Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 147/2021-T
Data da decisão: 2021-11-24  IRC  
Valor do pedido: € 272.331,33
Tema: IRC - Perdas por imparidade. Sociedades gestoras de participações sociais. Atividade normal.
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Sumário:

Constitui atividade normal de uma sociedade gestora de participações sociais, para efeito do reconhecimento de perdas por imparidade, nos termos do artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, na redação vigente antes da reforma de IRC de 2014, a concessão de créditos às suas sociedades participadas.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Acordam em tribunal arbitral

 

I – Relatório

 

1. A..., S.A., titular do número único de matrícula e de pessoa coletiva..., com sede na ..., n.º ..., ...-... Lisboa, vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade do ato de liquidação adicional de IRC n.º 2020... e respetiva demonstração de acerto de contas, que inclui juros compensatórios no valor de € 17.580,71, referente ao exercício de 2016, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto eventualmente a ser pago, acrescido de juros indemnizatórios.

 

Fundamenta o pedido nos seguintes termos.

A Requerente é a sociedade dominante de um grupo de sociedades, tributado segundo o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (RETGS), que passou a incluir, a partir de 1 de janeiro de 2014, a sociedade B..., S.A. (B...).

A B... detinha participações sociais na C..., SGPS, S.A. (C...). Esta sociedade foi declarada insolvente por sentença de 14 de fevereiro de 2012, tendo sido votada, em assembleia de credores, realizada em 6 de novembro de 2012, a liquidação da sociedade, e proferida a sentença de verificação e graduação de créditos em 30 de setembro de 2016.

Como consequência da declaração de insolvência da C... SGPS, sua participada, a B... contabilizou economicamente, em 2012, perdas por imparidade não admitidas fiscalmente associadas ao financiamento daquela sociedade e à participação social nela detida, no montante global de € 29.271.051,23, e, relativamente ao período de tributação de 2016, ao abrigo do disposto no artigo 41.º, n.º 1, alínea b) do Código do IRC, reconheceu perdas  no tocante à participação financeira detida no capital da C... SGPS e aos créditos existentes sobre aquela sociedade.

Enquanto sociedade dominante do grupo, a Requerente submeteu a correspondente declaração Modelo 22 de IRC para o ano de 2016, em que apurou, no âmbito do grupo de sociedades, um prejuízo fiscal de € 14.102.851,03,

A B... foi submetida a uma inspeção externa em sede de IRC, com referência ao exercício de 2016, que determinou correções na sua esfera individual de € 3.387.827,10, referente à valorização de participação social, e de € 17.505.378,52, pela não aceitação da dedução da perda dos créditos concedidos à C... SGPS, correspondentes a suprimentos (€ 16.717.176,28), a juros desses suprimentos (€ 776.109,32), e  a outras dívidas a receber relacionadas com uma sociedade participada pela C... SGPS (€ 12.092,92).

No pedido arbitral está apenas em causa o montante de € 17.505.378,52, relativo à não dedutibilidade dos créditos concedidos à C... SGPS, e que a Autoridade Tributária justificou, no procedimento inspetivo, considerando que o gasto contabilizado pela B... era já admitido como perda por imparidade em 2012, aquando da declaração de insolvência da C... SGPS, ao abrigo do disposto no artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, pelo que não estaria, assim, verificado o pressuposto do n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRC, para a sua dedutibilidade no exercício de 2016.

Ora, resulta a contrario do artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC que não são dedutíveis as perdas por imparidade que não resultem da atividade normal das empresas, ou que não se considerem créditos de cobrança duvidosa ao abrigo do citado artigo 36.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, ou ainda que, considerando-se créditos de cobrança duvidosa, os mesmos não tenham sido como tal evidenciados na contabilidade, sendo esses requisitos de verificação cumulativa.

Na situação do caso, resulta inequívoco que os créditos detidos pela B... sobre a C... SGPS podiam ser considerados de cobrança duvidosa, nos termos do disposto no artigo 36.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, quando foi declarada a insolvência em 14 de setembro de 2012, mas não se verificavam os restantes pressupostos previstos no artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do mesmo diploma, visto que as perdas por imparidade derivadas de empréstimos a participadas ou juros daqueles decorrentes, não são propriamente gastos da atividade normal das empresas, que se entende como sendo “aqueles que derivem de transações correntes a clientes e fornecedores”.

Com efeito, as operações de financiamento a entidades subsidiárias, caem fora da atividade normal das sociedades comerciais, e, assim, a Requerente e a B... registaram os prejuízos em 2016 por ter sido nesse ano que os créditos detidos sobre a C... SGPS se tornaram definitivamente incobráveis, nos termos do artigo 41.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC, por efeito do trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos, proferida em 20 de setembro de 2016, e após a prolação do despacho judicial de encerramento do processo de insolvência, por insuficiência da massa insolvente, em 28 de outubro seguinte.

É assim ilegal, por violação da referida disposição, a correção tributária no montante de € 17.505.378,52 com base na recusa de dedutibilidade dos gastos com créditos incobráveis que apenas poderiam ter sido deduzidos em 2016.

Acresce que face ao artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, as perdas por imparidade já constituídas só são suscetíveis de serem deduzidas fiscalmente se respeitarem a créditos cujo risco de incobrabilidade esteja evidenciado na contabilidade, o que, no caso, se não verificou. De facto, as contas 259 e 269, nas quais foram creditadas, em 2012, as perdas por imparidade relativas aos suprimentos concedidos à C... SGPS e respetivos juros, não são contas que evidenciem a existência de créditos de cobrança duvidosa, porquanto a primeira é uma subconta disponível da conta 25 que é destinada à contabilização de financiamentos, e a segunda é uma subconta da conta 26 – Acionistas/Sócios.

Para além da invocada violação do artigo 41.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC, a recusa da dedutibilidade das perdas por imparidade com créditos incobráveis contabilizadas pela Requerente contende com o princípio da proporcionalidade, previsto nos artigos 266.º, n.º 2, da Constituição e 55.º da LGT. Sendo que as normas conjugadas da alínea a) do n.º 1 do artigo 35.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRC, na interpretação segundo a qual permitem a não dedutibilidade fiscal de gastos/perdas efetivamente incorridos no exercício de encerramento de insolvência é materialmente inconstitucional por violação do disposto no artigo 104.º, n.º 2, da Constituição e do princípio da tributação pelo lucro real, que nele se encontra consagrado.

A Autoridade Tributária, na sua resposta, refere que, de acordo com o princípio da especialização de exercícios e face ao regime do acréscimo ou periodização económica, previsto no n.º 1 do artigo 18.º do CIRC, quando existam evidências objetivas de perda resultantes do risco de cobrabilidade decorrente da situação de insolvência do devedor, a perda por imparidade deverá ser reconhecida contabilisticamente nesse período de tributação. O que está em consonância com o previsto nos parágrafos 24 a 27 da NCRF 27 quanto ao  reconhecimento contabilístico de imparidades em ativos financeiros, dispondo o parágrafo 24, que "se existir uma evidência objetiva de imparidade, a entidade deve reconhecer uma perda por imparidade na demonstração de resultados", e enumerando o parágrafo 25 as situações que evidenciam objetivamente que um ativo financeiro está em imparidade, entre as quais, a significativa dificuldade financeira do devedor e a probabilidade de o devedor entrar em falência ou qualquer outra forma de reorganização financeira".

No caso, a B... deu cumprimento ao previsto na normalização contabilística visto que, na sequência da sentença de insolvência da C... SGPS, reconheceu imparidades relacionadas com créditos que detinha sobre a sua participada no montante total de € 21.334.084,52. E só mais tarde, já quando integrava o grupo de sociedades, é que a Requerente, enquanto sociedade dominante, procedeu à entrega de uma declaração modelo 22 de substituição e desconsiderou as perdas por imparidade nos resultados fiscais. 

Por outro lado, as perdas por imparidade relacionadas com créditos concedidos à sua participada integram-se no âmbito da sua atividade normal, na medida em que as sociedades gestoras de participações sociais têm como único objeto social a gestão de participações noutras sociedades e não deixa de ser essa a sua única e atividade principal, embora a participação na sociedade seja considerada uma forma indirecta de atividade económica. 

Note-se que as SGPS não podem conceder crédito a outras sociedades, excepto por meio de contratos de suprimento celebrados com as sociedades em que possuam participações sociais (artigo 5.º, n.º 1, alínea f), do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro), havendo de concluir-se que os empréstimos concedidos pela B...,  na qualidade de sociedade gestora de participações sociais, à sua participada C... SGPS se enquadram no exercício da sua única e principal atividade, que é a gestão de participações sociais, encontrando-se reunidos os requisitos que cumulativamente são exigidos pelos artigos 35.º, n.º 1, alínea a), e  36.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, para serem considerados créditos de cobrança duvidosa à data de declaração de insolvência da C... em 2012. 

Por outro lado, A Requerente reconhece que as perdas por imparidade relativas aos créditos de cobrança duvidosa que a B... detinha sobre a C... foram contabilizadas nas contas 259, 269 e 279, cumprindo-se o requisito da parte final do artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, pelo qual os créditos que constituam perdas por imparidade devem encontrar-se evidenciados como tal na contabilidade.  

A Autoridade Tributária considera, por outro lado, não verificada a alegada violação do princípio da proporcionalidade e do princípio da tributação pelo lucro real.

2. No seguimento do processo, houve lugar à reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, também destinada à inquirição de testemunhas arroladas pelas partes, tendo-se determinado, na sequência, a remessa do processo para apresentação de alegações escritas por prazo de dez sucessivo.

 

Em alegações, as partes procuraram fixar os factos que devem ser tidos como provados e mantiveram, no mais, as suas anteriores posições.

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 25 de Maio de 2021.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O processo não enferma de nulidades nem foram suscitadas exceções.

 

II - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

4. Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes.

 

A)           A Requerente é uma sociedade que se dedica à exploração e administração de bens móveis ou imóveis, à realização e prestação de serviços de auditoria e de estudos económicos de viabilidade e é a sociedade dominante de um grupo de sociedades, tributado segundo o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (RETGS), o qual passou a incluir, a partir de 1 de janeiro de 2014, a sociedade B..., S.A. (B...).

B)           Enquanto sociedade dominante do grupo, a Requerente submeteu a correspondente declaração Modelo 22 de IRC para o ano de 2016, tendo o grupo apurado um prejuízo fiscal de € 14.102.851,03.

C)           A B... foi constituída em 2001, tendo como objeto social a “prossecução de atividade turística e prestação de serviços conexos, designadamente restauração, hotelaria e animação cultural e desportiva em estabelecimentos próprios ou de terceiros”.

D)           Entre janeiro de 2008 e janeiro de 2015, a B... encontrou-se registada como Sociedade Gestora de Participações Sociais (SGPS), desenvolvendo, durante esse período, a atividade de “gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta do exercício de atividades económicas”.

E)            Em novembro de 2003, a B... tornou-se acionista fundadora da C..., SGPS, S.A. (C... SGPS), com uma participação social de € 99.996,00, representativa de 99,996% do respetivo capital social.

F)            Esta sociedade foi criada para desenvolver o Projeto  ..., que, pela sua dimensão e impacto, foi classificado como Projeto de Interesse Estratégico Nacional pelo despacho n.º 12113/2011, publicado no Diário da República n.º 178, série II, de 15 de Setembro de 2011.

G)           Neste contexto, nos exercícios compreendidos entre 2004 e 2012, a B..., na qualidade de detentora da quase totalidade do seu capital social, financiou a C... SGPS por meio de suprimentos.

H)           A C... SGPS foi declarada insolvente por sentença de 14 de setembro de 2012 proferida pelo Tribunal Judicial de Reguengos de Monsaraz, tendo havido lugar, na sequência, à liquidação da sociedade, para satisfação dos créditos reclamados pelo produto da venda dos bens e direitos da sociedade insolvente, votada em assembleia de credores realizada em 6 de novembro de 2012, e à prolação da sentença de verificação e graduação de créditos, em 30 de setembro de 2016.

I)             A sentença de verificação e graduação de créditos transitou em julgado em 15 de outubro de 2016.

J)            Em consequência da declaração de insolvência da C... SGPS, sua participada, a  B... contabilizou economicamente, em 2012, perdas por imparidade no montante global de € 29.271.907,62, que corresponde aos financiamentos efectuados àquela sociedade (€ 21.334.084,52) e à participação social nela detida (€ 7.937.823,10).

K)           Em 2016, após o encerramento do processo de insolvência, e com base nas perdas por imparidade contabilizadas em 2012, deduziu o gasto fiscal correspondente no montante global de € 29.269.201,62 (Campo 769 do Quadro 07 da M22).

L)            A sociedade B... foi objeto de uma inspeção externa de âmbito parcial em sede IRC e IVA relativa ao exercício de 2016, credenciada pela ordem de serviço OI 2018 ..., tendo como objetivo a análise dos valores declarados.

M)          A B... foi notificada do projeto de Relatório de Inspeção Tributária, para o exercício do direito de audição, que propunha correções à matéria coletável no montante de € 29.269.201,62.

N)           No relatório final do procedimento inspetivo, após o exercício do direito de audição, foram mantidas correções de € 3.387.827,10, referente à valorização de participação social, e de € 17.505.378,52, pela não aceitação da dedução da perda dos créditos concedidos à C..., correspondentes a suprimentos (€ 16.717.176, 28), a juros desses suprimentos (€ 776.109,32) e a outras dívidas a receber relacionadas com uma sociedade participada pela C... SGPS (€ 12.092,92).

O)           O Relatório de Inspeção Tributária justifica as correções nos seguintes termos:

 

III - 4. Dedutibilidade das perdas contabilizadas em “Restantes Investimentos financeiros”

Como já se referiu no final do capítulo III – 2 acima, no período de 2016, a B... contabilizou, na conta 6862 – Gastos nos restantes investimentos financeiros – Alienações, os € 29.269.201,62, correspondentes ao valor que deixou de receber por efeito do efeito do encerramento da insolvência da C... SGPS.

Ora, quando, em 2012, foi declarada a insolvência da C... SGPS, a B..., para além de deter uma participação maioritária e superior a 10% do seu capital social, era, também ela uma SGPS – Sociedade Gestora de Participações Sociais.

As SGPS têm por objeto social a gestão de participações sociais de outras empresas como forma indireta de exercício de atividades económicas, sendo constituídas com o objetivo de intervir na gestão e controlar as participadas, para através do exercício dos direitos sociais inerentes às respetivas participações sociais, receberem os respetivos lucros ou dividendos, bem como os rendimentos resultantes de eventuais alienações dessas participações socias.

Ou seja, as decisões que as SGPS tomam com referência à sua relação com as participações são-no em interesse próprio, com objetivo de que as mesmas prossigam a sua atividade da melhor forma e a finalidade última de obtenção de lucro.

Logo, a decisão de efetuar empréstimos à C... SGPS e as valorizações da respetiva participação social por via da aplicação do método da equivalência patrimonial decorrem do exercício, pela B..., da atividade empresarial de gestão de participações sociais, isto é, da sua atividade normal.

Desta forma, as dívidas da C... SGPS à B... são créditos resultantes da atividade normal da empresa e não perdas resultantes da alienação de investimentos financeiros, tal como foi classificado contabilisticamente.

Estando comprovado que o valor de € 29.269.201,62 corresponde a créditos resultantes da atividade normal da sociedade, há que verificar se estão reunidos os pressupostos legais para a sua dedução fiscal no ano de 2016.

O art.º 41, n.º1 do CIRC, na redação em vigor para o ano de 2016 dispunha que:

“Os créditos incobráveis podem ser diretamente considerados gastos ou perdas do período de tributação nas seguintes situações, desde que não tenha sido admitida perda por imparidade ou esta se mostra insuficiente:

(…)

b) Em processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado, após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos previstos no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ou, quando exista, a homologação do plano objeto da deliberação prevista no artigo 156.º do mesmo Código;

(…)”

Não subsistem quaisquer dúvidas de que o pressuposto previsto na al. b) se encontra cumprido, pois, o processo de insolvência da C... SGPS foi encerrado por despacho de 28-10-2016, por insuficiência da massa insolvente para a satisfação das custas do processo.

No entanto, o mesmo não se poderá afirmar relativamente ao pressuposto enunciado no corpo do n. º1 do citado preceito legal, quanto à perda por imparidade.

O art.º 35.º, n.º 1, al. a) do CIRC, na redação vigente para 2012, ano em que foi decretada a insolvência da C... SGPS, determinava: 

“Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes perdas por imparidade contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores: 

a)            As relacionadas com créditos resultantes da atividade normal que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados com tal na contabilidade;

(…)”

Já se comprovou que os créditos da B... sobre a C... SGPS são resultantes da sua normal atividade enquanto gestora de participações sociais, faltando agora verificar se, no ano de 2012 eram de cobrança duvidosa.

De acordo com o disposto no art.º 36.º, n.º 1, al. a) do CIRC, também na redação em vigor para o ano de 2012, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles que em risco de incobrabilidade estejam devidamente justificados, o que, inclusivamente, afasta a aplicação do n.º 3, al. d) do mesmo artigo que exclui da qualificação de cobrança duvidosa os créditos sobre empresas participadas em mais de10% de capital.

Desta forma fica provado que os créditos da B... sobre a C... SGPS eram créditos da cobrança duvidosa, em 2012, ano que foi decretada a insolvência da devedora.

Como tal, da leitura conjugada dos artigos35.º, n. º1, al. a) e 36.º, n.º 1, al. a) do CIRC, nas redações vigentes para o ano de 2012, conclui-se que, no período de 2012, era admitida, fiscalmente a perda por imparidade no valor de € 29.269.201,62.

Deste modo, o valor de € 29.269.201,62 deverá ser acrescido no campo 722 – Créditos incobráveis não aceites como gastos do quadro 07 da declaração modelo 22 de IRC do ano de 2016, daí resultando o apuramento de um prejuízo fiscal no montante de € 439,55.

III – 5. Conclusão

Considerando que:

a)            Nos termos do art.º 36.º, n.º 1, al. a) do CIRC, na redação em vigor para o período de 2012, os créditos da B... sobre a C... SGPS se constituíram nesse mesmo ano de 2012 por força da declaração de insolvência desta última, como créditos de cobrança duvidosa resultantes da atividade normal do sujeito passivo enquanto sociedade gestora de participações sociais e

b)           De acordo com o disposto no art.º 35.º, n.º 1, al. a) do CIRC, também na redação vigente para o ano de 2012, era admitida a dedução fiscal das perdas por imparidade relacionadas com créditos de cobrança duvidosa.

Propõe-se, por incumprimento dos pressupostos previstos no art.º 41.º, n.º 1 do CIRC, na redação em vigor para o período de 2016, o acréscimo do valor de € 29.269.201,62 ao resultado fiscal apurado pela B..., em sede de IRC do ano 2016.

 

P)           A Requerente, enquanto sociedade dominante do grupo de sociedades, foi objeto de uma ação de inspeção tributária credenciada pela ordem de serviço OI 2020..., relativa ao exercício de 2016, tendo em vista refletir no resultado do grupo as correções apuradas no procedimento inspetivo realizado à sociedade B..., a coberto da ordem de serviço OI 2018... .

Q)           No âmbito da ação inspetiva, e por efeito das correções efetuadas à matéria coletável da B..., o resultado fiscal declarado do grupo, constituído por prejuízo fiscal de € 14.102.851,03, foi corrigido para um lucro tributável de € 6.790.354,59.

R)           A correção tributária determinou a liquidação n.º 2020 ... e a demonstração de acerto de contas n.º 2020..., com um valor a pagar de € 272.331,33, incluindo juros compensatórios no valor de € 17.580,71, com data limite para o pagamento em 9 de dezembro de 2020.

S)            O pedido arbitral deu entrada em 8 de Março de 2021.

 

Matéria de direito

 

5. A questão em debate prende-se com a dedutibilidade como gastos ou perdas de créditos incobráveis por efeito de processo de insolvência da entidade devedora.

 

A Autoridade Tributária, no âmbito do procedimento inspetivo desencadeado para verificar a situação fiscal da B..., entidade que integra o grupo de sociedades da Requerente, procedeu a um acréscimo ao resultado fiscal apurado em sede de IRC, relativamente ao período de tributação de 2016, por considerar não dedutíveis, ao abrigo do artigo 41.º, n.º 1, do Código do IRC, os créditos concedidos à sociedade sua participada (C... SGPS), entendendo que o gasto contabilizado era já admitido como perda por imparidade em 2012, nos termos do disposto no artigo 35.º, n.º 1, alínea a), e 36.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, quando nessa data se verificou a insolvência da participada.

 

A Requerente contrapõe que os créditos detidos pela B... sobre a C... SGPS podiam ser considerados de cobrança duvidosa, nos termos do disposto no artigo 36.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, quando foi declarada a insolvência em 2012, mas não se verificavam os restantes pressupostos previstos no artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, visto que esses créditos não são resultantes da sua atividade normal e não se encontravam evidenciados na contabilidade.

 

As normas em causa, na redação vigente em 2012, na parte que mais releva, dispunham nos seguintes termos:

 

Artigo 35.º

Perdas por imparidade fiscalmente dedutíveis

1 – Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes perdas por imparidade contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores:

a)            As relacionadas com créditos resultantes da atividade normal que no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade;

b)           (…)

c)            (…).

 

Artigo 36.º

Perdas por imparidades em créditos

1 – Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se como créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a)            O devedor tenha pendente processo de insolvência e de recuperação de empresas ou processo de execução;

b)           Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal;

(…)

3             — Não são considerados de cobrança duvidosa:

a)            Os créditos sobre empresas participadas em mais de 10% do capital, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1.

(…).

Essas disposições transitaram para os artigos 28.º-A e 28.º-B com a reforma de IRC, aprovada pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, que também alterou a redação do artigo 41.º. Este preceito, sob a epígrafe “Créditos incobráveis”, na redação entretanto introduzida pela Lei n.º 82-C/2014, de 31 de dezembro, e na parte que interessa considerar, é do seguinte teor:

1 - Os créditos incobráveis podem ser diretamente considerados gastos ou perdas do período de tributação, ainda que o respetivo reconhecimento contabilístico já tenha ocorrido em períodos de tributação anteriores, em qualquer das seguintes situações, desde que não tenha sido admitida perda por imparidade ou esta se mostre insuficiente: 

a) (…)

b)           Em processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado, após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação de créditos prevista no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, ou, quando exista, a homologação do plano objeto da deliberação prevista no artigo 156.º do mesmo Código1111;

     (…).

 

Como resulta da matéria de facto dada como assente, a C... SGPS foi declarada insolvente em 14 de Setembro de 2012, e segundo as disposições então vigentes e acima transcritas, o reconhecimento das perdas por imparidade em créditos dependia de três requisitos essenciais: serem resultantes da atividade normal da entidade credora, considerados de cobrança duvidosa e encontrarem-se evidenciados na contabilidade.

 

A B... tornou-se acionista fundadora da C... SGPS, com uma participação representativa de 99,996% do respetivo capital social, em novembro de 2003, e esta entidade tinha sido criada para desenvolver o Projeto ..., que fora considerado um projeto de interesse estratégico nacional. Entre janeiro de 2008 e janeiro de 2015, a B... era uma sociedade gestora de participações sociais, e foi nessa circunstância e enquanto titular da quase totalidade do seu capital social, que, no período de 2004 e 2012, financiou a C... SGPS por meio de suprimentos.

 

A questão que primeiramente se coloca é a de saber se a concessão de créditos pela B... à sua participada se integram na sua atividade normal, enquanto sociedade gestora de participações sociais. 

 

Segundo o disposto no Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro, que define o regime jurídico das sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), estas sociedades, conforme o seu artigo 1.º, “têm por único objeto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas” (n.º 1), sendo que a participação numa sociedade é considerada forma indireta de exercício da atividade económica desta quando não tenha carácter ocasional e atinja, pelo menos, 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer por si só, quer através de participações de outras sociedades em que a SGPS seja dominante (n.º 2).

 

Os contratos pelos quais se constituem as SGPS devem mencionar expressamente como objeto único da sociedade a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas (artigo 2.º, n.º 2), sendo permitida às SGPS a prestação de serviços técnicos de administração e gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações ou com as quais tenham celebrado contratos de subordinação (artigo 4.º, n.º 1), como também a concessão de crédito às suas participadas por meio de contratos de suprimento (artigo 5.º, n.º 1, alínea f).

 

Tratando-se de sociedades que têm por único objeto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas, não oferece dúvidas que as sociedades gestoras de participações sociais se enquadram no conceito de “instituição financeira”, tal como se encontra definido no direito europeu (cfr. neste sentido, a propósito da isenção de imposto estabelecida no artigo 7.º, n.º 1, alínea e), do Código do Imposto do Selo, entre outros, ao acórdãos proferidos nos Processos n.º 254/2019-T, 911/2029-T e 81/2021-T).

 

E como resulta do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 495/88, a abertura para instituir condições favoráveis, designadamente de natureza fiscal, que facilitem e incentivem a criação de grupos económicos, teve em vista “proporcionar aos empresários um quadro jurídico que lhes permita reunir numa sociedade as suas participações sociais, em ordem à sua gestão centralizada e especializada” e “contribuir para o fortalecimento do tecido empresarial português”.

 

Como créditos que resultem da atividade normal devem entender-se os que se relacionam com o objeto social da empresa. Todos os demais créditos, quando se tornem incobráveis, são dedutíveis para efeitos fiscais, não segundo o regime fiscal das imparidades, mas o regime mais gravoso do artigo 41.º (cfr. GUSTAVO COURINHA, Manual do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, Coimbra, 2019, pág., pág. 87).

 

Atendendo a esse critério geral, para determinação das perdas por imparidade deverão considerar-se, em princípio, os créditos decorrentes das operações de natureza comercial relacionadas com a venda de bens ou serviços respeitantes à atividade da empresa, ou seja, operações que envolvam transacções correntes, encontrando-se excluídos os créditos que resultem de operações de carácter financeiro que não se encontrem directamente associados ao objeto social da empresa.

 

Mas esse não é o caso das sociedades gestoras de participações sociais, que tem como objeto, de acordo com o seu próprio estatuto, a gestão de participações sociais de outras sociedades, e, nessa condição, podem não apenas prestar serviços de administração e gestão como conceder crédito às suas participadas, de forma a assegurar que estas possam exercer adequadamente a sua própria atividade empresarial, o que é inteiramente condizente com a sua própria natureza de instituição financeira.

 

Sendo a B..., ao tempo, uma sociedade gestora de participações sociais, não pode deixar de concluir-se que a concessão de crédito à sua participada C... SGPS se integra na sua atividade normal, preenchendo o requisito que decorre da alínea a) do n.º 1 do artigo 35.º do Código do IRC para efeito do reconhecimento de perdas por imparidade. 

 

Por outro lado, o artigo 36º, n.º 1, alínea d), do Código do IRC, na redação vigente à data de 2012, embora não considerasse como sendo de cobrança duvidosa os créditos sobre empresas participadas em mais de 10% do capital – como era a situação dos créditos detidos pela B..., que dispunha de uma participação social sobre a C... SGPS muito superior a esse percentual -, excetuava os casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1, salvaguardando especialmente o caso em que se verificasse, em relação ao devedor, a pendência de processo de insolvência e de recuperação de empresas.

 

Acresce ainda que se encontra demonstrado que a B..., em 31 de dezembro de 2012, havia reconhecido contabilisticamente a imparidade relativa aos empréstimos concedidos à  C...SGPS, e correspondentes juros, por virtude da declaração de insolvência desta entidade, o que leva a concluir que, no exercício de 2012, se verificavam já todos os requisitos de que dependia, nos termos das referidas disposições dos artigos 35.º e 36.º do Código do IRC, a dedução para efeitos fiscais das perdas por imparidades que haviam sido contabilizadas nesse período.

 

Com a reforma do IRC de 2014, o artigo 41.º, alínea b), do Código, cuja redação foi alterada pela Lei n.º 82-C/2014, de 31 de Dezembro, passou a prever que os créditos incobráveis pudessem ser diretamente considerados gastos ou perdas do período de tributação, designadamente, nas situações de processo de insolvência, após o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação dos créditos. No entanto, como resulta do proémio desse preceito, a dedução de créditos incobráveis, nessa circunstância de tempo, opera “desde que não tenha sido admitida perda por imparidade”, pressuposto que não se pode dar como verificado, na situação do caso, visto que não havia nenhum obstáculo a que a perda por imparidade tivesse sido deduzida no exercício de 2012.

O pedido arbitral mostra-se, por conseguinte, ser improcedente.

Princípio da proporcionalidade

6. A Requerente alega ainda que a recusa da dedutibilidade das perdas por imparidade com créditos incobráveis contende com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição e no artigo 55.º da LGT, dizendo que existindo duas interpretações possíveis do conceito de “créditos resultantes da atividade normal da empresa”, ínsito no artigo 35.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRC, na redação vigente em 2012, cabe à Administração  adotar aquela que seja menos gravosa para o contribuinte, de modo a satisfazer os fins visados pelo regime de dedutibilidade fiscal das perdas por imparidade.

Deve começar por dizer-se que o princípio da proporcionalidade mobilizado pela Requerente como parâmetro de constitucionalidade não é mais do que um princípio conformador da atividade administrativa, significando que, no exercício de poderes discricionários, a Administração deve prosseguir os interesses públicos que lhe são conferidos segundo os princípios da necessidade, da adequação e da razoabilidade, de modo a assegurar que, de entre as medidas necessárias e adequadas aos fins em vista, adote aquelas que impliquem menos sacrifícios ou perturbações à posição jurídica dos administrados (cfr. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. II, 4.ª edição, Coimbra, pág. 801).

Não é esse o caso quando o que está em causa é a interpretação da lei, sendo que a Administração, por efeito do princípio da legalidade - que constitui um outro princípio da atividade administrativa com igual consagração constitucional -, está vinculada a aplicar a lei de acordo com os critérios hermenêuticos que permitam considerar o sentido interpretativo mais conforme à letra da lei e ao pensamento legislativo.

Não estando em causa o exercício de poderes discricionários, mas a simples interpretação da lei, não se verifica a apontada violação do princípio da proporcionalidade.

Princípio da tributação segundo o lucro real

7. A Requerente refere ainda que a posição adotada pela Autoridade Tributária é atentatória do princípio da tributação das empresas pelo lucro real, consagrado no artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República, na medida em que, de acordo com essa disposição, a tributação das empresas deve incidir sobre os lucros realmente verificados, e não sobre os lucros que poderiam obter em condições normais, com base em meras presunções.

Não sendo possível questionar o pressuposto de que a Requerente parte quanto ao sentido e alcance do princípio da tributação das empresas segundo o lucro real, não se vê, em todo o caso, em que termos é que a interpretação dos artigos 35.º, n.º 1, alínea), 36.º, n.º 1, alínea a), e 41.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC que veio a ser adotada colide com esse mesmo princípio.

A tributação segundo o lucro real pressupõe que a determinação do lucro tributável seja efetuada de acordo com a contabilidade da empresa, com base na documentação e comprovação das receitas e dos custos do sujeito passivo, e, por isso, exige um sistema fiável de informação sobre os resultados empresariais (neste sentido, GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ob. cit., I vol., pág. 1100).

Por outro lado, a tributação segundo o lucro real não impede que a Administração Tributária possa efetuar correções administrativas à declaração do sujeito passivo que possam levar à desconsideração de custos comprovados como custos fiscais e à consequente alteração da quantificação do lucro tributável (acórdão do Tribunal Constitucional n.º 753/2014).

No caso, a não dedutibilidade dos gastos relacionados com créditos incobráveis resulta, não de um qualquer juízo presuntivo sobre o lucro tributável, mas da mera consequência legal de não poderem ser considerados como gastos as perdas por imparidade que, segundo o princípio da especialização dos exercícios, poderiam ter sido deduzidas num outro período de tributação.

 Não ocorre, por isso, a violação do dito princípio constitucional.

Juros compensatórios

 

8.  A Requerente impugna igualmente a liquidação de juros compensatórios em relação ao ato tributário de liquidação de IRC.

 

Nos termos do artigo 35.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, “são devidos juros compensatórios quando, for imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária”.

 

Como tem sido entendimento corrente, os juros compensatórios devidos nos termos da referida disposição constituem uma reparação de natureza civil que se destina a indemnizar a Administração Tributária pela perda de disponibilidade de uma quantia que não foi liquidada atempadamente. Tratando-se de uma indemnização de natureza civil, ela só é exigível se se verificar um nexo de causalidade entre a atuação do sujeito passivo e o atraso na liquidação e essa atuação possa ser censurável a título de dolo ou negligência.

 

Nem nos relatórios de inspeção tributária referentes à B... e à Requerente, nem nos atos de liquidação de imposto e de notificação do contribuinte, que constituem os documentos n.ºs 1, 2 e 8 juntos ao pedido arbitral, nem na resposta da Autoridade Tributária, é feita qualquer referência às razões pelas quais, nas circunstâncias do caso, há lugar à liquidação de juros compensatórios, pelo que não é possível dar como demonstrado que houve culpa do contribuinte no atraso no pagamento do imposto.

 

O pedido arbitral é, nesta parte, procedente.

 

III – Decisão

Termos em que se decide:

 

a)            Julgar improcedente o pedido arbitral a anular ato de liquidação adicional de IRC n.º 2020 ... que foi impugnado;

b)           Julgar procedente o pedido arbitral no que se refere à liquidação de juros compensatórios, no valor de € 17.580,71.

 

Valor da causa

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 272.331,33, que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 4.896,00, que fica a cargo da Requerente e da Requerida na percentagem de 93,50% e 6,50%, respetivamente.

 

Notifique.

 

Lisboa, 24 de novembro de 2021

  

O Presidente do Tribunal Arbitral

Carlos Fernandes Cadilha

 

O Árbitro vogal

Carlos Quelhas Martins

 

A Árbitro vogal

Maria Antónia Torres