Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 643/2019-T
Data da decisão: 2020-10-20  Selo  
Valor do pedido: € 106.038,70
Tema: Imposto do Selo – Artigo 7.º-1/i), do CIS – Verba 17.1.2., da TGIS – Fundo de Investimento Imobiliário – Isenção.
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SUMÁRIO: I – O artigo 7.º-1/i), do Código do Imposto do Selo é apenas aplicável a empréstimos com caraterísticas de suprimentos. II - O contrato de suprimento, cujo regime está previsto nos artigos 243.º a 245.º do CSC (Código das Sociedades Comerciais), pressupõe necessariamente uma sociedade comercial como mutuária e um sócio da mesma como mutuante. III - Um Fundo de Investimento Imobiliário não constituído sob a forma de sociedade comercial não beneficia assim da norma de isenção consagrada na alínea i) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo.

 

Decisão Arbitral

 

I – Relatório

 

1. A..., S.A. (doravante abreviadamente designada de “Requerente”), com o número de identificação fiscal ..., com sede na ..., ..., ...-... Porto Salvo, na qualidade de sociedade gestora e em representação do B...– FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO (doravante “Fundo” ou “Fundo-Mutuário”), com o número de identificação fiscal ..., apresenta pedido de pronúncia arbitral sobre a (alegada) ilegalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa proferido pela Unidade dos Grandes Contribuintes, no âmbito do procedimento administrativo n.º ...2018..., e notificado no dia 30 de agosto de 2019 ao Fundo, o qual junta sob a designação de Documento 1 e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais e, consequentemente, a pronúncia sobre a ilegalidade do ato tributário de retenção na fonte do Imposto do Selo, no âmbito da concessão de crédito por uma entidade não residente em Portugal, declarado através da guia n.º ... de 31 de julho de 2018, no montante de € 106.038,70, junto sob a designação de Documento 2.

 

2. Invocando o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e nos n.os 1 e 2 do artigo 10.º, todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (“Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária” ou “RJAT”) e nos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 março e alegando, em síntese, e no essencial, que o ato de liquidação padece do vício de violação do disposto no artigo 7.º,1/i), do Código do Imposto do Selo (CIS) e da verba 17.1.2, da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS),  pede que (i) seja declarada a ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa referente ao ato tributário de retenção na fonte do Imposto do Selo que identifica e documenta, procedendo-se à anulação do mesmo, por padecer de erro nos pressupostos de facto e de direito;(ii) seja a Autoridade Tributária Aduaneira condenada a reembolsar o Fundo do valor do imposto pago, no montante de € 106.038,70, relativamente àquele ato tributário e (iii) seja a Autoridade Tributária e Aduaneira condenada no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, até ao reembolso integral da quantia devida e calculados sobre o imposto.

 

3. Fundamenta o pedido, no essencial e em síntese, alegando que na sequência da concessão do montante total de empréstimo / financiamento por Participante-Mutuante ao “Fundo” no âmbito da execução de Contrato de Mútuo e considerando que o Participante-Mutuante é uma pessoa singular não residente em Portugal, a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) emitiu ao Fundo, enquanto substituto tributário (e sujeito passivo e devedor do Imposto do Selo) na operação em apreço, o ato tributário sub judice de retenção na fonte a não residentes através da guia n.º ... de 31 de julho de 2017, relativo ao Imposto do Selo devido pela concessão de crédito em apreço, ao abrigo da verba 17.1.2 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), no montante total de € 106.038,70 (resultante da aplicação da taxa de 0,5% do Imposto do Selo aplicável à utilização de crédito de prazo igual ou superior a um ano) – cf. Documento 2.

 

4. Ora, não obstante o Fundo ter procedido ao pagamento, integral e atempado, do Imposto do Selo sub judice, objeto do ato de retenção na fonte acima identificado – conforme extrato bancário, emitido pelo Depositário que comprova este pagamento, junto como Documento 5 - entende a Requerente, enquanto sociedade gestora e representante do Fundo mutuário no Contrato de Mútuo em apreço, que o ato tributário de retenção na fonte do Imposto do Selo sub judice não se encontra conforme com a legislação aplicável.

 

5. Alega ainda o Fundo que a operação de mútuo / financiamento subjacente ao ato tributário sub judice beneficia da norma de isenção consagrada na alínea i) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, tendo apresentado, em representação do Fundo, a reclamação graciosa contra o ato tributário em crise.

 

6. Em 30 de agosto de 2019, a AT notificou o despacho de indeferimento definitivo aqui em causa, no âmbito do qual entendeu que a isenção de Imposto do Selo prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 7.º do Código deste imposto não é aplicável à concessão de crédito sub judice e, consequentemente, alegou que esta operação deve ser tributada em sede de Imposto do Selo (cf. Documento 1).

 

7. Daí o presente pedido de pronúncia arbitral sobre a ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa, notificado em 5 de agosto de 2019, referente ao ato de liquidação de Imposto do Selo nº..., correspondentes a junho de 2018, no montante total de € 106.038,70 requerendo que essa liquidação fosse declarada nula, e reembolsadas as quantias correspondentes, acrescidas de juros indemnizatórios.

 

8. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT.

 

9. O Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação.

 

10.  O Tribunal Arbitral Coletivo ficou regularmente constituído em 20 de dezembro de 2019 e é materialmente competente.

 

11. Nos termos artigo 17.º do RJAT, foi a AT notificada, para apresentar resposta.

 

12.  Foi oportuna e tempestivamente apresentada a Resposta e junta cópia do processo administrativo.

 

13. O Despacho Arbitral de 4 de março de 2020 dispensou a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, estabeleceu prazo para alegações e fixou o dia 12 de maio de 2020 como data previsível para prolação e notificação da decisão arbitral final.

 

14. Não foram apresentadas alegações finais.

 

15. Por despachos de 19-6-2020 e 15-9-2020, foi prorrogado, com os fundamentos aí invocados, o prazo para prolação e notificação da decisão arbitral final.

 

16. As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, estão devidamente representadas e são legítimas.

 

17. O processo não enferma de nulidades.

 

II – Fundamentação: a matéria de facto

 

II.A. Factos que se consideram provados e com relevância para a decisão

 

1. Para apreciação do pedido considera o Tribunal provados os seguintes factos:

a.            B... – FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO É um “Fundo especial de investimento imobiliário fechado”, constituído por subscrição particular, e enquadrado, nos termos e ao abrigo do Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário (entretanto revogado pelo Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo  )- cf. Regulamento de Gestão -  Documento 3 com a PI;

b.            A constituição do Fundo foi autorizada por deliberação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (“CMVM”) em 24 de outubro de 2007, tendo o Fundo iniciado a sua atividade em 13 de novembro do mesmo ano.

c.            O Fundo tem como objetivo “a aplicação das poupanças recebidas dos participantes no investimento efetuado no mercado imobiliário procurando, através da sua política de investimentos, criar condições de rentabilidade, segurança e liquidez, não privilegiando nenhuma área em particular da atividade imobiliária” (cf. Regulamento de Gestão, página 7, junto como Documento 3).

d.            Além da política de investimento centrada no mercado imobiliário, o Fundo poderá ainda “aceitar garantias/financiamento, prestadas/concedido pelos seus Participantes, desde que estes reunidos em Assembleia de Participantes aprovem, antecipada e unanimemente, deliberação nesse sentido”, e, neste contexto, o Fundo “poderá contrair dívida, de forma ilimitada, como forma de financiamento do seu ativo, sempre que o retorno esperado da operação se mostre vantajoso para os participantes” (cf. Regulamento de Gestão, página 8, junto como Documento 3).

e.            A administração, gestão e representação do Fundo é da competência da aqui Requerente, sendo as funções de entidade depositária asseguradas pelo Banco Comercial Português, S.A. (doravante abreviadamente designado como “Depositário”).

f.             A Requerente, enquanto sociedade gestora e representante do Fundo, celebrou, em 31 de julho de 2018, um Contrato de Mútuo (doravante abreviadamente designado de “Contrato”) com um dos detentores de unidades de participação do Fundo, C... cartão de cidadão n.º ..., com o número de identificação fiscal ..., residente na ... Suíça (doravante abreviadamente designado de “Participante-Mutuante”) – cf. Contrato de Mútuo junto com a petição – doc. 4;

g.            Nos termos do Contrato de Mútuo em apreço, e considerando que à data da celebração deste contrato o Fundo detinha um montante total de dívida de € 21.207.731,00 [cf. considerando B) do Contrato], o Participante-Mutuante concedeu ao Fundo, Mutuário no presente Contrato sub judice, um financiamento no mesmo montante da dívida em apreço, financiamento este admissível nos termos do n.º 2 do artigo 149.º da Lei n.º 16/2015, de 24 de fevereiro (Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo) – cf. considerando E) do citado Contrato - Documento 4.

h.            Neste contrato o Mutuário declarou-se devedor ao Mutuante, da quantia total de € 21.207.731,00 (vinte e um milhões duzentos e sete mil setecentos e trinta e um euros), emergente de financiamento concedido de uma só vez pelo Mutuante ao Mutuário destinado, exclusivamente, a apoio de tesouraria do Fundo.

i.             O contrato mencionado “tem a duração de 59 (cinquenta e nove) meses e, com efeitos reportados a 30 de junho de 2018 e término a 29 de maio de 2023”...,

j.             ... e o Fundo poderá proceder ao reembolso de capital ao Mutuante, em qualquer altura, previamente ao termo do contrato, mediante solicitação escrita do Fundo, formulada com antecedência mínima de 5 dias úteis e o Mutuante autoriza o reembolso antecipado total ou parcial do financiamento, sem qualquer penalização.

k.            Todas e quaisquer despesas e encargos que decorram ou sejam originadas pela execução do Contrato, maxime, de natureza fiscal, serão da responsabilidade exclusiva do Fundo e integralmente suportados por esta última, contra fatura ou nota de débito a apresentar pelo Mutuante.

l.             E será da responsabilidade do Mutuário a retenção e pagamento de quaisquer outros impostos por conta do Mutuante que sejam legalmente exigíveis e devidos.

m.          Na sequência da concessão do montante total de empréstimo / financiamento pelo Participante-Mutuante ao Fundo no âmbito da execução do Contrato de Mútuo em apreço, e considerando que o Participante-Mutuante é uma pessoa singular não residente em Portugal, a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) emitiu ao Fundo, enquanto substituto tributário (e sujeito passivo e devedor do Imposto do Selo) na operação em apreço, o ato tributário de retenção da fonte a não residentes sub judice, através da guia n.º... de 31 de julho de 2018, relativo ao Imposto do Selo devido pela concessão de crédito em apreço, ao abrigo da verba 17.1.2 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), no montante total de € 106.038,70 (resultante da aplicação da taxa de 0,5% do Imposto do Selo aplicável à utilização de crédito de prazo igual ou superior a um ano) – cf. Documento 2.

n.            O Fundo procedeu ao pagamento, integral e atempado, do Imposto do Selo sub judice, objeto do ato de retenção na fonte acima identificado – conforme extrato bancário -  Documento 5, junto com a PI.

o.            A Requerente apresentou, em representação do Fundo, a reclamação graciosa contra o ato tributário em crise e, subsequentemente, ...

p.            ...em 30 de agosto de 2019, a AT notificou o despacho de indeferimento dessa reclamação graciosa, no âmbito do qual entendeu que a isenção de Imposto do Selo prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 7.º do Código deste imposto não é aplicável à concessão de crédito sub judice e, consequentemente, alegou que esta operação deve ser tributada em sede de Imposto do Selo (cf. Documento 1).

 

II.B. Factos que se consideram não provados

 

Com base nos elementos documentais disponibilizados nos autos e consensualmente aceites pelas partes, incluindo a cópia do processo administrativo instrutor junta pela AT, verifica-se que, com interesse para a decisão da causa, nada ficou por provar, não havendo controvérsia sobre a matéria de facto.

 

III – Fundamentação: a matéria de Direito

 

19. A questão sub juditio reconduz-se à interpretação/aplicação do disposto no artigo 7º-1/i), do Código do Imposto do Selo (redação vigente em 2018) (CIS) e, consequentemente, da aplicação da taxa de 0,5% prevista na Verba 17.1.2, da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS).

 

Vejamos então.

 

20. Para maior facilidade expositiva convém transcrever o que dispõe o artigo 7.º,1./i), do CIS: “1. São também isentos do imposto: (...) i) Os empréstimos com características de suprimentos, incluindo os respetivos juros, quando realizados por detentores de capital social a entidades nas quais detenham diretamente uma participação no capital não inferior a 10% e desde que esta tenha permanecido na sua titularidade durante um ano consecutivo ou desde a constituição da entidade participada, contanto que, neste caso, a participação seja mantida durante aquele período (...)”.

 

21. A Requerente é uma sociedade gestora de investimentos de  fundos de participação que, na qualidade de gestora e representante de B...– FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO (doravante “Fundo” ou “Fundo-Mutuário”) e enquanto sociedade gestora e representante do Fundo, celebrou, em 31 de julho de 2018, um Contrato de Mútuo (doravante abreviadamente designado de “Contrato”) com um dos detentores de unidades de participação do Fundo,  C..., residente na ...– Suíça  e, nos termos desse contrato de mútuo, considerando que à data da celebração o Fundo detinha um montante total de dívida de € 21.207.731,00, o Participante-Mutuante concedeu um financiamento no mesmo montante da dívida em apreço, financiamento este admissível nos termos do n.º 2 do artigo 149.º da Lei n.º 16/2015, de 24 de fevereiro (Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo), declarando-se devedor ao Mutuante, da quantia total de € 21.207.731,00 (vinte e um milhões duzentos e sete mil setecentos e trinta e um euros), emergente de financiamento concedido de uma só vez pelo Mutuante ao Mutuário destinado, exclusivamente a apoio de tesouraria do Fundo.

 

22. O entendimento da Requerente, já veiculado na Reclamação Graciosa, é o de que o empréstimo concedido cabe em pleno na previsão da isenção estabelecida no art. 7.º, 1, i) do CIS.

 

23. E isto porque, no entender do Requerente, se encontram preenchidos os três requisitos que constam da norma:

a.            O empréstimo tem característica de suprimentos;

b.            Foi  realizado por acionista com 10% ou mais do capital social;

c.            Essa participação de 10% ou mais do capital social permaneceu na      titularidade do acionista durante pelo menos um ano consecutivo.

 

Vejamos

24. Os três requisitos cumulativos acima mencionados têm de estar preenchidos sob pena de inadmissibilidade da isenção prevista no citado artigo 7.º, 1 – i), do CIS.

 

25. Assim é que, e desde logo, os empréstimos têm de configurar a natureza de suprimentos.

 

26. O contrato de suprimento está previsto nos artigos 243.º a 245.º do CSC (Código das Sociedades Comerciais).

 

27. Desse enquadramento legislativo resulta que o contrato de suprimento  configura um negócio jurídico, em que o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível.

28. Ou seja: para se falar em contrato de suprimento, o estatuto dos respetivos outorgantes terá de ser, de um lado, uma sociedade comercial e do outro um sócio.

 

29. Os Fundos de Investimento Imobiliário não são sociedade comerciais mas antes  instituições de investimento coletivo, com o objetivo de aplicar o capital obtido junto de investidores.

 

30. Um Fundo de Investimento Imobiliário presume assim a captação de capital de vários investidores, gerido por especialistas, que o aplicam em imóveis.

 

31. O respetivo Regime Jurídico  constava inicialmente do DL n.º 71/2010, de 18/6 , que, no artigo 2.º dispunha: “(...) 1 - Os fundos de investimento imobiliário, adiante designados apenas por fundos de investimento, são instituições de investimento coletivo, cujo único objetivo consiste no investimento, nos termos previstos no presente diploma e na respetiva regulamentação, dos capitais obtidos junto dos investidores e cujo funcionamento se encontra sujeito a um princípio de repartição de riscos.

2 - Os fundos de investimento constituem patrimónios autónomos, pertencentes, no regime especial de comunhão regulado pelo presente diploma, a uma pluralidade de pessoas singulares ou coletivas designadas «participantes», sem prejuízo do disposto no artigo 48.º, que não respondem, em caso algum, pelas dívidas destes ou das entidades que, nos termos da lei, asseguram a sua gestão (...)”.

32. Entretanto, a Lei n.º 16/2015, que aprovou o Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo (RGOIC), em transposição das Diretivas 2011/61/EU e 2013/14/EU, veio revogar o anterior e citado Regime dos Fundos de Investimento Imobiliário – cfr. artigo 6.º, da citada Lei.

 

33. Respiga-se no citado RGOIC:

Artigo 5º

Forma e estrutura

1 — Os organismos de investimento coletivo assumem a forma contratual de fundo de investimento ou a forma societária.

2 — Os organismos de investimento coletivo sob forma societária compreendem as sociedades de investimento mobiliário e as sociedades de investimento imobiliário.

3 — As sociedades referidas no número anterior são sociedades anónimas de capital fixo ou variável.

Artigo 6º

Denominação

1 — A denominação identifica inequivocamente a espécie e o tipo do organismo de investimento coletivo, adequando-se à respetiva política de investimento.

2 — Ao fundo de investimento fica reservada a expressão «fundo de investimento», acrescida da expressão «imobiliário» no caso dos fundos de investimento imobiliário, que deve integrar a sua denominação.

3 — Aos organismos de investimento coletivo sob forma societária fica reservada a designação «SICAF» ou «SICAV» ou, no caso dos organismos de investimento imobiliário, «SICAFI» ou «SICAVI», consoante se constituam, respetivamente, com capital fixo ou variável, devendo a mesma integrar a sua denominação.

4 — (...)

 

34. A doutrina  sustenta quanto aos FII que:

 

“Os FII concorrem, portanto, com outras aplicações financeiras, sejam depósitos a prazo, outros instrumentos de investimento direto nos mercados de capitais, ou imóveis, na captação das poupanças dos investidores, sendo que até à crise do subprime, em finais de 2007, ofereciam uma rendibilidade superior à dos depósitos a prazo, mas com um risco substancialmente inferior aos dos investimentos diretos em instrumentos de capital. Salientando o papel dos FII como instrumento de poupança e de dinamização económica,Carvalho (2008: 288) defende que

 

[o]s fundos imobiliários posicionaram-se entre os convencionais depósitos a prazo e produtos de maior risco, e proporcionado aos participantes dos fundos uma rendibilidade segura interessante numa perspectiva de médio a longo prazo. Em simultâneo, os FIIs contribuíram para a angariação de poupanças de muitos pequenos aforradores e abriram o seu acesso a investimentos imobiliários, dinamizando este mercado.

E que podem ser utilizados não só como veículo de agregação de poupança, mas também como instrumento de captação de investimento estrangeiro, e como meio alternativo de investimento imobiliário, destacando-se por um risco de investimento mitigado, fiscalidade mais favorável (nosso sublinhado), associado a uma gestão profissional, transparência e à supervisão a que estão sujeitos (ibidem: 307-308)”.  Ou dito de outro modo, envolvem um risco de investimento mitigado, circunstância que não se verifica a propósito das sociedades comerciais, pois o risco de quinhoar nas perdas é imanente à atividade social.

 

35. A norma em dissídio prevê um benefício fiscal;  contudo, procurando, por via hermenêutica, a intenção do legislador na sua previsão, não se vê como concluir, por interpretação extensiva, que os fundos de investimento imobiliário se possam equiparar a entidades sobre a forma societária, perante, como se viu,  a distinta natureza e finalidades.

Descendo de novo ao caso sub juditio:

36. Não sendo o Fundo (B...– FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO) uma sociedade e consequentemente não tendo os respetivos investidores o estatuto de sócios, não há a possibilidade legal de existência ou celebração de contratos de suprimento.

 

37. E é, insiste-se, o que ocorre no caso dos autos: B...– Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado (o mutuário) de que é gestora a sociedade requerente,  A..., SA, não é uma sociedade comercial mas um FII e C... (mutuante) obviamente que não intervém no mútuo como sócio, mas como investidor, detentor de unidades de participação do sobredito Fundo B... .

 

38. Assim é que, sem outras, desnecessárias considerações, não estando reunido o requisito de “suprimentos” mas antes tratar-se de mero mútuo o ato sujeito à citada e impugnada tributação, não podia integrar caso de isenção nos termos do artigo 7.º,1/i), do CIS.

 

39.  Daí a inevitável improcedência do pedido.

 

IV. Decisão

 

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente e, em consequência decide-se:

a.            Manter na ordem jurídica o despacho que indeferiu a reclamação graciosa apresentada pela Requerente no âmbito do procedimento administrativo nº ...2018..., notificado à Requerente em 30-8-2019, respeitante ao ato tributário de retenção na fonte do imposto do selo (guia nº ... de 31 de julho de 2018, no montante de €106 038,70 – doc. 2, com o pedido);

b.            Manter igualmente na ordem jurídica a sobredita e impugnada liquidação de imposto do selo;

c.            Julgar prejudicados os pedidos de reembolso do imposto pago e de juros indemnizatórios e

d.            Condenar a Requerente nas custas.

 

V. Valor do processo

 

Fixa-se o valor do processo em €106 038,70  (cento e seis mil e trinta e oito euros e setenta  cêntimos), nos termos do disposto no art.º 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi art.º 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e art.º 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

VI. Custas

 

Custas no montante de €3 060,00 (três mil e sessenta euros) a cargo da Requerente conforme decidido supra (cfr. Tabela I, do RCPAT e artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, do RJAT).

 

Lisboa, 20 de outubro de 2020

 

O Tribunal Arbitral,

 

José Poças Falcão

(Presidente)

 

Ana Teixeira de Sousa

(árbitro vogal)

 

Francisco Nicolau Domingos

(árbitro vogal)