Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 502/2020-T
Data da decisão: 2022-09-07  Selo  
Valor do pedido: € 1.593.446,65
Tema: IS - Isenção. Emissão de obrigações e de papel comercial. Sociedade Gestora de Participações Sociais. Reforma de decisão arbitral (anexa à decisão) Juros indemnizatórios.
*Reforma da decisão arbitral de 4 de junho de 2021
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Sumário:

 

I – Em caso de revisão oficiosa do acto de liquidação, havendo lugar à anulação do acto, mesmo que em impugnação judicial do indeferimento da revisão oficiosa, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido, nos termos do artigo 43.º, nºs.1 e 3, alínea c), da L.G.T

II - Em caso de retenção na fonte e havendo lugar a reclamação graciosa, o erro passa a ser imputável à Autoridade Tributária com a decisão expressa ou tácita de indeferimento, constituindo a data da decisão o termo inicial para cômputo dos juros indemnizatórios.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

1. A... SGPS, S.A., B..., SGPS, S.A. e C..., SGPS, S.A., já identificadas nos autos, requereram a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade dos atos de liquidação de imposto de selo incidentes sobre operações de crédito e intermediação financeira em emissões obrigacionistas e de papel comercial, referentes aos períodos de Fevereiro a Dezembro de 2015, de Janeiro a Março de 2016, de Fevereiro a Dezembro de 2017 e de Janeiro a Dezembro de 2018, bem como da decisão de indeferimento do recurso hierárquico e dos precedentes pedidos de revisão oficiosa e reclamação graciosa apresentados relativamente a essas liquidações, requerendo ainda o reembolso do imposto indevidamente pago e a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios.

 

Por decisão arbitral de 4 de junho de 2021, o tribunal arbitral decidiu:

 

a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e declarar a ilegalidade e a anulação dos actos tributários de autoliquidação do imposto do selo impugnados, no montante de € 1.593.446,65, relativos ao período de Fevereiro a Dezembro de 2015, Janeiro a Março de 2016, Fevereiro a Dezembro de 2017 e Janeiro a Dezembro de 2018, bem como dos despachos de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, de reclamação graciosa e de recurso hierárquico;

b) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no reembolso do imposto indevidamente pago e no pagamento dos juros indemnizatórios, à taxa legal, desde a data do pagamento até à do processamento da respectiva nota de crédito.

 

 Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso para uniformização de jurisprudência, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, no que diz respeito à condenação no pagamento de juros indemnizatórios, na parte correspondente à condenação da Administração no pagamento de juros indemnizatórios, tendo havido procedimento de reclamação graciosa prévio, e na parte correspondente à condenação da Administração no pagamento de juros indemnizatórios, tendo havido procedimento de revisão oficiosa prévio.

 

Por acórdão de 29 de junho de 2022, transitado em julgado em 14 de julho seguinte, o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA julgou procedente o recurso nos segmentos que constituíam o seu objecto, deliberando:

 

1-Na parcela em que os actos tributários foram objecto de pedido de revisão oficiosa (cfr. alínea G) da matéria de facto constante da decisão arbitral recorrida), que são devidos juros indemnizatórios cujo termo inicial de contagem se fixa no pretérito dia 20 de Março de 2020, mais consubstanciando o respectivo termo final a data do processamento da respectiva nota de crédito;

  1. - Na parcela em que os actos tributários foram objecto de reclamação graciosa (cfr. alínea J) da matéria de facto constante da decisão arbitral recorrida), que são devidos juros indemnizatórios cujo termo inicial de contagem se fixa no pretérito dia 22 de Julho de 2019, mais consubstanciando o respectivo termo final a data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

Para assim concluir, o STA considerou, no tocante ao termo inicial da obrigação de juros indemnizatórios, quando ligado à existência do procedimento gracioso de revisão oficiosa, que a orientação jurisprudencial consolidada é no sentido de que, vindo o acto de liquidação a ser anulado, mesmo que em impugnação judicial do indeferimento da revisão oficiosa, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido, nos termos do artigo 43.º, nºs. 1 e 3, alínea c), da L.G.T, pelo que, tendo tal pedido sido deduzido em 20 de Março de 2019, o termo inicial do cômputo dos juros indemnizatórios deve fixar-se no dia 20 de Março de 2020.

 

Quanto ao termo inicial da obrigação de juros indemnizatórios no caso em que haja lugar a reclamação graciosa, o Pleno do STA invoca a doutrina do acórdão fundamento, segundo a qual, em caso de retenção na fonte e havendo lugar a impugnação administrativa do acto tributário em causa (v.g. reclamação graciosa), o erro passa a ser imputável à Administração Fiscal depois de operar o indeferimento do mesmo procedimento gracioso, efectivo ou presumido, funcionando tal data como termo inicial para cômputo dos juros indemnizatórios a pagar ao sujeito passivo, nos termos do artigo 43.º, nºs. 1 e 3, da L.G.T. Tendo sido deduzida a reclamação graciosa em 20 de Março de 2019, e verificando-se o indeferimento tácito em 22 de Julho de 2019, é esta data que constitui o termo inicial do cômputo dos juros indemnizatórios.

 

Há assim que reformar a decisão arbitral na parte referente à alínea b) do dispositivo, em conformidade com o julgado em acórdão de uniformização de jurisprudência, nos seguintes termos:

  1. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no reembolso do imposto indevidamente pago e no pagamento dos juros indemnizatórios, à taxa legal, desde a data de 20 de março de 2020 até à do processamento da respectiva nota de crédito, no que se refere aos atos tributários que foram objecto de revisão oficiosa;
  2. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento dos juros indemnizatórios, à taxa legal, desde a data de 22 de julho de 2019 até à do processamento da respectiva nota de crédito, no que se refere aos atos tributários que foram objecto de reclamação graciosa.

 

Notifique.

 

Lisboa, 7 de setembro de 2022,

 

O Presidente do Tribunal Arbitral,

 

Carlos Fernandes Cadilha

 

A Árbitro vogal

 

Marisa Almeida Araújo

 

O Árbitro vogal

 

Joaquim Silvério Mateus

 

 

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo n.º: 502/2020-T

Tema: IS - Isenção.  Emissão de obrigações e de papel comercial. Sociedade Gestora de Participações Sociais.

 

            *Reformada pela decisão arbitral de 07 de setembro de 2022

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SUMÁRIO:

I – A proibição de sujeição a imposto do selo resultante do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7/CE, aplicável a empréstimos contraídos sob a forma de emissão de obrigações ou outros títulos negociáveis e formalidades conexas, não abrange  os encargos com comissões bancárias cobradas pelas instituições de crédito a título de prestação de serviços de intermediação nessas operações financeiras;

 

II - Uma sociedade gestora de participações sociais constitui uma instituição financeira para efeito da isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Acordam em tribunal arbitral

 

I – Relatório

 

1. A... SGPS, S.A., pessoa colectiva n.º …,  B... SGPS, S.A., pessoa colectiva n.º …, e C... SGPS, S.A., pessoa colectiva n.º …, todas com sede na …, …, vêm requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade dos actos de liquidação de imposto de selo incidentes sobre operações de crédito e intermediação financeira em emissões obrigacionistas e de papel comercial, referentes aos períodos de Fevereiro a Dezembro de 2015, de Janeiro a Março de 2016, de Fevereiro a Dezembro de 2017 e de Janeiro a Dezembro de 2018, bem como da decisão de indeferimento do recurso hierárquico e dos precedentes pedidos de revisão oficiosa e a reclamação graciosa apresentados relativamente a essas liquidações, requerendo ainda o reembolso do imposto indevidamente pago e a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios.

 

Fundamenta o pedido nos seguintes termos.

 

As requerentes são sociedades gestoras de participações sociais, previstas e regidas pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro, que têm vindo a recorrer a financiamento junto de instituições de crédito, ou colocado por instituições de crédito junto de investidores (papel comercial e obrigações), sendo de destacar os contratos de financiamento, de conta corrente caucionada, de descoberto bancário, relativos a programas de papel comercial e a empréstimos obrigacionistas.

 

As instituições de crédito mutuantes são o D..., o E..., o F..., o G..., o H..., o I..., a J..., a K..., o L..., o M..., o N..., o O..., a P..., o Q..., o R... e o S..., domiciliadas em Portugal, e o T... (Espanha), domiciliado em Estado Membro da União Europeia, que liquidaram e entregaram ao Estado o imposto do selo, na qualidade de sujeitos passivos, com referência àqueles financiamentos, nos termos da Verba 17. da TGIS, salvo no caso do T..., não residente em território português, cuja liquidação e entrega foi feita pela A... SGPS, S.A..

 

As instituições de crédito domiciliadas em Portugal repercutiram o encargo do imposto do selo na esfera das Requerentes, enquanto utilizadoras dos créditos em causa, enquanto a A... SGPS, S.A. liquidou e suportou o encargo relativo ao imposto do selo devido ao abrigo do contrato de financiamento celebrado com o T....

 

A sujeição a imposto do selo dos encargos (comissões) por si suportados relativamente aos contratos de emissão de papel comercial e a empréstimos obrigacionistas é ilegal por violação do artigo 1.º, n.º 1, do CIS, conjugado com a Tabela Geral de Imposto do Selo e, bem assim, por violação do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7/CE do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre as reuniões de capitais.

 

Com efeito, a Directiva 2008/7/CE, nos termos da referida disposição, proíbe expressamente os Estados Membros de sujeitar a tributação indirecta “[o]s empréstimos, incluindo os estatais, contraídos sob a forma de emissão de obrigações ou outros títulos negociáveis, independentemente de quem os emitiu, e todas as formalidades conexas, bem como a criação, emissão, admissão à cotação em bolsa, colocação em circulação ou negociação dessas obrigações ou de outros títulos negociáveis.” Sendo que a não sujeição a imposto do selo incorpora não apenas as operações de emissão de obrigações e de papel comercial, como os encargos decorrentes dos contratos de emissão de obrigações e de papel comercial, maxime as comissões cobradas pelos bancos, por revestirem a natureza de “formalidades conexas” com estes mesmos contratos.

 

A sujeição a imposto do selo dos referidos encargos é também ilegal, por violação do artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do CIS porquanto as requerentes, na qualidade de mutuários preenchem a condição de instituição financeira, ao abrigo da legislação comunitária, e beneficiam da isenção prevista nesse preceito.

 

Conclui no sentido de que as autoliquidações de imposto de selo relativas a operações de crédito e intermediação financeira em emissões obrigacionistas e de papel comercial referentes aos períodos de Fevereiro a Dezembro de 2015, de Janeiro a Março de 2016, de Fevereiro a Dezembro de 2017 e de Janeiro a Dezembro de 2018, padecem de vício material de violação de lei.

 

A Autoridade Tributária, na sua resposta, invoca a incompetência do tribunal para apreciar os actos de autoliquidação de imposto do selo relativamente a encargos suportados com contratos de emissão de papel comercial e de empréstimos obrigacionistas, por considerar que nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, a impugnação está dependente de prévio recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Em sede de impugnação e relativamente às autoliquidações de IS sobre encargos com comissões bancárias cobradas pelas instituições bancárias, a título da prestação de serviços de intermediação financeira em emissões obrigacionistas e de papel comercial, a Requerida começa por referir que não está em causa, na situação do caso, a autoliquidação do imposto do selo sobre quaisquer operações que tenham directamente por objecto operações com títulos de dívida decorrentes de emissões de empréstimos obrigacionistas ou de papel comercial.

 

Embora constitua entendimento corrente que a emissão de obrigações, incluindo a emissão de papel comercial, não está sujeita a imposto de selo, por falta de previsão na Tabela Geral do Imposto do Selo, o que se encontra em conformidade com o disposto com o artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7/CE, o certo é que as Requerentes pretendem que esta disposição da Directiva incorpora também a proibição de sujeição a Imposto do Selo dos encargos decorrentes dos contratos de emissão de obrigações e de papel comercial, maxime as comissões cobradas pelos bancos  na vigência dos referidos contratos, por revestirem a natureza de “formalidades conexas” com estes mesmos contratos.»

 

O TJUE tem vindo a entender que essa disposição da Directiva deve ser interpretada em sentido amplo, de modo a abranger todas as operações de entradas de capitais que, mesmo não expressamente previstas, possam considerar-se partes integrantes de uma operação global, todavia, essa orientação não é transponível de forma automática para a tributação em imposto do selo das comissões e outros serviços financeiros prestados pelas instituições bancárias.

 

De facto, a incidência do imposto do selo sobre a remuneração das instituições bancárias pela sua atuação como intermediários financeiros nas emissões de obrigações ou de papel comercial não tem qualquer paralelo com “formalidades conexas” a esses instrumentos de financiamento.

 

Pelo que não pode considerar-se que as autoliquidações do imposto do selo pela Verba 17.3.4 sobre as comissões ou remunerações de serviços prestados pelas instituições bancárias pela intermediação financeira nas emissões de empréstimos obrigacionistas e de papel comercial, é proibida pelo artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7/CE. 

 

Quanto à pretendida isenção do imposto de selo em aplicação do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do CIS, a Autoridade Tributária sustenta que as Requerentes, enquanto sociedades gestoras de participações sociais, não podem ser qualificadas como instituições financeiras, de crédito ou sociedades financeiras para efeitos dessa disposição, pelo que não beneficiam da referida isenção.

 

Conclui no sentido da procedência da excepção de incompetência do tribunal e, se assim se não entender, pela improcedência do pedido arbitral.

 

2. No seguimento do processo, por despacho arbitral de 2 de Abril de 2021, as Requerentes foram notificadas para se pronunciarem sobre a suscitada questão da incompetência do tribunal.

 

Em resposta, as Requerentes referem, em síntese, que, conforme é entendimento jurisprudencial, o objecto real da impugnação é o acto de liquidação e não o acto que decidiu a reclamação, pelo que são os vícios daquela e não deste despacho que estão verdadeiramente em crise, e, assim a impugnação não está, por isso, limitada pelos fundamentos invocados na reclamação graciosa, podendo ter como fundamento qualquer ilegalidade do acto tributário. E, nesse sentido, o tribunal está habilitado a conhecer de qualquer ilegalidade quer ela haja sido ou não anteriormente invocada em sede administrativa, nomeadamente no âmbito de um procedimento de reclamação graciosa ou de recurso hierárquico.

 

Concluem no sentido de que o tribunal é materialmente competente para se pronunciar sobre ilegalidade do acto tributário não invocada no precedente procedimento administrativo e suscita a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT na interpretação segundo a qual o tribunal arbitral se encontra impedido de se pronunciar sobre ilegalidade do acto tributário não invocada em sede de procedimento administrativo, por violação dos princípios do Estado de direito democrático e do princípio da tutela jurisdicional efectiva.

 

 Por despacho de 23 de Abril de 2021, ao abrigo aplicação dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, e da celeridade, simplificação e informalidade processuais, foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e a apresentação de alegações.

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 23 de Dezembro de 2020.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

 

Cabe apreciar e decidir.

 

II – Saneamento

 

Incompetência do tribunal arbitral

 

4. A Autoridade Tributária suscita a questão da incompetência do tribunal para apreciar os actos de autoliquidação de imposto do selo relativamente a encargos suportados com contratos de emissão de papel comercial e de empréstimos obrigacionistas, por considerar que nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, a impugnação está dependente de prévio recurso à via administrativa, nos termos dos artigos 131.º a 133.º do CPPT, e não tendo sido essa questão abordada em sede de reclamação graciosa, fica vedado ao tribunal apreciar esse novo vício.

 

A referida disposição do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, determina que os serviços e organismos que integram a Administração Tributária vinculam-se à jurisdição arbitral no tocante a qualquer dos tipos de pretensões identificadas o n.º 1 do artigo 2.º desse Regime, com exceção das relativas à “declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do CPPT.

 

A disposição do artigo 131.º, como todas as demais para que remete a Portaria n.º 112-A/2011, tem o sentido inequívoco de  tornar exigível a prévia impugnação administrativa do acto tributário como condição de acesso à via jurisdicional, e está em plena consonância com o princípio expresso no artigo 185.º do CPA, segundo o qual as reclamações e recursos administrativos são necessários ou facultativos, conforme dependa ou não da sua prévia utilização a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de impugnação ou condenação à prática de acto devido (n.º 1).

 

Como tudo leva a concluir, a reclamação graciosa necessária prevista nas citadas disposições do CPPT constitui um requisito de impugnabilidade contenciosa do acto tributário, caracterizando-se como pressuposto processual atípico, que, como tal, se torna aplicável independentemente de a impugnação jurisdicional vir a ser deduzida perante um tribunal arbitral ou um tribunal estadual.

 

Por outro lado, a exigência legal de uma impugnação administrativa necessária tem em vista obter, por via de um procedimento de segundo grau, a reapreaciação da legalidade do acto impugnado, permitindo que a Administração possa ainda tomar uma posição definitiva sobre a questão antes de o interessado poder suscitar um litígio judicial.

 

O efeito útil e relevante do indeferimento da reclamação graciosa traduz-se na manutenção na ordem jurídica do acto tributário de liquidação, pelo que é esse mesmo indeferimento que torna justificável e necessário o recurso à jurisdição arbitral visto não ter sido possível obter a anulação administrativa ainda na fase pré-judicial.

 

O acto tributário de liquidação constitui, neste contexto, o objecto imediato do pedido, nada obstando que o interessado possa contra ele deduzir vícios que não foram arguidos na precedente fase de impugnação administrativa.

 

Nesse sentido se pronunciou o acórdão do STA de 3 de Junho de 2015 (Processo nº 0793/14), onde se consignou que “na impugnação judicial subsequente a decisão da Autoridade Tributária que recaia sobre reclamação graciosa ou pedido de revisão oficiosa do acto tributário, podem e devem, os órgãos jurisdicionais conhecer de todas as ilegalidades de substância que afetem o acto tributário em crise, quer essas ilegalidades tenham ou não sido suscitadas na fase graciosa do litígio impondo-se-lhes um dever acrescido quando se tratem de questões de conhecimento oficioso”.

 

Entendimento igualmente expresso nos acórdãos do STA de 18 de Maio de 2011 (Processo nº 0156/11) e de 3 de Julho de 2019 (Processo n.º 02957/16).

 

Não há, por isso, motivo para considerar verificada a alegada incompetência material do tribunal arbitral.

 

III - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

5. Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes.

 

  1. As Requerentes são sociedades gestoras de participações sociais, que se encontram reguladas pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro, e estão domiciliadas em Portugal;
  2. No âmbito da sua atividade, têm vindo a recorrer a financiamento junto de instituições de crédito, ou colocado por instituições de crédito junto de investidores (papel comercial e obrigações), sendo que no que respeita às liquidações de Imposto do Selo aqui em causa são de destacar os contratos de financiamento (mútuo), de conta corrente caucionada, de descoberto bancário, relativos a programas de papel comercial e a empréstimos obrigacionistas subjacentes às referidas liquidações e expressamente identificados pelas instituições de crédito em causa;
  3. As instituições de crédito mutuantes, o D..., o E..., o F..., o G..., o H..., o I..., a J..., a K..., o L..., o M..., o N..., o O..., a P..., o Q..., o R... e o S... são domiciliadas em Portugal, e instituição de crédito mutuante T... (Espanha) é domiciliada em Estado Membro da União Europeia;
  4.  As instituições de crédito liquidaram e entregaram ao Estado imposto de selo incidente sobre as operações de crédito, nos períodos de Fevereiro a Dezembro de 2015, de Janeiro a Março de 2016, de Fevereiro a Dezembro de 2017 e de Janeiro a Dezembro de 2018,de acordo com o quadro abaixo descrito:

 

A... SGPS, S.A.

Instituição de crédito

Data da liquidação

Guia do Imposto do Selo (n.º)

Natureza do Gasto

Valor de Imposto (€)

D...

mar/15

Comissões bancárias

160,00 €

abr/15

Juros bancários

 14.475,49 €

jun/15

Comissões bancárias

 180,00 €

set/15

Comissões bancárias

 160,00 €

dez/15

Comissões bancárias

 180,00 €

jan/16

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias

243.000,00 €

mar/16

Comissões bancárias

240,00 €

jun/17

Comissões bancárias

180,00 €

jul/17

Juros bancários

34.797,34 €

jul/17

Comissões bancárias

1.739,87

dez/17

Comissões bancárias

180,00 €

 

Subtotal D...

295.292,70 €

E…

fev/15

Juros bancários

8.004,07 €

mai/15

Juros bancários

8.102,81 €

ago15

Juros bancários

7.816,77 €

nov/15

Juros bancários

8.116,23 €

fev/16

Juros bancários

7.719,25 €

fev/17

Juros bancários

7.707,83 €

mai/17

Juros bancários

7.266,71 €

jun/17

Comissões bancárias

75.008,76 €

ago/17

Juros bancários

7.642,38 €

nov/17

Juros bancários

7.474,11 €

 

Subtotal E…

144.858,92 €

F...

fev/15

Utilização de crédito bancário

648,82 €

mar/15

Utilização de crédito bancário

986,69 €

abr/15

Utilização de crédito bancário

910,67 €

mai/15

Utilização de crédito bancário

960,92 €

jun/15

Comissões bancárias

2.344,28 €

jul/15

Utilização de crédito bancário

886,20 €

ago/15

Utilização de crédito bancário

208,81 €

set/15

Utilização de crédito bancário

226,44 €

out/15

Utilização de crédito bancário

265,66 €

nov/15

Utilização de crédito bancário

108,37 €

dez/15

Comissões bancárias

6.948,28 €

mar/16

Juros bancários

1.398,62 €

fev/17

Utilização de crédito bancário

876,65 €

mar/17

Juros bancários

359,53 €

jun/17

Comissões bancárias

514,00 €

out/17

Utilização de crédito bancário

6,25 €

nov/17

Utilização de crédito bancário

120,80 €

dez/17

Utilização de crédito bancário

784,57 €

 

Subtotal F...

18.555,56 €

G...

fev/15

-

Utilização de crédito bancário

6.997,73 €

mar/15

-

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

7.737,94 €

abr/15

-

Utilização de crédito bancário

4.037,87 €

mai/15

-

Utilização de crédito bancário

5.438,93 €

jun/15

-

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

12.322,24 €

jul/15

-

Utilização de crédito bancário

5.881,83 €

ago/15

-

Utilização de crédito bancário

726,93 €

set/15

-

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

2.020,92 €

out/15

-

Utilização de crédito bancário

408,00 €

nov/15

-

Utilização de crédito bancário

141,60 €

dez/15

-

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

3.734,05 €

jan/16

-

Utilização de crédito bancário

3.921,23 €

fev/16

-

Utilização de crédito bancário

4.433,32 €

mar/16

-

Comissões bancárias / Juros bancários

7.701,43 €

fev/17

-

Utilização de crédito bancário

4.078,75 €

mar/17

-

Comissões bancárias / Juros bancários

2.534,59 €

jun/17

-

Comissões bancárias

2.398,89 €

set/17

-

Comissões bancárias

1.737,78 €

nov/17

-

Utilização de crédito bancário

1.950,83 €

dez/17

-

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

6.563,60 €

 

Subtotal G...

84.768,46 €

H...

mar/15

Juros bancários

7.243,60 €

jun/15

Juros bancários

7.132,38 €

set/15

Juros bancários

3.524,73 €

dez/15

Juros bancários

3.502,49 €

mar/16

Juros bancários

3.412,50 €

 

Subtotal H...

24.815,70 €

I...

mar/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

8.970,19 €

mai/15

Comissões bancárias

250,00 €

jun/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

9.960,04 €

set/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

3.767,71 €

nov/15

Comissões bancárias

250,00 €

dez/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

7.020,62 €

jan/16

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

-59,27 €

mar/16

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

6.964,62 €

mai/17

Juros bancários

19.608,33 €

jun/17

Juros bancários

4.658,33 €

dez/17

Juros bancários

17.868,57 €

 

Subtotal I...

79.259,14 €

J...

fev/15

Utilização de crédito bancário/ Comissões bancárias/ Juros bancários

40.986,29 €

mar/15

Utilização de crédito bancário

7.466,67 €

abr/15

Utilização de crédito bancário

8.266,67 €

mai/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

16.028,77 €

jun/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias

38.891,67 €

jul/15

Utilização de crédito bancário/ Comissões bancárias / Juros bancários

41.938,97 €

ago/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias/ Juros bancários

26.380,23 €

set/15

Utilização de crédito bancário

8.266,67 €

out/15

Utilização de crédito bancário

8.000,00 €

nov/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

16.397,76 €

dez/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

32.495,54 €

 

Subtotal J...

245.119,24 €

U...

set/15

Comissões bancárias

2.700,00 €

out/17

Comissões bancárias

12.320,00 €

 

Subtotal U...

15.020,00 €

M...

fev/15

Utilização de crédito bancário

3.126,93 €

mar/15

Utilização de crédito bancário

3.705,14 €

abr/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

6.352,02 €

mai/15

Utilização de crédito bancário

3.751,48 €

jun/15

Utilização de crédito bancário

3.650,37 €

jul/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

4.173,79 €

ago/15

Utilização de crédito bancário

2.429,36 €

set/15

Utilização de crédito bancário

2.327,35 €

out/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

3.394,93 €

nov/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias

3.923,23 €

dez/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

5.493,23 €

jan/16

Utilização de crédito bancário

3.675,00 €

fev/16

Utilização de crédito bancário

2.186,25 €

mar/17

Utilização de crédito bancário

0,04 €

abr/17

Juros bancários

753,98 €

jul/17

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

26,67 €

set/17

Utilização de crédito bancário

182,42 €

out/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

3.484,72 €

nov/17

Utilização de crédito bancário

3.472,30 €

dez/17

Utilização de crédito bancário

3.206,05 €

 

Subtotal M...

59.315,27 €

 

mar/15

Comissões bancárias

26,00 €

N...

mai/15

Comissões bancárias

25.508,00 €

jun/15

Comissões bancárias

26,00 €

jul/15

Comissões bancárias

6.006,00 €

set/15

Comissões bancárias

26,00 €

nov/15

Comissões bancárias

13.433,00 €

dez/15

Comissões bancárias

130,00 €

jan/16

Comissões bancárias

6.006,00 €

mar/16

Comissões bancárias

1.073,34 €

fev/17

Comissões bancárias

776,11 €

mai/17

Comissões bancárias

1.073,34 €

jul/17

Comissões bancárias

3.511,20 €

ago/17

Comissões bancárias

1.073,34 €

nov/17

Comissões bancárias

1.073,34 €

dez/17

Comissões bancárias

3.300,00 €

 

Subtotal N…

63.041,67 €

O...

mar/15

Comissões bancárias

69,67 €

abr/15

Comissões bancárias

223,03 €

mai/15

Comissões bancárias

388,94 €

jun/15

Comissões bancárias

65,09 €

jul/15

Comissões bancárias

218,86 €

set/15

Comissões bancárias

55,64 €

out/15

Comissões bancárias

67,97 €

dez/15

Comissões bancárias

116,67 €

jan/16

Comissões bancárias

75,83 €

fev/17

Comissões bancárias

25,96 €

mar/17

Comissões bancárias

155,93 €

mai/17

Comissões bancárias

95,07 €

jun/17

Comissões bancárias

1.196,76 €

jul/17

Comissões bancárias

72,00 €

set/17

Comissões bancárias

187,51 €

nov/17

Comissões bancárias

13,20 €

dez/17

Comissões bancárias

297,78 €

 

Subtotal O...

3.325,91 €

P...

 

jun/15

Comissões bancárias

150,00 €

jul/15

Comissões bancárias

21.850,00 €

dez/15

Comissões bancárias

150,00 €

fev/16

Comissões bancárias

200,00 €

fev/17

Comissões bancárias

200,00 €

jun/17

Comissões bancárias

150,00 €

ago/17

Comissões bancárias

200,00 €

dez/17

Comissões bancárias

150,00 €

 

Subtotal P...

23.050,00 €

T... Espanha

 

jun/17

Juros bancários

1.552,78 €

dez/17

Juros bancários

5.757,20 €

jun/18

Juros bancários

4.929,17 €

dez/18

Juros bancários

4.432,29 €

 

Subtotal BCG Espanha

16.671,44 €

Q...

 

mai/17

Juros bancários

19.608,33 €

jun/17

Juros bancários

4.658,33 €

dez/17

Juros bancários

17.271,61 €

fev/18

Utilização de crédito bancário

275.000,00 €

fev/18

Comissões bancárias

33.000,00 €

jun/18

Juros bancários

26.033,33 €

jul/18

Juros bancários

14.787,50 €

 

Subtotal Q...

390.359,10 €

 

TOTAL

 

 

1.463.453,11 €

 

 

B... SGPS, S.A.

Instituição de crédito

Data da liquidação

Guia do Imposto do Selo (n.º)

Natureza do Gasto

Valor de Imposto (€)

F...

jun/15

Juros bancários

3.445,26 €

nov/15

Juros bancários

2.404,57 €

dez/15

Comissões bancárias

 20,00 €

jan/16

Utilização de crédito bancário

18,55 €

fev/16

Utilização de crédito bancário

152,34 €

mar/16

Comissões bancárias

204,40 €

fev/17

Utilização de crédito bancário

176,14 €

mar/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

337,37 €

abr/17

Utilização de crédito bancário

199,93 €

mai/17

Utilização de crédito bancário

195,30 €

jun/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

360,34 €

jul/17

Utilização de crédito bancário

161,10 €

ago/17

Utilização de crédito bancário

187,77 €

set/17

Comissões bancárias

362,49 €

out/17

Utilização de crédito bancário

134,48 €

nov/17

Utilização de crédito bancário

99,40 €

dez/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

237,15 €

 

Subtotal F...

8.696,59 €

L...

fev/15

Utilização de crédito bancário

555,52 €

mar/15

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

1.343,60 €

abr/15

Utilização de crédito bancário

 576,00 €

mai/15

Utilização de crédito bancário

556,80 €

jun/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.301,21 €

jul/15

Utilização de crédito bancário

595,20 €

ago/15

Utilização de crédito bancário

480,13 €

set/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.168,94 €

out/15

Utilização de crédito bancário

487,17 €

nov/15

Utilização de crédito bancário

456,43 €

dez/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.084,22 €

jan/16

Utilização de crédito bancário

526,06 €

fev/16

Utilização de crédito bancário

380,94 €

mar/16

Comissões bancárias / Juros bancários

525,09 €

fev/17

Utilização de crédito bancário

500,00 €

mar/17

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

1.335,43 €

abr/17

Utilização de crédito bancário

560,00 €

mai/17

Utilização de crédito bancário

660,00 €

jun/17

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

1.290,00 €

jul/17

Utilização de crédito bancário

580,00 €

ago/17

Utilização de crédito bancário

660,00 €

set/17

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

1.270,00 €

out/17

Utilização de crédito bancário

640,00 €

nov/17

Utilização de crédito bancário

600,00 €

dez/17

Utilização de crédito bancário / Juros bancários

1.262,50 €

 

Subtotal L...

19.395,24 €

R...

dez/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

45,65 €

jan/16

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

106,47 €

fev/16

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

71,88 €

mar/16

Comissões bancárias

33,89 €

fev/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

268,47 €

mar/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

299,26 €

abr/17

Comissões bancárias / Juros bancários

95,15 €

mai/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

467,25 €

jun/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

257,38 €

jul/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

276,28 €

ago/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

284,41 €

set/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

200,25 €

out/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

177,56 €

nov/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

190,86 €

dez/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

238,24 €

 

Subtotal R...

3.013,00 €

J...

mar/15

Juros bancários / Comissões bancárias

286,37 €

 

Subtotal J...

286,37 €

U...

fev/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.146,87 €

mar/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.056,80 €

abr/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.137,44 €

mai/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.111,55 €

jun/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

13.399,73 €

jul/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.119,70 €

ago/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.104,66 €

set/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

711,21 €

out/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

733,05 €

nov/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.122,67 €

dez/15

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

12.658,79 €

jan/16

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.007,18 €

fev/16

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.074,70 €

mar/16

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

534,16 €

fev/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.136,40 €

 

mar/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.026,43 €

 

abr/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.136,49 €

 

mai/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.101,53 €

 

jun/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

7.135,37 €

 

jul/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.099,93 €

 

ago/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.136,60 €

 

set/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.136,60 €

 

out/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.099,93 €

 

nov/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.136,60 €

 

dez/17

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

6.101,74 €

 

jan/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.135,01 €

 

fev/18

Comissões bancárias / Juros bancários

1.172,77 €

 

mar/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.042,22 €

 

abr/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.153,89 €

 

mai/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.116,66 €

 

jun/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.353,89 €

 

jul/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.116,66 €

 

ago/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.153,89 €

 

set/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.153,89 €

 

out/18

Utilização de crédito bancário / Comissões bancárias / Juros bancários

1.116,66 €

 

Subtotal U...

72.861,67 €

N…

jul/15

Comissões bancárias

6.506,50 €

jan/16

Comissões bancárias

6.506,50 €

jul/17

Comissões bancárias

3.803,80 €

 

Subtotal N…

16.816,80 €

S...

abr/15

Juros bancários

833,79 €

out/15

Juros bancários

552,98 €

 

Subtotal S...

1.386,77 €

 

TOTAL

 

 

122.456,44 €

  1.  

C... SGPS, S.A.

Instituição de crédito

Data da liquidação

Guia do Imposto do Selo (n.º)

Natureza do Gasto

Valor de Imposto (€)

I...

mar/15

Juros bancários/ Utilização de crédito bancário

2.651,12 €

jun/15

Juros bancários/ Utilização de crédito bancário

2.716,19 €

out/15

Juros bancários/ Utilização de crédito bancário

 2.169,78 €

 

Subtotal I...

7.537,09 €

 

TOTAL

 

 

7.537,09 €

 

  1. As instituições de crédito D..., E..., F..., G..., H..., I..., J..., K..., L..., M..., N..., o O..., P..., Q..., R... e S... fizeram repercutir o imposto de selo liquidado na esfera jurídica das Requerentes, enquanto entidades mutuárias, que suportaram integralmente o imposto.
  2. A Requerente A... SGPS, S.A. liquidou e suportou o encargo relativo ao Imposto do Selo devido ao abrigo do contrato de financiamento celebrado com o T....
  3. Em 20 de Março de 2019, as Requerentes apresentaram pedido de revisão oficiosa contra os actos de liquidação de imposto de selo emitidos no período de Fevereiro de 2015 a Janeiro de 2017, no montante total de € 1624.264,52, com fundamento na aplicação da isenção estabelecida na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS por se encontrarem qualificadas, enquanto entidades mutuárias, como instituições financeiras, ao abrigo da Directiva 2013/36/EU e Regulamento n.º 575/2013.
  4. O pedido de revisão oficiosa foi indeferido por despacho do chefe de divisão do serviço central de 12 de Setembro de 2019, praticado ao abrigo de subdelegação de competências, com base na informação dos serviços n.º 232 - APT 2019, que consta do documento n.º 6 junto com o pedido arbitral e aqui se dá como reproduzida;
  5. Na informação conclui-se que os juros, utilização de crédito, garantias e comissões e referentes às operações de financiamento não estão isentos de imposto de selo, visto que as Requerentes não se qualificam como instituição financeira e não preenchem os pressupostos da isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto de Selo (ponto 104);
  6. Em 20 de Março de 2019, as Requerentes apresentaram reclamação graciosa relativamente aos actos tributários de liquidação de imposto de selo de Fevereiro de 2017 a Dezembro de 2018, no valor global de € 703.398,20, e a Requerente …, SGPS apresentou ainda reclamação graciosa relativamente à liquidação imposto de selo no âmbito de contrato de mútuo celebrado com o T..., S.A. domiciliado em Espanha, com fundamento na aplicação da isenção estabelecida na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do CIS por se encontrarem qualificadas, enquanto entidades mutuárias, como instituições financeiras, ao abrigo da Directiva 2013/36/EU e Regulamento n.º 575/2013.
  7. A reclamação graciosa foi indeferida por despacho do chefe de divisão do serviço central de 6 de Setembro de 2019, praticado ao abrigo de subdelegação de competências, com base na informação dos serviços n.º 226 - APT 2019, que consta do documento n.º 7 junto com o pedido arbitral e aqui se dá como reproduzida;
  8. Na informação conclui-se que os juros, utilização de crédito, garantias e comissões e referentes às operações de financiamento não estão isentos de imposto de selo, visto que as Requerentes não se qualificam como instituição financeira e não preenchem os pressupostos da isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto de Selo (ponto 91);
  9. Em 2 de Outubro de 2019, as Requerentes apresentaram os recursos hierárquicos n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, nº …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019…, n.º …2019… e n.º …2019…;
  10. Os recursos hierárquicos foram indeferidos por despacho do subdirector-geral de 1 de Julho de 2020, praticado ao abrigo de subdelegação de competências, com base em  informação dos serviços de idêntico teor, que consta dos documentos n.ºs 8 a 23 juntos com o pedido arbitral e aqui se dão como reproduzidos;
  11. Na informação conclui-se que as SGPS, Requerentes, não se qualificam, face à legislação comunitária como “instituições financeiras, não preenchendo, por esse motivo, o pressuposto subjectivo da  isenção prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto de Selo (ponto 35);
  12. Os despachos de indeferimento dos recursos hierárquicos foram notificados às Requerentes por ofício datado de 2 de Julho de 2020;
  13. O pedido arbitral deu entrada em 1 de Outubro de 2020

 

Factos não provados

 

Não há factos não provados que tenham relevo para a apreciação da causa.

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta, e em factos não questionados pelas partes.

 

Matéria de direito

 

6. As Requerentes pretendem que não há lugar a imposto do selo pelos encargos suportados relativamente a contratos de emissão de papel comercial e a empréstimos obrigacionistas com base em duas ordens de considerações: por um lado, não existe no direito interno norma de incidência do imposto sobre esse tipo de encargos e uma norma com tal conteúdo seria ilegal por violação do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7/CE, que proíbe a  sujeição a qualquer forma de imposto indirecto sobre operações de emissão de obrigações e de papel comercial e todas as “formalidades conexas”, em que se incluem encargos decorrentes desses contratos; por outro lado, as Requerentes, enquanto entidades mutuárias das operações de financiamento, deverão ser tidas como instituições financeiras para efeito do disposto no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do CIS e encontram-se abrangidas pela isenção de imposto aí prevista. 

 

Em contraposição, a Autoridade Tributária defende que a proibição da sujeição a imposto do selo por efeito do disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7/CE relativamente à emissão de obrigações e de papel comercial, não é aplicável às comissões cobradas pelas instituições de crédito no âmbito de serviços de intermediação, os quais se não enquadram no conceito de “formalidades conexas”, e, por outro lado, também não beneficiam da isenção do imposto nos termos do artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do CIS, na medida em que as Requerentes, enquanto sociedades gestoras de participações sociais, não podem ser qualificadas como instituições financeiras, de crédito ou sociedades financeiras para efeitos dessa disposição.

 

A primeira questão em análise foi já apreciada nos acórdãos proferidos nos Processos n.ºs 856/2019-T e 37/2020-T e não há motivo para alterar o entendimento aí expresso.

 

Não existe no direito interno, e especificamente na verba 17. da Tabela Geral do Imposto do Selo, referente a operações financeiras, disposição que sujeite a imposto do selo a emissão de obrigações e a emissão de papel comercial, o que se encontra em consonância com a Directiva 2008/7/CE do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, relativa aos impostos indirectos que incidem sobre reuniões de capitais. 

 

Como resulta do respectivo preâmbulo, e especialmente dos considerandos (2), (3), (4), (5) e (6), a Directiva 2008/7, que substituiu, a partir de 1 de janeiro de 2009, a Directiva 69/335, visa promover a livre circulação de capitais, considerada essencial para a criação de uma união económica com características análogas às de um mercado interno e a prossecução dessa finalidade pressupõe, no que respeita à tributação que incide sobre as reuniões de capitais, a supressão dos impostos indiretos até então em vigor nos Estados-Membros e a aplicação, em sua substituição, de um imposto cobrado uma única vez no mercado interno e de nível idêntico em todos os Estados-Membros (cfr. acórdão TJUE Isbelle Gielen vs Ministerraad, Processo n.º C-299/13, n.º 20).

 

Neste sentido, o artigo 5.º da Directiva, no seu n.º 1, proíbe qualquer forma de imposto indireto, nomeadamente sobre as entradas de capital, e as alíneas a) e b) do n.º 2 dispõem nos seguintes termos.

 

2. Os Estados-Membros não devem sujeitar a qualquer forma de imposto indirecto:

a) A criação, a emissão, a admissão à cotação em bolsa, a colocação em circulação ou a negociação de ações, de participações sociais ou de outros títulos da mesma natureza, bem como de certificados representativos desses títulos, independentemente de quem os emitiu;

b) Os empréstimos, incluindo os estatais, contraídos sob a forma de emissão de obrigações ou outros títulos negociáveis, independentemente de quem os emitiu, e todas as formalidades conexas, bem como a criação, emissão, admissão à cotação em bolsa, colocação em circulação ou negociação dessas obrigações ou de outros títulos negociáveis.

 

A Directiva esclarece que a proibição de incidência de imposto opera relativamente a empréstimos contraídos sob a forma de emissão de obrigações, independentemente de quem os emitiu, o que significa que nada obstaria que as sociedades ora Requerentes pudessem beneficiar do mesmo regime de isenção, caso optassem, nos termos legalmente previstos, por proceder directamente à emissão das obrigações (artigo 348.º do Código das Sociedades Comerciais), caso em que igualmente beneficiariam de não sujeição a imposto relativamente a todas as formalidades conexas como, por exemplo, o registo da emissão no livro de registo, o registo dos titulares das obrigações, a autenticação de atas sociais, registos comerciais e publicações da deliberação de emissão de obrigações pela sociedade.

 

A situação é distinta quando o que está em causa é, não a própria emissão de empréstimos obrigacionistas e de papel comercial pelas sociedades comerciais, mas os encargos com comissões bancárias cobradas pelas instituições de crédito a título de prestação de serviços de intermediação nessas operações financeiras.

 

Esses encargos não podem ser tidos como correspondendo a formalidades conexas com a emissão de obrigações ou de papel comercial, visto que não constituem procedimentos intrinsecamente associados às operações financeiras que são objecto de isenção de imposto, mas antes a contraprestação pelos serviços bancários realizados no âmbito dessas operações e de que as Requerentes poderiam ter prescindido se tivessem procedido à emissão directa dos títulos.

 

Cabe dizer que não tem aplicação ao caso a doutrina do acórdão do TJUE Air Berlin (Processo C-573/16).

 

Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça declara que os objetivos prosseguidos pelas referidas directivas, os artigos 10.º e 11.º da Directiva 69/335 e o artigo 5º da Directiva 2008/7, devem ser objecto de uma interpretação latu sensu, para evitar que as proibições previstas nestas disposições sejam privadas de efeito útil (parágrafo 31). Mas tinha aí em vista assegurar que a proibição da sujeição a impostos indirectos das operações de reunião de capitais se aplica igualmente às operações que não estão expressamente referidas nessa proibição quando se trate de tributar uma operação que faz parte integrante de uma operação global do ponto de vista da reunião de capitais (parágrafo 32).

 

Não há que efectuar uma tal interpretação extensiva das normas de direito europeu quando o que está em causa, não é a operação financeira em si mesma considerada, mas os encargos com uma actividade bancária que apenas indirectamente se relacionam a emissão de títulos negociáveis.

 

Improcede, por conseguinte, este fundamento do pedido.

 

7. A segunda   questão em debate consiste em saber se a Requerente, enquanto sociedade gestora de participações sociais, é considerada instituição financeira para efeito do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, que estabelece, nos termos aí previstos, a isenção de imposto.

 

A referida disposição da alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, que aqui está especialmente em foco, estatui nos seguintes termos:

 

Outras isenções

 

1 - São também isentos do imposto:

(…)

e) Os juros e comissões cobrados, as garantias prestadas e, bem assim, a utilização de crédito concedido por instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras a sociedades de capital de risco, bem como a sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária, umas e outras domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, a definir por portaria do Ministro das Finanças. 

 

A isenção prevista nesta disposição, cuja redação foi introduzida pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de dezembro, contempla dois requisitos. Um de natureza objetiva, incidindo sobre  juros e comissões cobrados pela concessão do crédito, garantias prestadas na concessão do crédito e utilização de crédito concedido, e um outro, de natureza subjetiva na origem, respeitante às entidades financeiras (instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras) que cobram os juros e comissões, recebem as garantias e concedem crédito, e de natureza subjetiva no destino, respeitante às entidades beneficiárias da concessão do crédito, que incluem as sociedades de capital de risco, bem como as sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária. Em qualquer dos casos, as entidades intervenientes devem ser domiciliadas nos Estados membros da União Europeia ou em qualquer Estado, com exceção das domiciliadas em territórios com regime fiscal privilegiado, definidos por Portaria do Ministro das Finanças (Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro e respetivas alterações).

 

A isenção abrange, por conseguinte, segundo a própria terminologia legal, a concessão de crédito a “instituições financeiras previstas na legislação comunitária”.

 

Esta remissão para a legislação comunitária, agora dito Direito da União Europeia, haverá de entender-se como uma remissão dinâmica, pretendendo referir-se ao conceito de “instituição financeira” que se encontre previsto no direito europeu à data em que se pretenda exercer o direito de isenção.

 

À data da entrada em vigor da nova redação do artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo, o dispositivo aplicável era o do artigo 1.º, n.º 5, da  Directiva 2000/12/CE, que caracterizava como uma instituição financeira “uma empresa que não seja uma instituição de crédito, cuja atividade principal consista em tomar participações ou exercer uma ou mais atividades referidas nos pontos 2 a 12 da lista do anexo”.

 

Essa Directiva foi entretanto substituída pela Directiva 2006/48/CE, por sua vez revogada pela Directiva n.º 2013/36/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que, juntamente com o Regulamento (UE) n.º 575/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, constitui o atual enquadramento jurídico que rege o acesso à atividade das instituições de crédito e que estabelece o quadro de supervisão e as regras prudenciais aplicáveis às instituições de crédito e às empresas de investimento.

 

A Directiva 2013/36/EU, no seu artigo 3.º, n.º 1, ponto 22), declara como sendo uma instituição financeira, para efeitos da directiva, “uma instituição financeira na aceção do artigo 4.º, n.º 1, ponto 26), do Regulamento (UE) n.º 575/2013”.

 

Por sua vez, o Regulamento (UE) n.º 575/2013 - para que é efetuada a remissão -, no seu artigo 4.º, sob a epígrafe “Definições”, e na parte que mais interessa considerar, prescreve o seguinte:

 

Artigo 4.º

Definições

  1. Para efeitos do presente regulamento, aplicam-se as seguintes definições:

(...)

1) “Instituição de crédito”: uma empresa cuja atividade consiste em aceitar do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder crédito por conta própria;

3) "Instituição": uma instituição de crédito ou uma empresa de investimento;

(...)

26) "Instituição financeira": uma empresa que não seja uma instituição, cuja atividade principal é a aquisição de participações ou o exercício de uma ou mais das atividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15, da Directiva 2013/36/UE, incluindo uma companhia financeira, uma companhia financeira mista, uma instituição de pagamento, na aceção da Directiva 2007/64/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2007, relativa aos serviços de pagamento no mercado interno, e uma sociedade de gestão de ativos, mas excluindo as sociedades gestoras de participações no setor dos seguros e as sociedades gestoras de participações de seguros mistas, na aceção do artigo 212.º, n.º 1, ponto g) da Directiva 2009/138/CE”.

 

A Directiva 2013/2013/EU foi transposta para o direito interno pelo Decreto-Lei n.º  157/2014, de 24 de outubro, que, para esse efeito, procede à alteração do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

 

Uma das disposições aditadas por esse diploma é do artigo 2.º-A, que sob a epígrafe “Definições”, na parte relevante, é do seguinte teor:

 

Para efeitos do disposto presente Regime Geral, entende-se por:

(…)
z) «Instituições financeiras», com exceção das instituições de crédito e das empresas de investimento:
 i) As sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, incluindo as companhias financeiras e as companhias financeiras mistas;
 ii) As sociedades cuja atividade principal consista no exercício de uma ou mais das atividades enumeradas nos pontos 2 a 12 e 15 da lista constante do anexo I à Directiva n.º 2013/36/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013;
 iii) As instituições de pagamento;

(…).
 

Este preceito correlaciona-se com o artigo 117.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, que, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 157/2014, sob a epígrafe “Sociedades Gestoras de Participações Sociais, dispõe o seguinte:

 

1 - Ficam sujeitas à supervisão do Banco de Portugal as sociedades gestoras de participações sociais quando as participações detidas, direta ou indiretamente, lhes confiram a maioria dos direitos de voto em uma ou mais instituições de crédito ou sociedades financeiras.

2 - O Banco de Portugal pode ainda sujeitar à sua supervisão as sociedades gestoras de participações sociais que, não estando incluídas na previsão do número anterior, detenham participação qualificada em instituição de crédito ou em sociedade financeira.

3 - Excetuam-se da aplicação do número anterior as sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Instituto de Seguros de Portugal.

4 – O disposto nos artigos 30.º a 32.º, com as necessárias adaptações, 42.º-A, 43.º-A e nos n.ºs 1 e 3 do artigo 115.º é aplicável às sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal.

 

8.  Efectuando o artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo uma remissão para as “sociedades ou entidades cuja forma e objecto preencham os tipos de instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições financeiras previstos na legislação comunitária”, quando se refere a entidades beneficiárias da concessão do crédito,  parece claro que o preceito pretende remeter para as disposições de direito europeu aplicáveis, e,  na atualidade, no que se refere às instituições financeiras, essas disposições são  - como se viu - a do artigo 3.º, n.º 1, ponto 22), da Directiva 2013/36/EU e, por via de remissão,  a do artigo 4.º, n.º 1, ponto 26), do Regulamento (UE) n.º 575/2013.

 

No preceito para que se efetua a remissão, o Regulamento define como "instituição financeira" uma empresa que não seja uma instituição [de crédito], cuja atividade principal é a aquisição de participações ou o exercício de uma ou mais das atividades enumeradas no Anexo I, pontos 2 a 12 e 15, da Directiva 2013/36/U, com exclusão das sociedades gestoras de participações no setor dos seguros e as sociedades gestoras de participações de seguros mistas, na aceção do artigo 212.º, n.º 1, ponto g) da Directiva 2009/138/CE”.

 

       Torna-se assim evidente que a remissão da norma que estabelece a isenção de imposto de selo é feita para o direito europeu e, especificamente, para sobreditas disposições da Directiva 2013/36/EU e do Regulamento (UE) n.º 575/2013, havendo de reconhecer-se, neste contexto normativo, que uma instituição financeira, para o aludido efeito, é, além de outras que exerçam certas atividades enumeradas no anexo, uma empresa que, não sendo uma instituição de crédito, tem como principal atividade a aquisição de participações, desde que se não trate de sociedades gestoras de participações no setor dos seguros.

 

       Certo é que na transposição da Directiva 2013/36/EU para o direito interno, o legislador nacional adotou um conceito mais restritivo de “instituição financeira”, caracterizando como tal “as sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Banco de Portugal”.

 

No entanto, para efeitos da aplicação da isenção do imposto de selo, o artigo 7.º, n.º 1, alínea e), não remete para o direito interno, mas para o direito da União Europeia, o que significa que a definição constante do artigo 2.º-A do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aditado pelo diploma que procedeu à transposição da Directiva, releva para os demais efeitos da regulação das sociedades gestoras de participações sociais, e não para o específico aspeto da isenção de imposto de selo.

 

9. Segundo o disposto no Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro, que define o regime jurídico das sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), estas sociedades, conforme o seu artigo 1.º, “têm por único objecto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas” (n.º 1), sendo que a participação numa sociedade é considerada forma indireta de exercício da atividade económica desta quando não tenha carácter ocasional e atinja, pelo menos, 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer por si só, quer através de participações de outras sociedades em que a SGPS seja dominante (n.º 2).

 

Os contratos pelos quais se constituem as SGPS devem mencionar expressamente como objecto único da sociedade a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas (artigo 2.º, n.º 2), sendo permitida às SGPS a prestação de serviços técnicos de administração e gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações ou com as quais tenham celebrado contratos de subordinação (artigo 4.º, n.º 1).

 

Tratando-se de sociedades que têm por único objecto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas, não oferece dúvidas que as sociedades gestoras de participações sociais se enquadram no conceito de “instituição financeira”, tal como se encontra definido no direito europeu, e, assim sendo, beneficiam da isenção de imposto estabelecida no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo.

 

Como é tido como assente (alínea A) da matéria de facto) - e não é sequer controvertido pelas partes -, a Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais, que se encontra regulada pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro, e está domiciliada em Portugal. E nessa qualidade não pode deixar de se encontrar abrangida pelo conceito relevante de instituição financeira para efeito da aplicação da isenção do imposto de selo prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto de Selo.

 

10. Como é de concluir, as operações financeiras em causa preenchem os pressupostos objetivos e subjetivos da isenção de imposto de selo, na medida que respeitam à concessão de crédito por instituição de crédito a uma sociedade gestora de participações sociais, que se qualifica, à luz da legislação de direito europeu, como instituição financeira, e em que intervieram instituições mutuantes e mutuária que se encontram domiciliadas em Estados-Membros da União Europeia, e não em nenhum dos territórios com regime privilegiado previsto no Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro.

 

O pedido arbitral mostra-se ser procedente com este outro fundamento.

 

      Reenvio prejudicial

 

       11. As Requerentes, no pedido de pronúncia arbitral, vêm requerer, a título subsidiário, o recurso ao mecanismo do reenvio prejudicial para o TJUE, nos termos do artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, caso o tribunal arbitral se confronte com dúvidas sobre a interpretação do artigo 5.º, n.º 2, alínea b), da Directiva 2008/7.

 

            No entanto, como se deixou esclarecido, essa disposição não suscita qualquer dificuldade quanto ao âmbito objectivo de aplicação ou à interpretação a dar ao conceito de “formalidades conexas”, pelo que não há motivo para efectuar o pretendido reenvio prejudicial.

 

 

Reembolso do imposto indevidamente pago e juros indemnizatórios

 

12. A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

 

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

Por efeito da reconstituição da situação jurídica em resultado da anulação do acto tributário, há assim lugar ao reembolso do imposto indevidamente pago.

 

Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

III - Decisão

 

Termos em que se decide:

 

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e declarar a ilegalidade e a anulação dos actos tributários de autoliquidação do imposto do selo impugnados, no montante de € 1.593.446,65, relativos ao período de Fevereiro a Dezembro de 2015, Janeiro a Março de 2016, Fevereiro a Dezembro de 2017 e Janeiro a Dezembro de 2018, bem como dos despachos de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, de reclamação graciosa e de recurso hierárquico;
  2. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no reembolso do imposto indevidamente pago e no pagamento dos juros indemnizatórios, à taxa legal, desde a data do pagamento até à do processamento da respectiva nota de crédito.

 

Valor do Processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), fixa-se ao processo o valor de € 1.593.446,65.

 

 

Custas

 

Nos termos do artigo 4.º, n.º 4 do citado RCPAT e artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4 do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 21.114,00, nos termos da Tabela I, anexa àquele regulamento, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique.

 

Lisboa, 4 de Junho de 2021,

 

 

O Presidente do Tribunal Arbitral,

 

 

Carlos Fernandes Cadilha

 

A Árbitro vogal

 

 

Marisa Almeida Araújo

 

O Árbitro vogal

 

 

Joaquim Silvério Mateus