Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 112/2019-T
Data da decisão: 2019-10-04  IRC  
Valor do pedido: € 30.346,09
Tema: IRC – Correções Aritméticas.
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DECISÃO ARBITRAL 

I-RELATÓRIO

 

1.3 A...- SOCIEDADE DE INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA. , pessoa colectiva nº..., com sede na Rua ..., nº..., ..., ...-... ... (doravante designada por Requerente ou Sujeito Passivo), apresentou em 2019-02-21, pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 dos artigos 2º, 5º, nº2, alínea a), 6º, nº 1 e 10º, nºs 1 e 2 todos do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante referido por RJAT) e dos artigos 1º e 2º da Portaria nº 112-A/2011, de 2 de Março, em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT ou Requerida), com vista à declaração de ilegalidade do acto de indeferimento da reclamação graciosa nº ...2018..., e consequentemente da liquidação de IRC nº 2018..., referente ao ano de 2014, no valor de 58.044,75 €, juros compensatórios de 5.953,96 €, e demonstração de  acerto da contas, perfazendo o montante global de 64.397,84 €.

 

2.O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Tributário foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e de imediato notificado à Requerida nos termos legais.

 

3. Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente notificada às partes nos prazos previstos, foi designado como árbitro o signatário, que comunicou àquele Conselho a aceitação do encargo, no prazo previsto no artigo 4º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

 

4. Em 2019-04-09 foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11, nº 3, alíneas a) e b) na redacção que lhes foi conferida pela Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

5. O tribunal arbitral singular ficou constituído em 2019-05-02 de acordo com a prescrição da alínea c) do artigo 11º do RJAT, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

6. Devidamente notificada para tanto, através de despacho proferido na supra indicada data a Requerida apresentou em 2019-05-31 a sua resposta, tendo, nessa mesma data, procedido à junção do processo administrativo (PA).

 

7. Por despacho proferido em 2019-06-03 devidamente notificado às partes, que fundamentou, para além do mais a dispensa da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, e indicada como data para a prolação da decisão final e sua notificação às partes o dia um de Setembro de dois mil e dezanove, foram estas convidadas a apresentar, querendo, alegações escritas.

 

8. Com data de 2019-06-24 a Requerente procedeu à junção das suas alegações escritas, tendo, por seu turno, a AT procedido à junção das suas alegações em 2019-06-26.

 

9. Através de despacho datado de vinte e oito de Agosto de dois mil e dezanove, e pelas razões que do mesmo decorrem, foi prorrogado o prazo, com data limite de quinze de Outubro de dois mil e dezanove, para a prolação da sentença e sua notificação às partes.

 

10. A fundamentar o seu pedido a Requerente invoca, em síntese e com relevo para o que aqui importa o seguinte; (que se menciona por transcrição, atenta a circunstância, de fundamentalmente, se estar perante conclusões extraídas de mapas constantes no pedido de pronúncia arbitral)

 

10.1.”Pretende-se com a presente petição demonstrar que os valores inicialmente apresentados pela requerente estavam incorretos, por ter sido efetuado um inexato apuramento dos inventários finais de 2013 e 2014, facto pelo qual, a requerente desde já se penitencia, sendo essencial demonstrar com a exatidão o custo da mercadoria vendida, que é dada pela seguinte formula – Existências Iniciais (EI) + Comoras do Exercício – Existências Finais ( EF).

 

A requerente apresentou um valor de existências inicias de 2.303.409,67 Euros, que se deveu a um cálculo incorreto da imputação de gastos em obra nos anos anteriores a 2014.

 

A autoridade tributária, em consequência da ação inspetiva, apresenta o seguinte mapa das existências inicias de 2014.

 

Verificando-se, assim, uma discrepância entre os valores das existências iniciais apresentado pela requerente e o valor apresentado pela AT.

Ora, com base na valorização errada do inventário inicial é apurada uma diferença no inventário inicial de 302.260,69 Euros, que resulta do diferencial entre os 2.303.409,67 euros – valor das existências iniciais que foi apresentado pela requerente e o valor das existências iniciais apresentado pela AT - 2.001.148,98 euros.

 

Contudo, ficou por esclarecer a razão deste diferencial, uma vez que, nem a requerente, nem os Serviços de Inspeção Tributária lograram determinar com exatidão o valor do inventário inicial de 2014.

 

Importa, assim, demonstrar o valor dos imóveis constantes do inventário inicial de 2014, porém, para melhor compreensão, temos que recuar ao inventário inicial de 2013 e imputar os gastos incorridos em obra durante o ano de 2013, para que se apure qual o valor dos imóveis no final de 2013 e que transitaram em existências para o ano de 2014.

 

Assim, importa analisar os quadros infra:

 

Ora, estes seriam os valores dos imóveis em existências no início de 2014

 

Com base na valorização correta do inventário inicial, apuramos a diferença no inventário inicial no valor de 156.341,40 Euros, resultante da diferença entre os 2.303.409,67 Euros apresentado pela requerente erroneamente e o valor correto das existências inicias do ano de 2014 – 2.147.068,27 Euros

No que se refere ao valor das compras não se coloca qualquer reserva, por ser exato o que consta no relatório da AT.

 

Quanto aos inventários finais, existem diferenças na valorização dos mesmos, que importa esclarecer,

 

Pese embora, os imóveis constantes no inventário final de 2014 coincidam com os dados do cadastro da AT, existem diferenças na valorização dos inventários finais, as quais resultam das correções de imputação dos gastos em obra no ano de 2013, que por sua vez influenciaram o valor das existências inicias e das existências finais de 2014.

 

O Serviço de Inspeção Tributária (SIT), aquando da ação inspetiva, identificou o incorreto apuramento dos inventários finais de 2013 e 2014, como resulta do relatório SIT, contudo, não lograram identificar quais os valores corretos de forma a apurar as correções exatas a fazer à matéria coletável.

 

Podemos assim verificar através do quadro infra que esta diferença foi considerada pelo serviço de inspeção tributária

 

E, caso tivessem procedido às correções de imputação dos gastos e obras aos imóveis, teriam chegado à conclusão que se espelha no quadro infra:

 

Assim, e com base nas existências iniciais corrigidas, foi apurado o custo de mercadorias e matérias consumidas no valor de 1.305.127,76 Euros, conforme se demonstra no quadro seguinte:

 

No relatório do Serviço de Inspeção Tributária existe a rubrica outros gastos, com referência ao Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT).

 

Quanto a esta rubrica importa referir que, por lapso foi considerado um reembolso de IMT no valor de 6.095,44 Euros.

 

Ora, o reembolso de IMT pago anteriormente deverá ser considerado como rendimento, nos termos do Artigo 20º do CIRC.

 

Face ao supra exposto e às correções de erros existentes consideramos o seguinte:

 

Assim, e uma vez efetuadas as devidas correções, consideramos que ao requerente deverá ser devolvido o valor de 30.346.09 Euros, conforme se demonstra no quadro seguinte:

 

10.2. Conclui a Requerente o seu ppa pugnando que o pedido de pronúncia arbitral seja considerado “procedente por provado, com a consequente anulação do ato tributário que se impugna, dando lugar a uma liquidação que tenha em consideração as correções supra aduzidas” e “a AT ser condenada a restituir à requerente o valor de € 30.346,09 (trinta mil trezentos e quarenta e seis euros e nove cêntimos) pago em excesso”.

 

11. Como referido, em 2019-05-31 a Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à junção do PA e apresentou a sua resposta onde, fundamentalmente, em breve síntese e com relevo nesta sede, defende o seguinte (que igualmente se menciona, do mesmo modo, e maioritariamente por transcrição atenta a circunstância, de fundamentalmente, se estar perante conclusões extraídas de mapas constantes da resposta);

 

“Face aos fundamentos descritos no relatório inspectivo, o lucro tributável declarado foi objeto de correção como se discrimina:

 

PREJUÍZO FISCAL DECLARADO   -30.595,9 2 €

CORREÇÕES       271.186,75 €

LUCRO TRIBUTÁVEL        240.590,83 €

 

O valor total das correções resultou do somatório das seguintes parcelas:

 

             256 996,7€ - correção do custo da mercadoria vendida (CMV) de 1 461 852,94€ para 1 202 856,19€

             6 095,00€ - valor indevidamente contabilizado como gasto, referente ao um reembolso de IMT

             6 095,00€ - rendimento proveniente do reembolso do IMT não contabilizado.

 

Para pedir a anulação da liquidação a Requerente, em sede de reclamação graciosa, solicitou a correção do CMVMC relativo às correções ao inventário inicial e inventário final de 2014 para € 126.787,05, impugnando o valor de € 258.996,75.

 

Não obstante, veio agora a sociedade Requerente apresentar uma nova série de cálculos, cujos valores pretende ver refletidos no acto de liquidação de IRC.

 

A este respeito importa referir que, contrariamente ao alegado nos pontos 8 e 9 da PI, os valores constantes do mapa apresentado não são valores apurados pela AT, mas sim o valor dos imóveis apurado pela empresa à data de 31-12-2013, conforme mapa de inventário apresentado à Inspecção Tributária, o qual constitui o anexo 1 do relatório de inspecção.

Quer isto dizer que a Inspecção Tributária aceitou como correcta a valorização constante do mapa de existências que lhe foi apresentado.

 

Refira-se   ainda que   a sociedade foi, ao   longo do   tempo, apresentando valores de existências distintos, conforme infra discriminado:

 

             Existências Iniciais declaradas na IES e na contabilidade: € 2.303.409,67;

 

             Existências Iniciais declaradas no mapa de existências apresentado à Inspeção Tributária: € 2.001.148,98;

 

             Existências Iniciais que pretendia ver reconhecidas na Reclamação Graciosa: € 1.314.418,03;

 

             Existências Iniciais que pretende ver consideradas nesta sede: € 2.147.068,27.

 

 

III.1.1. Valores declarados em sede de IRC

 

 

III.1.2. Análise aos Rendimentos - Vendas – conta 71

 

Nesta rubrica os serviços de inspecção encontraram contabilizadas as vendas de diversos imóveis, pelo valor global de €1.485.000,00, possuindo como documentação de suporte as respetivas escrituras:

 

- Outros Rendimentos – conta 78

 

Relativamente a esta rubrica, verificaram os SIT, que o total de 151.000,00 respeita a:

 

- € 100.000,00, antecipação parcial do pagamento do preço e de sinal da venda de um imóvel suportado pelo contrato promessa de compra e venda, posteriormente não se tendo efectivado a referida venda;

- € 10.000,00 venda de viatura ligeira de mercadorias, Factura nº 3/2014;

- € 18.000,00 arrendamento do ... lote 1 bloco A e B. Este imóvel está em regime de leasing imobiliário, à data o contrato leasing estava com o B...;

- € 23.0000,00 arrendamento do Armazém ... lote ... .

 

III.1.3. - Análise aos Gastos - Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas

 

Relativamente ao valor declarado como custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas, verificaram os SIT que o valor ascende a € 1.461.852,94, conforme Anexo 1 do relatório de inspecção tributária (RIT).

 

Este valor é determinado da seguinte forma:

CMVMC = Inventários Iniciais + Compras – Inventários Finais

 

a)            Inventários Iniciais

 

No início de 2014 e conforme consta do cadastro da AT, o património da Requerente era constituído pelos seguintes imóveis:

 

De acordo com os valores constantes nos registos contabilísticos, bem como na declaração anual apresentada, o inventário inicial de 2014 ascende a € 2.303.409,67, verificando-se assim uma diferença de € 302.260,69.

 

Este valor de inventário e de acordo com o balancete de 2013, corresponde aos seguintes bens:

- 32101 – Prédio – Matriz                     € 1.403.409,67

- 32102 – Armazém ..., lote ... – € 900.000,00

                                                                  € 2.303.409,67

 

De acordo com o mapa de inventário de 2013 (Anexo 1 do RIT), no valor final está incluído um imóvel de € 184.664,14, cuja venda ocorreu em 2012, (Anexo 2) ou seja o inventário inicial de 2014, está influenciado com um imóvel cuja venda ocorreu em ano anterior, pelo que, se ao valor declarado pelo sujeito passivo, ora requerente, for abatido o imóvel já vendido chega-se a um inventário de € 2.118.745,50.

 

Este valor é, no entanto, superior ao valor apurado no mapa anterior, em €117.596,60, o qual e não obstante os esclarecimentos prestados pela contabilista certificada, não foi possível comprovar, pelo que os SIT consideraram o valor apurado e constante no mapa anterior (€ 2.001.148,98).

 

b)           Compras

 

De acordo com os registos contabilísticos, bem como nos dados constantes no cadastro da AT, os SIT apuraram que a Requerente adquiriu os seguintes imóveis:

 

A Requerente acresceu o valor de € 50.508,34, o qual de acordo com os registos/documentos contabilísticos referem-se a despesas com os imóveis vendidos. Assim sendo, as compras totalizam o valor de € 535.508,34.

 

c)            - Inventários Finais

 

São os seguintes os imóveis constantes no inventário final de 2014, os quais coincidem com os

dados constantes no cadastro da AT (Anexo 3 do RIT):

 

Da análise efectuada, os SIT verificaram que o imóvel identificado como artº ... (lote... nº...), fracção B foi adquirido em 2014 pelo valor de € 100.000,00, tendo o sujeito passivo valorizado erradamente o mesmo por € 143.263,94, verificando-se assim uma diferença € 43.263,94, ou seja, o valor correto de inventário ascendia a €1.333.801,13.

 

Assim e com base nas existências iniciais corrigidas, os SIT apuraram um custo de mercadorias vendidas e matérias consumidas de € 1.202.856,19, conforme mapa discriminativo - anexo 4 do RIT.

 

Comparando este valor com o declarado pelo sujeito passivo de € 1.461.852,94, conclui-se que foi indevidamente considerado como gasto € 258.996,75, pelo que ao abrigo do art. 23.º do CIRC, o mesmo foi acrescido para efeitos de apuramento do lucro tributável.

 

Esta diferença resulta em parte, do incorrecto apuramento dos inventários finais de 2013 e 2014, bem como na errada valorização atribuída aos imóveis adquiridos e vendidos em 2014:

 

d)           - Outros Gastos

Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT)

 

Da análise efectuada verificou-se ainda que a requerente considerou como gastos € 6.095,44, cujo documento de suporte se refere a um reembolso de IMT - Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis.

 

Estando em causa um reembolso de IMT, o mesmo não pode ser considerado como gasto.

 

Assim aquando de um reembolso de IMT pago anteriormente, o mesmo deve ser considerado como rendimento, nos termos do art. 20º do CIRC.

 

Face ao exposto, e na sequência dos elementos recolhidos e analisados pelos SIT, procedeu-se às seguintes correcções:”

 

12. Conclui a AT a sua resposta no sentido da “improcedência do presente peido de pronúncia arbitral, absolvendo-se a Requerida dos pedidos, com todas as consequências legais”.

 

13. O Tribunal Arbitral Singular é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos do disposto nos artigos 2º, nº 1, alínea a) 5º e 6º do RJAT;

 

14. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, estão devida e legalmente representadas (artigos 3º,6º e 15º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi artigo 29º, nº 1 alínea a) do RJAT:

 

15. Não foram suscitadas excepções de que deva conhecer-se;

 

16. O processo não enferma de nulidades;

 

17. Inexiste, deste modo, qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

II- FUNDAMENTAÇÃO

 

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

Com relevo para a apreciação e decisão da questão suscitada, dão-se como provados e assentes os seguintes factos:

 

1- A Requerente tem por objecto social “investimentos imobiliários, promoção imobiliária, construção civil, loteamentos, obras públicas, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, gestão imobiliária, arrendamento de imóveis”;

2- Encontrando-se em sede de IVA enquadrada no regime de isenção (artº 9 do CIVA) e em sede de IRC enquadrada no regime geral;

3- Com base na declaração Modelo 22 – IRC e anexo A da declaração anual de informação contabilística e fiscal, a Requerente registou um prejuízo para efeitos fiscais concernente ao ano de 2014 de 30.595,92 €.

4- No âmbito da Ordem de Serviço número OI 2016... de 22/01/2016 emitida pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de ... a Requerente foi alvo de um procedimento inspectivo de natureza externa, inicialmente de caracter parcial (IRC), tendo posteriormente sido o seu âmbito alterado para geral e com incidência sobre o exercício fiscal de 2014;

5- No Relatório de Inspeção Tributária, pode ler-se, para além do mais, o seguinte:

 

III.DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

Com base na declaração de rendimentos Mod.22-IRC e no anexo A da declaração anual de informação contabilística e fiscal, procedeu-se ao confronto dos valores mencionados nas mesmas com os registos contabilísticos, não se tendo verificado diferenças entre os valores declarados e a contabilidade.

III.1.VALORES DECLARADOS EM SEDE DE IRC:

 

Demonstração dos resultados por naturezas (SNC)

Rendimentos e gastos   Exercício 2014

Vendas e serviços prestados      1.485.000,00 €

Custo das mercadorias vendidas (CMVMC)         -1.461.852,94 €

Outros Rendimentos     151.000,00 €

Fornecimentos e serviços externos         -27.555,86 €

Outros gastos e perdas -18.099,50 €

Juros e gastos similares suportados        -129.365,62 €

Resultado antes de impostos     -30.595,92 €

Imposto sobre o rendimento do período              0,00 €

Resultado líquido do período     -30.595,92 €

Prejuízo para efeitos fiscais         30.595,92 €

 

III.1.2.   Análise aos Rendimentos

 

- Vendas – conta 71

 

Nesta rubrica encontram-se contabilizadas as vendas de diversos imóveis, pelo valor global de €1.485.000,00, possuindo como documentação de suporte as respetivas escrituras:

 

Vendas 2014

Data      Artº       Fracção Valor

10-01-2014         …(lote… nº…)     I              4º DTº   220.000,00 €

17-02-2014         …/…/…  -                              400.000,00 €

28-02-2014         … ( lote … nº…)  B             R/C DTº 125.000,00 €

30-05-2014         … ( lote… n.º…) J              4º ESQº 220.000,00 €

09-06-2014         … (lote… nº…)    E             2ºDTº    170.000,00 €

08-10-2014         … ( lote…nº…)    D             1ºESQº 170.000,00 €

23-12-2014         …( lote… nº…)    H             3ºESQº 180.000,00 €

Total      1.485.000,00 €

 

-              Outros Rendimentos – conta 78

 

O total registado nesta rubrica de € 151.000,00 respeita a:

. € 100.000,00, antecipação parcial do pagamento do preço e de sinal da venda de um imóvel suportado pelo contrato promessa de compra e venda, posteriormente não se tendo efectivado a referida venda;

. € 10.000,00 venda de viatura ligeira de mercadorias, Fatura nº 3/2014;

 

. € 18.000,00 arrendamento do Armazém ... lote ... bloco ... . Este imóvel está em regime de leasing imobiliário, à data o contrato leasing estava com o B... Crédito;

. € 23.0000,00 arrendamento do Armazém do ... lote ... .

 

Da análise e das diligências efetuadas não foram detetadas irregularidades aos rendimentos declarados em sede fiscal.

III.1.3.   - Análise aos Gastos

 

-              Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas

 

O valor declarado como CMVMC ascende a € 1.461.852,94, conforme Anexo 1

 

Este valor é determinado da seguinte forma:

 

CMVMC = Inventários Iniciais + Compras – Inventários Finais

 

-Inventários Iniciais

 

No início de 2014 conforme consta do cadastro da AT, o património do sujeito passivo era constituído pelos seguintes imóveis:

 

Existências Iniciais 2014               

Freguesia            Artº        Fracção Valor     Observações

            …(lote… nº…)     A             165.793,35 €      (*)

            …(lote… nº…)     A             168.007,78 €      (*)

            …(lote… nº…)     B             144.900,69 €      (*)

            … (lote… nº…)    D             185.915,77 €      (*)

            … (lote… nº…)    E             187.263,69 €      (*)

            …(lote… nº…)     I              249.267,70 €      (*)

                Sub total                             1.101.148,98 € 

                Armazém … lote …                          900.000,00 €     

 

TOTAL  

2.001.148,98 € 

 

(*) Valores conforme mapa de apuramento apresentado pelo sujeito passivo (Anexo 1)

 

 

De acordo com os valores constantes nos registos contabilísticos, bem como na declaração anual apresentada, o inventário inicial de 2014 ascende a € 2.303.409,67, verificando-se assim uma diferença de € 302.260,69.

Este valor de inventário e de acordo com o balancete de 2013, corresponde aos seguintes bens:

- 32101 – Prédio – Matriz -          € 1.403.409,67

- 32102 - Armazém do ..., lote ... –          € 900.000,00

€ 2.303.409,67

 

De acordo com o mapa de inventário de 2013 (Anexo 1), no valor final está incluído um imóvel de

€ 184.664,14, cuja venda ocorreu em 2012, (Anexo 2) ou seja o inventário inicial de 2014, está

influenciado com um imóvel cuja venda ocorreu em ano anterior, pelo que, se ao valor declarado pelo sujeito passivo for abatido o imóvel já vendido chega-se a um inventário de € 2.118.745,50.

Este valor é, no entanto, superior ao valor apurado no mapa anterior, em €117.596,60, o qual e não obstante os esclarecimentos prestados pela contabilista certificada, não foi possível comprovar, pelo que se considera o valor apurado e constante no mapa anterior (€ 2.001.148,98).

 

-Compras

 

De acordo com os registos contabilísticos, bem como nos dados constantes no cadastro da AT, o sujeito passivo adquiriu os seguintes imóveis:

 

 

Compras 2014

Freguesia            Artº        Fracção Valor

 

            …(lote…nº…)      B             100.000,00 €

 

            …(lote… n…)       H             133.000,00 €

 

            …/…/…  -              85.000,00 €

 

Total      485.000,00 €

 

 

O sujeito passivo acresceu o valor de € 50.508,34, o qual de acordo com os registos/documentos contabilísticos referem-se a despesas com os imóveis vendidos. Assim sendo, as compras totalizam € 535.508,34.

 

-Inventários Finais

 

São os seguintes os imóveis constantes no inventário final de 2014, os quais coincidem com os dados constantes no cadastro da AT (Anexo 3):

 

 

Existência Final 2014

Artº       Fracção Valor

…(lote… nº…)     A             165.793,35 €

…(lote… nº…)     B             143.263,94 €

…(lote1… nº…)  A             168.007,78 €

Lote … armazém …          900.000,00€

Total      1.377.065,07 €

 

Da análise efectuada verificou-se que o imóvel identificado como artº... (lote... nº...), fracção B foi adquirido em 2014 pelo valor de € 100.000,00, tendo o sujeito passivo valorizado erradamente o mesmo por € 143.263,94, verificando-se assim uma diferença € 43.263,94, ou seja, o valor correto de inventário ascendia a €1.333.801,13.

Assim e com base nas existências iniciais corrigidas, foi apurado um custo de mercadorias vendidas e matérias consumidas de € 1.202.856,19, conforme mapa discriminativo anexo 4.

Comparando este valor com o declarado pelo sujeito passivo de € 1.461.852,94, conclui-se que foi indevidamente considerado como gasto € 258.996,75, pelo que ao abrigo do artº 23 do CIRC, vai o mesmo ser acrescido para efeito de apuramento do lucro tributável.

Esta diferença resulta em parte, do incorrecto apuramento dos inventários finais de 2013 e 2014, bem como na errada valorização atribuída aos imóveis adquiridos e vendidos em 2014:

 

 

Artº       Fracção Valor Aquisição (1)          Valor Contabilistico (2)  Diferença (1)-(2)

…(lote…nº…)     H             133.000,00 €      186.589,73€        53.589,73€

…(lote… nº…)     J              167.000,00 €      246.571,88€        79.571,88€

Total      300.000,00 €      433.161,61€        133.161,61€

 

- Outros Gastos

 

Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) ...

 

Da análise efectuada verificou-se que o sujeito passivo considerou como gastos € 6.095,44, cujo documento de suporte se refere a um reembolso de IMT-Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis. Estando em causa um reembolso de IMT, o mesmo não pode ser considerado como gasto. Interpolada a contabilista certificada a mesma referiu ter sido um lapso.

Sobre esta questão, convém referir o disposto no nº 11 da NCRF nº 18 “11. Os custos de compra de inventários incluem o preço de compra, direitos de importação e outros impostos (que não sejam os subsequentemente recuperáveis das entidades fiscais pela entidade)”, pelo que o IMT é assim, passível de se acrescer ao valor do custo do imóvel.

Assim aquando de um reembolso de IMT pago anteriormente, o mesmo deve ser considerado como rendimento, nos termos do artº 20º do CIRC.

 

III.2. CONCLUSÃO

 

Face ao exposto neste relatório, na sequência dos elementos recolhidos e analisados determinamos haver lugar as seguintes correcções:

 

RENDIMENTO DECLARADO (1)   - 30.595,92 €

CORRECÇÕES

Custo das mercadorias vendidas (CMVMC) indevidas     258.996,75 €

Outros gastos e perdas indevidos            6.095,00 €

Rendimentos não declarados     6.095,00€

TOTAL CORRECÇÕES (2) 271.186,75€

RESULTADO CORRIGIDO (1)+(2) 240.590,83 €

 

6- Da liquidação resultante da inspecção tributário veio a Requerente apresentar reclamação graciosa a que coube o nº ...20018...,

 

7-Reclamação essa indeferida por despacho de 2018-11-21, proferido pelo Chefe de Divisão da Justiça Tributária, por delegação, notificado à Requerente.

 

8-No parecer que sustentou o indeferimento da reclamação graciosa pode ler-se o seguinte:

“Face aos fundamentos descritos no relatório inspectivo o LUCRO TRIBUTÁVEL DECLARADO foi objeto de correção como se descrmina;

 

PREJUÍZO FISCAL DECLARADO                                  - 30.595,92 €

CORRECÇÕES                                                                   271.186,75 €

LUCRO TRIBUTÁVEL                                                      200.590,83 €

 

O valor total das correções resultou do somatório das seguintes parcelas:

             258 696,70 €- correção do custo da mercadoria vendida (CMV) de 1 461 852.94 € para 1 202 856,19

             6 095,00 €- valor indevidamente contabilizado como gasto, referente a um reelbolso de IMT

             6 095,00 € - rendimento proveniente do reembolso do IMT não contabilizado.

 

Em resumo útil o reclamante alega errónea quantificação do lucro tributável por entender que o CMV é de 1 335 065,89€ e não o montante de 1.202 856,19 € considerado pela inspeção tributária.

No ponto 22 da petição a reclamante apresenta um quadro com o cálculo do CMV (fls.8) que em seu entender deve ser considerado para efeito de apuramento do lucro tributável, cujo conceito de encontra definido no artº 17º do CIRC.

 

O CMV é dado pela seguinte formula:

             EXISTÊNCIA INICIAIS (EI) + COMPRAS DO EXERCÍCIO – EXISTÊNCIAS FINAIS (EF)

Conforme valores apresentados pela reclamante:

             EI = 1 314 418,03 €

             COMPRAS = 514 860,49 €

             EF = 514 860,45 €

Apura-se o CMV de 1 335 065,89 €.

 

Porém pela análise do documento nº 4 (fls, 12) no qual a reclamante faz o apuramento do valor das EI e EF, verifica-se que no apuramento do valor das EI, é considerado o montante de 162 293,38 € referente ao imóvel a que corresponde o artigo matricial ... fração E da União de Freguesias de ... e ..., imóvel que foi vendido em 2012, e que portanto não pode integrar o valor EI de 2014, assim deduzindo este montante, 162 293,38 €, ao valor das EI referido pela empresa temos:

 

             EI= 1 152 124,65€ (1 314 418,03€-162 293,38€)

             Compras = 535 508,34

             EF = 514 860,49

             CMV = 1 172 772,50 ( 1 152 124,65 + 514 860,49)

ou seja perante os dados da reclamante, corrigidos apenas pela dedução do valor do imóvel já vendido em 2012, apura-se um CMV inferior ao considerado pela inspeção tributária, o que lavaria ao apuramento do lucro tributável de valor superior ao que serviu de base à liquidação reclamada”

 

9- A Requerente procedeu em 16/03/2019 ao pagamento correspondente à liquidação aqui em causa.

 

10- Em 2019-02-21 a Requerente apresentou junto do CAAD pedido de pronúncia arbitral que deu oigam ao presente processo.

                                                     

2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada

Relativamente à matéria de facto, o tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe sim, o dever de selecionar os factos que importam para decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr., artº 123º, nº 2 do CPPT, e artigo 670º, nº 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT.

Desde modo os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da (s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 596º do CPCivil, aplicável ex vi artigo 29º, nº 1 alínea e) do RJAT.

Por outro lado, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o tribunal baseia a sua decisão em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artigo 607º, nº 5 do Código de Processo Civil na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho)

Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré estabelecida na lei (v.g. força probatório dos documentos autênticos (cfr. artigo 371º, nº 3 do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110º, nº 7 do CPPT, a prova documental da Requerente, e o PA anexo, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos supra elencadas.

 

B.DO DIREITO

 

objecto e delimitação

 

- Em causa e como dissídio entre as partes, estarão divergências quanto aos valores iniciais e finais das existências apurados de forma diferente por cada uma delas, não obstante a Requerente reconhecer “que os valores inicialmente apresentados (…) estavam incorretos, por ter sido efetuado um inexato apuramento dos inventários finais de 2013 e 2014  (…)” (cfr. artigo 6º do pedido de pronúncia arbitral)  e que “apresentou um valor de existências iniciais de 2.303.409,67 Euros, que se deveu a um cálculo incorreto da imputação de gastos em obra nos anos anteriores a 2014”. (cfr. artigo 7º do pedido de pronúncia arbitral).

No que respeita à verba referente ao imposto municipal sobre as transacções onerosas de imóveis, haverá igualmente a referir, segundo a Requerente, que “por lapso foi considerado um reembolso de IMT no valor de 6.095,44 Euros” que “deverá ser considerado como rendimento nos termos do Artigo 20º do CIRC” (cfr. artigos 24º e 25º do pedido de pronúncia arbitral)

 

-Sendo que a questão emergente  dos presentes autos, tem fundamentalmente origem na divergência entre as partes quanto ao apuramento de valores em resultado do procedimento inspectivo a que a Requerente foi sujeita, afigurar-se-á pertinente, e antes da afrontar a questão de fundo, um ainda que muito breve incurso ao Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT) e, com este relacionado, o ónus de prova no direito fiscal, sem prejuízo de perfunctória referência quanto às correcções técnicas.

Pois bem:

Como se retira do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19/04/2017,  “decorre do artigo 17º do CIRC e 75º da LGT que a determinação do lucro tributável tem por base a contabilidade ou escrita organizada de acordo com a lei comercial e fiscal podendo contudo ser objecto de correcção pela AT quanto a mesma contiver erros ou inexactidões”.

Conforme se assinala no Relatório da Inspecção Tributária o motivo que presidiu ao procedimento inspectivo subjacente “surgiu no âmbito das ações de controlo tributário ao setor imobiliário.

Ora,

Como também já mencionado supra, a própria requerente admitiu um “inexacto apuramento dos inventários finais de 2013 e 2014” facto que, por si só, conferiria legitimidade à inspecção em causa, e subsequentes correcções ariméticas à matéria tributável, aqui postas em crise.

Recordando-se que “as correcções que a AT pode efectuar à matéria colectável podem resultar de uma avaliação directa, através da recolha e processamento dos dados das declarações da verificação do seu conteúdo e de correcções de eventuais erros.

Este tipo de avaliação assenta, assim, na análise da declaração do contribuinte ou nos elementos da sua contabilidade, dando origem a correcções técnicas (ou meramente aritméticas), pois não envolvem um juízo subjectivo sobre a realidade dos factos, ou a correcções sujeitas a um juízo de ponderação.

As correcções técnicas destinam-se a corrigir proveitos registados por montantes inferiores aos que constam das facturas emitidas, a desconsiderar custos ou perdas não comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora ou deduções de imposto que se refira a operação simulada bem como deduções de imposto referido em facturas ou documentos equivalente que não obedeçam aos requisitos formais legalmente exigidos” 

 

Em igual sentido, pode ver-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 03/06/2015,   de onde se retira:

“I- As correcções introduzidas pela Administração Tributária na declaração de rendimentos apresentada pelo contribuinte, quer tenha, origem na análise de própria declaração e respectivos documentos contabilísticos de suporte do próprio contribuinte, quer tenham origem na análise da declaração de rendimentos e respectivos documentos contabilísticos de suporte apresentados pelos contribuintes com quem o impugnante teve relações comerciais, tratam-se de correcções técnicas.”

 

quadro normativo pertinente

 

O artigo 62º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), determina sob o nº1 que “para conclusão do procedimento é elaborado um relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária”, relatório esse que “deve ser notificado ao contribuinte” nas condições previstas no nº 2 e que deverá conter, para além do mais, e para o que aqui releva, a “descrição dos factos fiscalmente relevante que alterem os valores declarados ou a declarar sujeitos a tributação, com menção e junção dos meios de prova e fundamentação legal de suporte das correcções efectuadas”, como preceitua a alínea i) do nº 3 do artigo 62º .

Esta alínea i) (conjuntamente com a h) constituirá a fundamentação das correcções que servirão de fundamento ao acto do RCPIT, actos tributários ou em matéria tributária que resultem do relatório inspectivo.

Assume-se aqui uma redobrada cautela em sede de fundamentação, a par de similar previsão que decorre do nº 1 do artigo 77º da Lei Geral Tributária:

 

Artigo 77º - Fundamentação e eficácia

 

“1.A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.

O nº 2 deste mesmo dispositivo refere expressamente que “a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável”.

As correcções técnicas (ou meramente aritméticas) levadas a cabo pela AT relativamente à matéria tributável da Requerente resultaram de uma avaliação directa tendo por base documentos, elementos contabilísticos e outros fornecidos pela Requerente ou por esta postos à disposição dos SIT (vg. Modelo 22, anexos IES e outros), tendo por fim, como se alcança do nº 1 do artigo 83º da LGT “a determinação do valor dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação.”

 

- Conforme resulta do Relatório da Inspecção Tributária parcialmente transcrito na parte que aqui releva, a AT procedeu a correcções da matéria colectável da Requerente nos termos aí explanados.

A primeira observação a registar, e como já sinalizado, é que tal apuramento (correcções) foi alcançado com recurso a avaliação directa,

E, outra questão que se afigura latente nos presentes autos, emerge do ónus de prova e da fundamentação das conclusões alcançadas no relatório da inspecção tributária.

Na verdade a Requerente suporta a sua tese nos mapas por si apresentados e das conclusões que dos mesmo retira, sem, no entanto os sustentar ou apresentar  qualquer prova documental que lhes sirvam de base, e não seria certamente através de qualquer outro meio de prova (nomeadamente testemunhal) que lograria demonstrar a justeza dos cálculos que apresenta com vista a infirmar a correcção à matéria tributável alcançada pelos SIT.

Afigura-se que a vinculação ao princípio da verdade material a que a AT está sujeita também no âmbito do artigo 6º do RCPIT onde se refere que “o procedimento de inspecção visa a descoberta de verdade material, devendo a administração tributária adoptar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objectivo”, não está posta em causa.

 

Relativamente ao segmento avaliação directa, versus avaliação indirecta convoca-se, pelo seu carácter recente e por se rever este tribunal no acerto decisório do mesmo, o acórdão proferido em 11-04-2019 pelo Tribunal Central Administrativo Sul 

“1. O lucro tributável das pessoas colectivas, como a recorrente, (e outras entidades mencionadas na alínea a) do nº 1 do artigo 3º do CIRC) é constituído pela soma algébrica do resultado do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código (artº 17º/1 CIRC e 83º/1 LGT)

2. Mas se as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo cessa a presunção de verdade e boa fé creditada às declarações dos contribuintes e aos apuramentos inscritos na sua contabilidade (artº 75º/1, 2-a) LGT).

3. E se a infidelidade contabilística tornar impossível a comprovação e  quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (artº 87º/1 a) e 88º LGT) há lugar à avaliação indirecta.

4. Nem todas as omissões, imperfeições ou deficiências da contabilidade, conduzem à tributação por métodos indirectos. A lei exige ainda que essas “falhas” sejam de tal modo graves que impossibilitem a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (Artº 87/1, b) e 88 LGT).

5. Se for possível a reconstituição dos elementos indispensáveis à exacta determinação da matéria tributável trabalhando os elementos conhecidos de forma mais rigorosa, não pode a AT lançar mão da avaliação indirecta”.

 

ónus da prova

 

As regras fundamentais em matéria de ónus da prova constam dos artigos 74º e 75º, nº 1 da LGT, sendo a regra primordial a enunciada no artigo 74º, nº1 da LGT, estabelecendo que “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recaia sobre quem os invoque.”

A aplicação desta regra reconduz-se a que a dúvida sobre a realidade de um facto se resolve contra a parte que o invoca que é a quem o facto aproveita (cfr. artigo 414º do Código de Processo Civil).

Caberia pois, no nosso entender, à Requerente alegar e sobretudo provar documentalmente como alcançou os valores com que avança e que reflecte nos “mapas” que apresenta.

 

Se, efectivamente, o artigo 75º da LGT estabelece uma presunção legal a favor do contribuinte ao estabelecer que “presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidades ou escrita, quanto estas estiverem organizadas de acordo com  a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade de gastos”. e que quem tem a seu favor uma presunção tem de provar os factos que são seus pressupostos, mas não tem que provar o facto a que ela conduz, como se expressa no artigo 350º, nº 1 do Código Civil, a verdade é que esta presunção cessa nas situações previstas no nº 2 do artigo 75º da LGT, concretamente quando “as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem  ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivos” e “o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações”.

Ora,

À semelhança do que se escreveu na decisão arbitral, proferida no âmbito do processo nº 236/2014-T de 4 de Maio de 2015, proferida no âmbito do CAAD, competirá, então evidenciar que a própria Requerente reconhecendo a existência de deficiências nos seus registos contabilísticos, conforme decorre do pedido de pronúncia arbitral,não  apresentou qualquer prova documental que pudesse suportar os cálculos que apresente dos mapas que constam  da sua petição.

Assim sendo, e retomando a decisão arbitral referida “ (…) sempre que se aplique a al. a) do nº 2 do art.75º da LGT, será sobre o contribuinte que recai o ónus de prova dos factos declarados ou inscritos na sua contabilidade ou escrita sobre que existam dúvidas probatórias” pelo que as dúvidas que no processo judicial subsistam sobre a matéria de facto, não podem considerar-se dúvidas fundadas para efeitos do nº 1 do artº 100 do CPPT (vd., assim Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, vol. II, 6ª ed., 2011, p.133).

Daí que incida sobre a Requerente o ónus da demonstração efectiva dos factos inscritos e das razões na base dos ajustamentos realizados na contabilidade, não bastando ficar a dúvida sobre a viabilidade da respectiva justificação, porquanto o nº 1 do artº 100º do CPPT tem a sua aplicação fulcral quando é a Administração Tributária a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação (cfr, assim o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26.2.2104, proc,, 0955/11)”.

 

- A Requerente, como vem dito, não logrou provar os valores que apresenta, não cumprindo o

ónus da prova que, in casu, sobre si impendia, face à assinalada cessão da presunção, face à previsão do nº 2 do artigo 75º da LGT.

 

Por outro lado, entendemos, e somos levados a concluir, que no âmbito do procedimento inspectivo a AT fez observar os princípios que enformam o procedimento de inspecção tributária, inscritos no artigo 5º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) não merecendo a sua actuação qualquer censura na situação factual subjacente, ao ter culminado com a liquidação adicional em causa nos presentes autos.

 

 

questão do pedido de substituição da liquidação aqui posta em crise

 

- Embora só suscitada/requerida em sede de alegações escritas a Requerente pretende “a anulação da nota de liquidação de IRC nº 2018 ... do exercício do exercício de 2014, e que a mesma seja substituída por outra que tenha em consideração as correcções que se demonstraram na petição inicial”.

A competência dos tribunais arbitrais que funcionam sob a égide do CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2, nº 1 do RJAT.

Aí se refere que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

a)            A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b)           A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de patrimoniais (redacção da Lei nº 64-B/2011, de 30 de Dezembro.

Para além da apreciação directa da legalidade de actos deste tipo, incluem-se ainda nas competência dos tribunais arbitrais que funcionam sob a égide do CAAD competências para apreciar actos de segundo ou terceiro grau que tenham por objecto a apreciação da legalidade de actos daqueles tipos, designadamente de actos que decidam reclamações graciosas e recursos hierárquicos, como se depreende das referências expressa que se fazem no artigo 10º, nº 1, alínea a) do RJAT ao nº 2 do artigo 102º do CPPT (que se reporta à impugnação judicial de decisões de reclamações graciosas na redacção anterior à Lei nº 82-E/2014, de 31 de Dezembro) e à “decisão do recurso hierárquico” .

Deste modo é manifesto que não se insere no âmbito desta competência emitir notas de substituição de liquidação ou sua regularização.

Com efeito, apesar de se ter vindo a entender, em sintonia  com longa jurisprudência  uniformizada do STA que, na sequência da declaração de ilegalidade de actos de liquidação, proferida em processo de impugnação judicial, podem ser proferias decisões de condenação no pagamento de juros indemnizatórios, bem como face à previsão do artigo 171º, nº 1 do CPPT, de condenação no pagamento de indemnizações por garantia indevida, a verdade é que não há qualquer suporte legal para permitir que sejam proferidas condenações de outro tipo, mesmo que sejam consequências, a nível executivo, da declaração de ilegalidade de actos de liquidação.

Face ao exposto e sem necessidade de quaisquer outras considerações o tribunal arbitral singular não conhece da pretendida “substituição” da nota de liquidação subjacente nos presentes autos.

 

juros indemnizatórios

 

A Requerente formula, em sede de alegações, pedido de juros indemnizatórios previstos no artigo 43º da LGT.

Não sendo de julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, não de pode concluir pela inexistência de pagamentos indevidos, nem a restituição da quantia paga, nem o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 43º, nº 1 da LGT.

 

III- DECISÃO

 

Face ao que vem de expor-se, decide o Tribunal Arbitral Singular em:

 

a-julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente, absolvendo-se do mesmo a Requerida,

 

b-manter na ordem jurídica os actos tributários objecto do presente processo,

 

c-condenar a Requerente no pagamento das custas processuais.

 

IV-VALOR DO PROCESSO

 

De conformidade ao estatuído nos artigos 296º.nº 1 e 2 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 47/2013, de 26 de Junho, 97º -A, nº 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 30.346,09 € (trinta mil ,trezentos e quarenta e seus euros e nove cêntimos)

 

V- CUSTAS

 

Nos termos do disposto nos artigos 12º, nº 2, 22º, nº 4 do RJAT e artigos 2º e 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e Tabela I a este anexa, fixa-se o montante de custas em 1.836,00 € (mil oitocentos e trinta e seis euros).

 

NOTIFIQUE-SE

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1, alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, com versos em branco e revisto pelo árbitro.

 

 

[A redacção da presente decisão rege-se pela grafia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que respeita às transcrições efectuadas].

 

Quatro de Outubro de dois mil e dezanove

 

 

O árbitro

(José Coutinho Pires)