Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 330/2021-T
Data da decisão: 2022-02-22  IRS  
Valor do pedido: € 47.705,62
Tema: IRS – Ilegalidade da liquidação de retenções na fonte.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I – Relatório

 

1.            Do histórico dos factos IRS – Mais-Valias de não residentes – Revogação do ato – Extinção da instância

a)            A..., S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua ..., n.º..., Edifício..., ...-... ... (doravante “Requerente”), vem, ao abrigo dos artigos 95.º, n.os 1 e 2, alínea a), da Lei Geral Tributária (“LGT”), 99.º, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, 6.º, n.º 1, 10.º, n.os 1, alínea a), e 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL tendo em vista a declaração de ilegalidade e consequente anulação da liquidação de retenções na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), referente ao período de tributação de 2017.

 

b)           No pedido de pronúncia arbitral é, portanto, impugnada a legalidade de retenções na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2021..., de 13 de janeiro de 2021, referente ao período de tributação de 2017, no montante global a pagar de EUR 47.705,62, sendo € 41.617,00 de imposto e € 6.088,62 de juros compensatórios, (doc.1)

 

c)            O pedido de pronúncia arbitral tem por fundamento a liquidação, por alegadamente enfermar de erro sobre os pressupostos de facto e de direito e, por via disso, de vícios de diversa ordem,

 

2.            Dos factos

 

d)           A Requerente – constituída em 27 de fevereiro de 2005 – integra o Grupo B..., grupo industrial que opera a nível mundial como fornecedor full service no ramo automóvel.

 

e)           A título principal, a Requerente exerce a atividade de “outras atividades e serviços de apoio prestados às empresas”, prestando serviços relacionados com o desenvolvimento de novos produtos e processos nas áreas de engenharia, R&D, procurement e ITK.

 

f)            Desde 2014, a Requerente integra o grupo fiscal dominado pela sociedade C..., SGPS, S.A., pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua do ..., ..., ..., ...-... ..., sendo integralmente detida por esta sociedade.

 

g)            No dia 12 de outubro de 2005, a ora Requerente e o senhor D... (doravante D...) celebraram um contrato promessa de trabalho, tendo este iniciado a sua relação laboral com a ora Requerente a 1 de maio de 2006 – cfr. cópias do contrato de promessa de trabalho e da declaração de inscrição na Segurança Social, juntas como doc.s n.os 2 e 3.

 

h)           No âmbito de tal relação laboral, a qual durou cerca de doze (12) anos, o senhor D... exerceu funções como diretor de Investigação e Desenvolvimento (“I&D”) – cfr. Doc. n.º 3.

 

i)             Entre janeiro de 2016 e março de 2017, pelo exercício de tais funções, o senhor D... auferiu a seguinte retribuição mensal:

 

j)             Abonos Montante (EUR):

 

Vencimento (janeiro 2016) - 8.850

Vencimento (fevereiro 2016) - 8.850

Vencimento (março 2016) - 8.850

Vencimento (abril 2016) - 8.850

Vencimento (maio 2016) - 8.850

Vencimento (junho 2016) - 8.850

Vencimento (julho 2016) - 8.850

Vencimento (agosto 2016) - 8.850

Vencimento (setembro 2016) - 8.850

Vencimento (outubro 2016) - 8.850

Vencimento (novembro 2016) - 8.850

Vencimento (dezembro 2016) - 8.850

Subsídio de férias de 2016 - 8.850

Subsídio de Natal de 2016 - 8.850

Bónus de 2016 - 110.000

Vencimento (janeiro 2017) - 8.850

Vencimento (fevereiro 2017) - 8.850

Vencimento (março 2017) - 8.850

Subsídio de férias de 2017 - 8.850 – cfr. conta corrente discriminativa, junta como doc.n.º 4.

 

k)            Por acordo de revogação de 30 de março de 2017, a Requerente e o senhor D... fizeram cessar a referida relação laboral – cfr. cópia do acordo de revogação, junta como doc.n.º 5.

 

l)             Por força da cessação da relação laboral, alega a Requerente que o senhor D... auferiu – a título de compensação paga pela ora Requerente – o montante global de EUR 99.562,50.

 

m)          O quantitativo em apreço foi parcialmente refletido pela Requerente, no montante de EUR 2.920,50, na declaração mensal de remunerações do mês de março de 2017.

 

n)           O remanescente (no montante de EUR 96.642,00) foi considerado excluído de tributação, em sede de IRS, pela Requerente, por força da aplicação do regime ínsito no artigo 2.º, n.º 4, alínea b), do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“CIRS”).

 

o)           Com efeito, ao abrigo deste regime, a Requerente apurou os seguintes montantes:

 

Cálculo da indemnização sujeita a tributação em IRS:

Montante da indemnização EUR 99.562,50

Parte devida pelas funções de administrador EUR 0,00

Parte devida pelas funções exercidas ao abrigo do contrato de trabalho EUR 99.562,50

Vencimento mensal EUR 8.850 Antiguidade 10,92(*)

Limite máximo EUR 96.642,00

Parte sujeita a tributação em IRS EUR 2.920,50 (*) 01-05-2006 a 30-03-2017 = 3.986 dias = 10,92 (3.986 dias / 365 dias)

 

p)           Em consequência e por referência aos rendimentos auferidos pelo senhor D... em março de 2017, a Requerente sujeitou a tributação em sede de IRS – mediante retenção na fonte à taxa de 40,5% – o montante global de EUR 11.770,50 (EUR 8.850 + EUR 2,929,50).

 

q)           Não obstante ter exercido o cargo de diretor de I&D, o senhor D... desempenhou igualmente funções como administrador no seio da Requerente.

 

r)            Em concreto, o senhor D... foi nomeado administrador do conselho de administração da ora Requerente em 9 de junho de 2011, tendo renunciado ao cargo, poucos meses depois, a 9 de maio de 2012 – cfr. cópias das atas n.os 14 e 16, juntas como doc.s n. os 6 e 7.

 

s)            A 9 de maio de 2012, o senhor D... foi novamente nomeado administrador da Requerente, tendo exercido funções até ao termo do mandato (triénio 2012 a 2015) – cfr. Doc. n.º 7.

 

t)            A 30 de março de 2016, o senhor D... foi novamente nomeado membro do conselho de administração da ora Requerente, desta feita na qualidade de Presidente, tenho desempenhado tais funções até 29 de março de 2017 – cfr. cópia da ata n.º 25 e extrato retirado do Portal da Justiça, juntas como doc.s n.os 8 e 9.

 

u)           O cargo de administrador desempenhado pelo D... nunca foi remunerado pela Requerente, não tendo aquele auferido qualquer retribuição pelo exercício de tais funções – cfr. Doc.s n.os 6 a 9.

 

v)            A coberto da ordem de serviço n.º OI2019..., dos serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças do Porto, a Requerente foi alvo de procedimento de inspeção tributária interno incidente sobre Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e retenções na fonte de IRS do período de tributação de 2017.

 

w)          Por ofício n.º 2020..., de 10 de novembro de 2020, da Direção de Finanças do Porto (Divisão de Inspeção – V), foi a Requerente notificada do projeto de relatório da inspeção tributária, em sede do qual, a Autoridade Tributária propôs, entre outras, correções em sede de IRS (retenções na fonte) no montante global de € 41.617,00.

 

x)            Tais propostas de correções assentaram no facto de a Autoridade Tributária ter considerado que a compensação, no montante total de € 99.562,50, paga pela Requerente ao senhor D..., estaria associada às funções de administração exercidas por este e, por via disso, sujeita a tributação, em sede de IRS, nos termos do artigo 2.º, n.º 4, alínea a), do CIRS.

 

y)            Por requerimento de 10 de dezembro de 2020, a Requerente exerceu o seu direito de audição prévia, no âmbito do qual informou dissentir da posição sufragada pela Autoridade Tributária no referido projeto.

 

z)            Não obstante, por ofício n.º 2020..., de 29 de dezembro de 2020, da Direção de Finanças do Porto (Divisão de Inspeção – V), a Requerente foi notificada do relatório final da inspeção tributária, de cujo conteúdo resulta a manutenção das correções anteriormente propostas, no montante global de € 41.617,00, concernentes a retenções na fonte de IRS do período de tributação de 2017 – cfr. cópia do relatório final da inspeção tributária, junta como doc. n.º 10.

 

aa)         Em sede do relatório final da inspeção tributária, a Autoridade Tributária sustentou o seguinte:

 

“Mediante a cessação de contrato de trabalho do administrador-presidente D... (...) em finais de março de 2017, a empresa processou uma indemnização no valor total de EUR 99.562,50 que constitui rendimento de trabalho dependente conforme artigo 2.º, n.º 3, alínea e), do CIRS (...). Desta indemnização – e segundo informação prestada pela empresa – foi excluído de tributação o valor de EUR 96.642,00, alegadamente pela aplicação da norma estabelecida pelo artigo 2.º, n.º 4, alínea b), do CIRS (...). Contrariando aquela “leitura”, o artigo 2.º, n.º 4, alínea a), do CIRS impõe a sua tributação pela totalidade porquanto esta indemnização acompanha a cessação das funções do administrador – exercidas desde o ano de 2011 até 29/03/2017 (...). Relativamente à parte da indemnização correspondente aos EUR 96.642,00, a empresa não (...) efetuou a correspondente tributação – mediante a obrigação de retenção na fonte de IRS, conforme estipula o artigo 99.º do CIRS (...). Assim, face à natureza do rendimento e ao seu enquadramento tributário, é devida a sua tributação via retenção na fonte nos termos dos artigos 98.º e 99.º e seguintes do CIRS (...). Apura-se uma correção (...) de EUR 40.007, com referência ao período de março de 2017 (...). Apura-se uma correção à sobretaxa de IRS de EUR 1.610, com referência ao período de março de 2017” – cfr. Doc. n.º 10.

 

bb)         Em consequência, em janeiro de 2021, a Requerente foi notificada da liquidação de retenções na fonte de IRS n.º 2021..., de 13 de janeiro de 2021, referente ao período de tributação de 2017, no montante global a pagar de € 47.705,62 (€ 41.617,00 a título de imposto e € 6.088,62 a título de juros compensatórios) – cfr. Doc. n.º 1.

 

cc)          Por a Requerente não ter voluntariamente pago a quantia antes referida, o Serviço de Finanças da ... procedeu à instauração do processo de execução fiscal n.º ...2021..., destinado à sua cobrança coerciva.

 

dd)         No dia 30 de abril de 2021, a Requerente apresentou a garantia bancária n.º ..., emitida pelo E..., no montante global de € 60.710,60, com o intuito de salvaguardar a suspensão do referido processo de execução fiscal – cfr. cópias da garantia bancária e do ofício n.º 2021..., de 4 de maio de 2021, do Serviço de Finanças da ..., juntas como doc.s n.os 11 e 12.

 

ee)         Atenta a factualidade supra, a Requerente, dissente da posição perfilhada pela Autoridade Tributária no âmbito do relatório final da inspeção tributária, apresenta o presente pedido de pronúncia arbitral, em sede do qual exporá as razões em que alicerça a sua posição e pelas quais considera padecer de ilegalidade o ato tributário sub judice, devendo por isso ser anulado nos termos do artigo 163.º do CPA.

 

3.            Da constituição do Tribunal Arbitral e respetivo saneamento

 

a)            O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado oportunamente e foi aceite pelo CAAD e de imediato notificado à Autoridade Tributária nos termos regulamentares.

 

a.            Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem, designou como árbitro do Tribunal Arbitral Singular o signatário, que comunicou de imediato a aceitação do encargo.

 

b.            As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado, qualquer delas, vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

c.            Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66.B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 10 de agosto de 2021.

 

d.            Donde, o tribunal arbitral tenha sido regularmente constituído e, por consequência, é materialmente competente, face ao preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

 

e.            Por sua vez, as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas, conf. artigos, 4.º, 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e n.º 1.º da Portaria n.º 112.º-A/112-A/2011, de 22 de março.

 

f.             E não enfermando o processo de quaisquer nulidades ou exceções que tenham sido invocadas,

 

CABE APRECIAR

 

4.            Fundamentação da matéria de facto 

 

4.1          Na sequência da petição arbitral apresentada pela Requerente A..., S.A., pessoa coletiva n.º..., e constituído o Tribunal Arbitral, foi notificada a Autoridade Tributária e Aduaneira em 12/08/2021, do Despacho arbitral para apresentar Resposta, ao abrigo do artigo 17.º do Regime Jurídico da Arbitragem em matéria tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, o que fez em 29/9/2021, juntando o respetivo processo administrativo.

 

4.2          Dado que não foram suscitadas quaisquer exceções, embora requerida prova testemunhal, que este Tribunal entendeu ser dispensável, (ainda que apenas num segundo despacho retificativo), por uma questão de simplificação e celeridade e no âmbito do poder do Tribunal na condução do processo, e foi também determinada a dispensa da Reunião a que se refere o art.º 18.º do RJAT, com notificação à Requerente e seu mandatário, concedendo-lhe o prazo de 5 dias para responder, querendo.

4.3 Mais foi decidido pelo Tribunal que fossem notificadas as Partes para prestação de Alegações escritas, no prazo máximo de 30 dias, prazo que produz efeitos primeiramente à Requerente e findo este à Requerida.

4.4 Prazo este que foi cumprido pela Requerente em 11/11/2021 e em cuja resposta reitera todos os factos e fundamentos aduzidos na Petição Inicial, doravante PI.

4.5 A Requerida apresentou a sua Resposta em 18 de novembro de 2011, em que se afirma que a Requerente pretende demonstrar que a compensação paga ao senhor D... se encontra abrangida pelo regime previsto no artigo 2.º, n.º 4, alínea b) do CIRS.

4.6 E a Requerente invoca como justificação o facto de que a compensação foi paga aquando da cessação de contrato de trabalho vigente, ao abrigo do qual o senhor D... desempenhou funções de diretor de Investigação e Desenvolvimento, não estando aquela compensação associada à cessação das funções de administrador.

4.7 Sobre a questão em diferendo, realça este Tribunal os seguintes aspetos fundamentais:

 

a)            O administrador em causa, D..., foi nomeado administrador do conselho de administração da Sociedade A..., SA, pessoa coletiva n.º ..., supra identificada, em 9 de junho de 2011, tendo renunciado ao cargo em 9 de maio de 2012, cf. Atas n.º a4 e 16, que constituem os doc.s 6 e 7 juntos com a PI.

 

b)           Na mesma data de 9 de maio de 2012, o senhor D... foi novamente nomeado administrador da referida sociedade, tendo exercido funções até ao termo do mandato de 3 anos (triénio de 2012 a 2015), doc. 7.

 

c)            A 30 de março de 2016, o senhor D... foi novamente nomeado membro do conselho de administração da sociedade em causa, agora na qualidade de Presidente, sem qualquer remuneração, tendo desempenhado funções até 29 de março de 2017, cf. Ata n.º 25 e doc.s 6 e 9.

 

d)           No entanto, face à cessação do contrato de trabalho do administrador-presidente senhor D..., a empresa A... processou uma indemnização no valor total de € 99.562,50, que pagou ao Senhor D... em março de 2017, segundo Relatório final da inspeção tributária da AT, cf. Doc. 10.

 

4.8 E em Resumo:

 

e)           No dia 12 de outubro de 2005, entre a Sociedade A... e o senhor D... foi celebrado um contrato de promessa de trabalho, tendo este iniciado a sua relação laboral com a categoria de Chefe de Departamento de Engenharia, a 1 de maio de 2006, cabendo-lhe o desempenho de todas as funções próprias dessa categoria, em particular a direção de todas as áreas de investigação, de desenvolvimento de projetos, produtos e processos de engenharia, podendo exercer tarefas fora do âmbito da sua categoria profissional quando solicitado. cf. Doc.s n.ºs 2 e 3.

 

f)            Esta relação laboral durou cerca de 12 anos, mais propriamente de 12/10/2005 a 30/03/2017.

 

g)            Entre janeiro de 2016 e março de 2017, supostamente pelo exercício de funções de Chefe de Departamento de Engenharia, o senhor D... auferiu as seguintes remunerações:

 

a.            De janeiro a dezembro de 2016 o vencimento mensal de € 8.850,00

b.            Subsídio de férias de 2016, no valor também de € 8.850,00

c.            Subsídio de Natal de 2016, igual valor de € 8.850,00

d.            “Bónus” de 2016, no valor de € 110.000,00

e.            De janeiro a março de 2017, o vencimento mensal de € 8.850,00

f.             Subsídio de férias de 2017, a importância de € 8.850,00.

 

h)           As referidas importâncias auferidas totalizam o valor de € 159.300,00  

 

i)             Alegadamente por força da cessação da relação laboral, o senhor D... auferiu, a título de compensação, ou seja, de indemnização, o montante global de € 99.562,50, com alegada base dos seguintes pressupostos:

 

a.            Parte devida pelas funções de administrador: € 00,00

b.            Parte devida pelas funções exercidas ao abrigo do contrato de trabalho € 99.562,50

c.            Vencimento mensal: € 8.850,00

d.            Antiguidade (de 01/05/2006 a 30/03/2017=3.986 dias=10,92 (3.986 dias/365 dias)

 

j)             A Requerente esclarece que por referência aos rendimentos auferidos pelo senhor D... em março de 2017 , sujeitou a tributação em sede de IRS, mediante retenção à taxa de 40,5%, o montante global de € 11.770,50, ou seja, € 8.850,00 + € 2.929,50.

 

4.9 Veja-se o seguinte cronograma relativo às alegadas funções exercidas pelo senhor D...:

 

k)            Ano 2005: Em 12 de outubro foi celebrado contrato de promessa de trabalho entre a A... e o senhor D..., para o desempenho de todas as funções próprias da categoria de Chefe de Departamento de Engenharia, (mais tarde como Diretor) com a retribuição líquida mensal de € 3.600,00, sendo € 3.000,00 como remuneração base e € 600,00 como retribuição especial pela isenção de horário de trabalho, contrato este registado em 27/01/2006 na Inspeção Geral de Trabalho-Delegação do Porto – Trabalho de Estrangeiros.

 

l)             ) Iniciou as suas funções em 01/05/2006, que perduraram durante 12 ano, até finais de março de 2017.

De notar que a retribuição mensal auferida no ano de 2016 foi de € 8.850,00, tendo-lhe sido pago no mesmo ano um bónus de € 110.000,00.

 

m)          Ano de 2011: Em junho de 2011, a A... nomeou o senhor D... para os seus corpos sociais, inicialmente como administrador do C.A. e a partir de 30/03/2016 e até 29/03/2017 (data em que renuncia ao cargo), como Presidente do C.A., alegando não ter auferido quaisquer remunerações pelo exercício destas funções.

 

n)           Ano de 2017: Em março, a A... pagou ao senhor D..., que não auferia remuneração mensal como Administrador, a importância de € 99.562,80, a título compensatório ou de indemnização, sendo este valor identificado pela A..., como sendo devido em razão da cessação do contrato de trabalho como Diretor de Investigação e Desenvolvimento.

 

o)           De salientar que em 29/03/2017 o senhor D...  renuncia ao cargo de Presidente do C.C da A..., pelo exercício do qual não auferia quaisquer remunerações.

 

4.91 Constata-se, assim, que o senhor D... exerceu cumulativamente funções de Diretor de Investigação e de Administrador e de Presidente do C.A. da A..., desde 2011 e até março de 2017.

 

4.92 E foi precisamente em março de 2017 que o senhor D... auferiu, a título de compensação ou de indemnização, a importância de € 99.562,80.

 

Todos os factos referidos, mostram-se devidamente comprovados.

 

5.            DO DIREITO

 

a).  A questão controversa consiste em saber se a indemnização se refere à renúncia do cargo de Presidente do C.A. da A... ou por cessação de funções de Diretor de Investigação da empresa.

 

b.) Importa também trazer aqui e desde já, o que dispõe o artigo 398.º, n.º 2 do Código das Sociedades Comerciais (C.S.C.).

 

“ Artigo 398.º

Exercício de outras actividades

1 - Durante o período para o qual foram designados, os administradores não podem exercer, na sociedade ou em sociedades que com esta estejam em relação de domínio ou de grupo, quaisquer funções temporárias ou permanentes ao abrigo de contrato de trabalho, subordinado ou autónomo, nem podem celebrar quaisquer desses contratos que visem uma prestação de serviços quando cessarem as funções de administrador.

2 - Quando for designado administrador uma pessoa que, na sociedade ou em sociedades referidas no número anterior, exerça qualquer das funções mencionadas no mesmo número, os contratos relativos a tais funções extinguem-se, se tiverem sido celebrados há menos de um ano antes da designação, ou suspendem-se, caso tenham durado mais do que esse ano.

3 - Na falta de autorização da assembleia geral, os administradores não podem exercer por conta própria ou alheia actividade concorrente da sociedade nem exercer funções em sociedade concorrente ou ser designados por conta ou em representação desta.

4 - A autorização a que se refere o número anterior deve definir o regime de acesso a informação sensível por parte do administrador.

5 - Aplica-se o disposto nos n.os 2, 5 e 6 do artigo 254.º

  Contém as alterações do seguinte diplomas:

   - DL n.º 76-A/2006, de 29/03”

                                             

c). De realçar também o disposto no artigo 2.º, n.º 4, alínea a) do Código do IRS, que vai no sentido da tributação, pela totalidade, na parte que corresponda ao exercício de funções de gestor público, administrador ou gerente de pessoa coletiva,  apenas salvaguardando os interesses considerados socialmente mais relevantes e entendidos como protegidos, nas situações previstas na alínea b) do mesmo normativo, com vista a que o trabalhador possa refazer a sua situação de trabalhador por conta de outrem noutra empresa.

 

                “Artigo 2.º

Rendimentos da categoria A

 

1 - Consideram-se rendimentos do trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular provenientes de:

 

a) Trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado;

 

b) Trabalho prestado ao abrigo de contrato de aquisição de serviços ou outro de idêntica natureza, sob a autoridade e a direção da pessoa ou entidade que ocupa a posição de sujeito ativo na relação jurídica dele resultante;

 

c) Exercício de função, serviço ou cargo públicos;

 

d) Situações de pré-reforma, pré-aposentação ou reserva, com ou sem prestação de trabalho, bem como de prestações atribuídas, não importa a que título, antes de verificados os requisitos exigidos nos regimes obrigatórios de segurança social aplicáveis para a passagem à situação de reforma, ou, mesmo que não subsista o contrato de trabalho, se mostrem subordinadas à condição de serem devidas até que tais requisitos se verifiquem, ainda que, em qualquer dos casos anteriormente previstos, sejam devidas por fundos de pensões ou outras entidades, que se substituam à entidade originariamente devedora.

 

2 - As remunerações referidas no número anterior compreendem, designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em multas e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não.

 

3 - Consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente:

 

a) As remunerações dos membros dos órgãos estatutários das pessoas coletivas e entidades equiparadas, com exceção dos que neles participem como revisores oficiais de contas;

(…)

 

4 - Quando, por qualquer forma, cessem os contratos subjacentes às situações referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1, mas sem prejuízo do disposto na alínea d) do mesmo número, quanto às prestações que continuem a ser devidas mesmo que o contrato de trabalho não subsista, ou se verifique a cessação das funções de gestor público, administrador ou gerente de pessoa coletiva, bem como de representante de estabelecimento estável de entidade não residente, as importâncias auferidas, a qualquer título, ficam sempre sujeitas a tributação:

 

a) Pela sua totalidade, na parte que corresponda ao exercício de funções de gestor público, administrador ou gerente de pessoa coletiva, bem como de representante de estabelecimento estável de entidade não residente;

 

b) Na parte que exceda o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fração de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, nos demais casos, salvo quando nos 24 meses seguintes seja criado novo vínculo profissional ou empresarial, independentemente da sua natureza, com a mesma entidade, caso em que as importâncias serão tributadas pela totalidade.

 

Ora,

 

d). Como foi anteriormente referido, em junho de 2011, a A... nomeou o senhor D... para os seus corpos sociais, inicialmente como administrador do C.A. e a partir de 30/03/2016 e até 29/03/2017 (data em que renuncia ao cargo), como Presidente do C.A., alegando não ter auferido quaisquer remunerações pelo exercício destas funções.

 

e). Como é também referido anteriormente, a ora Requerente e o senhor D... (doravante D...), no dia 12 de outubro de 2005, celebraram um contrato promessa de trabalho, tendo este iniciado a sua relação laboral com a ora Requerente a 1 de maio de 2006 – cfr. cópias do contrato de promessa de trabalho e da declaração de inscrição na Segurança Social, juntas como doc.s n.os 2 e 3.

 

f). No âmbito de tal relação laboral, a qual durou cerca de doze (12) anos, (entre 5/2006 e 3/2017), o senhor D... exerceu funções como diretor de Investigação e Desenvolvimento (“I&D”) – cfr. Doc. n.º 3.

 

g). Constata-se, assim, que o senhor D... exerceu cumulativamente funções de Diretor de Investigação e de Administrador e de Presidente do C.A. da A..., desde 2011 e até março de 2017.

 

h). E foi, tal como antes foi referido, precisamente em março de 2017 que o senhor D... auferiu, a título de compensação ou de indemnização, a importância de € 99.562,80.

 

i). Donde, dado que não poderia acumular funções, com a natureza de por conta de outrem, a partir de data em que iniciou funções de Administrador, em junho de 2011 e como Presidente do C.A., desde 30/3/2016 e até 29/03/2017 – mês em que recebeu a indemnização em causa, a indemnização auferida não poderia deixar de reportar-se à sua qualidade de Administrador e Presidente do Conselho de Administração, por estar legalmente impedido de exercer, cumulativamente, durante o período indicado, quaisquer outras funções por conta de outrem na empresa A... .

 

j). Termos em que tal indemnização auferida pelo Senhor D..., teria de ser tributada na totalidade, tal como entende, e bem, a Autoridade Tributária, por estar, necessariamente, associada às funções de administração exercidas por este ao tempo, e, por via disso, sujeita a tributação, pela totalidade, em sede de IRS, nos termos do artigo 2.º, n.º 4, alínea a), do CIRS desde logo, por retenção na fonte, como titular casado, sem dependentes, sobre a indemnização auferida, na importância de € 99.562,80, conforme estipula o artigo 99.º do CIRS,

 

k). em vez de o fazer mediante por retenção à taxa de 40,5% sobre o montante global de € 11.770,50, ou seja, sobre a remuneração de € 8.850,00, acrescida da parte da indemnização calculada pela Requerente como devida, de € 2.920,50 – (€ 99.562,80 (-) € 2.920,50 = € 96.642,00.

 

l). Donde, o IRS devido por retenção na fonte, agora exigível, será sobre a importância de € 40.007,00, acrescido da Sobretaxa de IRS de € 1.610,00, no total de € 41.617,00, a que acrescem os juros compensatórios, conforme se demonstra:

 

      € 108.412,50 (€ 8.850,00+€ 2.920,50+€ 96.642,00) X Tx. Retenç. 41,3% = € 44.774,00

 (-) €   11.770,50 (€ 8.850,00)+€2.920,50) X Taxa de Retenção 40,5%            = €  4.767,00

                                                                                                                 Soma = € 40.007,00

m). A que acresce a Sobretaxa de retenção de 3,5% para 2017, definida

pela Lei n.º 42/2016, de 28/12 (OE/2017), aplicada sobre € 46.014,54, que

resulta da diferença entre a Sobretaxa devida e a aplicada, na importância de…€  1.619,00

no total, conforme explicitado no Relatório de Inspeção, a págs. 9 e 10/25 ….  € 41.617.00,

E a que acrescem, ainda, os respetivos juros compensatórios de 24,3%, de …      6.088,62

No total de quarenta e sete mil, setecentos e cinco e sessenta e dois cêntimos € 47.705,62

 

n). A responsabilidade da retenção em causa impendia sobre a Requerente, por responsabilidade originária, no quadro da substituição tributária a que se refere o artigo 21.º da LGT e 103.º, n.º 4 do CIRS, pelo que a sua exigência pela AT, do imposto devido, acrescido dos respetivos juros compensatórios.

 

o). Pelo que, a exigência do IRS não retido, não se encontra, tal como refere, e bem, a Autoridade Tributária, ferida de qualquer ilegalidade, por não existirem erros sobre os respetivos pressupostos de facto e/ou de direito.

 

Termos em que este Tribunal profere a seguinte:

 

6.            DECISÃO

 

a)            Julgar improcedente o presente Pedido de Pronúncia Arbitral, por ausência de fundamento legal.

 

b)           Absolver a Requerida de todos os pedidos, com as legais consequências.

 

7.            VALOR DA CAUSA

 

                A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 47.705,62 (quarente e sete mil setecentos e cinco euros e sessenta e dois cêntimos), que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação, sob a forma de Retenção na fonte, a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.

 

8.            CUSTAS

 

                Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 24.º, n.º 4, do RJAT, 3.º, n.ºs 2 e 3 e 4.º, n.º 1, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00, que fica a cargo da Requerente.

 

Notifique.

Lisboa, 22 de fevereiro de 2022

                          

O Árbitro do Tribunal Singular,

(José Rodrigo de Castro)