Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 473/2020-T
Data da decisão: 2021-05-31  IRC  
Valor do pedido: € 293.620,75
Tema: IRC. Despesas não documentadas. Caducidade do direito à liquidação.
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Sumário:

I - Às despesas não documentadas sujeitas a tributação autónoma, nos termos do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, não se aplica o princípio da especialização dos exercícios e periodização do lucro tributável, enunciado no artigo 18.º. n.º 1, desse Código;

II- Tendo-se registado uma diferença entre o montante apurado na contagem física da conta de Caixa e o saldo contabilístico da mesma conta, e não tendo sido posta em causa a credibilidade dos registos contabilísticos, é ao sujeito passivo que cabe carrear elementos de prova que justifiquem o desvio do saldo em face dos efectivos fundos monetários disponíveis;

III – A norma do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, ao sujeitar a tributação autónoma as despesas não documentadas, constitui uma norma de incidência tributária e não assenta em qualquer presunção legal quanto qualificação das despesas a que a disposição se torna aplicável.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Acordam em tribunal arbitral

 

I – Relatório

 

1. A… -, LDA., pessoa coletiva n.º …, com sede na Rua de …, …, …, …, vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade do acto de liquidação adicional de IRC n.º 2020 ... e da respetiva demonstração de acerto de contas, em que se apurou um montante total a pagar de € 293.620,75, requerendo ainda o reembolso do imposto indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios.

 

Fundamenta o pedido nos seguintes termos.

 

A Requerente é uma sociedade de direito português, constituída em 21 de novembro de 1986, que prossegue a actividade principal de “produção de filmes e espetáculos”, estando sujeita ao regime geral de determinação do lucro tributável em sede de IRC e ao regime geral para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado.

Em cumprimento das Ordens de Serviço n.º OI2018... e n.º OI2018..., a Requerente foi objecto de uma inspecção tributária com incidência sobre os períodos de tributação de 2015 e 2016.

Na origem das ordens de serviço esteve a necessidade de se fazer um controlo de contribuintes com saldo de caixa elevado, e avaliar a situação tributária do sujeito passivo quanto ao cumprimento das obrigações fiscais nos exercícios de 2015 e 2016.

Neste âmbito da análise, a Autoridade Tributária verificou que a Requerente no final do exercício de 2015, apresentava um saldo de caixa no valor de € 527.915,16 e no total da rúbrica Caixa e Depósitos Bancários, àquela data, acumulava um saldo de € 1.284.304,71. Relativamente ao ano de 2016, o saldo da rúbrica Caixa no final daquele exercício tinha um valor de € 3.857,30, sendo que o total da rúbrica Caixa e Depósitos Bancários, àquela data, acumulava um saldo de € 752.530,00.

Neste contexto, foi transmitido à Autoridade Tributária que a Requerente procedeu, em 2016, à conferência dos saldos nas contas de caixa, transferindo da conta #111 Caixa o montante de € 527.730,87 por contrapartida da conta #2781997, com o objectivo de ajustar o saldo da rúbrica de Caixa de modo a que o mesmo refletisse corretamente as disponibilidades líquidas da sociedade.

Ainda em resposta à solicitação dos serviços inspectivos, a Requerente disponibilizou à Autoridade Tributária a informação financeira relevante relativa às contas utilizadas naquela regularização contabilística, nomeadamente os extratos das contas #111, #2781997, por respeito a 2016, e das contas #2781997 e #59, por respeito a 2018, assim como os balancetes analíticos dos anos de 2015, 2016 e 2018. E a contabilista certificada da Requerente esclareceu que o saldo de caixa de € 555.304,93 em grande parte dizia respeito a encargos realizados pela sociedade mas que não estavam devidamente documentadas, incorridos praticamente desde a constituição da sociedade até ao exercício de 2011.

Não obstante, no Relatório de Inspecção Tributária concluiu que os movimentos realizados na conta 27.8.1.99, por contrapartida de Caixa correspondem à saída de meios monetários desprovida de suporte documental sujeita a tributação autónoma nos termos do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, tendo efectuado, consequentemente, uma correção no montante de € 263.865,41 correspondente, em 2016, a 50% das despesas consideradas não documentadas (€ 527.730,81).

No entanto, o ónus da prova dos factos constitutivos do direito à liquidação com base na tributação autónoma pertence à Autoridade Tributária e não sendo possível concluir que os movimentos contabilísticos respeitam a despesas não documentadas ocorridas em 2016, mas a períodos de tributação anteriores a 2011, verifica-se a caducidade do direito à liquidação que, nos termos do artigo 45.º da LGT ocorre no prazo de quatro anos a contar do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a o facto tributário.

Por outro lado, a norma do artigo 88.º do Código do IRC que estabelece a tributação autónoma não tem natureza presuntiva e constitui uma norma de incidência que deverá operar à luz das regras relativas à especialização de exercícios e periodização do lucro tributável.

E, por conseguinte, a liquidação é ilegal deve ser anulada.                

A Autoridade Tributária, na sua resposta, sustenta que o reconhecimento de despesas não documentadas resultou do lançamento contabilístico efectuado em 31.12.2016, que se traduziu no crédito da conta #11Caixa e no débito da conta #27.8.1.99, que visou regularizar o saldo de Caixa, na sequência de contagem física das existências de meios monetários.  

 

Tanto os serviços inspectivos, no âmbito do procedimento de inspecção tributária, como a Requerente, no pedido arbitral, convergem no entendimento de que os valores da rubrica Caixa/Depósitos bancários que figuravam nas demonstrações financeiras da IES eram elevados pelo menos desde 2010, não havendo evidência de correspondência entre os saldos das contas e os meios monetários existentes no final de cada um dos correspondentes períodos de tributação.

 

Nem foram apresentados documentos comprovativos de operações de controlo regular dos meios monetários existentes em Caixa, como contagens físicas ou folhas de Caixa, ou de reconciliações de contas bancárias, que pudessem demonstrar o montante real das disponibilidades financeiras no final de cada período.

 

Por outro lado, a regularização do saldo da conta Caixa não se traduz no reconhecimento contabilístico de “despesas não documentadas”, procedimento que apenas veio a ser adoptado no exercício de 2018, sendo certo que a conferência física de Caixa permitiu revelar que, à data de 31.12.2016, os valores monetários na disponibilidade da Requerente não correspondiam ao saldo contabilístico, tendo a divergência sido registada noutra conta do activo.

 

A Requerente contesta a imputação das despesas não documentadas ao exercício de 2016, ano em que foi dada expressão, na contabilidade, à retirada dos valores de Caixa, no entanto,  acabou por reflectir as despesas no lucro tributável de 2018, ano em que foram registadas na conta #5991, assim, reconhecendo a impossibilidade material de identificar os exercícios em que terão sido realizadas.

 

Ora, a Requerente incumpriu a obrigação de contabilizar as despesas não documentadas, pelo que é a verificação da falta de meios financeiros revelada pelo crédito da conta Caixa efectuado à data de 31.12.2016, que gera, por si, a ocorrência do facto tributário para efeitos da tributação autónoma nos termos do n.º 1 do artigo 88.º do Código do IRC, sendo inaplicável a esse tipo de despesas o princípio da especialização dos exercícios ou de periodização do lucro tributável, enunciado no n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRC, que assenta no critério de competência económica dos rendimentos e dos gastos e de outras componentes positivas e negativas que concorrem para o lucro tributável.

 

Na ausência de contabilização das despesas não documentadas, só é possível apurar a sua ocorrência mediante contagem física das existências de meios monetários, que poderá ser seguida ou não da regularização do saldo da conta, não se prefigurando outra forma de detecção de saídas de activos monetários do património da empresa não documentadas nem registadas.

 

Por outro lado, não é à Autoridade Tributária que cabe demonstrar que o efluxo de Caixa verificado em 2016 decorre efectivamente de despesas não documentadas suportadas naquele exercício (o que veio a ser reconhecido por via do lançamento contabilístico efectuado em 31.12.2016), sendo que não é possível impor à Administração o ónus da prova que só a Requerente estaria em condições de realizar através, nomeadamente, da apresentação de mapas e documentos internos.

 

Neste contexto, a tese propugnada pela Requerente viola o princípio da igualdade e o critério de repartição do ónus da prova.

 

Conclui no sentido da improcedência do pedido arbitral.

 

2. No seguimento do processo, por despacho de 21 de Abril de 2021, o tribunal dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, bem como a apresentação de alegações escritas por considerar não existirem quaisquer novos elementos sobre que as partes se devessem pronunciar.

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 17 de Dezembro de 2020.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

 

Cabe apreciar e decidir.

 

II - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

4. Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes.

A) A Requerente é uma sociedade de direito português, constituída a 21 de novembro de 1986, que prossegue a actividade principal de “produção de filmes e espetáculos”, estando sujeita ao regime geral de determinação do lucro tributável em sede de IRC e ao regime geral para efeitos de IVA;

B) A Requerente foi alvo de uma acção de inspecção tributária, credenciada pelas Ordens de Serviço n.ºs OI2018... e OI2018..., com incidência nos períodos de tributação de 2015 e de 2016, e que tiveram por objecto o controlo de contribuintes com saldo de caixa elevado, e avaliar a situação tributária do sujeito passivo quanto ao cumprimento das obrigações fiscais, nos exercícios de 2015 e 2016.

C) No âmbito do procedimento inspectivo, os serviços verificaram que em 2015 a empresa apresentava um saldo de caixa no valor de € 527.915,16 que já não se encontrava evidenciado no balancete de 2016 e, segundo a informação prestada pela contabilista certificada, estava inscrito na contabilidade há muitos anos e foi regularizado no exercício de 2016, tendo sido acrescido ao quadro 7 da declaração modelo 22 do exercício de 2018;

D) Os serviços inspectivos propuseram uma correcção tributária relativamente ao exercício de 2016, tendo por base um valor de despesas não documentadas de € 527.915,16, tributado autonomamente, nos termos do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, à taxa de 50%, correspondente a um montante total de € 293.620,75;

E) A correcção originou o acto de liquidação n.º 2020 ..., datado de 6 de Maio de 2020, no montante total de € 293.620,75, correspondente ao imposto em falta de € 263.865,41, acrescido de juros compensatórios no valor de € 29.755,34;

F) O Relatório de Inspecção Tributária a fundamenta a correcção em causa nos seguintes termos:

 

III. Descrição dos Factos e Fundamentos das Correções Meramente Aritméticas à Matéria Tributável

 

III. – 1.1. Saldos de caixa

No que respeita aos saldos de caixa, questionámos a Contabilista Certificada (CC), da A..., sobre o saldo da conta 11, tendo a esta informado o seguinte:

“O saldo de caixa superior a €5000.000,00 (mais concretamente €555.304,93) dizia em grande parte respeito a encargos realizados pela sociedade mas que não estavam devidamente documentados, incorridos praticamente desde a constituição da sociedade até ao exercício de 2011. Precisamente por não estarem devidamente documentados,   estes encargos nunca foram reconhecidos, demonstração de resultados da sociedade, tendo acumulado como um saldo em contas de caixa.

Tendo-se procedido em 2016 a conferência de saldos nas contas de caixa, optou-se por acertar o saldo de caixa de modo a refletir corretamente as disponibilidades da sociedade, tendo sido transferido €527.730,87 (o valor concreto das despesas indevidamente documentadas) para uma conta #2781997.

Refira-se que no exercício de 2018 esse mesmo valor foi transferido da conta #2781997 para uma conta #5991 da sociedade, uma vez que nunca foi um saldo da sociedade sobre o seu sócio. A variação patrimonial positiva gerada por tal movimento, sempre no montante de €527.730,87, foi acrescida no modelo 22 desse exercício e objeto de tributação em sede de IRC, nos termos legais.”

Com efeito, da consulta às IES de 2010 e seguintes, foi possível constatar que este saldo está discriminado no balanço, designadamente na rubrica de caixa e depósitos.

Com propósito de clarificar os referidos movimentos contabilísticos solicitámos, adicionalmente, a apresentação dos extratos de conta, relativos a este procedimento, os quais evidenciaram que a regularização do saldo, de caixa, foi efetuada a 31-12-2016. Da forma já descrita.

Na análise documental, constatámos que o movimento que deu origem à diminuição do saldo de caixa, que ocorreu a 31-12-2016 tendo como contrapartida o aumento da conta 27.8.1.99, no mesmo montante, €527.730,87, sem que tenha influenciado o resultado do exercício, positiva ou negativamente.

As declarações fiscais do sujeito passivo são tidas como verdadeiras e de boa-fé como decorre do artigo 75.º n.º 1 da LGT. A presunção anterior verifica-se tendo em conta que a contabilidade do sujeito passivo se encontra devidamente organizada, nomeadamente os valores das prestações de serviços, dos fornecimentos e serviços externos, dos gastos com pessoal, estes estão patentes nas prestações de contas, nos valores declarados na aplicação do e-fatura (desde 2013), nas declarações fiscais obrigatórias entregues pelo sujeito passivo, bem como nos valores declarados por terceiros, permitindo o correto apuramento da matéria coletável, assinadas pelo CC e aprovadas por ROC e pela gerência.

Verificámos a falta de suporte documental para os movimentos realizados na conta 27.8.1.99, por contrapartida de Caixa, a que a Contabilista Certificada, refere tratarem-se de encargos realizados pela sociedade, mas que não estão devidamente documentados, o que se traduz numa saída de meios monetários desprovida de suporte documental, ou seja, numa despesa não documentada consubstanciada no artigo 88º n.º 1 do CIRC, tributada à taxa de 50%.

Importa referir que a despesa, não é necessariamente um gasto da empresa que pode ser, ou não, dedutível conforme especificam os artigos 23º e 23º A do CIRC, é uma saída de recursos financeiros podendo ser um gato ou outra realidade. E, desta forma, os movimentos contabilísticos efetuados no exercício de 2016 não afetam o resultado líquido do período.

Assim a correção proposta é a seguinte:

Período de Imposto        Valor das despesas

não documentadas        Taxa de tributação autónoma artigo 88º n.º 1    Tributação autónoma

12/2016               €527.730,81        50%       €263.865,41

 

G) No exercício do direito de audição, a Requerente manifestou discordância com a proposta de correcção, alegando, em síntese, o seguinte:

- Os saldos de caixa evidenciados na contabilidade, resultam de encargos não devidamente documentados e como tal, nunca reconhecidos nas demostrações de resultados;

- Em 2016 a sociedade procedeu à conferência dos saldos de caixa, transferiu o valor das despesas indevidamente documentadas, €527.730,87, para a conta 2781997;

- Em 2018 o sujeito passivo transferiu este montante da conta 2781997, para a conta 5991;

- A variação patrimonial gerada por este movimento contabilístico, foi acrescida ao Modelo 22 e tributado, neste exercício.

H) O relatório de final de inspecção tributária formulou os seguintes considerandos quanto ao alegado pela Requerente no exercício do direito de audição:

Analisada a exposição apresentada pelo sujeito passivo, oferece-se tecer as seguintes considerações:

- A requerente reconhece ter encargos não documentados, embora alegue que são de anos anteriores;

- A sociedade contesta a tributação efetuada, no exercício de 2016, uma vez que refere que o saldo de caixa em 2016 é consequência desses encargos não registados na contabilidade, em anos anteriores, o que não logrou comprovar;

- Contudo verifica-se que o registo contabilístico, do exfluxo de caixa, se efetuou em 2016, data em que o s.p. assume ter feito a conferência da conta caixa, logo não se pode deixar de considerar uma operação realizada em 2016;

- O SP também refere que a contabilidade e o apuramento do lucro tributável, estavam corretos, o que confirma o entendimento da AT, que é reforçado, quanto à força probatória, dada às contas da sociedade, pela contabilista certificada que visou as contas A...;

- Por outro lado, da análise á contabilidade da sociedade não foram identificados documentos de suporte para despesas a registar na conta caixa, no montante € 527.730,87, o que desconsidera estas despesas, como gastos nos termos do artigo n.º 23.º-A, do CIRC, “Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação:

- a)….

- b) As despesas não documentadas;”

- Não obstante, as despesas não serem consideradas para efeitos de apuramento do RLE, estão ainda sujeitos a tributação autónoma, de acordo com o disposto no artigo 88.º n.º 1 do CIRC, “1 – As despesas não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50%, sem prejuízo da sua não consideração como gastos nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º-A.”

- No que respeita à correção efetuada pelo s.p. em 2018, temos a referir que a presente ação inspetiva não está apreciar a alegada variação patrimonial positiva, registada no Q7 da Modelo 22 do exercício de 2018; contudo, segundo o referido essa operação terá resultado numa variação negativa no valor do capital próprio.

- Em todo o caso, a circunstância referida no ponto anterior não parece que possa constituir uma duplicação de coleta, já que uma coisa é a aplicação da Tributação Autónoma, sobre despesas não documentadas e outra será a determinação do lucro tributável de cada exercício, segundo a suas regras.

Pelo exposto e atendendo ao facto das alegações do s.p., não estarem suportadas por documentos ou outros dados, que alteram as conclusões vertidas no projeto de relatório, propomos que as mesmas se tornem definitivas.

I) No exercício de 2018, o valor de € 527.730,87 foi transferido da conta # 2781997 para a conta #599 1 e a variação patrimonial positiva gerada por esse movimento, no montante de € 527.730,87, foi acrescida na declaração modelo 22 relativa a esse exercício;

J) Em 24 de Junho de 2020, a Requerente procedeu ao pagamento do imposto resultante da liquidação adicional.

T) O pedido arbitral deu entrada em 21 de Setembro de 2020.

 

Factos não provados

 

Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta, e em factos não questionados pelas partes.

 

Na apreciação da prova, o Tribunal teve em consideração que a Requerente, no âmbito do procedimento inspectivo, reconheceu, através das declarações prestadas pela contabilista certificada, a existência de uma divergência entre o saldo de caixa e o registo contabilístico, no montante € 527.730,87, que foi verificado através da conferência dos saldos de caixa a que se procedeu em 2016, e que essa discrepância resulta de despesas não documentadas ocorridas em anos anteriores a 2011 (cfr. Relatório de Inspecção Tributária, doc. n.º 2  junto ao pedido, págs. 15-16 e 17).

 

Esta factualidade foi ainda reconhecida pela Requerente no âmbito do exercício do direito de audição no procedimento inspectivo (cfr.  processo administrativo, págs. 43-45, e artigo 23.º da petição inicial), além de que, no articulado inicial, a Requerente confessou judicialmente ter procedido, em 2016, à conferência dos saldos de caixa, de modo a ajustar as disponibilidades líquidas da sociedade,  e ter transferido da conta #111 Caixa o montante de € 527.730,87, por contrapartida da conta #2781997 (artigo 15.º).

 

                Matéria de direito

5. A questão em debate reconduz-se a saber se a regularização contabilística realizada em 2016, na sequência da conferência do saldo de caixa, que determinou a transferência do montante de € 527.915,16 para a conta #2781997, de modo a reflectir as disponibilidades líquidas da empresa, sendo respeitante a despesas não documentadas que poderão ter ocorrido em anos anteriores, poderão originar a liquidação adicional, a título de tributação autónoma, nos termos do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, no período de tributação em que ocorreu a regularização.

Numa primeira linha de análise, a Requerente alega que o ónus da prova dos factos constitutivos do direito à liquidação com base em tributação autónoma pertence à Autoridade Tributária e, não sendo possível concluir que os movimentos contabilísticos respeitam a despesas não documentadas ocorridas em 2016, mas a períodos de tributação anteriores a 2011, verifica-se a caducidade do direito à liquidação.

Em contraposição, a Autoridade Tributária considera que o sujeito passivo não cumpriu a obrigação de contabilizar as despesas não documentadas, reveladas pela divergência entre a contagem física da Caixa e o saldo contabilístico, pelo que é a verificação da falta de meios financeiros em 31 de Dezembro de 2016, que constitui o facto tributário para efeitos da tributação autónoma, sendo inaplicável a esse tipo de despesas o princípio da especialização dos exercícios ou de periodização do lucro tributável.

Como resulta da matéria de facto dada como assente, no âmbito do procedimento inspectivo, a Autoridade Tributária verificou que em 2015 a empresa apresentava um saldo de caixa no valor de € 527.915,16 que já não se encontrava evidenciado no balancete de 2016 e que, segundo a informação prestada pela contabilista certificada, respeitava a despesas realizadas desde a constituição da sociedade até ao exercício de 2011 que não estavam devidamente documentadas. A regularização foi efectuada em 2016 mediante a transferência daquele montante para a conta #2781997.

A Requerente não põe em causa que havia uma discrepância entre o saldo de caixa, verificado em contagem física no ano de 2016, e o saldo contabilístico, diferença que admite corresponderem a despesas não documentadas, mas contesta que as despesas tenham ocorrido no período de tributação de 2016 e que a regularização contabilística efectuada nesse ano possa originar, por si só, a sujeição a tributação autónoma.

6. Deve começar por dizer-se que quanto a este específico aspecto não há uniformidade na jurisprudência arbitral.

 Já se defendeu que para efeito da sujeição a tributação autónoma sobre despesas não documentadas, para além da demonstração da ocorrência de despesas desse tipo e da sua quantificação, torna-se necessário demonstrar que as mesmas ocorreram no exercício a que se reporta a correspondente liquidação, ou seja, só as despesas efectuadas num determinado período de tributação podem ser tributadas com referência a esse exercício.

Para assim se concluir, entende-se que, enquanto tributação em sede de IRC, a aplicação da tributação autónoma está sujeita às normas próprias daquele tributo, que não sejam incompatíveis com a sua natureza, designadamente e no que ao caso importa, no que diz respeito às regras relativas à especialização dos exercícios e periodização do lucro tributável, conforme decorre, para além do mais, dos artigos 8.º e 18.º do Código de IRC, com as necessárias adaptações que resultam de a tributação autónoma em causa ter subjacente um facto tributário instantâneo e de natureza financeira (cfr. acórdãos proferidos nos Processo 287/2017-T, 554/2017-T e o voto de vencido no Processo n.º 235/2020-T).

Em sentido oposto, sustenta-se que o princípio da especialização dos exercícios, relacionando-se com a  “periodização do lucro tributável”, como decorre do artigo 18.º do Código de IRC, pode justificar que as tributações autónomas em IRC sejam apuradas na declaração periódica anual e a respectiva liquidação se reporte a cada período fiscal, mas daí não resulta necessariamente que quanto a elas vigore o princípio da anualidade, enunciado no artigo 8.º, segundo o qual  “o IRC é devido por cada período de tributação” (cfr. acórdãos proferidos nos Processos n.º 228/2020-T, 235/2020-T e 269/2020.T).

É esta a questão que cabe primeiramente analisar 

Despesas não documentadas e natureza jurídica da tributação autónoma

6. A norma ao caso aplicável é a do artigo 88.º, n.º 1, do Código de IRC, na redação da Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, que estabelece que “as despesas não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50 %, sem prejuízo da sua não consideração como gastos nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º-A”.

Como despesas não documentadas devem entender-se aquelas que não têm por base qualquer documento justificativo ou de suporte documental a nível contabilístico, e, como tal, não especificam a sua natureza, origem ou finalidade (acórdão do TCA Sul de 7 de Fevereiro de 2012, Processo n.º 04690/11). Havendo de distinguir-se entre as despesas não documentadas e as despesas não devidamente documentadas, isto é, aquelas cujo suporte documental não obedece aos requisitos legalmente exigidos, embora permita identificar os beneficiários e a natureza da operação" e que apenas acarretam a não dedutibilidade para efeitos fiscais.

 

Ainda segundo o acórdão do STA de 7 de Julho de 2010 (Processo n.º 0204/10), "[a] apreciação da existência ou não da devida documentação e da confidencialidade da despesa é feita tendo por objecto o acto através do qual o sujeito passivo suporta o encargo ou a despesa que é susceptível de afectar o resultado líquido do exercício, para efeitos de determinação da matéria tributável de IRC. Isto é, o encargo não estará devidamente documentado quando não houver a prova documental exigida por lei que demonstre que ele foi efectivamente suportado pelo sujeito passivo e a despesa será confidencial quando não for revelado quem recebeu a quantia em que se substância a despesa" (a despesa confidencial encontra-se integrada agora no conceito amplo de despesas não documentadas).

No caso, não é posto em causa que ocorreram despesas não documentadas por efeito da referida divergência entre o efectivo saldo de caixa, verificado em conferência, e o saldo contabilístico e apenas se discute se a tributação autónoma podia ter incidido sobre despesas não documentadas que ocorreram não no período de tributação a que respeita a liquidação, mas em anos anteriores.

Importa, a este propósito, ter presente a própria natureza jurídica da tributação autónoma.

Como se esclareceu no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 197/2016, “a tributação autónoma, embora regulada normativamente em sede de imposto sobre o rendimento, é materialmente distinta da tributação em IRC, na medida em que incide não diretamente sobre o lucro tributável da empresa, mas sobre certos gastos que constituem, em si, um novo facto tributário (que se refere não à perceção de um rendimento mas à realização de despesas). E, desse modo, a tributação autónoma tem ínsita a ideia de desmotivar uma prática que, para além de afetar a igualdade na repartição de encargos públicos, poderá envolver situações de menor transparência fiscal, e é explicada por uma intenção legislativa de estimular as empresas a reduzirem tanto quanto possível as despesas que afetem negativamente a receita fiscal”. Nesse sentido, como aí se acrescenta, “[a] despesa constitui um facto tributário autónomo, gerando um imposto a que o contribuinte fica sujeito independentemente de ter obtido ou não rendimento tributável em IRC no mesmo período de tributação. E, assim, o facto revelador da capacidade contributiva é a própria realização da despesa”.

Nessa linha de considerações, o mesmo aresto, analisando a questão da tributação autónoma à luz do princípio da tributação das empresas segundo o rendimento real e do princípio da capacidade contributiva, formulou o seguinte entendimento.

 

“(…) o IRC e a tributação autónoma são impostos distintos, com diferente base de incidência e sujeição a taxas específicas. O IRC incide sobre os rendimentos obtidos e os lucros diretamente imputáveis ao exercício de uma certa actividade económica, por referência ao período anual, e tributa, por conseguinte, o englobamento de todos os rendimentos obtidos no período tributação. Pelo contrário, na tributação autónoma em IRC – segundo a própria jurisprudência constitucional -, o facto gerador do imposto é a própria realização da despesa, caracterizando-se como um facto tributário instantâneo que surge isolado no tempo e gera uma obrigação de pagamento com caráter avulso. Por isso se entende que estamos perante um imposto de obrigação única, por contraposição aos impostos periódicos, cujo facto gerador se produz de modo sucessivo ao longo do tempo, gerando a obrigação de pagamento de imposto com caráter regular.

Como é de concluir, a tributação autónoma, embora prevista no Código de IRC e liquidada conjuntamente com o IRC para efeitos de cobrança, nada tem a ver com a tributação do rendimento e os lucros imputáveis ao exercício económico da empresa, uma vez que incidem sobre certas despesas que constituem factos tributários autónomos que o legislador, por razões de política fiscal, quis tributar separadamente mediante a sujeição a uma taxa predeterminada que não tem qualquer relação com o volume de negócios da empresa”.

 

Em idêntico sentido, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 310/2012 chamou a atenção para a natureza materialmente distinta da tributação autónoma em relação ao imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, ainda que essa imposição fiscal se encontre formalmente inserida no Código de IRC.

 

E a esse propósito sublinhou:

 

“Contrariamente ao que acontece na tributação dos rendimentos em sede de IRS e IRC, em que se tributa o conjunto dos rendimentos auferidos num determinado ano (o que implica que só no final do mesmo se possa apurar a taxa de imposto, bem como o escalão no qual o contribuinte se insere), no caso tributa-se cada despesa efetuada, em si mesma considerada, e sujeita a determinada taxa, sendo a tributação autónoma apurada de forma independente do IRC que é devido em cada exercício, por não estar diretamente relacionada com a obtenção de um resultado positivo, e por isso, passível de tributação.

Assim, e no caso do IRC, estamos perante um imposto anual, em que não se tributa cada rendimento percebido de per si, mas sim o englobamento de todos os rendimentos obtidos num determinado ano, considerando a lei que o facto gerador do imposto se tem por verificado no último dia do período de tributação (cfr. artigo 8.º, n.º 9, do Código de IRC).

Já no que respeita à tributação autónoma em IRC, o facto gerador do imposto é a própria realização da despesa, não se estando perante um facto complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas perante um facto tributário instantâneo.

Esta característica da tributação autónoma remete-nos, assim, para a distinção entre impostos periódicos (cujo facto gerador se produz de modo sucessivo, pelo decurso de um determinado período de tempo, em regra anual, e tende a repetir-se no tempo, gerando para o contribuinte a obrigação de pagar imposto com caráter regular) e impostos de obrigação única (cujo facto gerador se produz de modo instantâneo, surge isolado no tempo, gerando sobre o contribuinte uma obrigação de pagamento com caráter avulso).

Na tributação autónoma, o facto tributário que dá origem ao imposto, é instantâneo: esgota-se no ato de realização de determinada despesa que está sujeita a tributação (embora, o apuramento do montante de imposto, resultante da aplicação das diversas taxas de tributação aos diversos atos de realização de despesa considerados, se venha a efetuar no fim de um determinado período tributário). Mas o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa”.

Concluindo-se, nos termos acabados de expor, que a tributação autónoma de “despesas não documentadas”, apesar de inserida do Código do IRC, apresenta uma natureza particular decorrente de o seu facto gerador corresponder à realização da despesa, e não ao lucro, e constituir um facto tributário instantâneo que determina uma obrigação de pagamento de carácter avulso, e não de formação sucessiva como o IRC, a questão que se segue é a de saber qual é o critério de imputação dessas despesas a um certo período temporal.

 

Imputação das despesas não documentadas a um concreto período de tributação

8. A questão que se coloca relativamente à imputação de despesas não documentadas a um concreto período de tributação releva dos termos em que poderá conjugar-se a autonomia das tributações autónomas, como tributo diverso do IRC, ainda que formalmente inserto no Código, com o princípio da periodização do lucro a que se refere o artigo 18.º. 

 

Como dispõe o artigo 17.º, n.º 1, “[o] lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código”.  Por sua vez, o subsequente artigo 18.º, referindo-se à “periodização do lucro tributável”, e de acordo com o princípio da anualidade do imposto, estabelece a regra da imputação dos rendimentos e dos gastos, assim como de as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.

 

O mecanismo da especialização dos exercícios e periodização económica reporta-se, por conseguinte, ao apuramento do lucro tributável, pressupondo que estamos perante a cobrança de um imposto periódico (IRC), cujo facto gerador se produz de forma sucessiva e por um período prolongado de tempo que corresponde, em regra, ao ano civil.

 

Por outro lado, a imputação a um período de tributação resulta essencialmente da aplicação das normas contabilísticas e, na situação particular do caso, haverá de ter-se em atenção o “Sistema de Normalização Contabilística” anexo ao Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, que, no seu no n.º 2.3.1, dispõe nos seguintes termos: “[u]ma entidade deve preparar as suas demonstrações financeiras, excepto para informação de fluxos de caixa, utilizando o regime contabilístico de acréscimo (periodização económica)”. Daí decorre, como se explicita no acórdão tirado no Processo n.º 235/2020-T, que “as demonstrações financeiras são preparadas segundo o regime da periodização económica, ou seja o regime de acréscimo, exceto para a informação de fluxos de caixa, à qual portanto tal regime expressamente se não aplica. Para movimentações de caixa, o regime que resta é o da sua reflexão com base na saída (ou na entrada)”. 

 

Nestes termos, o momento da tributação das despesas afere-se com base no critério de “competência de caixa”, atendendo-se à data em que ocorreu a saída de Caixa (o desembolso), sendo as despesas imputadas ao correspondente período de tributação, assim se articulando com o regime de periodização do IRC. No entanto, esse critério só é praticável se se estiver perante despesas não documentadas relevadas contabilisticamente em conta apropriada de “gastos”. Incumprindo o sujeito os deveres declarativos e de contabilização das saídas de caixa, como sucede na situação vertente, não é possível determinar a data de saída de caixa, havendo de recorrer-se ao critério supletivo da data da contagem física de Caixa. 

 

Assim sendo, pelas suas características específicas, as despesas não documentadas não implicam a sua imputação a cada período de imputação segundo o princípio da especialização dos exercícios e periodização do lucro tributável, enunciado no artigo 18.º. n.º 1, do Código de IRC. E tendo o facto gerador da tributação autónoma ficado evidenciado na data da contagem física da Caixa, só poderia o mesmo ser imputado ao exercício de 2016.

 

Considerando que o direito à liquidação caduca no prazo de quatro anos contado, nos impostos de obrigação única, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto ou o facto tributário (artigo 45.º, n.ºs 1e 4, da LGT) e que o facto tributário ocorreu em 2016, haverá de concluir-se que na data da notificação da liquidação do imposto - que necessariamente ocorreu antes da entrada do pedido arbitral -, ainda não se verificava a caducidade.

 

Ónus da prova

 

9. Alega ainda a Requerente que, tendo a Autoridade Tributária considerado que o facto tributário associado à ocorrência de despesas não documentadas se verificou em 2016, e não em anos anteriores, era a essa entidade que competia o ónus da prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.

 

Como resulta da matéria de facto dada como assente, a regularização do saldo de caixa foi efectuada em 31 de Dezembro de 2016 e teve por base a conferência dos saldos de caixa que teve lugar no decurso desse mesmo ano e que permitiu detectar uma divergência em relação ao saldo contabilístico no montante de € 527.730,87.

 

E como se deixou já esclarecido (cfr. supra ponto 7.), a imputação das despesas não documentadas ao período de tributação de 2016 não decorre de se ter demonstrado que as despesas ocorreram no decurso desse exercício, mas da mera aplicação de um critério jurídico segundo o qual, na ausência da contabilização das saídas de caixa – omissão que é imputável ao sujeito passivo -, a imputação deverá ser feita por referência à data da contagem física de Caixa.

 

Nessa circunstância, a determinação do momento em que ocorreu o facto tributário, não depende da demonstração factual das datas em que foram efectivamente realizadas as despesas não documentadas, mas da constatação da data em que teve lugar a conferência dos saldos de caixa.

 

E não oferece dúvida que a conferência dos saldos de Caixa, segundo a própria informação transmitida pela Requerente aos serviços inspectivos e o alegado no pedido arbitral (artigo 15.º da petição inicial), ocorreu em 2016, daí resultando a imputação das despesas não documentadas a esse período de tributação por via do apontado critério jurídico.

 

Encontra-se por isso efectuada a prova da data em que se produziu o facto tributário, quer mediante a prova coligida no procedimento inspectivo, quer através da confissão judicial espontânea da parte no articulado inicial apresentado no processo arbitral.

 

E, desse modo, não se verificando uma situação de falta ou insuficiência de prova relativamente àquele aspecto factual, não tem qualquer relevo a invocação do critério de repartição do ónus da prova que consta do artigo 74.º, n.º 1, da LGT.

 

Mas mesmo que assim não fosse, tendo-se registado uma diferença entre o montante efectivamente apurado na contagem física da conta de Caixa e o saldo contabilístico da mesma conta, e não tendo sido posta em causa a credibilidade dos registos contabilísticos, era à Requerente que cabia, quer no âmbito do procedimento de inspecção, quer no dos presentes autos, carrear elementos de prova que justificassem o desvio do saldo em face dos efetivos fundos monetários disponíveis.

 

 

Inexistência de presunção legal

10. A Requerente alega, por fim, que a norma que prevê a tributação autónoma não tem natureza presuntiva e a incidência de tributação autónoma apenas poderá operar à luz das regras relativas à especialização de exercícios e periodização do lucro tributável, assim concluindo que não é possível alargar o âmbito da sujeição da tributação autónoma ao movimento de regularização contabilística de despesas indocumentadas incorridas em exercícios anteriores.

Não pode deixar de reconhecer-se que a norma do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, ao sujeitar a tributação autónoma as despesas não documentadas, constitui uma norma de incidência tributária e não assenta em qualquer presunção legal quanto qualificação das despesas a que a disposição se torna aplicável.

Isso mesmo foi confirmado pelo acórdão do STA de 24 de Março de 2021 (Processo n.º 021/21, que uniformizou a jurisprudência no sentido de que as disposições legais que estabelecem a tributação autónoma objecto dos n.ºs 3 e 9 do artigo 88.º do Código do IRC constituem normas de incidência tributária e não consagram qualquer presunção que seja passível de prova em contrário. Sendo que esse entendimento é transponível para a disposição do n.º 1 desse artigo, que igualmente prevê a tributação autónoma em relação a despesas não documentadas.

O ponto é que, como se deixou esclarecido, nas circunstâncias do caso, a incidência da tributação autónoma opera por referência ao momento em que ocorreu a contagem física dos saldos de caixa, não sendo aplicável o princípio da especialização de exercícios e periodização do lucro tributável, sendo irrelevante que as despesas não documentadas, reveladas pela divergência entre o saldo de caixa e o registo contabilístico, possam ter sido realizadas em exercícios anteriores.

A tributação autónoma resulta, como se vê, não de qualquer um juízo presuntivo quanto à realização de despesas não documentadas, mas da própria constatação de uma discrepância contabilística relativamente ao saldo de caixa, sem suporte documental, sendo essa divergência que permite caracterizar a ocorrência de uma situação enquadrável na disposição do n.º 1 do artigo 88.º do Código do IRC.

Neste contexto, o movimento de regularização contabilística, mediante a transferência do montante de € 527,730,87 de uma para outra conta, é apenas a decorrência da detecção de despesas não documentadas, tendo em vista ajustar a contabilidade à realidade, e não o facto tributário que conduziu à sujeição da tributação autónoma.

 

Por todo o exposto, o pedido arbitral mostra-se ser improcedente, ficando prejudicado o conhecimento da pretendida condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto pago e no pagamento de juros indemnizatórios.

 

III – Decisão

Termos em que se decide julgar totalmente improcedente o pedido arbitral.

 

Valor da causa

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 293.620,75, que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 5.202,00, que fica a cargo da Requerente.

 

Notifique.

 

Lisboa, 31 de Maio de 2021,

  

 

O Presidente do Tribunal Arbitral

 

 

Carlos Fernandes Cadilha

 

O Árbitro vogal

 

 

João Cruz

 

O Árbitro vogal

 

 

                                                        Jorge Carita

(com declaração de voto de vencido em anexo)

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

São várias as questões que estão em causa na presente Decisão e todas elas doutamente abordadas no respetivo texto.

 

A primeira dessas questões está colocada do seguinte modo:

“5. A questão em debate reconduz-se a saber se a regularização contabilística realizada em 2016, na sequência da conferência do saldo de caixa, que determinou a transferência do montante de € 527.915,16 para a conta #2781997, de modo a reflectir as disponibilidades líquidas da empresa, sendo respeitante a despesas não documentadas que poderão ter ocorrido em anos anteriores, poderão originar a liquidação adicional, a título de tributação autónoma, nos termos do artigo 88.º, n.º 1, do Código do IRC, no período de tributação em que ocorreu a regularização.”

A Requerente entende que a AT não fez prova que os “…movimentos contabilísticos respeitam a despesas não documentadas ocorridas em 2016, mas a períodos de tributação anteriores a 2011…”

Por seu turno, entende que a regularização contabilística ocorrida nesse ano, não pode originar só por si a sujeição a tributação autónoma.

“Em contraposição, a Autoridade Tributária considera que o sujeito passivo não cumpriu a obrigação de contabilizar as despesas não documentadas, reveladas pela divergência entre a contagem física da Caixa e o saldo contabilístico, pelo que é a verificação da falta de meios financeiros em 31 de Dezembro de 2016, que constitui o facto tributário para efeitos da tributação autónoma, sendo inaplicável a esse tipo de despesas o princípio da especialização dos exercícios ou de periodização do lucro tributável.”,

E aqui a Presente Decisão faz referência à diferente jurisprudência do CAAD na abordagem destas matérias.

De um lado, defende-se que a tributação deste tipo de despesas fica dependente do fato de as mesmas terem ocorrido no exercício a que se reporta a liquidação, de molde a que apenas as despesas efetuadas num determinado período de tributação podem ser tributadas com referência a esse exercício.

Essa é a posição para a qual me inclino e não aquela que foi seguida neste Acórdão, que cruza o seu sentido da decisão com a não aplicabilidade, neste caso concreto, do princípio da especialização dos exercícios e da periodização do lucro tributável.

Não creio que a questão aqui em análise passe pela distinção entre despesas não documentadas versus despesas não devidamente documentadas, mas que a questão se resuma mais como adiante refere o presente Acórdão:

“No caso, não é posto em causa que ocorreram despesas não documentadas por efeito da referida divergência entre o efectivo saldo de caixa, verificado em conferência, e o saldo contabilístico e apenas se discute se a tributação autónoma podia ter incidido sobre despesas não documentadas que ocorreram não no período de tributação a que respeita a liquidação, mas em anos anteriores.”

E parece não haver dúvidas, nem divergências entre as partes, de que tais despesas reportam a períodos anteriores a 2011 e não ao ano de 2016.

E este facto, no meu entender, deveria ter ficado a constar de um modo mais explícito do Probatório do presente Acórdão e dele deveriam ter sido tiradas as devidas ilações.

Recorde-se o texto da alínea C do probatório, com o sublinhado nosso:

“C) No âmbito do procedimento inspectivo, os serviços verificaram que em 2015 a empresa apresentava um saldo de caixa no valor de € 527.915,16 que já não se encontrava evidenciado no balancete de 2016 e, segundo a informação prestada pela contabilista certificada, estava inscrito na contabilidade há muitos anos e foi regularizado no exercício de 2016, tendo sido acrescido ao quadro 7 da declaração modelo 22 do exercício de 2018;”

 

O que ocorreu em 2016 foi o movimento contabilístico que conduziu a uma diminuição do saldo de caixa e à sua reposição nos valores físicos resultantes da sua contagem.

O presente Tribunal entende que tal constitui o facto tributário relevante para a tributação.

Eu, respeitosamente considero que não.

Entendo que a AT deveria ter feito prova das saídas físicas de tais despesas, com indexação aos verdadeiros movimentos financeiros, não se devendo bastar num movimento contabilístico.

Depois de analisar a natureza das despesas não documentadas face ao IRC, não ponho em causa o rigor da conclusão daí extraída pelo Tribunal:

Concluindo-se, nos termos acabados de expor, que a tributação autónoma de “despesas não documentadas”, apesar de inserida do Código do IRC, apresenta uma natureza particular decorrente de o seu facto gerador corresponder à realização da despesa, e não ao lucro, e constituir um facto tributário instantâneo que determina uma obrigação de pagamento de carácter avulso, e não de formação sucessiva como o IRC, a questão que se segue é a de saber qual é o critério de imputação dessas despesas a um certo período temporal.

Mas entendo que a tónica deve precisamente ser colocada no “citério de imputação dessa despesa a um certo período temporal”

Aliás, ao afirmar-se que a natureza particular das “despesas não documentadas” aponta para o fato gerador corresponder à realização da despesa, só se pode estar a dar razão à posição da Requerente que defende que no exercício de 2016, ao qual respeita a tributação da despesa, não ter realizado despesas alguma….

E como é que o presente Tribunal resolve a questão da imputação destas despesas a um determinado período temporal?

Com base na autonomia das tributações autónomas face ao princípio da periodização do lucro, a que se refere o artº. 18º. do CIRC, acabando por se remeter para as regras do “Sistema de normalização Contabilística”, para se concluir, como no Acórdão tirado no Procº.nº. 235/2020-T, que:

“…as demonstrações financeiras são preparadas segundo o regime da periodização económica, ou seja o regime de acréscimo, exceto para a informação de fluxos de caixa, à qual portanto tal regime expressamente se não aplica. Para movimentações de caixa, o regime que resta é o da sua reflexão com base na saída (ou na entrada)”. 

 

  Estamos a falar de saídas e entradas de caixa, que poderão ser físicas ou contabilísticas, mas no caso concreto, a jurisprudência do CAAD apenas releva as contabilísticas… não se importando com o que aconteceu aos fluxos financeiros, em suma ao dinheiro…

Por isso também e este Acórdão conclui que:

“Nestes termos, o momento da tributação das despesas afere-se com base no critério de “competência de caixa”, atendendo-se à data em que ocorreu a saída de Caixa (o desembolso), sendo as despesas imputadas ao correspondente período de tributação, assim se articulando com o regime de periodização do IRC. No entanto, esse critério só é praticável se se estiver perante despesas não documentadas relevadas contabilisticamente em conta apropriada de “gastos”. Incumprindo o sujeito os deveres declarativos e de contabilização das saídas de caixa, como sucede na situação vertente, não é possível determinar a data de saída de caixa, havendo de recorrer-se ao critério supletivo da data da contagem física de Caixa. 

Tanto a AT como a Requerente poderiam ter apurado quando ocorreu a “saída de caixa”, já que ninguém colocou em causa que teria sido antes de 2011.

Era mais fácil ir pela contagem física.

Não indo, a tributação opera sempre quando e se a AT quiser.

Basta ir às empresas e consultar “o caixa”, mesmo que os seus saldos estejam sem qualquer movimento há vinte anos….

 

Importa referir o que neste aspeto consagra ao Acórdão do CAAD tirado no Procº. nº. 93/2020-T, que aborda questão em tudo idêntica à dos presentes autos:

“Assim, com referência ao exercício de 2018, apenas poderão ser tributadas autonomamente despesas que tenham ocorrido nesse exercício.

No caso em apreço, a prova produzida não permite concluir que todas as despesas que estão subjacentes à falta de meios financeiros correspondentes aos saldos da conta 11-Caixa em 26-12-2018 tenham ocorrido neste ano de 2018 e, pelo contrário, os indícios que resultam do facto de aquela conta já apresentar saldos elevados desde 2013, aumentando todos os anos até 2018, apontam no sentido de a falta de meios financeiros ter ocorrido antes deste ano, relativamente ao saldo devedor que já se verificava no final de 2017.

Aliás, a própria Administração Tributária reconhece que «desde 2013, que o saldo devedor da conta Caixa se mostra elevado e sem adesão à realidade das disponibilidades financeiras na posse da sociedade» (artigo 46.º da Resposta), o que tem ínsito que a falta de posse das disponibilidades financeiras correspondentes ao saldo devedor da conta 11-Caixa já terá ocorrido.”

Os saldos aqui reportados a 2018, são os saldos de 2016, nos presentes autos.

Os saldos elevados desde 2013, são os saldos elevados desde 2011, dados como provados nos presentes autos.

Neste mesmo sentido a Requerente aborda a jurisprudência do CAAD, e transcrevemos:

 

“Neste sentido, traz a Requerente à colação a decisão deste CAAD referente ao Processo n.º Processo n.º 554/2017 -T, de 28 de agosto de 2018, no qual se esclarece que, “para uma concreta tributação autónoma do género daquela que ora nos ocupa seja legalmente aplicável, para além da demonstração – feita no caso, como se viu – da ocorrência de despesas não documentadas e da respetiva quantificação, torna -se necessário demonstrar que as mesmas ocorreram no exercício que se reporta a correspondente liquidação, ou seja, e no caso, no exercício de 2014.” (artº. 50º. do Requerimento Inicial) .

 

E ainda o que ficou consagrado na decisão arbitral referente ao Processo n.º 648/2018 -T, de 4 de dezembro de 2019, “… da qual resulta claro que, “As despesas não documentadas a que se refere o artigo 88.º, n.º 1 do CIRC reconduzem -se, assim, a saídas de meios financeiros do património da empresa sem um documento de suporte que permita determinar a natureza da despesa ou o seu beneficiário. Mas, para ocorrerem despesas, é necessário que se comprove que ocorreram essas saídas de meios financeiros da empresa.” (sublinhado da Requerente) (artº. 55º. do Requerimento Inicial)

E o que diz o Relatório da Inspeção Tributária sobre este assunto:

“Concluindo a final que “Verificámos a falta de suporte documental para os movimentos realizados na conta 27.8.1.99, por contrapartida de Caixa, a que a Contabilista Certificada, refere tratarem-se de encargos realizados pela sociedade, mas que não estão devidamente documentados, o que se traduz numa saída de meios monetários desprovida de suporte documental, ou seja, numa despesa não documentada consubstanciada no artigo 88º nº1 do CIRC, tributada à taxa de 50%. Importa referir que a despesa, não é necessariamente um gasto da empresa que pode ser, ou não, dedutível conforme especificam os artigo 23º e 23ºA do CIRC, é uma saída de recursos financeiros podendo ser um gasto ou outra realidade. E, desta forma, os movimentos contabilísticos efetuados no exercício de 2016 não afetam o resultado líquido do período.” (Relatório transcrito no artº. 20º da Resposta da AT).

 

Mas na realidade a AT não se afasta da posição da Requerente sustentada na jurisprudência do CAAD, porque também afirma que uma despesa dessa natureza se traduz “numa saída de meios monetários desprovida de suporte documental”.

E é a ausência dessa saída de meios monetários, que falta no presente processo para que as despesas não documentadas possam ser tributadas.

 

Já a questão das despesas não documentos terem ou não que constituir um gasto das empresas, poderá deixar de ser tema a partir da mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, constante do Acórdão tirado no Procº. 0505/15, de 31.03.2016, que “…não faz depender a tributação autónoma baseada em despesas não documentadas da sua relevância como gastos para determinação do lucro tributável, …” (Vd. Acórdão do CAAD Procº. nº. 93/2020). 

Mas abordemos ainda a questão de ónus da prova.

Recordemos, como se faz no presente Acórdão, a posição da Requerente:

“9. Alega ainda a Requerente que, tendo a Autoridade Tributária considerado que o facto tributário associado à ocorrência de despesas não documentadas se verificou em 2016, e não em anos anteriores, era a essa entidade que competia o ónus da prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.”

E é verdade. Relativamente ao ocorrido no exercício de 2016 era à AT que cumpria a demonstração da verificação do facto tributário.

Só que, enquanto a Requerente entende que tal apenas terá ocorrido em anos anteriores  a 2016 (antes mesmo de 2011), e isso é a saída física dos recursos financeiros, a efetiva realização das despesas não documentadas, a AT e este Tribunal  entendem que não é esse o fato tributário que devemos procurar e ao qual se deve atribuir relevância fiscal, mas a contagem física da Caixa. E, essa contagem ocorreu em 2016.

 

A diferença de posições não está nas diferentes perspetivas da distribuição do ónus da prova, mas sim das diferentes conclusões quanto à natureza e momento da ocorrência do fato tributário. Ou seja, à escolha de diferentes fatos tributários, de natureza diversa e ocorridos em momentos diferentes.

 

Se entendo que caberia à AT demonstrar que o facto tributário ocorreu em 2016, entendo também que esse facto só pode ser a saída física dos recursos da sociedade, ou seja, a realização das despesas, e isso a AT não conseguiu provar que tivesse ocorrido em 2016, como lhe competia.

Mas já não competia à AT, fazer a prova de que as saídas físicas de dinheiro do caixa da sociedade tenham o ocorrido antes de 2011.

Isso teria cabido à Requerente demonstrar porque por si invocado, mas as partes aceitam que assim tivesse sido e o Tribunal dá esse facto como provado.

Do facto do Tribunal não ter extraído daí as devidas consequências, está a razão da minha respeitosa discordância com o resultado final do presente Acórdão.

 

Lisboa, 31 de maio de 2021

 

Jorge Carita