Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 428/2017-T
Data da decisão: 2017-12-18  IRC  
Valor do pedido: € 796.398,35
Tema: IRC - Tributações autónomas – SIFIDE - Benefício fiscal - Dedução à colecta.
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Decisão Arbitral

 

 

Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelo Conselho Deontológico do CAAD), Dr. João Taborda da Gama (designado pelo Sujeito Passivo) e Dr.ª Carla Castelo Trindade (designada pela Autoridade Tributária e Aduaneira) para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 16-06-2017, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A… SGPS, S.A., pessoa colectiva n.º …, com sede na Avenida …, lote…, …, …-… Lisboa, com o capital social de € 15.700.697, doravante designada por “A…SGPS” ou “Requerente”, sociedade abrangida pelos serviços periféricos locais do Serviço de Finanças de Lisboa …, sociedade dominante e responsável pela autoliquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do Grupo (o Grupo B…) ao qual, no exercício de 2011, foi aplicável o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (“RETGS”), veio, ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 Março, requerer a Constituição de Tribunal Arbitral, tendo em vista a declaração de ilegalidade do indeferimento do pedido de revisão oficiosa que apresentou da autoliquidação de IRC, incluindo tributações autónomas, do grupo B…, relativa ao exercício de 2011, no que concerne ao montante de taxas de tributação autónoma em IRC de € 796.398,35, com a sua consequente anulação, por afastamento indevido das deduções à colecta.

A Requerente pede ainda o reembolso da referida quantia, acrescida de juros indemnizatórios à taxa legal contados, até integral reembolso, desde 01-09-2012.

Subsidiariamente, caso se entenda que o artigo 90.º do CIRC não se aplica às tributações autónomas, deverá então ser declarada a ilegalidade da liquidação das tributações autónomas (e ser consequentemente anulada) por ausência de base legal para a sua efectivação, com o consequente reembolso do mesmo montante e pagamento de juros indemnizatórios contados da mesma data.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

A Requerente designou como Árbitro o Dr. João Taborda da Gama, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b), do RJAT.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 13-07-2017.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e do n.º 3 do RJAT, e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro a Dr.ª Carla Castelo Trindade.

Os Árbitros designados pelas Partes apresentaram ao Conselho Deontológico do CAAD requerimento para designação do Árbitro Presidente, na sequência do que foi designado o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, que aceitou a designação.

Em 31-05-2017 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 19-09-2017.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, em que suscitou a excepção de incompetência absoluta e defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 24-10-2017 dispensou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidiu-se que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.

As Partes apresentaram alegações.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

Importa apreciar prioritariamente a excepção de incompetência (artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT).

 

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)      No ano de 2011, a Requerente era a sociedade dominante de um grupo de sociedades a que foi aplicável o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades RETGS, e que era composto, no aludido período de tributação, por si e pelas sociedades:

▪ C…, S.A. (“C…”), NIF…;

▪ D…, SGPS, S.A. (“D…SGPS”) NIF…;

▪ E…, S.A. (“E…”) NIF…;

▪ F…, S.A. (“F…”) NIF …;

▪ G…, S.A. (“G…”) NIF…;

▪ H…, S.A. (“H…”) NIF… (que em 2009 incorporou por fusão as seguintes sociedades: I…, S.A. NIPC: …; J…, S.A., NIPC: …; K…, S.A., NIPC: …; L…, S.A.. NIPC: …. E que em 28 de Junho de 2011, o ano do próprio exercício fiscal aqui em causa, esta sociedade alterou a sua firma para M…, S.A.;

▪ N…, Lda. (“N…”) NIF…;

▪ O…, SGPS, S.A. (“O…”) NIF …;

▪ P…, S.A. (“P…”) NIF…;

▪ Q…, S.A. (“Q…”) NIF …;

▪ R…, S.A. (“R…”) NIF …;

▪ S…, S.A. (S…”) NIF …;

 

b)      Em 29-05-2012, a ora Requerente procedeu à apresentação da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, com referência ao período de tributação de 2011, do Grupo Fiscal de sociedades do qual é sociedade dominante, que consta do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, tendo procedido à autoliquidação de tributações autónomas em IRC desse mesmo ano de 2011, no montante de € 796.398,35, tendo ainda apresentado declaração de substituição que nada alterou a este respeito (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

c)      O montante das tributações autónomas referidas reporta-se aos seguintes tipos de despesas e encargos:

(documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

d)      A Requerente indicou na declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2011 que detinha créditos fiscais de SIFIDE, disponíveis para utilização no montante de € 6.835.337,30 (campo 709 do anexo D da declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2012, que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

e)      No exercício de 2012, a Requerente deduziu € 970.970,30 de créditos do SIFIDE, (campo 711 do anexo D da declaração modelo 22 que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral);

f)       No exercício de 2013, a Requerente não deduziu benefícios fiscais (declaração modelo 22 que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral);

g)       No exercício de 2014, a Requerente deduziu € 377.001,00 dos créditos que detinha no final do exercício de 2011 (campo 711 do anexo D da declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2014, que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, e documento n.º 8, não impugnado);

h)      No exercício de 2015, a Requerente deduziu € 2.989.277,24 de créditos do SIFIDE que detinha no final do exercício de 2011 (campo 711 do anexo D da declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2015, que consta do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e documento n.º 8, não impugnado);

i)       A Requerente entendeu que os créditos referidos podem ser deduzidos à colecta de tributações autónomas em IRC apuradas nesse mesmo ano, no montante de € 796.398,35, tendo apresentado em 02-04-2015 um pedido de revisão oficiosa da autoliquidação com esse fundamento (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

j)       O pedido de revisão oficiosa foi indeferido por despacho da Senhora Subdirectora de Serviços da DSIRC de 24-03-2017, que manifesta concordância com os fundamentos da informação que consta do documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

Em face do disposto no n.º 2, do artigo 90.º, do Código do IRC, maxime, na sua então alínea b) - atual alínea c) -, prevê-se que à colecta apurada seja efectuada a dedução relativa a benefícios fiscais. A ora Requerente pretende que as tributações autónomas sejam qualificadas como IRC para efeitos da mencionada dedução e, partindo desse pressuposto, que o valor dos benefícios fiscais (SIFIDE), dedutíveis à colecta, que deixaram de ser deduzidos por alegada insuficiência desta ultima, sejam deduzidos à parcela da colecta de IRC correspondente às tributações autónomas apuradas e pagas.

Recorde-se que o SIF/DE (Sistema de Incentivos Fiscais à I&D Empresarial), aprovado pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, permite às empresas a obtenção de um benefício fiscal, em sede de IRC, proporcional à despesa de investimento em investigação e desenvolvimento que consigam evidenciar, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido.

Traduzindo-se, no essencial, na possibilidade de deduzir à colecta de IRC apurada no período de tributação, o montante de crédito fiscal apurado, e sendo que as despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no período em que foram realizadas, o possam ser em períodos seguintes.

No que aqui pode interessar, quanto ao regime aprovado pela já mencionada Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, importa rememorar o seguinte:

«Artigo 4. º

Âmbito da dedução

1 - Os sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam, a título principal ou não, uma actividade de natureza agrícola, industrial, comercial e de serviços e os não residentes com estabelecimento estável nesse território podem deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até a sua concorrência, 0 valor Correspondente às despesas com investigação e desenvolvimento, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido, realizadas nos períodos de tributação de 1 de Janeiro de 2011 a 31 de Dezembro de 2015, numa dupla percentagem:

a) Taxa de base - 32,5 % das despesas realizadas naquele período;

b) Taxa incremental - 50 % do acréscimo das despesas realizadas naquele período em relação à média aritmética simples dos dois exercícios anteriores, até ao limite de (euro) 1 500 000.

(...)

3 - A dedução é feita, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior.

4 - As despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no exercício em que foram realizadas podem ser deduzidas até ao sexto exercício imediato››.

 

Vimos que a Requerente sustenta que o valor dos benefícios fiscais (SIFIDE) deve ser deduzido à parcela da colecta de IRC correspondente às tributações autónomas apuradas na esfera individual de cada uma das sociedades que originaram o pagamento desses benefícios.

Ora, cumpre recordar que a sujeição de determinadas despesas a tributação autónoma foi trazida pelo Decreto-Lei n.º 192/90, de 2 de Junho, a propósito das despesas confidenciais ou não documentadas incorridas pelas empresas. Com a reforma fiscal de 2001 quanto às despesas de representação e com viaturas. E, posteriormente, a leque diversificado de situações. Como sublinhou o Tribunal Constitucional, e que acompanhamos de mão-cheia, ‹‹a tributação autónoma, não incidindo directamente sobre um lucro, terá insira a ideia de desmotivar uma prática que, para além de afectar ci igualdade na repartição de encargos públicos, poderá envolver situações de ilicitude penal ou de menor transparência fiscal» (Acórdão de 12 de Janeiro de 2011 ~ Proc. n.º 204/2010).

Atenta a novel redacção do artigo 88.º, n.º 21, do Código do IRC, introduzida pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março (que aprovou o Orçamento do Estado para 2016), observa-se que o legislador não consente quaisquer deduções ao montante global apurado na tributação autónoma. E, no artigo 135.º, da referida Lei, assinala-se que esta redacção tem natureza interpretativa.

Sem conceder, esta interpretação já antes vinha fazendo o seu caminho.

Ainda recentemente, o Pleno do Tribunal Constitucional sancionou que «embora a tributação de determinados encargos esteja formalmente inserida no Código do IRC e o respetivo montante seja liquidado no âmbito daquele imposto, tal tributação é uma imposição fiscal materialmente distinta da tributação em IRC. Enquanto aquela incide, excecionalmente, sobre a realização de determinadas despesas, a última incide sobre determinados rendimentos, funcionando apenas como elo entre eles a circunstância dessas despesas serem dedutíveis no apuramento destes rendimentos, visando-se com a criação daquele imposto reduzir a vantagem fiscal resultante de dedução desses custos. Mas a existência do imposto aqui em análise em nada influi no montante do IRC, atuando de forma perfeitamente autónoma relativamente a este, pelo que o seu funcionamento deve ser encarado somente segundo os elementos que o caracterizam» (Acórdão de 19 de Dezembro de 2012 Proc. n.º150/12).

Como sublinha PAULO MARQUES, «traduz-se num pagamento autónomo, ou seja, independentemente da existência ou não de matéria colectável (artigos 88.º do CIRC e 73.º, do CIRS), daí a sua difícil compatibilidade com o princípio constitucional da tributação segundo 0 rendimento real (artigo 104. º, n.º 2, da Constituição)››. Acrescentando oportunamente que «No entanto, quanto a nos erradamente, a alínea a), do n.º 1, do artigo 23.º-A, do CIRC refere ‹‹O IRC, incluindo as tributações autónomas››. Entendemos que a tributação autónoma incide sobre uma despesa concreta, não se confundindo com o IRC, imposto que incide sobre o lucro da empresa››.

Na mesma senda, ANA PAULA DOURADO: «A tributação autónoma nos arts. 88.º do CIRC e 73.º do CIRS cria uma responsabilidade tributária e por isso não assenta nos métodos directos de tributação, ou seja, não assenta na tributação do rendimento acréscimo ou rendimento real líquido››.

Aqui chegados, podemos constatar que a tributação autónoma não partilha com o IRC de uma incidência tributária sobre o rendimento, nem da sua natureza periódica.

Esta tributação consubstancia-se numa obrigação única, pois incide sobre factos tributários instantâneos e autónomos, que se esgotam em actos de realização de determinadas realidades, sem mais. Factos formados por um único acontecimento (despesa ou encargo). Nesse momento dando origem ao imposto, o que não se confunde com o momento em que o imposto é devido. Ou seja, independentemente do momento em que o facto tributário vem a ser relevado em termos de declaração ou de liquidação do imposto.

Assim, o IRC contempla um elemento de obrigação única, que se traduz nas taxas de tributação autónoma do IRC, conforme a nossa melhor doutrina tem expendido. E, outrossim, a nossa jurisprudência mais qualificada - por todos, veja-se o Acórdão 85/2013, de 5 de Fevereiro, referente ao Processo n.º 121/2012, do Plenário do Tribunal Constitucional, já invocado.

Não obstante a liquidação apurada no fim do período, temos uma tributação caso a caso, ou avulsa nos seus factos, não se dando por razões de substância a sua agregação para efeitos de liquidação mas apenas de mera comodidade e facilidade para os sujeitos passivos. Acompanhamos por inteiro o entendimento do Tribunal Constitucional n.º 617/2012, de 19 de Dezembro (Proc. n.º 150/12), que em Plenário sancionou que «Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efectuadas na determinação da taxa››.

Ademais e por exemplo, pelo artigo 12.º, do Código do IRC, as sociedades e outras entidades abrangidas pelo regime de transparência fiscal (artigo 6.º) não são tributadas em IRC, mas sim quanto à tributação autónoma. Se o legislador não entendesse as duas liquidações como realidades distintas, a não sujeição a uma importaria a mesma solução para a outra.

No que respeita às despesas com investigação e desenvolvimento (SIFIDE), vimos que as mesmas, quando por insuficiência de colecta não possam ser deduzidas no período de tributação em que foram realizadas, ainda assim poderão ser deduzidas até ao sexto período imediato.

Retenha-se que nos períodos de tributação a regra é a da anualidade (artigo 8.º, do Código), e cada um tem independência face aos restantes para efeito de tributação. Não obstante, em alguns casos, excepcionalmente, esta independência cede perante uma solidariedade entre períodos sucessivos. Por exemplo, quando o legislador permite que passam valer num determinado período os prejuízos sofridos no passado, em períodos anteriores, através da sua dedução aos lucros tributáveis, caso existam. E isto é assim porque a segmentação artificial e estática num período, para efeitos fiscais, não vai a par com a fluência ininterrupta da actividade empresarial, prosseguindo o legislador ordinário a tributação pelo rendimento real, estribando-se no comando do artigo 104.º, n.º 2, da Constituição.

Ora, no caso da dedução das despesas com investigação e desenvolvimento não se alcança como uma tal solidariedade entre períodos sucessivos possa ater-se à tributação autónoma, se nesta última, desde logo, falta a periodicidade na caracterização da própria obrigação tributária. Se antes se revela como de obrigação única, avulsa e isolada ou autónoma, não existe qualquer segmentação artificial e estática num período, para efeitos fiscais, como qualquer afloramento da continuidade da empresa e da sua actividade, tomada em consideração pelo legislador (carry forward), mas apenas, como já se aludiu, uma agregação por mera comodidade e facilidade para os sujeitos passivos. E «daí a sua difícil compatibilidade com o princípio constitucional da tributação segundo o rendimento real (artigo 104.º, n.º 2, da Constituição)››.

Num afloramento da continuidade da empresa e da sua actividade, tomada em consideração pelo legislador (carry forward). As perdas não recuperadas num período de tributação são comunicáveis aos ganhos obtidos noutros nos posteriores.

Fazendo com que os resultados positivos contabilizados vão compensar os prejuízos obtidos em períodos anteriores.

Em face de todo o antedito, não vemos pois como uma dedução à colecta - neste caso, ao abrigo do disposto no artigo 90.º, n.º 2, na sua então alínea b) – atual alínea c) - possa ou deva fazer-se repercutir, não apenas quanto ao IRC (sobre o rendimento de natureza periódica) mas também quanto a uma tributação nominalmente agregada de despesas avulsas entre si e que correm à margem do IRC, e que por essa razão o legislador quis denominar por tributação autónoma, revestindo-a de um cariz desincentivador ou anti-abuso.

Em suma, em homenagem ao disposto no artigo 11.º, n.º 3, da LGT, sobre a interpretação de normas tributárias, «Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários››. Ora, já se expendeu, dúvidas não existem de que a materialidade subjacente a tributação autónoma e distinta da do IRC. Devendo, aos nossos olhos, o desigual ser tratado como desigual, sob pena de grave postergação, justamente, do princípio da igualdade.

Não devendo as tributações autónomas ser consideradas para efeitos das deduções referidas no n.º 2, do artigo 90.º, do Código do IRC, prejudicada fica o pedido de reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, efectuado pela Requerente.

Donde que resulta incólume a validade legal do objecto revidendo (autoliquidação), e não sendo de atender ao requerido no Pedido de Revisão.

DAS CONCLUSOES:

De todo o atrás explanado resultam as seguintes conclusões:

·         Pela redacção, com natureza interpretativa, do artigo 88.º, n.º 21, do Código do IRC, introduzida pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março (que aprovou o Orçamento do Estado para 2016), o legislador obsta a quaisquer deduções ao montante global apurado na tributação autónoma;

·         A tributação autónoma não partilha com o IRC de uma incidência tributária sobre o rendimento, nem da sua natureza periódica, donde que não deve ser considerada para efeitos da dedução referida na sua então alínea b) - atual alínea c) -, do n.º 2, do artigo 90.º, do Código do IRC;

·         Consequentemente, fica prejudicado o pedido de reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, efectuado pela Requerente.

DA PROPOSTA:

Somos do entendimento de que o Pedido de Revisão deve ser indeferido.

 

k)       O sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira não permite deduzir os montantes de benefícios fiscais à colecta derivada de tributações autónomas;

l)       Em 25-10-2011 e a 05-04-2012, a Requerente tinha situação tributária regularizada perante a Autoridade Tributária e Aduaneira (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

m)   Em 18-01-2012 e 13-04-2012, a Requerente tinha a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

n)      As sociedades ▪ E…, S.A. (“E…”) NIF…, G…, S.A. (“G…”) NIF …, H…, S.A. (“H…”) NIF…, P…, S.A. (“P…”) NIF … e Q…, S.A. (“Q…”) NIF … tinham as suas situações tributárias e contributivas regularizadas nas datas a que se reportam as respectivas certidões que constam do documento n.º 11 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;

o)      No exercício de 2011, foi autoliquidado imposto a recuperar (campo 368 da declaração modelo 22);

p)      Em 12-07-2017, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

 

2.2. Factos não provados

 

Não se provou se a Requerente tem créditos do SIFIDE por utilizar que eram detidos em final do exercício de 2011.

Por um lado, o valor que a Requerente indica no artigo 16.º do pedido de pronúncia arbitral como disponível para utilização, não é o que se refere no documento n.º 8, que junta como prova.

Por outro lado, não foi junta aos autos declaração modelo 22 relativa ao exercício de 2016 (apesar de já ter decorrido o prazo legal para a sua apresentação quando foi apresentado o pedido de pronúncia arbitral), pelo que não se pode concluir se foram utilizados créditos do SIFIDE neste exercício.

 

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente e que constam também do processo administrativo.

Quanto ao facto relativo ao sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira, não é questionado por esta.

 

3. Excepção da incompetência material do tribunal arbitral decorrente da circunstância do pedido de pronúncia arbitral ter sido formulado na sequência de indeferimento de pedido de revisão oficiosa ( [1] )

 

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende, em suma, que o artigo 2.º, alínea a) da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, através da qual a Autoridade Tributária e Aduaneira ficou vinculada à jurisdição arbitral exclui as pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa, através de reclamação graciosa, nos termos do artigo 131.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no art. 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT).

Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária foi vinculada àquela jurisdição pela Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o art. 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos».

Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele art. 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este Tribunal Arbitral.

Na alínea a) do art. 2.º desta Portaria n.º 112-A/2011, excluem-se expressamente do âmbito da vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário».

A referência expressa ao precedente «recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário» deve ser interpretada como reportando-se aos casos em que tal recurso é obrigatório, através da reclamação graciosa, que é o meio administrativo indicado naqueles artigos 131.º a 133.º do CPPT, para que cujos termos se remete. Na verdade, desde logo, não se compreenderia que, não sendo necessária a impugnação administrativa prévia «quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária» (art. 131.º, n.º 3, do CPPT, aplicável aos casos de retenção na fonte, por força do disposto no n.º 6 do art. 132.º do mesmo Código), se fosse afastar a jurisdição arbitral por essa impugnação administrativa, que se entende ser desnecessária, não ter sido efectuada.

No caso em apreço, é pedida a declaração de ilegalidade de acto de autoliquidação, na sequência do indeferimento de um pedido de revisão de actos tributários efectuado após o decurso do prazo de dois anos previstos no artigo 132.º, a que se seguiu recurso hierárquico.

Assim, importa, antes de mais, esclarecer se a declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão do acto tributário, previstos no art. 78.º da LGT, se inclui nas competências atribuídas aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD pelo art. 2.º do RJAT.

Na verdade, neste art. 2.º não se faz qualquer referência expressa a estes actos, ao contrário do que sucede com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, que refere os «pedidos de revisão de actos tributários» e «os actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação».

No entanto, a fórmula «declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT não restringe, numa mera interpretação declarativa, o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado directamente um acto de um daqueles tipos. Na verdade, a ilegalidade de actos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um acto de segundo grau, que confirme um acto de liquidação, incorporando a sua ilegalidade.

A inclusão nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD dos casos em que a declaração de ilegalidade dos actos aí indicados é efectuada através da declaração de ilegalidade de actos de segundo grau, que são o objecto imediato da pretensão impugnatória, resulta com segurança da referência que naquela norma é feita aos actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, que expressamente se referem como incluídos entre as competências dos tribunais arbitrais. Com efeito, relativamente a estes actos é imposta, como regra, a reclamação graciosa necessária, nos artigos 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes casos, o objecto imediato do processo impugnatório é, em regra, o acto de segundo grau que aprecia a legalidade do acto de liquidação, acto aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do acto de liquidação. A referência que na alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do RJAT se faz ao n.º 2 do art. 102.º do CPPT, em que se prevê a impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, desfaz quaisquer dúvidas de que se abrangem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos actos referidos na alínea a) daquele art. 2.º do RJAT tem de ser obtida na sequência da declaração da ilegalidade de actos de segundo grau.

Aliás, foi precisamente neste sentido que o Governo, na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, interpretou estas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, ao afastar do âmbito dessas competências as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», o que tem como alcance restringir a sua vinculação os casos em que esse recurso à via administrativa foi utilizado.

Obtida a conclusão de que a fórmula utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT não exclui os casos em que a declaração de ilegalidade resulta da ilegalidade de um acto de segundo grau, ela abrangerá também os casos em que o acto de segundo grau é o de indeferimento de pedido de revisão do acto tributário, pois não se vê qualquer razão para restringir, tanto mais que, nos casos em que o pedido de revisão é efectuado no prazo da reclamação graciosa, ele deve ser equiparado a uma reclamação graciosa. ( [2] )

O mesmo sucede com a decisão do recurso hierárquico, expressamente indicada na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT como termo inicial do prazo de apresentação de pedido de constituição do tribunal arbitral.

A referência expressa aos artigos 131.º a 133.º do CPPT que se faz no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 não pode ter o alcance decisivo de afastar a possibilidade de apreciação de pedidos de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa de actos dos tipos aí referidos.

Na verdade, a interpretação exclusivamente baseada no teor literal que defende a Autoridade Tributária e Aduaneira no presente processo não pode ser aceite, pois na interpretação das normas fiscais são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis (artigo 11.º, n.º 1, da LGT) e o artigo 9.º n.º 1, proíbe expressamente as interpretações exclusivamente baseadas no teor literal das normas ao estatuir que «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei», devendo, antes, «reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada».

Quanto a correspondência entre a interpretação e a letra da lei, basta «um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil) o que só impedirá que se adoptem interpretações que não possam em absoluto compaginar-se com a letra da lei, mesmo reconhecendo nela imperfeição na expressão da intenção legislativa.

Por isso, a letra da lei não é obstáculo a que se faça interpretação declarativa, que explicite o alcance do teor literal, nem mesmo interpretação extensiva, quando se possa concluir que o legislador disse menos do que o que, em coerência, pretenderia dizer, isto é, quando disse imperfeitamente o que pretendia dizer. Na interpretação extensiva «é a própria valoração da norma (o seu “espírito”) que leva a descobrir a necessidade de estender o texto desta à hipótese que ela não abrange», «a força expansiva da própria valoração legal é capaz de levar o dispositivo da norma a cobrir hipóteses do mesmo tipo não cobertas pelo texto». ( [3] )

A interpretação extensiva, assim, é imposta pela coerência valorativa e axiológica do sistema jurídico, erigida pelo artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil em critério interpretativo primordial pela via da imposição da observância do princípio da unidade do sistema jurídico.

É manifesto que o alcance da exigência de reclamação graciosa prévia, necessária para abrir a via contenciosa de impugnação de actos dos tipos referidos nos artigos 131.º a 133.º do CPPT, tem como única justificação o facto de relativamente a esse tipo de actos não existir uma tomada de posição da Administração Tributária sobre a legalidade da situação jurídica criada com o acto, posição essa que até poderá vir a ser favorável ao contribuinte, evitando a necessidade de recurso à via contenciosa.

Na verdade, além de não se vislumbrar qualquer outra justificação para a essa exigência, o facto de estar prevista reclamação graciosa necessária para impugnação contenciosa de actos de retenção na fonte e de pagamento por conta (nos artigos 132.º, n.º 3, e 133.º, n.º 2, do CPPT), que têm de comum com os actos de autoliquidação a circunstância de também não existir uma tomada de posição da Administração Tributária sobre a legalidade dos actos, confirma que é essa a razão de ser daquela reclamação graciosa necessária.

Uma outra confirmação inequívoca de que é essa a razão de ser da exigência de reclamação graciosa necessária encontra-se no n.º 3 do artigo 131.º do CPPT, ao estabelecer que «sem prejuízo do disposto nos números anteriores, quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o prazo para a impugnação não depende de reclamação prévia, devendo a impugnação ser apresentada no prazo do n.º 1 do artigo 102.º», regime este que é aplicável aos actos de retenção na fonte por remissão do n.º 6 do artigo 132.º do CPPT. Na verdade, em situações deste tipo, houve uma pronúncia prévia genérica da Administração Tributária sobre a legalidade da situação jurídica criada com o acto de autoliquidação ou retenção na fonte e é esse facto que explica que deixe de exigir-se a reclamação graciosa necessária.

Ora, nos casos em que é formulado um pedido de revisão oficiosa de acto de autoliquidação ou retenção na fonte é proporcionada à Administração Tributária, com este pedido, uma oportunidade de se pronunciar sobre o mérito da pretensão do sujeito passivo antes de este recorrer à via jurisdicional, pelo que, em coerência com as soluções adoptadas nos n.ºs 1 e 3 do artigo 131.º e 3 e 6 do artigo 132.º do CPPT, não pode ser exigível que, cumulativamente com a possibilidade de apreciação administrativa no âmbito desse procedimento de revisão oficiosa, se exija uma nova apreciação administrativa através de reclamação graciosa. ( [4] )

Por outro lado, é inequívoco que o legislador não pretendeu impedir aos contribuintes a formulação de pedidos de revisão oficiosa nos casos de actos de autoliquidação, pois estes foram expressamente referidos no n.º 2 do artigo 78.º da LGT e no n.º 2 do artigo 54.º da mesma Lei estabelece-se a aplicabilidade à autoliquidação e à retenção na fonte das garantias dos contribuintes previstas no n.º 1, em que se inclui a revisão oficiosa.

E aos actos de autoliquidação, praticados pelo sujeito passivo, são equiparáveis, por mera interpretação declarativa, os de retenção na fonte que são praticados pelo substituto tributário, que é considerado sujeito passivo (artigo 18.º, n.º 3, da LGT).

Neste contexto, permitindo a lei expressamente que os contribuintes optem pela reclamação graciosa ou pela revisão oficiosa de actos de autoliquidação e retenção na fonte e sendo o pedido de revisão oficiosa formulado no prazo da reclamação graciosa perfeitamente equiparável a uma reclamação graciosa, como se referiu, não pode haver qualquer razão que possa explicar que não possa aceder à via arbitral um contribuinte que tenha optado pela revisão do acto tributário em vez da reclamação graciosa.

Por isso, é de concluir que os membros do Governo que emitiram a Portaria n.º 112-A/2011, ao fazerem referência aos artigos 131.º a 133.º do CPPT, disseram imperfeitamente o que pretendiam, pois, pretendendo impor a apreciação administrativa prévia à impugnação contenciosa de actos dos tipos referidos, acabaram por incluir referência aos artigos 131.º a 133.º que não esgotam as possibilidades de apreciação administrativa desses actos.

Aliás, é de notar que esta interpretação não se cingindo ao teor literal até se justifica especialmente no caso da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, por serem evidentes as suas imperfeições: uma, é associar a fórmula abrangente «recurso à via administrativa» (que referencia, além da reclamação graciosa, o recurso hierárquico e a revisão do acto tributário) à «expressão nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», que tem potencial alcance restritivo à reclamação graciosa; outra é utilizar a fórmula «precedidos» de recurso à via administrativa, reportando-se às «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos», que, obviamente, se coadunariam muito melhor com a feminina palavra «precedidas».

Por isso, para além da proibição geral de interpretações limitadas à letra da lei que consta do artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil, no específico caso da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 há uma especial razão para não se justificar grande entusiasmo por uma interpretação literal, que é o facto e a redacção daquela norma ser manifestamente defeituosa.

Para além disso, assegurando a revisão do acto tributário a possibilidade de apreciação da pretensão do contribuinte antes do acesso à via contenciosa que se pretende alcançar com a impugnação administrativa necessária, a solução mais acertada, porque é a mais coerente com o desígnio legislativo de «reforçar a tutela eficaz e efectiva dos direitos e interesses legalmente protegidos dos contribuintes» manifestado no n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, é a admissibilidade da via arbitral para apreciar a legalidade de actos de liquidação previamente apreciada em procedimento de revisão.

E, por ser a solução mais acertada, tem de se presumir ter sido normativamente adoptada (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil).

Por outro lado, contendo aquela alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 uma fórmula imperfeita, mas que contém uma expressão abrangente «recurso à via administrativa», que potencialmente referencia também a revisão do acto tributário, encontra-se no texto o mínimo de correspondência verbal, embora imperfeitamente expresso, exigido por aquele n.º 3 do artigo 9.º para a viabilidade da adopção da interpretação que consagre a solução mais acertada.

É de concluir, assim, que o artigo 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011, devidamente interpretado com base nos critérios de interpretação da lei previstos no artigo 9.º do Código Civil e aplicáveis às normas tributárias substantivas a adjectivas, por força do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da LGT, viabiliza a apresentação de pedidos de pronúncia arbitral relativamente a actos de retenção na fonte que tenham sido precedidos de pedido de revisão oficiosa.

No que concerne à alegação da Autoridade Tributária e Aduaneira de que assim não «se entender, tal interpretação ser não só ilegal, mas manifestamente inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como da legalidade (cf. artigos 3.º, n.º 2, e 266.º, n.º 2, ambos da CRP), como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT, que vinculam o legislador e toda a atividade da AT».

Na verdade, a Constituição não impõe que a interpretação dos diplomas normativos tenha de cingir-se ao teor literal e, no caso em apreço, como se explicou, devidamente interpretadas as normas do artigo 2.º, n.º 1, do RJAT e do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, conclui-se que a vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD abrange os casos em que actos de autoliquidação foram precedidos de pedidos de revisão oficiosa. Por isso, a interpretação que se fez não aumentou a vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira em relação ao que está regulamentado, antes definiu exactamente os seus termos, que resultam do diploma regulamentar.

Por outro lado, ao interpretar e aplicar as normas jurídicas, este Tribunal Arbitral está a desempenhar a função que lhe está constitucionalmente atribuída (artigos 202.º, n.º 1, 203.º e 209.º, n.º 2, da CRP), pelo que nem se vislumbra como possa existir violação dos princípios da separação de poderes, do Estado de Direito e da legalidade, pois o decidido por este tribunal evidencia, precisamente, a perfeita concretização desses princípios: a Assembleia da República autorizou o Governo a legislar (artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril); o Governo, no uso de poderes legislativos, emitiu o RJAT; a Administração, através de dois membros do Governo, emitiu a Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março; o Tribunal Arbitral interpretou e aplicou os diplomas normativos referidos.

No que respeita ao princípio da legalidade, traduz-se no cumprimento da lei, na interpretação que dela for feita pelos tribunais, que se impõe às interpretações dos outros órgãos estaduais (artigo 205.º, n.º 2, da CRP). É precisamente a aplicação da legalidade que se faz ao reconhece a competência dos tribunais arbitrais para o conhecimento de pedidos de declaração de ilegitimidade de actos de autoliquidação precedidos de acesso à via administrativa através de pedido de revisão oficiosa.

Quanto à invocação do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, definido no artigo 30.º, n.º 2, da LGT, em que se refere que «o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributário», tratar-se-á, decerto, de lapso, já que ao decidir sobre a sua competência o Tribunal Arbitral não está a praticar qualquer acto de disposição de qualquer crédito.

Por outro lado, a Autoridade Tributária e Aduaneira nem sequer identifica qual é o crédito de que seja titular que esteja a ser objecto de disposição pelo Tribunal Arbitral.

Para além disso, o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários aplica-se à Administração e não aos Tribunais, como entendeu o Tribunal Constitucional, na esteira da generalidade da doutrina. ( [5] )

Improcede, assim, esta excepção de incompetência com fundamento na não apresentação de reclamação graciosa da autoliquidação.

Essencialmente neste sentido, relativamente a actos de autoliquidação, pode ver-se o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 27-04-2017, proferido no processo n.º 08599/15.

 

 

4. Matéria de direito

 

A questão que é objecto do processo é a de saber se as despesas de investimento que beneficiam do SIFIDE podem ser deduzidas às quantias devidas a título de tributações autónomas em IRC relativas ao exercício de 2011.

 

 

4.1. Aplicabilidade dos artigos 89.º e 90.º do CIRC ao cálculo das tributações autónomas

 

Os artigos 89.º e 90.º do CIRC estabelecem o seguinte, na redacção da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril:

 

 

Artigo 89.º

 

Competência para a liquidação

 

A liquidação do IRC é efectuada:

a) Pelo próprio sujeito passivo, nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º;

b) Pela Direcção-Geral dos Impostos, nos restantes casos.

 

Artigo 90.º

 

Procedimento e forma de liquidação

 

1 - A liquidação do IRC processa-se nos seguintes termos:

a) Quando a liquidação deva ser feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º, tem por base a matéria colectável que delas conste;

b) Na falta de apresentação da declaração a que se refere o artigo 120.º, a liquidação é efectuada até 30 de Novembro do ano seguinte àquele a que respeita ou, no caso previsto no n.º 2 do referido artigo, até ao fim do 6.º mês seguinte ao do termo do prazo para apresentação da declaração aí mencionada e tem por base o valor anual da retribuição mínima mensal ou, quando superior, a totalidade da matéria colectável do exercício mais próximo que se encontre determinada;

c) Na falta de liquidação nos termos das alíneas anteriores, a mesma tem por base os elementos de que a administração fiscal disponha.

2 – Ao montante apurado nos termos do número anterior são efectuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada:

a) A correspondente à dupla tributação internacional;

b) A relativa a benefícios fiscais;

c) A relativa ao pagamento especial por conta a que se refere o artigo 106.º;

d) A relativa a retenções na fonte não susceptíveis de compensação ou reembolso nos termos da legislação aplicável.

 

3 – (Revogado pela da Lei n.º 3-B/2010)

4 – Ao montante apurado nos termos do n.º 1, relativamente às entidades mencionadas no n.º 4 do artigo 120.º, apenas é de efectuar a dedução relativa às retenções na fonte quando estas tenham a natureza de imposto por conta do IRC.

5 – As deduções referidas no n.º 2 respeitantes a entidades a que seja aplicável o regime de transparência fiscal estabelecido no artigo 6.º são imputadas aos respectivos sócios ou membros nos termos estabelecidos no n.º 3 desse artigo e deduzidas ao montante apurado com base na matéria colectável que tenha tido em consideração a imputação prevista no mesmo artigo.

6 – Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções referidas no n.º 2 relativas a cada uma das sociedades são efectuadas no montante apurado relativamente ao grupo, nos termos do n.º 1.

7 – Das deduções efectuadas nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 2 não pode resultar valor negativo.

8 – Ao montante apurado nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 apenas são feitas as deduções de que a administração fiscal tenha conhecimento e que possam ser efectuadas nos termos dos n.ºs 2 a 4.

9 – Nos casos em que seja aplicável o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 79.º, são efectuadas anualmente liquidações com base na matéria colectável determinada com carácter provisório, devendo, face à liquidação correspondente à matéria colectável respeitante a todo o período de liquidação, cobrar-se ou anular-se a diferença apurada.

10 – A liquidação prevista no n.º 1 pode ser corrigida, se for caso disso, dentro do prazo a que se refere o artigo 101.º, cobrando-se ou anulando-se então as diferenças apuradas.

 

Os referidos artigos 89.º e 90.º do CIRC, bem como outras normas deste Código, como as relativas as declarações previstas nos artigos 120.º e 122.º, são aplicáveis às tributações autónomas.

Na verdade, é hoje pacífico, na sequência de inúmera jurisprudência arbitral e das posições assumidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que o imposto cobrado com base em tributações autónomas previstas no CIRC tem a natureza de IRC. De resto, para além da jurisprudência, o artigo 23.º-A n.º 1, alínea a), do CIRC, na redacção da Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, não deixa hoje margem para qualquer dúvida razoável, corroborando o que já anteriormente resultava do teor literal do artigo 12.º do mesmo Código.

Ora, o artigo 90.º do CIRC refere-se às formas de liquidação do IRC, pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária, aplicando-se ao apuramento do imposto devido em todas as situações previstas no Código.

Por isso, aquele artigo 90.º aplica-se também à liquidação do montante das tributações autónomas, que é apurado pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária, na sequência da apresentação ou não de declarações, não havendo qualquer outra disposição que preveja termos diferentes para a sua liquidação.

Assim, as diferenças entre a determinação do montante resultante de tributações autónomas e o resultante do lucro tributável restringem-se à determinação da matéria tributável e às taxas aplicáveis, que são as previstas nos Capítulos III e IV do CIRC para o IRC que tem por base o lucro tributável e no artigo 88.º do CIRC para o IRC que tem por base a matéria tributável das tributações autónomas e as respectivas taxas.

Mas, as formas de liquidação que se prevêem no Capítulo V do mesmo Código são de aplicação comum às tributações autónomas e à restante matéria tributável de IRC.

No entanto, a circunstância de uma autoliquidação de IRC, efectuada nos termos do n.º 1 do artigo 90.º, poder conter vários cálculos parciais com base em várias taxas aplicáveis a determinadas matérias colectáveis não implica que haja mais que uma liquidação, como resulta dos próprios termos daquela norma ao fazer referência a «liquidação», no singular, em todos os casos em que é «feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º», tendo «por base a matéria colectável que delas conste» (seja a determinada com base nas regras dos artigos 17.º e seguintes seja a determinada com base nas várias situações previstas no artigo 88.º).

Aliás, não são apenas as liquidações previstas no artigo 88.º que podem englobar vários cálculos de aplicação de taxas a determinadas matérias colectáveis, pois o mesmo pode suceder nas situações previstas nos n.ºs 4 a 6 do artigo 87.º. ( [6] )

De qualquer forma, sejam quais forem os cálculos a fazer, é unitária autoliquidação que o sujeito passivo ou a Autoridade Tributária e Aduaneira devem efectuar nos termos dos artigos 89.º, alínea a), 90.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), e 120.º ou 122.º, e com base nela que é calculado o IRC global, sejam quais forem as matérias colectáveis relativas a cada um dos tipos de tributação que lhe esteja subjacente. ( [7] )

Aliás, se este artigo 90.º não fosse aplicável à liquidação das tributações autónomas previstas no CIRC, teríamos de concluir que não haveria qualquer norma que previsse a sua liquidação, o que se reconduziria a ilegalidade, por violação do artigo 103.º, n.º 3, da CRP, que exige que a liquidação de impostos se faça «nos termos da lei».

Refira-se ainda a nova norma do n.º 21 aditada ao artigo 88.º do CIRC pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, independentemente de ser ou não qualificável como verdadeiramente interpretativa ( [8] ), em nada altera esta conclusão, pois aí se estabelece, no que concerne à forma de liquidação das tributações autónomas, que ela «é efectuada nos termos previstos no artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores».

Com efeito, se é certo que esta nova norma vem explicitar como é que se calculam os montantes das tributações autónomas (o que já decorria do próprio texto das várias disposições do artigo 88.º) e que a competência cabe ao sujeito passivo ou à Administração Tributária, nos termos do artigo 89.º, é também claro que não se afasta a necessidade de utilizar o procedimento previsto no n.º 1 do artigo 90.º, designadamente nos casos previstos na sua alínea c) em que a liquidação cabe à Administração Tributária e Aduaneira, com «base os elementos de que a administração fiscal disponha», que abrangerão a possibilidade de liquidar com base em tributações autónomas, se a Autoridade Tributária e Aduaneira dispuser de elementos que comprovem os seus pressupostos.

Por isso, quer antes quer depois da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, o artigo 90.º, n.º 1, do CIRC é aplicável à liquidação de tributações autónomas.

Fica, assim, prejudicado, desde já, o conhecimento do pedido subsidiário que a Requerente subordina à condição de se entender que o artigo 90.º do CIRC não é aplicável às tributações autónomas.

 

4.2. Dedutibilidade de despesas de investimento previstas no SIFIDE à colecta de IRC derivada de tributações autónomas

 

Em 2011, vigorava o Sistema de incentivos fiscais em investigação e desenvolvimento empresarial II (SIFIDE II) que foi aprovado pelo artigo 133.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (depois alterado pelo artigo 163.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro).

Este diploma estabelece o seguinte, nos seus artigos 4.º e 5.º, na redacção de 2010:

 

Artigo 4.º

Âmbito da dedução

1 - Os sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam, a título principal ou não, uma actividade de natureza agrícola, industrial, comercial e de serviços e os não residentes com estabelecimento estável nesse território podem deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência, o valor correspondente às despesas com investigação e desenvolvimento, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido, realizadas nos períodos de tributação de 1 de Janeiro de 2011 a 31 de Dezembro de 2015, numa dupla percentagem:

 

a) Taxa de base - 32,5 % das despesas realizadas naquele período;

 

b) Taxa incremental - 50 % do acréscimo das despesas realizadas naquele período em relação à média aritmética simples dos dois exercícios anteriores, até ao limite de (euro) 1 500 000.

 

2 - Para os sujeitos passivos de IRC que sejam PME de acordo com a definição constante do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro, que ainda não completaram dois exercícios e que não beneficiaram da taxa incremental fixada na alínea b) do número anterior, aplica-se uma majoração de 10% à taxa base fixada na alínea a) do número anterior.

3 - A dedução é feita, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior.

4 - As despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no exercício em que foram realizadas podem ser deduzidas até ao sexto exercício imediato.

5 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, quando no ano de início de usufruição do benefício ocorrer mudança do período de tributação, deve ser considerado o período anual que se inicie naquele ano.

6 - A taxa incremental prevista na alínea b) do n.º 1 é acrescida em 20 pontos percentuais para as despesas relativas à contratação de doutorados pelas empresas para actividades de investigação e desenvolvimento, passando o limite previsto na mesma alínea a ser de (euro) 1 800 000.

7 - Aos sujeitos passivos que se reorganizem, em resultado de actos de concentração tal como definidos no artigo 73.º do Código do IRC, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 15.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

 

Artigo 5.º

 

Condições

 

Apenas podem beneficiar da dedução a que se refere o artigo 4.º os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:

 

a) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indirectos;

b) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer impostos ou contribuições, ou tenham o seu pagamento devidamente assegurado.

 

 

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira não questiona que a Requerente preencha os requisitos subjectivos e objectivos para poder beneficiar do SIFIDE, tendo indeferido o pedido de revisão oficiosa por entender que as despesas em causa não podem ser deduzidas às quantias que pagou a título de tributações autónomas, por a dedução só poder ser efectuada à colecta de IRC resultante da aplicação da taxa de IRC ao lucro tributável.

Como se referiu, o artigo 90.º do CIRC reporta-se também à liquidação das tributações autónomas.

E, como também se disse, não há suporte legal para afirmar que, na eventualidade de terem de ser efectuados numa declaração vários cálculos para determinar o IRC, seja efectuada mais que uma autoliquidação.

O diploma que aprovou o SIFIDE não refere que os créditos dele provenientes são dedutíveis a toda e qualquer colecta de IRC, antes define o âmbito da dedução aludindo, no seu n.º 1 do artigo 4.º, «ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência».

O n.º 3 do mesmo artigo 4.º confirma que é ao montante que for apurado nos termos do artigo 90.º do CIRC que releva para concretizar a dedução ao dizer que «a dedução é feita, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior».

Assim, por mera interpretação declarativa, conclui-se que o artigo 4.º, n.º 1, do SIFIDE II, ao estabelecer a dedução «ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência», implica a dedução ao montante das tributações autónomas que são apuradas nos termos desse artigo 90º.

O facto de o artigo 5.º do SIFIDE II afastar o benefício quando o lucro tributável seja determinado por métodos indirectos e nas tributações autónomas se incluírem situações em que se visa indirectamente a tributação de lucros (designadamente, não dando relevância ou desmotivando factos susceptíveis de os reduzirem) não tem qualquer relevância para este efeito, pois o conceito de «métodos indirectos» tem um alcance preciso no direito tributário, que é concretizado no artigo 90.º da LGT (para além de normas especiais), reportando-se a meios de determinar o lucro tributável, cuja utilização não se prevê para cálculo da matéria colectável das tributações autónomas previstas no artigo 88.º do CIRC.

Por outro lado, se é a necessidade de fazer uso de métodos indirectos que afasta a possibilidade de usufruir do benefício, não se pode justificar esse afastamento em relação à colecta das tributações autónomas, que é determinada por métodos directos.

Para além disso, não pode ver-se, na eventual natureza de normas antiabuso que assumem algumas tributações autónomas ( [9] ) uma explicação para o seu afastamento da respectiva colecta do âmbito da dedutibilidade do benefício do SIFIDE II, pois não há qualquer suporte legal para afastar a dedutibilidade à colecta proporcionada por correcções baseadas em normas de natureza indiscutivelmente antiabuso, como, por exemplo, as relativas aos preços de transferência ou subcapitalização.

Por outro lado, o facto de a dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE II ser limitada à colecta do artigo 90º do CIRC, até à sua concorrência, não permite concluir que o crédito fiscal só seja dedutível caso haja lucro tributável, pois o que aquele facto exige é que haja colecta de IRC, que pode existir mesmo sem lucro tributável, designadamente por força das tributações autónomas.

Assim, apontando o teor literal do artigo 4.º do SIFIDE II no sentido de a dedução se aplicar também à colecta de IRC derivada de tributações autónomas a apurada nos termos do artigo 90.º do CIRC, só por via de uma interpretação restritiva se poderá afastar a aplicação do benefício fiscal à colecta de IRC proporcionada pelas tributações autónomas.

A viabilidade de uma interpretação restritiva encontra, desde logo, um obstáculo de ordem geral, que é o de que as normas que criam benefícios fiscais têm a natureza de normas excepcionais, como decorre do teor expresso do artigo 2.º, n.º 1, do EBF, pelo que, na falta de regra especial, devem ser interpretadas nos seus precisos termos, como é jurisprudência pacífica. ( [10] ) No caso dos benefícios fiscais, prevê-se explicitamente a possibilidade de interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF), mas não de interpretação restritiva, pelo que, em regra, o benefício fiscal não deve ser interpretado com menor amplitude do que a que, numa interpretação declarativa, resulta do teor da norma que o prevê.

De qualquer modo, uma interpretação restritiva apenas se justifica quando «o intérprete chega à conclusão de que o legislador adoptou um texto que atraiçoa o seu pensamento, na medida em que diz mais do que aquilo que pretendia dizer. Também aqui a ratio legis terá uma palavra decisiva. O intérprete não deve deixar-se arrastar pelo alcance aparente do texto, mas deve restringir este em termos de o tornar compatível com o pensamento legislativo, isto é, com aquela ratio. O argumento em que assenta este tipo de interpretação costuma ser assim expresso: cessante ratione legis cessat eius dispositio (lá onde termina a razão de ser da lei termina o seu alcance)» ( [11] ).

Como fundamento para uma interpretação restritiva poderá aventar-se o facto de que algumas tributações autónomas visam desincentivar certos comportamentos dos contribuintes susceptíveis de afectarem o lucro tributável, e, consequentemente, diminuírem a receita fiscal, e a sua força desincentivadora será atenuada com a possibilidade de a respectiva colecta poder ser objecto de deduções.

Mas, o desincentivo desses comportamentos é justificado apenas pelas preocupações de protecção da receita fiscal e os benefícios fiscais concedidos são, por definição, «medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do EBF).

E, no caso dos benefícios fiscais do SIFIDE II, as razões de natureza extrafiscal que justificam a sua sobreposição às receitas fiscais são, na perspectiva legislativa, de enorme importância, como se infere da fundamentação no Relatório do Orçamento do Estado para 2011:

 

II.2.2.4.4. Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial II (SIFIDE)


Tendo em conta que uma das valias da competitividade em Portugal passa pela aposta na capacidade tecnológica, no emprego científico e nas condições de afirmação no espaço europeu, a Proposta de Orçamento do Estado para 2011 propõe renovar o SIFIDE (Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial), agora na versão SIFIDE II, para vigorar nos períodos de 2011 a 2015, possibilitando a dedução à colecta do IRC para empresas que apostam em I&D (capacidade de investigação e desenvolvimento).

Dado o balanço positivo dos incentivos fiscais à I&D empresarial, e considerando também a evolução do sistema de apoio dos outros países, foi decidido rever e reintroduzir por mais cinco períodos de tributação este sistema de apoio. A I&D das empresas é um factor decisivo não só da sua própria afirmação enquanto estruturas competitivas, como da produtividade e do crescimento económico a longo prazo, facto, aliás, expressamente reconhecido no Programa do XVIII Governo, assim como em vários relatórios internacionais recentes.

É neste contexto que, no panorama internacional, a OCDE considera desde 2001 Portugal como um dos três países com um avanço mais significativo na I&D empresarial. Sendo o sistema nacional vigente, comparativamente aos demais sistemas que utilizam a dedução à colecta e a distinção entre taxa base e taxa incremental, é um dos mais atractivos e competitivos.

 

Sendo a investigação e desenvolvimento das empresas «um factor decisivo não só da sua própria afirmação enquanto estruturas competitivas, como da produtividade e do crescimento económico a longo prazo», compreende-se que se tenha dado preferência ao incentivo da aposta na capacidade tecnológica, no emprego científico e nas condições de afirmação no espaço europeu, que, a prazo se reconduzem à obtenção de maiores receitas fiscais.

A importância que, na perspectiva legislativa, foi reconhecida a este benefício fiscal previsto no SIFIDE II, é decisivamente confirmada pelo facto de ele ser indicado como estando especialmente excluído do limite geral à relevância de benefícios fiscais em IRC, que se indica no artigo 92.º do CIRC.

             Por isso, é seguro que se está perante benefícios fiscais cuja justificação é legislativamente considerada mais relevante que a obtenção de receitas fiscais, inferindo-se daquele artigo 92.º que a intenção legislativa de incentivar os investimentos em investigação e desenvolvimento previstos no SIFIDE II é tão firme que vai ao ponto de nem sequer se estabelecer qualquer limite à dedutibilidade da colecta de IRC, apesar de este regime fiscal ter sido criado e aplicado num período de notórias dificuldades das finanças públicas.

            Assim, não se vê fundamento legal, designadamente à face da intenção legislativa que é possível detectar, para, com fundamento numa interpretação restritiva, afastar a dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE II à colecta das tributações autónomas que resulta directamente da letra do artigo 4.º, n.º 1, do respectivo diploma, conjugado com o artigo 90.º do CIRC.

            Por outro lado, a eventual limitação da aplicação do benefício fiscal a empresas que apresentassem lucro tributável em 2011 reconduzir-se-ia a uma fortíssima restrição do seu campo de aplicação, já que, como é facto público, grande parte das empresas, nesse ano e nos anteriores, apresentava prejuízos fiscais, embora pagasse IRC por outras vias.

            Na verdade, segundo a estatística publicada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, no ano de 2011, mais de metade das declarações de IRC apresentavam valor líquido negativo e no período de tributação de 2011 apenas 26% dos sujeitos passivos apresentaram IRC Liquidado (Quadro 7), e cerca de 71% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC (Quadro 8), por via do Pagamento Especial por Conta, ou de outras componentes positivas do imposto (Tributações Autónomas, Derrama, Derrama Estadual, IRC de períodos de tributação anteriores, etc.). ( [12] ).

Por isso, é manifesto que a aplicabilidade do benefício fiscal a empresas que, embora apresentassem prejuízos fiscais, pagavam IRC, inclusivamente a título de tributações autónomas, ampliava fortemente o número de empresas potencialmente beneficiárias e, consequentemente, compagina-se melhor com a intenção legislativa subjacente ao SIFIDE II do que a defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Por outro lado, como se referiu, não se pode olvidar que as tributações autónomas visam proteger ou aumentar as receitas fiscais e que os benefícios fiscais concedidos são, por definição, «medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do EBF).

Isto é, no caso em apreço, ao estabelecer um benefício fiscal por dedução à colecta de IRC, o legislador optou por prescindir da receita fiscal que este imposto poderia proporcionar, na medida da concessão do benefício fiscal. Para esta ponderação relativa dos interesses em causa (receita fiscal versus estímulo forte ao investimento) é indiferente que essa receita provenha de cálculos efectuados com base no artigo 87.º ou no artigo 88.º do CIRC. Na verdade, seja qual for a forma de cálculo dessa receita fiscal, está-se perante dinheiro cuja arrecadação o legislador considerou ser menos importante do que a prossecução da finalidade económica referida. Das duas alternativas que se deparavam ao legislador relativamente ao incentivo aos investimentos previstos no SIFIDE II, que eram, por um lado, manter intactas as receitas provenientes de IRC (incluindo as de tributações autónomas) e não ver incentivado o investimento e, por outro lado, concretizar esse incentivo com perda de receitas de IRC, a ponderação que necessariamente está subjacente ao SIFIDE II é a da opção pela criação do incentivo com prejuízo das receitas. E, naturalmente, sendo a criação do incentivo ao investimento melhor, na perspectiva legislativa, do que a arrecadação de receitas, não se vislumbra como possa ser relevante que as receitas de IRC que se perdem para concretizar o incentivo provenham da tributação geral de IRC prevista no n.º 1 do artigo 87.º ou das tributações a taxas especiais previstas nos n.ºs 4 a 6 do mesmo artigo, ou das tributações autónomas previstas no artigo 88.º: em todos os casos, a alternativa é a mesma entre criação do incentivo e arrecadação de receitas de IRC e a ponderação relativa que se pode fazer dos interesses conflituantes é idêntica, quaisquer que sejam as formas de determinar o montante de IRC de que se prescinde para criar o incentivo.

E, no caso do benefício fiscal do SIFIDE II, as razões de natureza extrafiscal que justificam o incentivo com perda de receita são fortíssimas, pois considera-se que os investimentos incentivados são um factor decisivo na competitividade futura do país, que é fundamental para o próprio incremento das receitas fiscais.

            Por isso, é seguro que se está perante benefício fiscal cuja justificação é legislativamente considerada mais relevante que a obtenção de receitas fiscais provenientes de IRC, seja qual for a base do seu cálculo, pois o que está em causa sempre prescindir ou não de determinada quantia em dinheiro para criar um incentivo ao investimento.

            Neste contexto, a natureza das tributações autónomas e as soluções legislativamente adoptadas, em geral, em relação a elas, não têm qualquer relevância para a apreciação desta questão, pois esta tem de ser apreciada à face dos específicos interesses que na sua ponderação se entrechocam.

Na verdade, o que está em causa é, exclusivamente, determinar o alcance do SIFIDE II, que estabelece um regime de natureza excepcional, que visou prosseguir determinados interesses públicos, e não contribuir para a decisão de qualquer questão conceitual sobre a natureza das tributações autónomas, matéria sobre a qual não se vislumbra quer no texto da lei, quer no Relatório do Orçamento para 2011, a menor preocupação legislativa.

Pela mesma razão de que o que está em causa é interpretar o alcance do diploma de natureza especial que é o SIFIDE II, não pode ser atribuída relevância, para este efeito, à norma do n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, na parte em que se refere que não são «efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado», apesar da pretensa natureza interpretativa que lhe foi atribuída (que implica a sua inconstitucionalidade, por retroactividade, como entendeu o Tribunal Constitucional no acórdão n.º 267/2017, de 31-05-2017).

Com efeito, não há qualquer sinal, nem na Lei n.º 7-A/2016, nem no Relatório do Orçamento para 2016, nem na sua discussão, de que com o aditamento no artigo 88.º do CIRC de uma norma geral proibindo deduções ao montante global apurado de tributações autónomas, se pretendesse interpretar restritivamente a expressão «deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC» que consta de uma norma especial de um diploma avulso, como é o SIFIDE II.

E, na falta de uma intenção inequívoca em sentido contrário, vale a regra de que a lei geral não altera lei especial (artigo 7.º, n.º 3, do Código Civil), que tem a justificação o facto de que «o regime geral não inclui a consideração das condições particulares que justificaram justamente a emissão da lei especial». ( [13] )

Para além disso, as referidas regras do SIFIDE II têm em vista incentivar os sujeitos passivos de IRC a efectuarem investimentos no período entre 01-01-2011 e 31-12-2015, pelo que, sendo o benefício fiscal uma contrapartida da adopção do comportamento legislativamente desejado e incentivado, seria incompaginável com o princípio constitucional da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP), não reconhecer a esses comportamentos os efeitos fiscais favoráveis previstos na lei vigente no momento em que eles ocorreram.

Na verdade, a interpretação da lei que aqui se faz, era algo com que os contribuintes tinham razões para razoavelmente contar, como evidencia a já abundante e maioritária jurisprudência arbitral que adopta esta interpretação, com o reconhecimento de constitucionalidade que lhe foi dado pelo Tribunal Constitucional no acórdão n.º 267/2017, de 31-05-2017.

Por isso, se hipoteticamente a Lei n.º 7-A/2016 pretendesse eliminar, total ou parcialmente, os efeitos fiscais favoráveis que o SIFIDE II prometeu aos contribuintes que, com justificada confiança, adoptassem o comportamento aí previsto, seria materialmente inconstitucional, por violação daquele princípio.

Pelo exposto, convergindo os elementos literal e racional da interpretação do artigo 4.º do SIFIDE II no sentido de que as despesas de investimento nele previstas são dedutíveis à «ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência», é de concluir que elas são dedutíveis à globalidade dessa colecta, que engloba, para além, da derivada da tributação dos lucros em cada período fiscal, a que resulta do pagamento especial por conta e de outras componentes positivas do imposto, designadamente de tributações autónomas, derrama estadual e IRC de períodos de tributação anteriores.

            Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão, pois é ilegal a autoliquidação e a decisão do pedido de revisão oficiosa que a confirmou.

Estas ilegalidades justificam a anulação da autoliquidação, na parte em causa, e da decisão da reclamação graciosa, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

4.3. Questões de inconstitucionalidade suscitadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira refere nos artigos 203.º e 204.º da sua Resposta o seguinte:

 

«(...) qualquer interpretação que não aplique a norma constante da Lei Orçamento de Estado para 2016, vertida no artigo 133.º, que aditou o número 21 ao artigo 88.º do CIRC, com os efeitos previstos no artigo 135.º, ambos constantes da Lei do Orçamento de Estado para 2016, publicado a 30.03.2016, com entrada em vigor no dia seguinte, nos quais se preconiza, com carácter interpretativo, que

«A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos do artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado.»

(...)

e que, por conseguinte, permita a dedução à parte da colecta do IRC produzida pelas taxas de tributação autónoma dos benefícios fiscais efectuados em sede de IRC - in casu, SIFIDE -, essa decisão é materialmente inconstitucional, por

a) violação do princípio da legalidade, ínsito no art.º 103.º n.º 2 da CRP,

b) violação do princípio da separação dos poderes, plasmado no art.º 2 da CRP,

c) violação do princípio da protecção da confiança previsto no art.º 2.º da CRP,

d) violação do princípio da igualdade, na sua formulação positiva da capacidade contributiva, decorrente do art.º 13.º, n.º2 e do 103.º, n.º2 ambos da CRP».

 

Constata-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira não explica qual a razão ou razões pelas quais entende que são violados esses princípios, limitando-se a aludir a eles, pelo que não cumpriu, quanto a estas hipotéticas questões, ónus de alegar indispensável para ser assegurado o direito de contraditório.

De qualquer forma, com a brevidade que a insuficiência de alegação justifica, pode dizer-se que não se vê como possa ser violado o princípio da legalidade, pois a legalidade tem precisamente o alcance que atrás se referiu e, designadamente, a norma geral do n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, mesmo aplicada a situações anteriores não tem potencialidade, para revogar normas especiais, como são as do SIFIDE II, que prevêem a dedução à colecta de IRC, que inclui a proveniente das tributações autónomas. Sendo esta a interpretação adequada das referidas normas, o que seria incompaginável com o princípio da legalidade seria aplicá-las com alcance diferente do que resulta das regras interpretativas adequadas.

Quanto ao princípio da separação dos poderes, a presente decisão é proferida por um Tribunal, pelo que tem carácter jurisdicional, e, no exercício do poder jurisdicional, é aos Tribunais que incumbe interpretar e aplicar as leis. No caso, este Tribunal interpretou todas as normas em causa, inclusivamente o n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, com o sentido que referiu e não com outro. Por isso, a presente decisão arbitral é uma concretização do princípio da separação de poderes.

No que concerne ao princípio da protecção da confiança, mesmo que se entenda que o seu âmbito de protecção se estende à Administração Estadual, não abrange, decerto, a confiança em que os tribunais adoptarão uma determinada interpretação, quando a jurisprudência não é pacífica, para mais quando é maioritária em sentido contrário à posição da Autoridade Tributária e Aduaneira (no específico caso de benefícios fiscais).

No que respeita ao princípio da igualdade, não é identificada qualquer situação equiparável a que tenha sido dado um tratamento distinto. Para além disso, as tributações autónomas não têm por base a capacidade contributiva das empresas, pois a sua autonomia tributária concretiza-se, precisamente, na imposição de tributação com indiferença pela existência de rendimentos, sendo excepções ao princípio da tributação das empresas com incidência «fundamentalmente sobre o seu rendimento real» (artigo 104.º, n.º 2, da CRP). Por isso, não se vê como seja violado o princípio da igualdade, e muito menos o artigo 103.º, n.º 2, da CRP, que se reporta aos requisitos formais das leis tributárias.

Pelo exposto, não ocorre violação dos princípios invocados.

 

 

 

5. Reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios

 

A Requerente pede o reembolso da quantia de € 796.398,35 referente ao montante de tributações autónomas indevidamente pago, acrescida de juros indemnizatórios desde 01-09-2012.

O pagamento daquela quantia ocorreu por compensação, operada no campo 368 da declaração modelo 22, de que resultou imposto a recuperar.

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Por outro lado, como o direito a juros indemnizatórios depende da existência de direito de quantia a reembolsar, dessa competência para decidir sobre o direito a juros indemnizatórios infere-se que ela se estende à apreciação do direito a reembolso.

 

5.1. Direito a reembolso

 

A colecta de tributações autónomas foi de € 796.398,35 e a Requerente não deduziu a esse montante SIFIDE de que dispunha para utilização, em montante superior.

O n.º 4 do artigo 4.º do SIFIDE estabelece que «as despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no exercício em que foram realizadas podem ser deduzidas até ao sexto exercício imediato».

Por isso, para concluir que há, neste momento, direito a reembolso, é necessário demonstrar que o saldo de SIFIDE que transitou para os exercícios seguintes não foi nestes utilizado.

Nos exercícios posteriores de 2012, 2014 e 2015, a Requerente deduziu SIFIDE de que dispunha para dedução em 2011, mas nenhuma prova foi apresentada relativamente ao exercício de 2016.

Por isso, não é possível, com os elementos que consta do processo, decidir em que medida há neste momento direito a reembolso da quantia de € 796.398,35.

Tratando-se de matéria que reclama informação global e actualizada sobre a situação tributária da Requerente, ela não poderá ser apreciada no presente acórdão, devendo esse direito ser liquidado em execução de julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 95.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

 

 

5.2. Juros indemnizatórios

 

A Requerente pede ainda juros indemnizatórios calculados sobre o montante a restituir, contados desde 01-09-2012.

O regime substantivo dos juros indemnizatórios consta do artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços no caso em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

3. São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:

a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;

b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;

c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.

4. A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios.

5. No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.

 

 

O n.º 1 do artigo 43.º da LGT apenas reconhece o direito a juros indemnizatórios quando se determinar em processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços.

O pedido de revisão do acto tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, que se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, proferido no processo n.º 402/06.

Mas, como também se refere no mesmo acórdão, «nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) (...) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º, n.º 3, da LGT».

Assim, pedida a revisão oficiosa do acto de liquidação e vindo o acto a ser anulado, na impugnação contenciosa do indeferimento daquela revisão, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a iniciativa do contribuinte, e não desde a data do desembolso da quantia liquidada. ( [14] )

Este regime justifica-se pela falta de diligência do contribuinte em apresentar reclamação graciosa ou pedido de revisão no prazo de dois anos previsto no artigo 131.º, n.º 1, do CPPT, que consubstancia culpa na formação dos prejuízos. ( [15] )

Assim, no caso em apreço, a Requerente não tem direito a juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido, mas apenas a partir da data em que se completou um ano depois de ter apresentado o pedido de revisão do acto tributário, nos termos da referida alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT.

Como decorre da matéria de facto fixada, o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 02-04-2015 e não foi decidido no prazo de um ano (apenas foi proferido despacho de indeferimento em 24-03-2017), pelo que, na medida em que tiver direito a reembolso, a Requerente terá direito a juros indemnizatórios calculados sobre a quantia a reembolsar, ao abrigo daquela alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT, desde 03-04-2016 até que seja efectuado o reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1, e 35.º, n.º 10 da LGT, do artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, do artigo 61.º, n.ºs 3 e 4, do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou outra ou outras que alterem a taxa legal).

 

 

6. Decisão                      

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em

a)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à declaração de ilegalidade da não dedução do montante do SIFIDE à colecta resultante de tributações autónomas e anular a autoliquidação, na parte respectiva, bem como a decisão do pedido de revisão oficiosa;

b)       Julgar procedentes os pedidos de reembolso

c)        de quantia e de juros indemnizatórios, nos termos definidos no ponto 5 deste acórdão e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira o que for liquidado em execução do presente acórdão.

 

7. Valor do processo

 De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 796.398,35.

 

Lisboa, 18-12-2017

Os Árbitros

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

(João Taborda da Gama)

 

 

 

(Carla Castelo Trindade)

 

(vencida nos termos da declaração de voto anexa)

 

 

VOTO DE VENCIDO

Não acompanho a orientação que fez vencimento pelas razões que, ainda que de forma resumida, passo a reiterar.

 

Quanto ao ponto 3. - Excepção da incompetência material do tribunal arbitral decorrente da circunstância do pedido de pronúncia arbitral ter sido formulado na sequência de indeferimento de pedido de revisão oficiosa

No que respeita à questão da excepção da incompetência material do tribunal arbitral decorrente da circunstância do pedido de pronúncia arbitral ter sido formulado na sequência de indeferimento de pedido de revisão oficiosa acompanha-se a orientação que fez vencimento unicamente até ao parágrafo 26 inclusive (contando os parágrafos desde o início do ponto 3.). Não se concorda portanto com a parte da orientação que fundamenta a improcedência da excepção de incompetência com base na “imperfeição” da redacção da Portaria n.º 112-A/2011, bastando ao mesmo resultado – da afirmação da competência material dos tribunais arbitrais em julgar pedidos de pronúncia arbitral relativamente a actos de retenção na fonte e de auto-liquidação que tenham sido precedidos de pedido de revisão oficiosa – a fundamentação efectuada até ao parágrafo 26 inclusive.

Torna-se a acompanhar a orientação que fez vencimento na parte que se refere à improcedência da excepção de incompetência com fundamento na violação dos princípios constitucionais da separação de poderes, da legalidade e da indisponibilidade dos créditos tributários.

 

Quanto ao ponto 4.- Matéria de direito

Não se acompanha a orientação que faz vencimento desde logo porque a tese sustentada redunda na atribuição às normas do SIFIDE e do RFAI ou, arrisca-se, a quaisquer outras normas de benefício fiscal que funcionem através de dedução à colecta, de um alcance que não é compatível com a sua natureza excepcional.

Tudo porque as normas que disciplinam benefícios como o SIFIDE e o RFAI possuem natureza excepcional e só podem reconhecer-se como válidas quando a derrogação que tragam ao princípio da igualdade seja necessária, adequada e proporcionada ao fim extrafiscal que lhes está subjacente.

Como tentaremos demonstrar, uma leitura como a que resulta da orientação que faz vencimento poderá rendundar, no limite, na inconstitucionalidade dos próprios regimes de benefícios fiscais SIFIDE e do RFAI. Isto porque da orientação que faz vencimento decorre então que a finalidade destes benefícios fiscais é de tal modo intensa que justifica o afastamento das finalidades das tributações autónomas, o que é perturbante designadamente quando pensamos em casos em que a finalidade da tributação autónoma é a prevenção da fraude e evasões fiscais. Porém não é seguramente esta a intenção do legislador quando cria (ou criou) benefícios fiscais. Pelo contrário: a utilização de benefícios fiscais deve trazer consigo uma responsabilização reforçada dos contribuintes que os gozam.

Com o vencimento da tese sufragada no presente acórdão a comunidade perde duplamente: pela despesa fiscal incorrida com os benefícios fiscais e com a receita que se perde em práticas evasivas.

A leitura que faz o tribunal na orientação que fez vencimento parece-nos insustentável por isso no plano constitucional, onde talvez mereça ser dilucidada.

A leitura que faz o tribunal na orientação que fez vencimento parece-nos ainda insustentável no plano constitucional quando ao permitir deduções às tributações autónomas se está a violar o princípio da igualdade tributária. De facto, admitem-se deduções gerais à colecta do imposto (IRC), permitidas por lei por força (e imposição) do princípio da tributação do rendimento real e efectivo enquanto elemento revelador da capacidade contributiva. A dedução à colecta é uma realidade do IRC (e do IRS) enquanto imposto legitimado pelo princípio da capacidade contributiva. Ora o mesmo não acontece em relação à colecta devida por tributações autónomas. Nas tributações autónomas admitir-se uma dedução à sua colecta contrariaria o princípio da igualdade tributária, essa dedução geral deixa mesmo de fazer sentido porque, não tributando os rendimentos mas despesas e se se quiser comportamentos, não se coloca, quanto a estes, qualquer questão de justiça na repartição do encargo geral do imposto a que apela o n.º 1 do artigo 103.º da CRP. Não são estas as preocupações e os elementos enformadores do imposto. Muito pelo contrário. Seria mesmo ilógico permitir a dedução de encargos às tributações autónomas quando tal dedução, na prática, destruiria o sentido anti abusivo que as caracteriza e que se resume ao desincentivo de comportamentos desviantes que a sua instituição reprime ou dirime.

Compreenda-se desde já que as tributações autónomas são autónomas porque o legislador entendeu que os objectivos que lhes estão subjacentes só podiam ser concretizados através da criação de agravamentos fiscais sobre as empresas que ficassem imunes às contingências da liquidação do IRC. Que ficassem imunes às contingências necessárias ao cumprimento do princípio da tributação pelo lucro real que caracteriza o IRC.

Esses objectivos da tributação autónoma são, como se demonstrará, essencialmente de duas ordens: por um lado, o combate à evasão e fraude fiscal, interna ou internacional; por outro lado, o desincentivo de certos comportamentos por razões de ordem social, como o ambiente. Num e noutro casos, a tributação autónoma e a protecção destes bens jurídicos concretiza-se por um agravamento fiscal. Não se acompanha portanto a orientação que faz vencimento quando aponta para que o grande objectivo da tributação autónoma seja a obtenção de receita fiscal. A obtenção de receita fiscal há-de ser o resultado de qualquer intenção de sujeição de uma determinada realidade a tributos, não o objectivo ou o fundamento.

Em substância, nas tributações autónomas, está-se perante um mecanismo de estímulos negativos, que pretende alterar o comportamento das empresas com vista à tutela de interesses e valores com dignidade constitucional. Não se pode conceber que sobre estes se façam prevalecer sem reserva os interesses e valores que estão por trás de normas de benefícios fiscais como SIFIDE ou o RFAI, que não possuem com certeza dignidade maior.

Como veremos, não se acompanha a orientação que fez vencimento também e desde logo porque esta conclusão resulta de uma interpretação jurídica que não leva em linha de conta os elementos teleológico e racional das figuras da tributação autónoma e do IRC ao admitir que decorre do artigo 4.º, n.º1 do respectivo diploma do SIFIDE e RFAI, conjugado com o artigo 90.° do Código do IRC, que ao cálculo das tributações autónomas se efectua nos termos do artigo 90.º do Código do IRC e portanto podem ser deduzidos benefícios fiscais ao montante a pagar de tributações autónomas.

Para compreendermos o que se diz e, consequentemente, o porquê da não subscrição da douta decisão que fez vencimento, começar-se-á então por explicar de forma resumida a distinção estrutural e dogmática entre as figuras do IRC e da tributação autónoma. Tudo para depois concluir que no cálculo das tributações autónomas não cabem quaisquer deduções sendo a liquidação das tributações autónomas efectuada nos termos do artigo 88.º e 89.º do Código do IRC recorrendo-se unicamente ao n.º 1 do artigo 90.º do Código para efeitos de procedimento da liquidação. Nunca ao n.º 2 e seguintes do artigo 90.º do Código porquanto estes encerram instrumentos aplicáveis unicamente ao IRC.

Depois avançar-se-á para a análise de regime do SIFIDE e RFAI para concluir então o que acima se deixou dito. Que regimes de apoio ao investimento que são concretizados em deduções à colecta do IRC se reportam à colecta de IRC stricto sensu para cujo apuramento não concorrem as tributações autónomas. Não concorrem nem poderiam concorrer porque o regime premeia e quer premiar a rendibilidade do investimento. Quanto mais lucro tiver a empresa mais esta pode deduzir ao seu lucro as despesas com investimento. Não premeia nem quer premiar empresas que não tendo lucro e tendo tributações autónomas, por exemplo, decorrentes de despesas com representação, possam deduzir a este valor as despesas com investimento. Ora é também o próprio fundamento do regime do SIFIDE e RFAI que nega a possibilidade de deduções das despesas com investimento aos montantes da tributação autónoma. É que admitir-se isto, como decorre da posição que fez vencimento, estar-se-á a admitir que a finalidade destes benefícios fiscais é de tal modo intensa que justifica o afastamento das finalidades das tributações autónomas e uma leitura como esta poderá rendundar, no limite, na inconstitucionalidade dos próprios regimes de benefícios fiscais SIFIDE e do RFAI. Admitir-se isto está ainda a subverter-se todo o mecanismo de funcionamento dos dois impostos – IRC e tributações autónomas – trazendo a um imposto que se quer penalizador por imposição do princípio da igualdade tributária (tributações autónomas) instrumentos como as deduções à colecta característicos do IRC por imposição do princípio da tributação pelo lucro real.

Posto isto olhemos então a cada questão em concreto.

Tudo começa pela divergência (fundamental) relativa à natureza das tributações autónomas.

Aqui - e ao contrário daquela que parece ser a posição sufragada pela decisão sub judice -, acompanha-se a posição uniforme e reiterada quer da jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo quer da Doutrina.

As tributações autónomas são um imposto sobre a despesa diferente e distinto do IRC que, indiscutivelmente, é um imposto sobre o rendimento. Isto sem se discutir se as tributações autónomas têm ou não natureza – semelhanças – com o IRC. É que independentemente das possíveis semelhanças não há dúvida que são impostos diferentes.

Esta jurisprudência foi iniciada há já 7 anos no tribunal constitucional com o voto de vencido do Exmo. Conselheiro Vítor Gomes, aposto no Acórdão n.º 204/2010. Em Acórdão n.º 310/12, de 20 de Junho, o Tribunal Constitucional reformulou a doutrina do Acórdão n.º 18/11 aproximando-se do então voto de vencido do Conselheiro Vítor Gomes.

Esta jurisprudência foi mais tarde reafirmada pelo Plenário, no Acórdão n.º 617/2012, processo n.º 150/12, de 31/1/2013 e, recentemente, no Acórdão n.º 197/2016, proferido no âmbito do processo n.º 465/2015.

No mesmo sentido tem andado o Supremo Tribunal Administrativo como se confirmará, entre outros, no Acórdão de 21/3/2012, processo 830/11, de 21/3/2012.

A doutrina também acompanha esta posição.

De Sérgio Vasques, em nota de rodapé 60, página 342, do seu Manual de Direito Fiscal Almedina, 2015, a Rui Morais nos Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pp. 202-203, passando pelo Professor Casalta Nabais no seu Direito Fiscal, 8.ª ed., Almedina, Coimbra, 2015, p. 542 e pela Professora Ana Paula Dourado nas Direito Fiscal, Lições, 2015, pp. 237 ss. Todos reiteram a posição já sufragada pelos tribunais portugueses. A tributação autónoma e o IRC são impostos diferentes.

Esta tese foi transposta para a lei, de forma inequívoca, pelo próprio legislador quando na redacção introduzida ao artigo 23.º-A, n.º 1, alínea a), do Código do IRC pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, se passa a dizer que “não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável» «o IRC, incluindo as tributações autónomas”. Que sentido faria deixar claro na lei que a tributação autónoma e o IRC não são dedutíveis ao lucro tributável se as tributações autónomas fizessem parte do IRC? Se assim fosse os Acordos para Evitar a Dupla Tributação teriam as tributações autónomas incluídas onde se refere o IRC o que, como se sabe, não sucede. Essa é de resto a razão pela qual Portugal tem vindo a incluir as tributações autónomas na lista de impostos abrangidos. Assim, em face do exposto pode desde já concluir-se, de forma singela, que se o legislador fiscal entendesse que o IRC incluía as tributações autónomas não teria tido necessidade de distinguir as duas realidades, pois esse IRC já incluiria necessariamente as tributações autónomas.

E não é pelo facto de a tributação autónoma estar inserida no Código do IRC que as duas realidades se devem confundir.

Recorde-se que a tributação autónoma foi introduzida pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 192/90, de 9 de Junho, não tendo sido imediatamente inserida no Código IRC. O legislador só 10 anos depois do surgimento da tributação autónoma decidiu introduzi-la no Código IRC através da Lei n.º 30-G/2000 de 29 de Dezembro. O que o legislador procurou com esta sistemática foi um efeito anestesiador, já que, não obstante as tributações autónomas serem liquidadas independentemente do IRC, são autoliquidadas juntamente com a declaração do IRC, através do modelo 22. Quanto a esta questão o Tribunal Constitucional considerou, nos Acórdãos n.ºs 18/2009 e 85/2010, que a tributação autónoma poderia estar inserida em qualquer outro código ou diploma autónomo.

E as realidades são diferentes desde logo porque os objectivos são diferentes.

No IRC visa-se a tributação do rendimento sob o escrutínio da capacidade contributiva.

Já a tributação autónoma teve, pelo menos originariamente, dois objectivos bem diferentes sempre sob a legitimação do princípio da igualdade tributária.

O primeiro o de tributar na esfera das empresas o que não se consegue tributar em sede de IRS e o segundo o de desincentivar a realização de certas despesas ou de certos comportamentos. A este propósito o professor Saldanha Sanches chegou mesmo a afirmar que “Neste tipo de tributação, o legislador procura responder à questão reconhecidamente difícil do regime fiscal que se encontra na zona de intersecção da esfera pessoal e da esfera empresarial” acrescentando ainda que na “«(...) designação de “tributações autónomas", escondem-se realidades muito diversas (...)»” (Manual de Direito Fiscal, 3.“ edição (2007), Coimbra Editora, pág. 406/7). O Professor Guilherme de Oliveira Martins afirma que as tributações autónomas “(…) cumprem, no essencial, duas funções: por um lado, evitar a erosão da base tributável em sede de IRC, fazendo incidir tributação sobre encargos que podem ser deduzidos pelos sujeitos passivos de IRC, mas que, sendo-o, se transformam num agravamento da tributação, pretendendo, portanto, servir como desincentivo à despesa com tais encargos; outros tipos de tributações autónomas visam, pura e simplesmente, penalizar comportamentos presuntivamente evasivos ou fraudulentos dos sujeitos passivos, consubstanciando um mecanismo antiabusivo.”.

A tributação autónoma visa então tributar uma vantagem patrimonial obtida, via de regra, através da realização de uma despesa e que se traduz, consequentemente, na diminuição do lucro tributável. O IRC visa por seu turno tributar o rendimento real do sujeito passivo atendendo à sua capacidade contributiva.

Aqui e em jeito de conclusão há que lembrar que é unanimemente aceite quer pela jurisprudência quer pela doutrina que as taxas autónomas de IRC (e IRS) são um tributo de obrigação única distinto dos próprios IRC e IRS, impostos de formação sucessiva. Há também que relembrar que a autonomia das taxas autónomas resulta de possuírem um facto gerador radicalmente distinto do IRS/IRC, de obedecerem a regras de liquidação próprias e de servirem finalidades muito específicas.

Com efeito, as finalidades das tributações autónomas são hoje variadas mas, no que têm de mais importante, insista-se, elas servem para garantir a igualdade tributária garantindo a sujeição a imposto de valores que, sendo despesa na esfera das empresas, prefiguram rendimento na esfera de terceiros e prevenindo o planeamento abusivo pelo recurso a paraísos fiscais. Estes objectivos são de superlativa importância para garantir a justa distribuição dos rendimentos e da riqueza a que apela o artigo 103.º, n.º 1, CRP.

Em face do exposto relembramos o que deixámos acima dito: se há razões que justificam a admissão de deduções gerais à colecta do imposto (IRC), permitidas por lei por força do princípio da tributação do rendimento real e efectivo enquanto elemento revelador da capacidade contributiva, o mesmo não acontece em relação à colecta devida por tributações autónomas. A dedução à colecta é uma realidade do IRC (e do IRS) enquanto imposto legitimado pelo princípio da capacidade contributiva. Nas tributações autónomas, não são estas as preocupações e os elementos enformadores do imposto. Seria mesmo ilógico e, arriscamos, contrário ao princípio da igualdade tributária, permitir a dedução de encargos quando tal dedução, na prática, destruiria o sentido anti abusivo que as caracteriza e que se resume ao desincentivo de comportamentos desviantes que a sua instituição reprime ou dirime.

Em suma, as tributações autónomas, que incidem sobre certas despesas, funcionam de modo diferente do que constitui o escopo essencial do IRC, que tributa rendimentos, e, não obstante a inserção sistemática e a ligação funcional ao IRC, a verdade é que são cobradas no âmbito do processo de liquidação deste imposto sem, no entanto, se descaracterizarem e perderem sua raiz dogmática próprias.

Visitado o substracto teórico olhemos agora à lei.

Nada se diz na lei se o que está no artigo 90.º do Código do IRC, sob a epígrafe “Procedimento e Forma de liquidação” se aplica às duas realidades – IRC e tributação autónoma – ou a uma só e a qual. Porém, em nosso entender, e como tentaremos demonstrar, duma interpretação teleológica e sistemática da lei resulta claro que o n.º 1 do artigo 90.º - que encerra o procedimento de liquidação – se aplica quer ao IRC quer às tributações autónomas. Já o n.º 2 do mesmo artigo – que encerra a forma de liquidação – reporta-se aos casos da matéria colectável referida no artigo 15.º do CIRC ou seja ao IRC.

Para melhor compreender esta conclusão será necessário perceber que foi estabelecido no então n.° 6 do artigo 109.° do Código do IRC, actual artigo 117.°, que a obrigação de apresentar a declaração periódica de rendimentos abrange as entidades isentas de IRC, quando estejam sujeitas a tributação autónoma. E para determinados efeitos – designadamente para efeitos das deduções previstas no n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC ou do cálculo dos pagamentos por conta ou ainda do Resultado da Liquidação (artigo 92.°) - ficou, então, ao cuidado do intérprete e do aplicador da lei a tarefa de identificar a parte relevante de colecta do IRC. Isto extraindo dos normativos aplicáveis um sentido útil, literalmente possível, que permita uma solução coerente e conforme com a natureza e funções atribuídas a cada componente do imposto. Pois bem, é aqui que há que ter cautela.

Quando se trata das deduções previstas no n.° 2 do artigo 90.° do Código IRC, concorda a maioria do colectivo deste Tribunal que a expressão “montante apurado nos termos do número anterior” deva ser entendida como abrangendo o somatório do montante do IRC, apurado sobre a matéria colectável determinada segundo as regras do capítulo III e às taxas previstas no artigo 87.° do mesmo Código, e o montante das tributações autónomas, calculado com base nas regras previstas no artigo 88.°. Ora, o resultado desta interpretação implicaria desde logo e de uma forma muito singela que na base de cálculo dos pagamentos por conta definida no n.° 1 do artigo 105.º do Código do IRC, e em termos idênticos aos utilizados no n.° 2 do artigo 90.°, fossem incluídas as tributações autónomas. Com efeito, para a base de cálculo dos pagamentos por conta apenas é considerado o IRC apurado com base na matéria colectável determinada segundo as regras do capítulo III e as taxas do artigo 87.° do respectivo Código. E aqui não há qualquer diferendo nem na Doutrina nem na jurisprudência. Pois que, é de salientar que a coerência e adequação deste entendimento alicerça-se na própria natureza dos pagamentos por conta do imposto devido a final, os quais, de acordo com a definição do artigo 33.° da LGT são “as entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pelos sujeitos passivos no período de formação do facto tributário”, constituindo uma “(...) forma de aproximação do momento da cobrança ao do da percepção do rendimento de modo a colmatar as situações em que essa aproximação não pode efectivar-se através das retenções na fonte”. Portanto, só faz sentido concluir que a respectiva base de cálculo corresponda ao montante da colecta do IRC resultante da matéria colectável que se identifica com o lucro/rendimento do exercício do sujeito passivo.

Aqui acompanha-se o que defende a Requerida insistindo-se de que a única (e consistente) interpretação da expressão “montante apurado nos termos do número anterior” com a natureza das deduções referidas nas alíneas nas alíneas do n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC, relativas a:

-      créditos de imposto por dupla tributação internacional jurídica e económica (actuais alíneas a) e b));

-      benefícios fiscais (actual alínea c));

-      pagamento especial por conta (actual alínea d));

-      e retenções na fonte (actual alínea e)).

Na realidade, faz-se notar que o traço comum a todas as realidades reflectidas nas deduções referidas no n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC reside no facto de respeitarem a rendimentos ou gastos incorporados na matéria colectável determinada com base no lucro do sujeito passivo ou pagamentos antecipados do imposto, sendo, por isso, inteiramente alheios às realidades que integram os factos geradores das tributações autónomas.

E dizemos assim porque para nós é claro que a liquidação a que o legislador se quis reportar no n.º 2 é à matéria colectável referida no artigo 15.º do Código do IRC. Ou dito de outro modo, o “pecado original”, nunca bem resolvido é verdade, está no facto de (ter de) se entender, interpretando teleológica e sistematicamente a lei, que o n.º 1 do artigo 90.º se aplica às tributações autónomas, situação que se mantém mesmo com a mais recente alteração que veio apenas estabelecer que não existirá qualquer dedução ao montante da liquidação que resultar das tributações autónomas. A solução mais adequada teria sido ab initio o legislador ter afastado a aplicação do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, aos casos da tributação autónoma, mas como tal não sucedeu acabou por ir fazendo remendos cabendo ao interprete chegar à solução mais adequada através de uma interpretação teleológica e sistemática como a que se deixou atrás.

Assim, no cálculo das tributações autónomas não cabem quaisquer deduções sendo a liquidação das tributações autónomas efectuadas nos termos do artigo 88.º e 89.º do Código do IRC e do n.º 1 do artigo 90.º do Código. Nunca nos termos do n.º 2. O disposto no n.º 2 do artigo 90.º aplica-se ao único imposto cujo funcionamento e substrato teórico-constitucional permite a sua aplicação – IRC. Concorda-se, portanto, com a posição que fez vencimento quando se admite que o procedimento de liquidação previsto no n.º 1 do artigo 90.º do Código do IRC se aplica também às tributações autónomas. Porém dizer isto não significa aceitar que o mesmo se aplica ao n.º 2 do mesmo artigo. Não. Este preceito aplica-se unicamente ao IRC.

Posto isto há agora que olhar aos regimes do SIFIDE e RFAI para concluir então o que acima se deixou dito, isto é, que os regimes de apoio ao investimento que são concretizados em deduções à colecta do IRC se reportam à colecta de IRC stricto sensu para cujo apuramento não concorrem as tributações autónomas. Não concorrem nem poderiam concorrer porque ainda que o artigo 4.º, n.º 1 do respectivo diploma, remeta para o montante de imposto apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC está a referir-se aos montantes apurados nos termos do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC. E nestes temos, como sabemos os casos da matéria colectável referida no artigo 15.º do mesmo Código, i.e. IRC.

Para reforçar esta posição há que olhar ao Relatório do Grupo de Trabalho constituído pelo Despacho n.° 130/97-XIII do Ministério das Finanças onde se pode ler que o crédito de imposto ou dedução à colecta configura uma das modalidades, de entre as previstas no n.° 2 do artigo 2.° do EBF, que têm sido adoptadas sobretudo nas medidas de incentivos fiscais ao investimento. E são fundamentalmente duas as razões: uma, ligada à operacionalidade do benefício pela transparência e simplicidade do cálculo da despesa fiscal associada que, como é sabido, representa a receita fiscal (do IRC) cessante; e outra, que se prende com a filosofia subjacente aos benefícios, ou seja, a sua indexação à rendibilidade do investimento segundo a qual “a dedução de uma certa percentagem de um investimento à colecta de um imposto sobre lucros só se efectiva se houver lucro, o que premeia a rendibilidade do investimento” (Reavaliação dos Benefícios Fiscais in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.° 180, 1998, pp. 46-47).

Ora em face de tudo o que se deixou dito, e ao contrário do consignado na orientação que fez vencimento neste acórdão, não subsiste, assim, qualquer erro conceptual nem tão pouco qualquer contradição entre o acabado de expor e o facto de os regimes do SIFIDE e do RFAI estabelecerem que os mesmos são concretizados em deduções à colecta do IRC do montante apurado nos termos do artigo 90.º. É que apesar do artigo do SIFIDE se referir ao artigo 90.º como um todo refere-se ao montante apurado nos termos do n.º 2 do artigo 90.º, e este só se aplica, como já se sabe, ao IRC.

A dedução relativa a benefícios fiscais (alínea b) do n.° 2 do artigo 90.°), quando se trata de benefícios ao investimento - como é o caso do SIFIDE -, tem subjacente a filosofia de que o benefício constitui um prémio cuja amplitude varia com rendibilidade dos investimentos, pois quanto mais elevado foi o lucro/matéria colectável do IRC maior será a capacidade para efectuar a dedução. E é esta a lógica do benefício fiscal do SIFIDE que justifica e legitima a derrogação ao princípio da igualdade tributária.

Com o devido respeito, que é muito, o erro de raciocínio que padece a orientação que fez vencimento pode ser resumido neste excerto:

“Isto é, no caso em apreço, ao estabelecer um benefício fiscal por dedução à colecta de IRC, o legislador optou por prescindir da receita fiscal que este imposto poderia proporcionar, na medida da concessão do benefício fiscal. Para esta ponderação relativa dos interesses em causa (receita fiscal versus estímulo forte ao investimento) é indiferente que essa receita provenha de cálculos efectuados com base no artigo 87.º ou no artigo 88.º do CIRC.” (destacado nosso).

Isto porque não há dúvida que o legislador optou por prescindir de receita fiscal, é sempre assim quando cria benefícios fiscais e o SIFIDE não foi excepção, porém a receita fiscal cessante era de IRC e não de tributações autónomas. E era assim desde logo porque o próprio funcionamento e objectivo do SIFIDE - de incentivo ao investimento através de uma dedução de uma certa percentagem de um investimento à colecta de um imposto sobre lucros - só se efectiva se houver lucro na medida em que premeia a rendibilidade do investimento.

O SIFIDE II permite às empresas a obtenção de um benefício fiscal, em sede de IRC, proporcional à despesa de investimento em investigação e desenvolvimento (ao nível dos processos, produtos e organizacional) que consigam evidenciar, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido (Cfr Lei n.° 55- A/2010 de 31 de Dezembro, Decreto-Lei n.° 82/2013 de 17 de Junho e Lei n.° 83-C/2013 de 31 de Dezembro). Concretamente, o benefício a obter com o SIFIDE II traduz-se na possibilidade de deduzir à colecta de IRC apurada no exercício, um montante de crédito fiscal que resulta do somatório das seguintes parcelas: Taxa base: 32,5% das despesas realizadas no exercício; Taxa incremental: 50% do acréscimo das despesas realizadas no exercício face à média aritmética simples das despesas realizadas nos dois exercícios anteriores, até ao limite de € 1.500.000. Ou seja e em síntese: os valores que traduzam o benefício fiscal em sede de SIFIDE são deduzidos “aos montantes apurados nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência” e na liquidação respeitante ao período de tributação em que se realizem as despesas para o efeito elegíveis e que, na falta ou insuficiência de colecta apurada nesses termos, as despesas que não possam ser deduzidas no exercício em que forem realizadas “poderão ser deduzidas até ao 6.° exercício imediato”.

Ou seja, o legislador do regime do SIFIDE, ao fazer essa referência expressa ao montante apurado nos termos do artigo 90.° do Código do IRC, está a reportar-se à colecta de IRC propriamente dita para cujo apuramento não concorrem as tributações autónomas precisamente porque não entram no apuramento nem do lucro tributável, nem da matéria colectável, e, como consequência, não concorrem para o IRC liquidado.

Assim, ao contrário do consignado no presente acórdão, insista-se, não subsiste qualquer erro conceptual nem tão pouco qualquer contradição entre o acabado de expor e o facto de os regimes do SIFIDE e do RFAI estabelecerem que os mesmos são concretizados em deduções à colecta dos montantes apurados nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, i.e. do IRC. É porque em nosso entender quer as tributações autónomas quer o IRC são liquidados nos termos do n.° 1 do artigo 90.° do Código do IRC. Porém das duas realidades a única que é passível de dedução à colecta – isto é de concretização do beneficio é, quer por razões literais (porque o n.º 2 do artigo 90.º se aplica unicamente ao IRC) quer por razões materiais (o benefício só se efectiva se houver lucro de modo a premiar a rendibilidade do investimento), é a colecta do IRC que como vimos é diferente e distinta da tributação autónoma. O resultado das tributações autónomas, apurado de forma autónoma/independente/separada não concorre para a colecta do IRC, pelo contrário, há-de acrescer ao IRC liquidado para efeitos de apuramento do valor a pagar ou a recuperar, o que consubstancia um resultado bem diferente. Note-se a este propósito que são desde logo devidas tributações autónomas (agravadas) no caso de sujeitos passivos que apresentem prejuízos fiscais.

Em face de tudo o exposto e atenta em especial a natureza e a razão de ser das tributações autónomas, não é possível admitir a dedução de benefícios fiscais à colecta de tributação autónoma, sob pena de violação do princípio da igualdade tributária.

Admitir esta possibilidade leva a que um sujeito passivo pudesse efectuar a dedução a título de SIFIDE ou outros benefícios fiscais como RFAI ao montante de tributações autónomas incidentes sobre despesas não documentadas subvertendo por completo a função dessas tributações na prevenção ou evitação de comportamentos fiscal e socialmente indesejados.

Com efeito, tendo o regime das tributações autónomas maxime uma função desincentivadora de comportamentos abusivos, não se vê por que motivo lógico esse desincentivo poderia, depois, desvanecer-se em prol de um benefício fiscal. Não se vê como é que comportamentos como os de relações com paraísos fiscais possam ser desconsiderados e aproveitados em função de benefícios fiscais ao investimento o que sucederá ao possibilitar-se a dedução à colecta das tributações autónomas incentivos fiscais como aponta a presente decisão: Este resultado é no mínimo paradoxal.

É que aqui, há ainda que relembrar que os benefícios fiscais são normas absolutamente excepcionais no sistema fiscal, na medida em que encerram uma derrogação ao princípio da igualdade tributária, resultante do artigo 13.º CRP. Só podem sobreviver portanto a um juízo de inconstitucionalidade se a derrogação que trazem ao princípio da igualdade se mostrar necessária, adequada e proporcionada à tutela dos fins extrafiscais em jogo. Assim, para que se admita a dedução à colecta do IRC de créditos gerados por benefícios fiscais SIFIDE é necessário que se lhes reconheça intensidade suficiente para derrogar a igualdade que deve valer na tributação das empresas. Este exercício já de si não é fácil nem pode ser tomado com ligeireza, visto que a igualdade é o mais importante princípio material da Constituição Fiscal. Ora, se se admitir, porém, que benefícios fiscais como os do SIFIDE podem ser deduzidos não apenas à colecta do IRC mas também às taxas de tributação autónoma este controlo de proporcionalidade toma contornos muito diferentes. Com efeito, admitir que os contribuintes de IRC possam neutralizar as taxas de tributação autónoma de que são devedores mobilizando benefícios fiscais como o SIFIDE redundaria em reconhecer que a promoção do investimento em ciência por parte das empresas deveria prevalecer sobre o princípio da igualdade tributária mesmo quando estão em causa pagamentos e operações que indiciam as mais graves práticas de planeamento abusivo e evasão fiscal. A interpretação da lei que se sustenta no acórdão na posição que fez vencimento degrada o princípio da igualdade tributária num princípio menor do sistema e permite que empresas que realizam despesas confidenciais, práticas remuneratórias evasivas ou operações com territórios offshore se furtem por inteiro às consequências que a lei lhes associa, desde que a sua actividade envolva despesas relevantes de investigação e desenvolvimento (R&D). Na verdade, a interpretação da lei que se sustenta no acórdão na posição que fez vencimento tem consequência mais gravosa ainda, pois que a qualificação das taxas de tributação autónoma como colecta de IRC para efeitos da dedução de benefícios fiscais é doutrina que necessariamente valerá para quaisquer outros benefícios fiscais que operem por dedução à colecta e é doutrina que valerá necessariamente também em sede de IRS e não apenas de IRC.

Uma tal interpretação das normas do Código do IRC não apenas escamoteia o facto gerador e procedimento de liquidação muito próprios das taxas de tributação autónoma, mas sobretudo, uma tal interpretação das normas do Código do IRC atribui às regras do SIFIDE e aos benefícios fiscais em geral uma dignidade constitucional que não possuem no confronto com o princípio da igualdade tributária. Interpretadas as normas do Código do IRC e do SIFIDE deste modo, parece manifesto que a lesão que trazem ao artigo 13.º da CRP não se mostra necessária, adequada nem proporcionada ao objectivo de promoção da ciência que está subjacente ao SIFIDE.

Assim, o que se propõe no presente Voto vencido não é uma interpretação restritiva do artigo 4.º do SIFIDE II mas tão só uma interpretação teleológica e sistemática do previsto quer no SIFIDE quer no Código do IRC de forma a salvar o regime do teste de conformidade constitucional designadamente no que em concreto respeita à violação do princípio da igualdade tributária. É que não nos podemos nunca olvidar, insistimos, que as normas que disciplinam benefícios como o SIFIDE e o RFAI possuem natureza excepcional e só podem reconhecer-se como válidas quando a derrogação que tragam ao princípio da igualdade seja necessária, adequada e proporcionada ao fim extrafiscal que lhes está subjacente.

Não vale portanto a pena entrar na discussão, por despicienda, de saber se estamos ou não perante um benefício fiscal cuja justificação é legislativamente considerada mais relevante que a obtenção de receitas fiscais. Claro que sim, caso contrário não se teria aprovado o regime do SIFIDE ou do RFAI. A questão é a de saber que receita fiscal é que foi cedida em função de investimento? Receitas decorrentes de um imposto que admite deduções e que obedece ao princípio de capacidade contributiva e que premeia quem investe mas quem gera imposto admitindo que quem mais lucro obtiver mais pode investir. Ou o que se quis (e se admitiu) foi ceder receita decorrente de um imposto sobre a despesa que sob a alçada do princípio da igualdade tributária obriga a quem tem comportamentos desviantes – como pagamento com ajudas de custo ou despesas de representação, ou mesmo pagamentos a entidades residentes em paraísos fiscais – deixe de pagar esse imposto em virtude de ter despesas de investimento?

Não temos dúvidas que foi o primeiro.

Tanto assim é que a Proposta de Lei n.º 100/XIII do qual consta a Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2018 já - aprovada na data em que se elabora este Voto Vencido -, encerra uma alteração ao artigo 88.º do Código do IRC que aponta no sentido de que não são efectuadas quaisquer deduções ao montante devido das tributações autónomas ainda que estas provenham de legislação especial como o SIFIDE e do RFAI. Ora, mesmo sem se lançar mão do carácter interpretativo dado pelo legislador novamente ao n.º 21 do artigo 88.º do Código do IRC é claro que o legislador – que relembre-se, é sempre o mesmo, a Assembleia da República –, quis elucidar o que de resto já resultava da lei.

E até aqui, se não havia qualquer sinal, nem na Lei n.º 7-A/2016, nem no Relatório do Orçamento para 2016, nem na sua discussão, de que com o aditamento no artigo 88.º do CIRC de uma norma geral proibindo deduções ao montante global apurado de tributações autónomas, se pretendesse interpretar restritivamente a expressão «deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC» que consta de uma norma especial de um diploma avulso, como é o SIFIDE II, razão pela qual a posição que faz vencimento conclui que:

(…) na falta de uma intenção inequívoca em sentido contrário, vale a regra de que a lei geral não altera lei especial (artigo 7.º, n.º 3, do Código Civil), que tem a justificação o facto de que «o regime geral não inclui a consideração das condições particulares que justificaram justamente a emissão da lei especial».”

…é agora claro com a nova redacção do n.º 21 do artigo que não são permitidas quaisquer deduções à colecta das tributações autónomas mesmo que estas provenham de legislação especial.

Na tese que se sufraga, o legislador, ao aditar este n.º 21 ao artigo 88.º do CIRC com o conteúdo mencionado limitou-se a acolher e a reforçar o sentido interpretativo que já resultava das normas vigentes. Acolheu, portanto, a única leitura possível em face do acervo constitucional aplicável às realidades aqui em jogo: distinção entre as figuras da tributação autónoma e o IRC; aplicação do n.º 1 do artigo 90.º a ambas as realidades; aplicação do artigo 90.º n.º 2 unicamente ao IRC; remissão do regime do SIFIDE para o artigo 90.º refere-se aos montantes apurados no artigo 90.º n.º 2.

Há que sublinhar que a interpretação que se propõe no presente não só possui alcance em sede de SIFIDE e IRC mas quanto a todos os benefícios fiscais dedutíveis à colecta do IRS/IRC o que será bastante grave. Há que sublinhar ainda que tribunal arbitral tem a obrigação de fazer da lei a interpretação mais conforme à CRP, tal como o têm os tribunais judiciais, termos em que, pelas razões expostas, negaria provimento ao pedido arbitral de declaração de ilegalidade da autoliquidação de IRC, na parte produzida pelas tributações autónomas com a sua consequente manutenção na ordem jurídica.

Carla Castelo Trindade



[1] Embora a Autoridade Tributária e Aduaneira faça referência a recurso hierárquico, na página 3 da sua Resposta, trata-se de lapso manifesto, pois, no caso em apreço, não houve recurso hierárquico.

O mesmo sucede com referências que na Resposta a Autoridade Tributária e Aduaneira faz a retenções na fonte, que não estão em causa no caso em apreço.

 

[2]              Como se entendeu no citado acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-6-2006, proferido no processo n.º 402/06.

[3]              BAPTISTA MACHADO, Lições de Direito Internacional Privado, 4.ª edição, página 100.

[4]              Essencialmente neste sentido, podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, proferido no processo n.º 402/06, e de 14-11-2007, processo n.º 565/07.

[5]              Acórdão n.º 177/2016, de 29-3-2016, processo n.º 126/15.

[6]                     O n.º 6 do artigo 87.º do CIRC foi revogado pela Lei n.º 55/2013, de 8 de Agosto, o que não tem relevância para este efeito de demonstrar que fora do âmbito das tributações autónomas havia e há cálculos parciais de IRC com base em taxas especiais aplicáveis a determinadas matérias colectáveis.

[7]                     É, aliás, neste sentido a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira que refere que há «dois cálculos distintos que, embora processados, de acordo com a mesma base jurídica – a alínea a) do n.º 1 do art.º 90.º do CIRC - e nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º do mesmo código, são efectuados com base em parâmetros diferentes, pois cada uma se materializa na aplicação das suas próprias taxas, previstas nos artigos 87.º ou no 88.º do CIRC, às respectivas matérias colectáveis determinadas igualmente de acordo com regras próprias» (artigo 23.º da Resposta).

[8] Será materialmente inconstitucional, por violação da proibição constitucional da retroactividade dos impostos, que consta do n.º 3 do artigo 103.º da CRP, como entendeu o Tribunal Constitucional no acórdão n.º 267/2017, de 31-05-2017.

[9]                     Actualmente apenas em relação a algumas tributações autónomas se poderá encontrar a natureza de normas antiabuso, pois, como ensina CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 7.ª edição, página 543, «é, porém, evidente que o alargamento e agravamento de que tais tributações autónomas têm presentemente uma finalidade clara de obter mais receitas fiscais».

[10]                   Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15-11-2000, processo n.º 025446, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 501, páginas 150-153, em que se cita abundante jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e do Supremo Tribunal de Justiça.

                Este Boletim do Ministério da Justiça está disponível em:

                http://www.gddc.pt/actividade-editorial/pdfs-publicacoes/BMJ501/501_Dir_Fiscal_a.pdf

[11]                   BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso legitimador, página 186.

[12]                   Este texto está disponível em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/70E81137-189A-440E-AF11-88B4A6CC1C9A/0/Notas_Previas_IRC_20092011.pdf.

                De resto, há já vários anos que apenas uma minoria de contribuintes pagava IRC com base no lucro tributável do respectivo exercício, como se pode ver nos documentos estatísticos publicados em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/dgci/divulgacao/estatisticas/estatisticas_ir/:

      – 29% no período de tributação de 2010, em que cerca de 76% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, ou de outras componentes positivas do imposto (Tributações Autónomas, Derrama, Derrama Estadual, IRC de períodos de tributação anteriores, etc.).;

      – 31% no período de tributação de 2009, em que de 77% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, das Tributações Autónomas e do IRC de exercícios anteriores;

      – 34% no período de tributação de 2008, em que 79% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, das Tributações Autónomas e do IRC de exercícios anteriores;

      – 36% no período de tributação de 2007, em que 80% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, das Tributações Autónomas e do IRC de exercícios anteriores.

 

                 

 

[13]                   OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, página 260.

[14] Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 6-07-2005, processo n.º 0560/05; de 02-11-2005, processo n.º 0562/05; de 17-05-2006, processo n.º 016/06; de 24-05-2006, processo n.º 01155/05; de 02-11-2006, processo n.º 0604/06; de 15-11-2006, processo n.º 028/06; de 10-01-2007, processo n.º 523/06; de 17-01-2007, processo n.º 01040/06; de 12-12-2006, processo n.º 0918/06; de 15-02-2007, processo n.º 01041/06; de 06-06-2007, processo n.º 0606/06; de 10-07-2013, processo n.º 390/13; de 18-01-2017, processo n.º 0890/16; de 10-5-2017, processo n.º 0159/14.

[15] Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18-01-2017, processo n.º 0890/16, «do disposto nos nºs. 1 a 3 do art. 43º da LGT resulta que, em caso de revisão, a diferença temporal relativamente ao termo inicial no pagamento de juros indemnizatórios (não serão devidos juros indemnizatórios entre o momento do pagamento indevido e o da revisão, apesar de haver erro imputável aos serviços) decorre do entendimento legislativo no sentido da culpa do contribuinte na formação dos prejuízos derivados do acto ilegal, por não ter sido diligente em usar, nos prazos normais, os meios de impugnação administrativa e contenciosa que a lei põe ao seu dispor».