Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 193/2021-T
Data da decisão: 2021-12-13  IVA  
Valor do pedido: € 14.204,43
Tema: IVA - Cálculo do pro rata - Município
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SUMÁRIO:

I - À face da Diretiva IVA, os Estados, as regiões, as autarquias locais e os outros organismos de direito público não são considerados sujeitos passivos relativamente às atividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando, no âmbito dessas atividades ou operações, cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações. Contudo, quando efetuarem essas atividades ou operações, devem ser considerados sujeitos passivos relativamente às mesmas na medida em que a não sujeição ao imposto possa conduzir a distorções de concorrência significativas.

II - De acordo com a jurisprudência do TJUE, para se determinar se uma atividade prosseguida pelo Estado ou por um organismo de direito público é desenvolvida no âmbito dos poderes de autoridade é necessário verificar se tal atividade é exercida no quadro de um regime jurídico próprio dos organismos de direito público ou se, pelo contrário, é exercida nas mesmas condições jurídicas que os operadores económicos privados.

III - Só as atividades ou operações que, compreendidas no quadro legal definidor das competências dos municípios, não possam também ser levadas a cabo por operadores económicos privados, isto é, só possam ser desenvolvidas por ente público, é que estão compreendidas no conceito de poder de autoridade para efeitos da Diretiva do IVA.

 

DECISÃO ARBITRAL

I - RELATÓRIO

 

MUNICÍPIO A..., NIPC..., com sede no ..., ...-...,  ..., apresentou em 2021/04/06, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT), pedido de pronúncia arbitral  tendo como objeto a declaração de ilegalidade parcial da liquidação adicional de IVA nº ..., de 2020/12/28, referente ao período 19/12T , no montante de 14 204,33€.

O Requerente prescindiu de nomear árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou em 25/05/2021o o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo legalmente previsto.

As partes, depois de notificadas não manifestaram qualquer oposição à nomeação.

O Tribunal foi constituído em 16/06/2021 de conformidade com o previsto na alínea c) do nº 1 do artº 11º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) constante do Decreto-Lei nº 20/2011, de 20 de janeiro, com as alterações subsequentes.

A entidade Requerida – Autoridade Tributária e Aduaneira – depois de notificada para o efeito, apresentou Resposta em 2021/09/01 na qual se defende por impugnação.

A Requerida não juntou em simultâneo o processo administrativo.

E, porque não foi requerida a produção de prova adicional, foi dispensada a realização da reunião a que se reporta o art.º 18.º do RJAT, por despacho de 2021/10/10, e as Partes notificadas para, querendo, apresentarem alegações escritas no prazo de 10 dias.

Só o Requerente apresentou alegações nas quais reiterou o entendimento de que a liquidação impugnada sofre de ilegalidades insanáveis que só podem conduzir à sua anulação.

 

II – DO PEDIDO E POSIÇÃO DAS PARTES

 

Alega o Município A... em sua defesa, sumariamente, o seguinte:

Em resultado da ação de inspeção, “…a AT entende que foram detetadas deduções em áreas não tributáveis/isentas, bem como deduções de IVA em faturas que se encontram emitidas sem imposto” ascendendo as deduções indevidas ao montante de 18 675,20€,  o que se traduz “numa diminuição do valor do reembolso solicitado na Declaração periódica de dezembro de 2019”.

Após exercício do direito de audição no procedimento inspetivo, a AT acabou por efetuar correções meramente aritméticas no valor de 18 423,53€.

Sucede que o Município Requerente entende serem ilegais as correções efetuadas, as quais geraram uma liquidação que colide com o direito fundamental da neutralidade do IVA, e que exige uma declaração de pronúncia no sentido da ilegalidade da decisão da AT correspondente à liquidação acima identificada.

O Município de Requerente, na prossecução das suas atribuições realizou um conjunto de operações decorrentes de “uma atividade económica”, nomeadamente: a) operações sujeitas a IVA e dele não isentas: - distribuição de águas para consumo público; Feira ... (i.e. venda de bens conexos com o evento); exploração de piscinas municipais cobertas e descobertas; exploração de parque de estacionamento coberto; exploração de teatro; exploração de Escola Municipal de ...; prestação de serviços veterinários (canil); b) operações sujeitas a IVA e dele isentas (artº 9º)/operações sujeitas porque exercidas no âmbito dos seus poderes de autoridade (nº 2 do artº 2º do CIVA) - saneamento e tratamento de águas residuais; taxas e licenças; habitação social; atividades de serviços de apoio à educação; locação de imóveis.

No ano de 2019, o Município, no que se refere à dedução do IVA suportado, utilizou a os métodos imputação direta, a afetação real e pro rata.

Utilizando o método de imputação direta, numa primeira fase, “…o Município deduz o IVA incorrido integralmente conexo com operações tributadas (v.g., exploração do parque de estacionamento coberto), não deduzindo o IVA incorrido integralmente conexo com operações sujeitas e dele isentas ou operações não sujeitas, porque exercidas no âmbito dos seus poderes de autoridade”

Quanto ao restantes inputs não abrangidos pelo método de imputação direta, ou seja quanto aos bens de utilização mista, socorreu-se do método de afetação real para os inputs afetos à distribuição de água, apenas deduzindo parte do o IVA incorrido mediante a aplicação de um a percentagem de dedução de 90,40% ; e o método pro rata para os demais inputs de utilização mista (i.e. indistintamente utilizados no exercício de uma atividade económica, em operações que conferem direito à dedução e em operações que não conferem esse direito), apenas deduzindo parte do IVA incorrido mediante a aplicação de uma percentagem de dedução de 44%.

Ambas as percentagens foram as que a AT impôs em procedimento anterior relacionado com os exercícios de 2017 e 2018.

Seguindo esta metodologia, o Requerente apurou na citada Declaração de 2018/12T um montante de imposto a seu favor de 77 59,72€, de cujo valor solicitou o reembolso, tendo este pedido dado origem à inspeção externa acima referida.

Constituíram fundamento da decisão de efetuar correções aritméticas, nomeadamente tudo quanto respeita  aos inputs ligados às aquisições de bens ou serviços relacionados com a Feira ... (onde o Requerente obtém uma receita de cerca de 10 000,00€) uma vez que, no entendimento da AT, essa feira é “… realizada fora do âmbito de uma atividade comercial, ou seja, é efetuada no âmbito dos poderes de autoridade que assiste ao Município…”, pelo que os valores de IVA suportados com essa atividade “ …não têm como objetivo qualquer atividade económica desenvolvida pelo Município, mas sim fomentar a promoção da cultura social, com recreações de épocas passadas”.

As correções efetuadas no procedimento de inspeção respeitam também ao IVA referente à atividade de promoção turística do Município que, no seu entender, “potencia (direta e indiretamente) a realização de operações tributadas geradas nos diversos eventos promovidos pelo Município, como a Feira ... (onde decorrem operações tributadas) e o Cineteatro (e.g. venda de bilhetes)”.

Mais considerou a administração tributária que “… a receita tributada que o Município realiza através da venda de canecas na feira ..., resulta de operações efetuadas aos agentes económicos que se encontram no recinto da feira a exercer uma atividade comercial, bem como da venda a consumidores finais”.

Ainda assim, segundo a AT, a dedução desse IVA, porque suportado no âmbito de uma área não económica, mas de poderes de autoridade, não obedece às normas legais, nomeadamente no que se refere ao cálculo do pro rata porque quanto a este apenas podem ser consideradas operações de utilização mista sujeitas a imposto e não isentas e sujeitas a imposto isentas.

Dado o exposto o Requerente considera que a decisão da AT sofre de vícios de forma, por falta de fundamentação e de vício de violação de lei por erros nos pressupostos de direito, já que lhe foi coartado o direito à dedução de IVA em oposição ao que se encontra legalmente previsto.

 

A - No que diz respeito à falta de fundamentação da decisão, alega o Requerente que se o fundamento da AT da correção que se refere à Feira ..., porque justificado com o entendimento de que estamos perante uma atividade enquadrável, embora, indevidamente, no âmbito dos poderes de autoridade inerentes ao Município e, como tal, não constitui uma atividade económica tributada, foi corretamente entendido, já quanto à correção de  2 343,73€ respeitante a promoção turística, a decisão notificada não produz fundamentação bastante “… pois não existe clareza nem é compreensível por um destinatário médio (pelo menos, não o é para o Município), os fundamentos que levaram a AT a não aceitar a respetiva dedução do IVA, o que dificulta gravemente os direitos de defesa por parte do Município”.

Na verdade, o Relatório refere apenas que “não foram detetadas deduções em áreas não tributáveis/isentas… conforme enunciado nas tabelas 1 e 2 do Anexo I”.

Sucede que o Requerente foi notificado da correção aqui impugnada nos termos apresentados na liquidação adicional e “com os fundamentos constantes do relatório de inspeção”.

Todavia se, no que concerne à Feira ..., e apenas após esclarecimentos prestados pelo Município, os SIT alteraram o Projeto de RIT, já quanto à atividade turística, continuou a verificar-se uma inexistente fundamentação (ou pelo menos algo que sirva minimamente esse propósito), reiterando simplesmente ao SIT que “foram detetadas deduções em áreas não tributáveis/isentas […], conforme enunciado nas tabelas 1 e 2 do Anexo I”.

De facto, na Tabela 1 do anexo I, existe uma coluna com o título “motivo da não dedutibilidade” que, na maioria dos casos, nada mais é do que ao descrição indicada na própria fatura”.

É que o motivo invocado pela AT para defender a não dedutibilidade do IVA incorrido na fatura do fornecedor “B...” refere-se à “elaboração de estratégia para o Turismo de ... ”.

 

B – Complementarmente à falta de fundamentação, segundo o Requerente, o ato tributário é contrário à lei porque “parece existir uma manifesta confusão dos SIT, ao nível do enquadramento, em sede de IVA, a conferir às operações realizada pelo Município”, isto é, quanto ao conceito de atividade económica e do direito à dedução.

 “…Como pode um evento [a Feira ...] gerador de milhares de euros de receita tributada ser considerado, para efeitos de IVA, como decorrente do exercício de uma atividade não económica?”, como justifica a AT.

Se o evento gera receita tributada, a não dedutibilidade do imposto incorrido na realização do evento fere de forma clara a neutralidade do imposto.”

O conceito de atividade económica consta do artigo 9º da Diretiva nº 2006/112/CE do Conselho de 28/11/2006 (a chamada Diretiva IVA), que o define como “qualquer atividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência”.

O assunto já foi tratado pela jurisprudência do TJUE que “desvalorizou a exigência de uso direto da aquisição dos bens ou serviços concluindo que somente atendendo ao propósito último da aquisição se logrará atingir a racionalidade e a neutralidade do sistema de IVA. Ao desconsiderar a afetação direta de um input, atendendo à sua conexão final, o TJUE considera, assim, suficiente um nexo indireto, desde que se demonstre que os inputs integram o objetivo último de prossecução de uma atividade que confere o direito à dedução ou na medida em que o confira”.

“Apesar de a Feira ... ser um evento onde não se cobram bilhetes para entrada, são realizadas diversas atividades tributadas que conferem direito à dedução dentro do recinto do evento (i.e. venda de bens- ex. canecas medievais)”;

Há uma estreita ligação entre as entradas e as canecas vendidas, pois quantas mais pessoa entrarem no evento, mais canecas são vendidas – no evento, só se consomem bebidas com as canecas transmitidas pelo Município, sendo claro, ainda, que a venda destes bens só existe porque devida à ocorrência do evento, pelo que se trata de outputs tributados inequivocamente e exclusivamente gerados durante o evento.

Se não fosse com o intuito de realizar uma atividade económica, não existiria interesse para o Município incorrer em custos com a aquisição e canecas e garantir o monopólio da sua venda.

… A receita tributada apenas foi possível devido à realização do evento e a existência de público, pelo que tendo em vista cumprir a neutralidade do imposto, impõe-se a dedutibilidade, pelo menos parcial, do IVA dos respetivos inputs conexos com a persecução da atividade tributada.

No que respeita à “promoção turística”, releva-se que de facto … o Município tem efetuado investimentos neste particular na medida em que induzem, inequivocamente, a um maior número de visitantes ao concelho, o que (de sobremaneira) potencia (direta e indiretamente) a geração de receita tributada – seja neste sector (ex. Cineteatro, Feira ..., etc.), seja em outros sectores (ex. acréscimo de consume de água, parcómetros, etc.).

Consequentemente a atividade turística é indissociável da atividade económica (tributada) levada a cabo pelo Município, numa estratégia de promoção de eventos culturais, claramente potenciadora da geração de recita tributada do município.

…Estamos perante inputs de utilização mista (i.e. indistintamente utilizados, no exercício de uma atividade económica, em operações que conferem direito à dedução e em operações que não conferem esse direito), suscetíveis de aplicação de percentagem pro rata.

No entendimento do Requerente “… está demonstrado o caráter discriminatório do enquadramento realizado pela AT e a sua evidente ilegalidade, motivo pelo qual as correções sub judice enferma de vício insanável”.

No entender da jurisprudência comunitária, no que respeita ao direito à dedução do IVA incorrido com as referidas despesas, “…resulta claro que o exercício do direito à dedução do IVA é um direito essencial que não pode ser limitado senão nos casos expressamente permitidos pelas normas do Direito da União Europeia ou pelos princípios gerais de direito aceites neste domínio”.

“Por conseguinte, o TJUE tem vindo a acompanhar a tendência interpretativa que dá relevância à neutralidade do sistema do IVA, afastando-se de fórmulas restritivas na sua aplicação concreta e, por isso, tem salientado, em diversas ocasiões, que as normas da Diretiva IVA que preveem limitações do direito à dedução – artº 176º e 177º - têm caráter excecional no âmbito do sistema IVA, derrogando o princípio da neutralidade, pelo que devem ser sempre objeto de interpretação restritiva, ou seja,

A atividade tributada realizada pelo Município resulta (direta e/ou indiretamente), conforme demonstrado até à sagacidade, da sua atividade turística bem como de eventos como a Feira ...”.

Complementarmente o Requerente solicita a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios dado que “conforme resulta dos factos supracitados, o pedido de reembolso apresentado pelo Município foi parcialmente indeferido, através da emissão da liquidação, tendo sido privado do montante de 14 204,43€, … porque ao decidir deste modo a AT incorreu simultaneamente em erro nos pressupostos de facto e erro de interpretação da lei – o que constitui erro imputável aos serviços da AT”.

Assim, anulada a liquidação tem o Requerente direito ao pagamento de juros indemnizatórios contados nos termos legais.

 

*

 

Notificada do pedido arbitral formulado pelo Município A..., veio a Requerida responder, resumidamente, o seguinte:

“Entenderam os Serviços de Inspeção que a Feira ... é realizada fora do âmbito de uma atividade comercial, ou seja, é efetuada no âmbito dos poderes de autoridade que assiste ao Município, e tem como objetivo ser um espaço de animação, entretenimento e convívio para os Munícipes de A... e atração de turismo e comércio para a região.

 O Município gera receitas através da venda de canecas na Feira, vendendo aos agentes económicos que se encontram no recinto da feira a exercer uma atividade comercial, bem como da venda a consumidores finais.

Assim as duas faturas de € 37.50 e € 9.996,00 resultam de vendas realizadas aos diversos agentes, não podendo ser consideradas como motivo de dedução do IVA suportado na Feira ... no valor do pro rata.

O exercício do direito à dedução por parte da Requerente deverá ser efetuado mediante articulação dos artigos 20.º e 23.º do CIVA nos seguintes termos: “…a consideração/limitação da dedutibilidade do IVA, contido em despesas e afetas exclusivamente a uma “não operação “, ou na esfera do exercício de uma atividade económica, a sua afetação exclusiva a uma operação que confere o direito a dedução ou, alternativamente, a uma operação que não confere esse direito.

Ora, é evidente que o evento realizado pelo Município, a utilização dos espaços, a contratualização de entidades terceiras, a disponibilização dos meios, afetação de recursos humanos e materiais do Município, são tudo prestações no âmbito de poderes de autoridade; Pelo que, não podemos confundir a atividade pública, onde se aplicam regras de direito publico no exercício de funções e atribuições públicas com atividades económicas em que se aplica o direito privado. Aliás, tal seria uma clara violação às regras da concorrência.

Ora, a venda de canecas, material de merchandise do Município (atenção a entrada é gratuita) não podem conferir o direito à dedução, sob pena de estarmos a violar frontalmente as regras da concorrência por um lado e a sob a capa de uma atividade económica estar-se a travestir o exercício de poderes de autoridade.

Pelo que com a devida e vénia e respeito por opinião contrária, este tipo de eventos, mais não são que exercícios de poderes de autoridade, com utilização de bens, espaços e serviços públicos. Inclusive na promoção dos eventos, com a utilização de espaços de divulgação dos Municípios que são públicos e que atraem o público para a aquisição da caneca ou chifre Viking.

Assim, não podemos tratar por igual, realidades que são distintas, onde numas se aplicam regras e normas de direito público e outras de direito privado.

Sendo que as primeiras não conferem o direito à dedução e as segundas conferem preenchendo os pressupostos. Deste modo, as prestações de serviços respeitam a atividades não económicas, não se enquadram na alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IVA, uma vez que a dedutibilidade só é aplicável a operações de utilização mista sujeitas a imposto e não isentas e sujeitas a imposto isentas.”

 

 

III - Saneamento

 

  1. O Tribunal é materialmente competente e foi regularmente constituído de acordo com os artº 2º, nº 1, alínea a), 5º e 6º, nº 2, alínea a), todos do RJAT.
  2. As partes têm personalidade jurídica, gozam de capacidade judiciária, são legítimas e estão devidamente representadas, nos termos do artº 4º e 10º do RJAT e artº 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março.
  3. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
  4. O processo não enferma de nulidades, pelo que não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

IV – MATÉRIA DE FACTO

 

A - Factos dados como provados

 

O Requerente, Município A..., “é uma pessoa coletiva de direito público cuja atividade consiste na prossecução das suas atribuições municipais nas diversas áreas de atividade, encontrando-se inserida no regime normal de IVA”, e está registado para efeitos de fiscais com a atividade principal Administração Local, a que corresponde o CAE 84113, estando enquadrado no regime normal com periodicidade mensal, como sujeito passivo misto com afetação real de todos os bens.

Na sequência de uma ação inspetiva externa quanto ao período de 12/2019, autorizada pela Ordem de Serviço nº OI2020..., foram levadas a cabo pela AT correções técnicas ao valor do reembolso constante da Declaração do periódica de IVA do período de 2019/12M, no valor de 18 424,53€.

Segundo no Relatório final do procedimento de inspeção, o Requerente “exerce operações tributadas que conferem direito à dedução, nomeadamente águas, operações tributadas que não conferem direito à dedução e operações não decorrentes de uma atividade económica ou fora das regras de incidência de impostos (reabilitação urbanística, estradas e caminhos, jardins, apoio escolar, entre outros)”.[1]

O requerente foi notificado do projeto de Relatório em 27/11/2020, através do Ofício nº 2020... (doc. 6);

O Município durante o decurso do prazo para exercer o direito de audição prévia, remeteu à AT alguns esclarecimentos sobre o projeto de correções, conforme Anexos II e III do Relatório Final, relativamente aos quais a AT teceu as considerações que constam no Relatório Final.

O Requerente foi notificado do Relatório final em 21/12/2020 pelo ofício nº 2020... (doc. 2).

O Município utiliza o método pro rata para dedução do IVA suportado nas despesas com inputs de utilização mista, nos termos do nº 1, b), do artº 23º do CIVA.

O Requerente solicitou o reembolso de 77 759,72€, mas neste valor foram corrigidos os montantes de 17 982,34€ de IVA não relacionado com operações tributáveis com direito à dedução e ainda 441,19€ de ajustamento de IVA dedutível no sector das águas)[2], pelo que o crédito a constar na referida declaração devia ser no valor de 58 321,52€.

O pedido arbitral abrange apenas, no que se refere ao total das correções técnicas, o montante de 14 204,43€, sendo 11 860,64€ de correção do IVA referente à Feira ... e 2 343,79€ relativo a correções técnicas pelo IVA constante em faturas por serviços adquiridos a terceiros no âmbito da promoção turística.

 

B - Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

 

  1. Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente, nomeadamente o Relatório do procedimento de inspeção.
  2. O Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, no que tange à matéria de facto, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
  3. Assim, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (cfr. artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  4. Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, consideraram-se provados, com relevo para a decisão à luz do artigo 110º, nº 7, do CPPT, com base na prova documental junta aos autos, os factos acima elencados.
  5. Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

 

V - MATÉRIA DE DIREITO

 

  1. Da falta de fundamentação da liquidação

 

Impugnando de mérito o ato tributário na sua totalidade, o Requerente invoca, adicionalmente, a verificação do vício de forma por falta de fundamentação de parte da liquidação, alegando que no que respeita à não consideração do direito ao reembolso do IVA no valor de 2 343,79€, incorrido nas faturas por aquisição de serviços no âmbito da atividade  turística do Município, a AT fundamentou o ato com simples afirmações, como seja : “… foram detetadas deduções em áreas não tributáveis/isentas… conforme enunciado nas tabelas 1 e 2 do Anexo I”.

Ora, em seu entender, na referida Tabela do anexo I o único fundamento dela constante é que o motivo da não dedutibilidade é apenas o descritivo que consta nas faturas, não tendo a AT formulado qualquer outro juízo que fundamente tecnicamente a correção em apreço;

Como tal, não existe clareza nem são compreensíveis para um destinatário médio os fundamentos que levaram a AT a não aceitar a respetiva dedução do IVA, prejudicando, assim o direito de defesa.

Vejamos.

Determina o artº 124º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) o seguinte:     1 - Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do ato impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação; 2 - Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte: a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos; b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior.

A determinação constante desta norma quanto à ordem de conhecimento dos vícios tem como pressuposto que conhecendo de um vício que conduza à eliminação jurídica do ato impugnado, o tribunal deixará de conhecer dos restantes, pois, se assim não fosse, se o julgador tivesse de conhecer de todos os vícios imputados ao ato, seria indiferente a ordem de conhecimento.

Assim, tendo em conta o disposto neste artº 124º, são vícios de conhecimento prioritário aqueles que implicam a inexistência ou nulidade do ato tributário e também o vício de forma no procedimento por falta de fundamentação.

Nestes termos, cumpre conhecer de imediato o vício alegado de falta de fundamentação dos ato de liquidação adicional de IVA.  

*

A fundamentação dos atos é uma exigência legal que se impõe para qualquer ato administrativo ou tributário, sendo a liquidação de imposto um tipo de ato tributário em elação ao qual esta exigência se impõe com máximo rigor, atendendo aos efeitos que produz na esfera jurídica do sujeito passivo.[3]

Trata-se, aliás, de uma imposição constitucional por força do disposto no artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), reafirmada no artigo 77.º da Lei Geral Tributária (LGT).

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender que o dever de fundamentação visa permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa ou tributária a agir ou a decidir de modo a convencer o seu destinatário da legalidade que lhe está subjacente, permitindo-lhe entender a sua razão de ser e que possa, conscientemente, aferir sobre a sua a aceitação ou a sua impugnação, reiterando que a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do ato a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela entidade que praticou o ato.

Mais concretamente no que se refere ao ato tributário, todavia, acrescenta o STA que a fundamentação formal do ato administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu, como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. [4]

Ou seja, por força especialmente do preceituado no n.º 2 do referido artigo 77.º da LGT, as exigências de fundamentação são, em certa medida, atenuadas, pois «a fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».

Para o STA esta exigência de fundamentação considera-se cumprida quando dela conste a exposição, ainda que de forma sucinta, mas clara, dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, podendo consistir numa declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, desde que estes integrem a decisão final, devidamente notificada ao destinatário.

Assim, para a fundamentação ser considerada suficiente não é necessário que sejam apreciados todos os argumentos invocados pelos interessados no procedimento, mas sim que sejam percetíveis as razões por que se decidiu no sentido em que se decidiu.

Alega o Município que não lhe foi dado conhecimento e inexiste qualquer fundamentação credível, quer no Relatório de Inspeção quer nas notificações da referidas liquidações, isto porque a AT se limitou justificar a não dedutibilidade do imposto com a indicação do descritivo das faturas, com base na afirmação de que tratando-se de bens ou serviços afetos à realização de operações decorrentes do exercício de uma atividade económica, parte das quais não conferem o direito à dedução, pelo que havia que ter sido aplicada a alínea b) do nº 1 do artº 23º do CIVA, ou seja, a dedução devia ter sido efetuado pelo método de pro rata e não por dedução completa -  o que é manifestamente insuficiente para conhecer das razões pelas quais esse entendimento deveria ter sido seguido pela impugnante.

Em face deste entendimento jurisprudencial, afigura-se-nos que não assiste razão ao Requerente atento o argumentário fundamentador decorrente do projeto de Relatório que lhe foi devidamente notificado, tanto que durante o período em que decorreu a possibilidade de exercer o direito participação no procedimento carreou para junto da AT diversas explicações sobre o seu entendimento das projetadas correções técnicas.

E se é verdade que a AT não referiu expressamente o caso dos custos inerentes à promoção turística, autonomizando-os como fez com a matéria referente à dedução do IVA da Feira ..., o que se constata é que no explicativo do Projeto de Relatório e posteriormente do próprio Relatório final é evidente que a AT incluiu as faturas que diziam respeito à promoção turística no conjunto e as englobou na sua perspetiva de que  as prestações de serviços adquiridas dizem “respeito a uma área não económica”, pelo que não teriam enquadramento no disposto na alínea b) do nº 1 do artº 23º do CIVA.

Repare-se que o Relatório afirma que a análise realizada “… incidiu essencialmente sobre os montantes do IVA referidos e enunciados nos campos 24 e 40 das declarações periódicas de IVA, onde foram detetadas deduções e áreas não tributárias/isentas… ascendendo o total das deduções indevidas ao montante de 18 675,20€…”.

Ora este montante inclui as referidas faturas correspondentes aos custos com animação turística que a AT incluiu na justificação de que respeitam a uma atividade não económica fora do âmbito de uma atividade comercial, ou seja, foi efetuada no âmbito dos poderes de autoridade que assiste ao Município…”.

E é fácil de compreender que se no Relatório final houve análise expressa das despesas atinentes à Feira ... e a outras relacionadas a promoção turística constantes do descritivo das faturas constante do Mapa Anexo, e que o Requerente se prestou a esclarecer que essas despesas eram relacionadas com uma atividade económica desenvolvida pelo Município que conferem direito à dedução do IVA suportado com os respetivos inputs uma vez que contribuem para o desenvolvimento turístico do concelho.

Ademais, o Requerente nas explicações que forneceu à AT pronunciou-se sobre a questão das faturas respeitantes à promoção turística, pelo que se apercebeu das razões para a atitude da AT e tentou contrariá-las com os seus argumentos e, por outro aldo, percebe-se que o Requerente, pela forma como também aborda a questão na sua petição arbitral, compreendeu perfeitamente a fundamentação do ato impugnado.

Do que não há dúvida é a de que a justificação que o Requerente considera insuficiente para entender a posição da AT relativamente à questão das despesas inerentes a promoção turística é praticamente do mesmo teor das que respeitam à Feira ..., ou seja, a AT considerou que todos estes custos não são dedutíveis porque foram realizadas fora do âmbito de um atividade comercial, ou seja, foram efetuadas no âmbito de poderes de autoridade que assiste ao Município e foi esta a fundamentação que o Requerente invocou para solicitar a anulação da liquidação.

Improcede, pois, o pedido de declaração de ilegalidade por falta de fundamentação.

 

  1. Do mérito do pedido

 

Salvo melhor opinião, a vexata quaestio nesta instância arbitral é obter uma definição de duas realidades relevantes para efeitos de IVA, primeiramente é a de saber se o Município é sujeito passivo de IVA e, por outro, qual o enquadramento jurídico das operações por ele praticadas para tal efeito.

É o artº 2º do Código do IVA que nos dá a definição de sujeito passivo ( na parte que aqui nos interessa) -  n.º 1  -  são sujeitos passivos de IVA : “a) As pessoas singulares ou coletivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam atividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as atividades extrativas, agrícolas e as das profissões livres, e, bem assim, as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas atividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos de incidência real do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) ou do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC);…”.

Trata-se, portanto, de uma noção especialmente abrangente que transpõe a disposição do artº 9º da Diretiva IVA, e que determina que sujeito passivo pode ser qualquer pessoa, singular ou coletiva, qualquer que seja o seu estatuto ou forma jurídica, incluindo entidades desprovidas de personalidade jurídica nos termos do direito civil, desde que essas pessoas exerçam de modo independente uma atividade económica, composta por operações tributáveis, qualquer que seja a sua particular natureza, o fim ou o resultado dessa atividade.

A adoção deste conceito abrangente de atividade económica no artigo 9.º da Diretiva IVA, implica que a qualificação como sujeito passivo seja independente da natureza privada ou pública da pessoa ou entidade que exerce essa atividade, como refere Clotilde Palma.[5]

Este facto explica porque é que, em regra, não se verificando a delimitação negativa da incidência, o Estado e as demais entidades públicas são sujeitos passivos de IVA.

De acordo com as regras do IVA na União Europeia, um sujeito passivo será qualquer pessoa que exerça uma atividade económica independentemente do respetivo estatuto privado ou público.

O conceito de atividade económica empregue pelo legislador é, assim, determinante para a qualificação de uma entidade como sujeito passivo do IVA.

“…A qualidade de sujeito passivo adquire-se através da realização das operações que, antes de serem decompostas em transmissões de bens e prestações de serviços, têm que dar corpo a uma qualquer atividade económica.

O exercício de uma atividade económica constitui, portanto, o pressuposto em que assenta toda a incidência subjetiva e objetiva do IVA.

Nenhuma pessoa pode ser sujeito passivo se não levar a cabo uma atividade económica, nem quando esta falte podemos estar em face de transmissões de bens ou prestações de serviços tributáveis”. [6]

“…O conceito de atividade económica empregue pelo legislador é, assim, determinante para a qualificação de uma entidade como sujeito passivo do IVA.

Para qualificarmos uma determinada entidade como tal, é necessário que se verifique o exercício de uma atividade económica, de forma independente e habitual (como regra geral, dado que se prevê, expressamente, a aquisição de tal qualidade pela prática de atos ocasionais), independentemente do fim ou resultado económico dessa atividade económica (irrelevância do fim ou resultado da atividade económica). [7]

Adicionalmente, seguindo de perto o ensinamento de Clotilde Palma, “…o conceito de atividade económica é utilizado no artigo 9.º da Diretiva IVA apenas com o objetivo de identificar os sujeitos passivos do imposto. Serão sujeitos passivos do imposto, em regra, as entidades que, de uma forma habitual e de uma forma independente, realizem atividades económicas.

O facto de a operação ser efetuada no exercício de uma atividade económica poderá ser um indício da respetiva suscetibilidade para ser tributável, mas importa ter em consideração separadamente os requisitos concretos das operações tributáveis.

A realização de uma atividade económica não implica necessariamente a realização de operações tributáveis. (…).

Assim, a qualidade de sujeito passivo deverá ser apreciada exclusivamente com base nos critérios previstos no artigo 9.º da Diretiva IVA que tem um sentido próprio que consiste, exatamente, na indagação dessa qualidade. Ou seja, resulta desta disposição legal que para que o imposto seja devido é necessária a existência, em simultâneo, de um sujeito passivo e de uma operação tributável.

Para a questão que aqui se nos coloca quanto a quem é sujeito passivo, devemos ter em consideração o artº 13º da Diretiva IVA que diz:

“1. Os Estados, as regiões, as autarquias locais e os outros organismos de direito público não são considerados sujeitos passivos relativamente às atividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando, no âmbito dessas atividades ou operações, cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações. Contudo, quando efetuarem essas atividades ou operações, devem ser considerados sujeitos passivos relativamente às mesmas na medida em que a não sujeição ao imposto possa conduzir a distorções de concorrência significativas. Em qualquer caso, os organismos de direito público são considerados sujeitos passivos no que se refere às atividades referidas no Anexo I, na medida em que estas não sejam insignificantes.

2. Os Estados-Membros podem considerar como atividades de autoridades públicas as atividades realizadas pelos organismos de direito público, quando estejam isentas por força do disposto nos artigos 132.º, 135.º, 136.º e 371.º, nos artigos 374.º a 377.º, no artigo 378.º, n.º 2, no artigo 379.º, n.º 2 e nos artigos 380.º a 390.º-C”.

Apelamos aqui, pela sua pertinência, à interpretação que Clotilde Palma faz na obra citada deste preceito para a matéria deste pedido arbitral: “…Esta norma da Diretiva IVA mantém «um princípio geral de sujeição ao IVA das atividades económicas prosseguidas pelas entidades públicas, uma regra de não sujeição e duas exceções a esta regra que reintroduzem a regra geral de sujeição. Neste contexto, o artigo 13.º da Diretiva IVA estabelece um regime diferenciado no que respeita aos casos em que o Estado deve ser considerado sujeito passivo. O primeiro parágrafo do n.º 1 do artigo 13.º da Diretiva exclui da tributação geral as entidades públicas, ainda que exercendo uma atividade económica na aceção do respetivo artigo 9.º. Neste sentido, o exercício da autoridade pública é equiparado à atuação de um consumidor privado. Todavia, nos termos do segundo parágrafo da aludida norma, o Estado e os organismos de direito público são considerados sujeitos passivos, em derrogação do primeiro parágrafo, caso a sua não sujeição a tributação possa conduzir a distorções de concorrência significativas. A ideia subjacente à referida disposição parece consistir na possibilidade de determinados organismos públicos – mesmo que realizem as respetivas operações no âmbito do seu poder de autoridade – entrarem em concorrência com as operações realizadas por operadores privados. Visa, por conseguinte, assegurar a neutralidade fiscal. Por último, nos termos do terceiro parágrafo, as entidades públicas são sempre consideradas sujeitos passivos, designadamente no que se refere a determinadas atividades enumeradas no Anexo I, desde que não sejam exercidas de forma não insignificante, pretendendo-se, igualmente, assegurar a neutralidade fiscal. Os diferentes parágrafos do artigo 13.º da Diretiva IVA são, por conseguinte, estreitamente conexos. Assim, a aplicação do segundo parágrafo desta disposição pressupõe que se esteja abrangido pelo âmbito de aplicação do primeiro parágrafo».

A legislação nacional transpôs esta matéria para o art 2º do CIVA que, para o que aqui se aplica, estabelece:

“2. O Estado e demais pessoas coletivas de direito público não são, no entanto, sujeitos passivos do imposto quando realizem operações no exercício dos seus poderes de autoridade, mesmo que por elas recebam taxas ou quaisquer outras contraprestações, desde que a sua não sujeição não origine distorções de concorrência.

3. O Estados e as demais pessoas coletivas de direito público referidas no número anterior são, em qualquer caso, sujeitos passivos do imposto quando exerçam algumas das seguintes atividades e pelas operações tributáveis delas decorrentes, salvo quando se verifique que as exercem de forma não significativa: (…)

4. Para efeitos dos n.ºs 2 e 3 do presente artigo, o Ministro das Finanças define, caso a caso, as atividades suscetíveis de originar distorções de concorrência ou aquelas que são exercidas de forma não significativa.

Da interpretação conjugada destes dois normativos temos então que a não sujeição aí prevista para ocorrer necessita da verificação de duas condições: que as operações sejam realizadas por um Estado ou por um organismo público e que as operações sejam realizadas no exercício de poderes de autoridade.

Sendo pacífico e concordante o entendimento de que o Município A... é efetivamente uma pessoa coletiva de direito público enquadrável nesta norma, que realiza operações no exercício dos seus poderes de autoridade e outras que não são desenvolvidas nessa qualidade e que podem entrar em concorrência com o setor privado, torna-se necessário resolver a divergência de entendimentos sobre o âmbito do exercício destes poderes de autoridade.

As primeiras que estão obviamente fora da regra de incidência em sede de IVA como prevê a Diretiva, são “não operações”, enquanto as segundas seguem a regra geral de atos sujeitos a tributação.

O entendimento da doutrina é a de que a Diretiva usa a designação de poderes de autoridade em sentido amplo que abrange ambos os tipos de operações, mas não estabelece em concreto a forma de distinguir entre operações sujeitas e operações não sujeitas.

É, por outro lado, a jurisprudência do TJUE que nos permite concluir que para que “opere a norma de não sujeição nele prevista se devem encontrar preenchidas, cumulativamente, duas condições: as atividades em causa serem prosseguidas por um organismo público e o seu exercício ser efetuado na qualidade autoridade pública…;

Resulta de uma jurisprudência já assente do Tribunal de Justiça, sendo igualmente ato claro, que as atividades exercidas na qualidade de autoridades públicas são as desenvolvidas diretamente pelos organismos de direito público no âmbito do regime jurídico que lhes é próprio, com exclusão das que exerçam nas mesmas condições jurídicas que os operadores económicos privados [Acórdãos de 17 de Outubro de 1989, Caso Comune di Carpaneto Piacentino I, Procs. apensos 231/87 e 129/88, (…), n.º 16, de 15 de Maio de 1990, Caso Comune di Carpaneto II, Proc. C-4/89, (…), n.º 8, e de 6 de Fevereiro de 1997, Caso Marktgemeinde Welden, Proc. C-247/95, (…), n.º 17.];

O TJUE tem vindo, pois, a traçar as seguintes diretrizes: por um lado, para se determinar se uma atividade prosseguida pelo Estado ou por um organismo de direito público é desenvolvida no âmbito dos poderes de autoridade é necessário verificar se tal atividade é exercida no quadro de um regime jurídico próprio dos organismos de direito público ou se, pelo contrário, é exercida nas mesmas condições jurídicas que os operadores económicos privados; e, por outro lado, incumbe aos órgãos jurisdicionais nacionais a verificação das condições do exercício dessa atividade.[8]

A jurisprudência nacional  (STA) já proferiu, entre outros, os seguintes arestos sobre esta matéria: - Acórdão de 20.09.2000, processo n.º 021091: «Para efeitos do art. 2.º, n.º 2, do CIVA e do art. 4.º, n.º 5, da 6.ª Diretiva IVA, entende-se por serviço praticado no exercício dos poderes de autoridade ou na qualidade de autoridade pública aquele serviço que releva da missão específica da autoridade pública, no quadro de um regime de direito público e com exclusão das atividades exercidas nas mesmas condições jurídicas dos operadores económicos privados»; - Acórdão de 10.12.2003, processo n.º 022676: «Para efeitos do disposto no art. 2.º, n.º 2, do CIVA, entende-se por exercício de poderes de autoridade a atividade de um organismo público no exercício de funções efetuadas na qualidade de autoridade pública;  - Acórdão de 07.11.2012, processo n.º 025/12: «Para efeitos da delimitação negativa da incidência do IVA, prevista no artigo 13.º da Directiva e no n.º 2 do artigo 2.º do CIVA, é imperioso conhecer se a pessoa colectiva pública actuou na qualidade de autoridade pública, submetida a um regime substantivo de direito público, ou se praticou um acto de direito privado, desprovida da sua posição de supremacia».

“Com efeito, antes de mais, para que uma operação praticada pelo Estado e demais pessoas coletivas de direito público se encontre sujeita a IVA, é necessário, por um lado, que seja efetuada no exercício da respetiva atividade económica nos termos da Diretiva IVA (existindo, consequentemente, uma operação sujeita a IVA em conformidade com as respetivas regras de incidência objetiva), e, por outro lado, que não se verifique no caso concreto a delimitação negativa de incidência. Isto é, existem uma série de operações relativamente às quais, (…), por não se enquadrarem no conceito de atividade económica, será inútil analisar o enquadramento da atuação da entidade face ao disposto no artigo 13.º da Diretiva IVA. Em tais circunstâncias não estamos sequer perante uma operação sujeita a IVA, por não se enquadrar, ab initio, nas regras de incidência objetiva do imposto.

Com efeito, apurar se existe ou não o exercício de uma atividade económica por parte do organismo público é uma questão prévia essencial à análise da delimitação negativa da incidência[9].

Esta qualidade de autoridade pública dá-se ou verifica-se quando o organismo público atua no âmbito de um regime de direito público e utiliza prerrogativas de autoridade pública - Acórdão de 07.11.2012, processo n.º 025/12: «Para efeitos da delimitação negativa da incidência do IVA, prevista no artigo 13.º da Diretiva e no n.º 2 do artigo 2.º do CIVA, é imperioso conhecer se a pessoa coletiva pública atuou na qualidade de autoridade pública, submetida a um regime substantivo de direito público, ou se praticou um ato de direito privado, desprovida da sua posição de supremacia».

Ou seja, para que uma operação praticada pelo Município, enquanto pessoa coletiva de direito público, se encontre sujeita a IVA, é necessário que ela seja realizada no exercício da respetiva atividade económica desse município, como prevê a Diretiva IVA e, por outro lado, que não se verifique no caso concreto a delimitação negativa de incidência, isto é, se trate de  operações que na disposição da Diretiva não se enquadram no conceito de atividade económica.

Resulta, assim, do que vimos expondo, que o Requerente enquanto pessoa coletiva de direito público é sujeito passivo de IVA, dividindo-se a respetiva atividade em três categorias de operações que pratica quanto ao respetivo enquadramento: não tributadas, tributadas e isentas.

A questão em dissídio, portanto, é a que se destina a esclarecer se a realização de um evento cultural denominado Feira ... pelo Município deverá ser considerada como sendo uma operação decorrente do exercício dos poderes de autoridade pública conferidos por lei ao Município para efeitos de IVA.

Nesta conformidade, somos forçados a regressar ao entendimento do TJUE atrás referido de que, para determinar a sujeição ou não a imposto de operações do sector público, primeiro analisa-se se trata de operações efetuadas no exercício de uma atividade económica e só depois é que se aprecia a situação da delimitação negativa de incidência, ou seja, se as atividades económicas são desenvolvidas no exercício de poderes de autoridade.

Parece-nos pacífico que esse evento podia ter lugar por realização levada a cabo, por exemplo, por um associação cultural de natureza privada e os fins visados seriam exatamente os mesmos e, nestes termos, não pode deixar de se considerar como uma atividade económica.

A natureza do evento permite concluir que o mesmo, em si, não resulta necessariamente do exercício de um poder público, entendido no sentido de que só o Município pode levar a cabo a realização de uma Feira ....

Portanto, é difícil admitir que esta atividade económica possa ser considerada como sendo apenas decorrente do exercício das prerrogativas de uma autoridade ou ente público.

Na verdade, a cultura e as realizações culturais não surgem de uma característica ou possibilidade de desenvolvimento exclusivo dos poderes públicos. Aos agentes económicos privados desenvolvem inúmeras atividade de natureza cultural, como se constata na realidade.

Nem se pode dizer que esta operação não tem natureza económica e que está fora do âmbito de uma atividade comercial (atividade económica) dado que se ela for realizada por uma entidade privada ela terá necessariamente a natureza de atividade económica sujeita a tributação em sede de IVA nos termos gerais.

Na verdade, o relatório da AT não exclui do conceito de atividade económica em sentido geral a realização da Feira ... mas apenas considera que, mesmo que seja um atividade económica sujeita a IVA, estamos perante “uma operação realizada fora do âmbito de uma atividade comercial, ou seja, é efetuada no âmbito dos poderes de autoridade que assiste ao Município e tem como fito, ser um espaço de animação e convívio, dinamizando a atração turística e o comércio, dando a conhecer à sociedade/população os costumes e feitos remotos co  história marcante de época singular”, pelo que os custos com a sua realização não têm como objetivo qualquer atividade económica a desenvolver pelo município, mas sim fomentar a promoção da cultura social, com recreações de épocas passadas.

É certo que a argumentação da AT quando reclama que a realização é o desenvolvimento de uma atividade de natureza cultural é verdadeira, mas só por si não é suficiente para a classificar como tendo natureza exclusivamente pública e, como tal, dever ser uma “não atividade” para efeitos de tributação.

Sendo certo que poderemos, sem qualquer dificuldade, considerar a Feira ... incluída nas atividades que o artº 23º da Lei nº 75/2013, de 12 de setembro, “nº 2 - Os municípios dispõem de atribuições, designadamente, nos seguintes domínios: a)…; e) património, cultura e ciência…,” a verdade é que esta atividade não é exclusiva dos municípios e pode ser desenvolvida por outras entidades públicas ou privadas, como atrás ficou dito.

Aliás, este entendimento decorre do que foi decidido, por exemplo, no Ac.do STA nº 21091, de 20/09/2000, “Para efeitos do artº 2º, nº 2, do CIVA e do artº 4º, nº 5º, da DIVA, “…entende-se por serviço praticado no exercício dos poderes de autoridade ou na qualidade de autoridade pública aquele serviço que releva de missão específica da autoridade pública, no quadro de um regime jurídico e com exclusão de atividades exercidas nas mesmas condições jurídicas dos operadores económicos privados”.

Ou seja, o STA considera que só as atividades ou operações que, compreendidas no quadro legal definidor das competências dos municípios, não possam também ser levadas a cabo por operadores económicos privados; só aquelas que apenas possam ser desenvolvidas por ente público é que estão compreendidas no conceito de poder de autoridade para efeitos da Diretiva do IVA.

A nosso ver, portanto, está afastada de todo a caraterização da realização de um evento do tipo daqueles que estamos aqui a tratar como sendo uma atividade que só pode ser desenvolvida pelo município.

Ficando assim afastada a regra de não incidência prevista na Diretiva IVA (uma “não atividade económica”) e não tendo sido posta em causa a realização da atividade económica de aquisição de bens ou serviços inerente à Feira ... e aos serviços de promoção turística, estão verificados os restantes requisitos de operação tributada passível de em relação a elas se poder deduzir o IVA incorrido nos custos inerentes à sua realização.

*

E o mesmo se diga relativamente aos custos com a aquisição de serviços relacionados com a promoção turística do Município, acrescido o facto de, como vimos, a promoção da Feira ... dever ser considerada como uma atividade económica cuja realização não decorre necessariamente do exercício dos poderes de autoridade inerentes às funções legalmente atribuídas aos municípios e, como tal, esta prestação de serviços ter como finalidade a possibilidade de prestação de serviços destinada a uma operação tributada.

Além de se considerar pacificamente hoje em dia a promoção turística como um meio aceite como devendo constar entre as melhores práticas na gestão das atividades de um município, como bem salienta o Requerente, a promoção turística visa inequivocamente trazer ao concelho pessoas que nessas deslocações irão beneficiar das atividades económicas tributadas, diretamente desenvolvidas pela autarquia ( v.g. a Feira ..., o Cineteatro, as Piscinas Municipais, receita de estacionamento, etc.), mas também das desenvolvidas por todos os outros agentes económicos privados, o que potencia (direta e indiretamente) a receita tributada.

Acresce ainda a constatação de que o TJUE tem inclusivamente vindo a defender que basta uma relação indireta entre o bem ou serviço no qual o IVA foi incorrido e as operações produzidas a jusante (a atividade económica do sujeito passivo) para que este seja dedutível.

A regra geral é, pois, a de que o IVA incorrido nas aquisições feitas por um sujeito passivo é dedutível sempre que os bens ou serviços adquiridos sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas, como é o caso das que atrás citámos e que a própria AT admite como sendo, apesar de tudo, atividades económicas.

Nesta conformidade, atento o disposto no artº 23º, nº 4 do CIVA, incorreu a liquidação corretiva de IVA em vício de violação de lei, na parte em que exclui do cálculo do montante a deduzir o valor do IVA incorrido com os custos da Feira ... e com a aquisição de serviços destinados a criar um plano de promoção turística do concelho, pelo que o pedido arbitral não pode deixar de proceder.

 

  1. Do pedido de reembolso e de juros indemnizatórios

 

Complementarmente, a Requerente cumula o pedido de decisão anulatória parcial da liquidação de imposto com o pedido de condenação da AT no reembolso das importâncias que não foram devolvidas, acrescidas dos juros indemnizatórios devidos até à data da respetiva restituição.

Dispõe a alínea b) do art. 24.º do RJAT, que a decisão sobre o mérito da pretensão arbitral de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito».

É isto que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT, subsidiariamente aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT, quando prevê que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Mesmo que o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, é pacífico na doutrina e jurisprudência que deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários.

Aliás, é essa a interpretação que coincide com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, quando diz que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

Portanto, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral, bem como o reembolso da quantia paga, que é a base de cálculo dos juros.

Ora, sobre esta matéria a jurisprudência tem sido pacífica, tendo em conta o artº 43.º da LGT, que prevê que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

Considera-se que o erro é imputável à administração quando o mesmo não for imputável ao contribuinte e assentar em errados pressupostos de facto ou de direito que não sejam da responsabilidade do contribuinte.

Como é bom de ver, resultou dos atos tributários impugnados a restituição de um valor de imposto inferior ao que seria devido sem o cometimento das ilegalidades apontadas.

Nesta conformidade, enfermando a liquidação impugnada de vício de violação de lei substantiva, que se consubstancia em erro nos pressupostos de direito imputável à Autoridade Tributária, e não tendo o imposto sido devolvido, tem a Requerente direito à restituição dessas quantias e a juros indemnizatórios desde a data em que se considera indeferido o pedido de reembolso até ao integral do referido montante, por se encontrarem verificados os requisitos do artº 43º da LGT, liquidados sobre o  respetivo valor.

*

Em face das decisões quanto ao imposto e quanto aos juros indemnizatórios fica prejudica a análise de outras matérias alegadas, por desnecessidade.

*

VI - DECISÃO

 

Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral decide:

  1. Julgar procedente o pedido de anulação parcial do ato de liquidação do IVA nº..., período 19/12M, no valor de 14 204,43€;
  2. Julgar procedente o pedido de reembolso das quantias indevidamente não reembolsadas;
  3. Julgar ainda procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a contar nos termos legais sobre o valor do imposto a restituir até à data da emissão do reembolso;
  4. Condenar a Requerida no pagamento da taxa arbitral devida no processo.

 

VII - VALOR DO PROCESSO

 

De harmonia com o disposto nos artigos 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em €14 204,43, montante correspondente ao valor da liquidação parcial impugnada.

 

VIII - CUSTAS

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, sendo o respetivo pagamento da responsabilidade da Requerida.

Notifique.

 

Lisboa, 13/12/2021

O Árbitro Singular

 

José Ramos Alexandre

 



[1] Caraterização do Relatório de Inspeção, pág. 6/25

[2] Relatório pág. 13/25

[3] Vide sobre a fundamentação dos atos tributários, entre outros “Lei Geral Tributária-Anotada e Comentada” de Diogo Leite Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa-anotações ao artº 77º.

 

[4] Pode consultar-se este entendimento, por exemplo, entre muitos outros, nos seguintes acórdãos do STA: de 4- 11-1998, processo n.º 40618; de 10-3-1999, processo n.º 32796; de 6-6-1999, processo n.º 42142; de 9-2- 2000, processo n.º 44018; de 28-3-2000, processo n.º 29197; de 16-3-2001, do Pleno, processo n.º 40618; de 14-11-2001, processo n.º 39559; de 18-12-2002, processo n.º 48366

[5] “As Entidades Públicas e o Imposto sobre o Valor Acrescentado: Uma Ruptura no Princípio da Neutralidade”, Coimbra, Almedina, 2015.

[6] Sérgio Vasques “O Imposto sobre o Valor Acrescentado”, Coimbra, Almedina, 2015, pág. 129

[7] Clotilde Palma “As Entidades Públicas e o Imposto sobre o Valor Acrescentado: Uma Ruptura no Princípio da Neutralidade, Coimbra, Almedina, 2015

[8] Ver quanto a esta matéria, com grande desenvolvimento, o Acórdão nº 531/2019-T do CAAD

[9] Clotilde Palma, obra citada