Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 643/2020-T
Data da decisão: 2021-12-20  IRC  
Valor do pedido: € 113.747,14
Tema: IRC – Benefícios fiscais — RFAI — deduções à coleta.
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Sumário:

I - Estando em causa a apreciação da legalidade de um ato de liquidação oficiosa, praticado pela Autoridade Tributária, corrigindo liquidação anterior baseada na declaração do contribuinte, é à Administração que incumbe o ónus da prova dos pressupostos legais da correção que operou;

II – A enumeração de ativos intangíveis que podem ser considerados como despesas com transferência de tecnologia, que consta da alínea b) do n.º 2 do artigo 22.º do Código Fiscal de Investimento, é meramente exemplificativa, não podendo excluir-se que possa qualificar-se como despesa com transferência de tecnologia a relacionada com aquisição software, com programação específica, que se tornou necessário associar a novo sistema de gestão da produção;

III – Para efeitos da aplicação do RFAI, não é possível considerar como despesas de reparação, manutenção ou substituição de ativos a aquisição de novos componentes de equipamentos já existentes, que permitiram uma relevante alteração do processo de produção e uma melhoria da qualidade dos produtos produzidos.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros, Conselheiro Carlos Alberto Fernandes Cadilha (árbitro presidente), Doutor Sérgio Pontes e Dr. Ricardo Marques Candeias (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

I. Relatório

1) No dia 16 de novembro de 2020, a A…, S.A., com número único de pessoa coletiva (NIPC) …, com sede na Rua …, …, …, Santa Maria da Feira (doravante, apenas Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, (doravante, abreviadamente designado RJAT), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à declaração de ilegalidade da liquidação oficiosa de imposto de IRC n.º 2020 …, datada de 25/06/2020, no valor de  112.733,49 €, e dos respetivos juros compensatórios n.º 2020 … e n.º 2020 …, ambos de 29/06/2020, o que perfaz o valor total de 113.737,14 €.

2) O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD, e notificado automaticamente à AT em 17 de novembro de 2020.

3) A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Nos termos do disposto da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo 228.º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 11 de janeiro de 2021 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e c) do nº 1 do artigo 11.º, do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Assim, em conformidade com o preceituado no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 3 de maio de 2021.

4) No dia 09 de junho de 2021, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual impugnou os argumentos aduzidos pela Requerente, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral, com a consequente absolvição do pedido. A Requerida ainda juntou aos autos do respetivo processo administrativo (doravante, PA).

5) No dia 5 de julho de 2021, tendo sido manifestado interesse na produção da prova testemunhal, foi proferido despacho arbitral no sentido de proceder à realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, designando-se para o efeito o dia 16 de setembro de 2021, às 10h.

6) Dada a impossibilidade de comparência de uma das testemunhas arroladas, foi a referida diligência adiada para o dia 20 de outubro de 2021, pelas 10h00.

7) Na data prevista foi realizada a referida reunião, em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escrita sucessivas, no prazo de 10 dias, assim como determinada a prorrogação por dois meses do prazo nos termos do art. 21.º, 2, RJAT, tendo fixado o dia 3 de janeiro de 2022 para o efeito de prolação da decisão arbitral.

8) O SP apresentou as alegações escritas.

 

B. Posição das partes

 

Para fundamentar o seu pedido, alega o SP que a B…, S.A., por si detida a 100%, foi alvo em 2019 de um procedimento de inspeção externa ao exercício de 2016 (tributada autonomamente) e de um procedimento de inspeção externa e interna, do exercício de 2017 (já tributada no âmbito do Regime Especial Tributação pelo Grupo de Sociedades — RETGS — pelo que a liquidação e demonstração de acerto de contas ocorreu na sociedade dominante, ora Requerente).

Quanto ao procedimento interno de inspeção, foram realizadas correções ao IRC consolidado da C…, alegando a AT que “foi deduzido indevidamente o valor de 106.225,24€, referente ao benefício fiscal RFAI, à coleta de IRC do Grupo de sociedades onde a C… é sociedade dominante”.

Considera o SP que a inspeção tributária parcial aos exercícios de 2016 e 2017 é nula, pois a AT não alega a forma como a inspeção teve origem e não esclarece ou explicita qual o fundamento da inspeção. Além disso, não lhe foram dados a conhecer os motivos e fundamentos da decisão de prorrogação da inspeção.

Quanto à inspeção tributária interna, de âmbito parcial, ao exercício de 2017, não foi fundamentada a decisão que justifique a seleção do contribuinte para o efeito, além de não lhe ter sido dada a conhecer os fins da ação inspetiva.

Além disso, a AT concluiu pela inelegibilidade das despesas e dos investimentos realizados pela B…

, no âmbito do RFAI, e, por isso, pela dedução indevida à coleta de IRC, por o investimento em ativo fixo tangível não ter sido adquirido em estado de novo, por não ter proporcionado a criação de postos de trabalho, por não constituir despesas com transferência de tecnologia, e por não ter sido estabelecida uma relação de benfeitorias em edifício com qualquer investimento inicial, assim como não ter sido criada qualquer linha de fabrico adicional quando aos lingotes.

Entende o SP que o RIT é nulo, por falta de fundamentação, já que cabe à AT alegar e provar os factos e as normas jurídicas que fundamentam as correções promovidas à liquidação de IRC consolidado relativa ao exercício de 2017, o que não se verificou, pois a remissão que efetua para as conclusões e RIT elaborado na sequência da inspeção de que foi alvo a participada B…, com as ordens de serviço n.º OI 2018… e n.º OI2018… padece, também ele, de manifesta nulidade, já que é completamente omisso quanto aos concretos investimentos realizados pela Requerente (como, quando, onde e de que forma) e quanto às razões concretas pelas quais tais investimentos não são elegíveis. Isso verifica-se também, do mesmo modo, quanto à inelegibilidade dos investimentos que, alegadamente, não proporcionaram a criação de postos de trabalho, “não constituem despesas com transferência de tecnologia”, o mesmo ocorrendo com os investimentos relativos a benfeitorias do edifício e à lingoteira. Daí que o RIT é nulo por falta de fundamentação.

Quanto ao RIT elaborado na sequência da inspeção de que foi alvo a participada B…, também este não efetua o adequado enquadramento legal, na medida em que esta investiu num sistema de gestão de gestão de produção e num sistema de videoconferência, como adquiriu novos fornos, adquiriu um novo contentor da prensa e automatizou, a báscula de pesagem, a bomba de espectómetro, bem como a linha de produção do lingote, cumprindo os pressupostos legais que permitem concluir que estas despesas são elegíveis para efeitos do RFAI.

Pede o SP que seja declarada a ilegalidade dos atos já identificados bem como seja a AT condenada a reembolsar à Requerente os valores indevidamente pagos, num total de 113.737,14 €, acrescido dos respetivos juros.

            Por sua vez, vem a AT, na sua Resposta, alegar que não resultam quaisquer nulidades no procedimento, não foi efetuada prova relevante que acolitasse a posição alegada pelo SP e, a final, defender que o ato posto em crise deve ser mantido na ordem jurídica por entender que o mesmo consubstancia uma correta aplicação do direito aos factos.

 

II. Saneamento

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do nº 1 do artigo 2º, e do nº 1 do artigo 10º, ambos do RJAT.

Atendendo à conformação do objeto do processo, o tribunal é competente. (cf. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 5.º, n.ºs 1 e 2, do RJAT).

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

Não existem quaisquer exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e que cumpra conhecer.  

 

            III. Fundamentação

            III.1. De Facto

§1. Factos Provados                    

Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

a)     A A…, SA, sociedade incorporante da C…, SA., encontra-se enquadrada no regime geral de tributação, tendo optado pela tributação pelo RETGS, previsto no art. 69.º do CIRC, no período de 01/01/2017 a 31/12/2018.

b)     Conforme registo de 18 de setembro de 2019, deu-se a fusão da sociedade C…, SA., por transferência global do património para a sociedade B…, S.A, conforme deliberação em assembleia geral de cada sociedade datada de 2 de agosto de 2019.

c)     A B…, S.A., (B…, de ora em diante), foi incorporada na D…, SA., CIPC …, com sede na Rua …, nº …, …, Santa Maria da Feira (Inscrição 10 - AP. ./… … UTC).

d)     A D…, S.A alterou a sua denominação social para A…, SA. (Inscrição . - AP. ./…. …. UTC)

e)     Na sequência das referidas fusões, por incorporação, a C…, SA. encontra-se fundida na A…, SA., ora Requerente.

f)      A B… foi constituída em 31 de dezembro de 2014, tendo iniciado a sua atividade em janeiro de 2015.

g)     No seu primeiro ano de atividade, a B… subcontratava toda a sua produção à massa insolvente da E…, Lda., com quem havia celebrado um contrato de prestação de serviços de transformação, com termo a 16 de dezembro de 2015.

h)     A C…, SA, por intermédio de contrato de locação financeira, passou a usufruir  do imóvel onde laborava a massa insolvente da E…, Lda., sito em Rua …, …, Santa Maria da Feira, bem como de todos os seus ativos fixos tangíveis.

i)      A C…, SA., detinha, em 2016 e em 2017, 100% do capital social da  B….

j)       A B… alterou a sua sede para a Rua …, n.º …, …, Santa Maria da Feira,  celebrou com a C… um contrato de aluguer de todo o ativo fixo tangível (todo o equipamento industrial), e assumiu a posição contratual da Requerente no contrato de locação financeira das instalações fabris (fls. 69, PA).

k)     Em 2016 a B… iniciou a atividade de fundição de outros metais não ferrosos (cobre e zinco), de onde extrai o latão em lingote, o qual, após passar pela extrusão e maquinação, é transformado em perfis de latão, bem como a da sua comercialização.

l)      A B… ainda se dedica ao aproveitamento de sucatas, ao comércio por forço de sucatas e desperdícios de metais (ferrosos e não ferrosos), bem como ao aproveitamento e comercialização de poeiras metálicas.

m)   A B… registou na sua contabilidade os bens que alugou à C… assim como o edifício como ativos fixos tangíveis.

n)     Em 2016 grande parte dos equipamentos e maquinismos encontravam-se obsoletos e pouco produtivos.

o)     Para se modernizar, em 2017, a B… investiu:

p)     um novo sistema de gestão da produção, baseado no ERP Primavera Manufacturing Professional, com desenvolvimentos específicos efetuados à medida das necessidades.

q)     Tal investimento implicou a construção de uma infraestrutura totalmente nova de rede por toda a fábrica, bem como a aquisição de novo hardware (computadores, monitores apropriados à produção em cada posto de trabalho, impressoras específicas) para permitir o acompanhamento das ordens de fabrico e permitir que cada operador efetuasse os registos necessários

r)      Este investimento ocorreu em 2016 e em 2017 e implicou para a Requerente o dispêndio com aquisição de hardware no valor de 12.877,49 € e com software e programação específica no valor de 23.047,67 €.

s)      Não existe um ERP somente para processos produtivos de fundição e/ou extrusão, pelo que o atualmente utilizado foi especificamente desenvolvido para si.

t)      Este sistema permitiu um planeamento mais eficiente dos recursos relacionados com a produção, dotando as áreas de gestão e controlo de melhores ferramentas, métodos e práticas.

u)     novo sistema de videoconferência, no valor de 6.086,00 €, para permitir reuniões com os agentes comerciais no mercado externo, clientes e fornecedores fora de Portugal.

v)     Em 2015 as vendas da B… para o mercado externo eram praticamente inexistentes e atualmente representam cerca de 70% da sua atividade.

w)   novos fornos

x)     Um “forno completo de fusão elétrico de indução para latão” é composto por três componentes fundamentais:

y)     1. Carcaça – toda a estrutura metálica que envolve o forno;

z)     2. Equipamento elétrico – todo o equipamento que permite receber a eletricidade do posto de transformação;

aa)  3. Forno(s) propriamente dito(s) – composto por bobine, camisa de cobre e refratário, que permite dar a energia ao material (latão) que é fundido.

bb) As componentes 1 e 2 encontravam-se instaladas (e materialmente ligadas) no edifício industrial da Requerente, constituindo uma parte da infraestrutura da fábrica.

cc)   O forno propriamente dito (componente 3) é totalmente autonomizável podendo ser alterado e modernizado quando se torne tecnologicamente obsoleto.

dd) A B… adquiriu novos fornos com bobines com maior capacidade de fundição e de obtenção de ganhos adicionais de eficiência energética.

ee)  O presente investimento — alteração tecnológica dos fornos de fusão — iniciou-se em 2016, sendo que todo este projeto implicaria a mudança tecnológica dos 3 fornos FF1 e FF3

ff)    Este processo só culminou em 2019, pelo que nos anos de 2016 e 2017, os investimentos com a aquisição de novos fornos, ascenderam aos seguintes montantes: i) Aquisição de novo forno FF1 2016: 67.271,75 €; ii) Aquisição de novo forno FF1 2017: 61.442,47 €; iii) Aquisição de novo forno FF3 2017: 12.599,47 €.

gg) novo contentor da prensa, devido à necessidade de desenvolvimento tecnológico da linha de produção, tendo despendido, para o efeito, i) 2016: 43.668,56 €; ii) 2017: 41.185,00 €.

hh) nova bomba espectómetro, o que permitiu reduzir significativamente a margem de erro nas análises químicas, contribuindo para que a B… produzisse novas gamas de maior valor acrescentado.

ii)    nova báscula, adquirida devido à implementação do sistema ERP Primavera Manufacturing Professional — balança digital apta a efetuar a pesagem digital da matéria-prima de forma integrada com o ERP;

jj)    sistema robotizado da lingoteira, em resultado da automatização da toda a linha de produção, com alterações no sistema de arrefecimento dos moldes e pulverização dos desmoldantes, bem como a alteração dos próprios moldes (formas), de modo a permitir a automatização do fluxo de saída do lingote do processo, no montante de 13.658,92 €, tendo apenas a automação sido concluída com a aquisição, instalação e montagem de uma célula robotizada, incluindo não só o próprio robot, como também toda a programação e software necessários ao seu funcionamento e tratamento digitalizado dos dados de produção, no montante de 128.707,39.

kk) Esta robotização permite aumentar a qualidade dos lingotes e a diminuição das não conformidades.

ll)    A B… no ano de 2015 tinha ao ser serviço 3 funcionários, em 2016 passou para 46, em 2017 para 55, e em 2018 para 64.

mm)                 O volume de negócios da B… foi de: 2015, 10.987.720,56 €; 2016, 21.792.613,55 €; 2017, 37.394.111,58 €.

nn) Quanto ao exercício de 2016, a B…, S.A, não optou pela tributação ao abrigo do regime especial de tributação dos grupo de sociedades (RETGS).

oo) Quanto ao exercício de 2017, a B…, S.A, optou pela tributação ao abrigo do RETGS, pelo que a liquidação e demonstração de acerto de contas ocorreu na sociedade dominante, a ora Requerente.

pp) Em 2019, na sequência das ordens de serviço OI2018… e OI2018…, a B…, S.A, foi sujeita a um procedimento inspetivo externo, de âmbito parcial, (IRC e IVA) relativo aos anos de 2016 e de 2017, realizado pelo Serviços de Inspeção Tributária DIT II — Direção de Finanças de Aveiro.

qq) Em 2019, na sequência das ordem de serviço OI2020…, a Requerente foi sujeita a um procedimento inspetivo externo, de âmbito parcial, (IRC) relativo ao ano de 2017, realizado pelo Serviços de Inspeção Tributária (DIT III) — Direção de Finanças de …, que culminou com a elaboração do respetivo Relatório de Inspeção Tributária, constante do documento n.º 1 anexo ao PPA e do PA e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido, sendo que, notificado para exercer o direito de audição prévia sobre o projeto do dito, o SP não o fez.

      1. Procedimento inspetivo à B…, S.A:

rr)    Na sequência de solicitação de informações por parte da Direção de Finanças de …, de 24 de julho de 2019, veio a B… por correio eletrónico de 2 de agosto de 2019, prestar os esclarecimentos constantes a fls. 137, do PA, e que se dão aqui por integralmente reproduzidos.

ss)   Por ofício n.º 825570, de 12/09/2019, registado, foi a B… notificada conforme segue:

 

tt)    Consta do PA, a fls. 442, a seguinte informação:

 

uu) O procedimento inspetivo culminou com a elaboração do respetivo Relatório de Inspeção Tributária (RIT), constante do documento n.º 10 anexo ao PPA e do PA e cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido, considerando que, notificado para exercer o direito de audição prévia sobre o projeto do dito, o SP não o fez.

vv) Resulta do ponto II.2., do RIT, o seguinte:

 

 

ww)                  A B… foi notificada das seguintes infrações, em sede de IRC (p. 4):

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

xx) Estas infrações ocorrem na sequência do seguinte (p. 12):

 

 

 

yy) Resulta do RIT, quanto a 2017, o seguinte (pp. 23, ss.):

 

 

             

 

 

 

 

 

 

 

zz)  A AT ainda concluiu ainda pela desconsideração dos seguintes investimentos:

            i) Investimentos que não proporcionam a criação de postos de trabalho  (pág. 27 e seguintes do Relatório de Inspeção da B…):

 

 

 

            ii) Investimentos que não constituem despesas com transferência de tecnologia (pág. 28 do Relatório de Inspeção da B…):

 

 

 

 

 

            iii) Novo forno — Investimentos relativos a reparação, benfeitorias e substituição de ativos (pág. 25 e 26 do Relatório de Inspeção da B…):

 

 

 

 

            iv) novo contentor da prensa — Investimentos relativos a reparação, benfeitorias e substituição de ativos (pág. 26 do Relatório de Inspeção da B…):

 

            v) Nova bomba espectómetro — Investimentos relativos a reparação, benfeitorias e substituição de ativos (pág. 25 e 26 do Relatório de Inspeção da B…):

 

 

            vi) Nova báscula — Investimentos relativos a reparação, benfeitorias e substituição de           ativos (pág. 25 e 26 do Relatório de Inspeção da B…):

 

aaa)                   A Requerente admite que não são elegíveis para efeitos do RFAI os seguintes investimentos, qualificados como tais por mero lapso:

i) Investimentos relativos a reparação, benfeitorias e substituição de ativos (pág. 24 e seguintes do Relatório de Inspeção da B…):

 

 

(…)

 

 

(…)

 

(…)

 

(…)

 

              

               ii) Investimentos relativos a benfeitorias do edifício (pág. 28 e seguintes do Relatório de Inspeção da B…):

 

 

bbb)                 A B…foi notificada do RIT, através de ofício, datado de 15/10/2019, elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária DIT III — Direção de Finanças de …, remetido por carta registada com aviso de receção (cf. documento n.º 10 anexo ao PPA e PA). 

 

2. Inspeção interna de âmbito parcial à Requerente

ccc)                   Resulta do ponto II - 2 do RIT, sob a epígrafe “Motivo, âmbito e incidência temporal”, o seguinte:

 

           

ddd)                 Resulta do RAI, pp. 8 o seguinte:

 

eee)             A AT sustentou a sua correção em considerações que tiveram como critério a relação de grupo existente e o IRC consolidado, conforme se extrai do RAI:

“(…) foi levado a efeito junto do sujeito passivo B…[sociedade participada da Requerente C…], pelos Serviços de Inspeção Tributária desta Direção de Finanças, procedimentos externos credenciados pelas ordens de serviço n.º OI2018… e OI2018… que abarcaram os anos de 2016 e 2017, ambas de carácter parcial abrangendo as cédulas de imposto IRC e IVA.”

Das referidas ações de inspeção realizadas à B…, resultaram correções em sede de IRC (…) traduzidas na correção da dedução à coleta de IRC do ano de 2017, de integralidade do beneficio fiscal no âmbito do RFAI, no valor de 106.225,24€, facto que se repercutiu no IRC do grupo na medida em que, quando seja aplicável o RGTGS, as deduções à coleta de IRC “relativas a cada uma das sociedades [dominadas] são efetuadas no montante apurado relativamente ao grupo (…)”.

“Não obstante a presente ação de inspeção respeitar ao ano de 2017, mostra-se necessário dar também conhecimento das correções efetuadas pela Inspeção tributária na esfera da B… ao ano de 2016, pelo facto de as mesmas sustentarem a correção do saldo da dotação do beneficio fiscal no âmbito do RFAI de 2016 que transitou para o ano seguinte e que foi declarado e deduzido à coleta de IRC no ano de 2017, quer pela B…, através da sua modelo 22 de IRC individual, quer no âmbito do RETGS pela C…, através da modelo 22 de IRC do Grupo”.

fff)             A Requerente foi notificada do RIT, através de ofício, datado de 04/06/2020, elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária DIT III — Direção de Finanças de …, na sequência de ter sido concedida extensão de competência pela DF de Lisboa, nos termos do art. 17.º, RCPITA, remetido por carta registada com aviso de receção (cf. documento n.º 1 anexo ao PPA e PA).  

ggg)                 Na sequência da sobredita ação inspetiva, a AT emitiu e notificou a Requerente da liquidação oficiosa de imposto de IRC n.º 2020 …, datada de 25/06/2020, no valor de 112.733,49 €, e dos respetivos juros compensatórios n.º 2020 … e n.º 2020 …, ambos de 29/06/2020, no total de 7.449,11 €, dos quais resultou o montante total a pagar de 113.737,14 € até ao dia 17/08/2020 (cf. documentos 4 e 5, anexos ao PPA, e PA).

hhh)                 A B… apresentou PPA junto do CAAD, para que fosse declarada a ilegalidade da correção oficiosa de liquidação de imposto de IRC relativa a 2016, tendo sido atribuído o n.º 163/2020-T.

iii)               A Requerente C…, procedeu ao pagamento do valor de imposto apurado, na sequência das correções efetuadas, a 07/08/2020.

jjj)               Por decisão proferida nos autos proc. n.º 163/2020-T, depois de retificado o erro de escrita que constava da versão inicial, resulta dos autos proc. n.º 163/2020-T:

 

 

§2. Factos não Provados

Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não há factos que não se tenham por provados.

 

§3. Motivação quanto à Matéria de Facto

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, à face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2, do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

O Tribunal não se pronunciou sobre o demais vertido nos articulados das partes por constituírem afirmações conclusivas e/ou juízos de direito – e que, por isso, não podem ser objeto de uma pronúncia em termos de “provado” ou “não provado” – ou por se tratar de factualidade irrelevante à boa decisão da causa.

A convicção do Tribunal fundou-se nos factos articulados pelas partes, cuja adesão à realidade não foi posta em causa e no acervo probatório carreado para os autos (incluindo o processo administrativo), o qual foi objeto de uma análise crítica e de adequada ponderação à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum e segundo juízos de normalidade e razoabilidade, assim como do depoimento da testemunha F…, Diretora Financeira da Requerente, G… e H…, ambos administradores da Requerente, que prestaram declarações de parte produzidas em sede de reunião. Em particular, quanto a estes depoimentos, eles corroboraram, no essencial, a matéria de facto alegada pela Requerente, tendo-o feito de forma objetiva e isenta, com conhecimento direto desses mesmos factos, pelo que esses depoimentos merecem-nos toda a credibilidade. Os depoimentos prestados foram particularmente relevantes para que fosse julgados provados os pontos relativos aos investimentos efetuados, propósitos e natureza.

 

III.2. De Direito

            §1. Ordem de conhecimento dos vícios

 

10. A Requerente invoca, para além do vício de violação de lei, um vício de nulidade do procedimento inspetivo e de falta de fundamentação do relatório de inspeção tributária.

Conforme  dispõe o artigo 124.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, na sentença a proferir no processo de impugnação, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação (n.º 1), havendo lugar, no primeiro grupo, à apreciação prioritária dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, e, no segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior (n.º 2).

No presente caso, não são arguidos vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado ou outros que resultem do exercício da ação pública, estando apenas em causa vícios que conduzem à anulação do ato administrativo. Por outro lado, a Requerente não indica uma relação de subsidiariedade entre os vícios, pelo que se afigura haver lugar ao conhecimento prioritário do vício de violação de lei por ser este que confere mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.

 

§2. Thema Decidendum

 

11. A questão jurídico-tributária que está em causa e sobre que existe dissidência das partes consiste em determinar se os investimentos realizados pela B…, no ano de 2017, que, entretanto, alterou a denominação social para A…, SA, ora Requerente, são elegíveis para o benefício fiscal designado Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI) para efeito da dedução à coleta.

No âmbito de um procedimento inspetivo, a Autoridade Tributária considerou não verificados os pressupostos da elegibilidade do benefício fiscal e determinou correções tributárias relativamente ao exercício de 2017 por indevida dedução à coleta da correspondente dotação.

  Os serviços inspetivos concluíram pela inelegibilidade dos seguintes investimentos, que se encontram identificados no Relatório de Inspeção Tributária, e com os seguintes fundamentos:

a)  Investimentos relativos a reparações, benfeitorias e substituição de ativos, relacionados com a aquisição de forno, contentor da prensa, bomba espectómetro e báscula de pesagem, no valor de € 155,423,47, com fundamento na alínea a) do n.º 2 e alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º e no n.º 5 do artigo 22.º do CFI;

b) Investimentos que não proporcionam a criação de postos de trabalho, relacionados com o sistema de gestão de produção, no valor de € 12.257,83, com fundamento na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI;

c) Investimentos que não constituem despesas com transferência de tecnologia, relacionados com a aquisição de software, no valor de € 10.896,00, com fundamento na alínea b) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI;

d)) Investimentos relativos à lingoteira (moldes), no valor de € 13.658.92, com fundamento nas alíneas a) do n.º 2 do CFI e alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015;

e) Investimentos relativos à instalação de sistema robotizado de limpeza de lingoteira e de empaletamento de lingotes, no valor de € 128.707,39, com fundamento na alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

  Para a análise destas questões, importa começar por ter presente o artigo 22.º do CFI, que, na parte que mais interessa, dispõe nos seguintes termos:

Artigo 22.º

Âmbito de aplicação e definições

1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.

2- Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:

a)     Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:

 

i)                Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;

ii)              Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;

iii)            Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;

iv)             Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;

v)               Equipamentos sociais;

vi)             Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;

b) Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

(...)

5- Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.

6- Para efeitos do disposto no número anterior, não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso transitado de períodos anteriores, exceto se forem adiantamentos.

(…).

Por sua vez, o artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, estabelece que «para efeitos do disposto no artigo 22.º do Código Fiscal do Investimento (...) os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente».

Revertendo à situação do caso, interessa analisar, à luz do regime aplicável, cada um dos investimentos realizados pela Requerente que foram tidos como inelegíveis e os fundamentos que serviram de base à sua desconsideração para efeito de dedução à coleta.

            A) Sistema de gestão de produção

 

O investimento relacionado com o sistema gestão de produção foi considerável inelegível, com fundamento na alínea f) do 2 do artigo 22.º do CFI, por se ter entendido não proporcionar a criação de emprego.

Como resulta da matéria de facto dada como assente, o novo sistema de gestão da produção, baseado no ERP Primavera Manufacturing Professional, com desenvolvimentos específicos efetuados à medida das necessidades da Requerente, implicou a construção de uma infraestrutura de rede por toda a fábrica, bem como a aquisição de novo hardware (computadores, monitores apropriados à produção em cada posto de trabalho, impressores específicas) para permitir o acompanhamento das ordens de fabrico e permitir que cada operador efetuasse os registos necessários. Sendo que este sistema permitiu um planeamento mais eficiente dos recursos relacionados com a produção, dotando as áreas de gestão e controlo de mais adequados métodos e práticas.

Por outro lado, o investimento incluiu um sistema de videoconferência destinado a facilitar o contacto com agentes comerciais no mercado externo, clientes e fornecedores (cfr. alíneas o) a u) da matéria de facto).

Todos os equipamentos mencionados foram adquiridos em estado de novo, configuram ativos fixos tangíveis afetos à exploração da empresa, e as despesas complementares com a aquisição de know-how e conhecimentos técnicos, designadamente a aquisição do ERP Primavera Manufacturing Professional, constituem ativos intangíveis, e, em qualquer dos casos, são aplicações relevantes que se encontram abrangidos pela previsão do artigo 22.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CFI.

A Autoridade Tributária recusou a elegibilidade dos investimentos com fundamento em que não proporcionam a criação de postos de trabalho, mas formula uma tal conclusão em termos abstratos, e sem a mínima demonstração em concreto da correlação que possa ter existido entre a instalação de um novo sistema de gestão de produção e de videoconferência e a evolução ocorrida ao nível do número de trabalhadores ao serviço da empresa. Sendo ainda certo que, como está igualmente provado, nos anos de 2017, 2018 e 2019 houve um aumento significativo do pessoal afeto à empresa (alínea ii) da matéria de facto), e sempre seria de presumir que a instalação de um novo sistema de gestão da produção com as características referenciadas poderia potenciar a criação de novos postos de trabalho através da admissão de pessoal especializado.

Por outro lado, tendo em conta o critério que resulta do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, e estando em causa a apreciação da legalidade de um ato de liquidação oficiosa, praticado pela Autoridade Tributária, corrigindo liquidação anterior baseada na declaração do contribuinte, é à Administração que incumbe o ónus da prova dos pressupostos legais da correção que operou, e, na situação do caso, a demonstração de que os investimentos realizados não proporcionaram a criação de novos postos de trabalho.

B) Investimentos que não constituem despesas com transferência de tecnologia: aquisição de software

A Autoridade Tributária excluiu ainda o ativo com a descrição “implementação do software ERP Primavera Manufacturing Professional” (RIT, III.1.1.3.3, com a descrição 17077, pág. 28), com o único fundamento de se não tratar de despesas com transferência de tecnologia, limitando-se a invocar, sem qualquer outro desenvolvimento, o disposto no artigo 22.º, n.º 2, alínea b), do CFI.

De notar que a referida disposição considera como aplicações relevantes no âmbito do RFAI os ativos intangíveis “constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente”. Tratando-se de uma enumeração  meramente exemplificativa, nada permite concluir que o software associado ao sistema  ERP Primavera Manufacturing Professional, que implica uma programação específica para esse sistema (alínea r) da matéria de facto), não deva ser considerado como despesa com transferência de tecnologia para o efeito  previsto naquela disposição, e, em todo o caso, os serviços inspetivos não efetuam uma qualquer análise circunstanciada do sistema operacional em causa que possa afastar fundadamente essa qualificação.

 

C) Investimentos relativos a reparações, benfeitorias e substituição de ativos:  aquisição de forno

O Relatório de Inspeção Tributária desconsiderou o investimento relacionado com a aquisição de forno, para efeitos de RFAI, por entender que se trata de despesas relativas a reparações, manutenções e substituição ativos e/ou dos seus componentes, não correspondendo a um investimento inicial, na aceção da alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º da Portaria n.º 297/2015, nem a ativos fixos tangíveis adquiridos no estado de novo. Argumenta adicionalmente que o investimento não cumpre o requisito da alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

Como resulta da matéria dada como assente (alíneas w) a ff) da matéria de facto), o forno, designado como um “forno completo de fusão elétrico de indução para latão” é composto por três componentes fundamentais: 1. carcaça – toda a estrutura metálica que envolve o forno; 2. equipamento elétrico – todo o equipamento que permite receber a eletricidade do posto de transformação; 3. forno(s) propriamente dito(s) – composto por bobine, camisa de cobre e refratário, que permite dar a energia ao material (latão) que é fundido.

As componentes 1 e 2 encontravam-se instaladas (e materialmente ligadas) no edifício industrial da Requerente, constituindo uma parte da infraestrutura da fábrica. O forno propriamente dito (componente 3) é totalmente autonomizável podendo ser alterado e modernizado quando se torne tecnologicamente obsoleto.

A B… adquiriu novos fornos com bobines com maior capacidade de fundição e de obtenção de ganhos adicionais de eficiência energética, visando o investimento a alteração tecnológica dos fornos de fusão, que se iniciou em 2016 e culminou em 2019, havendo a B… adquirido em 2017, um novo forno FF1 e um novo forno FF3.

Face toda a prova coligida não pode concluir-se que o sujeito passivo se limitou a proceder a reparações ou à substituição de componentes, quando se constata que o forno é uma componente autonomizável, que foi adquirido em estado novo, e não só preenche o requisito do artigo 22.º, n.º 2, alínea a), do CFI, como também constitui um investimento inicial na medida em que implica uma alteração fundamental do processo de produção.

No Relatório de Inspeção Tributária, a Autoridade Tributária utiliza ainda o argumento adicional de que o investimento não proporciona a criação de postos de trabalho. Tem aqui plena aplicação o que se disse, a esse propósito, na antecedente alínea A), sendo que, tratando-se de um ato de liquidação oficiosa, sempre competiria à Administração o ónus da prova de que o investimento não proporcionou novos postos de trabalho.

 

C) Investimentos relativos a reparações, benfeitorias e substituição de ativos: contentor da prensa, bomba espectómetro e báscula de pesagem

A mesma ordem de considerações que conduziu à recusa de elegibilidade relativamente ao investimento anteriormente analisado, também determinou a exclusão dos gastos realizados com a aquisição do contentor da prensa, da bomba espectómetro e da báscula de pesagem (ponto III.1.1.3.1. do Relatório e descrições de ativo que constam de fls. 25 e 26).

Da matéria de facto dada como provada resulta que a Requerente teve de investir num novo contentor da prensa, devido à necessidade de desenvolvimento tecnológico da linha de produção (alínea gg). Assim como numa nova bomba espectómetro, que permitiu reduzir significativamente a margem de erro nas análises químicas, contribuindo para que a B… produzisse novas gamas de maior valor acrescentado (alínea hh), e numa nova báscula - balança digital apta a efetuar a pesagem digital da matéria-prima de forma integrada com o ERP –, que foi adquirida devido à implementação do sistema ERP Primavera Manufacturing Professional (alínea ii)).

O contentor da prensa é uma câmara específica que recebe o bilete a quente e onde ocorre a extrusão propriamente dita e integra um dos diversos equipamentos que funcionam de forma sequencial na linha de produção do sector da extrusão. E, quer a bomba espectómetro, quer a báscula de pesagem, são equipamentos tecnologicamente evoluídos que relevam para o controlo da qualidade do produto e o desenvolvimento do sistema de stocks.

Face a essa factualidade, não é possível considerar – como faz a Autoridade Tributária - que estamos perante a mera substituição de um ativo usado (contentor da prensa) ou a mera reparação de equipamentos já existentes (bomba espectómetro e báscula de pesagem), havendo de concluir-se que constituem investimentos em ativos tangíveis adquiridos em estado novo.

Por razões anteriormente expostas, e que têm igual aplicação ao caso, também não pode dar-se como inverificado o requisito da alínea f) do n.º 4 do artigo 22.º do CFI.

D) Investimentos relativos à lingoteira (moldes) e à instalação de sistema robotizado de limpeza de lingoteira e de empaletamento de lingotes

Relativamente a esta matéria, a Autoridade Tributária considerou que os investimentos relativos às alterações à lingoteira respeitam à substituição de equipamentos e passam essencialmente pela alteração do formato do produto já antes fabricado, e não são qualificáveis como investimentos iniciais, nem correspondem a ativos tangíveis em estado de novo. E no que concerne à instalação de sistema robotizado de limpeza de lingoteira e de empaletamento de lingotes, entendeu que o investimento não proporcionou a criação de novos postos de trabalho e, tendencialmente, implicará uma redução do número de trabalhadores, visto que anteriormente à instalação desse novo sistema o trabalho era realizado manualmente (ponto III.1.1.3.5 e descrição de fls. 31 e 32, e ponto III. 1.1.3.6. e descrição de fls. 36).

Resulta da matéria de facto tida como provada, com referência quer às alterações efetuadas na linha de fabrico dos ligotes, quer ao sistema robotizado, que: (a) o  sistema robotizado da lingoteira, em resultado da automatização da toda a linha de produção, com alterações no sistema de arrefecimento dos moldes e pulverização dos desmoldantes, bem como a alteração dos próprios moldes (formas), de modo a permitir a automatização do fluxo de saída do lingote do processo, no montante de 13.658,92 €, tendo apenas a automação sido concluída com a aquisição, instalação e montagem de uma célula robotizada, incluindo não só o próprio robot, como também toda a programação e software necessários ao seu funcionamento e tratamento digitalizado dos dados de produção; (b) esta robotização permite aumentar a qualidade dos lingotes e a diminuição das não conformidades.

 Como se pode concluir, o investimento teve em vista a realização de alterações na lingoteira, nomeadamente no sistema de arrefecimento dos moldes e pulverização dos desmoldantes e alteração da forma dos moldes (descrição 17028, 17072 e 17076, a fls. 32 do RIT), que se destinaram a permitir a autonomização da linha de produção mediante um sistema robotizado, e que – como reconhece a Requerida - anteriormente era manual.

Dificilmente se poderia compreender que investimentos desse tipo, que geram uma modificação substancial do processo de produção da empresa, transformando um sistema manual num sistema autonomizado, e aumentando a qualidade dos produtos, não pudesse ser entendido como um investimento inicial, à luz do disposto na alínea d) do n.º 2 da Portaria n.º 297/2015, que precisamente qualifica como tal, para efeito da atribuição do benefício fiscal, entre outras situações, os investimentos relacionados com uma “alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente”. 

E não pode deixar de reconhecer-se que a implementação desse novo sistema de produção não poderia ser efetuada através da reparação ou substituição de ativos já existentes, mas por intermédio da aquisição de ativos em estado novo.

Quanto ao fundamento invocado para a exclusão do investimento relacionado com a instalação do sistema robotizado, cabe referir – uma vez mais - que compete à Administração que o ónus da prova de que o investimento não proporcionou novos postos de trabalho. E, nesse ponto, o Relatório de Inspeção Tributária limita-se a extrair a ilação de que um sistema de robotização pode originar uma redução do número de trabalhadores, sem efetuar objetivamente a demonstração de que, nas circunstâncias do caso, o investimento não obteve o efeito inverso de criação de postos de trabalho.

Em conclusão, as correções tributárias enfermam de erro nos pressupostos de facto e violação do disposto no artigo 22.º, n.º 2, alíneas a) e b), n.º 4, alínea f), do CFI e do artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, e são, consequentemente, ilegais.

Face ao sentido da decisão, fica prejudicado o conhecimento dos restantes vícios invocados.

 

Reembolso do imposto indevidamente pago e juros indemnizatórios

 

12. A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

Por efeito da reconstituição da situação jurídica em resultado da anulação do acto tributário, há assim lugar ao reembolso do imposto indevidamente pago.

Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.

Há assim lugar, na sequência de declaração de ilegalidade do ato de liquidação de IRC, ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das citadas disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).

 

***

 

IV. Decisão

            Nos termos expostos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a)                Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à declaração de ilegalidade e anulação da liquidação oficiosa de imposto de IRC n.º 2020 …, datada de 25/06/2020, no valor de 112.733,49 €, e dos respetivos juros compensatórios n.º 2020 … e n.º 2020 …, ambos de 29/06/2020, o que perfaz o valor total de 113.737,14 €, com as legais consequências;

b)               Julgar procedente o pedido de condenação da Requerida no reembolso do imposto indevidamente pago e no pagamento de juros indemnizatórios;

c)                Condenar a Requerida das custas do processo.

*

V. Valor do Processo

Em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de 113.737,14 €.

*

VI. Custas

Em conformidade com o acima decidido e nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT e no artigo 4.º, n.º 4, e na Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante das custas é fixado em 3.060,00 €, a cargo da Requerida.

*

Notifique.

 

Lisboa, 20 de dezembro de 2021.

 

O Presidente do Tribunal Arbitral,

 

 

(Carlos Alberto Fernandes Cadilha)

 

 

O Árbitro vogal,

 

 

 

(Sérgio Pontes)

 

 

O Árbitro vogal,

 

 

(Ricardo Marques Candeias)