Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 588/2020-T
Data da decisão: 2021-08-05  ISV  
Valor do pedido: € 7.010,50
Tema: ISV – Admissão de veículo automóvel usado de outro Estado membro da UE – Incidência sobre a componente ambiental.
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SUMÁRIO:

 

A actual legislação portuguesa vertida no artigo 11º do Código de Imposto sobre Veículos não está em conformidade com o direito comunitário, designadamente, com o disposto no artigo nº 110° do Tratado de Funcionamento da União Europeia (aplicável por força do artigo 8°, nº 4 da Constituição da República), ao não considerar aplicável a redução de ISV à componente ambiental, permitindo que o imposto calculado ultrapasse o montante de ISV contido no valor residual de veículos usados similares nacionais.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

REQUERENTE: A..., LDA.

REQUERIDA: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA

1 - RELATÓRIO

A-PARTES

 A..., LDA., a seguir designada por Requerente, com o NIPC ..., e sede na ..., n.º ..., ...-... ..., veio requerer em 31 de Outubro de 2020 a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária, ao abrigo do prescrito no art. 2°, nº 1, alínea a) do Decreto - Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária - RJAT) e nos arts. 1°, alínea a) e 2° da Portaria nº 112 - A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida.

B. - CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL

1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerente e à Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira em 02/11/2020, Requerida esta que designou juristas para a representar por despacho comunicado em 24/11/2020, tendo o Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6°, nº 1, do RJAT, em 24/12/2020, encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.

2. Em 24/12/2020, as Partes foram notificadas dessa designação, nos termos das disposições combinadas do art. 11°, nº 1, alínea b) do RJAT e dos artigos 6° e 7° do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro.

3. Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 25/01/2021, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11° do Decreto-Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.

C. - PRETENSÃO

A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral proceda à anulação parcial da liquidação de ISV, que se desdobra nos números 2020/..., de 20/08/2020, e 2020/..., de 24/08/2020, no valor de 7.010,50 euros, nos termos descritos no Pedido de Pronúncia Arbitral, e, em consequência

Determine a restituição daquela quantia, que foi indevidamente liquidada e paga pela Requerente, acrescida de juros indemnizatórios, calculados à taxa legal aplicável.

D. - TRAMITAÇÃO DO PROCESSO

Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 25/01/2021, seguiram-se:

- Em 25/01/2021 - Foi notificada a Requerida para nos termos dos nºs 1 e 2 do 17º do RJAT, apresentar Resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional e juntar o processo administrativo.

- Em 30/04/2021 -A Requerida apresentou Resposta ao Pedido de Pronúncia Arbitral e inseriu na "Plataforma" on line do CAAD o processo administrativo, tendo sido, de tudo, notificada a Requerente em 03/ 05/2021.

- Em 05/05/2021 - O Tribunal exarou um despacho arbitral, que foi notificado às Partes, visando:

      - Dispensar a realização da reunião prevista no art. 18° do RJAT, em aplicação dos princípios  

        da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade, simplificação e  

        informalidade processuais (arts. 19, nº 2 e 29, nº 2 do RJAT), tendo em conta que a

      matéria de facto relevante para a decisão poderá ser fixada com base na prova

      documental.

 

       - Determinar o prosseguimento do processo, mediante a notificação das Partes, para 

       apresentarem alegações escritas, no prazo sucessivo de quinze dias;

       - Solicitar, ao abrigo do princípio da colaboração, a remessa das peças processuais em 

       formato word.

       - Fixar como data previsível para a prolação da decisão arbitral o dia 15/07/2021.

 - Em 06/05/2021 - A Requerente apresentou alegações escritas.

 - Em 11/05/2021 - A Requerida apresentou alegações escritas.

- Em 14/07/2021, o Tribunal Arbitral exarou o seguinte despacho:

      “Em aditamento ao despacho arbitral de 5 de Maio de 2021, no segmento em que fixava

        como data previsível para a prolação da decisão a data de 15/07/2021, vem-se informar

        que a mesma será proferida posteriormente, com observância do disposto no art. 21.º, n.º

        1 do RJAT.”

- Em 05/08/2021 - Prolação da decisão.

 

E. - PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS

A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente alegou, em síntese, o seguinte:

 

- A Requerente é uma sociedade por quotas, constituída a 5 de janeiro de 1988, cujo objeto social visa a “Comércio de materiais e equipamentos para a construção civil, de produtos e equipamentos para agricultura, para silvicultura e para agropecuária e comércio de produtos alimentares. Serviços de alojamento.”

- No âmbito da prossecução destas atividades empresariais procedeu a Requerente, em 29 de julho de 2020, à aquisição noutro Estado-Membro da União Europeia, na Alemanha, de um veículo automóvel já usado, doravante identificado apenas por “veículo”.

 - Este veículo é do tipo “ligeiro de passeiros”, da marca ..., modelo ..., variante ..., versão ..., designado comercialmente como “...”, movido a gasóleo, n.º de motor ..., cilindrada ... e com emissão de gases CO2 de 180g/km e de partículas 0.0001 g/km.

 - A primeira matrícula deste veículo está datada de 19 de fevereiro de 2015, com o número ... .

- Proveniente da Alemanha, este veículo entrou no território nacional a 18 de agosto de 2020, com 82442 kms percorridos.

- Em sequência disso, a Requerente, na sua qualidade de operador sem estatuto, apresentou a 20 de agosto de 2020, por transmissão eletrónica de dados, dirigida à Alfândega de Aveiro, e para introdução no consumo do referido veículo usado – regime geral, a respetiva DAV que ficou identificada sob o n.º 2020/... .

- Efetivamente, a introdução no consumo e a liquidação do imposto são tituladas pela DAV – conforme estabelece o artigo 17.º, n.1, do Código do ISV (CISV), aprovado pela Lei n.º22-A/2007, de 29 de junho.

- Dessa DAV resultou a liquidação de ISV no valor total de € 18.020,40, mas que aqui se contesta, a título de pedido principal, no valor de € 7.010,50.

- A Requerente procedeu, a 20 de agosto de 2020 e a 24 de agosto de 2020, ao pagamento integral do ISV liquidado pela AT.

- Tal como estabelece o artigo 17.º, n.3, do CISV, para efeitos de matrícula, os veículos automóveis ligeiros e pesados, os motociclos, os ciclomotores, os triciclos e os quadriciclos, ainda que excluídos do imposto, ficam sujeitos ao processamento da DAV.

- Deste modo, a 25 de agosto de 2020, a Direção Regional de Mobilidade e Transportes do Centro (IMT) emitiu a respetiva matrícula portuguesa do veículo como sendo  ... .

- No entender da Requerente, a liquidação de ISV aqui visada foi efetuada com recurso às tabelas A e D, previstas, respetivamente, nos artigos 7.º e 11.º do CISV.

- Sendo que, a percentagem de redução (no caso, 52%), aplicada em função do número de anos de uso do veículo (no caso, mais de 5 a 6 anos), incidiu apenas sobre a componente cilindrada, não tendo sido aplicável, no cálculo da liquidação de ISV, à componente ambiental.

- É precisamente esta não aplicação da percentagem de redução à componente ambiental, tendo por base a idade do veículo, que motiva a apresentação desta ação arbitral.

- Considera a Requerente que a AT ao proceder à liquidação de ISV nos moldes em que o fez incorreu numa ilegalidade, porquanto padece de um erro sobre os pressupostos de direito, pelo que vem solicitar que o Tribunal determine a anulação parcial do ato de liquidação de ISV, em face do vício apontado, conforme melhor se detalha: Descrição Valor A Componente Cilindrada 9 455,56 € B Percentagem de Redução - Anos - Cilindrada 52% C = A x B Redução de Anos de Uso (componente cilindrada) 4 916,89 € D = A - C Componente Cilindrada Reduzida 4 538,67 € E Componente Ambiental 13 481,73 € D + E Total de ISV liquidado 18 020,40 €.

 - No entender da Requerente, a AT liquidou ISV num valor total de € 18.020,40, quando deveria ter sido liquidado apenas € 11.009,90, o que é demonstrativo de uma liquidação ilegal na diferença em excesso de € 7.010,50.

- Relativamente à fundamentação jurídica do seu pedido, a Requerente diz que o primeiro passo para a concretização de um regime jurídico no qual a tributação automóvel passou a ter em conta a componente ambiental decorreu da aprovação da Lei do Orçamento do Estado para 2006 (aprovada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro), por meio do qual, a partir de 1 de julho de 2006, o Imposto Automóvel (IA) aplicável aos veículos ligeiros de passageiros passou a integrar na sua base tributável, além da componente cilindrada já existente, uma componente ambiental assente nas emissões de dióxido de carbono (CO2).

- No ano seguinte, com a Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, a tributação automóvel foi objeto de uma profunda reforma em Portugal, porquanto aboliu-se o IA, o Imposto Municipal sobre Veículos (IMV), o Imposto de Circulação (ICi) e o Imposto de Camionagem (ICa), e, em substituição dos mesmos, foram instituídos o ISV e o Imposto Único de Circulação (IUC), impostos que entraram em vigor em 1 de julho de 2007. Descrição Valor A Componente Cilindrada 9 455,56 € B Percentagem de Redução - Cilindrada 52% C = A x B Redução de Anos de Uso (componente cilindrada) 4 916,89 € D = A - C Componente Cilindrada Reduzida 4 538,67 € E Componente Ambiental 13 481,73 € F Percentagem de Redução - Ambiental 52% G = E x F Redução de Anos de Uso (componente ambiental) 7 010,50 € H = E - G Componente Ambiental que deveria ter sido liquidado 6 471,23 € I = D + E Valor de ISV total liquidado 18 020,40 € J = D + H Valor de ISV total que deveria ter sido liquidado 11 009,90 € I - J Excesso aqui impugnado 7 010,50 €

- Esta reforma da fiscalidade automóvel teve por objetivos a clarificação e a simplificação do sistema fiscal, reduzindo a carga fiscal aquando da aquisição de um veículo, em detrimento da tributação durante a sua utilização, bem como preocupações ambientais na graduação das taxas dos impostos em função das emissões de CO2.

- Neste sentido, a principal alteração no modelo de tributação daqui emergente foi a introdução da componente ambiental no enformar da base tributável do ISV e do IUC, o que foi de encontro às preocupações comunitárias de uma tributação norteada pelo princípio da equivalência ou do poluidor-pagador, atribuindo ao contribuinte a responsabilidade principal pelos custos ambientais causados.

 - De facto, estabelece expressamente o artigo 1.º do CISV, que o ISV obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente, infraestruturas viárias e sinistralidade rodoviária, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária. 

-Relativamente ao quadro legal actualmente aplicável destacam que o ISV tem como características primaciais a de ser um imposto monofásico, indireto, sobre o consumo, específico, de aquisição (de registo ou de matrícula), progressivo, e não harmonizado a nível europeu.

- Na sua incidência objetiva estão sujeitos, entre outros, os “Automóveis ligeiros de passageiros, considerando-se como tais os automóveis com peso bruto até 3500 kg e com lotação não superior a nove lugares, incluindo o do condutor, que se destinem ao transporte de pessoas;” – conforme artigo 2.º, n.1, alínea a), do CISV.

- Ao nível da sua incidência subjetiva, estipula o CISV que são “sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares, tal como definidos pelo presente código, que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando-se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos.” – conforme artigo 3.º, n.1, do CISV.

 - Relativamente ao facto gerador da obrigação tributária, preceitua o artigo 5.º, n.1, do CISV que “Constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal.”.

-  Aclarando o artigo 5.º, n.3, do CISV que, para efeitos deste código, deve entender-se por: “a) «Admissão», a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado membro da União Europeia em território nacional; b) «Importação», a entrada de um veículo originário de país terceiro em território nacional.”.

- O imposto torna-se exigível no momento da introdução no consumo, considerando-se esta verificada: “no momento da apresentação da declaração aduaneira de veículos pelos particulares.” – conforme artigo 6.º, n.1, alínea b), do CISV.

- Constata-se, assim, ser facto gerador, entre outros, a admissão de veículos tributáveis em território nacional provenientes de outro Estado-Membro da União Europeia.

- Esta previsão aplica-se quer aos veículos novos, quer aos veículos usados, sendo que nos presentes autos está em apreciação a admissão no território português de um veículo usado, ligeiro de passageiros.

- No caso concreto dos automóveis ligeiros de passageiros, as taxas de ISV incidem sobre grandezas físicas (centímetros cúbicos de cilindrada e emissões de CO2) e não sobre o valor dos automóveis.

- Nesta medida, o ISV liquidado tem por base duas componentes tributáveis: (i) a componente cilindrada (centímetros cúbicos) e (ii) a componente ambiental (emissões de CO2 – gramas por quilómetro), ambas constantes da Tabela A prevista no artigo 7.º do CISV.

- Estabelece o artigo 11.º, n.1, do CISV, com a redação dada pelo artigo 217.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro (diploma que aprovou a Lei do Orçamento do Estado para 2017), da qual resultou a liquidação em articulação com o artigo 7.º do CISV: “O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com exceção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional: TABELA D

- Para estes efeitos, entende-se por «tempo de uso» o período decorrido desde a atribuição da primeira matrícula e respetivos documentos pela entidade competente até ao termo do prazo para apresentação da declaração aduaneira de veículos – conforme artigo 11.º, n.2, do CISV.

- A liquidação de ISV aqui impugnada foi efetuada ao abrigo, entre outras, das normas ínsitas nos artigos 7.º - taxas normais - automóveis e 11.º - taxas – veículos usados, ambos do CISV.

- Conforme resulta desta disposição legal (i.e. artigo 11.º do CISV) e da Tabela D nela inserta, o ISV que incide sobre os veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados-membros da União Europeia tem em conta, mas apenas na componente cilindrada, o tempo de uso, aplicando uma percentagem de redução crescente, e que está associada à desvalorização comercial média dos veículos usados no mercado nacional.

- Sucede que a liquidação de ISV promovida pela AT, baseada maxime no artigo 11.º do CISV, enferma de ilegalidade por não ter sido considerada na componente ambiental qualquer percentagem de redução do imposto relativamente ao tempo de uso do veículo, mas apenas na componente cilindrada, o que contende com o disposto no primeiro parágrafo do artigo 110.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), disposição esta que estipula uma proibição da tributação interna discriminatória e que tem como objetivo último assegurar a livre circulação de mercadorias entre os Estados-membros, em condições normais de concorrência e mediante a eliminação de quaisquer formas de proteção que possam resultar na aplicação de imposições internas discriminatórias em relação aos produtos originários de outros Estados membros (vd., designadamente, Acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) de 18 de janeiro de 2007, Brzeziński, C 313/05, e de 7 de abril de 2011, Tatu, C 402/09).

- Num mercado interno, como aquele que é preconizado pelo projeto de construção europeia, toda a tributação discriminatória ou protecionista está proibida, e a ocorrer deve ser eliminada do sistema jurídico em causa.

- Analisando-se a referida norma do artigo 11.º do CISV, aplicável aos veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias, com vista a contemplar no cálculo do imposto devido a desvalorização comercial média dos veículos usados no mercado nacional, constata-se que a mesma prevê uma redução percentual pelo número de anos de uso do veículo, mas que esta incide apenas na componente cilindrada, deixando de fora a componente ambiental.

- Deste modo, a norma aplicada (i.e. artigo 11.º do CISV) na liquidação que aqui é contestada conduz a que seja cobrado, sobre os veículos “importados” de outros Estados-membros da União Europeia, um imposto determinado com base num valor superior ao valor real do veículo, onerando-os com uma tributação superior à que é aplicada aos veículos usados similares disponíveis no mercado nacional, pelo que não está garantida a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos nacionais e produtos “importados”.

- Acresce que, conforme o TJUE já referiu nos Acórdãos de 19 de setembro de 2002, Tulliasiamies e Siilin, C 101/00, e de 20 de setembro de 2007, Comissão/Grécia, C 74/06, a depreciação de um veículo começa no momento da sua compra ou da sua entrada em serviço.

- Com efeito, estabelece o artigo 110.º do TFUE - correspondente aos anteriores artigos 90.º do Tratado da Comunidade Europeia (TCE) e 95.º do Tratado de Roma (CEE) -, integrado sistematicamente no Título VII – As Regras Comuns Relativas à Concorrência, à Fiscalidade e à Aproximação das Legislações, Capítulo II – Disposições Fiscais – que: “- Nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares. - Além disso, nenhum Estado-Membro fará incidir sobre os produtos dos outros Estados membros imposições internas de modo a proteger indiretamente outras produções.”.

- Após citar doutrina em apoio do seu ponto de vista, refere que a liquidação impugnada está ferida de ilegalidade porquanto, sendo efetuada com base no artigo 11.º do CISV, atenta contra o direito comunitário, mormente contra o primeiro parágrafo do artigo 110.º do TFUE, na medida em que a tributação subjacente à mesma é diretamente discriminatória e mais gravosa para os veículos introduzidos no consumo em Portugal provenientes de outros Estados-membros da União Europeia do que a que recai sobre veículos usados transacionados no mercado nacional.

- Pois, quando a imposição que incide sobre o produto “importado” e a que incide sobre o produto nacional similar são calculadas de forma diferente conduzindo, ainda que pudesse ser apenas em certos casos, o que não é o caso presente, a uma imposição superior do produto “importado” existe uma inobservância daquela regra comunitária (vd. Acórdãos do TJUE de 2 de abril de 1998, Outokumpu, C-213/96; de 22 de fevereiro de 2001, Gomes Valente, C 393/98; de 19 de setembro de 2002, Tulliasiamies e Siilin, C 101/00; e de 20 de setembro de 2007, Comissão/Grécia, C 74/06). Ademais,

- Aduz que a evolução da redação legal inerente ao artigo 11.º do CISV é ela própria demonstrativa de uma praxis de ilegalidade face ao direito comunitário.

- Na sua redação inicial, previa-se que o imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados-membros da União Europeia fosse objeto de liquidação provisória feita em função da desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional, ponderados fatores como a respetiva marca, modelo, modo de propulsão, quilometragem, estado mecânico e de conservação, atentos os valores médios que resultam das publicações de referência no sector, apresentadas pelo interessado e reduzindo-se o imposto de acordo com a tabela seguinte:

- Isto significa que numa fase inicial, contudo apenas de 1 de julho de 2007 a 31 de dezembro de 2008, o coeficiente de desvalorização previsto na tabela D do artigo 11.º do CISV era aplicável a todo o ISV, sem destrinça daquele que resultava da componente cilindrada, como daquele que resultava da componente ambiental.

- Sucede que através do artigo 89.º da Lei n.º 64-A/2008, diploma que aprovou a Lei do Orçamento do Estado para 2009, com entrada em vigor a 1 de janeiro de 2009, passou-se a estipular que o imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados-membros da União Europeia seria objeto de liquidação provisória, com base na aplicação das percentagens de redução, previstas na tabela D, ao imposto resultante apenas da componente cilindrada da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização média dos veículos no mercado nacional, calculada com referência à desvalorização comercial média corrigida do respetivo custo de impacte ambiental: Tempo de uso Percentagem de redução De 6 meses a 1 ano 10 Mais de 1 a 2 anos 20 Mais de 2 a 3 anos 28 Mais de 3 a 4 anos 35 Mais de 4 a 5 anos 43 Mais de 5 a 6 anos 52 Mais de 6 a 7 anos 60 Mais de 7 a 8 anos 65 Mais de 8 a 9 anos 70 Mais de 9 a 10 anos 75 Mais de 10 anos 80 TABELA D Tempo de uso Percentagem de redução Mais de 1 a 2 anos 20 Mais de 2 a 3 anos 28 Mais de 3 a 4 anos 35 Mais de 4 a 5 anos 43 Mais de 5 anos 52 TABELA D

 - Esta redação legal esteve em vigor nos anos de 2009 e 2010, porquanto com o artigo 113.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, diploma que aprovou a Lei do Orçamento do Estado para 2011, a mesma foi revogada com efeitos desde 1 de janeiro de 2011.

- Assim, durante aqueles dois anos (i.e. 2009 e 2010), a percentagem de redução considerando o tempo de uso incidiu apenas sobre a componente cilindrada, mas já não sobre a componente ambiental.

- Com a redação dada ao artigo 11.º do CISV pelo artigo 113.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011, a percentagem de redução passou a incidir sobre as duas componentes, conforme se afere pelo texto legal, não se tendo, contudo, alterado a tabela aplicável: “O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória, com base na aplicação das percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização social média dos veículos no mercado nacional:”

- Em face da redação legal não prever qualquer percentagem de redução aplicada a situações em que o tempo de uso era inferior a 1 ano ou manter-se inalterável a percentagem de redução de 52% para as situações em que o tempo de uso era superior a 5 anos, a Comissão Europeia apresentou no TJUE, no dia 29 de abril de 2015, uma ação por incumprimento contra Portugal (processo C-200/15). Tempo de uso Percentagem de redução Mais de 1 a 2 anos 20 Mais de 2 a 3 anos 28 Mais de 3 a 4 anos 35 Mais de 4 a 5 anos 43 Mais de 5 anos 52 TABELA D

- Previamente, na sequência de uma troca de correspondência entre os serviços da Comissão e as autoridades portuguesas, a Comissão dirigiu a Portugal, em 22 de novembro de 2012, uma notificação para cumprimento porquanto considerava que o artigo 11º do CISV não respeitava o plasmado no artigo 110º TFUE.

- A este respeito, a Comissão Europeia salientou que do referido artigo 11º do CISV resultava uma discriminação dos veículos automóveis usados provenientes de outros Estados membros na medida em que o montante do referido imposto calculado nos termos deste artigo não refletia a desvalorização real sofrida pelos veículos automóveis usados similares já matriculados em Portugal e, em particular, porque, por um lado, nenhuma desvalorização dos veículos automóveis usados importados com menos de um ano era tida em conta e, por outro lado, a desvalorização dos veículos com mais de cinco anos estava limitada a uma percentagem de redução de 52%.

 - Na sua resposta de 30 de janeiro de 2013, Portugal contestou esta acusação, alegando que o regime nacional de tributação dos veículos automóveis usados provenientes de outros Estados membros não era discriminatório, uma vez que as tabelas de percentagens fixas e a possibilidade de os sujeitos passivos pedirem uma avaliação do veículo, previstas no artigo 11º do CISV, eram suscetíveis de garantir que o montante deste imposto não excedia o montante do imposto residual incorporado no valor dos veículos similares já matriculados em Portugal.

 - Não tendo ficado satisfeita com esta resposta, por carta de 27 de janeiro de 2014, a Comissão Europeia dirigiu a Portugal um parecer fundamentado no qual insistia que o método de cálculo do imposto sobre os veículos automóveis usados provenientes de outros Estados membros, conforme previsto na regulamentação nacional em causa, constituía uma violação do artigo 110.º TFUE, na medida em que a desvalorização real dos referidos veículos não era considerada para efeitos do cálculo do montante desse imposto.

- Como Portugal manteve a sua posição, a Comissão Europeia decidiu intentar uma ação por incumprimento junto do TJUE para que este declarasse que, ao aplicar, para efeitos da determinação do valor tributável dos veículos usados provenientes de outro Estado Membro, introduzidos no território português, um sistema relativo ao cálculo da desvalorização dos veículos que não tem em conta o valor real destes e, em particular, que não tem em conta a sua desvalorização antes de estes atingirem um ano, nem qualquer outra desvalorização desses veículos no caso de veículos com mais de cinco anos, Portugal não cumpriu os deveres que lhe incumbem por força do artigo 110º TFUE.

- Nesta esteira, o incumprimento do direito comunitário pelo Estado Português foi declarado pelo TJUE (sétima secção), através do seu Acórdão proferido a 16 de junho de 2016, no qual se sustentou haver uma discriminação porquanto: “a cobrança, por um Estado Membro, de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado Membro é contrária ao artigo 110º TFUE, quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional (vd., designadamente, acórdãos de 9 de março de 1995, Nunes Tadeu, C 345/93, e de 22 de fevereiro de 2001, Gomes Valente, C 393/98). (…) A República Portuguesa, ao aplicar, para efeitos da determinação do valor tributável dos veículos usados provenientes de outro Estado-Membro, introduzidos no território de Portugal, um sistema relativo ao cálculo da desvalorização dos veículos que não tem em conta a sua desvalorização antes de estes atingirem um ano, nem a desvalorização que seja superior a 52% no caso de veículos com mais de cinco anos, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.° TFUE.” – sublinhado pela Requerente.

- Na sequência deste Acórdão, o Legislador Português introduziu uma nova alteração ao artigo 11.º do CISV e à tabela D nele ínsita, através do artigo 217.º da Lei n.º 42/2016, de 27 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2017), e que entrou em vigor a 1 de janeiro de 2017, constatando-se que o Estado Português observou o decidido pelo TJUE, mormente ao alargar as percentagens de redução, para que as mesmas incidissem no primeiro ano de uso do veículo e se alargassem até aos 10 e mais anos de uso.

- Todavia, a par desta alteração, foi introduzida uma outra que consistiu na limitação da aplicação das percentagens de redução apenas à componente cilindrada, excluindo-a da componente ambiental atinente às emissões de CO2, conforme se constata: “1 – O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com exceção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional:”

 - Com esta alteração, o Legislador Português recuou ao regime vigente nos anos de 2009 e de 2010, retomando um normativo jurídico que tinha sido já objeto de um pré-contencioso instaurado pela Comissão Europeia e que esteve na base da alteração legislativa operada com a Lei n.º 55-A/2010 de 31 de dezembro, conforme “Informação nº .../2010, de 16/04/2010, da DSIECIV, emanada no âmbito do Processo nº 020.20.01/1-1/2010 (“Pré Contencioso – Carta Administrativa - Tributação de veículos usados em Portugal” respeitante a pedido de Tempo de uso Percentagem de redução Até 1 ano 10 Mais de 1 a 2 anos 20 Mais de 2 a 3 anos 28 Mais de 3 a 4 anos 35 Mais de 4 a 5 anos 43 Mais de 5 a 6 anos 52 Mais de 6 a 7 anos 60 Mais de 7 a 8 anos 65 Mais de 8 a 9 anos 70 Mais de 9 a 10 anos 75 Mais de 10 anos 80 TABELA D esclarecimento formulado em 24/03/2010 pela Comissão Europeia relativamente ao facto de não estar a ser aplicada (naquela data), “(…) qualquer redução à componente ambiental do ISV, aplicada aos veículo usados admitidos (…)” porquanto a Comissão entendia que tal comportamento do Estado Português “(…) contraria o disposto no artigo 90º do Tratado CE (agora artigo 110º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia)” – prova documental que foi junta pela Requerida no processo arbitral tributário n.º 572/2018-T e que aqui, e com base no permitido pelo artigo 429.º do Código do Processo Civil (CPC), se requer que seja a AT notificada para apresentar o mesmo documento, com vista a provar-se que já no ano de 2010, Portugal foi confrontado pela Comissão Europeia para com o incumprimento do normativo comunitário em face da desvalorização apenas incidir sobre a componente cilindrada.

- Para fundar a sua opinião de haver desconformidade do artigo 11.º, n.1, do CISV com o artigo 110.º do TFUE é citada vária doutrina.

- De seguida, a Requerente refere que a questão da conformidade com o direito comunitário das normas internas dos Estados membros relativos à tributação de veículos usados “importados” de outro Estado Membro tem vindo, de forma recorrente, a ser objeto de apreciação no TJUE.

- No Acórdão de 11 de dezembro de 1990, proc. C-47/88, Comissão das Comunidades Europeias vs. Reino da Dinamarca, considerou-se haver discriminação quando a matéria coletável do imposto é distinta para as duas situações (i.e. usados “nacionais” e usados “importados”), conforme se afere: “2. O facto de, num Estado-membro, não existir produção nacional de automóveis não exclui de forma alguma que se possa verificar, na tributação dos automóveis, uma discriminação proibida pelo artigo 95º do Tratado, pois no mercado nacional, e - de veículos usados, os veículos comprados no país, por um lado, e os veículos importados, por outro lado, constituem produtos similares ou concorrentes. Constitui tal discriminação o facto de estabelecer como matéria coletável do imposto de registo cobrado sobre os segundos um valor fixo geralmente superior ao seu valor real, o que conduz à sua sobre-tributação em relação aos primeiros, os quais, não sendo tributados aquando da sua revenda e tendo, enquanto veículos novos, sido apenas sujeitos, quando da sua primeira entrada em circulação após a importação, a uma tributação baseada no seu valor real, já só incorporam no seu preço um valor residual mínimo do mesmo imposto de registo.” 

- No Acórdão de 26 de junho de 1991, proc. C-152/89, Comissão das Comunidades Europeias vs. Grão-Ducado do Luxemburgo: “Deve recordar-se que o Tribunal de Justiça já declarou existir violação do primeiro parágrafo do artigo 95º quando a tributação aplicada ao produto importado e a aplicada ao produto nacional similar sejam determinadas de modo e segundo modalidades diferentes das quais resulte, nem que seja apenas em certos casos, uma tributação superior do produto importado.”.

- No caso português, debruçando-se sobre o sistema nacional de tributação automóvel, ainda na vigência do revogado IA, que precedeu o atual ISV, aquele Tribunal (quinta secção) não teve dúvida em declarar que: “A cobrança por um Estado-Membro de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-Membro é contrária ao artigo 95º do Tratado CEE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional.” – Acórdão de 9 de março de 1995, proc. C345/93 – Nunes Tadeu.

- Sobre a mesma matéria, e com referência aquele mesmo tributo, voltaria o TJUE (quinta secção) a pronunciar-se, no sentido de que: “O artigo 95.º, primeiro parágrafo, do Tratado só permite a um Estado-Membro aplicar aos veículos usados importados de outros Estados-Membros um sistema de tributação em que a depreciação do valor efetivo dos referidos veículos é calculada de modo geral e abstrato, com base em critérios ou tabelas fixas determinados por uma disposição legislativa, regulamentar ou administrativa, se esses critérios ou tabelas forem suscetíveis de garantir que o montante do imposto devido não excede, ainda que apenas em certos casos, o montante do imposto residual incorporado no valor dos veículos similares já matriculados no território nacional.” - Acórdão de 22 de fevereiro de 2001, proc. C-393/98 – Gomes Valente.

- Posteriormente, sustentou o TJUE (sexta seção): “Em matéria de tributação dos veículos automóveis usados importados, o Tribunal de Justiça considerou que o artigo 90º CE visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos que se encontram já no mercado nacional e produtos importados. Segundo jurisprudência bem assente, há violação do artigo 90º, primeiro parágrafo, CE sempre que a imposição que incide sobre o produto importado e a que incide sobre o produto nacional similar são calculadas de forma diferente e segundo modalidades diferentes que conduzam, ainda que apenas em certos casos, a uma imposição superior do produto importado.” – Acórdão de 29-04- 2004, proc. C-387/01.

- Destaca ainda as conclusões da Advogada-Geral Eleanor Sharpston, apresentadas em 13 de Julho de 2006, no âmbito do processo C-290/05.

“11. Pode inferir-se da referida jurisprudência que, para ser compatível com o primeiro parágrafo do artigo 90.º CE, na medida em que afete veículos usados, um imposto nacional cobrado apenas uma única vez relativamente a cada veículo, quando do respetivo primeiro registo num Estado -Membro, deve ser calculado de forma a evitar qualquer discriminação relativamente a esse tipo de veículos provenientes de outros Estados-Membros. Por conseguinte, um imposto desse tipo não pode constituir um encargo sobre os veículos usados superior ao imposto residual incluído no custo de veículos equivalentes registados pela primeira vez no mesmo Estado-Membro numa fase anterior da sua existência. 12. Nesses acórdãos, o Tribunal de Justiça também indicou, entre outros, que as regras específicas de cobrança do imposto devem ser tidas em conta na avaliação da compatibilidade com o artigo 90.º CE; que a prossecução de um objetivo ambiental não exime os Estados-Membros da necessidade de evitar a discriminação; que a desvalorização não tem necessariamente que ser avaliada em cada caso individual, podendo basear-se em índices ou tabelas que utilizem critérios adequados para fornecer um bom cálculo aproximativo da desvalorização; e que, um proprietário deve ter a possibilidade de impugnar a aplicação desses índices ou tabelas nos casos em que não tenham em conta as características reais de um determinado veículo.”

 - Prosseguindo: “Um imposto que incide sobre veículos automóveis usados quando da sua primeira colocação em circulação num Estado-Membro, cujo montante é calculado sem ter em consideração a depreciação efetiva do veículo, de tal modo que, quando aplicado a veículos usados importados de outros Estados-Membros, excede o montante de imposto residual incorporado no valor dos veículos usados similares já matriculados no território nacional, é, na medida desse montante excedentário, incompatível com o artigo 90.º, primeiro parágrafo, CE. Esta incompatibilidade não é afetada pelo facto de o imposto em causa prosseguir objetivos relacionados com a proteção do ambiente ou de ser cobrado unicamente com base em critérios objetivos relevantes para efeitos desta proteção.”

- Determinando o TJUE, no âmbito dos processos C-290/05 e C-333/05, a 5 de outubro de 2006: “Assim, não obstante o carácter ambiental do objetivo e do fundamento do imposto automóvel e mesmo não tendo estes qualquer relação com o valor de mercado do veículo, o artigo 90.º, primeiro parágrafo, CE exige que seja tida em conta a depreciação dos veículos usados que são objeto de tributação, visto que esse imposto se caracteriza por ser apenas cobrado uma vez quando do primeiro registo do veículo para efeitos da sua utilização no Estado-Membro em causa e por ser desta forma incorporado no referido valor.”.

 - No Acórdão de 18 de janeiro de 2007, proc. C-313/05, Brzeziński: “Como já foi decidido pelo Tribunal de Justiça, o artigo 90º CE constitui, no sistema do Tratado CE, um complemento das disposições relativas à supressão dos direitos aduaneiros e dos encargos de efeito equivalente. Essa disposição tem por objetivo assegurar a livre circulação das mercadorias entre os Estados Membros, em condições normais de concorrência, através da eliminação de qualquer forma de proteção que possa resultar da aplicação de imposições internas discriminatórias relativamente a produtos originários de outros Estados-Membros (acórdão de 15 de Junho de 2006, Air Liquide Industries Belgium, C-393/04 e C-41/05, Colect, p. I-5293, n.° 55 e jurisprudência aí referida, e acórdão Nádasdi e Németh, já referido, n.° 45). Em matéria de tributação de veículos automóveis usados importados, o Tribunal de Justiça considerou igualmente que o artigo 90º CE visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre os produtos que já se encontram no mercado nacional e os produtos importados (v. acórdão de 29 de Abril de 2004, Weigel, C-387/01, Colect, p. I-4981, n.° 66 e jurisprudência aí referida, e acórdão Nádasdi e Németh, já referido, n.° 46). De acordo com jurisprudência assente, há violação do artigo 90º, primeiro parágrafo, CE sempre que a imposição que incide sobre o produto importado e a que incide sobre o produto nacional similar são calculadas de forma diferente e segundo modalidades diferentes que conduzam, ainda que apenas em certos casos, a uma tributação superior do produto importado (v. acórdão Weigel, já referido, n.° 67 e jurisprudência aí referida). Assim, nos termos da referida disposição, um imposto especial sobre o consumo que incide sobre os produtos originários de outros Estados-Membros não pode ser superior ao que incide sobre os produtos nacionais similares.”

 - No âmbito deste processo (C-313/05), importa também atentar nas conclusões da Advogada Geral Eleanor Sharpston, apresentadas em 21 de setembro de 2006: “51. O Governo polaco invocou três considerações que, em sua opinião, justificam o método de cálculo utilizado. Vou expor essas considerações resumidamente, apesar de não existir nada no Tratado ou na jurisprudência do Tribunal de Justiça que permita justificar uma imposição discriminatória contrária ao artigo 90º CE. 52. Em primeiro lugar, aquele governo destaca razões ambientais, que fazem parte dos objetivos fundamentais da Comunidade Europeia, estabelecidos no artigo 2.° CE. Os automóveis mais antigos são, em geral, mais poluentes e, portanto, justifica-se desincentivar a sua compra através de uma tributação diferenciada. 53.Todavia, conforme recordei nas minhas conclusões no processo Nádasdi 22, a finalidade do artigo 90º CE é proibir qualquer imposição interna que, em igualdade de circunstâncias quanto ao resto, onere produtos de outros Estados-Membros de forma mais gravosa que produtos nacionais similares. Um imposto não escapa a essa proibição pelo mero facto de, para além do seu objetivo fundamental de gerar receitas, procurar favorecer produtos ou hábitos «amigos» do ambiente. Pelo contrário, se prosseguir tal finalidade deve fazê-lo de maneira a não onerar os produtos nacionais menos do que os importados de outros Estados-Membros.”

- Por fim, pela importância da fundamentação e pela sua atualidade, importa destacar o Despacho do TJUE, de 17 de abril de 2018, no processo C-640/17, no âmbito do reenvio prejudicial, efetuado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, a respeito de um veículo matriculado pela primeira vez em 20 de Outubro de 1966 no Reino Unido, ao qual foi atribuída nova matrícula em Portugal em 31 de Maio de 2013 e que foi objeto de um ato de liquidação de IUC em 2014: “12 - Há que começar por recordar que o artigo 110.º TFUE tem por objetivo assegurar a livre circulação de mercadorias entre os Estados-Membros, em condições normais de concorrência. Este artigo visa eliminar qualquer forma de proteção que possa resultar da aplicação de imposições internas discriminatórias aos produtos provenientes de outros Estados-Membros (Acórdão de 9 de junho de 2016, Budişan, C-586/14, EU:C:2016:421, n.° 19 e jurisprudência referida). 13 - Para o efeito, o artigo 110º, primeiro parágrafo, TFUE proíbe os Estados-Membros de fazerem incidir sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas superiores às que incidem sobre os produtos nacionais similares (Acórdão de 9 de junho de 2016, Budişan, C-586/14, EU:C:2016:421, n.° 20). 14 - A este respeito, segundo jurisprudência constante, um sistema de tributação só pode ser considerado compatível com o artigo 110º TFUE se se demonstrar que está organizado de modo a excluir, em todas as hipóteses, que os produtos importados sejam tributados mais fortemente do que os produtos nacionais e, portanto, que não comporta, em caso algum, efeitos discriminatórios (Acórdãos de 19 de março de 2009, Comissão/Finlândia, C-10/08, não publicado, EU:C:2009:171, n.° 24, e de 19 de dezembro de 2013, X, C-437/12, EU:C:2013:857, n.° 28). 15 - Por outro lado, o Tribunal já declarou que, em matéria de tributação dos veículos automóveis usados importados, o artigo 110º TFUE visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que respeita à concorrência entre os produtos que já se encontram no mercado nacional e os produtos importados (Acórdãos de 17 de julho de 2008, Krawczyński, C-426/07, EU:C:2008:434, n.° 31, e de 3 de junho de 2010, Kalinchev, C-2/09, EU:C:2010:312, n.° 31). 16 - Ora, os veículos automóveis presentes no mercado de um Estado-Membro são produtos nacionais do mesmo, na aceção do artigo 110º TFUE. Quando esses produtos são vendidos no mercado dos veículos usados desse Estado-Membro, devem ser considerados produtos análogos aos veículos usados importados do mesmo tipo, com as mesmas características e com o mesmo desgaste. Com efeito, os veículos usados comprados no mercado do referido Estado-Membro e os comprados, para importação e entrada em circulação no mesmo, noutros Estados-Membros constituem produtos concorrentes (Acórdãos de 7 de abril de 2011, Tatu, C-402/09, EU:C:2011:219, n.° 55, e de 7 de julho de 2011, Nisipeanu, C-263/10, não publicado, EU:C:2011:466, n.° 24). 17 Daqui resulta que o artigo 110.° TFUE obriga cada Estado-Membro a escolher e a estruturar os impostos que incidem sobre os veículos automóveis de maneira a não terem por efeito favorecer a venda de veículos usados nacionais e desencorajar desse modo a importação de veículos usados similares (Acórdãos de 7 de abril de 2011, Tatu, C-402/09, EU:C:2011:219, n.° 56, e de 7 de julho de 2011, Nisipeanu, C-263/10, não publicado, EU:C:2011:466, n.° 25).”.

 - Com base nesta fundamentação e numa interpretação conforme ao direito comunitário, o Supremo Tribunal Administrativo (STA), no processo 0305/14.3BEPRT, de 22 de janeiro de 2020, decretou que esta diferença de tratamento era violadora do disposto no artigo 110.º do TJUE. 

- Refere, ainda, que existem até ao momento presente várias decisões arbitrais incidentes sobre esta temática, cujas decisões foram favoráveis aos sujeitos passivos que as interpuseram, que identifica.

- A desconformidade da redação atual do artigo 11.º do CISV com o direito comunitário conduziu ao início de um (novo) procedimento de infração instaurado pela Comissão Europeia contra Portugal, por este não ter em conta a componente ambiental no cálculo do ISV aplicável aos veículos usados “importados” de outros EM, gerando efeitos discriminatórios nestes veículos face aos veículos usados adquiridos em território nacional.

 - Conforme comunicado de 24 de janeiro de 2019, a Comissão Europeia deu início a um procedimento de infração contra Portugal “por este Estado-Membro não ter em conta a componente ambiental do imposto de matrícula aplicável aos veículos usados importados de outros Estados-Membros para fins de depreciação. A Comissão considera que a legislação portuguesa não é compatível com o artigo 110.º do TFUE, na medida em que os veículos usados importados de outros Estados-Membros são sujeitos a uma carga tributária superior em comparação com os veículos usados adquiridos no mercado português, uma vez que a sua depreciação não é plenamente tida em conta. Se Portugal não atuar no prazo de dois meses, a Comissão poderá enviar um parecer fundamentado sobre esta matéria às autoridades portuguesas.”.

 - Entretanto, a 27 de novembro de 2019, a Comissão Europeia decidiu enviar um parecer fundamentado a Portugal “por tributar veículos usados importados de outros Estados-Membros mais do que os automóveis usados adquiridos no mercado português. Atualmente, a legislação portuguesa não tem plenamente em conta a depreciação de veículos importados de outros Estados-Membros, pelo que a legislação portuguesa não é compatível com o artigo 110.º do TFUE. O Tribunal de Justiça Europeu tinha já concluído, em 16 de junho de 2016 (Acórdão C200/15), que uma versão anterior deste imposto português era contrária ao direito da UE. Se Portugal não atuar no prazo de um mês, a Comissão pode decidir remeter o processo para o Tribunal de Justiça da UE.”.

- De acordo com o artigo 258.º do TFUE, “se a Comissão considerar que um Estado Membro não cumpriu qualquer das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados, formulará um parecer fundamentado sobre o assunto, após ter dado a esse Estado oportunidade de apresentar as suas observações. Se o Estado em causa não proceder em conformidade com este parecer no prazo fixado pela Comissão, esta pode recorrer ao Tribunal de Justiça da União Europeia.”.

- Em conformidade, a 12 de fevereiro de 2020, é comunicado que em face da persistência de Portugal na manutenção do regime inerente ao artigo 11.º do CISV, a “Comissão decidiu instaurar uma ação contra Portugal junto do Tribunal de Justiça da União Europeia por não ter alterado as regras do imposto de matrícula sobre os veículos usados importados. Ao abrigo das regras da UE, nenhum Estado-Membro deve fazer incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas superiores às que incidam sobre produtos nacionais similares. A legislação portuguesa em causa não tem plenamente em conta a depreciação dos veículos usados importados de outros Estados-Membros. Isso resulta numa tributação mais elevada desses veículos importados em comparação com veículos nacionais semelhantes, o que não é compatível com o artigo 110.º do TFUE. O Tribunal de Justiça Europeu já concluiu, em 16 de junho de 2016 (Acórdão C-200/15), que uma versão anterior deste imposto português era contrária ao direito da União. A decisão de remeter a questão para o Tribunal de Justiça decorre do facto de Portugal não ter alterado a sua legislação para a tornar conforme com o direito da UE, na sequência do parecer fundamentado da Comissão.”, conforme decorre do documento que se junta e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

- Em 23 de abril de 2020, a Comissão Europeia apresentou junto do TJUE uma ação contra a República Portuguesa, e que segue atualmente o seus termos como Processo – C-169/20, na qual pediu ao Tribunal para que este “declare que, ao não desvalorizar a componente ambiental no cálculo do valor aplicável aos veículos usados introduzidos no território da República Portuguesa e adquiridos noutros Estados-Membros no âmbito do cálculo do imposto de registo, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”.

- E para isso a Comissão Europeia apresenta os seguintes fundamentos e argumentos: “A legislação portuguesa em causa consagra uma discriminação entre a tributação que incide sobre o veículo importado e aquela que incide sobre o veículo nacional similar. As modalidades e a forma de cálculo em vigor levam a que a tributação do veículo importado seja quase sempre mais elevada. Esta situação é tanto mais preocupante quanto ela é contrária à jurisprudência assente do Tribunal de Justiça: a legislação portuguesa relativa ao cálculo do imposto aplicável aos veículos usados adquiridos noutros Estados-Membros já foi objeto de procedimentos de infração anteriores e de vários acórdãos do Tribunal de Justiça. A legislação portuguesa não garante que os veículos usados importados de outros Estados-Membros sejam tributados num montante que não exceda o imposto refletido nos veículos usados domésticos similares. Tal pode ser explicado pelo facto de, em consequência da alteração da legislação em 2016, a componente ambiental utilizada para calcular o valor de um veículo usado não ser desvalorizada. Daqui resulta que a tabela de desvalorização adotada pela legislação nacional não conduz a uma aproximação razoável do valor real do veículo usado importado. Consequentemente, o montante pago para registar um veículo usado importado excede o montante relativo a um veículo usado similar já registado em Portugal, o que configura uma violação do artigo 110.º do TFUE e da jurisprudência do Tribunal de Justiça.” 

- O princípio do primado do Direito Comunitário sobre o Direito Nacional foi erguido pelo TJUE a partir da constatação de que a transferência de competências efetuada pelos Estados-membros em favor das instituições europeias, ainda que em domínios determinados, implicou uma limitação definitiva dos poderes soberanos de que os Estados-membros eram titulares.

- De acordo com o TJUE tal princípio implica que os Estados-membros devem respeitar e fazer respeitar o direito da União, não aplicando direito nacional não conforme ou incompatível com o direito da União e suprimir ou, no mínimo, reparar os efeitos de atos nacionais que lhe sejam contrários.

 - Cabendo aos Estados-membros respeitar uma ordem jurídica autónoma, quer quanto às fontes, quer quanto à autoridade, o direito “nascido” do Tratado (ou em ordem a alcançar os seus objetivos) não pode, em razão da sua específica natureza, encontrar um limite em qualquer disposição interna sem que resulte abalado o fundamento jurídico da União Europeia.

- Neste sentido, o princípio do primado já se antevia no Acórdão Van Gend en Loos, processo 26/62, de 5 de fevereiro de 1963, do TJUE, na medida em que ao consagrar o efeito direto das normas do Tratado, implicava que a regra nacional confrontante não devesse ser aplicada.

- Sendo que foi no Acórdão Costa vs. ENEL, processo 6/64, de 15 de julho de 1964, que o TJUE claramente o delimita: “diversamente do que acontece com os tratados internacionais ordinários, o tratado CEE instituiu um ordenamento jurídico próprio, integrado nos ordenamentos jurídicos dos Estados-membros desde a entrada em vigor do Tratado e que se impõe às suas jurisdições.”.

- Daí derivaria “a impossibilidade, para os Estados, de fazerem prevalecer, contra um ordenamento jurídico por eles aceite sob condição de reciprocidade, um ato unilateral ulterior, o qual não poderá assim ser oponível à ordem comum”.

 - Deste modo, um Estado não pode invocar uma disposição do seu direito interno, mesmo que seja do ramo constitucional, para impedir a aplicação de uma disposição de direito comunitário que esteja em vigor, cf. Acórdão do TJUE, San Michele, processos 9 e 58/64, de 2 de junho de 1965.

 - Da mesma maneira, o Juiz nacional tem a obrigação de aplicar integralmente o direito comunitário e de conferir proteção aos direitos que este atribui aos particulares, e que tenham efeito direto, deixando inaplicável toda e qualquer norma nacional contrária, incluindo as regras nacionais que delimitam a sua competência.

- Como determinou o TJUE, no Acórdão Simmenthal, de 9 de março de 1978, processo 106/77, o dever de desaplicação por parte dos Estados-membros da norma interna contrária a norma comunitária impende imediatamente sobre qualquer juiz nacional, não sendo necessário esperar pela sua revogação, nem por declaração de inconstitucionalidade da mesma. 

- O Princípio do Efeito Direto das Normas Comunitárias permite que um particular invoque uma norma comunitária junto de um tribunal nacional ou europeu para afastar assim a norma nacional que lhe é desfavorável.

 - O efeito direto do direito europeu foi consagrado pelo TJUE no sobredito acórdão Van Gend en Loos, quando sustentou que o direito europeu acarreta obrigações para os Estados da União Europeia, mas também direitos subjetivos para os particulares.

- Os particulares podem assim prevalecer-se destes direitos e invocar diretamente normas europeias perante jurisdições nacionais, não sendo necessário que o país da União Europeia integre a norma europeia em questão na sua ordem jurídica interna.

- No que diz respeito ao direito primário, ou seja, aos textos de base da ordem jurídica europeia, o TJUE estabeleceu no acórdão Van Gend en Loos o princípio do efeito direto, não obstante, indicou, como condição para o mesmo, que as obrigações devem ser precisas, claras, incondicionais e não devem requerer medidas complementares, de carácter nacional ou europeu.

 - Com base neste quadro, o TJUE declarou que a disposição da não-discriminação fiscal (i.e. e que atualmente deriva do artigo 110.º do TFUE) é clara, incondicional e não carece de quaisquer medidas complementares, de caráter nacional ou europeu (vd. por exemplo, Acórdãos de 16 de junho de 1966, no processo 57/65, Lütticke, Rewe-Zentrale des Lebensmittel-Großhandels GmbH, de 17 de fevereiro de 1976, processo 45/75, acórdão de 22 de Fevereiro de 2001, Gomes Valente, C-393/98).

- No Acórdão Lütticke, Rewe-Zentrale des Lebensmittel-Großhandels GmbH, de 17 de fevereiro de 1976, processo 45/75: “Em primeiro lugar, pretende-se saber se o primeiro parágrafo do artigo 95° constitui, no final do período de transição, na esfera jurídica dos nacionais dos Estados-membros, direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais devem proteger. Tal como o Tribunal declarou no seu acórdão de 16 de Junho de 1966, no processo 57/65 (Lütticke, Colect. 1965-1968, p. 361), esta disposição produz efeitos imediatos e constitui, em proveito dos interessados, direitos individuais que os órgãos jurisdicionais internos devem proteger.”

 - Consequente, é incontestável que o artigo 110.º do TFUE beneficia do princípio do efeito direito.

 - Convém ainda atentar que as decisões do TJUE constituem fonte de direito imediata, permitindo com isso a uniformidade e a harmonização na aplicação do direito da União nos Estados membros.

- Nesta esteira, a jurisprudência do TJUE beneficia do denominado “precedente vinculativo”, ou seja, as decisões do TJUE vinculam todos os tribunais nacionais dos Estados-membros (cf. Acórdão de 15 de julho de 1964, processo Costa/Enel – 6/64). 

- Também, nos termos do artigo 8.º, n.4, da Constituição da República Portuguesa (CRP): “As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respetivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático.”.

- Concluindo a Requerente que o Direito Comunitário prevalece sobre o Direito Interno Português e é diretamente aplicável em território nacional. 

- A Requerente refere, ainda, que a Proposta de Lei 61/XIV (que contém a Proposta do Orçamento do Estado para 2021) vem prever uma alteração legal ao artigo 11.º do CISV, no sentido da percentagem de redução do imposto considere também a componente ambiental.

- Em sede de enquadramento desta alteração legal, o Relatório do OE2021 anuncia que: “Por forma salvaguardar os ambiciosos objetivos ambientais do País e a incorporar o essencial das preocupações levantadas pela Comissão Europeia em matéria de compatibilidade com o direito europeu, prevê-se, à semelhança do que já sucede com a componente cilindrada do ISV, que os veículos usados provenientes de Estados-membros da União Europeia passem a beneficiar de um desconto sobre a componente ambiental do ISV, o qual, ao contrário do que sucede com a componente cilindrada, não estará associado à desvalorização comercial média dos veículos, mas antes à sua vida útil média remanescente (medida por referência à idade média dos veículos enviados para abate), por se entender que mesma é uma boa métrica do horizonte temporal de poluição do veículo, assegurando-se, deste modo, que os carros poluentes serão justamente tributados à entrada em Portugal.”

- Entendendo a Requerente que se trata do reconhecimento do Estado Português, de que atualmente existe uma situação discriminatória na entrada de veículos vindos de outro Estado da União Europeia e que tal situação é uma preocupação da Comissão Europeia por consubstanciar-se numa ostensiva incompatibilidade com o direito europeu.

- Concluindo a Requerente outra não poderá ser a decisão arbitral do que determinar a anulação parcial da liquidação de ISV aqui em causa.

 - Porquanto, o ato de liquidação padece de uma flagrante ilegalidade, porquanto assenta em pressupostos de direito desajustados do normativo comunitário, já que subjaz à sua aplicação um efetivo tratamento fiscal discriminatório. 

- A liquidação impugnada, e o normativo subjacente a ela (maxime o artigo 11.º do CISV) viola o artigo 110.º do TFUE, quando este preceito proíbe que as imposições aplicáveis aos produtos provenientes de um outro Estado-Membro sejam superiores ou mais onerosas do que as imposições colocadas aos produtos similares nacionais.

- Relativamente ao seu Pedido Subsidiário, sustenta-o baseado em doutrina que apresenta.

- A Requerente aduz, ainda, que no caso de ser anulado parcialmente o ato de liquidação de ISV aqui visado, para além da devolução do ISV pago a mais pela Requerente, o ressarcimento desta através dos exigíveis juros indemnizatórios, conforme plasmado nos artigos 43.º e 100.º da Lei Geral Tributária, bem como no artigo 61.º do CPPT.

 - De acordo com o disposto no n.1 do artigo 43.º da LGT: “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”.

-Por sua vez, estipula o artigo 100.º da LGT, sob a epígrafe “Efeitos de decisão favorável ao sujeito passivo” que, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, a AT está obrigada à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo, nesta reconstituição, o pagamento de juros indemnizatórios.

- Para além dos meios referidos na norma que se transcreve, entende-se que, conforme decorre do n.5 do artigo 24.º do RJAT, o direito aos mencionados juros pode ser reconhecido no processo arbitral, citando para o efeito doutrina e jurisprudência, designadamente o Acórdão do STA, de 29 de maio de 2002, processo n.º 0114/02: “A violação do direito comunitário por parte da Administração Pública portuguesa integra o conceito de erro imputável aos serviços, para efeito de condenação em juros indemnizatórios.”.

- Constando, ainda, na sua fundamentação, “É jurisprudência pacífica deste STA que a violação do direito comunitário pelas autoridades públicas portuguesas constitui erro imputável aos serviços para efeito do disposto no artº 43º, nº 1, da Lei Geral Tributária. E esta jurisprudência está certa, pois o Estado Português, pelas suas autoridades legislativas, administrativas ou judiciais, está obrigado a cumprir o direito comunitário, nos termos do artº 10º do Tratado de Roma.”.

- A Requerente solicita que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, a liquidar a final, no momento do reembolso do imposto pago indevidamente, porquanto a mesma pagou imposto por montante superior ao devido e que tal derivou de erro de direito imputável em exclusivo aos serviços da AT.

- Os juros indemnizatórios deverão ser calculados à taxa legal de 4%, nos termos dos artigos 35.º, n.10 e 43.º, n.4, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril, sobre o montante indevidamente cobrado, sendo contados desde a data do pagamento até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos.

- Em conclusão, a Requerente, requer ao Tribunal Arbitral que seja julgada provada e procedente a ação arbitral, e consequentemente, determinada a anulação parcial do ato de liquidação de Imposto sobre Veículos (ISV) aqui impugnado, e que se desdobra concretamente nos n.ºs (ano/liquidação) 2020/... e 2020/..., de 20/08/2020 e 24/08/2020, respetivamente, resultante da apresentação pela Requerente da declaração aduaneira de veículo (DAV), à qual foi atribuído o n.º 2020/..., cuja data limite para pagamento terminou, respetivamente, a 03/09/2020 e 07/09/2020, no valor total de € 18.020,40, mas que aqui se contesta, a título principal, no valor de € 7.010,50, referente estritamente à desconsideração do tempo de uso na componente ambiental, em virtude do erro sobre os pressupostos de direito de que padece ao infringir o artigo 110.º do TFUE e a sua proibição de discriminação fiscal, e que, em sequência, determine a devolução à Requerente do valor indevidamente cobrado e já pago a este título, a que deverão acrescer os juros indemnizatórios peticionados, à taxa legal aplicável, sobre o montante indevidamente cobrado, a liquidar a final, no momento do reembolso do imposto pago indevidamente.

- A título meramente subsidiário, caso o Tribunal Arbitral considere ser o ISV um imposto indivisível, requer a anulação total da liquidação visada na presente ação arbitral, com as inerentes consequências ao nível do reembolso do imposto pago e juros indemnizatórios devidos.

 

F- RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS

Em resposta veio a Requerida alegar o seguinte:

 - Conforme resulta dos elementos constantes do Processo Administrativo (PA) constituído pelo procedimento atinente à introdução no consumo efetuada através da Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) n.º 2020/..., de 26.08.2020 (com data de aceitação de 20.08.2020), da Alfândega de Aveiro, relativo a Imposto Sobre Veículos (ISV), com referência ao veículo automóvel com as características descritas na declaração, foi a DAV apresentada naquela estância aduaneira, por transmissão eletrónica de dados, para introdução no consumo do veículo, ligeiro de passageiros, usado, proveniente da Alemanha.

 - Com referência à mencionada DAV, foi apresentado o veículo da marca ..., modelo..., ao qual foi atribuída a matrícula nacional ... cujas características constam das inscrições do Quadro E.

- Quanto ao veículo em questão constata-se que, para efeitos de aplicação da tabela D prevista no n.º 1 do artigo 11.º do CISV, se insere no escalão da tabela correspondente à redução de 52%, conforme resulta da referida tabela.

 - No Quadro E da DAV (características do veículo), consta, na casa 50, quanto à Emissão de Gases CO2, o valor de 180 g/Km.

 - O cálculo do imposto sobre veículos, que consta do Quadro R da DAV, foi efetuado com recurso à tabela A, aplicável aos veículos ligeiros de passageiros, e calculado o ISV atendendo à componente cilindrada e à componente ambiental, nos termos do artigo 7.º do CISV, tendo, igualmente, sido deduzida a percentagem de redução correspondente, conforme o disposto na tabela D constante do n.º 1 do artigo 11.º do CISV, prevista para os veículos usados, em função do número de anos de uso do veículo.

 - A liquidação do imposto, relativa à introdução no consumo do veículo, foi concretizada conforme indicado no Quadro T da declaração, constando desta, igualmente, a identificação dos atos de liquidação e data (n.º 2020/..., de 20.08.2020, e n.º 2020/..., de 24.08.2020), montante, termo final do prazo de pagamento (que ocorreu, respetivamente, em 03.09.2020 e 07.09.2020), data de cobrança e a identificação do autor do ato.

 - A Requerida, refere, ainda que o regime do imposto sobre veículos encontra-se previsto no Código do Imposto sobre Veículos (CISV), aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, constando do Capítulo I (artigos 1.º a 11.º) os princípios e regras gerais atinentes a este tributo.

 - Referindo-se os Capítulos II e III ao estatuto dos sujeitos passivos e à introdução no consumo, respetivamente (artigos 12.º a 29.º) e o Capítulo V (Secção I) aos regimes suspensivos da admissão e importação temporária de veículos no território nacional (artigos 30.º a 33.º).

- Para o enquadramento legal da questão ora submetida à sindicância do tribunal, releva, particularmente, o artigo 5.º do CISV, atinente ao facto gerador de imposto sobre veículos, de acordo com o qual: «1 - Constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal. 2 - Constitui ainda facto gerador do imposto: a) A atribuição de matrícula definitiva após o cancelamento voluntário da matrícula nacional feito com reembolso de imposto ou qualquer outra vantagem fiscal; b) A transformação de veículo que implique a sua reclassificação fiscal numa categoria a que corresponda uma taxa de imposto mais elevada ou a sua inclusão na incidência do imposto, a mudança de chassis ou a alteração do motor de que resulte um aumento de cilindrada ou das emissões de dióxido de carbono ou partículas; c) A cessação ou violação dos pressupostos da isenção de imposto ou o incumprimento dos condicionalismos que lhe estejam associados; d) A permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no presente código. 3 - Para efeitos do presente código entende-se por: a) «Admissão», a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-membro da União Europeia em território nacional; b) «Importação», a entrada de um veículo originário de país terceiro em território nacional. 4 - Sem prejuízo das obrigações declarativas previstas nos artigos 18.º e 19.º, quando, à entrada em território nacional, os veículos tributáveis forem colocados em regime de suspensão de imposto, considera-se gerado o imposto no momento em que se produza a sua saída desse regime.» 

- Dispondo o artigo 3.º do CISV, no que concerne à Incidência subjectiva, que: “(…) «1 - São sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares, tal como definidos pelo presente código, que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando-se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos. 2 - São ainda sujeitos passivos do imposto as pessoas que, de modo irregular, introduzam no consumo os veículos tributáveis.» 

- Sendo que, quanto à exigibilidade, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 6.º, com referência ao n.º 1 do artigo 5.º, o imposto torna-se exigível no momento da introdução no consumo, considerando-se esta verificada: «a) No momento da apresentação do pedido de introdução no consumo pelos operadores registados e reconhecidos; b) No momento da apresentação da declaração aduaneira de veículos pelos particulares. 2 - Nos casos mencionados no n.º 2 do artigo anterior considera-se verificada a introdução no consumo no momento da ocorrência do facto gerador do imposto ou, sendo este indeterminável, no momento da respectiva constatação. 3 - A taxa de imposto a aplicar é a que estiver em vigor no momento em que este se torna exigível.»

- Estabelecendo, quanto às taxas do imposto, o artigo 7.º (Taxas normais – automóveis) do CISV, nas alíneas a) e b) do n.º 1, que consagra a aplicação das taxas previstas na Tabela A, tendo em conta as componentes cilindrada e ambiental, aos veículos automóveis de passageiros, e aos automóveis ligeiros de utilização mista e aos automóveis ligeiros de mercadorias, que não sejam tributados pelas taxas reduzidas nem pela taxa intermédia, havendo, ainda, lugar à redução em função da desvalorização do veículo, conforme previsto no artigo 11.º do CISV.

 - E, estando em causa, nos presentes autos, a admissão de um veículo usado, oriundo de outro Estado-membro, deve atender-se, especificamente, ao artigo 11.º do CISV na redação em vigor à data dos factos.

 - Não obstante o artigo 11.º do CISV tenha sido objeto de várias alterações desde a sua entrada em vigor, para o caso em apreço releva, particularmente, a redação introduzida pela Lei n.º 42/2016, de 28.12.2016 (Lei do Orçamento para 2017), que dispunha o seguinte: Taxas - veículos usados “1 - O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com exceção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional: TABELA-D 2 - Para efeitos de aplicação do número anterior, entende-se por «tempo de uso» o período decorrido desde a atribuição da primeira matrícula e respectivos documentos pela entidade competente até ao termo do prazo para apresentação da declaração aduaneira de veículos. 3 - Sem prejuízo da liquidação provisória efetuada, sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto apurado nos termos do nº 1 excede o imposto calculado por aplicação da fórmula a seguir indicada, pode requerer ao director da alfândega, mediante o pagamento prévio de taxa a fixar por portaria do membro do governo responsável pela área das finanças, e até ao termo do prazo de pagamento a que se refere o nº 1 do artigo 27º, que a mesma seja aplicada à tributação do veículo, tendo em vista a liquidação definitiva do imposto: ISV é igual a (V/VR x Y) +C) Em que: ISV representa o montante do imposto a pagar; V representa o valor comercial do veículo, tomando por base o valor médio de referência determinado em função da marca, modelo e respectivo equipamento de série, da idade, do modo de propulsão e da quilometragem média de referência, constante das publicações especializadas do sector, apresentadas pelo interessado; VR é o preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, tal como declarado pelo interessado, considerando-se como tal o veículo da mesma marca, modelo e sistema de propulsão, ou, no caso de este não constar de informação disponível, de veículo similar, introduzido no mercado nacional, no mesmo ano em que o veículo a introduzir no consumo foi matriculado pela primeira vez. Y representa o montante do imposto calculado com base na componente cilindrada, tendo em consideração a tabela e a taxa aplicável ao veículo, vigente no momento da exigibilidade do imposto; C é o custo de impacte ambiental, aplicável a veículos sujeitos à tabela A, vigente no momento da exigibilidade do imposto, e cujo valor corresponde à componente ambiental da referida tabela. 4 - Na falta de pedido de avaliação formulado nos termos do número anterior presume-se que o sujeito passivo aceita como definitiva a liquidação do imposto feita por aplicação da tabela constante do n.º 1.”

 - Relevando, também, no contexto da tributação automóvel, o disposto no artigo 1.º do CISV que consagra o Princípio da Equivalência, de acordo com o qual: “O imposto sobre veículos obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente, infraestruturas viárias e sinistralidade rodoviária, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária.”

- E, não obstante o artigo 110.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), correspondente ao anterior artigo 90.º do TCE, afirme que: “Nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares. (…)”

 - É de destacar o estatuído no artigo 191.º do TFUE, que consagra, expressamente, que: “1. A política da União no domínio do ambiente contribuirá para a prossecução dos seguintes objetivos: - a preservação, a proteção e a melhoria da qualidade do ambiente, - a proteção da saúde das pessoas, - a utilização prudente e racional dos recursos naturais, - a promoção, no plano internacional de medidas destinadas a enfrentar os problemas regionais ou mundiais do ambiente e designadamente, a combater as alterações climáticas.” 2. A política da União no domínio do ambiente terá por objetivo atingir um nível de proteção elevado, tendo em conta a diversidade das situações existentes nas diferentes regiões da União. Basear-se-á nos princípios da precaução e da ação preventiva, da correção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente e do poluidor-pagador. Neste contexto, as medidas de harmonização destinadas a satisfazer exigências em matéria de proteção do ambiente incluirão, nos casos adequados, uma cláusula de salvaguarda autorizando os Estados-Membros a tomar, por razões ambientais não económicas, medidas provisórias sujeitas a um processo de controlo da União. (…)

 - Acrescendo que, o artigo 66.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra, designadamente, o seguinte, quanto ao ambiente e qualidade de vida: “1. Todos têm direito a um ambiente humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender. 2.Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com a participação dos cidadãos: (…) a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão; (…) f) Promover a integração de objectivos ambientais nas várias políticas de âmbito sectorial; g)Promover a educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente; h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida.

- E que o artigo 103.º (Sistema fiscal), também da CRP, estabelece que: “1. O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza. 2. Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes. 3. Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei.

 - Alega a Requerida que a Requerente defende que a liquidação de ISV é ilegal por violação do artigo 110.º do TFUE, por não ter sido aplicada a redução de anos de uso à componente ambiental, devendo ser parcialmente anulada na parte em que não se fez aplicação da redução naquela componente.

- A regularização fiscal de um veículo depende da sua introdução no consumo encontrando-se esta, para aquele efeito, sujeita ao processamento de uma Declaração Aduaneira de Veículo, nos termos do artigo 17.º, n.º 1, do CISV, o que se verificou relativamente ao veículo em causa nos presentes autos.

 - E, no caso concreto, o imposto foi calculado de acordo com o previsto no artigo 7.º. do CISV, tendo sido aplicada uma redução para a componente ambiental nos termos deste artigo, não tendo sido aplicada outra/nova redução à componente ambiental porque tal redução não se encontrava prevista no artigo 11.º do CISV, ao contrário do estabelecido para a componente cilindrada, que consagrava reduções em função dos “anos de uso” de acordo com a tabela D.

 - Efetivamente, de acordo com o previsto nos supracitados artigos 5.º, n.º 1 e n.º 3, alínea a), 3.º, n.º 1, 6.º, n.º 1, alínea b), e n.º 3, 7.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, 11.º n.º 1 e n.º 3, todos do CISV, o veículo foi introduzido no consumo e tributado em sede de imposto sobre veículos, nos termos da lei.

- E porque se trata de veículo ligeiro de passageiros, usado, com emissão de gases CO2, conforme indicado na respetiva DAV, os serviços aduaneiros efetuaram o cálculo do imposto devido, por aplicação da tabela A prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea a), recorrendo igualmente à aplicação da redução por anos de uso prevista na tabela D no n.º 1 do artigo 11º do CISV para a componente cilindrada.

- Resultando, assim, comprovados, face à lei aplicável, os pressupostos da tributação e, em concreto, da liquidação de ISV que ora vem impugnada, tendo, consequentemente, o veículo sido tributado de acordo com o regime plasmado no CISV em vigor à data da liquidação.

- E, não obstante a alteração ao artigo 11.º do CISV tenha surgido após o acórdão proferido no Processo n.º C- 200/15 do TJUE, este não se pronuncia, em concreto, sobre a matéria em causa nos presentes autos, designadamente quanto à questão da percentagem de redução de ISV aplicável a veículo usado incidir apenas sobre o elemento específico de tributação (Cilindrada), e não sobre a componente ambiental do ISV, limitando-se aquele a analisar a questão da determinação do valor tributável dos veículos usados provenientes de outro Estado-Membro, introduzidos no território nacional, no sentido de afirmar que um sistema relativo ao cálculo da desvalorização dos veículos que não tem em conta a sua desvalorização antes destes atingirem um ano, nem a desvalorização que seja superior a 52% no caso de veículos com mais de cinco anos, não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.º do TFUE.

- O modelo de tributação do ISV, resultante da aprovação do CISV pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, foi norteado por preocupações ambientais com respeito pelas diretrizes emanadas pelas instâncias comunitárias e pelos compromissos assumidos no âmbito do Protocolo de Quioto e, mais tarde, pelo Acordo de Paris.

- Acrescendo que o estabelecido no artigo 191.º do TFUE, tendo surgido depois do artigo 90.º do TCE (anterior 110.º do TFUE), exige que se proceda a uma interpretação atualista, no que concerne ao enquadramento da questão sub judice, que deve atender aos elementos sistemático e teleológico, porquanto, naquele dispositivo, afirma-se, expressamente, no n.º 1, que a política da União, no domínio do ambiente, contribuirá para a prossecução, entre outros, da preservação, da proteção e a melhoria da qualidade do ambiente, não podendo o artigo 110.º do TFUE ser interpretado nos termos defendidos pelo Requerente.

 - Devendo, pois, a interpretação do artigo 110.º do TFUE ser efetuada à luz do disposto no artigo 191.º do mesmo tratado, sob pena de conflitualidade e desarmonia entre as duas normas, a não ser que o TJUE, em sede de interpretação, venha defender a existência de tal violação e que a norma do artigo 110.º do TFUE tem valor superior ao previsto no artigo 191.º quanto à proteção e a melhoria da qualidade ambiental.

 - A alteração ao artigo 11.º do CISV operada pela Lei n.º 22-A/2007 encontrava-se, assim, também, em consonância com o disposto no artigo 1.º do mesmo código, que consagra o “Princípio da Equivalência”, nos termos do qual o imposto sobre veículos obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente, infraestruturas viárias e sinistralidade rodoviária, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária.

- Face ao previsto no n.º 1, do artigo 11.º do CISV, constata-se que o legislador teve em consideração que a componente ambiental representa o custo do impacto ambiental, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 11.º do CISV, também suportada pelos veículos novos, devendo a mesma ser entendida como um montante que os sujeitos passivos pagam ao Estado, destinado a compensar os efeitos nefastos que o veículo automóvel causa ao ambiente, sendo que esse montante é progressivo em função das emissões de dióxido de carbono.

- Pelo que, em nome da unidade e da coerência do modelo de tributação automóvel vigente em Portugal, a não aplicação da totalidade da componente ambiental aos veículos usados violaria os princípios supra referidos, tornando-se fonte de graves injustiças, já que beneficiaria claramente os veículos usados em detrimento dos novos, sem que, para tal, se encontrem razões válidas.

- Assim, a interpretação do disposto no artigo 110.º do TFUE não poderá deixar de ter em consideração os objetivos ambientais acima referidos, sob pena de se gerarem incoerências insustentáveis entre a política fiscal e a política ambiental.

- Mais acrescendo que o n.º 2 do artigo 191.º, enfatiza o princípio do poluidor pagador ao postular que “A política da União no domínio do ambiente terá por objetivo atingir um nível de proteção elevado, tendo em conta a diversidade das situações existentes nas diferentes regiões da União. Basear-se-á nos princípios da precaução e da ação preventiva, da correção, prioritariamente na fonte, dos danos causados ao ambiente e do poluidor-pagador”.

- Em última análise, procurou-se, como se viu, aplicar o princípio da equivalência consagrado no artigo 1.º do CISV, bem como o princípio do poluidor pagador, já que, se o regime nacional atribuísse um desconto comercial à componente ambiental do ISV para veículos usados adquiridos noutro Estado-Membro da União Europeia, estaria a subverter aquele princípio e a atribuir um alívio fiscal à admissão e importação de veículos usados mais poluentes.

 - A aplicação do disposto no artigo 11.º do CISV não pretendia restringir a entrada de veículos em território nacional para proteger a produção nacional, nem obstava à admissão de veículos usados em território nacional, nem, tampouco, visava impedir a realização de negócios jurídicos de compra e venda de veículos automóveis, visto que eram, e continuaram a ser processadas inúmeras declarações aduaneiras de veículos, de regularização fiscal de veículos em território nacional, provenientes de outros Estados-membros, conforme resulta dos dados atinentes ao número de matrículas atribuídas nos últimos anos.

 - Por outro lado, a aplicação da mesma percentagem de redução às duas componentes, por não se encontrar prevista na lei, dá origem a um desagravamento que, por via da alteração à taxa do imposto, incentivava os consumidores a utilizarem veículos mais poluentes, interpretação que não pode deixar de se considerar inconstitucional face ao disposto no n.º 2 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa.

 - E, estando em causa matéria de elevada relevância social, e bem assim, a existência de disposições legais e objetivos de defesa ambiental definidos ao nível da União Europeia, internacional e nacional, entende-se que, no caso concreto, não deve ser aplicada à componente ambiental a mesma redução que é aplicada à componente cilindrada no âmbito da tributação automóvel, concretamente no que se refere ao cálculo do imposto, que deve ser efetuado nos termos dos artigos 7.º e 11.º do CISV, na redação que lhe foi aplicada.

- Acrescendo que, em rigor, os artigos 7.º e 11.º do CISV não violam a norma prevista no artigo 110.º do TFUE, por gerarem uma descriminação negativa dos veículos usados admitidos no território nacional, uma vez que estes artigos não são de aplicação exclusiva aos veículos usados admitidos no território nacional.

- De facto, os artigos 7.º e 11.º do CISV aplicam-se igualmente a veículos matriculados no território nacional, designadamente nos casos previstos nas alíneas a), b), e d), do n.º 2, do artigo 5.º, que, de novo se transcreve, o qual determina o seguinte: “Constitui ainda facto gerador do imposto: a) A atribuição de matrícula definitiva após o cancelamento voluntário da matrícula nacional feito com reembolso de imposto ou qualquer outra vantagem fiscal; b) A transformação de veículo que implique a sua reclassificação fiscal numa categoria a que corresponda uma taxa de imposto mais elevada ou a sua inclusão na incidência do imposto, a mudança de chassis ou a alteração do motor de que resulte um aumento de cilindrada ou das emissões de dióxido de carbono ou partículas; c)A cessação ou violação dos pressupostos da isenção de imposto ou o incumprimento dos condicionalismos que lhe estejam associados; d) A permanência do veículo no território nacional em violação das obrigações previstas no presente código.”

 - Quanto à taxa de imposto a aplicar nos casos mencionados no n.º 2 do artigo 5.º do CISV,

dispõe o n.º 3 do mesmo artigo que é a que estiver em vigor no momento em que se torna exigível.

- Determinando, designadamente o artigo 7.º, nº 6, do CISV, quanto à transformação de veículo enquanto facto gerador do imposto, que “Nas situações previstas na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º, o montante do imposto a pagar é o que resulta da diferença entre o imposto incidente sobre o veículo após a respectiva operação, atento o tempo de uso, entretanto decorrido, e o imposto originariamente pago, excepto nos casos de mudança de chassis, em que o imposto é devido pela totalidade.”

 - Decorrendo daqueles dispositivos que as taxas de imposto previstas no artigo 7.º e 11.º do CISV são aplicadas de igual forma, na componente cilindrada e ambiental, a um veículo com matrícula nacional e a um veículo usado admitido no território nacional.

- Pelo que, reitera-se, não se poderá concluir que, ao fazer incidir sobre os veículos usados, nacionais e comunitários, uma componente ambiental que não é objeto de redução, o Estado Português teve por objetivo restringir a entrada de veículos usados em Portugal, mas sim como corolário orientar a escolha dos consumidores através da aplicação criteriosa das medidas de política ambiental europeia, tanto a veículos nacionais como aos provenientes de outro Estado-Membro.

- Até porque não se pode olvidar, igualmente, o estabelecido no artigo 66.º, relativo ao Ambiente e Qualidade de Vida, da Constituição da República Portuguesa, que consagra o direito de todos a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender (n.º 1), e, especificamente, o disposto na alínea h), do n.º 2 do mesmo artigo, quando se refere a um direito fiscal do ambiente que utilize os impostos, taxas, benefícios fiscais como instrumentos formais que propiciem a proteção do ambiente.

- Configurando a aplicação da interpretação, pugnada pela Requerente, uma desaplicação do direito da União e do direito internacional - artigo 191.º do TFUE, Protocolo de Quioto e Acordo de Paris - que vinculam o Estado Português, por força do artigo 8.º da CRP, bem como uma violação do disposto no n.º 1, e alíneas a), f) e h), do n.º 2, do artigo 66.º e do n.º 2 do artigo 103.º da CRP.

- Na elaboração do CISV foram considerados os referidos princípios constitucionais, estando subjacentes, designadamente, nos artigos 1.º e 11.º do CISV, nos termos explanados, não podendo afastar-se a aplicação deste artigo, quanto à componente ambiental, sem mais, impondo-se que se afira a sua conformidade com os supra identificados comandos constitucionais.

 - Concluindo-se, assim, que a liquidação de ISV, ao aplicar o artigo 11.º do CISV, foi efetuada em conformidade com a lei nacional e o direito comunitário, cumprindo, designadamente, o disposto nos artigos 110.º e 191.º do TFUE e nos artigos 66.º e 103.º da Constituição, não existindo, conforme o exposto, a invocada discriminação da tributação dos veículos usados nacionais relativamente aos admitidos de outros Estados-membros, não se verificando, consequentemente, a alegada violação do artigo 110.º do TFUE.

- Destarte, tendo o ato impugnado sido efetuado de acordo com o direito nacional e comunitário, não enferma de qualquer vício, devendo, consequentemente, o mesmo ato de liquidação, na parte que vem impugnada, quanto ao cálculo do imposto efetuado nos termos do n.º 1 do artigo 11.º do CISV, e à não aplicação de redução à componente ambiental nos termos deste artigo, considerar-se conforme ao direito constituído então em vigor.

- Da interpretação do artigo 11.º do CISV defendida pela Requerente resulta, desde logo, uma violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 266.º (Princípios fundamentais) da Constituição da República Portuguesa (CRP), o qual, além de estabelecer, no n.º 1, que a administração pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos, impõe aos órgãos e agentes administrativos a subordinação à Constituição e à lei, devendo atuar no exercício das suas funções com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé (n.º 2).

- Concomitantemente, no que concerne ao princípio da legalidade tributária, nos termos do artigo 8.º da Lei Geral Tributária, estão sujeitos a este princípio a incidência, a taxa, os benefícios fiscais, as garantias dos contribuintes, bem como a liquidação e cobrança dos tributos.

- Ora, no caso concreto a administração tributária agiu nos termos da lei, de acordo com as normas de incidência, taxas e liquidação do imposto em causa, não podendo ter atuado de modo diferente, face ao direito constituído sob pena de violar os referidos princípios da legalidade e da justiça tributária, da igualdade e da segurança jurídica.

- Assim, relativamente à liquidação ora impugnada, foi efetuada de acordo com as normas aplicáveis em vigor, designadamente as constantes do artigo 7.º e do artigo 11.º do CISV, não sendo possível retirar da letra da lei, no caso, do artigo 11.º do CISV, ou de outra norma do mesmo código, a aplicação da redução prevista na admissão de veículos usados, para a componente cilindrada, à componente ambiental, além da aplicada por força do artigo 7.º.

 - Sendo que o intérprete tem de se socorrer dos elementos lógicos para determinar, designadamente, o espírito da lei, a sua racionalidade (razão de ser/ratio legis).

- Nesta medida, a interpretação da Requerente ofende claramente o princípio da equivalência previsto no artigo 1.º do CISV, sobre o qual assenta o atual modelo de tributação automóvel, o artigo 9.º, alínea e) e o artigo 66.º, n.º 1 e n.º 2, ambos da CRP, ocorrendo uma violação do princípio constitucional do Estado de direito ambiental.

- Estando em causa um direito constitucional fundamental, o direito ao Ambiente e Qualidade de Vida consagrado no n.º 1 do artigo 66.º da CRP, isto é, o direito de todos a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, e do qual resulta (n.º 2), a obrigação, para o Estado, de assegurar o direito ao ambiente, a obrigação de prevenir e controlar a poluição e seus efeitos, promover a integração de objetivos ambientais nas várias políticas de âmbito setorial, bem como de assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com proteção do ambiente e qualidade de vida (artigo 66.º, n.º 2, alíneas a), f) e h), da CRP).

- E, com vista à concretização e defesa do direito ao ambiente, o Estado pode impor proibições ou deveres de abstenção de ações ambientalmente nocivas e, numa vertente positiva, impor a defesa do ambiente mediante obrigações políticas, legislativas, administrativas e penais, nas quais se incluem a utilização dos impostos, taxas e benefícios fiscais como instrumentos formais que propiciem a proteção do ambiente, defendendo J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira que, consagrando o artigo 66.º da CRP o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, a sua defesa até pode justificar restrições a outros direitos constitucionalmente protegidos, que incluem a redução de gases, do consumo e a seletividade nas escolhas.

 - Deste modo, estabelecendo o artigo 66.º a adoção de medidas de âmbito setorial e a política fiscal enquanto instrumento de proteção do ambiente e qualidade de vida, que podem consistir no agravamento fiscal de veículos particularmente poluentes, a CRP consagra expressamente, neste âmbito, um direito fiscal do ambiente que utilize os impostos, taxas, benefícios fiscais como instrumentos formais que propiciem a proteção do ambiente, por estarem em causa bens constitucionalmente protegidos de natureza coletiva, merecedores de tutela jurisdicional.

 - Na elaboração do CISV foram considerados os referidos princípios constitucionais, estando subjacentes, designadamente, nos artigos 1.º e 11.º do CISV, não podendo afastar-se a aplicação deste artigo, impondo-se que se afira a sua conformidade com os princípios constitucionais consagrados no artigo 9.º e 66.º da CRP, até porque está em causa matéria de reserva de lei (âmbito de reserva legislativa da Assembleia da República).

- Acrescendo que, a interpretação defendida pela Requerente, posto que pugna pela aplicação de uma fórmula de cálculo, com atribuição de uma redução não prevista na tabela D do artigo 11.º, acrescenta uma redução à componente ambiental que não está consagrada na letra lei, que não foi querida pelo legislador, consubstancia assim, também nesta parte, uma violação dos princípios constitucionais aludidos, da legalidade e da justiça tributária, da igualdade e da certeza e segurança jurídica.

 - Por outro lado, a aplicação de tal redução, não pode deixar de se considerar como uma alteração à taxa do imposto que, não se encontrando prevista na lei, é inconstitucional face ao disposto no n.º 2 do artigo 103.º da CRP, que estabelece que os impostos são criados por lei, determinando esta igualmente a incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes, colocando, igualmente, a Requerente em situação de vantagem face aos demais sujeitos passivos, criando também, nesta parte, uma situação de desigualdade fiscal.

- Ademais, a pretensão da Requerente, além de não se estribar na lei e violar os acima indicados princípios constitucionais também olvida que estamos perante um imposto sobre o consumo não harmonizado, e que a tributação do consumo visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo, conforme o consagrado no n.º 4 do artigo 104.º da CRP.

- E, sendo um dos princípios gerais da interpretação das normas jurídicas e “critério de interpretação” o da interpretação conforme à Constituição1, de acordo com este critério, no caso de o intérprete, mediante a aplicação dos elementos interpretativos, chegar a mais do que um sentido possível a atribuir a um preceito normativo, deve preferir aquele que mais se adeque à Constituição.

- Não podendo, assim, deixar de se considerar o artigo 204.º da CRP, que impõe que os tribunais não apliquem normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.

 - Por outro lado, ao defender, a Requerente, a ilegalidade da liquidação, por entender que existe uma desconformidade do artigo 11.º do CISV com o artigo 110.º do TFUE, além da violação, por via de tal interpretação, dos já referidos princípios, consagrados na nossa Lei Fundamental, verifica-se, ainda, a violação, por via da desaplicação do artigo 11.º do CISV, do princípio do acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva.

 - De facto, tendo a Requerente recorrido à arbitragem tributária para impugnar a liquidação, a administração encontra-se coartada no seu direito de reação face aos limitados meios de recurso perante a prolação de uma decisão arbitral desfavorável.

- É que o RJAT prevê tão somente três tipos de reações recursórias, sendo eles o recurso para o Tribunal Constitucional, o recurso para uniformização de jurisprudência e a impugnação arbitral, com base nas nulidades elencadas no artigo 28.º, n.º 1 do RJAT.

 - Em sede arbitral, não existe o clássico recurso de direito e de facto, em princípio a interpor para o Tribunal Central Administrativo competente.

- Ora, defendendo a Requerente a violação de um princípio do TFUE no caso concreto, e prevendo o RJAT que o recurso para o Tribunal Constitucional só pode ter como fundamento as alíneas a) e b) do artigo 70.º da Lei do TC, não há dúvida que, a vingar tal interpretação, estamos perante uma violação do princípio do livre acesso aos tribunais.

- Verifica-se, pois, face ao disposto nos artigos 20.º, n.º 1 e n.º 4 e 266.º, todos da CRP, a violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva.

- Em face do exposto, a interpretação da Requerente do artigo 11.º do CISV viola os princípios, acima mencionados, da legalidade e da legalidade fiscal, da justiça tributária, da igualdade e da certeza e segurança jurídica, do Estado de direito ambiental e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, impondo-se a apreciação da constitucionalidade de tal entendimento, o qual a Requerida, reputa de inconstitucional, não podendo por isso, ser aplicado no caso concreto.

- Devendo a questão da desconformidade do direito nacional, em concreto das normas dos artigos 7.º e 11.º do CISV, aplicáveis à liquidação ora impugnada, ser suscitada junto do TJUE, conforme já decidido pelo Tribunal Constitucional, designadamente, nos autos de recurso n.º 173/20 e n.º 649/20, ou suspender a instância de acordo com o decidido noutros processos pelo mesmo tribunal e, também, pelo tribunal arbitral.

- Além dos demais pedidos formulados, peticiona ainda a Requerente o pagamento de juros indemnizatórios que, no seu entender, seriam devidos por conta da ilegalidade dos atos de liquidação.

 - No que concerne ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios, diga-se que, ainda que venha a considerar-se que o pedido arbitral deva proceder, o que só por dever de raciocínio se concebe, não poderá, todavia, aquele proceder.

 - De facto, o direito a juros indemnizatórios, consagrado no artigo 43.º da Lei Geral Tributária, pressupõe que se apure a existência de erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida em montante superior ao legalmente devido.

 - E, no caso concreto, não se verifica a existência de qualquer erro que possa ser imputável à administração tributária.

- É que, efetivamente, a liquidação em causa nos presentes autos decorreu exclusivamente da aplicação da lei em vigor, tendo aquela sido efetuada nos termos das normas aplicáveis, previstas no CISV, que determinam a exigibilidade e consequente liquidação do imposto, o que nem sequer é posto em causa pela Requerente.

- E, estando a AT e os seus órgãos, vinculados, na sua atuação, ao princípio da legalidade, a Requerida agiu, sempre, em obediência àquele e em conformidade com o direito em vigor, não podendo ter agido de modo diverso, não devendo, consequentemente, ser-lhe atribuído qualquer erro que lhe seja imputável, nos termos do artigo 43.º da LGT, posição que já foi sufragada em sede arbitral, conforme resulta das decisões proferidas nos Processos n.º 348/2019-T, n.º 34/2020-T e n.º 52/2020-T.

 - Pelo que, face ao invocado, tendo a AT agido no cumprimento estrito da lei, não se verifica qualquer erro de que possa resultar o pagamento indevido do imposto, sob pena de se verificar com tal interpretação, uma violação, também aqui, do invocado princípio constitucional da legalidade e legalidade fiscal, não devendo assistir, por conseguinte, à Requerente, o direito ao pagamento de juros indemnizatórios, pelo que, deverá o pedido de pronúncia arbitral ser julgado totalmente improcedente.

 

G. - QUESTÕES A DECIDIR

Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:

1 -Questão Principal - Saber se a liquidação do Imposto Sobre Veículos realizada, nos termos do art. 11º do respectivo Código, sem que seja tido em conta, no cálculo do imposto, qualquer dedução relativa à componente ambiental, padece, ou não, de ilegalidade determinante da sua anulação;

2 - Juros indemnizatórios - Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 4º da LGT, no caso de ser parcialmente anulada a liquidação e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga, e a partir de que momento.

3 - Em qualquer caso, responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

H. - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

1. O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).

2. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.

3. O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.

 

I. -MATÉRIA DE FACTO

I. 1 - FACTOS PROVADOS

Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provados os seguintes factos:

1) - A Requerente importou, com origem na Alemanha, o veículo automóvel ligeiro de passageiros, marca ..., modelo ..., designado comercialmente por ..., movido a gasóleo, que, actualmente, tem o número de matrícula ... .

2) - O referido veículo tinha sido matriculado pela primeira vez na Alemanha, em 18/02/2015, com o número ..., e percorrido, antes da sua entrada em Portugal, 82.442 Kms.

3) - A Requerente procedeu à declaração aduaneira deste veículo (DAV nº 2020/..., de 20/08/2020), tendo a Requerida AT liquidado o Imposto Sobre Veículos pelo valor de 18.020,40 euros, imposto pago pela Requerente, em 20/08/2020 e 24/08/2020.

4) - Deste valor liquidado, 4.538,67 euros correspondem à componente cilindrada e 13.481,73 euros à componente ambiental.

5) - Relativamente à componente cilindrada, aquele valor foi deduzido pela quantia correspondente a 52% do seu montante, ou seja, 4.538,67 euros, por força da redução resultante do número de anos de uso do veículo.

 6) – Essa redução não foi aplicada na liquidação à componente ambiental, representando o montante de 7.010,50 euros.

7)- Em 31/10/2020, a Requerente entregou no CAAD o pedido de pronúncia arbitral

 

I. 2 - FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS

Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada.

 

J. - MATÉRIA DE DIREITO

Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.

As orientações arrogadas pela Requerente e pela Requerida e a sua fundamentação estão expostas, em síntese, ou com parcial transcrição, em E. e F. do Relatório desta Decisão.

O presente pedido de pronúncia arbitral tem como fundamento a ilegalidade do art. 11º do Código do Imposto sobre Veículos, relevante na liquidação impugnada, por violar o disposto no art. 110º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

A questão em apreço consiste em saber se a liquidação de ISV relativa à viatura identificada nos autos padece, ou não, de ilegalidade parcial, como pretende a Requerente, ou, ao invés, como defende a Requerida, o acto de liquidação deste tributo deverá ser mantido na sua íntegra, não enfermando de qualquer ilegalidade.

Sobre a matéria, sumariamente, entende a Requerente que o normativo em apreço, aplicável aos veículos portadores de matrículas comunitárias, de modo a contemplar no cálculo do imposto a desvalorização comercial média no mercado nacional das viaturas usadas, prevê uma redução percentual pelo número de anos de uso, considerada apenas na componente cilindrada, deixando de lado a componente ambiental, o que se vai traduzir numa tributação superior à que é aplicada aos usados similares no mercado nacionais.

Por seu lado, a Requerida entende que a componente ambiental não se deve traduzir em nenhuma redução, pois representa o custo do impacto ambiental, pelo que não deve ser entendida como contrária ao espírito do art. 110º do TFUE.

Ora, a questão em apreço já foi apreciada em diversas decisões arbitrais proferidas pelo CAAD, nomeadamente as relativas aos processos nºs. 572/2018-T, 346/2019-T, 348/2019-T, 350/2019-T, 459/2019-T, 466/2019-T, 498/2019-T, 833/2019-T, 75/2020 e no 297/2020-T,  que foi proferida pelo signatário enquanto juiz singular, e que seguiremos, nas quais foram tomadas  decisões anulatórias com fundamento na incompatibilidade do disposto no art. 11º do CISV com a disposição do art. 110º do TFUE, segundo a qual "nenhum Estado-Membro fará incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares."

Ora, no presente caso concreto coloca-se questão análoga, conforme resulta do supra exposto, acompanhando nós a argumentação na formulação do juízo de desconformidade dos critérios adoptados com o disposto no art. 110º do TFUE, uma vez que o cálculo do imposto não leva inteiramente em linha de conta a depreciação do veículo, acabando por se verificar que a admissão de um veículo de outro Estado Membro esteja sujeita a uma carga tributária superior à que se se encontra incorporada e depreciada no valor dos veículos usados anteriormente matriculados no território nacional.

 Assim sendo, pode dizer-se que a lei portuguesa está a fazer incidir sobre este "produto" dos Estados-Membros uma imposição interna superior à que incide directa ou indirectamente, sobre os veículos usados nacionais, em clara violação do prescrito no art. 110º do TFUE. J /

Vejamos, então, quais as razões e fundamentos para se chegar a esta conclusão, aliás, vertidos nas decisões do CAAD que se deixaram identificadas e as quais iremos acompanhar, de seguida.

De acordo com o disposto no Código do ISV, estão sujeitos a este imposto, no seu regime regra, nomeadamente, "os veículos automóveis ligeiros de passageiros, (art. 2º, nº 1, alínea a), sendo "sujeitos passivos do imposto os operadores registados, os operadores reconhecidos e os particulares que procedam à introdução no consumo dos veículos tributáveis, considerando-se como tais as pessoas em nome de quem seja emitida a declaração aduaneira de veículos" (art. 3º, nº 1 ).

O artigo 5º do Código do ISV, diz que constitui facto gerador do imposto o fabrico, montagem, admissão ou importação dos veículos tributáveis em território nacional, que estejam obrigados à matrícula em Portugal", sendo que, para este efeito, de acordo com o nº 3 alínea a) do mesmo artigo, entende-se por admissão, a entrada de um veículo originário ou em livre prática noutro Estado-Membro da União Europeia em território nacional".

No que diz respeito à exigibilidade do imposto, de acordo com o disposto no artigo 6º, nº 1, alínea b, "o imposto torna-se exigível no momento da introdução no consumo, considerando-se esta verificada no momento da apresentação da declaração aduaneira de veículos pelos particulares", sendo que" a taxa de imposto a aplicar é a que estiver em vigor no momento em que este se torna exigível" (nº 3).

Quanto à introdução no consumo, estabelece o artigo 17º, nº 1 do referido Código que "a introdução no consumo e a liquidação do imposto são tituladas pela declaração aduaneira de veículos (DAV)", sendo que nos termos do nº 3, "para efeitos de matrícula, os veículos automóveis ligeiros ficam sujeitos ao processamento da DAV".

De acordo com o disposto no artigo 20º, nº 1 do Código do ISV, "os particulares e os sujeitos passivos que não se encontrem constituídos como operadores registados ou operadores reconhecidos estão obrigados à apresentação da DAV" nos prazos aí previstos, sendo que, nos termos do seu nº 2, se enumeram os documentos que a devem acompanhar.

As taxas a aplicar para efeito de cálculo do ISV não incidem sobre o valor do automóvel mas têm por base os centímetros cúbicos por cilindrada (cm3) (componente cilindrada) e os gramas de C02 por quilómetro (componente ambiental), sendo que foram estruturadas em taxa normal, taxa intermediária e taxa reduzida e taxa para veículos usados, nos termos do disposto nos artigos 7º a 11º do Código do ISV.

 

 Assim, no que diz respeito à tributação do ISV, as taxas aplicáveis têm por base tributável uma componente cilindrada e uma componente ambiental, sendo que a primeira componente prevê uma taxa a aplicar consoante a cilindrada e o tipo de veículo e a segunda componente estabelece uma discriminação positiva entre os veículos a gasolina e os veículos a gasóleo, prevendo uma tributação progressiva em função do nível de C02 g/km.

O cálculo do ISV devido por veículos usados portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia, o artigo 11º, nºs 1 e 2 do Código do ISV dispõe que "o imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados membros da União Europeia é objecto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com excepção da componente cilindrada à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respectiva, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional".

Os nºs 3 e 4 do referido artigo 11º do Código do ISV referem que "sem prejuízo da liquidação provisória efectuada, sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto apurado nos termos do nº 1 excede o imposto calculado por aplicação da fórmula aí indicada, pode requerer ao director da alfândega, mediante o pagamento prévio de taxa que a mesma seja aplicada à tributação do veículo, tendo em vista a liquidação definitiva do imposto, sob pena de se presumir" que o sujeito passivo aceita como definitiva a liquidação do imposto feita por aplicação da tabela constante do nº 1 ".

Nos termos da decisão arbitral do processo nº 572/2018-T que também adoptámos na nossa decisão do processo n.º 297/2020-T, em sede de ISV, existe um longo percurso no que diz respeito às questões que a Comissão Europeia tem levantado ao Estado Português em matéria de legalidade das normas nacionais, nomeadamente, quanto à carga fiscal incidente sobre os veículos usados.

A legalidade foi questionada pela Comissão Europeia, ainda no âmbito do Imposto Automóvel, "porquanto esta entendia que as normas portuguesas então vigentes não observavam o disposto no artigo 95º do Tratado de Roma e, sendo necessário que Portugal perdesse o seu carácter proteccionista, era imprescindível que o montante de imposto fosse idêntico ao remanescente do imposto incorporado no preço dos veículos usados similares, comercializados no mercado português, remanescente esse a calcular a partir da percentagem da depreciação do valor desses veículos".

O Acórdão do T JCE (de 22/02/01) denominado "Gomes Valente", proferido a título prejudicial, veio criar as condições para se romper, a nível nacional, com o quadro clássico de tributação dos veículos usados, assente exclusivamente em reduções fixas em função do número de anos de uso.

"Neste âmbito (conforme se extrai daquela decisão), embora tenha sido referido que a aplicação de uma tabela de taxas para os veículos usados fundada num critério de depreciação único não seria contrário ao referido artigo 95º do Tratado de Roma, foi sublinhado que era importante que fossem tomados em conta outros factores de depreciação que não apenas a antiguidade, de forma a garantir que a referida tabela reflectisse de modo mais preciso a depreciação real dos veículos e permitisse alcançar de uma forma mais fácil o objectivo da tributação dos veículos usados, de modo a que, em nenhum caso, esta pudesse ser superior ao montante da taxa residual incorporada no valor dos veículos usados já matriculados em território nacional".

Conforme resulta daquela decisão do CAAD "esta jurisprudência veio a ser reforçada com o Acórdão do T JCE nº 101/00, proferido em 19 de Setembro de 2002 num processo que então envolveu o Governo Finlandês e Antti Sillin, no qual foi considerado que o artigo referido artigo 95º, primeiro parágrafo do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 90º, primeiro parágrafo) permitia a um EM aplicar aos veículos usados importados de outro EM um sistema de tributação em que o valor tributável é determinado por referência ao valor aduaneiro definido, mas obsta a que o valor tributável varie em função da fase de comercialização quando daí possa resultar, pelo menos, em determinados casos, que o montante do imposto que incide sobre um veículo usado importado exceda o montante do imposto residual incorporado no valor de um veículo usado similar já matriculado no território nacional".

Acrescentando que "na sequência do designado Acórdão "Gomes Valente", a jurisprudência tem entendido que para que um sistema de tributação dos veículos usados seja compatível com o disposto no Tratado é necessário que se adapte ou um modelo de tributação baseado na avaliação de cada veículo ou um modelo de tributação baseado em tabelas fixas que exclua todo e qualquer efeito discriminatório".

O actual artigo 110º do TFUE opõe-se a que um EM aplique aos veículos usados importados de outro EM um sistema de tributação em que o imposto que incide sobre esses veículos não atenda à depreciação real do veículo e não permita garantir sempre que o montante do imposto que fixa não excede o montante do imposto residual incorporado no valor de um veículo usado similar já matriculado no território nacional.

"Quando um EM aplica aos veículos usados importados de outros Estados membros um sistema de tributação em que a depreciação real dos veículos é definida de modo geral e abstracto com base em critérios determinados pelo direito nacional, o disposto no Tratado exige que esse sistema de tributação seja organizado de forma a excluir todo e qualquer efeito discriminatório", como se extrai da decisão que temos vindo a seguir.

 Em 2006, no âmbito do sistema de tributação Húngaro, no Acórdão do T JUE de 5 de Outubro de 2006 (C-290/05), no caso Nádasdi, foi analisada pela primeira vez a questão ambiental face aos impostos automóveis aplicáveis dentro do espaço da União Europeia. Refere aquela decisão que "o sistema fiscal Húngaro ignorava a desvalorização do veículo e tratava de forma igualitária todos os veículos que tivessem a mesma motorização e comportamento ambiental".

Contudo, o referido Acórdão veio declarar que "o artigo 90º, primeiro parágrafo, CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a um imposto como o instituído pela lei relativa ao imposto automóvel, na medida - em que seja cobrado sobre os veículos usados quando da sua primeira colocação em circulação no território de um Estado-Membro e - em que o seu montante, exclusivamente determinado em função das características técnicas dos veículos (tipo de motor, cilindrada) e da sua classificação ambiental, seja calculado sem ter em conta a depreciação dos membros, de tal forma que, quando se aplique a veículos usados importados de outros Estados Membros, ultrapasse o montante do referido imposto contido no valor residual de veículos usados similares que já foram registados no Estado-Membro de importação.

Não é relevante proceder a uma comparação com os veículos usados postos em circulação no

Estado-Membro em questão antes da introdução desse imposto", com resulta da decisão do CAAD a que aderimos. "Adicionalmente (acrescenta esta decisão), considerou-se que os Estados Membros (EM) têm liberdade para seleccionar os critérios a utilizar no cálculo do imposto e estabelecer um sistema de tributação diferenciado para certos produtos, em função de critérios objectivos aplicados, sendo que tais diferenciações só serão consideradas compatíveis com o direito da UE se, por um lado, prosseguirem objectivos compatíveis, também eles, com as exigências do Tratado e do direito derivado e, se por outro, as formas que vierem a revestir sejam molde a evitar qualquer forma de discriminação, directa ou indirecta, das "importações" provenientes dos outros EM, ou de protecção em favor de produções nacionais concorrentes".

Assim, em termos gerais, é possível concluir que "no âmbito de um regime fiscal relativo à tributação automóvel, critérios como o tipo de motor, a cilindrada e uma classificação assente em factores ambientais constituem critérios objectivos que possam ser utilizados no sistema de tributação, da sua utilização não poderá resultar discriminação e o imposto que vier a ser apurado não poderá onerar mais os produtos provenientes de outros EM do que os produtos nacionais similares, implicando que a cobrança por um EM de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro EM é contrária ao artigo 110º do TFUE quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados, semelhantes, já matriculados no território nacional".

Mais acrescentando que "em 2009, interpretando o mesmo artigo 110º do TFUE, o TJUE, no Acórdão de 19 de Março de 2009 (que opôs a Comissão Europeia à Finlândia), considerou que este artigo visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos que já se encontrem no mercado nacional e produtos importados, de um modo que não pode, em caso algum, ter efeitos discriminatórios".

 No que a Portugal diz respeito, "nos termos do disposto no artigo 8º da Constituição da República Portuguesa (CRP), o direito internacional prevalece sobre o direito interno português e é directamente aplicável em território nacional, sem desenvolver qualquer fundamentação, fez eco uma comunicação da Comissão Europeia em que se informava que esta tinha encetado, no TJUE, um processo contra Portugal, no sentido de defender que era censurável o artigo 11º do Código do ISV não contabilizasse no cálculo do ISV incidente sobre veículos usados nenhuma desvalorização até o veículo ter mais de um ano de tempo de uso, nem é considerada nenhuma diminuição do valor real para os veículos com mais de cinco anos de utilização, processo que culminou com a prolação do Acórdão do TJUE (C-200/15), de 16/06/2016, acima já referido". ...

 Com efeito, em matéria de direito internacional, o artigo 8º, nº 4 da CRP estabelece que "as disposições dos tratados que regem a UE e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de Direito democrático". A Decisão Arbitral nº 577/2016-T, de 1 de Junho de 2017, refere, neste âmbito que "apesar de só os Estados-Membros terem competência em matéria de impostos directos, o Tribunal de Justiça (T J) tem sustentado, através das suas decisões, que esses Estados devem exercer essa competência em conformidade com o direito da União Europeia.

Evitando assim, violações das cinco liberdades económicas fundamentais, designadamente a livre circulação de mercadorias (artigos 28º e seguintes do TFUE).

Ora, é precisamente através da protecção de cada uma destas liberdades, directamente aplicáveis, que ocorre uma verdadeira harmonização pela via jurisprudencial que se traduz na obrigatoriedade de as legislações nacionais se conformarem a cada uma dessas liberdades.

 

O direito português consagra uma cláusula de recepção automática plena do direito convencional internacional, cumpridas as formalidades de aprovação, ratificação e publicação.

Daqui decorre que “os tratados são fonte imediata de direitos e obrigações para os seus destinatários podendo ser invocados perante os tribunais".

Enfatizando que "os tratados são superiores hierarquicamente relativamente à lei ordinária.

Esta superioridade decorre não só dos artigos 26º e 27º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, mas igualmente do artigo 8º nºs 1 e 2 da CRP.

Apresenta-se, pois, como claro que, para que a Convenção vigore na ordem interna, é necessário que a lei ordinária posterior a não possa revogar.

Ou seja, o direito internacional convencional não pode ser afastado por leis ordinárias, surgindo como superior àquelas, sejam essas leis subsequentes, as quais serão materialmente inconstitucionais se o contrariarem; sejam anteriores, as quais terão de ser suspensas se forem conflituantes com esse direito convencional internacional, só retomando a vigência no caso de suspensão ou cessação da convenção internacional que estiver em causa."

O artigo 110º do TFUE (na esteira do artigo 90º do Tratado de Roma), preceitua que "nenhum EM fará incidir, directa ou indirectamente, sobre os produtos dos outros Estados Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, directa ou indirectamente sobre produtos nacionais similares".

Nos terrmos da decisão, cuja fundamentação temos vindo a perfilhar, acrescenta-se que "sobre a interpretação deste artigo face aos direitos nacionais já o TJUE se pronunciou por diversas vezes precisando o seu alcance dado que a admissão nos mercados nacionais de veículos automóveis portadores de placa de matrícula definitiva de outros Estados Membros, isto é de veículos usados, rege-se exclusivamente pelo direito nacional, não podendo, todavia, tal direito contrariar os princípios em que se alicerça o funcionamento da EU".

"Por isso, dentro da liberdade conformadora que o legislador nacional dispõe para modelar o imposto de forma a proceder à sua cobrança de forma exequível e eficaz, é necessário ter em conta, para além da opinião da Comissão Europeia, enquanto entidade a que cabe zelar pelo respeito pelo Tratado, a jurisprudência comunitária que se vai produzindo.

E tanto assim é que o Estado Português, interpelado pela Comissão Europeia em 2009/201, quanto à forma como eram tributados os veículos usados admitidos em Portugal provenientes da UE (porque contrária ao previsto no referido e citado artigo 110° do TFUE), se viu forçado a alterar a legislação em vigor em matéria de ISV, em concreto o artigo 11º, nº 1 do Código do ISV (naquela data vigente), através da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do OE para 2011), no sentido de: O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados Membros da União Europeia é objecto de liquidação provisória, com base na aplicação das percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respectiva, as quais estão associadas à desvalorização social média dos veículos no mercado nacional, calculada com referência à desvalorização comercial média corrigida do respectivo custo de impacte ambiental".

 

Contudo, como refere a aludida decisão, não foi comtemplada, com a referida alteração legislativa, a questão da desvalorização dos veículos usados, oriundos de outro EM, com menos de um ano e mais de cinco, surge então o já citado Acórdão do TJUE nº C-200/15, de 16 de Junho de 2016, visando directamente a legislação nacional, consubstanciada no artigo 11º do Código do ISV (na redacção em vigor até 2016), nos termos do qual se veio considerar que "a República Portuguesa ao aplicar, para efeitos da determinação do valor tributável dos veículos usados provenientes de outro EM, introduzidos no território nacional, um sistema relativo ao cálculo da desvalorização dos veículos que não tem em conta a sua desvalorização antes de atingirem um ano, nem a desvalorização que seja superior a 52% no caso de veículos com mais de cinco anos, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110º do TFUE".

E assim, o legislador nacional foi forçado a alterar o referido artigo 11º do Código do ISV, no sentido de nele incluir a desvalorização referida no ponto anterior, através da Lei nº 42/2016, de 28 de Dezembro, mas excluindo de novo da redacção do artigo a questão da desvalorização incidente sobre a componente ambiental do ISV.

Nesta conformidade, os actuais contornos da legislação nacional ignoram, no artigo 11º, nº 1 Tabela D, o previsto no artigo 110º do TFUE e a posição que o TJUE tem assumido (e que já assumia face ao disposto no artigo 90º do Tratado de Roma) de que este artigo visa garantir a perfeita neutralidade das imposições internas no que se refere à concorrência entre produtos que já se encontrem no mercado nacional e produtos importados, de modo que não pode, em caso algum, ter efeitos discriminatórios".

A situação descrita levou a Comissão Europeia a dar início a um procedimento contra Portugal, "por este EM não ter em conta a componente ambiental no cálculo do ISV aplicável aos veículos usados "importados" de outros EM, gerando efeitos discriminatórios nestas viaturas face às viaturas usadas adquiridas em território nacional".

Assim, de acordo com o artigo 4º do TFUE, as competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados- Membros" (nº 1), sendo que "os Estados Membros tomam todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes dos actos das instituições da União" (nº 4).

Nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do TFUE, "a Comissão promove o interesse geral da União e toma as iniciativas adequadas para esse efeito.

A Comissão vela pela aplicação dos Tratados, bem como das medidas adaptadas pelas instituições por força destes. Controla a aplicação do direito da União, sob fiscalização do Tribunal de Justiça da União Europeia".

Por sua vez, de acordo com o artigo 258° do TFUE, "se a Comissão considerar que um Estado-Membro não cumpriu qualquer das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados, formulará um parecer fundamentado sobre o assunto, após ter dado a esse Estado oportunidade de apresentar as suas observações.

Se o Estado em causa não proceder em conformidade com este parecer no prazo fixado pela Comissão, esta pode recorrer ao Tribunal de Justiça da União Europeia".

Assim sendo, “se uma eventual  infracção à legislação europeia for identificada pela Comissão ou denunciada por queixa, esta última tenta resolver o problema que lhe está subjacente através do diálogo com o EM em causa, com o objectivo de encontrar uma solução rápida que esteja em conformidade com a legislação da UE e evitar assim o recurso a um processo formal por infracção.

No caso de o EM não concordar com a Comissão ou não tomar medidas para rectificar a eventual violação da legislação da UE, a Comissão pode abrir um processo formal por infracção, sendo que este processo compreende várias etapas.

Neste âmbito, a Comissão Europeia convida, através de notificação por carta, as autoridades nacionais do EM a pronunciarem-se sobre o problema de incumprimento identificado, no prazo máximo de dois meses, sendo que, em caso de ausência de resposta ou de resposta não satisfatória, a Comissão indicará as razões por que considera que o EM violou a legislação da EU e as autoridades nacionais dispõem de um prazo máximo de dois meses para dar cumprimento à legislação europeia".

Não obstante, em caso de ausência de resposta ou resposta não satisfatória, a Comissão pode pedir ao TJUE que abra um procedimento contencioso ao EM incumpridor, decidindo o TJUE, em média, no prazo de dois anos, sobre a existêncía, de uma infracção à legislação europeia".

 No âmbito dos presentes autos, e de acordo com a factualidade dada como provada, Portugal não tem em conta nenhuma redução sobre a componente ambiental do ISV no cálculo do imposto incidente sobre veículos usados "importados" de outros EM, à revelia do disposto no artigo 110º do TFUE, Portugal deixou de considerar as percentagens de redução de ISV relativas à depreciação das viaturas no que diz respeito à componente ambiental.

Ainda que a Requerida suscite o princípio da protecção do ambiente consagrado no artigo 191º do TFUE, devendo interpretar-se o artigo 110º do TFUE à luz do disposto no artigo 191º do mesmo Tratado, sob pena de conflitualidade entre as duas normas, a verdade é que este artigo 191º do TFUE teve origem no artigo 174º daquele Tratado e também a jurisprudência do TJUE se referiu em diversos momentos às questões ambientais na interpretação do referido artigo 90º, nomeadamente, no processo C-290/05.

Por seu turno o Acórdão do TJUE (C-200/15), de 16/06/2016, como se extrai da mencionada decisão arbitral, refere que "este artigo (110º do TFUE) é violado sempre que a imposição que incide sobre o artigo importado e a que incide sobre o produto nacional similar são calculados de forma diferente e segundo modalidades diferentes que conduzam a uma imposição superior do produto importado", sendo que "um Estado-Membro não pode cobrar um imposto sobre os veículos usados importados, calculado com base num valor superior ao valor real do veículo, tendo como efeito uma tributação mais onerosa destes relativamente à dos veículos usados similares, disponíveis no mercado nacional".

 Assim sendo, o Tribunal Arbitral não tem dúvidas em concluir que o artigo 11º do Código do ISV está em desconformidade com o disposto no artigo 110º do TFUE, uma vez que calcula o imposto sobre veículos usados provenientes de outro Estado Membro da EU, sem tomar em linha de conta a sua depreciação, permitindo que o imposto calculado seja superior ao montante residual de veículos usados nacionais.

Termos em que se determina a anulação parcial do acto tributário de liquidação de Imposto sobre Veículos objecto do pedido, uma vez que padece de ilegalidade na parte em que não considerou aplicável a redução de ISV relativa à componente ambiental.

 

Quanto aos juros indemnizatórios:

Esta matéria está regulada no art. 24.º do RJAT, o qual expressamente determina no seu n.º 1, alínea b) que a decisão arbitral obriga a Administração Tributária, nos casos aí consignados, a “Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessárias para o efeito”, e preceitua, ainda, no seu n.º 5, que “É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.

 Também o art. 100.º da LGT, cuja aplicação é autorizada pelo disposto no art. 29.º, n.º 1, al. a), do RJAT, preceitua de modo idêntico, no sentido da imediata reconstituição da legalidade, compreendendo a mesma o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso.

Por seu lado, o art. 43.º, n.º 1, da LGT condiciona o direito a juros indemnizatórios aos casos em que “houve erro imputável aos serviços de que resulta pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

 Nesta conformidade, coloca-se a questão de saber se se pode considerar ter havido, ou não, um erro imputável aos serviços na situação vertente.

 Ora, conforme se referiu anteriormente, a liquidação em apreço é ilegal por erro na aplicação do direito aos factos, cometido pelos serviços da Requerida, de que resultou um pagamento em excesso.

 Assim, dúvidas não há que está preenchido o requisito estabelecido no art. 43.º, n.º 1, da LGT, ou seja, a ilegalidade das liquidações resultou de um erro cometido pelos serviços tributários, condição para serem exigíveis juros indemnizatórios.   

Têm assim os Requerentes  direito não só ao reembolso da  quantia  paga  em excesso, mas

também a receber juros indemnizatórios sobre a mesma, nos termos das disposições combinadas dos arts. 24.º, n.º 1, al. b), do RJAT, 100.º e 43.º, n.º 1, ambos da LGT, à taxa resultante do n.º 4 do art. 43.º da LGT. 

 

L.-DECISÃO

 

Atento o exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:

Julgar procedente o pedido de anulação parcial da liquidação de ISV que se desdobra nos nºs 2020/... e 2020/..., de 20/08/2020 e 24/08/2020, respectivamente, resultante da DAV nº 2020/..., no montante de 7.010,50 euros, e, consequentemente, condenar a Requerida a restituir à Requerente esta quantia, com juros indemnizatórios, nos termos supra expostos e,

Condenar a Requerida a pagar as custas do presente processo (art. 527º, nºs. 1 e 2 do Código do Processo Civil, ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).

 

Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315°, nº 2) e 97º -A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 7.010,50 euros.

 

Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

Notifique-se.

 

Lisboa, 5 de Agosto de 2021

 

O Árbitro

(José Nunes Barata) (Redacção pela ortografia antiga)