Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 611/2020-T
Data da decisão: 2021-08-17  IVA  
Valor do pedido: € 175.548,82
Tema: IVA – Localização das operações. Estabelecimento estável.
Versão em PDF

 

DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

 

                Os árbitros Dr. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelo Conselho Deontológico do CAAD), Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma e Dr. António de Barros Lima Guerreiro, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 31-05-2021, acordam no seguinte:

            

                1. Relatório

 

                A..., titular do número de identificação fiscal..., residente na ... n.º ..., ...-... Cascais,

                B..., titular do número de identificação fiscal ... residente na Rua ... n.º..., ..., ...-... Alcabideche, e

                C..., titular do número de identificação fiscal..., residente na Rua ..., n.º ..., ...+, ..., ...-... Cascais,

(doravante designados conjuntamente como “Requerentes”) vieram, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral. tendo em vista a declaração de ilegalidade e anulação das seguintes liquidações de IVA e juros compensatórios, relativas aos anos de 2014 e 2015:

REQUERENTE A...:

– liquidações de IVA n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018... e n.º 2018..., e respectivas liquidações de juros compensatórios e moratórios n.ºs 2018... a 2018..., n.ºs 2018... a 2018..., n.º 2018..., n.º 2018... e n.ºs 2018... a 2018...;

 

REQUERENTE B...

                – liquidações de IVA n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018... e n.º 2018..., e respectivas liquidações de juros compensatórios e moratórios n.º 2018... a 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018... e n.º 2018...;

 

REQUERENTE C...

– liquidações de IVA n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018..., n.º 2018... e n.º 2018..., liquidações dos respectivos juros compensatórios e moratórios n.ºs 2018... a 2018..., n.ºs 2018... a 2018..., n.º 2018... e n.º 2018..., e demonstrações de acerto de contas n.ºs 2018... a 2018 ... e n.ºs 2018... a 2018... .

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 10-11-2020.

Os signatários comunicaram a aceitação do exercício das funções no prazo aplicável.

Em 11-05-2021, as Partes foram notificadas da designação dos árbitros, não tendo manifestado vontade de recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 31-05-2021.

A AT apresentou resposta, em que afirmou que «a posição dos serviços competentes em relação ao pedido foi inconclusiva, pelo que se oferece, sem mais, em obediência aos princípios da economia e da celeridade processuais, o merecimento dos autos, remetendo-se a presente contestação para o teor do descrito no âmbito do procedimento administrativo».

Por despacho de 09-06-2021, foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT e é competente.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

A)           Em 28 de Janeiro de 2011, a D... LIMITED (doravante D...) incorporou a E... SA (doravante E...) como uma subsidiária sua, para criar e desenvolver em Portugal 87 health clubs dentro do conceito low cost (relatórios das inspecções tributárias que constam dos documentos n.ºs 66 a 68 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

B)           A D... obteve e negociou o financiamento bancário inicial para o negócio com o F... e, com a finalidade de providenciar apoio financeiro adicional para o desenvolvimento do negócio, vendeu à G... SGPS, SA, acções representativas de 5o% do capital social da E... (relatórios das inspecções tributárias e contrato que consta do anexo IV da inspecção ao Requerente A...);

C)           A D... entrou num acordo de accionistas com a G... SGPS, SA relativo à F..., nos termos do qual, a D... forneceria à E... serviços de assessoria e de controlo relacionados com o negócio (criação e desenvolvimento em Portugal de 87 Health Clubs), em particular, no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos Health Clubs (contrato referido);

D)           Os Requerentes são pessoas singulares que se dedicam à prestação de serviços de consultoria (Código 1320 da tabela de atividades do IRS) (Relatórios das Inspecções Tributárias que constam dos documentos n.ºs 66, 67 e 68);

E)            Em Maio de 2011, os Requerentes celebraram um contrato de prestação de serviços com a sociedade D... (documento n.º 69 junto com o pedido de pronúncia arbitral e que consta dos processos administrativos, cujo teor se dá como reproduzido);

F)            Através deste contrato de prestação de serviços, os Requerentes obrigaram-se

perante a D... a prestar serviços de assessoria e de consultoria na gestão da então designada E...;

G)           A E... alterou a sua designação para H..., S.A. (adiante designada simplesmente H...) (certidão permanente que consta dos Relatórios das Inspecções Tributárias);

H)           Quando foi celebrado o contrato de prestação de serviços pelos Requerentes, a E... (actual H...) era uma pessoa colectiva portuguesa detida em 50% pela D... e em 50% pela G..., S.G.P.S., S.A. (página 5 do contrato);

I)             A E... (actual H...) dedicava-se à concepção, ao desenvolvimento, à exploração, à gestão e à manutenção de health clubs, clubes de fitness, ginásios e bem-estar físico, e, bem assim, à prestação de serviços e consultas de nutrição (certidão Permanente citada nos Relatórios das Inspecções Tributárias);

J)            A E... tinha personalidade jurídica, capital próprio e uma administração própria (certidões permanentes que constam dos processos administrativos);

K)           A contratação dos Requerentes por parte da D... LIMITED visou dar cumprimento ao compromisso que esta empresa tinha assumido (i) num acordo parassocial celebrado com a G..., S.G.P.S., S.A.; e (ii) num contrato de prestação de serviços celebrado diretamente com a própria E... (actual H...) de assegurar – directamente ou através de terceiros qualificados para o efeito –serviços de assessoria e de consultoria (documentos n.ºs 69 e 70 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos)

L)            Nos anos de 2014 e de 2015:

(i) O REQUERENTE A... recebeu honorários no valor global de € 259.000,00 (duzentos e cinquenta e nove mil euros) em contrapartida dos serviços adquiridos e pagos pela D... LIMITED no âmbito do contrato acima descrito (páginas 7 e 15 do Documento n.º 66);

(ii) o REQUERENTE B... recebeu honorários no valor global de € 266.000,00 (duzentos e sessenta e seis mil euros) em contrapartida dos serviços adquiridos e pagos pela D... LIMITED no âmbito do mesmo contrato (página 7 do Documento n.º 67); e

(iii) O REQUERENTE C... recebeu honorários no valor global de € 161.131,00 (cento e sessenta e um mil cento e trinta e um euros) em contrapartida dos serviços adquiridos e pagos pela D... LIMITED no âmbito daquele contrato (página 12 do Documento n.º 68);

M)          A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção cada um dos Requerentes, em que elaborou os Relatórios que constam dos documentos n.ºs 66, 67 e 68, cujos teores se dão como reproduzidos, em que se refere, além do mais o seguinte: (   )

Da análise efetuada ao contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre a Entidade D..., com sede em Malta e a E... SA (Empresa Portuguesa), resulta segundo as suas diversas alíneas dos "Considerandos" que:

A) A D... é uma empresa com know-how no desenvolvimento, manutenção e gestão de Health Clubs;

B) Em 28 de Janeiro de 2011, a D... LIMITED incorporou a E... SA como uma subsidiária sua para criar e desenvolver em Portugal 87 health clubs dentro do conceito low cost;

C) A D... obteve e negociou o financiamento bancário Inicial para o negócio com o F...:

D) Que, sem prejuízo do disposto na alínea c) acima, com a finalidade de providenciar apoio financeiro adicional para o desenvolvimento do negócio, a D... vendeu à G... SGPS, SA, ações representativas de 5o% do capital social da E... e a D... e a G... SGPS, SA entraram num acordo de acionistas relativo à E...;

E) Nos termos do acordo de acionistas, a D... fornecerá à E... serviços de assessoria e de controlo relacionados com o negócio (criação e desenvolvimento em Portugal de 87 Health Clubs), em particular, no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos Health Clubs.

Sendo que de acordo com a análise ao contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre a D... LIMITED, o s.p. e os outros dois contribuintes (B..., NIF ... e C..., NIF...) resulta que estes contribuintes foram contratados pela Sociedade Maltesa para prestar e/ou fornecer os serviços que esta Entidade se tinha comprometido efetuar à E..., no contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre estas Empresas.

Ou seja, de fornecer e/ou de prestar serviços de assessoria e de controlo relacionados com a criação e desenvolvimento em Portugal de 87 health clubs, em particular no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos referidos health clubs.

O que no caso concreto do sujeito passivo correspondiam à prestação de serviços de consultoria relacionados com a atividade operacional, de vendas e marketing dos mencionados health clubs (...)

 

III.2.ENQUADRAMENTO JURÍDICO

A cobrança do IVA na União Europeia é regulada através da Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (designada de Diretiva IVA), sendo que os artigos 43º e seguintes contêm disposições relativas ao lugar das prestações de serviços, de acordo com os quais se determina em que Estado - Membro uma prestação de serviços está sujeita ao IVA.

Com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2010, as referidas disposições foram objecto de uma profunda reforma pela Diretiva 2008/8/CE, do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, que contém a seguinte declaração no primeiro período do terceiro considerando: «Relativamente a todas as prestações de serviços, o lugar de tributação deverá, em princípio, ser o lugar onde ocorre o seu consumo efectivo».

Por conseguinte, o artigo 44º da Diretiva IVA (com as alterações introduzidas pela Diretiva 2008/8/CE) contém atualmente a seguinte regra geral referente à determinação do lugar em que se considera efetuada uma prestação de serviços, cujo destinatário é um sujeito passivo:

« O lugar das prestações de serviços efetuadas a um sujeito passivo agindo nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sede da sua atividade económica. Todavia, se esses serviços forem prestados a um estabelecimento estável do sujeito passivo situado num lugar diferente daquele onde este tem a sede da sua atividade económica, o lugar das prestações de serviços é o lugar onde está situado o estabelecimento estável (...)».

Em face do que dispõe o art.º 44º da Diretiva 2006/112/CE, na redacção dada pela Diretiva 2008/8/CE, resulta que o lugar das prestações de serviços efetuadas a um sujeito passivo se determina de acordo com o lugar onde esse sujeito passivo tem a sua sede ou um estabelecimento estável. Isto é, se os serviços prestados pelo s.p. foram recebidos/consumidos no lugar onde o s p. destinatário dos mesmos tem a sede da sua atividade, considera-se que as prestações de serviços se localizam no lugar onde este s.p, tem a sua sede; no caso dos serviços prestados pelo s.p. terem sido recebidos/consumidos no lugar em que o s.p. destinatário dos mesmos tem um estabelecimento estável, então, considera-se que as prestações de serviços se localizam no lugar no qual se situa o seu estabelecimento estável.

Relativamente à obrigação de pagamento do imposto sobre o valor acrescentado foi estabelecido no artigo 193º da Diretiva IVA, a regra geral, segundo a qual: « O IVA é devido por sujeitos passivos que efetuem (...) prestações de serviços, com exceção dos casos em que o imposto é devido por outra pessoa nos termos dos artigos 194º a 199º e 202º».

Por sua vez, o artigo 196º da Diretiva IVA, na redação que lhe foi dada pela Diretiva 2008/8/CE, estabelece uma exceção à regra geral estabelecida no artigo 193º da Diretiva IVA, caso o lugar da prestação de serviços se determine de acordo com o art.º 44º da Diretiva IVA, na redação que lhe foi dada pela Diretiva 2008/8/CE, uma vez que determina que: « O IVA é devido pelos sujeitos passivos (...) a quem são prestados os serviços a que se refere o artigo 44º. se os serviços forem prestados por sujeitos passivos não estabelecidos no território desse Estado-Membro ».

Assim, resultando o seguinte: Se os serviços que foram prestados pelo s.p. foram recebidos e consumidos pela Entidade que tem a sua sede em Malta (D... LIMITED, é a esta Entidade que compete liquidar em Malta, o IVA das prestações de serviços que foram realizadas pelo s.p., nos termos dos artigos 44º, 1ª parte e 195º, da Diretiva IVA, na redação dada pela Diretiva 2008/8/CE; Se, pelo contrário, considerarmos que quem recebeu e consumiu as prestações de serviços que foram efetuadas pelo s.p., foi o estabelecimento estável em Portugal (E...) do s.p. com sede em Malta (D... LIMITED), então é ao s.p. prestador de serviços que compete liquidar o IVA das prestações de serviços por si efetuadas, nos termos da 2a parte do artigo 44º, da Diretiva IVA (na redação que lhe foi dada pela Diretiva 2008/8/CE) e do disposto no artigo 193º, da Diretiva IVA

Sendo de mencionar que as alterações introduzidas na Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, pelo artigo 2º da Diretiva 2008/8/CE. do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, ao serem transpostas para a ordem Jurídica Interna portuguesa, pelo Dec. - lei n.º 186/2009, de 12 de Agosto, vigoram na ordem jurídica portuguesa, nos termos do artigo 9.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa,

Assim, uma vez que é a resposta à questão de saber se a sociedade Maltesa dispõe em Portugal de um estabelecimento estável ou não que vai determinar se é o Estado Português ou Estado Maltês quem tem o poder de tributar em sede de IVA, as operações ativas que foram efetuadas pelo s.p., iremos apreciar essa questão.

Relativamente à definição do conceito de estabelecimento estável na aceção da 2ª parte do artigo 44º da Diretiva IVA, (na redacção introduzida pela Diretiva 2008/8/CE) o legislador da União Europeia deu uma resposta clara a esta questão, uma vez que o Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011, do Conselho, de 15 de Março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112/CE, relativa ao sistema comum do Imposto sobre o valor acrescentado, definiu no seu artigo 11º, nº 1, que para a aplicação do artigo 44º da Diretiva 2006/112/CE, se entende por « "estabelecimento estável" qualquer estabelecimento diferente da sede da actividade económica a que se refere o artigo 10º do referido Regulamento, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento ».

Assim sendo, pode-se, em moldes sintéticos, decompor o conceito de "estabelecimento estável", nos seguintes pressupostos tipológicos - normativos cumulativos:

• Um estabelecimento diferente da "sede da atividade económica";

• Com um grau suficiente de permanência;

• Com uma estrutura adequada, em termos de: l) recursos humanos e H) recursos técnicos;

• Devendo, estes recursos, permitir-lhe receber e utilizar os serviços que lhe são prestados.

Em face do exposto, deve, portanto, analisar-se se os elementos de facto recolhidos são suficientes para se poder considerar que a Sociedade com sede em Malta – D... LIMITED - tem, como estabelecimento estável no Território Português, a Entidade E... S.A. e, em caso afirmativo, determinar se os serviços realizados pelo s.p. foram recebidos, consumidos e utilizados pelo estabelecimento estável.

Tendo em conta que nos "considerandos" do contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre a empresa D... LIMITED e a E... SA, consta que a Empresa com sede em Malta, na data de 28-01-2011, incorporou a E... como uma subsidiária para criar e desenvolver em Portugal 87 Health Clubs dentro do conceito de Premium Low Cost.

E que na consulta que foi efetuada à Certidão Permanente da entidade E..., SA, com o NIPC ... (a que atualmente corresponde a denominação/firma de H..., SA) se verifica que esta tem como objeto social (atividade) a concepção, desenvolvimento, exploração, gestão e manutenção de health clubs, clubes de fitness, ginásios e espaços de bem-estar físico; comércio de produtos e serviços nas áreas de fitness e bem-estar físico; e a prestação de serviços e consultas de nutrição (Cfr. ANEXO VI -Fls. 1 a Fls. 14).

Assim como se constata através do site da H... S.A

 (www... pt/clubes/todos) que esta entidade tem aumentado em Portugal o n.º de Health Clubs/Ginásios criados dado que desde 2011 até 2017 já criou e/ou desenvolveu cerca de 27 Health Clubs/ginásios (o que é revelador do grau de permanência com que a referida entidade se encontra estabelecida em Portugal).- Cfr. ANEXO x, Fls. 1 a Fls. 29).

Para além de que demonstra ter uma estrutura adequada em termos de recursos humanos e técnicos com vista à implementação em Portugal dos referidos Health Clubs, já que de acordo com a consulta que foi à efetuada à Declaração Mod. 10, a que se refere o artigo 119º, n.º 1, alínea c), subalínea ii), do CIRS -Declaração anual de comunicação dos rendimentos que foram pagos ou colocados à disposição e respectivas retenções de Imposto -, se verifica que por esta Entidade foram declarados os seguintes n.º de trabalhadores dependentes e/ou independentes a quem tem efetuado o pagamento de retribuições e/ou de honorários:

 

Assim, tendo em atenção que os serviços de assessoria que foram efetuados pelo s.p., também se destinaram ou foram consumidos não pelo sujeito passivo com sede em Malta (D... LIMITED), mas sim pelo seu estabelecimento estável sito em Portugal (E.../H...), já que foi este quem os recebeu e os utilizou para as suas necessidades próprias, ou seja, para o seu negócio de criar e desenvolver em Portugal Health Clubs.

Considera-se que a Entidade E...S.A/H... SA constitui em Portugal um estabelecimento estável da Empresa denominada de D... LIMITED, que tem sede em Malta, nos termos do artigo 44º, 2ª parte, da Diretiva IVA (na redacção dada pela Diretiva 2008/8/CE) e dos artigos 11º, n.º 1 e 22º, n.º 1, do Regulamento de Execução (UE) n.º 232/2011, do Conselho de 15 de Março de 2011.

Concluindo-se, assim, que era ao s.p, que cabia a obrigação legal de proceder à liquidação do Imposto sobre o valor acrescentado nas prestações de serviços de consultoria que efetuou à entidade denominada de H... SA, sendo que a taxa de imposto a aplicar às prestações de serviços efectuadas pelo s.p. é a taxa de 23%, conforme prevê o artigo 18º, n.º 1, alínea c), do Código do IVA.

Por outro lado, tendo em consideração que o s.p. na data de 2014.10.23, também passou a exercer a atividade com o CAE Secundário 55201 - ALOJAMENTO MOBILADO PARA TURISTAS - e que no exercício dessa atividade emitiu, nos anos de 2014 e de 2015, diversas Faturas - Recibos quer no regime de isenção do art.º 53º do CIVA (ou seja sem liquidar IVA) quer liquidando indevidamente IVA e restituindo o mesmo ao Estado, iremos determinar o imposto em falta, mediante a aplicação da taxa reduzida de IVA de 6%, as prestações de serviços de alojamento que constam nas Faturas - Recibos referentes, quer ao ano de 2014 (Faturas-Recibo n.ºs 56. 57, 58 e 59), quer ao ano de 2015 (Faturas-Recibo n.ºs 75, 76,77 e 78), conforme se encontra previsto nas disposições conjugadas da alínea a), do n.º 8, do artigo 6º, da alínea a), do n.º 1, do artigo 18º e do ponto 2.17, da Lista l anexa ao Código do IVA, que faz parte integrante do mesmo código.

(...)

IX- DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO

(...)

IX.3 - POSIÇÃO DA AT

Salvo o devido respeito por opinião/posição contrária à da AT, não assiste razão ao exponente/s.p. quando defende que não existe nenhum fundamento legal que justifique a proposta de correções aritméticas que foi efectuada relativamente aos serviços que foram prestados pelo exponente nos anos de 2014 e de 2015.

Senão vejamos.

Da análise da presente situação, o que temos em termos factuais, e o seguinte: Por um lado, temos uma sociedade que foi constituída e registada no território de Malta, designada de D... LIMITED, que embora se desconheça o seu objeto social, é referido no contrato que foi celebrado com a E... SA que é uma empresa com Know how na área do desenvolvimento, manutenção e gestão de Health Clubs, e, por outro lado, temos uma empresa constituída e registada em Portugal, denominada de E... S.A. (e mais tarde denominada de H... SA), cuja constituição foi objeto de registo comercial na data de 28-01-2011 (Cfr. Insc. 1 da Certidão permanente da E... S.A/H..., S.A) e que tem como objeto social a concepção, desenvolvimento, exploração, gestão e manutenção de health dubs, clubes de fitness, ginásios e espaços de bem-estar físico; comércio de produtos e serviços nas áreas de fitness e bem-estar físico; e a prestação de serviços e consultas de nutrição.

Sendo que, na data de 28 de Janeiro de 2011 (data do registo da constituição da Sociedade E..., SA.), a D...LIMITED incorporou a referida sociedade portuguesa como uma subsidiária sua com vista a criar e desenvolver em Portugal 87 Health Clubs, dentro do conceito de "Premmium low-cost".

Tendo em consideração o Know how que a D... possuía/possui na área do desenvolvimento, manutenção e gestão de Health Clubs foi celebrado com a E... S.A. um contrato de prestação de serviços (Service Agreement): nos termos do qual a sociedade de Malta se obrigou a prestar à sua subsidiária ou sociedade Portuguesa E... S.A, os serviços de assessoria e consultoria necessários ao fim para o qual a sociedade Portuguesa foi constituída e incorporada na D... LIMITED como uma subsidiária sua, ou seja, a construção e abertura em território Português de ginásios/health clubs.

Sendo que o âmbito dos serviços a prestar pela sociedade de Malta à sociedade Portuguesa engloba os serviços de assessoria e consultoria desde o momento prévio à construção e implementação dos ginásios, passando por todo o processo de concepção do conceito "ginásios premmium low cost", vendas, marketing, formação de pessoal, decisões estratégicas e gestão corrente do negócio, conforme melhor consta do contrato designado de "Service Agreement", que foi celebrado entre as partes no dia 3 de Maio de 2011,

Ainda nos termos do mencionado contrato, foi estipulado entre as partes que a sociedade D... poderia subcontratar os serviços que se obrigou a prestar à sociedade Portuguesa a terceiros independentes que possuíssem os conhecimentos e skills necessários à prestação de tais serviços.

Tendo sido nesse sentido que foi celebrado entre a Sociedade de Malta e o exponente/inspeccionado um contrato de prestação de serviços, nos termos do qual este se obrigou a prestar à sociedade Portuguesa os serviços que a sociedade de Malta se havia inicialmente obrigado a prestar para com a sua subsidiária Portuguesa.

Ora, tendo em consideração que a Diretiva 2008/8/CE, do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, que alterou a Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, no que diz respeito ao lugar das prestações de serviços, passou a dispor no seu artigo 44º que: O lugar das prestações de serviços efectuadas a um sujeito passivo agindo nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sede da sua actividade económica, mas que, se esses serviços forem prestados a um estabelecimento estável do sujeito passivo situado num lugar diferente daquele onde tem a sede da sua actividade económica, o lugar das prestações desses serviços é o lugar onde está situado o estabelecimento estável (...)".

E que por sua vez, o Regulamento de Execução (EU) n.º 282/2011, do Conselho, de 15 de Março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112/CE, relativa ao Sistema Comum do Imposto sobre o valor acrescentado, veio regulamentar, através do seu art.º 11º, n.º 1, que, para efeitos de aplicação do artigo 44º da Diretiva 2006/112/CE, se entende por «estabelecimento estável»; "(...) qualquer estabelecimento, diferente da sede da actividade económica a que se refere o artigo 10º do presente regulamento, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada em (ermos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento".

Ou seja, que das disposições legais supra citadas, resulta que, relativamente a todas as prestações de serviços, o lugar de tributação deverá, em princípio, ser o lugar onde ocorre o seu consumo efectivo, como consta do ponto (3) dos considerandos da Diretiva 2008/8/CE, do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008.

Consideramos que o lugar de tributação das prestações de serviços que foram efectuadas pelo exponente/inspeccionado à sociedade Portuguesa (em cumprimento do contrato celebrado entre a sociedade Maltesa e a empresa Portuguesa) ocorreu não em Malta, mas em Portugal,

Dado que foi no território Português que ocorreu o consumo efectivo das prestações de serviços de assessoria e de consultoria que foram efectuadas pelo exponente à referida entidade portuguesa e que eram necessárias à construção e abertura ao público dos ginásios/health clubs em Portugal.

Em relação à argumentação apresentada pelo exponente de que resulta evidente que a sociedade Portuguesa enquanto adquirente dos serviços, nunca poderia constituir um estabelecimento estável em Portugal da sociedade de Malta, já que a ser assim, tal quereria dizer que a sociedade Portuguesa seria ao mesmo tempo adquirente e prestadora dos serviços em análise, há que referir o seguinte:

Entende-se por "estabelecimento estável" para efeitos da aplicação das regras relativas ao lugar das prestações de serviços efectuadas a um sujeito passivo, qualquer estabelecimento, diferente da sede da actividade económica, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento.

Ou seja, de acordo com a definição de "estabelecimento estável" que nos é dada pelo artigo 11º, do Regulamento de Execução (EU) n.º 282/2011, do Conselho, de 15 de Março de 2011, basta, em princípio, determinar, que existe um qualquer estabelecimento diferente da sede da actividade económica, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento, para, de imediato se dever constatar a existência de um "estabelecimento estável" para todo e qualquer efeito legal no que concerne ao IVA (isto é, todo e qualquer estabelecimento estável que cumpra os requisitos do art.º 11º, n.º 1, do mencionado Regulamento, passa a dever ser sempre considerado, e/ou perspectivado como sendo utilizado, simultaneamente, para efeitos de aquisição e de prestação de serviços, nos termos do artigos 44º e 45º da Diretiva 2006/H2/CE, na redação dada pela Diretiva 2008/8/CE. do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008.

Não sendo objetivamente necessário, face ao conceito de estabelecimento estável adoptado em sede de IVA, que os meios humanos afetos à actividade do estabelecimento estável/H... S.A. (exploração e desenvolvimento da actividade de ginásios), tenham que ser os mesmos que estão afectos à actividade de consultoria desenvolvida pela Sociedade de Malta, dado que, os estabelecimentos estáveis constituem normalmente realidades patrimoniais ou centros de interesses autónomos, susceptíveis de per si ser objeto de relações jurídicas tributárias.

Podendo os estabelecimentos estáveis situados em diferentes Estados - membros constituir sujeitos passivos de IVA diferenciados e dotados de personalidade tributária própria e distinta, no exercício das respectivas actividades.

Sendo que para aferir da existência de uma relação jurídica entre uma sociedade não residente e o estabelecimento estável, a fim de sujeitar a IVA as prestações de serviços fornecidas, há que verificar se o estabelecimento estável realiza uma atividade económica independente, designadamente se pode ser considerado autónomo por suportar o risco que decorre da sua actividade.

O que na presente situação se verifica já que a actividade económica exercida pela empresa Portuguesa (de exploração e desenvolvimento da actividade de ginásios) é independente da actividade exercida pela empresa sede situada em Malta que é, a fazer fé no que foi referido pelo exponente, a de prestação de serviços de consultoria na área da gestão e promoção de health clubs.

Pelo que, não é a circunstância das referidas empresas exercerem actividades diferentes, embora integradas no mesmo sector de actividade (gestão e promoção de health clubs/ginásios), que impede que a sociedade Portuguesa possa constituir um estabelecimento estável em Portugal da Sociedade com sede em Malta.

Relativamente ao alegado no art.º 25º do direito de audição, parece-nos que o exponente incorre em confusão, já que o que está em causa não são as prestações de serviços da sociedade de Malta para com a sociedade estabelecida em Portugal mas sim as prestações de serviços que foram efectuadas por terceiros independentes (que são sujeitos passivos) e que foram consumidas e/ou que tiveram como destinatário uma empresa ou um estabelecimento que se encontra localizado no território nacional.

Assim, face ao exposto, considera-se que os argumentos invocados em sede de direito de audição não vêm alterar as conclusões do Projecto de Relatório.

 

 

N)           Na sequência das inspecções os Requerentes foram notificados das seguintes liquidações de IVA e juros compensatórios, na parte em que são contestadas no presente processo:

 

 

(documentos n.ºs 4 a 6 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

O)           O Requerente C... ainda foi notificado das demonstrações de acerto de contas n.ºs 2018... a 2018... e n.ºs 2018... a 2018..., que se limitam a reproduzir o conteúdo das liquidações oficiosas, sem nada acrescentar (Documentos n.ºs 52 a 65 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

P)           Os Requerentes pagaram as quantias liquidadas (artigo 19.º do pedido de pronúncia arbitral, não questionado);

Q)           Os Requerentes apresentaram reclamações graciosas das liquidações (documentos n.ºs 71 a 73 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

R)           As reclamações graciosas referidas foram indeferidas, nos termos que constam dos documentos n.ºs 74 a 76 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;

S)            Os Requerentes apresentaram recursos hierárquicos das decisões de indeferimento das reclamações graciosas (documentos n.ºs 77 a 79 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

T)            Os recursos hierárquicos foram indeferidos nos termos dos documentos n.ºs 1 a 3 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, cujos teores se dão como reproduzidos;

U)           Em 08-11-2020, os Requerentes apresentaram o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pelas Requerentes e os que constam do processo administrativo.

Não há outros factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.

Quanto aos pagamentos das quantias liquidadas, embora não tenham sido juntos documentos comprovativos, consideram-se provados por a Autoridade Tributária e Aduaneira não ter questionado as afirmações dos Requerentes de que efectuaram os pagamentos que fizeram no presente processo e nas reclamações graciosas, indicando como prova «informação constante do sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira» (páginas 6 e 7 das reclamações graciosas), o que basta para considerar provado os factos alegados, na falta de contraprova, em face do preceituado no artigo 74.º, n.º 2, da LGT.

 

 

3. Matéria de direito

 

                A situação fáctica é resumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira nos Relatórios das Inspecções Tributárias nos seguintes termos:

A) A D...  é uma empresa com know-how no desenvolvimento, manutenção e gestão de Health Clubs;

B) Em 28 de Janeiro de 2011, a D... LIMITED incorporou a E... SA como uma subsidiária sua para criar e desenvolver em Portugal 87 health clubs dentro do conceito low cost;

C) A D... obteve e negociou o financiamento bancário Inicial para o negócio com o F...:

D) Que, sem prejuízo do disposto na alínea c) acima, com a finalidade de providenciar apoio financeiro adicional para o desenvolvimento do negócio, a D... vendeu à G... SGPS, SA, ações representativas de 50% do capital social da E... e a D... e a G... SGPS, SA entraram num acordo de acionistas relativo à E...;

E) Nos termos do acordo de acionistas, a D... fornecerá à E... serviços de assessoria e de controlo relacionados com o negócio (criação e desenvolvimento em Portugal de 87 Health Clubs), em particular, no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos Health Clubs.

Sendo que de acordo com a análise ao contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre a D... LIMITED, o s.p. e os outros dois contribuintes (B..., NIF ... e C..., NIF...) resulta que estes contribuintes foram contratados pela Sociedade Maltesa para prestar e/ou fornecer os serviços que esta Entidade se tinha comprometido efetuar à E..., no contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre estas Empresas.

Ou seja, de fornecer e/ou de prestar serviços de assessoria e de controlo relacionados com a criação e desenvolvimento em Portugal de 87 health clubs, em particular no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos referidos health clubs.

O que no caso concreto do sujeito passivo correspondiam à prestação de serviços de consultoria relacionados com a atividade operacional, de vendas e marketing dos mencionados health clubs (...)

               

                Os Requerentes foram contratados pela D... LIMITED, para prestarem serviços de assessoria e controlo relativos à criação e desenvolvimento de 87 Health Clubs em Portugal, à E..., actualmente denominada H... .

                A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que os Requerentes deveriam liquidar IVA em Portugal relativamente à prestação de serviços que efectuaram nos anos de 2014 e 2015, no âmbito do contrato que celebraram com a D... .

                A fundamentação da posição da Autoridade Tributária e Aduaneira é a seguinte, em suma:

 

– «o art.º 44º da Diretiva 2006/112/CE, na redacção dada pela Diretiva 2008/8/CE, resulta que o lugar das prestações de serviços efetuadas a um sujeito passivo se determina de acordo com o lugar onde esse sujeito passivo tem a sua sede ou um estabelecimento estável. Isto é, se os serviços prestados pelo s.p. foram recebidos/consumidos no lugar onde o s p. destinatário dos mesmos tem a sede da sua atividade, considera-se que as prestações de serviços se localizam no lugar onde este s.p, tem a sua sede; no caso dos serviços prestados pelo s.p. terem sido recebidos/consumidos no lugar em que o s.p. destinatário dos mesmos tem um estabelecimento estável, então, considera-se que as prestações de serviços se localizam no lugar no qual se situa o seu estabelecimento estável»;

– «Relativamente à definição do conceito de estabelecimento estável na aceção da 2ª parte do artigo 44º da Diretiva IVA, (na redacção introduzida pela Diretiva 2008/8/CE) o legislador da União Europeia deu uma resposta clara a esta questão, uma vez que o Regulamento de Execução (LIE) n.º 282/2011, do Conselho, de 15 de Março de 2011, que estabelece medidas de aplicação da Diretiva 2006/112/CE, relativa ao sistema comum do Imposto sobre o valor acrescentado, definiu no seu artigo 11º, nº 1, que para a aplicação do artigo 44º da Diretiva 2006/112/CE, se entende por « "estabelecimento estável" qualquer estabelecimento diferente da sede da actividade económica a que se refere o artigo 10º do referido Regulamento, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento»;

– «como se constata através do site da H... SA (www...pt/clubes/todos) que esta entidade tem aumentado em Portugal o n.º de Health Clubs/Ginásios criados dado que desde 2011 até 2017 já criou e/ou desenvolveu cerca de 27 Health Clubs/ginásios (o que é revelador do grau de permanência com que a referida entidade se encontra estabelecida em Portugal)»;

– «para além de que demonstra ter uma estrutura adequada em termos de recursos humanos e técnicos com vista à implementação em Portugal dos referidos Health Clubs», tendo ao seu serviço, desde 2013, mais de duas centenas de trabalhadores independentes, designadamente, nos anos em causa, 283 em 2014 e 418 em 2015;

– «os serviços de assessoria que foram efetuados pelo s.p., também se destinaram ou foram consumidos não pelo sujeito passivo com sede em Malta (D... LIMITED), mas sim pelo seu estabelecimento estável sito em Portugal (E.../H...), já que foi este quem os recebeu e os utilizou para as suas necessidades próprias, ou seja, para o seu negócio de criar e desenvolver em Portugal Health Clubs».

                                              

                Os Requerentes defendem o seguinte, em geral:

 

– «os serviços prestados no âmbito do contrato que celebraram com a D... LIMITED não estão sujeitos a imposto em Portugal, uma vez que a sociedade adquirente (a sociedade perante a qual se obrigaram juridicamente e que lhes pagou os serviços prestados) é um sujeito passivo com a sua sede jurídica e a sua atividade económica e comercial noutro Estado-Membro da União Europeia, sem qualquer estabelecimento estável ou domicílio em Portugal»;

– «Se a H... tivesse efetivamente adquirido e pago aos REQUERENTES os serviços aqui em causa e estes fossem tributados em território português, os REQUERENTES teriam podido repercutir o imposto (e a H... tê-lo-ia podido deduzir), sem terem que interiorizar o esforço económico (que no IVA não deve incidir sobre os sujeitos passivos)»;

– «Consequentemente, as liquidações contestadas (i) forçam os REQUERENTES a suportar na sua esfera o imposto como se fosse o consumidor final dos seus próprios serviços; e (ii) garantem à Fazenda Pública uma receita absolutamente injustificada e alheia à cadeia de valor acrescentado»;

– «Desta forma, as correções promovidas pela DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA são ilegais, por violação do disposto no artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 55.º da Lei Geral Tributária»;

– «os atos de apuramento de juros compensatórios e de juros de mora também são ilegais, quer porque não houve qualquer atraso na entrega do imposto (falta aos juros 0 seu pressuposto objetivo), quer ainda porque padecem de ilegalidades próprias, violando o disposto no artigo 96.º do Código do IVA e nos artigos 35.º, 44.º e 77.º da Lei Geral Tributária».

 

                Em suma, os vícios que os Requerentes imputam às liquidações reportam-se à

– violação do regime de localização das operações em sede de IVA (artigos 34- a 68.º do pedido de pronúncia arbitral);

– violação dos princípios da actividade administrativa, designadamente da justiça e da prossecução do interesse público;

– ilegalidade da liquidação de juros;

 

 

                3.1. Âmbito do contencioso arbitral

 

                O processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa eliminar os efeitos produzidos por actos ilegais, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele], pelo que os actos têm de ser apreciados tal como foram praticados, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos. (   )

Assim, a fundamentação sucessiva ou a posteriori não é relevante para aferir a sua suficiência, quando não acompanhada de revogação e prática de um novo acto. (   ) Por isso, a fundamentação ou a remissão para documentos que a contenham têm de integrar-se no próprio acto e serem contemporâneas dele, não relevando para apreciação da validade formal do acto fundamentos invocados posteriormente.

Da mesma forma, os tribunais, num contencioso de anulação como é o contencioso tributário (art. 124.º do CPPT), têm apenas de apurar se o acto que foi praticado, tal como foi, enferma da ilegalidade ou ilegalidades que lhe são imputadas pelo impugnante.

O que, de resto, se compreende à luz dos direitos de defesa ínsitos no princípio constitucional da tutela judicial efectiva (arts. 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4 da CRP), pois, se a Autoridade Tributária e Aduaneira tivesse invocado outros fundamentos da liquidação, como, por exemplo, que existiria um imaginário colectivo formado pelos três Requerentes que constituiria, esse hipotético colectivo, um estabelecimento estável, a fundamentação da impugnação poderia ser diferente e as provas que o Sujeito Passivo a trazer ao processo poderiam ser diferentes.

Por isso, aquele direito à tutela judicial efectiva não permite que o Tribunal conheça de possíveis fundamentos dos actos impugnados que o sujeito passivo não teve oportunidade  de conhecer quando elaborou a sua impugnação e relativamente aos quais não teve oportunidade de utilizar todos os meios de defesa administrativos (reclamação graciosa, recurso hierárquico) e contenciosos (impugnação judicial o pedido de constituição do tribunal arbitral) que a lei prevê, nas condições em que a lei atribui esses direitos.

Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01-07-2020, processo n.º 309/14.6BEBRG), em que se entendeu que:

                I – O tribunal, na apreciação da legalidade de uma decisão administrativa, não pode considerar que esta se alicerça noutros fundamentos que não aqueles que aí foram externados.

                II – Assim, não pode julgar improcedente a impugnação judicial da decisão que indeferiu o pedido de revisão de um acto tributário alicerçando-se na não verificação de um requisito se a AT não usou esse fundamento para indeferir aquele pedido.

 

                3.2. Provas a considerar. «Quod non est in actis non est in mundo»

               

                As provas que podem ser valoradas para decisão da matéria de facto num processo arbitral são as que constam do processo, como se sintetiza no velho brocardo «quod non est in actis non est in mundo» e decorre do princípio do contraditório, que é corolário do princípio do direito a um processo equitativo, ínsito no direito constitucional à tutela judicial efectiva (artigos 20.º, n.ºs 1 e 4, e 268.º, n.º 4, da CRP).  

                Por isso, não podem ser tidos em consideração na decisão documentos que não foram apresentados pelas Partes, que não constam do processo administrativo e que sejam obtidos através de investigação de algum dos Árbitros, efectuada por diligências próprias, à margem do processo, sem submissão ao contraditório das Partes.

 

               

3.3. Questão da violação do regime de localização das operações em sede de IVA (artigos 34- a 68.º do pedido de pronúncia arbitral). Questão da existência de um estabelecimento estável

 

                A posição da Autoridade Tributária e Aduaneira tem como pressuposto essencial que o entendimento de que a «E... /H... constitui em Portugal um estabelecimento estável da empresa denominada de D... LIMITED».

                Os Requerentes defendem o seguinte, sobre esta questão:

 

– as regras de localização das prestações de serviços visam eliminar materialmente o risco de alocação artificial das operações a jurisdições com taxas de imposto mais baixas (com consequências para a neutralidade do imposto) e assegurar a eficiência e a justiça do sistema na distribuição de receitas entre os Estados-Membros;

– o artigo 44.º da Diretiva IVA «O lugar das prestações de serviços efetuadas a um sujeito passivo agindo nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sede da sua atividade económica»;

– o TJUE entendeu que «a tomada em consideração de outro estabelecimento só tem interesse no caso de essa sede não levar a uma solução racional ou criar um conflito com outro Estado-Membro» e que «a presunção de que as prestações de serviços são efetuadas no local em que o sujeito passivo destinatário estabeleceu a sede da sua atividade econômica permite evitar que tanto as autoridades competentes dos Estados-Membros como os prestadores de serviços efetuem investigações complicadas com vista à determinação do ponto de conexão»;

– «a tributação das operações entre sujeitos passivos deve, em princípio, ocorrer no Estado-Membro da sede económica do adquirente; e só nos casos em que essa regra levar a uma distorção injustificada do sistema no que respeita às taxas aplicadas ou à repartição de receita é que a mesma pode ser afastada»;

– «apenas pode afastar a aplicação do imposto no Estado-Membro da sede do adquirente nos casos em que os serviços são materialmente prestados a uma estrutura: (i) Que corresponda a uma extensão territorial do adquirente (uma estrutura integrada na empresa do aquirente e que prossiga a atividade desta empresa noutro Estado); e (ii) Que esteja funcionalmente preparada a receber e utilizar aqueles serviços em seu próprio benefício»;

– «se os serviços materialmente aproveitados por estas sucursais fossem tributados no Estado-Membro onde a casa-mãe está registada, o sistema seria permeável à alocação artificial de operações em Estados-Membros onde a taxa de imposto é mais reduzida (o que afetaria a neutralidade do sistema) e não estaria assegurada a justa repartição da receita»;

– «inversamente, se o adquirente não tiver uma sucursal capaz de aproveitar os serviços em causa ou se, mesmo dispondo dessa estrutura, os serviços prestados por terceiros forem materialmente aproveitados pela casa-mãe, a operação tem forçosamente que ser tributada no local onde a casa-mãe tem a sua sede, sob pena de se verificarem exatamente os mesmos problemas de artificialidade e de desequilíbrio descritos»;

– «a H... não pode ser qualificada como uma mera extensão territorial D... LIMITED destinada a prosseguir a atividade desta última em Portugal», pois «já era, à data dos factos relevantes para a análise do presente pedido arbitral, uma entidade independente - uma sociedade (e não uma sucursal) detida em 50% por uma entidade não relacionada com a D... LIMITED»;

– «o critério essencial para distinguir sujeitos passivos de estabelecimentos estáveis é a independência jurídica e económica entre as entidades – se uma entidade assume o risco jurídico e económico da sua atividade, então não é uma mera extensão da outra, mas um sujeito passivo independente»;

– «apesar de ser parcialmente participada pela D... LIMITED, a H... é um sujeito passivo jurídica e economicamente independente, que assume por si o risco da sua própria atividade, sendo absurdo considerá-la uma extensão da D... LIMITED»;

– «a H... não desenvolve a mesma atividade que a D... LIMITED», pois «enquanto que a D... LIMITED se dedica à consultoria, oferecendo primordialmente serviços de apoio à gestão de sociedades operacionais, a H... dedica-se materialmente à exploração de health clubs»;

– «se a H... fosse uma mera extensão territorial da D... LIMITED, limitando-se a desenvolver em Portugal a atividade desta última, então estes contratos seriam absolutamente inúteis, por obrigarem uma empresa a prestar serviços de consultoria a si própria (em concreto, não se compreenderia que a G..., S.G.P.S., S.A. exigisse a formalização desta obrigação no acordo parassocial)»;

– «as prestações de serviços de consultoria acabaram por ser formal e materialmente imputadas à H... (que é um sujeito passivo com direito a deduzir o imposto, não tendo qualquer interesse em evitar a tributação), inexistindo, por isso, qualquer distorção económica ou jurídica a corrigir»;

– «a estrutura contratual aqui em apreço não teve como consequência material a não sujeição dos serviços de consultoria a tributação; e que (ii) Se a interpretação vertida no Relatório de Inspeção vingasse, a H... estaria potencialmente sujeita a pagar duas vezes IVA sobre a mesma operação económica, o que consubstancia uma violação do princípio da neutralidade e das regras de repartição da receita entre Estados»;

– «as correções feitas pela Administração Tributária padecem de erro sobre os respetivos pressupostos de facto e de direito, violando manifestamente o disposto no artigo 6.º do Código do IVA, no artigo 44.º da Diretiva IVA e no artigo 11.º do Regulamento de Execução, assim como o princípio da neutralidade, que traveja o regime do IVA, razão pela qual devem ser anuladas».

 

                No presente processo, a Autoridade Tributária e Aduaneira nada referiu sobre esta questão, remetendo para o decidido nas decisões administrativas.

                A E.../H... é uma entidade com personalidade jurídica própria, como se infere da certidão permanente junta aos autos (já tendo a designação de H... em 2014).

                Como se afirma nos Relatórios das Inspecções Tributárias, a E.../H... foi criada pela D..., com uma sociedade subsidiária, com personalidade jurídica, e não como uma sucursal ou agência desta, sem personalidade jurídica própria.

                Para além de a E.../H... não fazer parte da pessoa jurídica que é a D... e ter um capital próprio e uma administração própria, é também uma entidade que realiza uma actividade económica independente, diferente da que leva a cabo a D... MALTA, suportando sozinha o risco inerente à sua actividade.

                Na verdade, resulta da prova produzida que as duas empresas têm estatutariamente actividades perfeitamente distintas, embora dirigidas à mesma área de negócio.

                Com efeito, «a D... é uma empresa com know-how no desenvolvimento, manutenção e gestão de Health Clubs», dedicando-se à prestação de «serviços assessoria e de controlo relacionados com o negócio», «em particular, no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos Health Clubs» (Relatórios das Inspecções Tributárias).

                No que concerne à E.../H... dedica-se à «concepção, ao desenvolvimento, à exploração, à gestão e à manutenção de health clubs, clubes de fitness, ginásios e bem-estar físico, e, bem assim, à prestação de serviços e consultas de nutrição», como decorre do seu objecto social.

                Assim, não se enquadra no objecto social da E.../H... a prestação a outrem de serviços assessoria e de controlo relacionados com o negócio, que é a única actividade que se demonstra ter a D..., sendo a actividade da E.../H... a exploração material de Health Clubs, actividade a que não se dedica a  D... .

                As relações que se demonstram entre a H... e a D..., nos anos de 2014 e 2015, a que se reportam as liquidações impugnadas, são uma participação de 50% desta no capital e a prestação «serviços de assessoria e de controlo relacionados com o negócio (criação e desenvolvimento em Portugal de 87 Health Clubs), em particular, no que diz respeito às instalações, expansão, operações, vendas e marketing dos Health Clubs» (Relatórios das Inspecções Tributárias).

                No âmbito do IVA, para efeitos de localização da prestação de serviços e tributação em Portugal, nos termos do artigo 6.º, n.º 6, alínea a), do CIVA, os estabelecimentos estáveis são um meio através do qual a actividade económica um sujeito passivo não residente é totalmente ou parcialmente realizada em Portugal, território diferente daquele em que se situa a sede da sua actividade económica (   ), o que está de acordo com os artigos 44.º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, e 11.º do Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho de 15 de Março de 2011, que estabelecem o seguinte, no que aqui interessa:

Artigo 44.o

O lugar das prestações de serviços efectuadas a um sujeito passivo agindo nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sede da sua actividade económica. Todavia, se esses serviços forem prestados a um estabelecimento estável do sujeito passivo situado num lugar diferente daquele onde este tem a sede da sua actividade económica, o lugar das prestações desses serviços é o lugar onde está situado o estabelecimento estável. Na falta de sede ou de estabelecimento estável, o lugar das prestações dos serviços é o lugar onde o sujeito passivo destinatário tem domicílio ou residência habitual.

 

Artigo 11.º

1. Para a aplicação do artigo 44.º da Directiva 2006/112/CE, entende-se por «estabelecimento estável» qualquer estabelecimento, diferente da sede da actividade económica a que se refere o artigo 10.º do presente regulamento, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento.

 

                Como resulta do próprio texto daquele artigo 44.º, estabelece-se nele a regra de que «o lugar das prestações de serviços efectuadas a um sujeito passivo agindo nessa qualidade é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sede da sua actividade económica» e excepcionam-se as situações em que os serviços forem prestados a um estabelecimento estável do sujeito passivo.

                Mas, não se encontra neste artigo 44.º qualquer definição de estabelecimento estável, resultando dele apenas que esse estabelecimento tem de ser «do sujeito passivo», o que tem ínsito que o estabelecimento seja uma forma de extensão da actividade deste sujeito passivo num território diferente daquele em que se localiza a sua sede.

                O artigo 11.ºdo Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 fornece uma definição de estabelecimento estável, pressupondo que o estabelecimento realiza, em local diferente da sede da actividade económica do sujeito passivo de IVA, a actividade económica deste. Isto é, o sujeito passivo de IVA realiza a sua actividade não só através da sede, a que se refere o artigo 10.º do mesmo Regulamento, mas também noutro local, que pode ser considerado estabelecimento estável, se satisfizer os requisitos aí indicados.

                As sociedades subsidiárias não são consideradas, em princípio, estabelecimentos estáveis das sociedades-mãe, pois constituem entidades juridicamente independentes, só podendo constituir estabelecimentos estáveis quando, apesar da independência, actuarem efectivamente em representação da sociedade-mãe. (   )

                No caso em apreço, não foi demonstrado que a H... tenha actuado como representante da D..., desenvolvendo em Portugal qualquer actividade desta, designadamente de prestação a outrem de serviços de consultadoria e assessoria ou controlo relacionados com o negócio dos Health Clubs, que é a actividade a que a D... se dedica.

                Assim, conclui-se que a E.../H... e a D... são entidades juridicamente independentes, não assumindo aquela funções de representação desta, nem exercendo qualquer actividade desta, pelo que não há suporte para factual para considerar a E.../H... como um estabelecimento estável da D..., isto é, como uma extensão ou auxiliar da actividade desta para realizar em Portugal a sua actividade de consultadoria, assessoria e de controlo de Health Clubs.

                Assim, no caso em apreço, apesar de a E.../H... ter o «grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos», para poder ser um estabelecimento estável da D..., era necessário que aquela fosse um meio de que este sujeito passivo dispusesse para desenvolver a sua actividade fora do âmbito do território em que se situa a sua sede.

                Neste caso, isso não sucede, pelo que a E.../H... não era um estabelecimento estável da D... .

                Os Requerentes prestaram serviços à D... sujeito passivo de IVA que os adquiriu para prestar serviços de assessoria e de consultoria na gestão à E.../H..., que não era um estabelecimento estável daquela, pelo que que o lugar das prestações de serviços efetuadas pelos Requerentes à D... «é o lugar onde esse sujeito passivo tem a sede da sua actividade económica», por força do disposto no artigo 44.º da Directiva n.º 2006/112/CE.

                No entanto, uma vez que não há unanimidade dos Árbitros quanto a esta questão e a dúvida  poderia justificar reenvio prejudicial para o TJUE, com a consequente demora na decisão, justifica-se que se aprecie a questão da violação dos princípios da justiça e da prossecução do interesse público, também suscitada pelos Requerentes, que tem potencialidade para constituir vício autónomo de violação de lei e, a proceder, tornará irrelevante para a decisão da causa a solução da questão da qualificação ou não da E... como estabelecimento estável.

 

               

                3.4. Questão da violação dos princípios da actividade administrativa, designadamente da justiça e da prossecução do interesse público

 

                Os Requerentes defendem, em suma, o seguinte:

– «ainda que as prestações de serviços realizadas pelos REQUERENTES pudessem efetivamente qualificar-se como operações sujeitas a IVA em Portugal (...) o certo é que, ainda assim, as mesmas sempre seriam ilegais, por violação dos princípios da justiça e da prossecução do interesse público consagrados no artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 55.º da Lei Geral Tributária»;

– «a Administração Tributária não pode deixar de considerar o resultado material das suas correções, tendo O dever de assegurar que esse resultado não é materialmente injusto, designadamente por implicar uma arrecadação injustificada de receita ou por impossibilitar o exercício de direitos por parte dos sujeitos passivos»;

– «ao corrigir o imposto alegadamente devido pelos REQUERENTES, ficcionando que os serviços de consultoria haviam sido prestados por este a um sujeito passivo português que não contratou nem lhe pagou aqueles serviços (a H...) (...), a Administração Tributária não podia ter deixado de considerar que os  REQUERENTES não ficaram em condições de repercutir esse imposto no (suposto) adquirente dos bens, suportando-o, por isso, integralmente, como se fosse o consumidor final dos seus próprios serviços»;

– «se a H... tivesse efetivamente adquirido e pago aos REQUERENTES os serviços aqui em causa e estes fossem tributados em território português, os REQUERENTES teriam podido repercutir o imposto e a H... tê-lo-ia deduzido, sem que nenhuma destas entidades tivesse que interiorizar o esforço económico»;

– «todavia, como não foi a entidade portuguesa que contratou e que pagou os serviços dos REQUERENTES, estes não têm qualquer vínculo jurídico com a H... e não podem repercutir o IVA sobre esta entidade, que não o vai suportar nem deduzir»;

– «as correções aqui em apreço só seriam admissíveis se a Administração Tributária pudesse e tivesse implementado um procedimento que permitisse a repercussão e dedução do imposto agora liquidado sem violação do disposto nos artigos 22.º e 36.º do Código do IVA)»;

– «não sendo esse o caso, as liquidações contestadas (i) forçam os REQUERENTES a suportar na sua esfera o imposto como se fosse o consumidor final dos seus próprios serviços; e (ii) garantem à Fazenda Pública uma receita absolutamente injustificada e alheia à cadeia de valor acrescentado»;

– «confrontada com esta argumentação em sede de Reclamação Graciosa e de Recurso Hierárquico, a Administração Tributária nem sequer tentou afastá-la, certamente por não haver qualquer fundamento aceitável para o efeito».

 

                Como dizem os Requerentes, estas questões da violação dos princípios a justiça e da prossecução do interesse público foram suscitadas nas reclamações graciosas e nos recursos hierárquicos e a Autoridade Tributária e Aduaneira nada disse sobre a argumentação dos Requerentes.

                No presente processo, a Autoridade Tributária e Aduaneira também nada disse sobre esta matéria, limitando-se a remeter «para o teor do descrito no âmbito do procedimento administrativo».

               

                O artigo 266.º da CRP estabelece o seguinte:

 

1. A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.

 

O artigo 55.º da LGT estabelece o seguinte:

               

A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários.

 

                O princípio da justiça é um princípio básico que deve enformar toda a actividade da Administração Tributária, como resulta do preceituado nestes artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT.

                Embora estes princípios constitucionais tenham um domínio primacial de aplicação no que concerne aos actos praticados no exercício de poderes discricionários, introduzindo neste exercício aspectos vinculados cuja não observância é susceptível de constituir vício de violação de lei, a sua relevância não se esgota nos actos praticados no exercício desses poderes discricionários.

                Na verdade, por um lado, o texto do artigo 266.º da CRP não deixa entrever qualquer restrição à sua aplicação a qualquer tipo de actividade administrativa, pelo que, em princípio, dever-se-á fazer tal aplicação, se não se demonstrar a sua inviabilidade.

                Por outro lado, na aplicação da legalidade, tanto pela Administração como pelos tribunais, não pode ser encarada isoladamente cada norma que enquadra uma determinada actuação da Administração, antes terá de se atender à globalidade do sistema jurídico, com primazia para o direito constitucional, como impõe o princípio da unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica (art. 9.º, n.º 1, do Código Civil).

                Não se pode afirmar, que, nos casos de exercício de poderes vinculados, a obediência a uma determinada lei ordinária se sobrepõe aos princípios constitucionais referidos, pois estes princípios fazem também parte do bloco normativo aplicável, eles são também definidores da legalidade e, como normas constitucionais, são de aplicação prioritária em relação ao direito ordinário.

                Por isso, para definir a legalidade a que a Administração está vinculada, terão de se ter em conta todas essas normas e fazer uma ponderação e escolha entre elas caso a sua aplicação global, abstractamente compatível, se demonstre inviável em determinada situação concreta.

                Da observância concomitante dos princípios da legalidade e da justiça conclui-se que o dever de a Administração Tributária aplicar o princípio da legalidade não se traduz numa mera subordinação formal às normas que especificamente regulam determinadas situações, abrangendo também o dever de a Administração Tributária ter em conta as consequências da sua actividade e abster-se da aplicação estrita de normas quando delas decorra um resultado manifestamente injusto, repudiado pela Constituição.

                Isso está actualmente estabelecido de forma expressa no artigo 8.º do Código do Procedimento Administrativo de 2015 em que se preceitua que «a Administração Pública deve tratar de forma justa todos aqueles que com ela entrem em relação, e rejeitar as soluções manifestamente desrazoáveis ou incompatíveis com a ideia de Direito, nomeadamente em matéria de interpretação das normas jurídicas e das valorações próprias do exercício da função administrativa».

                A aplicação do princípio da justiça será de sobrepor a normas específicas reguladoras de determinadas situações primacialmente nos casos em que do seu incumprimento pelos contribuintes não tenha resultado prejuízo para o erário público e a falta de cumprimento não tenha sido concretizada intencionalmente com o objectivo de obter vantagens fiscais. (   )

                Em situações em que do incumprimento de normas fiscais não tenha resultado prejuízo para o erário público não se pode justificar que seja infligida ao contribuinte uma oneração fiscal que não lhe deveria seria aplicada sem esse incumprimento em nome de um respeito fetichista e acrítico pela observância da legalidade e à margem de qualquer perspectiva de prossecução do interesse público, que é o dever primacial a observar pela Administração Pública, como decorre do n.º 1 do artigo 266.º da CRP.

                O dever de a Administração Tributária orientar a sua actividade pela prossecução do interesse público (artigo 266.º, n.º 1, da CRP), reconduz-se, em IVA, a que os contribuintes paguem o que devem em função do seu consumo, o que não se compatibiliza com o aproveitamento pela Administração Tributária de hipotéticos erros ou omissões dos contribuintes para obtenção de receitas fiscais indevidas, com enriquecimento injustificado do erário público à custa da preterição de direitos dos contribuintes.

                No caso em apreço, está-se perante uma situação deste tipo.

                Na verdade, como dizem os Requerentes, sem qualquer contestação da Autoridade Tributária e Aduaneira, da omissão de emissão de facturas-recibo com liquidação de IVA em nome da E...– H...não resultou prejuízo para o erário público, pois, sendo esta uma entidade independente da D... LIMITED, o IVA que fosse por aqueles liquidado à E... era integralmente dedutível, à face da jurisprudência do TJUE do acórdão FCE Bank Plc, processo C-210/04, de 23-06-2006, mesmo que esta última, uma entidade juridicamente distinta, fosse um estabelecimento estável da primeira.

                Mas, não tendo a E...– H... tido qualquer intervenção nos procedimentos tributários instaurados pela Autoridade Tributária e Aduaneira aos Requerentes, não há fundamento para impor àquela as conclusões a que a Autoridade Tributária e Aduaneira chegou nos procedimentos de inspecção, designadamente quanto a hipotética obrigação de pagamento aos Requerentes do IVA que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que deveria ter liquidado por estes, pois os serviços foram prestados pelos Requerentes à D... LIMITED e foi esta que lhes pagou.

                Isto é, como dizem os Requerentes, não ficaram em condições de «repercutir esse imposto no (suposto) adquirente dos bens, suportando-o, por isso, integralmente, como se fosse o consumidor final dos seus próprios serviços».

                Assim, para além de se estar perante uma situação em que não há interesse público que justifique a exigência de IVA não liquidado, que era totalmente dedutível se tivesse sido liquidado pelos Requerentes à E...–H..., a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao exigi-lo a quem é prestador e não o adquirente dos serviços e não tem possibilidade de reaver as quantias exigidas, conduz que uma situação manifestamente injusta, por impor uma tributação a quem não tem o dever legal de suportar o encargo.

                A não exigência do imposto aos Requerentes resulta também do entendimento do TJUE, que, no acórdão de 07-05-2020, Dong Yang Electronics, processo n.º C-547/18, n.º 31, por evidentes considerações de justiça, decidiu que não pode exigir-se ao prestador de serviços que averigue as relações contratuais existentes entre uma sociedade-mãe e a sua filial, quando tais elementos não lhe são, em princípio, acessíveis.

                A exigência do IVA aos prestadores de serviços apenas poderia justificar-se, à face da jurisprudência do TJUE, se estes sabiam ou tinham a obrigação de saber que participavam numa operação envolvida numa fraude ao IVA (acórdãos de 22-10-2015, PPUH Stehcemp, C-277/14, n.º 48 e de 07-05-2020, Dong Yang Electronics, processo C-547/18, n.º 30).

                Mas, no caso em apreço, para além de não se vislumbrar qualquer fraude ou prejuízo derivado da omissão de liquidação de IVA pelos Requerentes à E...– H... (porque o IVA que fosse liquidado seria integralmente dedutível por esta), os Requerentes, que celebraram um contrato de prestação de serviços com a D... LIMITED, que foi quem lhes pagou os serviços prestados, não tinham obrigação de averiguar as relações contratuais existentes entre a D... LIMITED e a E...–H..., averiguação essa que não se provou que estivesse ao seu alcance.

                De resto, pelo que atrás se disse, se tivessem feito tal averiguação, os Requerentes poderiam ter chegado, de boa fé, à conclusão de que a E...– H... não era um estabelecimento estável da D... LIMITED e não tinham de liquidar IVA àquela relativamente a pagamentos que não lhes efectuou.

                Pelo exposto, as liquidações efectuadas, enfermam dos vícios de violação dos o princípios da justiça e da prossecução do interesse público e os Requerentes lhes imputam e que, só por si, justificam a sua anulação nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

                3.4.1. Conclusão

               

                Sendo de julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral com fundamento em violação dos princípios da justiça e da prossecução do interesse público, é inútil efectuar reenvio prejudicial sobre a questão da qualificação da E...– FITNESS CLUB como estabelecimento estável da D... LIMITED.

 

3.5. Liquidações de juros compensatórios e de mora

 

 

                As liquidações de juros compensatórios têm como pressupostos as respectivas liquidações de IVA, pelo que enfermam do mesmo vício, justificando-se também a sua anulação.

                Por outro lado, as liquidações de juros de mora têm como pressuposto as liquidações de juros compensatórios, como decorre das respectivas liquidações, pelo que também são afectadas pelo vício que afecta estas.

                No entanto, como os Requerentes imputam vícios autónomos às liquidações de juros compensatórios e de juros de mora, importa apreciá-los, inclusivamente porque as liquidações de IVA referentes ao Requerente A... não são impugnadas na sua totalidade, pois não impugna a correção de € 417,41 relativa à sua actividade secundária de alojamento mobilado para turistas (artigo 15.º do pedido de pronúncia arbitral) e, por isso, na parte respeitante a esta correcção, as liquidações de juros compensatórios e juros de mora não são afectadas pelo vício que afecta as restantes correcções.

 

                3.5.1. Liquidações de juros compensatórios

 

                Os Requerentes imputam às liquidações de juros compensatórios vícios autónomos por falta do requisito de culpa, que não é invocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

                O artigo 96.º, n.º 1, do CIVA estabelece que «sempre que, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação ou tenha sido recebido reembolso superior ao devido, acrescem ao montante do imposto juros compensatórios nos termos do artigo 35.º da lei geral tributária».

O artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária».

A responsabilidade objectiva é excepcional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (art. 483.º, n.º 2, do Código Civil) e, por isso, deverá entender-se que, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um «facto imputável ao sujeito passivo» quando puder formular-se um juízo de censura em relação à sua conduta.

Nesta linha, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender, uniformemente, que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte. (   )

Por outro lado, se é certo que, «quando uma determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito, deverá fazer-se decorrer do preenchimento da hipótese normativa, por ilação lógica, a existência de culpa, na forma pressuposta na previsão do tipo de ilícito respectivo» (   ), também o é que isso não sucede necessariamente, pois o contribuinte pode ter agido com a diligência normalmente exigível, o que exclui um juízo de censura ínsito na imputação de culpa.

No caso em apreço, para além de os Relatórios das Inspecções Tributárias e as liquidações de juros compensatórios omitirem qualquer referência a juros compensatórios e a culpa dos Requerentes constata-se mesmo que nas «Conclusões da Ação de Inspeção» dos três Relatórios das Inspecções Tributárias incluem-se um ponto I.1.3 relativo a «Montantes sujeitos a juros» em que não se indica qualquer valor.

Pelo exposto, não sendo imputada nem se demonstrando a culpa dos Requerentes, são ilegais as liquidações de juros compensatórios.

 

3.5.2. Juros de mora

 

                O artigo 96.º, n.º 2, do CIVA estabelece que «sempre que o imposto liquidado pelos serviços ou pelo sujeito passivo não seja pago até ao termo dos prazos legais estabelecidos, são devidos juros de mora nos termos do artigo 44.º da lei geral tributária».

                O artigo 44.º n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros de mora quando o sujeito passivo não pague o imposto devido no prazo legal».

                Os Requerentes imputam vícios às liquidações de juros de mora por não se ter verificado uma situação em que tenham deixado de pagar imposto no prazo legal.

                Na verdade, como dizem os Requerentes, o atraso na liquidação pode gerar juros compensatórios, mas não juros de mora que, como resulta do n.º 2 do artigo 96.º do CIVA, só são aplicáveis quando «o imposto liquidado pelos serviços ou pelo sujeito passivo não for pago no prazo legal».

                Neste caso, os Requerentes não liquidaram IVA, nem ele foi liquidado pelos serviços antes das liquidações impugnadas, pelo que não há fundamento para a inclusão de juros de mora nas liquidações.

                Assim, as liquidações de juros de mora enfermam de vícios de violação de lei, designadamente violação do artigo 96.º, n.º 2, do CIVA, que justificam a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

                4. Reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios

 

                Os Requerentes pagaram as quantias liquidadas e pedem os seu reembolso (com exclusão do imposto de € 417,41 liquidado ao Requerente A... que não foi contestado), com juros indemnizatórios.

                De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei».

                Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

                O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

                Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

                Como o pagamento de juros indemnizatórios depende de existir quantia a reembolsar, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar se há direito a reembolso e em que medida.

                Cumpre, assim, apreciar os pedidos de restituição da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios.

             

                4.1. Restituição de quantias pagas

 

                Procedendo o pedido de pronúncia arbitral, os Requerente têm direito, como consequência da anulação das liquidações, a ser reembolsados das quantias, que pagaram indevidamente, que são as seguintes:

 

                A) Requerente A...

                Pagou as liquidações de IVA n.º 2018 ... (€ 3.220,00), n.º 2018 ... (€ 4.714,00), n.º 2018 ... (€ 7.425,65), n.º 2018 ... (€ 12.650,00), n.º 2018 ... (€ 6.900,00), n.º 2018 ... (€ 8.740,00), n.º 2018 ... (€ 8.510,00) e n.º 2018 ... (€ 7.590,00), e respectivas liquidações de juros compensatórios n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 529,62), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 725,91), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 1.068,11), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 1.691,17), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 854,44), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 990,66), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 878,20) , n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de 706,22).

                No entanto, só impugna as liquidações de IVA no montante global de € 59.570,00 e as liquidações de juros compensatórios e juros de mora no montante global de € 7.444,33, o que perfaz € 67.014,33, pelo que é este o montante a reembolsar ao Requerente A... .

 

                B) Requerente B...

                Pagou as liquidações de IVA n.º 2018 ... (€ 3,266,00), n.º 2018... (€ 4,600,00), n.º 2018 ... (€ 6.670,00), n.º 2018 ... (€ 13.409,00), n.º 2018 ... (€ 7.820,00), n.º 2018 ... (€ 8.280,00), n.º 2018 ... (€ 6.900,00) e n.º 2018 ... (€ 8.510,00), e respectivas liquidações de juros compensatórios e moratórios n.º 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 533,42), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 703,12), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 951,89), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 1.777,65), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 960,03), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 929,76), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 704,85), n.º 2018 ... e n.º 2018 ... (no valor conjunto de € 783,01).

                No total, o Requerente B... pagou € 59.455,00 de IVA e € 7.343,73, pelo que tem direito a ser reembolsado da quantia de € 66.798,73.

 

                C) Requerente C...         

 

                Pagou as liquidações de IVA n.ºs 2018 ... (€ 1.380,00), 2018 ... (€ 3.864,00), 2018 ... (€ 4.094,00), 2018 ... (€ 5.984,60), 2018 ... (€ 3.105,00), 2018 ... (€ 5.980,00), 2018 ... (€ 7.199,00) e n.º 2018 ... (€ 6.143,53), e as respectivas liquidações de juros compensatórios e moratórios n.ºs 2018 ... (€ 199,77), 2018 ... (€ 519,57), 2018 ... (€ 509,67), 2018 ... (€ 685,35), 2018 ... (€ 325,64), n.ºs 2018 ... (€ 565,56) 2018 ... (€ 609,05), 2018 ... e 2018 ... (no valor total de € 571,02).

                No total, o Requerente C... pagou € 37.750,13 de IVA e € 3.985,63 de juros compensatórios e moratórios, pelo que tem direito a ser reembolsado da quantia de € 41.735,76.

                

                4.2. Juros indemnizatórios

 

                No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

                No caso em apreço, é claro que o erro nas liquidações de IVA, nas partes em que são impugnadas, bem com os erros nas liquidações de juros compensatórios e juros de mora são imputáveis a Autoridade Tributária e Aduaneira, que as emitiu por sua iniciativa.

                Por isso, os Requerentes têm direito a juros indemnizatórios que devem ser contados, sobre os valores de € 67.014,33, quanto ao Requerente A..., de € 66.798,73 , quanto ao Requerente B..., e de 41.735,76, quanto ao Requerente C..., desde as datas em os pagamento os pagamentos foram efectuados, que deverão ser apuradas em execução do presente acórdão, até ao integral reembolso.

                Os juros indemnizatórios são devidos à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, e deverão ser determinados em execução do presente acórdão [artigo 609.º, n.º2, do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT].

 

                5. Decisão

 

Nestes termos acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

A)           Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

B)           Anular as seguintes liquidações de IVA, relativas ao Requerente A..., quanto aos seguintes valores: n.º 2018 ... (€ 3.220,00); n.º 2018 ... (€ 4.600,00) (impugnada parcialmente); n.º 2018 ... (7360,00) (impugnada parcialmente); n.º 2018 ... (€ 12.650,00); n.º 2018 ... (€ 6.900,00); n.º 2018 ... (€ 8.740,00); n.º 2018 ... (€ 8.510,00); n.º 2018 ... (€ 7.590,00);

C)           Anular as seguintes liquidações de IVA relativas ao Requerente B...: n.º 2018 ... (€ 3,266,00); n.º 2018 ... (€ 4,600,00); n.º 2018 ... (€ 6.670,00); n.º 2018 ... (€ 13.409,00); n.º 2018 ... (€ 7.820,00); n.º 2018 ... (€ 8.280,00); n.º 2018 ... (€ 6.900,00); e n.º 2018 ... (€ 8.510,00);

D)           Anular as seguintes liquidações de IVA relativas ao Requerente C...: n.º 2018 ... (€ 1.380,00); n.º 2018 ... (€ 3.864,00); n.º 2018 ... (€ 4.094,00); n.º 2018 ... (€ 5.984,60); n.º 2018... (€ 3.105,00); n.º 2018... (€ 5.980,00); n.º 2018... (€ 7.199,00); e n.º 2018 ... (€ 6.143,53);

E)            Anular as seguintes liquidações de juros compensatórios e juros de mora, , relativas ao Requerente A...: liquidações de juros compensatórios n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 529,62), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 725,91), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 1.068,11), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 1.691,17), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 854,44), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 990,66), n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 878,20) , n.ºs 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de 706,22);

F)            Anular as seguintes liquidações de juros compensatórios e juros de mora, relativas ao Requerente B...: n.º 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 533,42), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 703,12), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 951,89), 2018 ... e 2018... (no valor conjunto de € 1.777,65), 2018... e 2018 ... (no valor conjunto de € 960,03), 2018... e 2018... (no valor conjunto de € 929,76), 2018 ... e 2018 ... (no valor conjunto de € 704,85), n.º 2018 ... e n.º 2018 ... (no valor conjunto de € 783,01);

G)           Anular as seguintes liquidações de juros compensatórios e juros de mora, relativas ao Requerente. C...: n.ºs 2018... (€ 199,77), 2018... (€ 519,57), 2018 ... (€ 509,67), 2018... (€ 685,35), 2018 ... (€ 325,64), n.ºs 2018 ... (€ 565,56) 2018 ... (€ 609,05), 2018 ... e 2018 ... (no valor total de € 571,02);

H)           Julgar procedente os pedidos de reembolso e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar aos Requerentes as seguintes quantias:

– ao Requerente A..., a quantia de € 67.014,33;

– ao Requerente B..., a quantia de € 66.798,73;

– ao Requerente. C..., a quantia de € 41.735,76:

I)             Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar ao cada um dos Requerentes os juros que forem determinados em execução do presente acórdão.

 

7. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 175.548,82, valor indicado pelos Requerentes, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 17-08-2021

 

Os Árbitros

 

(Jorge Lopes de Sousa)

(Clotilde Celorico Palma)

(António de Barros Lima Guerreiro)

(Vencido conforme declaração junta)

 

 

 

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO DE VENCIDO

 

I-Embora  naturalmente a respeite,  não me é de todo  possível acompanhar a posição que fez vencimento no presente Acórdão,  fundamentada em um conceito de estabelecimento estável   para efeitos de IVA,  que não tem em conta, por ultrapassado,  a sua independência do conceito de estabelecimento estável adotado em sede de impostos sobre o rendimento pelo art. 5º do CIRC, e, no meu modesto  entender,  não é  partilhado,  nem pela Diretiva  nº 2008/8/CE,  que alterou o Capítulo 3, em especial o art. 44º , da  Diretiva nº 112/2006 /CE ,  a Diretiva IVA, transposta adequadamente para o direito nacional pelo DL nº 186/2009, de 12/8, nem pelos nºs 1 e 2 do art. 11º do Regulamento de Execução nº 282/2011, de 15/3/2011, que contêm uma inédita definição de estabelecimento estável para efeitos de IVA ,nem   pela jurisprudência mais recente do TJUE, que seguidamente será referida, pelo menos tal como a interpreto, nem pela doutrina que conheço.  de mencionar que, em IVA, nas operações entre sujeitos passivos,  releva primordialmente para  a classificação como  estabelecimento estável   o local do efetivo consumo dos serviços e , nos  impostos sobre o rendimento, independentemente da natureza dos rendimentos empresariais, nos termos do nº 1 daquele art. 5º, as caraterísticas  da instalação onde a atividade é desenvolvida. O conceito de estabelecimento estável para efeitos de IVA, como é sabido, é mais amplo que o conceito de estabelecimento estável nos impostos sobre o rendimento  .

A não tributação em Portugal, consequente da  posição que fez vencimento,  de serviços  integralmente prestados e consumidos em território português,  como são os prestados pelos Requerentes, relativos ao apoio na  criação, controlo e expansão,  de uma rede de ginásios de baixo custo, totalmente localizada em Portugal, apenas com o fundamento da interposição  apenas  formal  entre prestador e consumidor de entidade sediada noutro Estado membro da UE,  a qual  não recebe,  não utiliza ou nem  explora tais serviços, como é o caso da D... LIMITED, não é, por outro lado, racional e favorece objetivamente a elisão fiscal, ainda quando legítima. Viola, por outro lado, ao contrário do que afirmam os Requerentes no art. 28º da PI, o princípio da neutralidade do imposto.

Com efeito,  possibilita  , pelo menos abstratamente, a  sujeitos passivos do IVA registarem-se em regimes fiscais mais favoráveis, “maxime” por o tipo de operações em causa beneficiar de isenção ou redução de taxas ou, até, de uma menor efetividade  das normas fiscais, por um menos intenso  controlo da sua aplicação pelas administrações fiscais dos Estados membros, por ineficácia ou vontade própria, apenas com vista a reduzir  o encargo tributário a suportar pelo consumidor final e  consequentemente distorcer a    concorrência ( nesse sentido, ainda no âmbito do Parágrafo 1º do art. 9º da 6ª Diretiva, o  o nº  14 do Acórdão do TJUE C-168/84, de 4/7, que mantém toda a atualidade). Essa eventualidade pode igualmente ocorrer internamente em caso de deslocação dos sujeitos passivos entre circunscrições  com taxas diferentes de IVA com fins de elisão fiscal, ainda que legítima,   considerando-se circunscrições as definidas na alínea b) do art. 23º  da Lei Orgânica nº 2/2013, de 9/9.(Lei de Finanças das Regiões Autónomas)  já que a  localização das prestações de serviços, para efeitos de aplicação dessas taxas ser, nos termos do nº 1 do art. 3º do DL nº 347/85, de 23/8, regulada integralmente  pelo art. 6º do CIVA.  No limite, extravasando do caso concreto, caso a posição da administração fiscal da República de Malta seja idêntica à da Requerida, do entendimento ora consagrado resulta a pura e simples não tributação deste tipo de operações: nem em Portugal, nem na República de Malta.

Os serviços prestados pelos impugnantes ao estabelecimento estável da D... LIMITED,   E...SA, ora H..., SA”, são, assim, de acordo com a minha posição, para efeitos da incidência territorial do IVA, conforme a alínea a) do nº 6 do art. 6º do CIVA e o art. 44º da Diretiva IVA, de acordo com o qual o lugar das operações tributáveis é o lugar do estabelecimento estável ,  tratados como   meras operações domésticas, aplicando-se-lhes as regras  gerais de liquidação e cobrança do imposto que  regulam essas operações, ou seja, a liquidação pelo prestador,  e não o pretendido regime de “reverse charge”.

II- Com efeito, como consta dos Contratos designados de “Service Agreement” integrantes do PA, que:

a)A 3/5/2011, a à D... LIMITED, representada por C... no exercício dos poderes referidos em documento anexo a esses contratos, celebraria com a então ainda E..., SA , representada por I..., a responsável máxima pela direção da sociedade Contrato de Prestação de Serviços, denominados pelos Requerentes de acordo parassocial, regulado nos termos do nº 9.1. pela lei portuguesa cujo objeto seria a assistência na instalação e expansão de uma rede de ginásios de baixo custo, incluindo o controlo dos serviços de “marketing” e vendas relacionados, que, nos termos do nº 1.2.  desse Contrato, não envolvem quaisquer poderes de representação da segunda sociedade pela primeira sociedade;

b) A contraprestação a pagar à D... LIMITED pela E..., SA, nos termos dos nº s 3.1.,3.2. e 3.3. desse Contrato, compreenderia uma importância fixa acrescida de uma majoração em função do volume de trabalho e inflação, mais um prémio de desempenho dependente dos objetivos alcançados, de acordo com um Plano de Negócios que constitui o Anexo II ao Contrato, do qual consta do PA um extrato;

c) A esses montantes, nos termos do nº 3.5. do contrato, acresceriam despesas de bolso (“out of pocket expenses”), a reembolsar à D... LIMITED pela E..., SA, dentro de um teto estabelecido com a previa concordância da E..., SA, que não incluiriam , no entanto, o IVA suportado;

d) O nº 1.2. desse Contrato permitiria à D... LIMITED designar terceiros independentes com os conhecimentos e capacidades exigidas para cumprir as obrigações aí previstas, assumidas pela D... LIMITED perante a E..., SA , relativas à instalação, expansão, operações, vendas e promoção dos serviços relacionados com a rede dos ginásios detida por esta, aos quais esta última sociedade assegura os necessários poderes de representação;

e) No mesmo dia 3/5/2011, A..., B... e C..., autores da presente ação,  todos profissionais independentes exercendo funções de consultoria nos termos do nº 1320 da Tabela Anexa à Portaria nº 1011/2001, de 20/8, assinaram segundo contrato de Prestação de Serviços com a D... LIMITED em que se obrigariam perante esta, segundo os nº 1 e 2 e os Requerentes admitem nos arts. 5º e 6º da PI, a prestar os serviços de assessoria e controlo que a D... LIMITED se comprometera simultaneamente a prestar à E..., SA no primeiro Contrato, com o direito à respetiva remuneração;

f) De acordo com o nºs 1 e 3 respetivamente do Primeiro e Segundos Contratos, estes são de execução continuada, terminando esta pela verificação, pela E..., SA do incumprimento dos objetivos fixados;

g) Esses serviços seriam faturados à D... LIMITED, nos termos do nº 1 do art. 8º do CIVA, pelos ora Requerentes, que não liquidaram IVA, com o fundamento de o imposto ser devido pelo adquirente e não pelos prestadores dos serviços, não sendo consequentemente aplicável a alínea a) do nº 6 do art. 6º do CIVA.

 

Segundo o II, 2, do projeto de relatório notificado aos Requerentes para efeitos do exercício do direito de audição, que procedeu ao enquadramento jurídico dos factos apurados, os serviços que prestaram não foram utilizados/consumidos   na República de Malta mas na instalações  fixas onde a   E..., SA exerce a atividade, ou seja,  a rede dos  27 ginásios já instalados a quando das ações  inspetivas, .

 

Tal enquadramento   não seria alterado, após o exercício do direito de audição, no III.3 comum a todos os Relatórios Finais de Inspeção.

 

Todos esses factos constam do PA e os Relatórios Finais de Inspeção contêm   suficientes fundamentos não só de direito como de facto para as liquidações  cuja anulação os Requerentes pretendem, sem necessidade de indagações complementares que, ainda que, ainda que se pudessem fazer, não se revestiriam de qualquer utilidade para a decisão da causa.

III- Para os Requerentes, segundo a argumentação deduzida nos arts.   42º, i), 44º e 46º da PI, a qualificação da D... LIMITED apenas seria possível se se   considerasse a primeira entidade  constituir  uma extensão territorial da segunda  sociedade, prosseguindo  a atividade desta última  em território português.

A qualificação como estabelecimento estável dessa primeira entidade dependeria, assim, de estar integrada na organização empresarial da D... LIMITED, como sucursal, único caso em que o risco do negócio recairia exclusivamente na casa-mãe, ainda assim dependendo essa qualificação de sucursal reunir os meios técnicos e humanos necessários a desenvolver uma atividade económica autónoma.

Segundo os Requerentes, no entanto, a E...,  SA seria independente da D... LIMITED, motivo pelo qual jamais poderia ser considerada estabelecimento estável desta e, portanto, relativamente à aplicação da alínea a) do nº 6 do art. 6º do CIVA, sujeito passivo do imposto.

Esse entendimento seria partilhado sem  qualquer reserva no Acórdão em que voto vencido, na seguinte passagem “As sociedades subsidiárias não são consideradas, em princípio, estabelecimentos estáveis das sociedades-mãe, pois constituem entidades juridicamente independentes, só podendo constituir estabelecimentos estáveis quando, apesar da independência, atuarem efetivamente em representação da sociedade-mãe” . Assim, terminaria esta parte do Acórdão   que, “não tendo sido demonstrado que a H... ( ou E...; SA”) tenha atuado como representante da D..., desenvolvendo em Portugal qualquer atividade desta, designadamente de prestação a outrem de serviços de consultadoria e assessoria ou controlo relacionados com o negócio dos  ginásios , que é a atividade a que a D... LIMITED se dedica, não pode ser considera estabelecimento estável”.

Afirma também o Acórdão em que está integrado o presente Voto de Vencido, para fundamentar a inexistência de estabelecimento estável no caso concreto, “apesar de a E.../H... ter o «grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos», para poder ser um estabelecimento estável da D..., era necessário que aquela fosse um meio de que este sujeito passivo dispusesse para desenvolver a sua atividade fora do âmbito do território em que se situa a sede”

Seria o corolário lógico do Facto Provado   da não coincidência do objeto social de ambas as entidades: a D... LIMITED exerceria a consultadoria na instalação, desenvolvimento e  expansão da redes de ginásios,  a E... SA exerceria diretamente a atividade de exploração de uma rede de ginásios, não tendo por objeto social a prestação a terceiros desse tipo de serviços, embora naturalmente, em caso de opção pela não externalização, os possa prestar diretamente a si própria.

Tal doutrina poderia eventualmente fundamentar-se nos Acórdãos n.º 0200/08 de 7/5/2008 e n.º 0199/08 de 24/9/ 2008. Ambos os processos incidiam sobre o mesmo tipo de situação e em ambos foram tiradas conclusões iguais. No texto dos acórdãos foi referido que (àquelas datas) o conceito de estabelecimento estável em IVA não se encontrava definido na Sexta Diretiva nem no CIVA e que por isso, o conceito definido em termos de IRC seria analogicamente aplicável no âmbito do IVA. O STA defendeu ainda que o conceito que vinha sendo adotado pelo TJUE seria semelhante ao que consta no art 5.º do Código do IRC, pelo que não se vislumbraria “qualquer razão para ser utilizado um conceito distinto”. Ana Rita Garcia da Costa  na Dissertação  coordenada por António Nunes dos Reis “Discussão do Conceito Relevante de Estabelecimento Estável “ , editado pelo ISEG em 2015,pgs. 72 e 73, estranharia essa afirmação, porque, segundo ela, “O próprio TJUE sempre defendeu que os conceitos de estabelecimento estável em IVA e em sede de impostos sobre o rendimento são distintos”.

Independentemente da pertinência, ou não, dessa observação, a jurisprudência desses dois Acórdãos não pode havida como consolidada (entretanto mudou a quase totalidade da Secção do Contencioso Tributário do STA). Por outro lado, da aplicação por integração analógica do art. 5º do CIRC, apenas possível em caso de lacuna da lei, não pode resultar um conceito de estabelecimento estável incompatível com o do art. 11º do Regulamento de Execução nº 282/2011, como aquele em que assenta a posição dos Requerentes. Caso isso fosse possível, esvaziar-se-ia, aliás, o sentido e alcance desse art., que seria inútil.

IV-  De acordo com essa posição,  as sucursais seriam , assim, o típico estabelecimento estável sujeito passivo do IVA, com os mesmos fundamentos com que são consideradas estabelecimento estável sujeito passivo dos impostos sobre o rendimento.

Por outro lado, as sociedades subsidiárias, como as filiais, por, dada a sua independência jurídica, o risco do negócio não ser da casa- mãe, a sociedade dominante, mas exclusivamente da  própria sociedade subsidiária, não seriam estabelecimentos estáveis, relevando, assim, para efeitos da alínea a) do nº 6 do art. 6º do CIVA, para efeitos da localização das prestações de serviços efetuadas, o Estado da sede de tais sociedades e não o Estado da sede da sociedade dominante .

A   qualificação para o efeito das sucursais como estabelecimento estável sujeito passivo do IVA pressuporia, no entanto,  que desenvolvessem uma atividade autónoma  da atividade da sociedade mãe.

Em boa verdade, dado as sucursais não disporem de personalidade jurídica, as operações entre sucursal e sede não são geralmente consideradas como operações entre sujeitos passivos  autónomos, situando-se, salvo prova em contrário, fora do campo de incidência do IVA.

Essa é a jurisprudência do TJUE, (ver, entre outros, Acórdão C-210/04, de 13/3/2006, que tem um sentido diferente em que o art. 48º da PI o interpreta.

 

Sustentaria, com efeito, o nº 1 do art. 2 e   o nº 1 do art. 9º da então 6ª Diretiva deverem ser interpretados no sentido de que um estabelecimento estável, que não é uma entidade jurídica distinta da sociedade em que se integra, situado noutro Estado-Membro e ao qual a sociedade fornece prestações de serviços, não pode ser considerado sujeito passivo apenas em razão dos custos que lhe são imputados pelas referidas prestações.

 

Já as filiais e outras subsidiárias, apesar de ser apenas seu o risco do negócio que desenvolvem, podem ser estabelecimentos estáveis sujeitos passivos do IVA, nos termos do Acórdão do TJUE C/260/95, de 10/2/97.

 

De acordo com essa jurisprudência, o nº 2 do art. 6º da Sexta Diretiva 77/388 deveria ser interpretado no sentido de que, quando um organizador de circuitos turísticos com sede num Estado-Membro fornece a viajantes prestações de serviços por intermédio de uma sociedade que opera na qualidade atue como simples auxiliar do organizador e disponha dos meios humanos e técnicos que caracterizam um estabelecimento estável. É de referir que, no caso concreto, essa sociedade era detida na totalidade do seu capital pelo organizador dos circuitos turísticos   Em Portugal, a sua atuação teria lugar no quadro do contrato de agência regulado pelo DL nº 178/86, de 3/7, que não depende de qualquer relação de representação entre o prestador e o destinatário dos serviços de intermediação, que atua em nome próprio.

Que, ao contrário das sucursais,  uma filial ,ou, se  se quiser, uma sociedade subsidiária,  pode ser estabelecimento estável  independentemente de qualquer relação de representação, seria , aliás, recentemente reafirmado pelo  Considerando  32 do Acórdão do TJUE  de 7/5/2020, Proc. C-547/18,  de acordo com o qual é possível  uma filial  constituir o estabelecimento estável da sua sociedade mãe , desde que preencha  as  condições materiais referidas    no Regulamento nº 282/2011, que devem ser apreciadas à luz da realidade económica e comercial.  Assim, a filial não é, só pelo facto de o ser, estabelecimento estável, sendo necessário que atue no interesse da sede   noutro Estado membro, independentemente de qualquer relação de representação, e simultaneamente, seja uma unidade economicamente autónoma, atuando pelos seus próprios meios, mas, caso estes requisitos estiverem preenchidos, não pode deixar de ser considerada estabelecimento estável.

Assim, não é a indiscutível autonomia da atividade da   E... SA que prejudica a sua qualificação como estabelecimento estável da D... LIMITED, caso se verifiquem os requisitos do Regulamento de Execução nº 282/2011.

V- No presente processo arbitral, não ficou, no entanto, provada a subsidiariedade da E... SA perante a D... LIMITED, em virtude da existência de uma relação de domínio. Essa ausência de prova não obsta, no entanto, à sua qualificação como estabelecimento estável.

Nos termos do nº 1 do art. 486º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), considera-se que duas sociedades estão em relação de domínio quando uma delas, dita dominante, pode exercer, diretamente ou por sociedades ou pessoas que preencham os requisitos indicados no nº 2 do art. 483, sobre a outra, dita dependente, uma influência dominante.

Segundo o nº 2 desse art. 483º. presume-se que uma sociedade é dependente de uma outra se esta, direta ou indiretamente:

a) Detém uma participação maioritária no capital;

b) Dispõe de mais de metade dos votos;

c) Tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização.

O conceito de estabelecimento estável pode, no entanto, abranger sociedades que não sejam filiais nem subsidiárias, o que resulta da independência do conceito d adotado no CIVA do conceito adotado no CIRC.

VI- A definição autónoma e exaustiva para efeitos de IVA de estabelecimento estável consta dos mencionados nºs 1 e 2 do art. 11º do Regulamento de Execução nº 282/2011.

Nos termos desse nº 1 do art. 11º, para a aplicação do artigo 44.º da Diretiva 2006/112/CE, entende-se por «estabelecimento estável» qualquer estabelecimento, diferente da sede da atividade económica a que se refere o artigo 10, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permitam receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento. Como se referiu , tal norma não tinha paralelo no Direito anterior e abrange  apenas as operações entre sujeitos passivos, “Business to  Business”, através de “Purchased Fixed Estabishments”, como cabalmente esclarece Raquel Montes Fernandes, “O Estabelecimento Estável do IVA  na Era Digital- O Caso Welmory no Contexto do BEPS”, Cadernos do IVA, 2016, pg. 334), uma vez que as operações entre sujeitos passivos e não sujeitos passivos são reguladas no nº 2 e só no caso de operações entre sujeitos passivos os serviços são adquiridos com vista à satisfação das necessidade próprias do estabelecimento .

 

O   adquirente que  receba e utilize os serviços prestados por outro sujeito passivo, de acordo com as necessidades da sua exploração económica,  é, assim, estabelecimento estável, desde que este disponha de  um grau suficiente de permanência e de  uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, para efeitos do exercício de uma atividade empresarial autónoma , que obviamente não  seja  de carácter meramente preparatório ou auxiliar e, por isso, não tenha independência económica(Acórdão do  TJUE C-73/06, de 28/6/2007), e os serviços adquiridos se destinem a essa atividade.

 

O nº 2 desse art. 11º define outro tipo de estabelecimento estável que também deve  ter  um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, mas que lhe permita prestar serviços a  terceiros , não sujeitos passivos, as chamadas operações “Business  to Consumer” , desenvolvidas por “sales fixed establishments”.

Com efeito, segundo essa norma, para a aplicação dos arts. a seguir indicados, entende-se por «estabelecimento estável» qualquer estabelecimento, diferente da sede da atividade económica a que se refere o artigo 10.º  do Regulamento, caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permita efetuar as prestações de serviços que fornece: a) art. 45.o da Diretiva 2006/112/CE; b) a partir de 1/1/ 2013, segundo parágrafo do n.o 2 do art. 56.o da Diretiva 2006/112/CE; c) até 31/12/2014, art. 58.o da Diretiva 2006/112/CE; d) art. 192.o-A da Diretiva 2006/112/CE.

Todas essas normas se referem    a serviços prestados a não sujeitos passivos: caso contrário, aliás, não se vislumbraria a necessidade do nº 1, já   que a sua regulamentação estaria absorvida pelo subsequente nº 2.

Assim, a condição de o estabelecimento estável dispor de uma estrutura de meios humanos e técnicos que lhe permita efetuar os serviços que fornece  é somente  condição de a  estrutura ser considerada um “sales fixed establishment”, abrangido pelo regime particular do nº 2 do  art. 11º e não pelo nº 1, não sendo exigível a todos e qualquer estabelecimento estável( nesse sentido  , “IVA, Estabelecimento Estável e Obrigação de Registo”, Cadernos IVA , 2016, pg. 307, Pedro Nuno Monteiro, pg. 307)  

Assim, o facto de a E... SA não prosseguir a mesma atividade económica da D... LIMITED  mas outra atividade económica autónoma  não afeta a sua qualificação  como estabelecimento estável e, portanto, a legalidade dos atos tributários impugnados, ao abrigo do nº 1 do art. 11º.

É de referir que, para efeitos do nº 1 do art. 11º do Regulamento de Execução nº 282/2011,  declara o nº 2 do art. 53º  que, quando um sujeito passivo dispuser de um estabelecimento estável no território do Estado-Membro em que o IVA é devido, considera-se que esse estabelecimento não intervém na entrega de bens ou prestação de serviços , a menos quando  os recursos técnicos e humanos do estabelecimento estável sejam utilizados nas prestações de serviços (ou transmissões de bens )inerentes à realização da operação tributável,   antes ou durante a realização dessa entrega ou prestação de serviços.

Na verdade, por natureza, os serviços prestados pelos Requerentes à D... LIMITED, são inerentes às operações tributáveis: na medida em que não se teriam realizado não fosse a utilização da rede de ginásios e são totalmente consumidos no funcionamento dessa rede.

Apenas quando os recursos do estabelecimento estável sejam utilizados exclusivamente para tarefas de apoio administrativo, tais como contabilidade, faturação e cobrança de créditos, não se consideram como sendo utilizados para efetuar entregas de bens ou prestações de serviços, que, para o efeito, são consideradas de carácter apenas instrumental ou auxiliar. Não é o caso dos serviços previstos nos Contratos.

O regime- regra de “reverse charge” é, assim, afastado, presumindo-se a intervenção do estabelecimento estável na fase do consumo para efeitos da incidência territorial do IVA, quando a infra-estrutura do estabelecimento estável (no caso, a rede dos 27 ginásios) deva ser utilizada na prestação de serviços tributável.

Assim, nesse caso, como no caso do nº 2 do art. 11º do Regulamento, cabe ao prestador e não ao adquirente liquidar IVA, uma vez que as operações se consideram localizadas em território português.

A prova de que os recursos técnicos e humanos do estabelecimento estável português E...SA , no caso, a rede dos 27 ginásios (  e não recursos técnicos e  humanos localizados na República de Chipre ou noutro Estado membro da União Europeia) foram consumidos na realização dos serviços prestados pelos Requerentes resulta claramente dos Relatórios Finais da Inspeção e , em boa verdade, não foi  posta em causa pelos Requerentes, a quando do exercício do direito de audição.

Cabia, assim, aos Requerentes, conhecedores que eram da natureza e utilização dos serviços prestados através do Contrato de Prestação de Serviços que subscreveram e do chamado acordo parassocial da mesma data , para o qual o  primeiro  Contrato remete ,nos termos do nº 1 do art. 22º do Regulamento de Execução nº 282/2011, liquidar IVA( sobre situação em parte semelhante, ver   o n+n37  do Acórdão C- 547/18 já referido ), o que escolheram não fazer. 

VII- Ao definir estabelecimento estável como  qualquer estabelecimento, diferente da sede da atividade económica  caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura                                                                                                    adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permita receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento independentemente de prestar ou não a terceiros os serviços que  recebe, o  nº 1 so art. 11º do Regulamento de Execução nº 282/2011,  prescindiu,  por outro lado, do pressuposto ou requisito do estabelecimento estável da   propriedade/ locação  pelo sujeito passivo dos recursos humanos e técnicos a ele afetos  .

 Assim, não tem relevância efeitos da incidência territorial do imposto, os meios materiais e humanos utilizados na realização das prestações de serviços não serem da propriedade ou locados pela D... LIMITED ou dos Requerentes, mas de terceiros, bastando, com efeito, a mera utilização desses meios pelo contribuinte ao abrigo de contrato de colaboração com carácter permanente, que assegure a sua disponibilidade, como aliás, vem referido no Acórdão nº 547/18.

A essa conclusão não obsta, como pretende a fundamentação do Acórdão, do termo “estabelecimento do sujeito passivo” usado no art. 44º da Diretiva IVA.

Estabelecimento estável do sujeito passivo é qualquer   polo através do qual o sujeito passivo  desenvolve a sua atividade económica, independente de essa infra-estrutura ser ou não sua, que o sujeito passivo use, em virtude de qualquer tipo de relação contratual, e não  necessariamente por força de direito de propriedade  ou outro direito real, ou de qualquer contrato de locação-.

A expressão atinge todo o conjunto de meios humanos e materiais de que o sujeito passivo disponha permanentemente, independentemente do título, não tendo qualquer relevância se as instalações são, ou não, estabelecimento estável para efeitos do art. 5º do CIRC.

Essa doutrina seria acolhida pelo Acórdão do TJUE de 26/10/2012, proc. C-605/12,   relativo a um contrato de colaboração de execução duradoura( não intermitente)  de uma sociedade cipriota com uma sociedade polaca, nos termos do qual a primeira  sociedade se comprometeria  a prestar à segunda sociedade um serviço de disponibilização de um sítio Internet de leilões, no caso, uma website polaco, sob o nome de domínio www…..pl, incluindo igualmente a prestação de serviços relacionados, respeitantes, por um lado, à locação dos servidores indispensáveis ao funcionamento do sítio Internet, e, por outro, à apresentação dos produtos leiloados.

A sociedade polaca, por sua vez, comprometer-se-ia se principalmente a vender bens nesse sítio Internet.

A sociedade cipriota não dispunha de quaisquer meios materiais e humanos na Polónia, sendo o “website” gerido pela sociedade polaca, com os recursos técnicos e humanos detidos por esta, facto considerado suficiente pelo TJUE para a sua qualificação como estabelecimento estável. A confusão entre   prestador e adquirente dos serviços não obstaria à qualificação pelo TJUE  como estabelecimento estável da sociedade cipriota, uma vez um e outro atuarem em qualidades diferentes.. 

O    65 do Acórdão admitiria , com efeito,  que um primeiro sujeito passivo, a sociedade cipriota,  com a sede da sua atividade económica num Estado Membro, que beneficie de serviços prestados por um segundo sujeito passivo estabelecido noutro Estado Membro, dispõe, nesse outro Estado Membro, de um «estabelecimento estável», na aceção do artigo 44.° da Diretiva IVA, com vista à determinação do lugar de tributação desses serviços, se esse estabelecimento se caraterizar por um grau suficiente de permanência e uma estrutura apta, em termos de recursos humanos e técnicos, a permitir lhe receber prestações de serviços e a utilizá las para efeitos da sua atividade económica própria .

Como afirmaria a Advogada Geral nesse Processo, para haver estabelecimento estável não são necessários recursos humanos e técnicos próprios, bastando que o estabelecimento disponha de recursos alheios como se fossem próprios, o que pressupõe obviamente uma relação contratual que titule essa disposição.

Tal Acórdão versa sobre a localização territorial de serviços de natureza digital, “on line”, em que, segundo o nº 60, os meios técnicos utilizados eram equipamento informático, servidores e programas informáticos adaptados e os meios humanos eram os próprios colaboradores da empresa polaca, ou seja, a empresa  beneficiária dos serviços prestados pela empresa cipriota.

No presente caso, os serviços prestados não são de natureza digital, sendo porventura de natureza porventura predominantemente presencial, os meios materiais da estrutura seria o conjunto da rede de ginásios da E... SA e os colaboradores dessa estrutura seriam os Requerentes, um coletivo de 3 profissionais independentes que se comprometeram a prestar os referidos serviços de  assistência, “marketing” e vendas, remunerados em função dos resultados obtidos.

Não faria, no entanto, sentido e violaria, sim, o princípio da neutralidade, que serviços substancialmente idênticos, controlo e apoio às vendas, num quadro de operações “Business to Business”, seguissem critérios diferentes de localização, conforme fossem efetuados “on line” ou “off line”, não sendo legitima qualquer interpretação do Acórdão C-605/12 no sentido de apenas abranger a realidade digital.

Sendo óbvia à luz desse critério, a qualificação como estabelecimento estável da E... SA da D... LIMITED , o lugar dos serviços que lhe sejam prestados é o lugar desse estabelecimento estável , como diz a segunda frase do art. 44º da Diretiva IVA e não o lugar da sede, como diz a 1ª frase.

VIII- Também não procede a argumentação desenvolvida pelos Requerentes nos arts. 76º a 81º da PI, de que, caso o imposto tivesse sido liquidado à D... SA esta não o poderia deduzir, por inexistência de qualquer mecanismo legal que previsse a repercussão e dedução do imposto.

Ao contrário do que afirma, poderia efetivamente em tais circunstâncias ter deduzido o imposto, desde que se tivesse registado como estabelecimento estável. Com efeito, nada impede uma sociedade nacional de dispor em Portugal de vários estabelecimentos estáveis e que individualmente proceda ao respetivo registo (alínea a)d o  nº 1 do art. 2º, alínea a) do nº 1 do art. 29ºe nº 1, do art. 31º do CIVA,  e nº 1 do art. 213º da Diretiva IVA , bem como  Pedro Nuno Monteiro, artigo citado, pgs. 311 e 312).

A não liquidação do imposto, quando esta  seja  obrigatória,  não  é conceda-se ,  uma vantagem direta  para o destinatário dos serviços, mas pode distorcer  a  concorrência , ainda que, dados os valores envolvidos , essa distorção possa ser  virtual ou insignificante., quando   o preço de venda ao consumidor não incorpore o IVA que  devia legalmente  ter sido liquidado.

Assim, não se concorda com a posição vencedora porque:

a)O conceito de estabelecimento estável para efeitos de IVA  é regulado nos nºs 1 e 2 do art. 11º do Regulamento de Execução nº 282/2011, com autonomia do conceito de estabelecimento estável dos impostos sobre o rendimento;

b) Nas operações “Business to Business” , entre sujeitos passivos, o estabelecimento estável é caracterizado por um grau suficiente de permanência e uma estrutura                                                                                                    adequada, em termos de recursos humanos e técnicos, que lhe permita receber e utilizar os serviços que são prestados para as necessidades próprias desse estabelecimento, que não pode ser de carácter apenas instrumental ou auxiliar , não sendo elemento dessa definição o sujeito passivo prestar a  terceiros, consumidores finais ou não, serviços da mesma natureza dos serviços recebidos;

c) Nos termos do art. 53º desse Regulamento de Execução nº 282/2011, considera-se haver estabelecimento   sempre que os   recursos técnicos e humanos do estabelecimento estável sejam utilizados nas prestações de serviços inerentes   à realização da operação tributável.

d) No caso em apreço, é inerente às prestações de serviços tributáveis a utilização da rede de ginásios  da E...SA,  já que dessa utilização depende a efetiva prestação de tais serviços

e) A posição vencedora parte de um quadro normativo que apenas teria vigorado até 1/7/2011, dada em que, no termos do nº 1 do seu art. 65º, entrou em vigor  Regulamento de Execução nº 282/2011, com o qual é incompatível

 

O ÁRBITRO

(António de Barros Lima Guerreiro)