Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 34/2019-T
Data da decisão: 2019-07-22  IRC  
Valor do pedido: € 2.249.628,05
Tema: IRC - Dedutibilidade de gastos - Operações com território com regime fiscal claramente mais favorável. Falta de fundamentação. Juros compensatórios.
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DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

 

                Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Marcolino Pisão Pedreiro e Dra. Cristina Aragão Seia (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 27-03-2019, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

 

A..., LDA., pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua..., ..., ... e ..., ...-... Lisboa (doravante “Requerente”) apresentou, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2017..., praticado em 28 de Agosto de 2017, pela Senhora Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, com referência ao exercício de 2013, do qual resulta imposto a pagar no valor de € 2.249.628,05, do acto de liquidação de Juros Compensatórios n.ºs 2017... no valor de € 253.725,67, a que corresponde a Demonstração de Acerto de Contas n.º 2017...  (Compensação n.º 2017...), da qual resulta imposto a pagar no valor de € 2.249.628,05.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 17-01-2019.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 07-03-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 27-03-2019.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu que o pedido deve ser julgado improcedente.

Em 27-05-2019 realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações simultâneas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

A)           A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma acção inspectiva à Requerente ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2016..., relativa ao exercício fiscal de 2013;

B)           Nessa acção inspectiva foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

II.3.2. Enquadramento Fiscal

Em termos fiscais, o início de atividade da sociedade A... ocorreu em 2012-10-02, encontrando-se a mesma enquadrada:

—» Em "atividades de mediação imobiliária" (CAE principal: 68311), e;

—» Pela "administração de imóveis por conta de outrem" (CAE secundário: 68321).

Em sede de IRC a sociedade enquadra-se no regime de tributação geral, sendo que para efeitos de IVA vigora o regime de tributação normal de periodicidade mensal, desde 2015-01-01.

(...)

II.3.3. Breve Análise Documental/Atividade Exercida

A atividade exercida pela A... consiste na mediação imobiliária, angariando clientes (os proprietários de imóveis) e promovendo a venda ou o arrendamento dos imóveis angariados. Por vezes esta sociedade também promove a venda ou o arrendamento de imóveis angariados por outras sociedades de mediação imobiliária.

A A... assume a denominação comercial de "B..." nas faturas que emite. A denominação comercial de "B..." é também utilizada pelas sociedades C... e D..., que participam no Capital Social da A... .

(...)

Os rendimentos obtidos pela A... resultam em especial de comissões pela intermediação na venda de imóveis de propriedade dos seus clientes ou angariados por outras mediadoras imobiliárias. Estas comissões tiveram um acréscimo substancial a partir de maio de 2013

Para cada imóvel angariado pela A..., para venda ou arrendamento, é atribuído um número de identificação (doravante designado por ID), o qual é mencionado nas faturas emitidas por esta sociedade juntamente com a morada de localização do imóvel

Os gastos suportados pela A... e de valores consideráveis encontram-se registados na conta de "Fornecimentos e Serviços Externos", os quais também tiveram um acréscimo significativo a partir de maio de 2013.

De acordo com os documentos de suporte aos registos contabilísticos e os esclarecimentos prestados, o aumento dos gastos registados na conta "Fornecimentos e Serviços Externos" encontram-se diretamente associados às comissões de intermediação imobiliária recebidas pela A... e consistem:

• Em comissões faturadas por nacionais, pessoas singulares ou colectivas, que angariam imóveis em nome da A... e promovem a sua venda (subcontas: subcontratos, honorários e comissões); e

• Em faturas emitidas por entidades não residentes no território nacional, essencialmente sedeadas em Hong Kong, relativas à promoção/publicitação dos imóveis, a cargo da A..., no estrangeiro para angariação de adquirentes que pretendessem investir em Portugal (subcontas de trabalhos especializados).

Parte das faturas A..., mencionam apenas "serviços de consultoria" ou "serviços de consultoria e gestão" ou ainda "serviços de consultoria imobiliária', sem qualquer outra indicação sobre os serviços efetivamente prestados. No entanto, para as faturas, que se encontram nas condições referidas, a A...:

• Anexou um documento interno, no qual identifica os imóveis (morada e ID) e os cálculos das comissões a pagar por cada imóvel intervencionado por estes prestadores de serviços, ou;

• Apresentou quadro elaborado, no qual identifica os imóveis (morada e ID) com a indicação do valor da comissão a pagar por cada imóvel intervencionado.

Estes elementos apresentados permitem colmatar as insuficiências dos requisitos mencionados no nº 5 do artigo 36º do Código do IVA (CIVA).

Os documentos internos emitidos pela A... relativos aos cálculos das comissões a pagar por cada imóvel intervencionado, com a indicação da morada e do ID, também se encontram anexos aos documentos eletrónicos (fatura-recibo) emitidos por pessoas singulares, residentes em território nacional, que prestam serviços a esta sociedade. No entanto, o montante calculado pela A..., relativo às comissões a pagar é sempre superior ao valor base inscrito nos documentos eletrónicos, pelo facto de esta sociedade abater ao valor das comissões calculadas os encargos que suportou relativos ao fornecimento de bens e serviços utilizados por estes prestadores de serviços (comunicações, fotocopias, serviços jurídicos, ele.).

No que respeita aos gastos suportados com o fornecimento de bens e serviços (comunicações, fotocópias, serviços jurídicos, etc.) utilizados pelas sociedades nacionais prestadoras de serviços, a A... fatura-os às referidas sociedades. O rendimento proveniente desta faturação encontra-se refletido na conta de "Prestações de Serviços", em outros serviços (subconta: despesas administrativas).

Em relação aos registos contabilísticos verificou-se que muitas vezes a classificação manuscrita nos documentos de suporte, relativos aos gastos suportados pela A..., não têm correspondência com as subcontas onde esses documentos foram efetivamente registados.

Para concluir, refere-se que no decurso da ação inspetiva procedeu-se (Anexo II - folhas 1 a 8, páginas 1 a 16):

• Em 2016-10-04, à notificação do sujeito passivo, nos termos dos artigos 29º, 37º e 42º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA) e do artigo 65º do Código do IRC (CIRC), na pessoa de E..., na qualidade de gerente, para no dia 7 de novembro de 2016, apresentar a prova efetiva de que os encargos com as empresas sedeadas em Hong Kong corresponderam a operações efetivamente realizadas e não tiveram um carácter anormal ou montante exagerado;

• Em 2017-02-01, à notificação do sujeito passivo, nos termos do artigo 59º da Lei Geral Tributária (remetida por fax e dirigida ao advogado F..., NIF:..., na qualidade de mandatário da A...), para que no dia 23 de fevereiro de 2017, fossem apresentados esclarecimentos e documentos relativos a outras situações verificadas na análise documental.

Apesar de terem sido apresentados os esclarecimentos e um elevado número de documentos (fotocópias), nos dias e horas marcados por notificação (Anexo II - folhas 9 a 16, páginas 17 a 31 -esclarecimentos), deu ainda entrada nesta Direção de Finanças*, uma nova versão dos esclarecimentos solicitados por notificação de 2017-02-01, datada de 2017-04-06 (Anexo II - folhas 16 a 24, páginas 32 a 47).

 

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

Com base na análise documental e nos esclarecimentos prestados5, foram efetuadas correções, quer em sede de Imposto sobre o Rendimento de pessoas Coletivas (IRC), quer em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentando (IVA).

 

III.1. Fundamentação das Correções

Nos subpontos seguintes encontram-se discriminadas e fundamentadas as correções efetuadas.

 

III.1.1. Transmissões do Direito de Propriedade de Frações Autónomas de Prédios Urbanos

Na conta "Propriedades de Investimentos" (42) foi registada a aquisição de três frações autónomas nos edifícios um, dois e cinco, do empreendimento denominado por "...", (localizado na ..., em Lisboa), pelo valor total de € 270.000,00 (Anexo III - folhas 1 a 6, páginas 1 a 11). As três frações autónomas correspondem a:

• Uma habitação localizada no ... C, na ..., nº ... (fração ..., inscrita na matriz sob o artigo ... da freguesia de ... — código da freguesia ...);

• Dois lugares de estacionamento, correspondentes à fração AD, inscrita na matriz sob o artigo ..., da freguesia de ... (código da freguesia ...), e;

• Uma arrecadação, correspondente à fração L, inscrita na matriz sob o artigo..., também da freguesia de ... .

De acordo com a escritura pública de compra e venda, realizada em 2013-11-11, entre o "Banco G..., S.A." (NIPC:...) e a A..., este negócio teve a intervenção da mediadora imobiliária C..., a qual participa no Capital Social da A..., tendo sido atribuído ao processo de aquisição das frações autónomas o ID1... (Anexos III - folhas 4 e 7 a 9. página 8 e 13 a 17).

As frações autónomas adquiridas pela A..., com a intervenção da mediadora imobiliária C..., foram alienadas pelo montante total de € 510.000,00, em 2013-11-20, e adquiridas pela cidadã H... (NIF:...), natural da República Popular da China, tendo sido atribuído ao processo de venda das frações autónomas o ID1... (Anexo III - folhas 9 a 14, páginas 18 a 28).

As operações relativas a transmissões do direito de propriedade de frações autónomas de prédios urbanos encontram-se isentas de IVA, nos termos do nº 30 do artigo 9º do CIVA, as quais não conferem o direito à dedução do imposto suportado na aquisição de bens ou serviços inerentes a estas operações. No entanto, os sujeitos passivos podem beneficiar da dedução do IVA suportado na aquisição de bens e serviços associados às transmissões do direito de propriedade de frações autónomas de prédios urbanos, se renunciarem à isenção do imposto, de acordo com o disposto nos nºs. 5 e 6 do artigo 12º CIVA, e consequentemente são obrigados a liquidar o imposto nessas transmissões.

Através da análise documental constatou-se que:

• Foram registados pela A... gastos, com dedução do IVA suportado, relativos a encargos que deveriam ter sido suportados por terceiros, e;

• Foi deduzido o IVA suportado pela A... na aquisição de bens e serviços inerentes à alienação das frações autónomas.

 

A) Aquisição das Frações Autónomas - Gastos com Comissões

Sendo o ID1... o número do processo atribuído às frações autónomas de prédio urbano adquiridas pela A... e a mediadora imobiliária interveniente neste negócio a C..., os gastos inerentes a comissões relativas a este processo deveriam ter sido suportados pela C... .

No entanto, a A... registou em gastos (honorários) a verba de € 6.269,82 e deduziu o IVA de € 1.442,06, com base na fatura-recibo nº 44 (documento eletrónico), datada de 2013-11-20, emitida por I... (NIF: ...), referente a comissões do ID1... .

De acordo com o documento interno emitido pela A... em anexo à fatura-recibo nº 44, emitida pelo comissionista I..., o valor base da comissão corresponde a € 6.345,00, enquanto o valor base mencionado na referida fatura-recibo é de € 6.269,82 (Anexo III -folhas 15 e 16, páginas 29 a 31). A diferença existente no valor base da comissão resulta do facto de a A... ter abatido ao cálculo da comissão a pagar os encargos que suportou na aquisição de bens e serviços, utilizados pelo referido prestador de serviços, no montante total de € 75,18.

Atendendo ao exposto:

• O gasto suportado pela A... no valor de € 6.345,00 (valor base mencionado no documento interno anexo à fatura-recibo nº 44), relativo a comissões do ID1..., não pode ser aceite para efeitos fiscais, nos termos do nº 1 do artigo 23º do CIRC, e:

• A dedução do IVA de € 1 459,35 suportado nesta comissão (mencionada na fatura-recibo nº 44) e na aquisição de bens e serviços, utilizados pelo comissionista I..., é considerada indevida, nos termos do nº 1 do artigo 20" do CIVA.

 

B) Fornecimento e montagem de Cozinhas

Para além do registo contabilístico do valor de aquisição das frações e dos montantes pagos do Imposto de Selo e do Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT), foram também registadas na conta da "Propriedades de Investimento" duas verbas de € 16.127,94 e € 9.244.33, correspondentes a duas faturas emitidas pela sociedade "J..., Lda." (NIPC:...), relativas ao fornecimento e montagem de duas cozinhas, com eletrodomésticos encastrados. Com base nestas faturas a A... deduziu o IVA que lhe foi faturado pela "J..., Lda." (doravante designada por J...), no montante total de €5.835,63 (Anexo III-folhas 1, 17 e 18, páginas 1 e 33 a 36)

 

Em esclarecimentos o sujeito passivo referiu que por lapso foram imputadas duas faturas relativas à instalação de cozinhas para o mesmo imóvel e que (Anexo II - folha 20, página 40):

• A fatura de valor mais elevado respeita ao imóvel localizado na Praça ..., ..., na ..., ou seja, à fração autónoma Q (habitação) adquirida pela A..., e;

• A outra fatura (de montante inferior) refere-se ao imóvel localizado também na ..., no nº A, ..., na ..., ao qual foi atribuído o ID ... (propriedade de cliente da A...).

Estando a fatura nº 303A, de 2013-12-03, emitida pela sociedade J..., relacionada com o fornecimento e montagem de cozinha com electrodomésticos encastrados, na fração autónoma Q do prédio urbano, adquirida pela A..., o IVA suportado de € 3.709,43 foi deduzido indevidamente (conjugação do disposto nos artigos 9º nº 30 e 20º nº 1, ambos do CIVA). A verba de € 3.709,43 deveria ter sido incluída na conta de "Propriedades de Investimentos" e considerada no apuramento do ganho obtido pela alienação das frações autónomas.

Em relação à fatura nº 322A, de 2013-12-20, emitida também pela sociedade A..., refere-se que o gasto suportado no fornecimento e montagem de cozinha em imóvel de propriedade de terceiro, no montante de € 9.244,33, não pode ser aceite para efeitos fiscais, nos termos do nº 1 do artigo 23º do CIRC, assim como a dedução do IVA suportado de € 2.126,20 é considerada indevida, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 20º do CIVA, pelos seguintes motivos:

• A A..., enquanto mediadora imobiliária, recebe exclusivamente comissões pela angariação de adquirentes para os imóveis que tem a seu cargo, propriedade dos seus clientes;

• Se os imóveis necessitam de "melhoramentos", os gastos relacionados com esses "melhoramentos" devem ser suportados pelos clientes da A... ou até mesmo pelos adquirentes dos imóveis (os novos proprietários);

• A A... assumiu encargos com a instalação de cozinha em imóvel do qual não é a proprietária, sem que fosse reembolsada por esses encargos.

 

C) Comissões pela Alienação das Frações Autónomas

Conforme foi referido anteriormente, a A... atribuiu às frações autónomas de prédios urbanos de sua propriedade que alienou o ID...

Através da análise documental constatou-se que na conta de "Fornecimentos e Serviços Externos" (subcontas: subcontratos e honorários) foram registados gastos inerentes ao ID..., relativos a comissões pagas no montante total de € 103.157,66 e foi deduzido o IVA suportado nestas comissões, no valor total de € 23.726,26 (Anexo III - folhas 19 e 20, páginas 37 a 40).

Estando as transmissões do direito de propriedade de frações autónomas de prédios urbanos isentas de IVA, nos termos do nº 30 do artigo 9º do CIVA, as deduções de imposto no montante total de € 23.726,26 são consideradas indevidas, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 20º do mesmo normativo. A referida verba deveria ter sido considerada como um gasto do exercício, nos termos da alínea f) do nº 1 do artigo 23º do CIRC (redação aplicável à data).

A fatura emitida pela sociedade "K..., Unipessoal, Lda." (atualmente denominada por "L... Lda.") menciona no descritivo a promoção do apartamento no 6º andar da ... (...), o qual não corresponde ao apartamento alienado pela A..., localizado no ... da ... . No entanto, o sujeito passivo, na apresentação de documentos que lhe foram solicitados por notificação, indicou que a fatura nº 31/2013, emitida pela "K..., Lda.", correspondia a gastos suportados com imóvel próprio, ou seja, com o ID1... (Anexo III - folha 21, páginas 41 e42).

Tendo em conta que o apartamento do ... andar da ... (...), identificado pelo ID..., gerou à A... um rendimento em comissões de € 16.250,00 (valor líquido), correspondente à fatura nº 1300/000439 de 2013-10-17, emitida ao "G..., SA." (Anexo III - folha 22. página 43), considerou-se que o montante faturado pela "K..., Lda." de € 76.500,00 (valor líquido) não poderia corresponder ao referido ID, mas ao ID... .

 

III.1.2. Aquisições para Imóveis de Propriedade de Terceiros

Na contabilidade da A... foram contabilizados gastos relativos à aquisição de mobiliário diverso e ao fornecimento de materiais de construção, em que o IVA foi deduzido com base nas faturas relativas a estas aquisições.

Com base nos esclarecimentos do sujeito passivo, constatou-se que parte destas aquisições teve como destino imóveis de propriedade dos clientes da A... (Anexo II - folhas 4 e 20, páginas 7, B e 40 e Anexo III - folha 23, páginas 45 e 46).

Conforme foi referido anteriormente, a A... apenas recebe comissões pela venda dos imóveis que tem a seu cargo, enquanto mediadora imobiliária, não existindo registos de rendimentos associados à aquisição de mobiliário ou materiais de construção para os imóveis de propriedade dos seus clientes.

Atendendo ao exposto, os gastos suportados na aquisição de mobiliário e materiais de construção para imóveis de propriedade dos clientes da A..., no montante total de € 25.178,12, não pode ser aceite para efeitos fiscais, nos termos do nº 1 do artigo 23º do CIRC, assim como a dedução do IVA suportado de € 5.790,97 é considerada indevida, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 20º do CIVA (Anexo III - folhas 24 a 29, páginas 47 a 57).

 

Quanto às faturas nºs V001/201303385 e V001/201303632, emitidas pela sociedade M..., Lda., o sujeito passivo indicou-as como sendo relativas a obras realizadas na sua loja dos ... (o local da sede). No entanto, estas faturas mencionam que a descarga dos materiais foi efetuada em ... (Anexo III - folhas 23, 26 e27, páginas 46, 52 e 54).

 

III. 1.3. Registo de Faturas Emitidas por não Residentes

Conforme foi referido anteriormente, na conta de "Fornecimentos e Serviços Externos" (em várias subcontas de trabalhos especializados) foram registadas faturas emitidas por não residentes em território nacional, em especial por empresas localizadas em Hong Kong. De acordo com os esclarecimentos do sujeito passivo, esta faturação refere-se à promoção/publicitação dos imóveis, a cargo da A..., no estrangeiro para angariação de adquirentes que pretendessem investir em Portugal.

Os gastos inerentes a esta faturação ascenderam a 3.213.295,16 (Anexo III - folhas 30 a 94, páginas 59 a 188).

 

Os pagamentos das faturas emitidas pela sociedade "N..." (doravante designada por N...) foram efetuados por transferências bancárias nacionais para uma conta titulada pela sociedade "O..., R. L." (NIPC:...), no "P... (NIB:...) (Anexo III - folhas 58 a 79, páginas 115 a 158), enquanto os pagamentos das faturas emitidas pelas empresas "Q... LTD.", "R... e "S..." (doravante designadas, respetivamente, por Q..., R... e S...) foram efetuados por transferências bancárias internacionais para contas tituladas por estas empresas.

Quanto aos prestadores serviços não residentes no território nacional, há que atender:

• A autoliquidação do lVA, nos termos da alínea a) nº 6 do artigo 5º do CIVA, a qual não foi efetuada pelo sujeito passivo. No entanto, considerando que a A... realiza operações ativas tributáveis e sendo-lhe conferido o direito à dedução do imposto autoliquidado, estamos perante uma operação nula, ou seja, sem qualquer influência no imposto apurado pelo sujeito passivo nas declarações periódicas do IVA que submeteu à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT);

• Ao disposto no artigo 65º do CIRC, quanto à dedutibilidade dos gastos para o apuramento do lucro tributável, no caso das entidades sedeadas em Hong Kong que estão sujeitas a um regime de tributação claramente mais favorável, conforme portaria 292/2011 de 8 de novembro (aplicável ao exercício de 2013);

• Ao pagamento dos serviços (publicidade ou comissões) a entidades não residentes, considerados rendimentos obtidos em território nacional, de acordo com o disposto no nº 6 da alínea c) do nº 3 do artigo 4º do CIRC, sujeitos a tributação por retenção na fonte a título definitivo à taxa de 25%, nos termos da alínea g) do nº 1 e nºs. 3 e 4 do artigo 94º do mesmo diploma legal.

No que respeita à tributação em território nacional de rendimentos pagos a entidades não residentes, o artigo 98º do CIRC estabelece que não existe a obrigação de efetuar retenção na fonte, sempre que por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos pela entidade não residente não seja atribuída ao estado da fonte do rendimento ou seja apenas limitada'". Esta condição está dependente da apresentação de formulário (modelo 21-RFI) ou no caso específico de Hong Kong, o mesmo deve acompanhar o certificado de residência fiscal emitido pelas autoridades competentes daquele território (nº 2 do artigo 98 do CIRC e Despacho nº 22600/2009 de 14/10").

Os documentos apresentados pelo sujeito passivo para comprovarem a dispensa de retenção na fonte dos rendimentos pagos a não residentes consistiram:

No original do formulário (modelo 21-RFI), para a empresa sueca S..., certificado pela T..., em 2013-11-01, obedecendo aos requisitos de dispensa de retenção na fonte do imposto, previstos no artigo 98º do CIRC;

 Em fotocópias simples dos certificados de residência, emitidos em nome das sociedades Q... e R... sedeadas em Hong Kong (Anexo III - folha 95, páginas 189 e 190). Posteriormente foram remetidas a esta Direção de Finanças fotocópias simples de autenticações feitas pela advogada U... (NIF:...), em 2017-03-31, com base na verificação dos originais exibidos a esta advogada em 2013 (Anexo III - folhas 96 a 99, páginas 191 a 197), não sendo possível determinar se os documentos que foram certificados por solicitação da A... corresponderam aos certificados de residência das empresas localizadas em Hong Kong, como adiante se refere.

Conforme foi referido anteriormente, em 2016-10-04, procedeu-se a notificação do sujeito passivo, nos termos dos artigos 29º, 37º e 42º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA) e do artigo 65º CIRC. na pessoa de E..., na qualidade de gerente, para no dia 7 de novembro de 2016, apresentar a prova efetiva de que os encargos com as empresas sedeadas em Hong Kong corresponderam a operações efetivamente realizadas e não tiveram um carácter anormal ou montante exagerado (Anexo II - folhas 1 e 2). Solicitou-se também:

• A justificação para os pagamentos das faturas emitidas pela N..., localizada em Hong Kong, terem sido efetuados a entidade distinta e localizada em território nacional;

• A apresentação de documentos que comprovassem os encargos suportados com a sociedade sueca S... (SE...).

Quanto às faturas emitidas pela N..., localizada em Hong Kong, o sujeito passivo esclareceu que os pagamentos destas faturas foram efetuados para o NIB indicado por esta sociedade, tendo apresentado fotocópia de uma declaração emitida em nome da sociedade D..., na qual é indicado o NIB e a sociedade de advogados O... R.L. (Anexo II - folha 9, página 17 e Anexo III - folha 58, página 106), na qualidade de recetora dos pagamentos das faturas emitidas pela N... à A... .

No que se refere aos esclarecimentos e aos documentos apresentados pelo sujeito passivo, em resposta à notificação, os mesmos são insuficientes para comprovar a efetiva realização dos serviços faturados pelas empresas de Hong Kong e pela empresa sueca, como adiante se refere.

 

A) Erros Contabilísticos

Entre os registos Contabilísticos e os documentos de suporte foram verificadas as seguintes situações

— A fatura nº 20130712-0015 de 2013-07-12, emitida pela Q..., no valor de € 94.224,29, foi registada na contabilidade da A... pelo montante de € 94.229.29 (Anexo III -folhas 30 e 36, páginas 59 e 71);

 — Na fatura nº SNH12011 de 2013-09-04, emitida pela sociedade "V... (Hong Kong)", pelo valor de 25.000 dólares e registada na contabilidade por 25.000 Euros não consta a denominação do cliente da referida sociedade. De acordo com os esclarecimentos prestados pela gerente da A..., esta fatura foi enviada para a contabilidade, apenas como exemplo, no sentido de verificarem se a mesma "...estaria de acordo com as regras..." e por lapso deu entrada nos registos Contabilísticos da sociedade (Anexo II - folha 9, página 17 e Anexo III - folhas 30 e 93. páginas 60 e 185).

Trata-se de erros Contabilísticos que originaram gastos no montante total de € 25.005.00, os quais devem ser desconsiderados para efeitos fiscais, nos termos do nº 1 do artigo 23º do CIRC.

 

B) Faturas Emitidas por Empresas de Hong Kong

Tendo em conta os erros contabilísticos detetados, a faturação emitida por empresas localizadas em Hong Kong à A... ascendeu a € 3.150.490,16.

 

De acordo com do descritivo destas faturas, estamos perante "serviços de marketing e consultoria na China" ou serviços de "marketing e publicidade na China".

Considerando o disposto no artigo 65º do CIRC (aplicável ao exercício de 2013), temos:

•Artigo 65º Pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado

1 — Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

2 — Considera-se que uma pessoa singular ou colectiva está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando o território de residência da mesma constar da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aquela aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC, ou quando, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior, o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60% do imposto que seria devido se a referida entidade tosse considerada residente em território português.

3 — Para efeitos do disposto no número anterior, os sujeitos passivos devem possuir e, quando solicitado pela Direcção-Geral dos Impostos, fornecer os elementos comprovativos do Imposto pago pela entidade não residente e dos cálculos efectuados para o apuramento do imposto que seria devido se a entidade fosse residente em território português, nos casos em que o território de residência da mesma não conste da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.

4 — A prova a que se refere o n.º 1 deve ter lugar após notificação do sujeito passivo, efectuada com a antecedência mínima de 30 dias.

5 - O disposto nos números anteriores é ainda aplicável às importâncias pagas ou devidas indirectamente, a qualquer título, as mesmas pessoas singulares ou colectivas, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento do destino de tais importâncias, presumindo-se esse conhecimento quando existam relações especiais nos termos do n.º 4 do artigo 63.º entre:

a) O sujeito passivo e as pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável: ou

b) O sujeito passivo e o mandatário, fiduciário ou interposta pessoa que procede ao pagamento às pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea anterior."

Esta norma visa claramente combater operações evasivas, por meio de pagamentos a favor de entidades não residentes e estabelecidas em jurisdições de fiscalidade privilegiada, de modo a que os rendimentos gerados e localizados em Portugal não sejam transferidos para locais com regimes fiscais mais favoráveis, com tributação reduzida ou inexistente e tradicionalmente avessos à colaboração de informações para efeitos fiscais. No entanto, relativamente à não dedutibilidade dos gastos suportados, foi introduzida uma cláusula de salvaguarda que opera mediante a prova do sujeito passivo, cabendo ao mesmo demonstrar o cumprimento, cumulativo de duas condições:

- Os gastos corresponderem a operações efetivamente realizadas; e

- Não tiveram um carácter anormal ou um montante exagerado.

Trata-se duma dupla prova, incumbindo ao sujeito passivo demonstrar que:

• Os gastos se materializaram em atos efetivos, não bastando a mera existência formal de contratos, faturas e transferências bancárias,

• Os gastos não são anormais ou excessivos, ou seja, que constituem a justa remuneração dos serviços, podendo, nomeadamente, ser comparáveis com gastos relativos a serviços análogos.

Quando se trata de entidades não residentes em Portugal e localizadas em jurisdições de fiscalidade privilegiada, como é o caso de Hong Kong não basta "revestir" as operações contabilísticas com documentos formais (contratos, faturas, transferências bancárias) é necessário que existam provas efetivas da prestação dos serviços por parte dos prestadores dos mesmos.

Com prova da efetiva realização dos gastos (em resposta à notificação de 2016-10-04), o sujeito passivo limitou-se a apresentar os seguintes elementos;

-> Uma descrição sumária relativa aos serviços faturados pelas empresas localizadas em Hong Kong (N..., Q... e R...), os quais consistiram na procura de clientes no estrangeiro que quisessem investir em Portugal através da aquisição de imóveis, publicitando a A... em feiras e eventos (Anexo II - folha 9, pagina 17), sem que fosse evidenciado a prática de qualquer campanha publicitária ou equivalente, pelas citadas empresas;

-> Os contratos/acordos celebrados entre a A... e as sociedades N... Q... e R..., todos redigidos em inglês e dentro dos mesmos moldes, ou seja, com as mesmas cláusulas, cujos serviços contratados são iguais. As diferenças existentes nestes contratos/acordos resultam das percentagens de remuneração a atribuir pelos serviços prestados, em função do valor de venda dos imóveis (16% para N..., 17% para a Q... e 1% para a R...) (Anexo III - folhas 100 a 104, páginas 199 a 207);

-> Quadros elaborados com a indicação da morada e do ID dos imóveis vendidos com a participação da A..., enquanto mediadora imobiliária, e intervencionados pelas empresas localizadas em Hong Kong (Anexo III - folhas 105 e 106, páginas 209 a 211);

-> Fotocópias das faturas emitidas pelas sociedades N..., Q... e R..., manuscritas com os números de identificação atribuídos pela A..., ou seja, do ID (Anexo III - folhas 107 a 130, páginas 213 a 259);

-> Fotocópias das faturas emitidas pela A... aos seus clientes, com a indicação do ID mencionado no descritivo das faturas, as quais também se encontram manuscritas com a palavra "chineses", indiciando que os imóveis, a cargo desta sociedade, foram adquiridos por cidadãos naturais da República Popular da China" (Anexo III - folhas 131 e 132, páginas 261 a 263, a título exemplificativo). Os números do ID mencionado nas faturas emitidas pela A... correspondem aos números do ID manuscritos nas fotocópias das faturas emitidas pelas empresas sedeadas em Hong Kong;

— Fotocópias dos contratos de mediação imobiliária.

Com base nos documentos apresentados pela A..., comparou-se os montantes faturados por esta sociedade aos seus clientes, com os valores faturados pelas empresas localizadas em Hong Kong à A... (Anexo III - folha 133, páginas 265 e 266). Desta análise constatou-se que:

• A faturação das empresas sedeadas em Hong Kong representa, em média, cerca de 71,37% das comissões faturadas pela A... aos seus clientes (para os mesmos imóveis, de acordo com a indicação do sujeito passivo), podendo esta percentagem variar entre os 4,23% e os 85,52%;

• Existem faturas emitidas por mais do que uma das empresas sedeadas em Hong Kong, para o mesmo imóvel, de acordo com o ID manuscrito nas fotocópias das faturas emitidas pelas empresas N..., Q... e R..., não tendo sido apresentada qualquer justificação, por parte do sujeito passivo, para esta situação.

Considerando os esclarecimentos e os documentos apresentados pelo sujeito passivo, e a respetiva análise dos mesmos, conclui-se que não foram apresentadas provas concretas de que os serviços faturados pelas empresas N..., Q... e R..., localizadas em Hong Kong, foram efetivamente realizados, nem que os pagamentos efetuados pela A... às referidas empresas corresponderam ajusta remuneração dos serviços.

Face ao exposto, a verba de € 3.150 490,16 registada na contabilidade como um gasto ("Fornecimentos e Serviços Externos" - Trabalhos Especializados), proveniente de faturas emitidas pelas empresas N..., Q... e R..., não pode ser aceite para efeitos fiscais, estando a mesma sujeita a tributação autónoma à taxa de 35%, conforme o disposto nos nºs. 1 e 8 do artigo 88º do CIRC, sendo o valor do imposto correspondente a esta tributação de € 1.102.671,56 (€ 3.150.490,16 X 35%).

 

C) Rendimentos Pagos a Entidades Residentes em Hong Kong 

 

 

D) Fatura Emitida por Empresa Sueca

A A... registou na contabilidade, como gasto a verba de € 37.800.00, com base na fatura nº 13037, datada de 2013-12-11, emitida pela sociedade sueca S... e com o descritivo de "Service fee" ("Taxa de Serviço") (Anexo III - folha 94, página 187).

Tendo em conta os esclarecimentos prestados pelo sujeito passivo, a sociedade sueca S... faturou comissões pela sua intervenção na venda de imóveis a cargo da A... (Anexo II - folha 9, página 17)

De acordo com a base de dados da AT, a sociedade S... encontra-se registada no VIÉS, desde 2013-02-01, pela atividade de comércio por grosso de vestuário e calçado* (Anexo III -folha 134, página 267)

Como prova da realização do serviço por parte da S..., o sujeito passivo apresentou (Anexo III - folhas 135 e 136, páginas 269 a 272):

• A fotocópia da fatura emitida por esta sociedade, manuscrita com os números dos processos ID... e ID...;

• A fotocópia da fatura nº 008/2014 de 2014-01-20, emitida pela sociedade N... (localizada em Hong Kong), manuscrita com os mesmos números dos processos (IO) que se encontram manuscritos na fotocópia da fatura emitida pela S...;

• As fotocópias de duas faturas emitidas pela A... ao seu cliente, "W..., S.A." (NIPC:...), relativas às comissões recebidas pela venda dos imóveis identificados por ID... e ID... (faturas nºs 1300/000540 e 1400/000023, emitidas em 2013-12-12 e 2014-01-13, respetivamente).

Atendendo ao exposto, não foi apresentada qualquer justificação por parte do sujeito passivo, sobre a necessidade de recorrer a duas empresas, residentes em locais distintos (Suécia e Hong Kong), uma para faturar comissões ("taxa de serviço") e outra faturar serviços de "marketing e publicidade na China", para a venda dos mesmos imóveis, a cargo da A..., em que a própria empresa sueca declarou exercer uma atividade comercial ligada ao sector do vestuário e calçado (VIÉS).

Tendo em conta o disposto no nº 1 do artigo 23º do CIRC, a verba € 37.800,00 faturada pela empresa sueca S... e considerada pelo sujeito passivo como um gasto do exercício, não pode ser aceite para efeitos fiscais, por não ter sido demonstrada a relação deste gasto com a obtenção de rendimentos, atendendo à localização geográfica das sociedades indicadas como prestadoras do mesmo serviço e à atividade desenvolvida pela empresa sueca.

 

III.1.4. Registo de Fatura emitida Por Sociedade Cessada

Em março de 2013 foi registada na conta de Fornecimentos e Serviços Externos (subconta: 622503 denominada por "comissões pagas a outras agências") a verba de € 14.388,36, com base na fatura nº 122-02 de 2012-03-26, emitida pela sociedade "X..., Lda." (NIPC:...) à A:.., tendo sido deduzido o IVA de € 3.309,32, mencionado na referida fatura (Anexo III - folha 137, página 273).

Em relação ao registo contabilístico desta fatura e respetivo pagamento, refere-se o seguinte:

— De acordo com a base de dados da AT, a sociedade "X..., Lda." emitente da fatura nº 122-02 de 2012-03-26, encontra-se cessada desde 2011-07-01, para efeitos de IVA e de IRC;

— A data de emissão da fatura é anterior ao início de atividade da A..., que se verificou em 2012-10-02;

— Tendo em conta os registos contabilísticos da A..., associados ao pagamento do total da fatura de € 17.697,68 (€14,388,36 + € 3.309,32), apenas existem várias transferências bancárias no total de € 16.897,17, para contas bancárias de três pessoas, Y..., Z... e AA... (Anexo III -folhas 137 a 139, páginas 273 a 277).

 

Em esclarecimentos o sujeito passivo, refere que (Anexo II - folha 22. página 44)

• O Capital Social da sociedade "X..., Lda." era detido por três agentes que colaboravam com a A... (Z..., Y... e AA...), aos quais foram pagas comissões pelo serviço evidenciado na fatura nº 122-22, e efetivamente prestado;

• O pagamento em causa foi efetuado para as contas (NIB) que foram indicadas pelos responsáveis da sociedade, e:

• Em momento algum suspeitou da idoneidade da referida sociedade, desconhecendo que a mesma já tinha cessado atividade

Em 2017-04-06, o sujeito passivo remeteu a esta Direção de Finanças fotocópias de três contratos de angariador imobiliário, realizados com a sociedade D... e com cada um dos senhores a seguir identificados (Anexo III - folhas 140 a 144, páginas 279 a 287):

• BB..., com o NIF:...;

• AA..., com o NIF:..., e;

• Z..., com o NIF:... .

Para além dos três contratos terem sido realizados com a sociedade D... e os mesmos terem sido firmados com pessoas singulares na qualidade de angariadores imobiliários, não foi apresentado nenhum contrato realizado entre a A... e a sociedade "X..., Lda.", assim como nenhum dos senhores atrás identificado exerceu funções de gerência nesta sociedade, de acordo com a base de dados da AT.

Apesar do sujeito passivo considerar que a fatura emitida pela sociedade "X..., Lda.", comprova os serviços prestados, não é possível determinar a realização dos mesmos, tendo em conta a forma como foram processados os pagamentos da fatura, em que a própria A... deveria ter exigido a cada um dos beneficiários a emissão das faturas correspondentes aos montantes que receberam.

Em função do exposto, a fatura emitida pela sociedade "X..., Lda.", originou:

• O registo de um gasto que não garante ser necessário para a obtenção dos rendimentos, no valor de € 14.388,36, não podendo o mesmo ser aceite para efeitos fiscais nos termos do nº 1 do artigo 23º do CIRC;

• IVA deduzido no valor total de € 3.309,32. considerado indevido de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 20º do CIVA.

 

III.1.5. Despesas de Representação

Em várias subcontas da conta de "Fornecimentos e Serviços Externos" (deslocações e estadas, comissões e publicidade) foram registados gastos que devido às suas características ou pela ausência de outros elementos justificativos dos mesmos, deveriam ter sido considerados como despesas de representação, as quais estão sujeitas a tributação autónoma à taxa de 10%, conforme o disposto no nº 7 do artigo 88º do CIRC. Importa referir que em alguns destes gastos, foi deduzido o IVA mencionado nos documentos de suporte, contrariando o disposto nas alíneas d) e e) do nº 1 do artigo 21º do CIVA.

Os gastos suportados pela A... com base nas faturas evidenciadas neste quadro, referem-se às seguintes situações:

• Gastos suportados e não reembolsados, relativos ao alojamento de fornecedores de  serviços (comissionistas) (Anexo II - rolhas 4. 8 e 21, páginas 8. 15 e 41 e Anexo III – folhas 145 a 147, páginas 289 a 293);

— Gastos suportados com jantares de montantes consideráveis, cujos documentos encontram-se manuscritos com as seguintes frases "jantar de equipa" ou "jantar de loja" (Anexo III - folhas 147 e 148, páginas 294 a 296);

— Encargos relativos a deslocações e viagens, sem que as faturas identifiquem  a(s)  pessoa(s) beneficiária(s) (Anexo III - folhas 149 a 151, páginas 297 a 301). O sujeito passivo associa estes gastos à atividade de mediação imobiliária (angariação de clientes e promoção dos imóveis junto de potenciais adquirentes), e sem apresentar documentos que confirmem a identidade dos "viajantes", alega que as viagens foram realizadas pelos sócios da A..., F..., E..., FF... e CC... (Anexo II - folhas 21 e 22, páginas 41 a 43). Quanto à indicação/identificação "sumária" dos sócios da A..., refere-se que:

• Esta sociedade tem como sócios as sociedades C... e D..., que exercem a mesma atividade da A... . As funções de gerência na A... são exercidas por F... e E...;

• A C... tem exclusivamente como sócio-gerente o senhor F..., o único detentor do Capital Social desta sociedade. As viagens indicadas como realizadas por este senhor poderiam ter sido efetuadas em representação de qualquer uma das sociedades, C... ou A... ;

• A D... tem como sócios-gerentes, FF... e E... . As viagens indicadas como realizadas por estes senhores (sempre juntos na qualidade de viajantes) poderiam ter sido efetuadas em representação da referida sociedade;

• Relativamente ao senhor CC..., desconhece-se quais as sociedades onde o mesmo possa ter quota.

•Na subconta de publicidade foi registada a fatura nº 142 de 2013-12-13, emitida pela sociedade "DD..., Lda.", com o descritivo "Evento Firewalking", tendo sido deduzido o IVA mencionado na referida fatura (Anexo III - folha 151, página 302). Em esclarecimentos o sujeito passivo associa este "evento de caminhar sobre brasas" como uma atividade formativa e de desenvolvimento pessoal, no qual participaram parte dos seus agentes (os comissionistas), sem se pronunciar sobre reembolso dos encargos que suportou neste "evento/divertimento", por parte dos participantes (Anexo II - folha 23, página 46);

• Na subconta de comissões foi registada a fatura nº 1300/000001 de 2013-09-24, emitida pela sociedade "EE..., Lda.", com o descritivo de "Ação Promocional", tendo sido deduzido o IVA mencionado na referida fatura (Anexo III - folha 152, página 303). Considerando a atividade desenvolvida por esta sociedade, de comércio a retalho em supermercados, e os esclarecimentos do sujeito passivo, presume-se que a referida sociedade forneceu à A... bens alimentares, bebidas e pessoal para a celebração/comemoração de determinadas datas ou acontecimentos. Os esclarecimentos do sujeito passivo, referem que (Anexo II - folha 23, páginas 45 e 46):

• A A... realizou várias "ações promocionais", no sentido de promover e publicitar a atividade que desenvolve, que implicaram a aquisição de bens à sociedade "EE..., Lda.", que exercia uma atividade de supermercado;

• Ao ter conhecimento da pré-liquidação do negócio da sociedade “EE..., Lda.", adquiriu a quase totalidade do stock (sem a apresentação de documento que identifique as quantidades e os bens que foram adquiridos, os quais deveriam constar da respetiva fatura) que o supermercado apresentava antes do encerramento, assim como também contratou os serviços dos seus funcionários para dar apoio nas "ações promocionais";

• As ações promocionais, entre outras, abrangeram a inauguração de várias lojas B..., a comemoração do Dia da Criança (em benefício dos sem abrigo) e a comemoração do Dia da Mulher.

Em função do exposto:

• O IVA deduzido com base nas faturas emitidas pelas sociedades "DD..., Lda  e "EE... Lda. " (identificadas no quadro anterior), no montante total de e 23759.00, é considerado indevido nos termos das alíneas d) e) do nº 1 do artigo 21º do CIVA;

• A verba de € 23.759,00, relativa ao IVA deduzido indevidamente, é considerada gasto do exercício, nos termos da alínea f) do nº 1 do artigo 23º do CIRC;

• A verba apurada como despesas de representação de € 146.239,07 (com inclusão do IVA de € 23.759.00) está sujeita a tributação autónoma à taxa de 10% (artigo 88º, nº 7, do CIRC), sendo o valor do imposto inerente a estas despesas de € 14 623.91.

 

III.2. Apuramento do Total das Correções

Face às situações descritas nos subpontos anteriores, deste Capítulo, foram efetuadas correções técnicas, em sede de IRC e IVA. que assumem os montantes abaixo indicados.

Em sede de IRC

 

(...)

IX. DIREITO OE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO

Em conformidade com os artigos 60.º da Lei Geral Tributária e 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira, foi notificado o sujeito passivo, através do seu mandatário, sobre o Projeto de Relatório de Inspeção Tributária pelo do nosso ofício nº..., datado de 2017-07-03, no sentido de possibilitar o exercício do Direito de Audição prévia, tendo-lhe sido concedido um prazo de 15 dias para exercer esse direito.

Em 2017-07-21, o Direito de Audição do sujeito passivo A... deu entrada nesta Direção de Finanças (entrada nº 2017... Anexo IV - folhas 1 a 14, páginas 1 a 28), em que os fundamentos apresentados, relativos às correções propostas, baseiam-se:

• Essencialmente em transcrições de frases/parágrafos do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária para salientar o facto dos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) terem procedido a correções. em IRC e IVA, sem atenderem aos documentos e esclarecimentos apresentados pela A... . ao longo do procedimento inspetivo, “...o que conduziu a conclusões erradas que não se poderão manter na justa medida em que são flagrantemente ilegais", e,

• Numa descrição mais "detalhada" sobre os gastos suportados pela A... com base em faturas emitidas por empresas sedeadas em Hong Kong, associando esta faturação a comissões necessárias à venda de imóveis de propriedade da própria A... .

Quanto à ilegalidade das correções propostas entende-se da leitura ao Direito de Audição, que a aplicação das normas fiscais inerentes a estas correções, não têm qualquer relevância face aos esclarecimentos/explicações e aos documentos fornecidos pelo sujeito passivo, ao longo do procedimento inspetivo e 'ignorados ou desconsiderados" pelos SIT (itens 2 ao 123 do Direito de Audição).

Transcrição de Frases/Parágrafos do Projeto de Relatório de Inspeção

No que respeita à transcrição de frases/parágrafos do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária, introduzidas no Direito de Audição, refere-se que as mesmas não espelham todos os factos evidenciados no referido projeto, originando interpretações diferentes daquelas que se encontram subjacentes às correções propostas (itens 4 ao 59 do Direito de Audição).

Como se trata, exclusivamente, da descrição de factos que se encontram devidamente fundamentados no Projeto de Relatório de Inspeção, não se vislumbra a necessidade de voltar a referenciá-los, sob pena de repetição

Faturas Emitidas por Empresas Localizadas em Hong Kong

Na contabilidade do sujeito passivo foram registados:

• Gastos provenientes de faturas emitidas pelas empresas Q..., R... e N..., sedeadas em Hong Kong, no montante de € 3.150.490,16,

• Transferências transfronteiriças de valores para o território de Hong Kong, para contas bancárias tituladas pelas empresas Q..., R..., a título de pagamento das faturas emitidas por estas empresas, e;

• Transferências bancárias nacionais para conta titulada pela sociedade "O..., R. L.", a título de pagamento das faturas emitidas pela N... .

Pela aplicação do disposto no nº1 do artigo 65º do CIRC, a verba de € 3.150.490,16, não foi aceite para a determinação do lucro tributável, assim como a mesma foi sujeita a tributação autónoma à taxa de 35%. conforme o disposto nos nºs. 1 e 6 do artigo 88º do CIRC, sendo o valor do imposto, resultante desta tributação, de € 1.102.671,56 (vide alínea B) do subponto 1.3 Capítulo III, do Projeto de Relatório de Inspeção).

Relativamente a esta situação, o sujeito passivo, em sede de Direito de Audição, apresenta apenas uma descrição mais "detalhada" (itens 60 a 119):

• Evidenciando como "comissões de angariação" os serviços faturados pelas empresas localizadas em Hong Kong;

• Considerando que os elementos de prova incumbidos ao sujeito passivo, de que os gastos suportados corresponderam a operações efetivamente realizadas e não tiveram carácter anormal ou montante exagerado (cláusulas de salvaguarda mencionadas no nº 1 do artigo 65 do CIRC), se encontram devidamente comprovados, e,

• Destacando os contratos celebrados com as empresas localizadas em Hong Kong como documentos fulcrais de prova.

As alegações do sujeito passivo, relativas a esta descrição, resumem-se ao seguinte:

— As faturas emitidas pelas empresas sedeadas em Hong Kong respeitam a comissões pela angariação de clientes para os imóveis de que a A... era proprietária;

— As comissões apenas eram pagas se os clientes fossem angariados, ou seja. se adquirissem os imóveis de que a A... era proprietária;

-> Os contratos celebrados (evidenciados diversas vezes como documentos fulcrais) com as entidades angariadoras não consagram uma obrigação de meios na divulgação dos imóveis ou em ações de marketing, mas antes de resultados (a venda dos imóveis);

• Os serviços englobados nas comissões foram efetivamente prestados pelas empresas de angariação e consubstanciaram-se:

• Na prospeção de clientes no mercado chinês;

• Na apresentação do programa de Golden Visa;

• Na organização de viagens e estadias em Portugal para visita aos imóveis.

• No acompanhamento de visitas aos imóveis com tradutores dos clientes chineses e aluguer de carros para o efeito.

-> As comissões pagas são superiores aos valores praticados pelas empresas de mediação imobiliária nacionais, pelo facto destas empresas sedeadas fora do espaço comunitário, incorrerem em despesas mais avultadas relacionadas, nomeadamente, com deslocações a Portugal, estadias em hotéis e acompanhamento personalizado dos potenciais clientes.

-> A A... viu-se forçada a aceitar condições que não aceitaria se a procura no mercado nacional, relativa ao sector imobiliário, não tivesse tido uma acentuada retração O recurso a empresas localizadas em Hong Kong, para angariarem clientes na República Popular da China, permitiu celebrar contratos de compra e venda dos imóveis;

-> A conclusão errada por parte dos SIT, em conformidade com o que foi demonstrado através da apresentação dos contratos celebrados que consagram uma obrigação de resultados (angariação de clientes na República Popular da China e consequente celebração de contratos), na demonstração das comissões pagas, meios de pagamento e escrituras de compra e venda

Sobre estas alegações refere-se o seguinte:

-> A atividade exercida pela A... consiste em mediação imobiliária, portanto, os imóveis não são/eram de sua propriedade, surgindo a dúvida se discrição mais "detalhada" sobre a faturação emitida pelas empresas de Hong Kong. considerada em sede de Direito de Audição como "comissões", está efetivamente direcionada à A...;

-> O descritivo das faturas emitidas pelas empresas localizadas em Hong Kong'5, não evidencia que estamos perante "comissões", assim como os esclarecimentos do sujeito passivo, no decurso da ação inspetiva e em resposta à notificação de 2016-10-04, vão noutro sentido, ou seja, na associação destas faturas à publicitação da A... em feiras e eventos com o objetivo de procurar adquirentes no estrangeiro para os imóveis que tinha a seu cargo;

-> Contrariamente o referido no Direito de Audição (item 91), não houve "demonstração de comissões" pagas, assim como não foram apresentadas as escrituras públicas de compra e venda dos imóveis intervencionados pela A..., enquanto mediadora imobiliária, que pudessem, pelo menos, confirmar a aquisição dos imóveis por residentes na Região Administrativa Especial de Hong Kong, tendo em conta a diversidade de serviços incluídos nas denominadas "comissões" de ligação "quase exclusiva" com os potenciais adquirentes dos imóveis.

Quando se trata de entidades não residentes em Portugal e localizadas em jurisdições de fiscalidade privilegiada, como é o caso de Hong Kong, não basta apresentar como prova efetiva da realização dos serviços os documentos formais (contratos, faturas, transferências bancárias), é necessário que existam outros elementos/documentos que possam atestar inequivocamente a realização dos mesmos.

Considerando todos os serviços incluídos nas denominadas "comissões", nem sequer foram apresentadas provas que atestassem a ligação da A... às empresas emitentes de faturas.

Face ao exposto, entendem os Serviços de Inspeção Tributária que os esclarecimentos/explicações e documentos apresentados pelo sujeito passivo no decurso da ação inspetiva. bem com os argumentos apresentados, em sede de Direito de Audição, não foram suficientes e adequados para prova, nos termos do nº 1 do artigo 65º do CIRC, ou seja, não fazem prova inequívoca de que estes gastos corresponderam a operações efetivamente realizadas.

 

Conclusão

Os esclarecimentos/explicações e os documentos apresentados pelo sujeito passivo, no decurso da ação inspetiva, não foram ignorados ou desconsiderados, conforme se verifica pela leitura ao Projeto de Relatório de Inspeção e respetivos anexos, os mesmos foram devidamente analisados, resultando dessa análise as correções propostas.

C)           Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRC n.º 2017..., referente ao exercício de 2013, o acto de liquidação de Juros Compensatórios n.ºs 2017... no valor de € 253.725,67, a que corresponde a Demonstração de Acerto de Contas n.º 2017... (Compensação n.º 2017...), da qual resulta imposto a pagar no valor de € 2.249.628,05; (documentos n.ºs 2 a 4 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

D)           A Requerente apresentou reclamação graciosa das liquidações referidas, que foi indeferida por decisão de 13-07-2018, com os fundamentos que constam do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

VI - ANALISE GLOBAL E PARECER

Como já mencionado, no âmbito de ações inspetivas aos anos de 2013 e de 2014, foram apuradas corações à matéria tributável, tendo por base "Gastos não dedutíveis" e IVA considerado como gasto e foi apurado imposto com base em desposas sujeitas a tributação autónoma, conforme discriminação seguinte:

 

Analisada a situação e os argumentos ora apresentados pela reclamante, verificamos que grosso modo, são idênticos aos expostos anteriormente em direito de audição em sede de procedimento inspetivo

Refere a reclamante que nos atos de liquidação notificados não são explicitados os fundamentos que determinaram a sua emissão e que foram praticados com ofensa das normas e princípios, por violação do dever de fundamentação, devendo ser anuladas em conformidade.

Vejamos,

Os atos praticados pela Autoridade Tributária suscetíveis de afetar os direitos e interesses legítimos dos contribuintes devem ser sempre fundamentados, nos termos exigidos pelo art. 77º da LGT

«O dever dá fundamentar visa, assim, permitirão destinatário do ato conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo deste, permitindo-lhe ficar a saber quais os motivos que levaram a Administração à sua prática e a razão por que se decidiu nesse sentido e não noutro. (...) um ato está devidamente fundamentado sempre que o administrado, colocado na posição do destinatário normal - o bonus pater famílias de que fala o art. 487 º do Código Civil - fica devidamente esclarecido das razões que o motivaram».

Ora, à data de 25-08-2017, foi a reclamante notificada através do oficia nº..., datado de 23-09-2017 (cf. fls 94 a 97 em anexo) através do seu mandatário, do Relatório de Inspeção Tributária, respeitante à Ordem de Serviço OI2016... . Esta notificação refere "(...) a breve prazo, os serviços da AT procederão à notificação da liquidação respetiva, a qual conterá os meios de defesa, bem como o prazo de pagamento, se a ele houver lugar (...).

Nesta sequência, surgem as respetivas liquidações de IRC n.º 2017 ... datada de 30-08-2017 (cf. fls 90 a 93 em anexo), nas quais é mencionado "(...) liquidação de IRC relativa ao período a que respeitam os rendimentos, conformo nota demonstrativa junte 6 fundamentação já remetida (...)"

Concluiu-se, pois, que face ao exposto no relatório da Inspeção não assiste razão à reclamante no que se refere aos argumentos expendidos em defesa da falta de fundamentação no alo de liquidação

Analisando a reclamação graciosa apresentada pela A... e o relatório dos SIT podemos verificar que grosso modo, as alegações apresentadas em sede de RG são as mesmas que foram apresentadas em sede de Inspeção, B que se basearam essencialmente em:

 

A- Despesas não aceites fiscalmente nos termos do n.º 1 do art. 23º do CIRC

Os gastos com comissões relativas a aquisição de frações autónomas só pode ser aceites fiscalmente se for a reclamante a mediadora Imobiliária e a fatura respetiva tiver sido emitida em seu nome, o que não se verificou

A fatura n.º322A emitida pela J..., relacionada com fornecimento e montagem de cozinha, bem como as faturas respeitantes a aquisição de mobiliário a materiais de construção para imóveis propriedades de clientes da A... não pode ser acerte fiscalmente pela mesma porquanto esta não é proprietária do imóvel

A fatura n.º SNH12011 emitida pela sociedade "V..." foi registada na contabilidade da reclamante, por lapso, pelo que o seu valor deve ser desconsiderado para efeitos fiscais

A verba faturada pela empresa Sueca S... e considerada como gasto do exercício pela A... . não pode ser aceite para efeitos fiscais por não ter sido demonstrada a relação deste gasto com a obtenção de rendimentos, atendendo a localização geográfica das sociedades indicadas como prestadoras do mesmo serviço e à atividade desenvolvida pela empresa sueca.

A fatura emitida pela Sociedade "X... Lda. foi emitida após estar cessada e antes do início de atividade da reclamante, pelo que o registo de um gasto que não garante ser necessário para a obtenção dos rendimentos, não pode ser aceite fiscalmente,

B- Faturas emitidas por empresas de Hong Kong – art. 65º do CIRC. Refere o relatório da inspeção, em suma, e conforme transcrição.

"Quanto aos prestadores de serviço não residentes no território nacional, há que atender (...) ao disposto no art. 65º do CIRC quanto à dedutibilidade dos custos para o apuramento do lucro tributável no caso das entidades sedeadas em Hong Kong que estão sujeitas a um regime de tributação claramente mais favorável conforme portaria 292/2011 de 8 de novembro (aplicável ao exercido de 2013)" (cf. fl. 16/36 do RI e 65 - verso - dos autos)

Tendo em conta os erros contabilísticos detetados, a faturação emitida por empresas localizadas em Hong Kong à A... ascendeu a 3.150.490,16€, como se pode verificar no quadro seguinte:

De acordo com o descritivo das faturas estamos perante "serviços de marketing e consultoria na China" ou serviços de "marketing e publicidade na China", pelo que temos que atender ao disposto no art. 65º do CIRC, onde foi introduzida uma cláusula de salvaguarda que opera mediante a prova do sujeito passivo, cabendo ao mesmo demonstrar o cumprimento cumulativo, de duas condições:

• Os gastos correspondem a operações efetivamente realizadas;

•Os gastos não têm um caráter anormal e um montante exagerado.

Como prova de efetiva realização dos gastos, o sujeito passivo apresentou alguns elementos em sede de inspeção tributária, que a equipa de IT analisou e concluiu que "considerando os esclarecimentos e os documentos apresentados pelo sujeito passivo, e a respetiva análise dos mesmos, conclui-se que não foram apresentadas provas concretas de que os serviços faturas pelas empresas N..., Q... e R..., localizadas em Hong Kong, foram efetivamente realizados, nem que os pagamentos efetuados pela A... às referidas empresas corresponderam à justa remuneração dos serviços"

Nesta sede, a reclamante não traz aos autos, qualquer documento adicional de prova.

Ora, na situação agora em análise opera a inversão do ónus da prova, que incumbirá ao sujeito passivo produzir, o qual, em primeiro lugar, tem de demonstrar que os gastos se materializaram em atos efetivos, não bastando a mera existência formal, tais como contratos, faturas e transferências bancárias e, em segundo lugar, que esses gastos não são anormais ou excessivos, o que se poderá operar mediante a confrontação com situações comparáveis de mercado num contexto de plena concorrência.

Ora, da análise da argumentação da reclamante e da análise documental continua a carecer comprovação de forma substancial, tal como é referido no relatório de inspeção, não se comprovando:

- Que tenha sido praticada qualquer ação, campanha publicitária ou equivalente, concreta e efetiva pelas empresas prestadoras de serviços visando a venda de frações, ou a promoção de diverso; empreendimentos junto do Mercado chinês, de forma a promover a obtenção de investidores, que permitam a aquisição dos empreendimentos e posterior gestão;

- Qualquer tipo de prova de que o serviço foi na realidade prestado, mediante a apresentação, designadamente, de estudos de prospeção de mercados, vantagens no investimento, campanhas de marketing, porquanto não foram apresentadas evidências dos mesmos em papel, gravações, vídeo, suporte informático, digital ou qualquer outro suporte;

- E ainda que fossem exibidas as evidências físicas dos trabalhos efetuados, seria ainda necessário demonstrar a adequação de cada um deles aos requisitos do artigo 23.º do Código do IRC;

- Sobre o montante das comissões cobradas pelas sociedades N..., Q... e R...,  a reclamante não apresentou prova dos serviços análogos no mercado.

Sobre esta matéria, carácter anormal ou ao montante exagerado das operações, transcreve-se parte do acórdão proferido em 19/02/2015 no processo 08126/14 10 Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), que julgou um caso de pagamento a entidades não residentes e sujeitas a um regime fiscal privilegiado, evidenciando a importância da demonstração das provas:

" (...) quanto à prova da inexistência do carácter anormal ou exagerado das despesas esta deve passar pela demonstração de que o contrato, cuja veracidade se provou, se apresenta equilibrado. Para esse efeito, o sujeito passivo deverá demonstrar qual a importância real das vantagens auferidas pelo contrato em causa, tal como fazer prova que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens, mormente, por comparação com os custos de serviços análogos no mercado (...)."

Em sede de reclamação graciosa, a reclamante contesta as correções que, especula-se, terão estado na origem dos atos de liquidação de IRC e JC na medida em que essas correções padecem de erro sobre os pressupostos, quer de facto, quer de direito, o que deverá determinar a sua anulação", apenas reiterando que os gastos em causa se encontram suportados em faturas devidamente registas na sua contabilidade, não juntando ao processo factos/documentos novos suscetíveis de alterar as correções propostas pelos SIT.

Nesta senda, afigura-se-nos que as correções efetuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária se encontram corretas.

Com efeito, encontrando-se o sujeito passivo investido na condição de Reclamante, cabe-lhe o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos que alega nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT "o ónus da prova dos fatos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque", o que não se verifica no caso em apreço.

Consequentemente, os factos só devem ser considerados provados quando forem determinados com uma certeza absoluta, razão pela qual a não prestação de prova ou a sua prestação insuficiente não poderá deixar de influenciar o mérito da pretensão.

JUROS COMPENSATÓRIOS

Consagra o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo: 06670/13, de 17-10-2013, que "(...) A responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de uma situação em que exista uma dívida de imposto (que serve de base ao cálculo dos juros), verificados os seguintes pressupostos:

a) Atos ou omissões que levem a um atraso na estruturação de uma liquidação; ou

b) Não pagamento de imposta que deva ser efetuado antecipadamente (sem prévia notificação do sujeito passivo pela administração tributaria), ou

c) Não pagamento de imposto que foi retido ou que deveria ter sido retido e entregue à administração tributária', ou

d) Reembolso superior ao devido;

e) Atraso na liquidação ou entrega do imposto ou reembolso indevido imputáveis ao contribuinte, isto é, quando exista nexo de causalidade entre a atuação do contribuinte e aquele atraso ou reembolso;

f) Que o retardamento ou reembolso seja imputável ao contribuinte a título de culpa (...)."

"Para que o sujeito passivo deva juros compensatórios exige-se um nexo de causalidade adequada entre o seu comportamento e a falta de recebimento pontual de prestação ou o reembolso excessivo (...) A conduta do sujeito passivo deve ser censurável a título de dolo ou negligência (...) Deverá partir-se do pressuposto de que existe culpa sempre que a atuação do sujeito passivo integrar a hipótese de qualquer infração tributária (...)", tal como defendem DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, in LEI GERAL TRIBUTÁRIA, Comentada e anotada.

No caso em apreço, os juros compensatórios liquidados à Reclamante resultaram da violação das normas estabelecidas no Código do IRC, tal como explanado no relatório de inspeção tributária e nos termos descritos nos presentes autos.

Dispõe o art.º 102º do CIRC que "Sempre que, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega do imposto a pagar antecipadamente ou a reter no âmbito da substituição tributaria ou obtido reembolso indevido, acrescem o montante do imposto juros compensatórios à taxa e nos termos previstos no artigo 35.º da Lei Geral Tributária."

Assim, os juros compensatórios revestem a natureza de um agravamento da própria divida de imposto, com vista a "indemnizar" o Estado (ou, atendendo ao próprio conceito, compensar o Estado) pela perda da quantia que não foi liquidada no momento em que deveria ter sido.

Assim, e face ao exposto, afigura-se serem devidos juros compensatórios porquanto houve retardamento daquela liquidação, existindo também um nexo de causalidade entre a atuação do contribuinte e as consequências referidas lesivas para o Estado, enquanto credor.

 

VII -JUROS INDEMNIZATÓRIOS

Acrescenta-se, ainda que, por não se verificarem in casu os pressupostos do n.º 1 do art.º 43.º da LGT, não assiste ao reclamante o direito a juros indemnizatórios.

VIII - PROPOSTA DE DECISÃO

Nestes termos e em face ao exposto, propõe-se o indeferimento da reclamação, de acordo com os fundamentos da presente informação.

 

E)            A empresa X..., Lda, prestou serviços à Requerente em 2013 relativamente a uma transacção;

F)            Essa empresa era de antigos agentes comerciais da Requerente que saíram desta;

G)           Fizeram uma transação que demorou algum tempo, após o que aquela empresa emitiu a factura n.º 122-02, de 26 de marco de 2012, no valor de € 14.388,36, que foi paga pela Requerente, não tendo razão para desconfiar de qualquer irregularidade (depoimento da testemunha FF...);

H)           A Requerente foi constituída pelas sociedades, C... e D... que são suas sócias (relatório de inspeção tributária); (depoimento da testemunha FF...);

I)             Quando constituíram a Requerente, sociedades C... e D..., passaram   todos os negócios anteriores daquelas sociedades, designadamente os contratos de franchising que detinham e os imóveis que aquelas empresas tinham angariado para mediação (depoimento da testemunha FF...);

J)            Relativamente aos contratos de mediação anteriores, os proprietários dos imóveis assinaram declarações autorizando que mediação fosse feita pela Requerente, com pagamento por esta das comissões aos agentes (depoimento da testemunha FF...);

K)           A Requerente efectuou acções de formação de motivação profissional e desenvolvimento pessoal para os seus colaboradores (team building), realizadas pela empresa DD..., Lda, a que se refere a fatura nº 142, de I3 de Dezembro de 2013;

L)            A Requerente aceitou suportar as despesas com mobiliário e equipamentos em falta em imóveis que foram vendidos a clientes, para conseguir realizar os negócios e para não afectar, com a insatisfação dos compradores, a possibilidade de continuação da sua parceria com as empresas que lhe angariavam clientes, que eram a parte mais relevante da sua actividade de mediação (depoimento da testemunha FF...);

M)          A Requerente tinha interesse em satisfazer os clientes também por que muitas vezes, depois das aquisições, passavam a ser intermediárias no arrendamento dos imóveis que esses clientes adquiriam (depoimento da testemunha FF...);

N)           A Requerente efectuou obras numa sua loja (nos Olivais) a que se referem as facturas emitidas pela empresa "M..., Lda. " (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

O)           Materiais relativos a essas obras foram descarregados em ..., pois a Requerente continuava a operar na loja dos ... durante as obras e algum do material não pode ser descarregado logo nessa loja (depoimento da testemunha FF...);

P)           Relativamente à factura n.º 1300/000001, de 24 de Setembro de 2013, relativa à compra do stock da sociedade “EE...", inseriu-se num contexto em que aquela sociedade ia ser liquidada e contratou os seus serviços para acções promocionais da Requerente, nomeadamente, no âmbito da inauguração de lojas B... e na comemoração do dia da criança e do dia da mulher (depoimento da testemunha FF...);

Q)           Em 2013, havia grande dificuldade em vender imóveis, pela situação de crise económica (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

R)           No ano de 2013, relativamente a contratos no âmbito dos Golden Visa, a Requerente foi contactada por várias empresas, com sede em Hong Kong, em Chipre, na Suécia e em Macau, que se propunham angariar compradores residentes na República Popular da China, com a condição de lhe serem pagas comissões sobre os valores das vendas, em percentagens da ordem de 10% a 15% e por vezes montantes superiores (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

S)            A Requerente, como mediadora imobiliária, contactava os proprietários de imóveis e, caso aceitassem pagar essas comissões, mais a comissão da Requerente da ordem dos 5%, efectuava os respectivos contactos com essas empresas (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

T)            No ano de 2013, os vendedores precisavam de vender, em face de dificuldades económicas pelo que aceitavam frequentemente pagar as comissões referidas, por ser a única forma de conseguirem vender os imóveis de que dispunham para esse fim (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

U)           Só havia lugar a pagamento no caso de as vendas se concretizarem, correndo por conta dassas empresas todas as despesas relativas à angariação dos clientes (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

V)           Relativamente a empresas com sede em Macau, Chipre e Suécia que angariaram clientes no âmbito desse mercado, trata-se de empresas intermediárias relacionadas com empresas com sede na República Popular da China, com que tinham parcerias destinadas a acompanhar a Portugal os clientes que estas angariavam (tratando de assegurar viagens, visitas a casas, hotéis, serviços de tradução, restaurantes), o que gerava situações em que, relativamente ao mesmo imóvel, eram pagas comissões a duas empresas (depoimento da testemunha FF...);

W)          A Requerente não sabia quais as actividades que as empresas angariadoras realizavam para obterem os clientes (depoimentos de GG... e da testemunha FF...);

X)           Em 28-11-2017, a Requerente foi citada para o processo de execução fiscal n.º ...2017..., instaurado para cobrança coerciva da dívida de IRC e de Juros Compensatórios, referente ao exercício de 2013, no valor de € 2.249.628,05, acrescido de juros de mora no montante de € 612,14 e custas no valor de € 7.579,02, no valor total de € 2.257.819,21 (cf. Documento n.º 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

Y)            Em 28-12-2017, a Requerente requereu a suspensão da execução fiscal referida, com dispensa de prestação de garantia (documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

Z)            A suspensão da execução fiscal com dispensa de prestação de garantia foi deferida (documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

AA)        Em 16-01-2019, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente e os que constam do processo administrativo e nos depoimentos de GG... e da testemunha FF..., que aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos que relataram.

 

3. Matéria de direito

 

3.1. Ordem de conhecimento dos vícios

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou várias correcções à matéria tributável de IRC do exercício de 2013, com fundamento essencialmente no n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, que estabelece a regra geral de que «para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC».

Além das correcções relativa a gastos, a Autoridade Tributária e Aduaneira também efectuou uma correcção relativa a retenções na fonte respeitante a «RENDIMENTOS PAGOS A ENTIDADES RESIDENTES EM HONG KONG», que a Requerente refere ter impugnado através de reclamação graciosa autónoma (artigo 210.º do pedido de pronúncia arbitral), pelo que não se inclui no objecto deste processo.

De harmonia com o disposto no artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, não sendo imputados aos actos impugnados vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade, nem indicada uma relação de subsidiariedade, a ordem de apreciação dos vícios deve ser a, que segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz à tutela dos interesses ofendidos.

No caso em apreço, interpretando o pedido de pronúncia arbitral, em que a Requerente imputa às liquidações de IRC e juros compensatórios vícios de falta de fundamentação, infere-se que a Requerente pretende que seja apreciado, em primeiro lugar, esses vícios.

Na verdade, depois de imputar esses vícios, a Requerente refere no artigo 57.º do pedido de pronúncia arbitral a intenção de imputar os restantes vícios, a título subsidiário, ao dizer:

«Não obstante, e sempre sem conceder, por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá o seguinte:».

No entanto, a Requerente imputa vício à liquidação de juros compensatórios, por falta do pressuposto da existência de culpa e por falta de fundamentação quanto a esse pressuposto.

Apreciar-se-ão os vícios tendo em conta esta posição assumida pela Requerente, mas tendo em consideração que a falta da fundamentação da liquidação de juros compensatórios está conexionada com a fundamentação global da liquidação, em que os juros compensatórios foram incluídos.

Na verdade, apesar de Autoridade Tributária e Aduaneira ter elaborado um documento denominado «Demonstração de liquidação de juros», em que se indicam os elementos de cálculo dos juros compensatórios, este documento consubstancia um elemento de fundamentação da liquidação n.º 2017..., que inclui não só a liquidação de IRC como dos juros compensatórios, o que está em sintonia com o preceituado no artigo 35.º, n.º 8, da LGT, que estabelece que «os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados». Aliás, na notificação da liquidação, a Autoridade Tributária e Aduaneira refere-se à liquidação de juros compensatórios como uma «nota demonstrativa junta».

Por isso, embora a autonomia da liquidação de juros compensatórios possa ser tida em conta para efeitos de aferir a divisibilidade do acto impugnado e viabilizar uma hipotética anulação parcial, ela constitui apenas um dos elementos em que assentou a liquidação global que definiu de uma forma unitária a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira em relação à Requerente, indicando um valor a pagar de € 2.249.628,05.

Assim, é a liquidação n.º 2017..., em que se incluem IRC e juros compensatórios, que constitui o objecto do processo.

 

3.2. Vício de falta de fundamentação

A Requerente imputa ao acto impugnado vício de falta de fundamentação em duas vertentes: numa delas, reporta-se à globalidade do acto de liquidação, em que se inclui o valor dos juros compensatórios, defendendo, em suma, que não há nele fundamentação própria nem remissão para a fundamentação do Relatório da Inspecção Tributária; para além disso, relativamente à liquidação de juros compensatórios a Requerente imputa vício ainda por não se fazer referência à existência de culpa.

 

3.2.1. Questão da falta de fundamentação quanto à parte da liquidação relativa ao IRC

A exigência de fundamentação de actos administrativos lesivos consta do n.º 3 do artigo 268.º da CRP, em que se estabelece que «os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos».

Especialmente para a fundamentação dos actos tributários, o artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, da LGT, estabelece que «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária» e que «a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender uniformemente que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. (   )

Embora seja de distinguir entre o acto de liquidação e o acto de notificação através do qual ele é comunicado ao destinatário, no caso em apreço não se provou que haja qualquer outro documento referente ao acto de liquidação que não seja o que está reproduzido no documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, pelo que se tem de partir do pressuposto que ele é cópia do acto que foi praticado, que não terá outro conteúdo para além do que dele consta.

Pelo documento referido constata-se que dele constam as operações de que resulta o cálculo da quantia liquidada e refere-se que foi junta uma «nota demonstrativa», que será constituída pela «Demonstração de liquidação de juros» e pela «Demonstração de acerto de contas» juntas pela Requerente.

Na referida liquidação, indicam-se as importâncias da liquidação anterior, e as «importâncias corrigidas» e refere-se que a liquidação está «conforme nota demonstrativa junta e fundamentação já remetida».

Há, assim, uma perceptível remissão para a fundamentação que consta do Relatório da Inspecção Tributária, anteriormente enviado à Requerente, relativo ao exercício de 2013, a que se reporta a liquidação.

Constata-se ainda que na notificação do Relatório da Inspecção Tributária se refere expressamente que «a breve prazo, os serviços da AT procederão à notificação da liquidação respetiva, a qual conterá os meios de defesa, bem como o prazo de pagamento, se a ele houver lugar» e que na notificação do acto de liquidação se faz referência à «fundamentação já remetida».

Neste contexto, tendo a Requerente sido previamente notificada do Relatório da Inspecção Tributária e do despacho que o sancionou em que foi proposta correcção à matéria tributável da Requerente relativa ao ano de 2013, a liquidação em que se indicam importâncias corrigidas correspondentes às correcções previamente comunicadas não pode deixar de ser interpretada por um destinatário com capacidades de percepção normais como sendo a concretização da liquidação anunciada, o que é reforçado pelo facto de na própria liquidação se fazer referência à «fundamentação já remetida».

Assim, interpretando o teor do acto de liquidação no contexto em que foi praticado, conclui-se que há nele uma remissão expressa para a fundamentação que não pode deixar de ser a do Relatório da Inspecção Tributária.

Por outro lado, a exigência de fundamentação expressa dos actos lesivos que é feita no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, é compatível com a fundamentação por remissão e, no caso em apreço, contém-se no acto de liquidação uma remissão expressa para a fundamentação anteriormente remetida.

Para além disso, infere-se do pedido de pronúncia arbitral que a Requerente percebeu perfeitamente que as importâncias corrigidas que constam da liquidação correspondem às indicadas no Relatório da Inspecção Tributária e que a fundamentação a que se alude na notificação da liquidação é a do Relatório da Inspecção Tributária, que tinha sido previamente comunicada.

Por isso, não há falta de fundamentação global da liquidação de IRC. (   )

 

3.2.2. Questão da falta de fundamentação quanto à parte da liquidação relativa aos juros compensatórios

No que concerne à liquidação de juros compensatórios constata-se que a única fundamentação é a que consta da demonstração das liquidações de juros compensatórios e da demonstração de acerto de contas (documentos n.ºs 3 e 4), pois no Relatório da Inspecção Tributária não se faz qualquer referência a juros compensatórios.

Pelo contrário, no Relatório da Inspecção Tributária até à uma omissão explícita de que se infere que se terá entendido que não havia lugar a juros compensatórios. Na verdade, na página 4 do Relatório da Inspecção Tributária indicam-se as «Conclusões da Ação de Inspecção» e no ponto I.1.3, relativo a indicação dos «Montantes sujeitos a juros», não se indica qualquer montante.

O artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária».

A responsabilidade objectiva é excepcional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (art. 483.º, n.º 2, do Código Civil) e, por isso, deverá entender-se que, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um «facto imputável ao sujeito passivo» quando puder formular-se um juízo de censura em relação à sua conduta.

Nesta linha, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender, uniformemente, que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte. 

Por outro lado, se é certo que, «quando uma determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito, deverá fazer-se decorrer do preenchimento da hipótese normativa, por ilação lógica, a existência de culpa, na forma pressuposta na previsão do tipo de ilícito respectivo» (   ), também o é que isso não sucede necessariamente nas situações em que se está perante a falta de prova de requisitos de dedutibilidade de gastos.

Na verdade, a falta dos requisitos de dedutibilidade de gastos não afasta a presunção de boa-fé das declarações dos contribuintes, como resulta do teor expresso do n.º 1 do artigo 75.º da LGT, ao estabelecer que «presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos».  

Neste caso, perante a falta de qualquer referência a essa imputabilidade e razões que a justificam, quer no Relatório da Inspecção Tributária quer nas demonstrações da liquidação de juros compensatórios e de acerto de contas, fica-se sem saber se a entidade que emitiu a liquidação de juros compensatórios entendeu que a responsabilidade por juros compensatórios é automática, decorrendo do próprio facto de terem sido efectuadas correcções, ou se concluiu que se pode formular um juízo de censura em relação à actuação da Requerente, susceptível de preencher o requisito da imputabilidade, situação em que a fundamentação deveria conter indicação dos factos subjacentes a esse juízo de censura.

Assim, tem de se concluir que a fundamentação da liquidação de juros compensatórios não constitui a fundamentação expressa e acessível exigida pelo n.º 3 do artigo 268.º da CRP.

O artigo 37.º do CPPT, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não tem qualquer relevo para este efeito, pois visa sanar apenas deficiências da notificação dos actos tributários e não a sua falta de fundamentação.

Pelo exposto, a liquidação de juros compensatórios enferma de vício de falta de fundamentação, que justifica a sua anulação, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

3.3. Aquisição de fracções autónomas - Gastos com Comissões - € 6.345,00

A Requerente adquiriu três fracções autónomas tendo sido intermediária no negócio a empresa C... (ponto III.1.1.do RIT) e pagou comissão ao comissionista I... .

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que, sendo a intermediária no negócio a C... era esta que deveria ter pagado a comissão ao referido comissionista.

A Requerente defende sobre esta correcção, como único fundamento do pedido de anulação, que «estando o gasto no valor de € 6.345,00 suportado num documento anexo à fatura-recibo n.º 44 e referindo o mesmo que se reporta às comissões do ID ... não restam quaisquer dúvidas de que o referido gasto tem suporte documental e apoio na sua contabilidade, pelo que nos termos conjugados do artigo 23º, nº 1, do CIRC e 75.º da LGT, deverá ser aceite o gasto em apreço e determinada a anulação da correção».

Esta norma estabelece que «presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos».

Porém, como se refere na parte final deste artigo 75.º esta presunção não prejudica os «demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos», designadamente o requisito geral exigido pelo n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, na redacção vigente em 2013, de que «consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora».

Assim, só os gastos conexionados com os rendimentos ou a manutenção da fonte produtora podem ser dedutíveis.

Neste caso, não se demonstrou qualquer relação da comissão com a actividade de intermediação da Requerente e, pelo contrário, a prova produzida aponta no sentido de não foi a Requerente a intermediária.

Por isso, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.

 

3.4. Fornecimento e montagem de cozinha em imóvel de terceiro - € 9.244,33

A Requerente suportou o gasto de € 9.244,33, com base numa factura emitida pela sociedade "J..., Lda." relativa ao fornecimento e montagem de cozinha no imóvel localizado também na ..., no nº..., na ..., ao qual foi atribuído o ID ... (propriedade de cliente da Requerente).

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que o «fornecimento e montagem de cozinha em imóvel de propriedade de terceiro, no montante de € 9.244,33, não pode ser aceite para efeitos fiscais, nos termos do nº 1 do artigo 23º do CIRC».

Diz a Autoridade Tributária e Aduaneira que «a A..., enquanto mediadora imobiliária, recebe exclusivamente comissões pela angariação de adquirentes para os imóveis que tem a seu cargo, propriedade dos seus clientes» e que «se os imóveis necessitam de "melhoramentos", os gastos relacionados com esses "melhoramentos" devem ser suportados pelos clientes da A... ou até mesmo pelos adquirentes dos imóveis (os novos proprietários)».

A Requerente defende que a aquisição se revelou imprescindível para a transmissão do imóvel, o que foi corroborado pela prova produzida na reunião: «a Requerente aceitou suportar as despesas com mobiliário e equipamentos em falta em imóveis que foram vendidos a clientes, para conseguir realizar os negócios e para não afectar, com a insatisfação dos compradores, a possibilidade de continuação da sua parceria com as empresas que lhe angariavam clientes, que eram a parte mais relevante da sua actividade de mediação» e «a Requerente tinha interesse em satisfazer os clientes também por que muitas vezes, depois das aquisições, passavam a ser intermediárias no arrendamento dos imóveis que esses clientes adquiriam».

Trata-se, assim, de actos de gestão, conexionados com a actividade da Requerente, destinados a obter os rendimentos e assegurar a manutenção da sua fonte produtora (clientes angariados), pelo que se verificam os requisitos de dedutibilidade de gastos exigidos pelo n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.

Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.

 

3.5. Comissões pela alienação de fracções autónomas -  € 23.726,26

A Requerente registou, relativamente à mediação identificada com a designação ID..., comissões pagas no montante total de € 103.157,66, relativamente às quais foi deduzido o IVA suportado nestas comissões, no valor total de € 23.726,26.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que «as deduções de imposto no montante total de € 23.726,26 são consideradas indevidas, de acordo com o disposto  no    1  do  artigo  20º  do  mesmo normativo. A referida verba deveria ter sido considerada como um gasto do exercício, nos termos da alínea f) do nº 1 do artigo 23º do CIRC», que refere a relevância dos gastos «de natureza fiscal e parafiscal».

A Requerente defende que a factura a que se reporta este gasto «está devidamente registada na sua contabilidade e identifica, tal como esclareceu a ora Requerente que a mesma se reporta a um gasto com um imóvel próprio sito no ... andar da ..., em ... ».

A Autoridade Tributária e Aduaneira admite que a referida verba deve ser considerada um gasto do exercício, pelo que não se justifica uma correcção desfavorável à Requerente em sede de IRC.

A eventual dedução indevida de IVA, se tiver ocorrido, o que não é objecto de apreciação presente processo, será possível fundamento de correcção da dedução efectuada.

Pelo exposto, não tem fundamento esta correcção à face do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, designadamente a sua alínea f).

Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.

3.6.  Aquisições para Imóveis de Propriedade de Terceiros - € 25.178,12

A Requerente efectuou esta correcção, relativa a «gastos relativos à aquisição de mobiliário diverso e ao fornecimento de materiais de construção» para imóveis de propriedade dos clientes da Requerente e «quanto às faturas nºs V001/201303385 e V001/201303632, emitidas pela sociedade M..., Lda., o sujeito passivo indicou-as como sendo relativas a obras realizadas na sua loja dos ... (o local da sede). No entanto, estas faturas mencionam que a descarga dos materiais foi efetuada em  ...».

A prova produzida justifica que, pelas razões que se referem no ponto 3.4., se entenda que as despesas com imóveis dos clientes são actos de gestão, conexionados com a actividade da Requerente, destinados a obter os rendimentos e assegurar a manutenção da sua fonte produtora.

Quanto às M..., Lda, a prova produzida revelou que as despesas se reportam efectivamente a obras numa loja da Requerente (nos ...) e que materiais relativos a essas obras foram descarregados em ..., por a Requerente continuar a operar na loja dos ... durante as obras e algum do material não poder ter sido descarregado logo nessa loja.

Assim, não há fundamento para esta correcção, à face do preceituado no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, na redacção vigente em 2013, pois se trata de despesas destinadas a assegurar a fonte produtora de rendimentos.

Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.

 

3.7. Faturas Emitidas por Empresas de Hong Kong - correcção no montante de € 3.150.490,16

A Requente contabilizou facturas emitidas por empresas com sede em Hong Kong, com descritivos destas faturas, estamos perante "serviços de marketing e consultoria na China", serviços de "marketing e publicidade na China", "serviços de pesquisa de mercado na China" e "comissões".

Essas empresas e montantes facturados são indicados no quadro que segue:

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a dedutibilidade dos gastos da Requerente relativos a pagamentos às empresas com sede em Hong Kong, com fundamento no artigo 65.º do CIRC, na redacção vigente em 2013, que estabelece o seguinte, no que aqui interessa:

 

Artigo 65.º

 

Pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado

 

1 – Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

2 – Considera-se que uma pessoa singular ou colectiva está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando o território de residência da mesma constar da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aquela aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC, ou quando, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior, o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60 % do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português.

 

Para além disso, a Autoridade Tributária e Aduaneira liquidou, pelas mesmas razões, a correspondente tributação autónoma prevista no artigo 88.º, n.º 8, do CIRC, em que se estabelece o seguinte, na redacção vigente em 2014:

 

8 – São sujeitas ao regime do n.º 1 ou do n.º 2, consoante os casos, sendo as taxas aplicáveis, respectivamente, 35 % ou 55 %, as despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, tal como definido nos termos do Código, salvo se o sujeito passivo puder provar que correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

               

O território de Hong Kong estava incluído, em 2013, na «lista dos países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada, claramente mais favoráveis», que consta da Portaria n.º 292/2011, de 8 de Novembro, que alterou a Portaria n.º 150/2004, de 13 de Fevereiro.

A Requerente apresentou documentos para prova das operações realizadas, designadamente contratos celebrados com essas empresas e contratos celebrados de compra de imóveis com intermediação da Requerente por cidadãos por aquelas empresas.

               

3.7.1. Prova da realização das operações            

Resultou da prova produzida, que foi realizada por aquelas empresas de Hong Kong uma actividade global de angariação de cidadãos residentes na China para compra de imóveis com intermediação da Requerente, no ano de 2013.

Essa actividade de angariação era acompanhada pelo pagamento das despesas de viagem e estadia dos cidadãos angariados e a remuneração daquelas empresas era efectuada apenas nos casos em que eram concretizadas vendas.

Por isso, a concretização das vendas com mediação da Requerente a cidadãos residentes na República Popular da China é uma prova convincente de que as operações foram realizadas, pois não é crível que fossem apresentados à Requerente, em número elevado, sem uma actividade de angariação, publicidade e marketing, pois sem esta não se vislumbra como poderiam ter conhecimento de que a Requerente dispunha de imóveis para venda. Por outro lado, o facto de que a remuneração só ser paga precisamente se tivesse como resultado a concretização das vendas, assegura que não houve pagamentos que não tivessem subjacente actividade de angariação.

Tendo sido identificados os imóveis vendidos, juntos os contratos celebrados entre a Requerente e as sociedades sediadas em Hong Kong e os contratos de imediação imobiliária, as facturas relativas aos pagamentos e escrituras públicas relativas às vendas, não se justificam dúvidas sobre a realização desta actividade, confirmada pela prova produzida na reunião e não contrariada por qualquer elemento de prova.

Por isso, não se justifica que não se considere provado que os gastos suportados pela Requerente com pagamentos às referidas empresas de Hong Kong correspondem a operações efectivamente realizadas.

 

3.7.2. Prova da não anormalidade e não exagero

No que concerne à normalidade de pagamentos pela prestação de serviços de angariação de clientes para a aquisição de imóveis afigura-se evidente, pois trata-se de uma actividade de prestação de serviços regulamentada, precisamente no que concerne a imóveis (Decreto-Lei n.º 69/2011, de 15 de Junho) e, como qualquer actividade de natureza profissional, é remunerada. O que consubstanciaria anormalidade, seria a prestação de serviços gratuitos à Requerente, suportando as empresas de Hong Kong as despesas da actividade sem qualquer contrapartida.

Quanto ao montante das comissões, tem a ver com o requisito do «não exagero» e não com o de «não anormalidade» para efeitos daquele artigo 65.º do CIRC.

Para decidir se há ou não exagero não pode tomar-se como termo de comparação as percentagens das comissões cobradas habitualmente pelas empresas de intermediação imobiliária nacionais, pois a desenvolvida pelas empresas referidas não se limita à que normalmente é levada a cabo na mediação imobiliária, que não envolve despesas da ordem das que se provou serem suportadas por aquelas empresas (pagamento de viagens, alojamento, alimentação, transportes, etc.).

Por outro lado, a aferição do requisito do não exagero, deverá ser efectuada tendo em conta a situação do sujeito passivo, procurando apurar se o pagamento deve considerar-se excessivo, sob a sua perspectiva, no contexto em que tem de decidir pagar os serviços.

Desta perspectiva, será exagerado o pagamento quando se demonstrar que o sujeito passivo podia obter o mesmo serviço por quantia inferior.

Resulta da prova produzida que eram os vendedores que suportavam as comissões pagas às empresas de Hong Kong e não há razão para duvidar que, em face das despesas suportadas e o risco do negócio correr por sua conta (no caso de os clientes trazidos a Portugal não comprarem imóveis), os pagamentos não serão de considerar exagerados, em face do contexto do mercado, sendo essa a explicação para ser aceite o pagamento daquela comissões por grande quantidade de vendedores dos imóveis.

A prova produzida é também no sentido de que não era possível obter clientes com pagamento de comissões inferiores, para obter tão elevada quantidade de clientes para imóveis de valores elevados.

 Nestas condições o pagamento não se pode considerar exagerado, pois está justificado pela necessidade de obtenção dos serviços de angariação e não haver alternativa a preço inferior, para serviços com a mesma qualidade e quantidade.

A razoabilidade dos pagamentos efectuados pela Requerente é ainda reforçada pelo facto de a Requerente não ser afectada pelos pagamentos que lhe fazia, pois apenas lhe pagava quando concretizasse a venda dos imóveis e o que pagava era suportado pelos vendedores.

Pelo exposto, deve considerar-se provado que os pagamentos não eram exagerados.

 

3.7.3. Anulação da liquidação de IRC na parte respectiva e anulação da liquidação de tributação autónoma no montante de € 1.102.671,56

Assim, conclui-se que o acto de liquidação relativo ao exercício de 2014 enferma de vício de violação do artigo 65.º do CIRC, na parte respeitante à não dedutibilidade dos pagamentos efectuados às empresas de Hong Kong no valor de € 3.150.490,16, bem como quanto ao montante da tributação autónoma calculada com base no n.º 8 do artigo 88.º do CIRC, no montante de € 1.102.671,56 (€ 3.150.490,16x 35%).

 

3.8. Factura Emitida por Empresa da Suécia – correcção no montante de € 37.800,00

A Requerente registou na contabilidade, como gasto a verba de € 37.800,00, com base numa factura emitida pela sociedade sueca S... com o descritivo de "Service fee" ("Taxa de Serviço").

A Requerente apresentou como prova da realização do serviço por parte da S...:

 

• A fotocópia da fatura emitida por esta sociedade, manuscrita com os números dos processos ID... e...;

• A fotocópia da fatura nº 008/2014 de 2014-01-20, emitida pela sociedade N... (localizada em Hong Kong), manuscrita com os mesmos números dos processos (IO) que se encontram manuscritos na fotocópia da fatura emitida pela S...;

• As fotocópias de duas faturas emitidas pela A... ao seu cliente, "W..., S.A. (NIPC:...), relativas às comissões recebidas pela venda dos imóveis identificados por ID... e ID... (faturas nºs 1300/000540 e 1400/000023, emitidas em 2013-12-12 e 2014-01-13, respetivamente).

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou a correcção, por entender que «não foi apresentada qualquer justificação por parte do sujeito passivo, sobre a necessidade de recorrer a duas empresas, residentes em locais distintos (Suécia e Hong Kong), uma para faturar comissões ("taxa de serviço") e outra faturar serviços de "marketing e publicidade na China", para a venda dos mesmos imóveis, a cargo da A..., em que a própria empresa sueca declarou exercer uma atividade comercial ligada ao sector do vestuário e calçado (VIÉS).».

A explicação para a emissão de duas facturas foi trazida ao processo pela prova produzida na reunião, de que resulta que se trata de uma empresa relacionada com empresas com sede na República Popular da China e Hong Kong, com que tinha parcerias destinadas a acompanhar a Portugal os clientes que estas angariavam (tratando de assegurar viagens, visitas a casas, hotéis, serviços de tradução, restaurantes), o que gerava situações em que, relativamente ao mesmo imóvel, eram pagas comissões a duas empresas.

Neste contexto, tendo-se provado que, efectivamente, ocorreu uma venda, sem a qual não havia pagamento de comissões, não há fundamento para não considerar como gasto a despesa referida na factura emitida pela referida empresa sueca.

De qualquer modo, a prova produzida na reunião esclareceu que esta empresa colaborava com é empresas angariadoras de clientes com sede na República Popular da China e assegurava o acompanhamento dos clientes angariados nas suas viagens a Portugal (incluindo na estadia, intérpretes deslocações em Portugal).

Aliás, não se está, nestes casos, perante pagamentos a entidades não residentes submetidas a um regime fiscal identificado por Portaria do membro do Governo, pelo que não vale aqui a presunção ínsita na alínea r) do n.º 1 do artigo 23.º e no n.º 8 do artigo 88.º do CIRC.

Por isso, a hipotética dúvida sobre estas operações teria de ser valorada contra a Autoridade Tributária e Aduaneira, por força do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT.

Assim, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.

 

3.9. Registo de Fatura emitida Por Sociedade Cessada – correcção no montante de € 14.388,36

Refere-se no RIT que «em Março de 2013 foi registada na conta de Fornecimentos e Serviços Externos (subconta: 622503 denominada por "comissões pagas a outras agências") a verba de € 14.388,36, com base na fatura nº 122-02 de 2012-03-26, emitida pela sociedade "X..., Lda." (NIPC:...) à A..., tendo sido deduzido o IVA de € 3.309,32, mencionado na referida fatura (Anexo III - folha 137, página 273)».

A sociedade "X..., Lda." emitente da fatura nº 122-02 de 2012-03-26, encontra-se cessada desde 2011-07-01, para efeitos de IVA e de IRC e a factura e anterior ao início de actividade da Requerente.

A Requerente disse durante a inspecção que o capital daquela empresa «era detido por três agentes que colaboravam com a A... (Z..., Y... e AA...), aos quais foram pagas comissões pelo serviço evidenciado na fatura nº 122-22, e efetivamente prestado», mas foram apresentados contratos celebrados entre estes três agentes e uma sociedade denominada D..., que é sócia da Requerente.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que a quantia facturada não podia ser aceite como gasto pelo seguinte:

  

Para além dos três contratos terem sido realizados com a sociedade D... e os mesmos terem sido firmados com pessoas singulares na qualidade de angariadores imobiliários, não foi apresentado nenhum contrato realizado entre a A... e a sociedade "X..., Lda.", assim como nenhum dos senhores atrás identificado exerceu funções de gerência nesta sociedade, de acordo com a base de dados da AT.

Apesar do sujeito passivo considerar que a fatura emitida pela sociedade "X..., Lda.", comprova os serviços prestados, não é possível determinar a realização dos mesmos, tendo em conta a forma como foram processados os pagamentos da fatura, em que a própria A... deveria ter exigido a cada um dos beneficiários a emissão das faturas correspondentes aos montantes que receberam.

 

A prova produzida é no sentido de terem sido prestados serviços pelos referidos três pessoas, Y..., Z... e AA... e o contrato ter sido celebrado pela empresa D... cujos contratos foram transferidos para a Requerente, na sequência de fusão.

Mas, o certo é que os contratos apresentados foram celebrados individualmente com os referidos Y..., Z... e AA... e não com a sociedade "X..., Lda.", que foi a emitente da factura, mas não quem recebeu os pagamentos.

A Requerente alega que está de boa-fé ao fazer o pagamento, mas há sérias razões para duvidar que tenham sido prestados serviços por aquela sociedade no valor referido e mesmo pelos beneficiários dos pagamentos Y..., Z... e AA... .

Na verdade, os factos de as transferências terem sido feitas para contas individuais, não estar identificado qual o concreto serviço prestado por cada um deles, nenhum deles ter emitido facturas nem recibos relativo às quantias que a Requerente transferiu para as suas contas bancárias e o montante das transferências (€ 16.897,17) não corresponder ao montante facturado acrescido de IVA (€ 17.697,68, resultante de €14,388,36 + IVA no montante de € 3.309,32), justificam a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao não considerar comprovado que houve prestação de serviços.

De qualquer modo, o que resulta da prova produzida é que não está subjacente à factura referida qualquer contrato celebrado com a "X..., Lda." e que esta não prestou qualquer serviço correspondente ao montante facturado, pela que a factura atesta a prestação de serviços fictícia.

Nestas condições, justifica-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira não tenha aceitado como gasto a referida factura, por estar demonstrado que a factura não corresponde à realidade.

De qualquer modo, mesmo que se estivesse perante uma situação de dúvida sobre a existência da prestação de serviços a que se refere a factura emitida em nome da "X..., Lda.", elas teriam de ser valoradas contra a Requerente, por força do preceituado no n.º 1 do artigo 74.º e nos n.ºs 1 e 2, alínea a), do artigo 75.º da LGT, na linha do que entendeu o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 04-11-2004, processo n.º 0810/04:

Tendo a Administração Fiscal, por considerar seriamente indiciado não se terem efectivamente realizado as operações consubstanciadas em determinadas facturas, existentes na escrita do contribuinte, não considerado como custos os montantes delas constantes, não precisa de demonstrar a falsidade de tais documentos, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo, incumbindo ao contribuinte provar a realidade das ditas operações.

 

No caso apreço, não foi provada a existência de uma prestação de serviços à Requerente pela sociedade X..., Lda.", nem qualquer prestação de serviços cujo valor seja o montante facturado.

Pelo exposto, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção.

 

3.10. Despesas de representação – tributação autónoma no valor de montante de € 14.623.91.

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção no montante de € 14.623.91. relativa a «gastos que devido às suas características ou pela ausência de outros elementos justificativos dos mesmos, deveriam ter sido considerados como despesas de representação, as quais estão sujeitas a tributação autónoma à taxa de 10%, conforme o disposto no nº 7 do artigo 88º do CIRC».

A Requerente faz uma alegação incongruente sobre esta correcção, pois diz que explicou a «natureza destes gastos e a sua indispensabilidade para a atividade da ora Requerente e, consequentemente, o seu enquadramento como gasto para efeitos do disposto no artigo 23.º do CIRC» (artigo 221.º do pedido de pronúncia arbitral) para depois concluir que «deverá, pois, concluir-se para se considerar que os gastos em causa não têm enquadramento no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC e, consequentemente, para sujeito deste gasto à tributação autónoma de 10% nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 88.º, n.º 7, do CIRC» (artigo 225.º do pedido de pronúncia arbitral).

Aliás, a própria Requerente considerou as referidas despesas como gastos do exercício. 

A Autoridade Tributária e Aduaneira não fez, no âmbito desta correcção, desconsideração dos gastos referidos, por hipoteticamente não serem de considerar indispensáveis à face do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, mas, antes pelo contrário, considerou um gasto adicional no valor de € 23.759,00, por alegada dedução indevida de IVA, como se refere expressamente no RIT: « A verba de € 23.759,00, relativa ao IVA deduzido indevidamente, é considerada gasto do exercício, nos termos da alínea f) do nº 1 do artigo 23º do CIRC».

E vê-se pelo quadro de «Apuramento do Total das Correcções» que, em sede de IRC, o valor de € 23.759,00 foi considerado a favor da Requerente, sendo abatido ao montante dos gastos não dedutíveis.

Por isso, há erro de interpretação desta correcção pela Requerente, ao dizer que «os SIT desconsideraram como gastos da Requerente despesas comprovadamente associadas à sua atividade de mediação imobiliária, nomeadamente, com angariação de clientes e promoção dos imóveis junto de potenciais adquirentes e relacionados com eventos da própria Requerente» (artigo 222.º do pedido de pronúncia arbitral).

Por outro lado, é precisamente por os encargos referidos serem dedutíveis que podem ser tributados autonomamente à taxa de 10%, como resulta do teor expresso do n.º 7 do artigo 88º do CIRC:

 

São tributados autonomamente à taxa de 10 % os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação, considerando-se como tal, nomeadamente, as despesas suportadas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.

 

 Por isso, a não aplicação da tributação autónoma em causa apenas poderia advir da demonstração de que as despesas referidas não se enquadram no conceito de despesas de representação, designadamente que não se reportam a «recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos».

Trata-se de um tributação autónoma que tem por finalidade tributar despesas que, embora sejam consideradas indispensáveis para a formação do rendimento, acabam por ter vantagens na esfera pessoal de outras pessoas, colaboradores ou não, sendo estas vantagens que se visam tributar.

As despesas com a comemoração do Dia da Criança (em benefício dos sem abrigo) e a comemoração do Dia da Mulher, bem como o evento de firewalking, enquadram-se neste conceito específico de despesas de representação, o que, aliás, nem sequer é questionado pela Requerente, que invoca como fundamento para a não aplicação da tributação autónoma apenas que as despesas «não têm enquadramento no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC» (artigo 225.º do pedido de pronúncia arbitral, contraditório com o que diz no artigo 221.º).

Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta tributação autónoma.

 

3.11. Ilegalidade por violação do princípio do inquisitório e prossecução da verdade material

A Requerente imputa estes vícios à liquidação impugnada porque entende, em suma, «que a Administração Tributaria e Aduaneira não logrou demonstrar os motivos pelos quais desconsiderou os gastos com comissões suportados pela ora Requerente e, bem assim, que os mesmos não foram fundamentais para a manutenção da fonte de produção e para a obtenção de proveitos, os quais, conforme demonstrado, se revelaram essenciais para a manutenção da fonte de produção, em manifesta violação do disposto no artigo 58.°, da LGT e artigo 6.º, do RCPITA»

O artigo 58.º da LGT estabelece que «a administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido».

O artigo 6.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) estabelece que «o procedimento de inspecção visa a descoberta da verdade material, devendo a administração tributária adoptar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objectivo».

Como resulta do teor expresso destas normas, reportam-se à realização de diligências pela Autoridade Tributária e Aduaneira e não à eventual insuficiência de prova dos fundamentos de facto em que assentam os actos que pratica.

Neste caso, a Requerente não imputa à actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira falta de realização de diligências, pelo que não ocorre a invocada violação desses princípios.

Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a estes vícios.

 

3.12. Decisão da reclamação graciosa

A decisão da reclamação graciosa, que manteve as liquidações de IRC e juros compensatórios impugnadas, enferma das ilegalidades de que enfermam as liquidações, pelo que se justifica também a sua anulação, na parte correspondente às ilegalidades referidas.

 

4. Decisão

 De harmonia com o exposto, acordam, neste Tribunal Arbitral, em

a)            Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto à liquidação de juros compensatórios n.º 2017..., no montante de € 253.725,67, e anular esta liquidação, bem como a liquidação de IRC n.º 2017..., na parte em que inclui o valor da liquidação de juros compensatórios;

b)           Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às seguintes correcções:

– Aquisição de fracções autónomas - Gastos com Comissões - € 6.345,00 (ponto 3.3);

– Registo de Factura emitida Por Sociedade Cessada – correcção no montante de € 14.388,36 (ponto 3.9);

– Despesas de representação – tributação autónoma no valor de montante de € 14.623.91 (ponto 3.10);

c)            Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às seguintes correcções:

– Fornecimento e montagem de cozinha em imóvel de terceiro - € 9.244,33 (ponto 3.4);

– Comissões pela alienação de fracções autónomas -  € 23.726,26 (ponto 3.5.);

– Aquisições para Imóveis de Propriedade de Terceiros - € 25.178,12 (ponto 3.6);

– Facturas Emitidas por Empresas de Hong Kong - correcção no montante de € 3.150.490,16 (ponto 3.7);

– Tributação autónoma no montante de € 1.102.671,56  (ponto 3.7.3);

– Factura Emitida por Empresa da Suécia – correcção no montante de € 37.800,00 (ponto 3.8);

d)           Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às questões da falta de fundamentação da liquidação de IRC e violação dos princípios do inquisitório e da prossecução da verdade material;

e)           Anular a liquidação de IRC n.º 2017... na parte correspondente às correcções que são julgadas procedentes;

f)            Anular a decisão da reclamação graciosa n.º ...2017..., na parte em que manteve as liquidações de IRC e de juros compensatórios na medida em que são anuladas.

 

5. Valor do processo

De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 2.249.628,05.

6. Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 29.070,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente e da Autoridade Tributária e Aduaneira nas percentagens de 3,63% e 96,37, respectivamente.

Na fixação das percentagens foi considerado que a Requerente obteve vencimento quanto ao valor de € 2.168.006,95 (ficando vencida quanto ao valor restante da liquidação, que impugnou na totalidade):

 

  a juros compensatórios no valor de € 253.725,67;

– a correcções à matéria tributável de IRC no valor de 3.246.438,87, a que correspondente imposto € 811.609,72, à taxa de 25%, prevista no artigo 87.º do CIRC, na redacção vigente em 2013;

– a tributação autónoma no valor de 1.102.671,56.

 

Lisboa, 22-07-2019

Os Árbitros

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)                                

(Marcolino Pisão Pedreiro)

(Cristina Aragão Seia)