenha dado como prejudicado o conhecimento da questão da ilegalidade da liquidação por violação do artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT, a verdade é que essa circunstância não invalida o conhecimento de tal vício por este Tribunal, tendo sido circunstanciadamente alegado pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral e constituindo, de forma inequívoca, causa de pedir da presente ação. Conforme resulta da jurisprudência reiterada e uniforme do Supremo Tribunal Administrativo – por exemplo, no acórdão de 11 de Setembro de 2013, proferido no âmbito do processo n.º 01138/12, no acórdão de 12 de Outubro de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 0427/16 ou no acórdão de 30 de Outubro de 2019, proferido no âmbito do processo n.º 02453/05.1BEPRT 0402/18 –, uma vez anulada a decisão de indeferimento que constitui o objecto imediato da acção, cumpre analisar os vícios do acto tributário de autoliquidação que constitui o objecto mediato do pedido da Requerente. Neste sentido, cumpre apreciar se o acto de autoliquidação controvertido nos presentes autos é ou não ilegal por violação do direito à dedução do crédito de imposto resultante do IRPC suportado pela Requerente em resultado dos royalties auferidos em Moçambique.

            Enquanto ponto de partida, cumpre fixar a base legal vigente à data dos factos que conformava o direito à dedução do crédito de imposto.

            No plano convencional dispunha-se na CDT, ao que aqui importa, que:

“Artigo 23.º

Métodos

 1 – a) Quando um residente de Portugal obtiver rendimentos que, de acordo com o disposto nesta Convenção, possam ser tributados na República de Moçambique, Portugal deduzirá do imposto sobre os rendimentos desse residente uma importância igual ao imposto sobre o rendimento pago na República de Moçambique. A importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fracção do imposto sobre o rendimento calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que podem ser tributados na República de Moçambique”.

            Já a nível interno dispunha-se no Código do IRC que:

“Artigo 91.º

Crédito de imposto por dupla tributação internacional

“1 – A dedução a que se refere a alínea a) do n.º 2 do artigo 90.º é apenas aplicável quando na matéria colectável tenham sido incluídos rendimentos obtidos no estrangeiro e corresponde à menor das seguintes importâncias:

a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;

b) Fracção do IRC, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos dos gastos directa ou indirectamente suportados para a sua obtenção.

2 – Quando existir convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efectuar nos termos do número anterior não pode ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela convenção”.

            Do confronto entre as normas citadas verifica-se que a grande diferença na conformação do direito à dedução do crédito de imposto reside no facto de o Código do IRC estabelecer que o mesmo é determinado a partir dos rendimentos líquidos auferidos pelos sujeitos passivos, enquanto na CDT não se estabelece tal limitação, ou seja, o montante a deduzir por crédito de imposto é determinado com base nos rendimentos brutos.

            Esta colisão de normas é resolvida através do respectivo grau hierárquico resultante do disposto no artigo 8.º, da Constituição da República Portuguesa, e no artigo 1.º, n.º 1, da LGT, segundo os quais as normas da CDT celebrada entre Portugal e Moçambique, enquanto normas de direito internacional, prevalecem sobre as normas internas previstas no Código do IRC. Ainda que referente a matéria diversa, é precisamente este o entendimento uniforme e constante sufragado pelo Supremo Tribunal Administrativo, por exemplo, no acórdão de 4 de Março de 2020, proferido no âmbito do processo n.º 01679/13.9BALSB, no qual se referiu que “forçoso é concluir que o conceito de «residência por dependência», acolhido no artigo 16.º n.º 2 do CIRS, não pode sobrepor-se ao conceito de residência resultante disposições convencionais que seguem o artigo 4.º da Convenção Modelo da OCDE, nomeadamente o artigo 4.° da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e Itália. É o conceito convencional de residência que deve prevalecer, dada a supremacia do direito internacional sobre o direito interno ordinário consagrada nos artigos 8.º da CRP e 1º, nº 1 da LGT”. (destaque nosso)

            Dito isto, é evidente que, ao contrário do defendido pela Requerida, é com base nas regras de dedução do crédito de imposto previstas no artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT e não nas regras previstas no artigo 91.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC que a posição jurídico‑tributária da Requerente terá de ser determinada. Esta mesma conclusão foi já sufragada pelos tribunais arbitrais que se pronunciaram anteriormente sobre idênticas questões, designadamente no acórdão de 25 de janeiro de 2016, proferido no âmbito do processo n.º 369/2015-T, no acórdão de 1 de Junho de 2017, proferido no âmbito do processo n.º 565/2016-T, no acórdão de 19 de Dezembro de 2019, proferido no âmbito do processo n.º 70/2019-T ou no acórdão de 5 de Março de 2020, proferido no âmbito do processo n.º 389/2019-T. Conforme se referiu no acórdão relativo ao processo n.º 565/2016-T “(…) para cálculo do imposto do Estado da residência, no caso o IRC - com um base de incidência mundial - é considerada a matéria colectável que tem em consideração a totalidade dos rendimentos e, por isso, também os obtidos no estrangeiro, bem como os gastos suportados para a sua obtenção. Daí que só a dedução integral do imposto pago no Estado da fonte (com os limites contidos na CDT), determinado a partir dos rendimentos brutos aí obtidos, permite alcançar o objectivo da total eliminação da dupla tributação.

A aplicação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 91º do CIRC frustraria, pelo menos em parte, o objectivo de eliminação da dupla tributação pretendido pelas CDT em causa”.

            De sublinhar que, no caso específico de royalties, como se referiu no acórdão relativo ao processo n.º 369/2015-T, numa situação em tudo similar à analisada[2], “a solução acolhida na CDT […] (e, também, na generalidade das convenções celebradas por Portugal) se afasta do preconizado no MOCDE, porquanto este consagra a regra da competência exclusiva do estado da residência para tributar este tipo de rendimento. Assim sendo, o problema do montante do crédito de imposto (do valor a ser deduzido pelo estado da residência, relativo ao imposto pago no estado de fonte) não se coloca, no âmbito do MOCDE, quanto às royalties. Esta constatação assume alguma relevância na análise do caso concreto, uma vez que os Comentários ao n.º 1 do Artigo 23.º-B da Convenção Modelo da OCDE, em que a AT se louva para estribar o seu entendimento, não poderão ser entendidos como referindo-se ao caso das royalties, pela simples razão de que, na economia deste Modelo de Convenção, nenhuma questão de dupla tributação internacional  se suscita quanto a estes rendimentos.

O “equilíbrio” entre o direito à tributação do estado da fonte e o do estado de residência, quando estão em causa convenções como a celebrada com Cabo Verde [e, bem assim, com Moçambique] – as que consagram a competência cumulativa dos dois estados contratantes para tributar as royalties – é conseguido da forma seguinte: o estado da fonte tributará os rendimentos brutos a uma taxa, que, no máximo, não pode exceder um valor convencionalmente fixado (no caso, 10%) e o estado da residência deduzirá o valor desta coleta à do seu imposto, calculado numa base mundial, no qual se incluem os rendimentos brutos obtidos no outro país (i. e., o rendimento efetivamente obtido acrescido do imposto aí pago).

Exatamente porque é assim é que ”muitos dos estados co-contratantes, quando exportadores importantes de tecnologia, tentam a inclusão de uma taxa de retenção na fonte baixa, avançando o argumento de que suportam a dedução das despesas necessárias à produção do bem ou ao nascimento do direito que dá origem às royalties[3]“.

Nenhuma dúvida parece, pois, existir, que pelo menos no caso das royalties, o imposto pago no país da fonte, incidente sobre rendimentos brutos, é dedutível à coleta do IRC, calculada com base no rendimento mundial do sujeito passivo[4], no apuramento do qual são considerados todos os gastos fiscalmente relevantes, incluindo os originados pela produção dos rendimentos obtidos no estrangeiro.

O mesmo é dizer que, pelo menos relativamente às royalties, a parte final do art.º 23º da CDT Portugal - Cabo Verde (a importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fração do imposto sobre o rendimento, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que podem ser tributados nesse outro Estado) apenas terá aplicação no caso, improvável, de a taxa do IRC aplicável a um determinado contribuinte ser inferior à taxa a que os rendimentos foram sujeitos no estado da fonte: «a dedução máxima é equivalente à taxa do imposto do estado de residência aplicada sobre o rendimento obtido no outro estado»[5].

Esta interpretação da norma convencional é a mais conforme com o princípio da boa-fé que, nos termos do art.º 26.º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, preside à interpretação dos acordos internacionais entre estados. Portugal e Cabo Verde celebraram uma CDT visando a eliminação de situações de dupla tributação internacional relativamente a rendimentos que um residente em um desses estados obtenha no outro. A total eliminação da dupla tributação internacional é a regra, o objetivo prosseguido pelas partes, pelo que é neste sentido que deverão ser resolvidas eventuais dúvidas interpretativas do articulado convencional.

Um Estado que, em razão de uma alteração posterior das suas normas internas, pretenda limitar, unilateralmente, o sentido e objetivos do pactuado com o outro estado contratante não estará, certamente, a cumprir com os ditames da boa-fé.

No caso concreto, encontramos, na parte final do art.º 12 da Convenção Portugal-Cabo Verde [e também no artigo 12.º, n.º 2 da CDT Portugal Moçambique], uma disposição algo “invulgar” em termos de articulados convencionais: as autoridades competentes dos Estados Contratantes estabelecerão, de comum acordo, a forma de aplicar este limite.

Podemos admitir que este parágrafo traduza uma abertura dos estados contratantes à consagração de regras especiais na determinação do crédito de imposto a ser aplicado pelo estado de residência. Só que um tal acordo nunca existiu, pelo que a AT não o alega ao fundamentar a sua posição.

Acresce, como segundo fundamento do nosso entendimento, que só a dedução integral do imposto pago no estado da fonte à coleta do imposto do estado da residência, (imposto cuja matéria coletável foi calculada tendo em consideração os gastos suportados para a obtenção dos rendimentos de fonte estrangeira) permite dar total concretização ao princípio da neutralidade na exportação de capitais que o método da imputação (crédito de imposto) visa lograr[6]: o imposto total a pagar pelo sujeito passivo (a soma do imposto a  ser pago nos estados da fonte e da residência) deverá ser igual ao imposto que ele pagaria caso todo o seu rendimento tivesse origem (fonte) no estado de residência.

Assim, consideramos que, no caso concreto, não deve haver lugar à aplicação do disposto no artigo 91.º, n.º 1, al. b), desde logo porquanto a sua aplicação frustraria parcialmente o objetivo de total eliminação da dupla tributação em situações envolvendo Portugal e Cabo Verde [e também Moçambique], o objetivo principal prosseguido pela convenção subscrita pelos dois países.

Não podemos, pois, subscrever o entendimento administrativo de que o disposto nesta norma é, sem mais, aplicável quer nos casos de concessão unilateral (pela lei interna portuguesa) de crédito de imposto, quer quando exista uma CDT[7].”

            Por conseguinte, por força do disposto no artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT a Requerente tinha direito a deduzir à colecta de IRC a título de crédito por dupla tributação jurídica internacional um montante igual ao imposto pago em Moçambique incidente sobre os rendimentos brutos, desde que esse montante não exceda a fracção de IRC calculado antes da dedução correspondente aos rendimentos brutos tributados em Moçambique. Concretizando, a Requerente tinha direito a deduzir ao montante de € 126.337,11 de colecta de IRC o montante de € 93.291,64 que suportou a título de IRPC, já que este último valor não excede os limites impostos pela CDT.

            Nestes termos, é forçoso concluir-se pela ilegalidade do acto de autoliquidação objecto de impugnação nos presentes autos.

 

III.2.4. Juros indemnizatórios

 

            16. No seu pedido arbitral a Requerente peticionou ainda o direito a juros indemnizatórios. Este direito é conformado na LGT que, ao que aqui importa, dispõe o seguinte:

“Artigo 43.º

Pagamento indevido da prestação tributária

1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

3 - São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:

(…)

c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária”.

            Conforme tem entendido de forma reiterada e uniforme o Supremo Tribunal Administrativo, por exemplo, no acórdão de 4 de Novembro de 2020, proferido no âmbito do processo n.º 038/19.4BALSB, resulta do regime jurídico previsto no artigo 43.º, da LGT que nos casos em que o sujeito passivo peticiona a revisão do acto tributário ao abrigo do disposto na 2.ª parte, do n.º 1, do artigo 78.º, da LGT e o mesmo vem a ser anulado, os juros indemnizatórios apenas “são devidos depois de decorrido um ano contado da apresentação do pedido de revisão, por aplicação do artigo 43.º, n.º 3, alínea c) da LGT, e não desde a data do pagamento indevido do imposto, porque o contribuinte poderia ter “obtido anteriormente a anulação do acto”, e ao não fazê-lo “desinteressou-se temporariamente pela recuperação do seu dinheiro”, o que justifica que o direito a juros indemnizatórios haja de ter uma extensão mais reduzida por contraposição à situação em que o contribuinte, suscita a questão da ilegalidade do acto de liquidação imediatamente”.

            Assim sendo, ao ter sido o pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente em 29 de Maio de 2018, serão devidos juros indemnizatórios desde o dia 29 de Maio de 2019 e até à data da emissão das respectivas notas de crédito a favor do sujeito passivo.

 

IV. DECISÃO

 

Termos em que se decide julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente e, em consequência:

  1. Anular a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa impugnado nos autos;
  2. Anular parcialmente o acto de autoliquidação alvo daquele procedimento nos termos acima evidenciados;
  3. Condenar a Requerida a restituir à Requerente o montante indevidamente pago, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal em vigor nos termos acima referidos;
  4. Condenar a Requerida nas custas do processo.

 

V. VALOR DO PROCESSO

           

            Atendendo ao disposto no artigo 32.º do CPTA e no artigo 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixando-se ao processo o valor de € 93.291,64.

 

VI. CUSTAS

 

Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de € 2.754,00, a cargo da Requerida, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 10 de Dezembro de 2021

 

 

Os Árbitros,

 

Alexandra Coelho Martins

 

José Eduardo Mendonça da Silva Gonçalves

(vota vencido, nos termos da declaração junta)

 

Carla Castelo Trindade

Relatora

 

 

 

 

Voto de vencido

 

Discordo da tese que fez vencimento, atendendo ao seguinte:

 

No que se refere a métodos para atenuar ou eliminar a dupla tributação, no caso da Convenção sobre Dupla Tributação (CDT) celebrada entre Portugal e Moçambique, é adotado o denominado método do crédito de imposto ou da imputação, na modalidade de crédito normal ou ordinário, que corresponde ao que Portugal tem adotado na generalidade das suas Convenções 1,2,3,4, em que o Estado da residência (no caso, Portugal) deduz ao seu imposto (IRC) o imposto pago (IRCP) no Estado da fonte (no caso, Moçambique) até ao limite “do imposto do Estado da residência, correspondente à matéria colectável proveniente do Estrangeiro”5, i.e., o lucro (net income)1,3,6, no caso relativos aos rendimentos obtidos em Moçambique deduzidos dos gastos suportados que lhes estão associados, o que se encontra traduzido na seguinte expressão constante da alínea a) do nº 1 do Artigo 23º da CDT com Moçambique: “A importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fracção do imposto sobre o rendimento, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que podem ser tributados na República de Moçambique”.

 

Repare-se que embora a empresa seja tributada no Estado da fonte em regra (no caso em que não tenha estabelecimento estável nesse Estado ou as operações não lhe sejam imputáveis) por uma taxa de retenção na fonte (tributação liberatória) sobre os rendimentos brutos; no Estado da residência (Portugal) é tributado pelo lucro (net income), incluindo o lucro obtido no exterior (tributação pelo rendimento mundial), conforme decorre da alínea a) do nº 1 do artigo 3º, e o nº 1 do artigo 4º, ambos do CIRC.

Pelo que, na expressão constante da alínea a) do nº 1 do Artigo 23º da CDT com Moçambique “Portugal deduzirá do imposto sobre os rendimentos desse residente”, há que ter em conta que o imposto no Estado da residência é um imposto sobre o lucro (net income).

 

Em matéria de Jurisprudência, esta posição é coerente com os Acórdãos do TCAN (Tribunal Central Administrativo Norte) de 14/04/2016 (Proc. 03511/04-Aveiro), no qual releva-se os pontos III e IV do Sumário, e de 21/05/2020 (Proc. 01357/13.9BEPRT), no qual releva-se os pontos 2 e 3 do Sumário.

No que refere ao Acórdão do TCAN de 14/04/2016, o respetivo ponto IV do Sumário considera: “Resulta da interpretação da alínea b) do n.º 1 do art.º 80.º do CIRS que os titulares de rendimentos obtidos no estrangeiro têm direito a um crédito de imposto por dupla tributação internacional, dedutível até à concorrência da parte da coleta proporcional a esses rendimentos líquidos, considerados nos termos da alínea b) do n.º 6 do artigo 22.º, que corresponderá à fração da coleta do IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados”.

 

 

Embora os Acórdãos supra versem sobre rendimentos do trabalho dependente sujeitos a IRS, as suas considerações são também aplicáveis, com as necessárias adaptações, a rendimentos sujeitos a IRC (lucro das empresas), porquanto o artigo 23º da CDT com Moçambique não distingue elementos do rendimento, seja de empresas seja de particulares.

 

A doutrina sobre a aplicação do método do crédito de imposto refere que este é de aplicação complexa 5,6, “implica operações que podem não ser simples, … também o cálculo do limite do crédito a conceder”5.

 

Ao não ser indicado o lucro obtido nas operações com Moçambique, por não terem sido identificados os gastos suportados que lhes estão associados, não existem condições para apurar o limite da dedução em matéria de crédito de imposto por dupla tributação jurídica internacional aplicável no caso.

 

Por estas razões julgaria o Pedido de pronúncia improcedente.

 

José Eduardo Gonçalves

 

1 João Félix PINTO NOGUEIRA, em The Impact of the OECD and UN Model Conventions on Bilateral Tax Treaties, Edited by Michael Lang, Pasquale Pistone, Josef Schuch and Claus Staringer, Cambridge University Press, 2012; em capítulo sobre a análise das políticas e rede em matéria de convenções fiscais de Portugal (p. 855-887, em particular as p.880-881): “Traditionally, Portugal mitigates double taxation by granting an ordinary tax credit of the tax paid in the other contracting state. This position is currently valid for both treaty and unilateral relief from international double taxation”. “This credit is normally limited to the tax that would be paid in Portugal on the net income which is received. … Article 85 (3) of Portuguese CITC, ruling on tax treaty cases, states that the credit granted may in no case exceed the amount of tax paid outside “in accordance with the Convention””… “As described in Article 85 of the Portuguese CITC, the credited granted is limited to: 1. the paid foreign tax; or 2. if less than the paid foreign tax, to the Portuguese tax that would have been paid on the gross amount of income received. The same is prescribed for individuals under Article 81 of the PITC”. 

2 Maria Margarida CORDEIRO MESQUITA, As Convenções sobre Dupla Tributação, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, nº 179, 1998, onde é efetuada, para as convenções fiscais celebradas por Portugal à data, uma análise por artigos da Convenção Modelo da OCDE, descreve (p. 290 e segs.) em capítulo relativo ao Artigo 23: “O modelo OCDE propõe, apenas, uma modalidade de cada um dos métodos – a isenção com progressividade e a imputação ordinária. Indica-se, nos Comentários, que os Estados contratantes podem combinar os dois métodos”; “Portugal, com vista à eliminação da dupla tributação dos seus residentes, e em consonância com o estabelecido na lei interna – Código do IRC, …, e Código do IRS, …, - tem adoptado, na generalidade das suas convenções, o método da imputação ordinária”.

3 Alberto XAVIER (com a colaboração de Clotilde CELORICO PALMA e Leonor XAVIER), Direito Tributário Internacional, 2ª edição actualizada, Almedina, 2014, é referido (p. 749-752) que “No que tange ao direito convencional, o método da imputação ordinária foi o adoptado, via de regra, por Portugal, para atenuar a dupla imposição dos rendimentos percebidos pelos seus residentes”; “O método da imputação ordinária, directa e efectiva, foi adoptado por Portugal através de norma interna, unilateral, nos artigo 83º, nº 2, alínea “b”, e no artigo 85º do CIRC. A dedução correspondente à dupla tributação internacional é, porém, apenas aplicável quando na matéria colectável tenham sido incluídos rendimentos obtidos no estrangeiro e corresponderá à menor das seguintes importâncias: (i) imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro; (ii) fracção do imposto sobre o rendimento calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos dos custos ou perdas, directa ou indirectamente suportados para a sua obtenção. … Disposições similares constam, quanto às pessoas singulares, do artigo 81º do CIRS”.

4 Paula ROSADO PEREIRA, Princípios do Direito Fiscal Internacional – Do paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu, Almedina, 2010, refere (p. 150) que “no método da imputação normal, a dedução permitida pelo Estado da residência é limitada à fracção do respectivo imposto correspondente aos rendimentos com origem no outro Estado. Nestes termos, caso o imposto do Estado da fonte seja mais elevado do que o imposto devido no Estado da residência relativamente aos mesmos rendimentos, a imputação normal permitirá apenas uma dedução parcial do imposto estrangeiro”; “O artigo 23º-B do MC OCDE consagra o método da imputação normal, prevendo que – no caso de rendimentos que, em conformidade com o disposto na convenção, possam ser tributados no Estado da fonte – o Estado da residência deduzirá do respectivo imposto uma importância igual ao imposto pago no Estado da fonte. Contudo, a importância deduzida não pode exceder a fracção do imposto do Estado da residência, calculado antes da dedução, correspondente ao rendimento tributado no Estado da fonte”.

5 Rita CALÇADA PIRES, Manual de Direito Internacional Fiscal, Almedina, 2018 (reimpressão de 2019), p. 128-129.

6 Klaus VOGEL et al., Klaus Vogel on Double Taxation Conventions, Third Edition, Kluwer Law International, 1997. VOGEL refere (p.1126) que, quanto ao método de imputação normal, “the deduction given by State R (residence) for the tax paid in the other State is restricted to that part of its own tax which is appropriate to the income which may be taxed in the other State; this method is called “ordinary credit””; e quanto à diferença entre os métodos de isenção e o método de imputação (ou do crédito de imposto) como método de eliminação ou atenuação da dupla tributação, “Fundamentally, the difference between the methods is that the exemption methods look at income, while the credit methods look at tax”. 

Refere também (p. 1130-1131) que “The object of Art. 23 is to eliminate double taxation in the State of residence. In cases where, in order to eliminate double taxation, treaties restrict taxation by the State of source, such restrictions result from the distributive rules laid down in Arts. 6 to 22 MC. According to those rules, certain items of income … are exempted in the state of source (…), and in some instances the level of tax on certain items of income is restricted (as in the case of dividends and interest, and under UN MC and many DTCs also of royalties). In certain instances, the distributive rules conversely operate to exempt items of capital … in the State of residence … According to OECD MC and UN MC, these arrangements, already laid down in distributive rules for the purpose of eliminating double taxation, take precedence over, and are supplemented by, those in the Art. 23 A and/or B … (a more precise heading would be: “Methods for eliminating residual double taxation”) …

… The details of both the exemption method and the credit method must be shaped by reference to domestic law, viz. in regard to the reference figures – what positive and what negative elements should be included in the “foreign items of income” and what in the “domestic” ones, etc – and in reguard to procedures. In this connection, the credit method is, however, by far the more complicated of the two, and that is why it is normally shaped and supplemented to a much greater extent by domestic law.

Na análise do método do crédito de imposto, VOGEL (p. 1216-1217) refere ainda que “[Operation of the credit] Article 23 B sets out the main rules of the credit method, but does not give detailed rules on the computation and operation of the credit…

[Maximum credit allowed] … The maximum deduction is normally computed as the tax on net income, i.e. on the income from State E (or S) less allowable deductions (specified or proportional) connected with such income … For such reason, the maximum deduction in many cases may be lower than the tax effectively paid in State E (or S). This may especially be true in the case where … the amount of net income subject to tax in State R may be very small, or there there may even be no net income at all”.

 



[1] Protocolo entre a República Portuguesa e a República de Moçambique que Revê a Convenção para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovado pela Resolução da Assembleia da República N.º 36/2009, de 27.03.2009, e ratificado por Decreto do Presidente da República n.º 45/2009, de 08.05.2009.

[2] Embora nesse processo a CDT em causa seja a celebrada com Cabo Verde, a questão equaciona-se exactamente nos mesmos moldes, dada a identidade de soluções de ambas as Convenções na matéria controvertida.

[3] “Maria Margarida Cordeiro de Mesquita, As Convenções sobre Dupla Tributação, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 179, 1988, pág. 203.

A Autora considera que a fixação de taxas de 10% como limite máximo do imposto passível de ser cobrado pelo estado da fonte corresponde ao interesse dos estados que, no contexto bilateral, sejam “exportadores importantes de tecnologia”. Tal é – acrescentamos nós – o caso de Portugal relativamente a Cabo Verde.” Idêntica conclusão se retira em relação a Moçambique.

[4] Assim era, obrigatoriamente, no quadro legal vigente antes da reforma do IRC de 2014.

[5] Maria Margarida Cordeiro de Mesquita, cit., pág. 290.

[6] Por todos, Rui Duarte Morais, Imputação de Lucros de Sociedades Não Residentes…, 2005, pág. 146-151.

[7] “O entendimento administrativo que, também no presente processo, é feito do disposto no artigo 91.º, n.º 1, al. b), do CIRC aparece explicitado no relatório que Maria dos Prazeres Lousa apresentou ao Congresso da IFA de 2011, em Paris, o qual se encontra publicado em Cahiers de Droit Fiscal International, vol. 96b, pág. 541 a 550. Não cumpre aqui apreciar da substância de tal entendimento que, em vários aspetos, entendemos não ser de subscrever.”