Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 565/2019-T
Data da decisão: 2020-04-20  IMI  
Valor do pedido: € 32.899,33
Tema: IMI - Cláusula de salvaguarda prevista no artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro.
Versão em PDF

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

I – RELATÓRIO

 

 

1.  A..., sociedade de direito inglês, registada sob o número ..., com sede em ..., ..., ..., Reino Unido, com o número de identificação fiscal português ... apresentou em 27/08/2019 pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral, pois entende que a liquidação de IMI n.º 2018... do ano de 2018 e  a demonstração da revisão oficiosa n.º 2018... da  liquidação de IMI respeitante ao ano de 2018 são ilegais por padecerem de erro sobre os pressupostos – violação do artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro; ofensa à autoridade do caso julgado material e por falta de suspensão do direito à liquidação respeitante ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ... da União das Freguesias de ... e ... .

 

2. O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) designou em 14/10/2019 como árbitro, Francisco Nicolau Domingos.

 

3. No dia 14/11/2019 ficou constituído o tribunal arbitral.

 

4. Cumprindo a previsão do artigo 17.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (“RJAT”) foi a Requerida em 20/11/2019 notificada para, querendo, apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e juntar o Processo Administrativo (“PA”) aos autos.

5. A Requerida em 30/12/2019 apresentou a sua resposta, na qual pugna pela manutenção dos atos tributários na ordem jurídica.

6. Considerando que não foi solicitada a produção de qualquer prova, não se vislumbrou necessário convidar as partes a aperfeiçoarem as suas peças processuais e  caso existisse matéria de exceção de conhecimento oficioso podia ser conhecida na decisão arbitral, o tribunal em 26/01/2020  determinou, ao abrigo do princípio da autonomia na condução do processo e na determinação das regras a observar com vista à obtenção, em prazo razoável, de uma pronúncia de mérito sobre as pretensões formuladas (artigo 16.º, al. c) do RJAT), a dispensa de realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, concedeu prazo para  que as partes apresentassem alegações finais escritas e fixou data limite para proferir a decisão arbitral.

 

7. As alegações finais escritas foram apresentadas pela Requerente e pela Requerida em 11/02/2020.

 

POSIÇÃO DAS PARTES

 

A Requerente defende que os atos tributários impugnados são ilegais, na medida em desconsideram, para efeitos de apuramento do IMI, o regime jurídico previsto no artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro.

Mais concretamente, alega que cumpre os três requisitos necessários para beneficiar do aludido regime jurídico:  i) estarmos perante prédios urbanos; ii) abrangidos pela avaliação geral e iii) objeto do contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de setembro.

Em segunda linha alega que os atos tributários incorrem em violação do caso julgado material, visto que dois tribunais arbitrais constituídos sob a égide do CAAD - processos números 96/2017-T e 149/2017-T  – já se pronunciaram  sobre a aplicação à  Requerente do regime especial previsto no artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro.

Em terceira linha defende a suspensão da liquidação de IMI relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 570 da União das Freguesias de Caparica e Trafaria. Isto é, o artigo 118.º, n.º 1 do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) impõe a suspensão da liquidação até o resultado da 2.ª avaliação se tornar definitivo.

Peticiona ainda o pagamento de uma indemnização por prestação de garantia indevida, com fonte em fiança.

A Requerida apresenta uma defesa com a seguinte fundamentação:

i) Violação do regime consagrado no artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro

 Defende que constitui um pressuposto da aplicação do aludido regime que os prédios urbanos se encontrem avaliados nos termos do CIMI, porquanto o valor patrimonial tributário (“VPT”) fixado – exclusivamente para efeitos de IMI – pela capitalização da renda anual só será aplicado no caso de o resultado da avaliação ser superior.

Os procedimentos de avaliação iniciados em 2012, por força da Lei n.º 60-A/2011, de 30 de novembro terão sido suspensos, até à determinação por parte da Direção de Serviços de Avaliação dos critérios que deveriam ser aplicados para a determinação do valor patrimonial das instalações petrolíferas.

Assim, as liquidações impugnadas no pedido de pronúncia arbitral tiveram por base os valores patrimoniais tributários resultantes de atualizações definidas na lei e não da avaliação geral ou de qualquer outro procedimento de avaliação nos termos do CIMI.

ii) Indemnização por prestação de garantia indevida

Propugna que se a fiança não é equivalente à garantia bancária a que se refere o artigo 53.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) e artigo 171.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) os eventuais prejuízos que puderem ser associados à sua prestação não são ressarcíveis  pelo instituto da indemnização por prestação de garantia indevida.

 

QUESTÕES A DECIDIR

 

Nesta sequência, tendo em atenção as pretensões e posições da Requerente e da Requerida constantes das suas peças processuais, acima descritas, são as seguintes as questões que o tribunal deve apreciar (sem prejuízo da solução dada a certa questão poder prejudicar o conhecimento de outra ou outras questões – artigo 608.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 21.º, n.º 1, al. e) do RJAT):

a) Se os atos tributários [liquidação de IMI n.º 2018... do ano de 2018 e demonstração da revisão oficiosa n.º 2018 ... da liquidação de IMI respeitante ao ano de 2018] são ilegais por padecerem de erro sobre os pressupostos – violação do artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro;

 

b) Se os referidos atos tributários são ilegais por ofensa à autoridade do caso julgado material;

 

c) Se os atos tributários respeitantes ao prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ... da União das Freguesias de ... e ... são ilegais, por falta de suspensão do direito à liquidação – artigo 118.º, n.º 1 do CIMI;

 

d) Se a Requerente tem direito a uma indemnização por prestação de garantia indevida.

 

SANEAMENTO

 

O processo não enferma de nulidades, o tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer e decidir o pedido, verificando-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.

 

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

MATÉRIA DE FACTO

1. Factos com relevância para a apreciação da causa que se consideram provados

1.1.  A Requerente (anteriormente denominada B...) celebrou, a 01/10/1953, contrato de arrendamento de instalações petrolíferas com a C..., S.A. (anteriormente denominada D..., S.A.).

1.2.  Não obstante as alterações efetuadas, o mesmo ainda se encontra em vigor em relação aos prédios infra descritos:

 

Concelho

Freguesia

Artigo matricial antigo

Artigo matricial atual

Ano inscrição na matriz

Valor inicial

...

União das Freguesias de ... e ...

U - ...

U - ...

1995

€ 17 956,72

União das Freguesias de ... e ...

U-...

U - ...

1995

€ 32 322,10

União das Freguesias de ... e ...

U-...

U - ...

1995

€ 30 526, 43

...

União das Freguesias de ... e ...

U - ...

U - ...

1971

€ 254 340, 24

União das Freguesias de ... e ...

U-...

U-...

1971

€ 12 717,18

União das Freguesias de ... e ...

U – ...

U-...

1971

€ 2 543,35

União das Freguesias de ... e ...

U - ...

U-...

1971

€ 2 543,35

União das Freguesias de ... e ...

R- ...

R-...

1976

_

1.3. O prédio inscrito na matriz sob o artigo..., secção C da União das Freguesias de ... e ... tem a natureza  de rústico.

1.4. A Requerente entregou em 12/12/2018 a participação de rendas relativas ao ano de 2018, nos seguintes termos:

Freguesia

Artigo

Valor inicial

Renda Anual

Renda Anual * 15

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 17 956,72

€ 1 287,32

€ 19 309,81

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 32 322,10

€ 2 150,94

€ 32 264,05

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 30 526,43

€ 376,42

€ 5 646,34

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 254 340,24

€ 316 432,47

€ 4 746 487,03

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 12 717,18

€ 2 695,67

€ 40 434,98

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 2 543,35

€ 1 908,04

€ 28 620,53

União das Freguesias de ... e ...

U-...

€ 2 543,35

€ 3 094,63

€ 46 419,45

1.5. O Serviço de Finanças de Almada ... submeteu, em 20/11/2012, uma declaração modelo 1 de IMI relativamente ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... (anteriormente com o artigo matricial ...).

1.6.  Em resultado da avaliação a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) atribuiu em 27/12/2016 ao prédio descrito em 1.5. o VPT de € 11 866 000,00.

1.7. A Requerente apresentou pedido de segunda avaliação relativamente ao VPT do aludido prédio.

1.8.  Em 17/10/2017 foi praticado outro ato de avaliação do prédio urbano melhor identificado em 1.5. deste probatório, no qual foi fixado um VPT de € 5 428 380,00.

1.9. A Requerente apresentou novo pedido de segunda avaliação, relativamente ao qual ainda não obteve decisão.

1.10. Em 23/07/2019 foi praticado outro ato de avaliação do prédio urbano melhor identificado em 1.5. deste probatório, no qual foi fixado o VPT de € 8 540 700,00.

1.11. A Requerente no dia 05/08/2019 apresentou novo pedido de segunda avaliação.

1.12.  A Requerente até à data de apresentação do pedido de constituição e de pronúncia arbitral não foi notificada do resultado do pedido da segunda avaliação a que se alude em 1.11. do probatório.

1.13.  A Requerente foi notificada da liquidação de IMI n.º 2018..., de 23/03/2019, no montante de € 45 808,49, na qual a AT aplicou a taxa de IMI aos valores patrimoniais constantes das matrizes de que era titular, a 31 de dezembro de 2018.

1.14. O ato tributário foi oficiosamente revisto pelo documento n.º 2018..., de 07/05/2019, tendo apurado uma coleta de € 32 903, 90.

1.15. A Requerente foi notificada para pagar a 2.ª prestação da liquidação identificada em 1.14., no montante de € 8 817,20 – documento de cobrança n.º 2018... .

1.16.  A Requerente apresentou garantia – fiança –   para suspender o processo de execução fiscal n.º ...2019....

1.17. Com aplicação do regime previsto no artigo 15.º-N, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro os valores do IMI deveriam ser os seguintes:

 

Liquidação de IMI

Apuramento de IMI – artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro

Artigo Matricial

VPT

Taxa

Coleta

Renda Anual

VPT (artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro

Coleta

U-...

 € 78 783,63

0,45%

€ 354,53

€ 1 287,32

€ 19 309,80

€ 86,89

U–...

€ 131 636,65

0,45%

€ 592,36

€ 2 150,94

€ 32 264,05

€ 145,19

U–...

€ 23 036,93

0,45%

€ 103,67

€ 376,42

€ 5 646,30

€ 25,41

U-...

€ 8 668 810,50

0,36%

€ 31 207,72

€ 316 432,47

€ 4 746 487,03

 € 17 087,35

U-...

€ 104 910,00

0,36%

€ 377,68

€ 2 695,67

€ 40 434,98

€ 145,57

U-...

€ 73 159,88

0,36%

€ 263,38

€ 1 908,04

€ 28 620,53

€ 103,03

Total

€ 32 899,33

Total

€ 17 593,44

1.18. O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado no dia 27/08/2019.

3.2. Factos não provados

 

Com relevo para a decisão nada ficou por provar.

 

4. Fundamentação da matéria de facto que se considera provada

 

A matéria de facto dada como provada tem génese nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cuja autenticidade não foi colocada em causa – não existe controvérsia relativamente à matéria de facto assente.

 

MATÉRIA DE DIREITO

 

i) Questão da desconsideração do artigo 15.º-N do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro nos atos tributários em crise

 

A Requerente alega que os atos tributários em crise são ilegais por não terem considerado o regime especial de salvaguarda relativo a prédios urbanos arrendados, previsto no  artigo 15.º-N, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 novembro, aditado pela Lei n.º 60-A/2011, de 30 de novembro, que estabelece o seguinte, na redação dada pela Lei n.º 64/2012, de 20 de dezembro:

 

“1 - No caso de prédio ou parte de prédio urbano abrangido pela avaliação geral que esteja arrendado por contrato de arrendamento para habitação celebrado antes da entrada em vigor do Regime de Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, ou por contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro, o valor patrimonial tributário, para efeitos exclusivamente de IMI, não pode exceder o valor que resultar da capitalização da renda anual pela aplicação do fator 15.

2 - No caso de prédios ou partes de prédios abrangidos pelo n.º 1 cujas rendas sejam atualizadas nos termos do n.º 10 do artigo 33.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, alterada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, ou com base no rendimento anual bruto corrigido (RABC), nos termos previstos na alínea c) do n.º 2 do artigo 35.º ou no n.º 7 do artigo 36.º da mesma lei, é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 1 com referência ao valor anual da renda atualizada.

3 - Os proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos arrendados por contratos de arrendamento celebrados nos termos dos números anteriores, devem apresentar, anualmente, no período compreendido entre 1 de novembro e 15 de dezembro, participação de que constem o valor da última renda mensal devida e a identificação fiscal do inquilino, conforme modelo aprovado por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

4 - A participação referida no número anterior deve ser acompanhada da participação eletrónica do contrato de arrendamento ou respetivo modelo 2 da AT, ou ainda, na sua falta, por meios de prova idóneos nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

5 - A participação deve ainda ser acompanhada de cópia do recibo de renda ou canhoto desse recibo relativos aos doze meses anteriores à data da apresentação da participação, ou ainda por mapas mensais de cobrança de rendas nos mesmos meses, nos casos em que estas são recebidas por entidades representativas dos proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios arrendados nos termos dos números 1 e 2.

6 - O valor patrimonial tributário para efeitos exclusivamente de IMI, fixado nos termos do disposto nos números anteriores, é objeto de notificação ao respetivo titular e passível de reclamação ou impugnação nos termos gerais.

7 - (Revogado.)

8 - (Revogado.)

9 - (Revogado.)

10 - O valor patrimonial tributário, para efeitos exclusivamente de IMI, fixado nos termos do presente artigo, não é aplicável, prevalecendo, para todos os efeitos, o valor patrimonial tributário determinado na avaliação geral, nas seguintes situações:
a) Falta de apresentação, nos prazos estabelecidos nos números anteriores, da participação ou dos elementos previstos nos números 3, 4 e 5;

b) Não declaração de rendas referentes aos contratos de arrendamento previstos nos números 1 e 2 para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas no ano anterior ao ano da participação referida no n.º 3;

c) Divergência entre a renda participada e a constante daquela declaração;

d) (Revogada.)

e) Transmissão onerosa ou doação do prédio ou parte do prédio urbano;

f) Cessação do contrato de arrendamento referido nos números 1 ou 2;

g) Atualização da renda nos termos previstos nos artigos 30.º a 37.º ou 50.º a 54.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, alterada pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, exceto nas situações referidas no n.º 2;

h) (Revogada.)

11 - A falsificação, viciação e alteração dos elementos referidos nos números 3, 4 e 5 ou as omissões ou inexatidões das participações previstas no n.º 3, quando não devam ser punidas pelo crime de fraude fiscal, constituem contraordenação punível nos termos do artigo 118.º ou 119.º do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho.”.

 

 

A Requerida, na sua defesa, limita-se a dizer que os procedimentos de avaliação, iniciados em 2012, terão sido suspensos até à determinação, por parte da Direção de Serviços de Avaliação dos critérios que deveriam ser utilizados para a determinação do VPT das instalações petrolíferas. Isto é, não é contestado que se verificam todos os requisitos para aplicação deste regime, o que se comprova pelos documentos juntos pela Requerente.

Como resulta do n.º 1 do referido artigo, nas situações aqui previstas: “[o] valor patrimonial tributário, para efeitos exclusivamente de IMI, não pode exceder o valor que resultar da capitalização da renda anual pela aplicação do fator 15”.

Nos atos tributários impugnados foram considerados para cálculo do IMI valores patrimoniais tributários que constavam das matrizes antes da introdução deste regime pela Lei n.º 60-A/2011, de 30 de novembro, que são superiores aos que resultam da capitalização da renda anual pela aplicação do fator 15.

Não se vislumbrando, nem sendo alegado, qualquer fundamento válido para não ser aplicado este regime especial, tem de se concluir pela ilegalidade dos atos tributários, por vício de violação de lei, o que justifica a sua anulação parcial – na parte respeitante aos prédios urbanos.

 

ii) Questão da indemnização por prestação de garantia indevida

 

A Requerente formula um pedido de indemnização por garantia indevida, mais concretamente, por ter apresentado fiança para suspender o processo de execução fiscal n.º ...2019... .

O artigo 171.º do CPPT estabelece que a: “[i]ndemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda”.

 O pedido de constituição do tribunal e de pronúncia arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a “legalidade da dívida exequenda”, pelo que, como resulta do teor daquele n.º 1 do referido artigo 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.

O regime do direito a indemnização por garantia indevida encontra-se previsto no artigo 53.º da LGT, que determina o seguinte:

“1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objeto a dívida garantida.

2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efetuou”.

Nos presentes autos, não foi prestada garantia bancária nem equivalente, mas sim [garantia] através de fiança (matéria de facto provada).  Ora, propugna a jurisprudência[1]: “[a] única questão colocada e que consistia em saber se a norma contida no art.º 53.º da LGT abarcava na sua previsão a fiança prestada por uma sociedade a favor de outra. Questão que obteve resposta negativa, suportada nas razões nele enunciadas e que residem, essencialmente, numa interpretação segundo a qual existe uma clara opção legislativa de conceder este tipo de indemnização apenas a quem preste garantia bancária ou equivalente (como é o seguro-caução) porque só estas têm, em abstrato, aptidão danosa, assim se justificando que o legislador tenha estabelecido, para estes específicos casos, uma presunção de existência de prejuízos, com a inerente dispensa de prova, por parte do lesado, da sua existência”.

Assim, como bem refere a AT, o dever de indemnização não se estende à fiança, pelo que improcede este pedido.

 

III – DECISÃO

 

Termos em que se decide:

 

a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, assim, anular parcialmente a liquidação de IMI respeitante ao ano de 2018, com todas as consequências legais.

 

b) Julgar improcedente o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida.

 

VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em € 32 899,33, nos termos do artigo 97.º - A do CPPT, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, al. a) do RJAT e do artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

CUSTAS

Custas a suportar pela Requerida, no montante de € 1836, cfr. artigo 22.º, n.º 4 do RJAT e da Tabela I anexa ao RCPAT.

 

Notifique.

 

Lisboa, 20 de abril de 2020

 

 

 

O árbitro,

 

                                                                                   

Francisco Nicolau Domingos

 

 



[1] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no âmbito do processo n.º 03025/17.3BEPRT, de 30/04/2019 e relatado pela Conselheira DULCE NETO.