Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 431/2014-T
Data da decisão: 2015-02-18  IUC  
Valor do pedido: € 3.261,72
Tema: IUC - Incompetência material do Tribunal Arbitral; caducidade do direito
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Decisão Arbitral

 

I.              RELATÓRIO

A…, LDA., sociedade com sede na Rua …, titular do número único de matrícula e de identificação de pessoa colectiva …, doravante simplesmente designada Requerente, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, adiante abreviadamente designado por RJAT), peticionando a declaração de ilegalidade e a consequente anulação dos actos de liquidação de Imposto Único de Circulação (IUC) relativos ao veículo automóvel com a matrícula ...-...-..., referentes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, no valor total de € 2.461,00, bem como das coimas aplicadas, no valor de € 576,10 e correspondentes juros compensatórios no valor global de € 224,62.

Para fundamentar o seu pedido alega, em síntese:

a)             À data da verificação do facto gerador do imposto em causa nos presentes autos, a Requerente não era proprietária do veículo automóvel sobre o qual incidiu o imposto, o qual já havia sido vendido;

b)             O veículo foi vendido em estado de sucata, não tendo circulado mais na via pública desde a data da sua alienação;

c)             O comprador do veículo não procedeu ao registo da transferência da propriedade;

d)            Nos termos do artigo 3.º do CIUC, são sujeitos passivos de imposto os proprietários dos veículos;

e)      O n.º 1 do artigo 3.º do CIUC contém uma presunção ilidível;

f)              O contrato de compra e venda tem eficácia real;

g)             O registo da propriedade automóvel não tem carácter constitutivo, visando apenas dar publicidade à situação jurídica dos bens registáveis;

h)             Assim, sujeito passivo de IUC é o proprietário, ainda que não figure no registo automóvel, desde que seja feita prova bastante para ilidir a presunção legal proveniente do registo.

i)        No caso das liquidações em crise, a Requerente não é sujeito passivo de IUC.

A Requerente juntou 7 documentos, tendo arrolado duas testemunhas.

No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, nos termos do disposto no artigo 6º nº1 do RJAT, foi designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa o signatário, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.

O tribunal arbitral foi constituído em 25 de Agosto de 2014.

Notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17º do RJAT, a Requerida apresentou resposta, defendendo-se por excepção e por impugnação, alegando, em síntese, o seguinte:

Por excepção:

a)             A data limite de pagamento das três liquidações aqui em crise era 24.02.2014;

b)             Nos termos do disposto no artigo 10.º n.º 1 alínea a) do RJAT, a Requerente dispunha do prazo de 90 dias, contado a partir da data limite de pagamento voluntário das liquidações, para deduzir o pedido de pronúncia arbitral;

c)             Assim, o prazo para apresentar o pedido de constituição do tribunal arbitral com vista à apreciação da legalidade das liquidações aqui em crise terminava em 25.05.2014;

d)            O pedido de constituição do tribunal arbitral apenas foi efectuado em 16.06.2014;

e)             Tendo sido o pedido apresentado para além do prazo legalmente previsto, os actos tributários aqui em causa já se consolidaram na ordem jurídica, não podendo, por via disso, ser objecto de apreciação pelo tribunal arbitral;

f)              A decisão de aplicação de coimas não pode ser objecto de impugnação judicial, o que resulta dos artigos 53.º e 80.º n.º 1 do RGIT;

g)             Não podendo igualmente ser objecto de apreciação pelo tribunal arbitral, o que resulta do disposto no artigo 2.º n.º 1 do RJAT.

 

Por impugnação:

a)             O legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que são sujeitos passivos do IUC os proprietários, considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados;

b)             O artigo 3.º do CIUC não estabelece qualquer presunção de propriedade, mas uma verdadeira ficção de propriedade – o legislador não diz que se presumem proprietários, antes que se consideram proprietários;

c)             A falta de inscrição no registo das alterações de propriedade tem como consequência que a obrigação de pagamento do IUC recaia no proprietário inscrito, não podendo a AT liquidar o imposto com base em elementos que não constem do registo;

d)            O IUC é devido pelas pessoas que constam no registo como proprietárias dos veículos;

e)             A factura junta pela Requerente como prova da celebração do contrato de compra e venda não é apta a fazer tal prova, por se tratar de um documento emitido unilateralmente;

f)              O documento junto pela Requerente sob o n.º 5 não é, igualmente, apto a provar o que nele vem vertido;

g)             A falta de cumprimento da obrigação de actualização do registo e de cancelamento da matrícula do veículo faz impender sobre a Requerente a responsabilidade pelas custas arbitrais.

 

A Requerida juntou cópia do processo administrativo, não tendo arrolado nenhuma testemunha.

Em resposta às excepções suscitadas pela AT, e concretamente em relação à invocada intempestividade do pedido de pronúncia arbitral, veio a Requerente alegar ter sido notificada das liquidações impugnadas por correio electrónico, sendo que só conseguiu abrir a caixa postal electrónica em 20.03.2014, pelo facto de só então o seu representante legal ter tido acesso à respectiva senha, não devendo, no entanto, ficar prejudicada no seu prazo de defesa.

Para prova do invocado, requereu o aditamento ao rol de nova testemunha.

A AT respondeu, pugnando pela ilegalidade do requerido.

 

A reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, bem como a produção da prova testemunhal requerida e as alegações orais, foram dispensadas, sem oposição das partes, atento o facto de o processo conter todos os elementos documentais necessários e suficientes para decidir de Direito.

As partes não apresentaram alegações escritas, apesar de notificadas para o efeito.

 

II.              QUESTÕES A DECIDIR

Atentas as posições assumidas pelas Partes, vertidas nos argumentos expendidos, cumpre:

a.         Conhecer da excepção de erro na forma de processo e de incompetência material do tribunal arbitral relativamente à impugnação da notificação para apresentação de defesa ou pagamento antecipado da coima;

b.        Conhecer da excepção de caducidade invocada pela AT;

c.         Apurar quem é sujeito passivo de IUC quando, na data da verificação do facto gerador do imposto, o veículo automóvel já tiver sido alienado;

d.        Apurar qual o valor jurídico do registo automóvel em sede de IUC, maxime para efeitos da incidência subjectiva do imposto;

e.         Determinar se a não actualização do registo automóvel permite considerar, como sujeitos passivos de IUC, as pessoas em nome das quais o veículo se encontra registado;

f.         Apurar se a factura junta pela Requerente é ou não apta a provar a pretensa alienação do veículo.

III.              MATÉRIA DE FACTO

a.        Factos provados

Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, deram-se como provados os seguintes factos:

1.        A Requerente foi notificada das liquidações de IUC relativas aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, referentes ao veículo com a matrícula ...-...-..., no valor global de € 2.461,00, nos termos constantes das liquidações juntas ao pedido de pronúncia arbitral sob o número 1;

2.        A data limite de pagamento do IUC era de 24.02.2014;

3.        A Requerente foi notificada para apresentar defesa ou proceder ao pagamento antecipado das coimas aplicadas, por falta de pagamento do imposto, no valor global de € 576,10, com o teor constante dos documentos juntos com a petição inicial sob os números 2 a 4;

4.        A Requerente só acedeu à sua caixa postal electrónica no dia 20.03.2014, pelo facto de só nessa data o seu representante legal ter tido acesso à respectiva senha;

5.        O pedido de constituição do tribunal arbitral em matéria tributária e de pronúncia arbitral foi apresentado em 16.06.2014;

6.        O veículo a que se alude em 1. anterior não pertence à categoria F ou G, a que alude o artigo 4.º do CIUC;

7.        Na data da ocorrência do facto gerador do imposto, havia sido já emitida, pela Requerente, uma factura de venda do veículo a que se alude em 1. anterior a terceiro.

 

b.        Factos não provados

Com relevância para a decisão não se provou qualquer outro facto.

 

c.         Fundamentação da matéria de facto

A convicção acerca dos factos tidos como provados formou-se tendo por base a prova documental junta pela Requerente, indicada relativamente a cada um dos pontos, e cuja adesão à realidade não foi questionada, bem como a matéria alegada e não impugnada constante dos requerimentos juntos aos autos.

 

IV.              SANEAMENTO

O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas.

O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.

 

V.              DO DIREITO

a.             Da matéria de excepção:

i) Do erro na forma do processo e da incompetência material do tribunal arbitral:

 

Fixada que está a matéria de facto, cumpre agora, por referência àquela, apurar o Direito aplicável.

Antes de mais, cumpre apreciar da excepção de “impropriedade parcial do pedido de pronúncia arbitral e consequente incompetência do tribunal arbitral” invocada pela Requerida.

A AT fundamenta a sua pretensão, no que a esta excepção diz respeito, no facto de a impugnação judicial da decisão de aplicação das coimas aplicadas por falta de pagamento do imposto não ser o meio adequado para reagir contra a decisão administrativa em questão, mas sim o recurso judicial para o tribunal tributário de 1.ª instância.

Cumpre, no entanto, notar que, confrontado o teor dos documentos n.ºs 2 a 4 juntos pela Requerente com a petição inicial, resulta que esta não foi notificada de qualquer decisão de aplicação de coimas, mas sim para apresentar defesa ou proceder ao pagamento antecipado da coima.

Ora, esta notificação para apresentação de defesa ou pagamento antecipado da coima não é sindicável, apenas sendo possibilitado às partes, como consta da própria notificação, apresentar defesa ou proceder ao pagamento antecipado da coima, caso em que beneficia da redução da coima para o mínimo legal e das custas processuais para metade.

Mas, ainda que se tratasse, in casu, não de uma notificação para apresentação de defesa ou pagamento antecipado da coima mas de uma decisão de aplicação da coima, ainda assim não seria esta decisão sindicável por esta via.

Com efeito, conforme resulta explícito, quer do disposto no artigo 53.º, quer no n.º 1 do artigo 80.º, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, “as decisões de aplicação de coimas e sanções acessórias podem ser objecto de recurso para o tribunal tributário de 1.ª instância”.

No mesmo sentido, define a alínea c) do artigo 101.º da Lei Geral Tributária, como meio processual tributário, “o recurso, no próprio processo, de actos de aplicação de coimas e sanções acessórias”.

Na linha do que vem dito, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 13.04.2011, processo n.º 087/11, disponível em www.dgsi.pt, que “o meio processual adequado para sindicar a decisão administrativa de aplicação de coimas é o recurso dessa decisão (artigo 80.º do RGIT e alínea c) do artigo 101.º da Lei Geral Tributária)”.

Assim, não sendo a impugnação judicial o meio processual adequado para reagir contra a decisão de aplicação de coimas por falta de pagamento de imposto, necessário será concluir que também o não seria o pedido de pronúncia arbitral apresentado, na hipótese de se tratar, in casu, de uma decisão de aplicação de coima, o que, como vimos, não sucede.

Evidenciando-se, assim, um erro na forma de processo utilizado pela Requerente.

Isto posto, dispõem o n.º 3 do artigo 97.º da LGT e o n.º 4 do artigo 98.º do CPPT que, quando o meio usado não for o adequado segundo a lei, deverá ser ordenada a correcção do processo ou a sua convolação na forma do processo adequada, nos termos da lei.

No caso, não poderia este tribunal ordenar a correcção do processo ou a sua convolação na forma do processo adequada pela razão de que a notificação efectuada à Requerente para apresentação de defesa ou pagamento antecipado da coima não ser, como já se viu, sindicável.

De qualquer forma, ainda que estivéssemos perante uma decisão de aplicação de coima, nunca poderia este tribunal arbitral ordenar tal convolação, por ser materialmente incompetente para conhecer da ilegalidade da decisão de aplicação de coimas.

 

Senão vejamos.

Prescreve a alínea a) do nº 1 do artigo 2º do RJAT que os tribunais arbitrais são competentes para apreciar as pretensões de declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta.

Por seu turno, quanto à vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais, dispõe o nº 1 do artigo 4º do citado regime que esta depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça.

A competência da instância arbitral encontra-se, assim, delimitada, pela portaria de vinculação da Administração Tributária à jurisdição do Centro de Arbitragem Administrativa (Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

Nos termos do disposto no artigo 2.º da indicada Portaria, que, de forma taxativa, regula e delimita as pretensões que podem ser submetidas à apreciação da jurisdição material, verifica-se que desse elenco não fazem parte pretensões relacionadas com a apreciação da legalidade de coimas aplicadas em processo de contra-ordenação.

Assim, ainda que estivéssemos perante uma decisão de aplicação de coima, o pedido de declaração da sua ilegalidade não estaria abrangido no âmbito de competências do tribunal arbitral.

A incompetência material configura uma incompetência absoluta que determina a absolvição da instância, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo 96.º e no n.º 1 do artigo 99.º do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

Em face do exposto, e sem necessidade de mais considerações, julga-se procedente a excepção de incompetência material do presente tribunal para conhecer da ilegalidade da notificação para apresentação de defesa ou pagamento antecipado da coima, com a consequente absolvição da instância nesta parte.

 

ii) Da intempestividade do pedido de pronúncia arbitral:

Invoca ainda a AT que, relativamente às liquidações impugnadas, se encontra ultrapassado o prazo para deduzir pedido de constituição de tribunal arbitral em matéria tributária e de pronúncia arbitral, atento o facto de o respectivo pedido ter sido apresentado já depois de decorrido o prazo de 90 dias, contado desde a data limite de pagamento do imposto, a que alude o artigo 10.º n.º 1 alínea a) do RJAT.

Com efeito, continua a AT, sendo a data limite de pagamento do imposto em causa nos presentes autos o dia 24.02.2014, o presente pedido de pronúncia arbitral deveria ter sido apresentado até ao dia 25.05.2014.

Tendo o pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral sido apresentado em 16.06.2014, já havia sido ultrapassado o indicado prazo de 90 dias, pelo que já havia caducado o direito da Requerente de peticionar a sua declaração de ilegalidade.

Conclui, peticionando seja considerado intempestivo o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, absolvendo-se, por via disso, a AT do pedido.

Em sede de resposta à excepção suscitada, defendeu-se a Requerente, invocando que apenas tomou conhecimento da notificação remetida pela AT no dia 20.03.2014, pelo facto de até àquela data o seu representante legal não ter tido acesso à senha do correio electrónico para o qual foram enviadas as liquidações impugnadas.

Termina a Requerente invocando que, tendo apenas sido notificada para proceder ao pagamento do imposto em 20.03.2014, deveria o prazo de 90 dias para apresentar o pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral começar a contar-se somente a partir dessa data, julgando-se assim a excepção invocada improcedente.

A AT respondeu a este requerimento, pugnando pela procedência da excepção invocada.

 

Cumpre decidir:

Conforme resulta dos factos provados - cfr. ponto 2 -, o imposto em causa nos presentes autos tinha como data limite de pagamento o dia 24.02.2014.

Verifica-se ainda dos factos provados que a Requerente só acedeu à caixa postal electrónica para a qual foram enviadas as liquidações em causa nos presentes autos em 20.03.2014, o que se deveu ao facto de só nessa data o respectivo representante legal ter tido acesso à correspondente senha – cfr. ponto 4 dos factos provados.

Por último, encontra-se provado que o pedido de constituição do tribunal arbitral em matéria tributária e de pronúncia arbitral foi apresentado pela Requerente em 16.06.2014 – cfr. ponto 5 dos factos provados.

Isto posto, considerando, por um lado, que a data limite de pagamento do imposto terminava no dia 24.02.2014 e, por outro, que o prazo de 90 dias estabelecido no artigo 10.º n.º 1 alínea a) do RJAT, contado desde o termo do prazo para pagamento voluntário daquelas prestações, acabava dia 25.05.2014, transferindo-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte – 26.05.2014 -, é manifesto que na data da apresentação do pedido de pronúncia arbitral – 16.06.2014 - havia já caducado o correspondente direito da Requerente.

Só assim não seria se a Requerente apenas houvesse sido notificada das respectivas liquidações após o término do prazo para a sua impugnação.

No caso dos autos, como já vimos e resultou provado – cfr. ponto 4 dos factos provados –, a Requerente acedeu à caixa de correio electrónico, tendo então tido acesso às liquidações impugnadas, no dia 20 de Março de 2014.

Nessa data não havia ainda decorrido o prazo para impugnação das liquidações, o qual, como já se viu, terminava em 26 de Maio de 2014, pelo que nada impediria a Requerente de ter impugnado as liquidações dentro do prazo legal.

Nem se diga, como defende a Requerente, que apenas tendo tido acesso à caixa de correio electrónico no dia 20.03.2014, se justificaria que o prazo de 90 dias para apresentar o pedido de pronúncia arbitral começasse a correr a partir dessa data.

Com efeito, tal consequência poderia eventualmente admitir-se no caso de o acesso tardio às liquidações ter sucedido por facto não imputável à Requerente – o que, in casu, não se verificou.

De facto, analisados os factos constitutivos do alegado impedimento, verifica-se que estes decorreram única e exclusivamente por culpa da Requerente, em virtude de uma postura pouco diligente adoptada pelo seu representante legal.

Na verdade, não é de todo aceitável que, nos tempos que correm, o representante legal de uma empresa esteja mais de dois meses sem ter acesso às notificações efectuadas via electrónica, sem tratar de assegurar o seu conhecimento por parte de outrem ou diligenciar nesse sentido, como no presente caso se veio a demonstrar.

Por outro lado, também não seria de ponderar a hipótese de justo impedimento, por duas ordens de razões: em primeiro lugar, porque à data da tomada de conhecimento das liquidações a Requerente ainda tinha prazo para apresentar o pedido de pronúncia arbitral; e em segundo, porque tal como se encontra previsto no n.º 1 do artigo 140.º do Código de Processo Civil, o justo impedimento apenas será de admitir quando seja logo invocado, apresentada a respectiva prova e praticado o acto.

Desta forma, nem sequer uma situação de justo impedimento poderia ser de admitir, por no caso sub judice, não ter o mesmo sido invocado aquando da apresentação do pedido de pronúncia arbitral pela Requerente, nem apresentada a respectiva prova.

Além disso, sempre se dirá que qualquer justo impedimento terminaria aquando da tomada de conhecimento das liquidações em crise pela Requerente, ou seja, no dia 20.03.2014.

Por onde se conclui que, mesmo nesta situação, esta estaria em prazo para deduzir o correspondente pedido de pronúncia arbitral, se assim o entendesse.

Nesta conformidade, tendo a Requerente apresentado o presente pedido de pronúncia arbitral em 16 de Junho de 2014, é manifesto já se encontrar ultrapassado o prazo legal para a respectiva impugnação.

Impõe-se, assim, concluir pela procedência da excepção de caducidade do direito de apresentação do pedido de pronúncia arbitral suscitada pela AT, com a consequente absolvição do pedido, nos termos do n.º 3 do artigo 576.º do CPC aplicável “ex vi” alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

Verificadas as indicadas excepções, fica, assim, prejudicada a apreciação do mérito da causa.

 

VI.              DISPOSITIVO

Em face do exposto, decide-se:

a.                       Julgar procedente a excepção dilatória de incompetência material deste tribunal arbitral para apreciação da legalidade da notificação para apresentação de defesa ou pagamento antecipado da coima e, em consequência, absolver da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira nessa parte;

b.                       Julgar procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de apresentação de pedido de pronúncia arbitral com vista à apreciação da legalidade das liquidações de IUC e, em consequência, absolver do pedido a Autoridade Tributária e Aduaneira nessa parte.

 

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Fixa-se o valor do processo em € 3.261,72 nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 97º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

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Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, bem como do n.º 2 do artigo 12.º e do n.º 4 do artigo 22.º, ambos do RJAT, e do n.º 4 do artigo 4.º, do citado Regulamento, a pagar pela Requerente por ser a parte vencida.

***

Registe e notifique.

Lisboa, 18 de Fevereiro de 2015.

O Árbitro,

Alberto Amorim Pereira

***

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01.

A redacção da presente decisão rege-se pela