Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 216/2014-T
Data da decisão: 2014-09-18  IUC  
Valor do pedido: € 2.079,48
Tema: Incidência subjetiva
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Decisão Arbitral

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo nº 216/2014 – T

Tema: Imposto Único de Circulação (IUC)

 

 

I RELATÓRIO

 

A... S.A., Pessoa Colectiva n.º …, com sede na Rua …, vem, nos termos do disposto nos artigos 2.º n.º 1 a) e 10.º n.º1 a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, apresentar pedido de pronúncia, pedindo:

a) a anulação das  liquidações de IUC e de juros compensatórios referentes ao ano de 2009, 2010, 2011 e 2012;

b) A condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, calculados sobre as importâncias pagas em resultado dessas liquidações, até efectivo e integral reembolso;

c) A condenação da Requerida ao ressarcimento à Impugnante das despesas resultantes da lide.

 

Fundamenta o pedido imputando aos atos de liquidação os vícios de violação de lei e erro nos pressupostos de facto.

Para o efeito, a Requerente alega:

1.      A Impugnante recepcionou as seguintes liquidações de Imposto Único de Circulação (IUC) e Juros Compensatórios (JC) relativas ao ano de 2009, 2010, 2011 e 2012, respectivamente, referentes à viatura ..-..-..:

- nº ..., de 26.10.2013, no valor a pagar de €536,12 – sendo €461,00 relativos ao IUC e €75,12 relativos a juros compensatórios;

- nº ..., de 26.10.2013, no valor a pagar de €522,18 - sendo €465,00 relativos ao IUC e €57,18 relativos a juros compensatórios;

- nº ..., de 26.10.2013, no valor a pagar de €514,41 - sendo €475,00 relativos ao IUC e €39,41 relativos a juros compensatórios e;

 - nº …, de 26.10.2013, no valor apagar de €506,77 – sendo 486,00 relativos ao IUC e 20,77 relativos  a juros compensatórios (doc. nº 1).

2.      Em 4-12-2013, a Impugnante procedeu ao pagamento integral das referidas liquidações de IUC (doc. nº 2).

3.      Impugnante não é devedora de qualquer imposto, uma vez que em 2009, 2010, 2011 e 2012, já não era proprietária da referida viatura.

4.      Desde 31.07 1997 que a Impugnante já não era a proprietária da referida viatura, uma vez que nessa data -  31.07.1997 vendeu esta viatura à empresa B..., SA, Pessoa Colectiva nº … e,

5.      … esta última, em 17.02.1998, vendeu a referida viatura  a C..., Lda, Pessoa Colectiva nº … (doc. n.º 3),

6.      A Impugnante inclusive já diligenciou junto do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P (IMTT) a apreensão dos documentos da viatura (doc. nº 4).

7.      Nos termos do artigo 6º nº 1 do CIUC “o facto gerador do imposto é constituído pela propriedade do veículo”.

8.      O presente acto tributário vem tributar a pretensa propriedade de um bem que não pertence à Impugnante, violando o artigo 4.º n.º 1 da LGT, que estabelece que os impostos assentam na capacidade contributiva revelada pela propriedade de determinados bens – o que não é o caso.

9.      Do mesmo modo, desconhece a Impugnante, porque não tem a obrigação de conhecer, os dados constantes das bases de dados do IMTT, nem tem a obrigação de descortinar por que motivo ali consta, erradamente, como proprietária do veículo em causa.

10.  Para levar a cabo a tributação em causa, vem a AT presumir a titularidade de bens na esfera jurídica da Impugnante como critério de incidência de IUC, sendo que em direito tributário não são admissíveis presunções inilidíveis ao nível de incidência de impostos[1].

11.  A Impugnante tem conhecimento de uma recente decisão arbitral de 19.07.2013 (processo nº 26/2013-T) que trata de matéria idêntica à dos autos, (e que se junta em anexo como doc. nº 5) a qual refere que, a presunção do nº 3 do CIUC é uma presunção ilidível, nos termos gerais e, em especial, por força do disposto no artº 73º da LGT e, ainda que os meios de prova apresentados têm a seu favor a presunção de veracidade que lhes é conferida pelo artº 73º nº 1 da LGT e que são idóneos para ilidir a presunção em que se suportam as liquidações de IUC.

12.  Nessa decisão arbitral refere-se que: “37. É no sentido do conceito legal de presunção e no respeito dos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva que o legislador atribuiu plena eficácia à presunção derivada do registo automóvel acolhendo-a, como tal, na definição da incidência subjectiva deste tributo estabelecida no nº 1 do art.3º do IUC. Assim, não poderá deixar de se entender que a expressão “considerando-se como tais” constante da referida norma, configura uma presunção legal, e que esta é ilidível, nos termos gerais e, em especial, por força do disposto no art. 73º da LGT que determina que as presunções consagradas na normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário.” (sublinhado nosso)

13.  Refere ainda a referida decisão arbitral: “45. Dos elementos fornecidos pela requerente extrai-se que à data da exigibilidade do imposto a que respeitam as liquidações questionadas não era esta o proprietário dos veículos naquelas identificados, por se ter já anteriormente operado as respectivas transferências, nos termos da lei civil. (…) Os meios de prova apresentados pela requerente, constituídos por cópias dos respectivos registos contabilísticos e documentos de suporte têm a seu favor a presunção de veracidade que lhes é conferida nos termos do nº 1 do art. 75º da LGT que, assim, se afiguram idóneos e com força bastante para ilidir a presunção em que se suportam aquelas liquidações que, por isso, devem ser objecto de anulação com a consequente restituição do imposto indevidamente cobrado à Requerente.” (destaque nosso)

14.  No caso em apreço, a AT para efeito das liquidações de imposto, utiliza a base de dados do IMTT e que naquela base de dados a Impugnante consta como proprietária.

15.  Por força das liquidações impugnadas, sabe a Impugnante que ainda figura como proprietária dos automóveis, na medida em que os actuais proprietários ainda não registaram os mesmos em seu nome.

16.  Todavia, como é de liminar clareza, não estão em causa os elementos constantes do registo – outrossim está em causa que esse registo não reflecte a VERDADEIRA PROPRIEDADE do bem, não podendo a Impugnante ver-se confrontada com um acto tributário que não lhe respeita, sem poder demonstrar que não estão verificados os concretos pressupostos factuais para a tributação.

17.  Ao proceder às liquidações em causa, incorreu a AT, simultaneamente, em violação de lei e erro nos pressupostos de facto.

18.  Assim sendo, uma vez que não está, nem nunca esteve em falta, qualquer imposto, a liquidação de juros compensatórios em questão não respeita o artigo 35.º da LGT, designadamente no que concerne à verificação dos pressupostos para a sua liquidação.

19.  Como se referiu, a Impugnante procedeu, dentro do prazo legal, ao pagamento global do imposto no montante de €1887,00, pelo que, além da restituição desse valor, tem ainda a Impugnante direito aos respectivos juros indemnizatórios.

 

A autora não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT, o signatário foi designado pelo presidente do Conselho Deontológico do CAAD para integrar o presente Tribunal Arbitral singular, tendo aceite o encargo nos termos legalmente previstos.

 

Em 21-4-2014 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

O Tribunal ficou constituído em 8-5-2014 [artigo 11º-1/c), do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º, da Lei nº 66-B/2012, de 31-12]

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta defendendo, no essencial e em síntese, que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente e que os atos tributários impugnados se devem manter na ordem jurídica porquanto, em seu entender, os sujeitos passivos não são ou podem não ser os titulares reais e efetivos da propriedade do veículo mas aqueles que constam do registo como tais, juntando em abono da tese defendida uma decisão do TAF de Penafiel proferida no proc nº …/13.0BEPNF.

 

Por despacho de 6-6-2014, o Tribunal dispensou a reunião prevista no artigo 18º, do RJAT, bem como as alegações finais.

 

Saneador/Pressupostos processuais

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do RJAT.

Tratando-se do mesmo tributo (IOC) e ponderada a identidade dos fundamentos de facto e de direito em todas as impugnações das liquidações, verificam-se os pressupostos previstos nos arts 104º, do CPPT e 3º, do RJAT, para a cumulação dos pedidos.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões que possam obstar à apreciação do mérito da causa.

 

II FUNDAMENTAÇÃO

Os factos provados

É o seguinte o quadro factual essencial assente para enquadrar jurídica e legalmente as questões suscitadas:

a) A Impugnante rececionou as seguintes liquidações de Imposto Único de Circulação (IUC) e Juros Compensatórios (JC) relativas ao ano de 2009, 2010, 2011 e 2012, respectivamente, referentes à viatura ..-..-..:

- nº ..., de 26.10.2013, no valor a pagar de €536,12 – sendo €461,00 relativos ao IUC e €75,12 relativos a juros compensatórios;

- nº ..., de 26.10.2013, no valor a pagar de €522,18 - sendo €465,00 relativos ao IUC e €57,18 relativos a juros compensatórios;

- nº ..., de 26.10.2013, no valor a pagar de €514,41 - sendo €475,00 relativos ao IUC e €39,41 relativos a juros compensatórios e;

 - nº ..., de 26.10.2013, no valor apagar de €506,77 – sendo 486,00 relativos ao IUC e 20,77 relativos  a juros compensatórios (doc. nº 1).

b) A Impugnante procedeu ao pagamento integral das referidas liquidações de IUC, no montante global de €1.887,00, em 04.12.2013 (doc. nº 2).

c) Desde 31.07 1997 que a Impugnante já não é a proprietária da referida viatura, uma vez que nessa data -  31.07.1997 a vendeu à empresa B..., SA, Pessoa Colectiva nº 502 572 77 e,

d) … esta última, em 17.02.1998, vendeu a referida viatura  a C..., Lda, Pessoa Colectiva nº 501 700 862 (doc. n.º 3),

e) Em fevereiro de 2012, a Impugnante diligenciou junto do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P (IMTT) a apreensão dos documentos da viatura (doc. nº 4).

f) À data das liquidações constava das bases de dados do IMTT e da Conservatória do Registo Automóvel que era a impugnante a proprietária do mencionado veículo automóvel.

 

Não há outros factos essenciais, provados ou não provados.

 

Motivação

Os factos mencionados estão documentalmente comprovados ou não foram especificamente impugnados.

Ou seja: não há nessa matéria quaisquer divergências das partes.

A divergência situa-se no âmbito da interpretação e aplicação de normas jurídicas e, concretamente, no que concerne ao entendimento quanto ao conceito de sujeito passivo para efeitos de tributação à luz do Código do Imposto Único de Circulação e, mais especificamente se, não sendo o proprietário quem consta como tal no IMTT e na Conservatória do Registo Automóvel, este pode ou não demonstrar essa divergência para, conseguindo-o, exonerar-se da liquidação de IUC efetuada com base nos dados existentes naqueles órgãos.

Ou seja: trata-se aqui fundamentalmente de divergentes entendimentos quanto à interpretação do artigo 3º, do CIUC [Código do Imposto Único de Circulação].

 

II FUNDAMENTAÇÃO (continuação)

O Direito

Atenta as posições das Partes assumidas nos argumentos apresentados, constitui questão central dirimente saber se, na data da ocorrência dos factos geradores do imposto [artigo 3º-1, do CIUC[2]] os proprietários dos veículos não forem os que constam do registo, serão apesar disso estes que serão sempre considerados os sujeitos passivos do IUC, não sendo por consequência  considerada presunção ilidível a titularidade revelada pelo registo ou, dito doutro modo, se a norma de incidência subjetiva constante do artigo 3º nº 1 do CIUC, estabelece ou não uma presunção.

 

Adiante-se que a matéria objeto dos autos foi já abundantemente tratada na  Jurisprudência Arbitral Tributária [cfr diversas decisões do CAAD publicadas em www.caad.org.pt , designadamente as proferidas nos processos nºs 14/2013, 26/2013, 27/2013, 73/2013, 170/2013 e 294/2013[3]].

O sentido geral e unânime de tal Jurisprudência é o de considerar que o artigo 3º-1, do CIUC, consagra presunção ilidível da titularidade da propriedade as menções ou inscrições constantes na Conservatória do Registo Automóvel e/ou da base de dados do IMTT à data do facto tributário.

Ou seja: liquidado o IUC em função das inscrições do registo ou de harmonia com os elementos que constam nas bases de dados do IMTT, pode o sujeito passivo exonerar-se do pagamento demonstrando a não correspondência entre a realidade e aquelas inscrições e elementos de que se socorreu a Autoridade Tributária para proceder às liquidações.

Não se antolham razões para inverter o alterar o sentido essencial desta Jurisprudência.

Vejamos então, de novo e mais de perto a questão:

Dispõe o artigo 3º do CIUC (Código do Imposto único de Circulação):

 

Artigo 3º

Incidência Subjetiva

             1 – São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados.

         2 – São equiparados a proprietários os locatários financeiros, os adquirentes com reserva de propriedade, bem como outros titulares de direitos de opção de compra por força do contrato de locação”.

 

Estabelece, por seu lado, o nº1 do artigo 11º da LGT que “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis”.

 Resolver as dúvidas que se suscitem na aplicação de normas jurídicas pressupõe a realização de uma atividade interpretativa.

Há assim que ponderar  qual a melhor interpretação[4] do art. 3º, nº 1 do CIUC, à luz, em primeiro lugar, do elemento literal, ou seja  aquele em que se visa detetar o pensamento legislativo que se encontra objetivado na norma, para se verificar se a mesma contempla uma presunção, ou se determina, em definitivo, que o sujeito passivo do imposto é o proprietário que figura no registo.

A questão que se coloca é, no caso sub juditio, a de saber se a expressão “considerando-se” utilizada pelo legislador no CIUC, em vez da expressão “presumindo-se”, que era a que constava nos diplomas que antecederam o CIUC, terá retirado a natureza de presunção ao dispositivo legal em apreço.

A nosso ver e ao contrário do que defende doutamente a AT, a resposta tem necessariamente de ser negativa, uma vez que da análise do nosso ordenamento jurídico se retira de forma clara que as duas expressões têm sido utilizadas pelo legislador com sentido equivalente, seja ao nível de presunções ilidíveis, seja no quadro das presunções inilidíveis, pelo que nada habilita a extrair a conclusão pretendida pela Autoridade Tributária por uma mera razão semântica.

Na verdade, assim acontece em variadas normas legais que consagram presunções utilizando o verbo “considerar”, de que se indicam, meramente a título de exemplo, as seguintes:

~ no âmbito do direito civil - o nº 3 do art. 243º do Código Civil, quando estabelece que considera-se sempre de má-fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da ação de simulação, quando a este haja lugar”;

 ~  também no âmbito do direito da propriedade industrial o mesmo se passa, quando o art. 59º, nº 1 do Código da Propriedade Industrial dispõe que “(…)as invenções cuja patente tenha sido pedida durante o ano seguinte à data em que o inventor deixar a empresa, consideram-se feitas durante a execução do contrato de trabalho (…)”;

   ~ e, por último, no âmbito do direito tributário, quando os nºs 3 e 4 do art. 89-A, da LGT dispõem que incumbe ao contribuinte o ónus da prova que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que, não sendo feita essa prova, presume-se (“considera-se” na letra da Lei) que os rendimentos são os que resultam da tabela que consta no nº 4 do referido artigo.

Esta conclusão de haver total equivalência de significados entre as duas expressões, que o legislador utiliza indiferentemente, satisfaz a condição estabelecida no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma vez que se encontra assegurado o mínimo de correspondência verbal para efeitos da determinação do pensamento legislativo.

 

Importa, de seguida, submeter a norma em apreço aos demais elementos de interpretação lógica, designadamente, o elemento histórico, o racional ou teleológico e o de ordem sistemática.

Dissertando sobre a atividade interpretativa diz Francisco Ferrara que esta “é a operação mais difícil e delicada a que o jurista pode dedicar-se, e reclama fino trato, senso apurado, intuição feliz, muita experiência e domínio perfeito não só do material positivo, como também do espírito de uma certa legislação. (…) A interpretação deve ser objetiva, equilibrada, sem paixão, arrojada por vezes, mas não revolucionária, aguda, mas sempre respeitadora da lei” (Cfr. Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leistradução de Manuel de Andrade, (2ª ed.), Arménio Amado, Editor, Coimbra, 1963, p. 129).

Como refere Batista Machado “a disposição legal apresenta-se ao jurista como um enunciado linguístico, como um conjunto de palavras que constituem um texto. Interpretar consiste evidentemente em retirar desse texto um determinado sentido ou conteúdo de pensamento.

O texto comporta múltiplos sentidos (polissemia do texto) e contém com frequência expressões ambíguas ou obscuras. Mesmo quando aparentemente claro à primeira leitura, a sua aplicação aos casos concretos da vida faz muitas vezes surgir dificuldades de interpretação insuspeitadas e imprevisíveis. Além de que, embora aparentemente claro na sua expressão verbal e portador de um só sentido, há ainda que contar com a possibilidade de a expressão verbal ter atraiçoado o pensamento legislativo – fenómeno mais frequente do que parecerá à primeira vista “ (Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, pp.175/176).

“A finalidade da interpretação é determinar o sentido objetivo da lei, a vis potestas legis.(…) A lei não é o que o legislador quis ou quis exprimir, mas tão somente aquilo que ele exprimiu em forma de lei. (…) Por outro lado, o comando legal tem um valor autónomo que pode não coincidir com a vontade dos artífices e redatores da lei, e pode levar a consequências inesperadas e imprevistas para os legisladores. (…) O intérprete deve buscar não aquilo que o legislador quis, mas aquilo que na lei aparece objetivamente querido: mens legis e não a mens legislatoris  (Cfr. Francesco Ferrara, Ensaio, pp. 134/135).

Entender uma lei “não é somente aferrar de modo mecânico o sentido aparente e imediato que resulta da conexão verbal; é indagar com profundeza o pensamento legislativo, descer da superfície verbal ao conceito íntimo que o texto encerra e desenvolvê-lo em todas as suas direções possíveis”(loc. cit., p.128).

Com o objetivo de desvendar o verdadeiro sentido e alcance dos textos legais, o intérprete lança mão dos fatores  interpretativos que são essencialmente o elemento gramatical (o texto, ou a “letra da lei”) e o elemento lógico, o qual, por sua vez, se subdivide em elemento racional (ou teleológico), elemento sistemático e elemento histórico. (Cfr. Baptista Machado, Loc. Cit., p. 181; Oliveira Ascensão, O Direito – Introdução e Teoria Geral 2ª Ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p.361).

Entre nós, é o artigo 9º do Código Civil (CC) que fornece as regras e os elementos fundamentais à interpretação correta e adequada das normas.

O texto do nº 1 do artigo 9º do CC começa por dizer que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo”.

Sobre a expressão “pensamento legislativo” diz-nos Batista Machado que o artigo 9º do CC “não tomou posição na controvérsia entre a doutrina subjetivista e a doutrina objetivista. Comprova-o o facto de se não referir, nem à “vontade do legislador” nem à “vontade da lei”, mas apontar antes como escopo da atividade interpretativa a descoberta do “pensamento legislativo” (artº. 9º, 1º). Esta expressão, propositadamente incolor, significa exatamente que o legislador não se quis comprometer” (loc. cit., p. 188).

No mesmo sentido se pronunciam P. de Lima  e A. Varela,  em anotação ao artigo 9º do CC (Cfr. Código Civil Anotado – vol. I, Coimbra ed., 1967, p. 16 ).

E sobre o nº 3 do artigo 9º do CC refere ainda Batista Machado: “(…) este nº 3 propõe-nos, portanto, um modelo de legislador ideal que consagrou as soluções mais acertadas (mais corretas, justas ou razoáveis) e sabe exprimir-se por forma correta. Este modelo reveste-se claramente de características objetivistas, pois não se toma para ponto de referência o legislador concreto (tantas vezes incorreto, precipitado, infeliz) mas um legislador abstrato: sábio, previdente, racional e justo” (Obra e loc. cit. p. 189/190).

Logo a seguir este insigne Mestre  chama a atenção de que o nº 1 do artigo 9º, refere mais três elementos de interpretação a “unidade do sistema jurídico”, as “circunstâncias em que a lei foi elaborada” e as “condições específicas do tempo em que é aplicada” (loc. cit, p. 190).

Quanto às “circunstâncias do tempo em que a lei foi elaborada”, explica ainda Batista Machado que esta expressão “representa aquilo a que tradicionalmente se chama a occasio legis: os fatores conjunturais de ordem política, social e económica que determinaram ou motivaram a medida legislativa em causa” (loc. cit., p.190).

Relativamente às “condições específicas do tempo em que é aplicada” . este elemento de interpretação “tem decididamente uma conotação atualista (loc. cit., p. 190) no que coincide com a opinião expressa por P. de Lima E A. Varela, nas anotações ao artigo 9º do CC.

No que respeita à “unidade do sistema jurídico” , Baptista Machado considera este o fator interpretativo mais importante: “ (…)a sua consideração como fator decisivo ser-nos-ia sempre imposta pelo princípio da coerência valorativa ou axiológica da ordem jurídica” (loc. cit., p. 191).

É também este autor que nos diz, relativamente ao elemento literal ou gramatical (texto ou “letra da lei”) que este “é o ponto de partida da interpretação. Como tal, cabe-lhe desde logo uma função negativa: a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei.

Mas cabe-lhe igualmente uma função positiva, nos seguintes termos: se o texto comporta apenas um sentido, é esse o sentido da norma – com a ressalva, porém, de se poder concluir com base noutras normas que a redação do texto atraiçoou o pensamento do legislador” (loc. cit., p. 182).

 

Referindo-se ao elemento racional ou teleológico, diz este autor que ele consiste “na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao elaborar a norma. O conhecimento deste fim, sobretudo quando acompanhado do conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.,) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura política-económica-social que motivou a decisão legislativa (occasio legis) constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma. Basta lembrar que o esclarecimento da ratio legis nos revela a valoração ou ponderação dos diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses interesses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime” (loc. cit., pp. 182/183).

No que respeita ao elemento sistemático (contexto da lei e lugares paralelos) que “este elemento compreende a consideração das outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos).Compreende ainda o lugar sistemático que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico.

Baseia-se este subsídio interpretativo no postulado da coerência intrínseca do ordenamento, designadamente no facto de que as normas contidas numa codificação obedecem por princípio a um pensamento unitário” (Batista Machado, loc.cit., p. 183).

 “(…) Em particular havemos de tomar em consideração o encandeamento das diversas leis do país, porque uma exigência fundamental de toda a sã legislação é que as leis se ajustem umas às outras e não redundem em congérie de disposições desconexas (Joseph Kohler, citado por Manuel de Andrade, in Ensaio, p. 27).

 

Descendo ao caso dos autos e ao enquadramento legal e jurídico que lhe subjaz:

Através da análise do elemento histórico, extrai-se a conclusão que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei 59/72, de 30 de Dezembro, o primeiro a regular esta matéria, até ao Decreto-Lei nº 116/94, de 3 de Maio, o último a anteceder o CIUC [cfr Lei nº 22-A/2007, com as alterações da Lei 67-A/2007 e 3-B/2010], foi consagrada a presunção [grifado nosso] dos sujeitos passivos do IUC serem as pessoas em nome das quais os veículos se encontravam matriculados à data da sua liquidação.

            Verifica-se, portanto, que a lei fiscal teve, desde sempre, o objetivo de tributar o verdadeiro e efetivo proprietário e utilizador do veículo, afigurando-se indiferente a utilização de uma ou outra expressão que, como vimos, têm na nossa ordem jurídica um sentido coincidente.

            O mesmo se diga quando nos socorremos dos elementos de interpretação de natureza racional ou teleológica.

            Com efeito, o atual e novo quadro da tributação automóvel consagra princípios que visam sujeitar os proprietários dos veículos a suportarem os prejuízos por danos viários e ambientais causados por estes, como se alcança do teor do art. 1º do CIUC.

            Ora a consideração destes princípios, designadamente, o princípio da equivalência, que merecem tutela constitucional e consagração no direito comunitário, e são também reconhecidos em outros ramos do ordenamento jurídico, determina que os aludidos custos sejam suportados pelos reais proprietários, os causadores dos referidos danos, o que afasta, de todo, uma interpretação que visasse impedir os presumíveis proprietários de fazer prova de que já não o são por a propriedade estar na esfera jurídica de outrem[5].

Assim, também, da interpretação efetuada à luz dos elementos de natureza racional e teleológica, atento aquilo que a racionalidade do sistema garante e os fins visados pelo novo CIUC, resulta claro que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.

Em face do exposto, importa concluir que a ratio legis do imposto aponta no sentido de serem tributados os efetivos proprietários-utilizadores dos veículos pelo que a expressão “considerando-se” está usada no normativo em apreço num sentido semelhante a “presumindo-se”, razão pela qual dúvidas não há que está consagrada uma presunção legal.

 

Por outro lado, estabelece o art. 73º da LGT que “(…) as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, pelo que são ilidíveis (…)”.

Assim sendo, consagrando o art. 3º, nº 1 do CIUC uma presunção juris tantum [e, portanto, ilidível], a pessoa que está inscrita no registo como proprietária do veículo e que, por essa razão foi considerada pela Autoridade Tributária como sujeito passivo do imposto, pode apresentar elementos de prova visando demonstrar que o titular da propriedade, na data do facto tributário, é outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.

 

Analisados os elementos carreados para o processo e os factos provados, extrai-se a conclusão que a impugnante não era a proprietária dos veículos a que respeitam as liquidações em apreço à data dos respetivos factos tributários, por, entretanto, já ter transferido a propriedade do veículo em causa, nos termos da lei civil.

 Estas operações de transmissão de propriedade são oponíveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, porquanto, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos em relação a terceiros quando registados, face ao disposto no art. 5º, nº 1 do Código do Registo Predial [aplicável por remissão do Código do Registo Automóvel], a Autoridade Tributária não é terceiro para efeitos de registo, uma vez que não se encontra na situação prevista no nº 2 do referido art. 5º do Código do Registo Predial, aplicável por força do Código do Registo Automóvel, ou seja: não adquiriu de um autor comum direitos incompatíveis entre si.

 

Em síntese  conclusiva:

Para liquidação de IUC, a Autoridade Tributária e Aduaneira só pode prevalecer-se da realidade registal ou constante da base de dados do IMTT, se não for comprovada a desatualização da situação jurídica, designadamente quanto à propriedade do veículo.

O registo automóvel, na economia do CIUC, representa assim mera presunção ilidível dos sujeitos passivos do imposto.

 

Nestas circunstâncias, estão reunidos os pressupostos necessários para a procedência do pedido de anulação das liquidações, com fundamento em ilegalidade e erro nos pressupostos.

 

Pedido de juros indemnizatórios

A Impugnante, em 4-12-2013, procedeu ao pagamento integral das referidas liquidações de IUC.

E pede o reembolso desses montantes indevidos, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, nos termos do art. 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, há lugar a reembolso do imposto, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado”.

No que concerne aos juros indemnizatórios, é também claro que a ilegalidade do ato é imputável à Administração Tributária e Aduaneira, que, por sua iniciativa o praticou sem suporte legal.

Está-se perante um vício de violação de lei substantiva, consubstanciado em erro nos pressupostos de direito, imputável à Administração Tributária.

Consequentemente, a requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que pagou indevidamente.

Assim, deverá a Autoridade Tributária e Aduaneira dar execução ao presente acórdão, nos termos do art. 24.º, n.º 1, do RJAT, determinando o montante a restituir aos Requerentes e calcular os respetivos juros indemnizatórios, à taxa legal supletiva das dívidas cíveis, nos termos dos arts. 35.º, n.º 10, e 43.º, n.ºs 1 e 5, da LGT, 61.º, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou diploma ou diplomas que lhe sucederem).

Os juros indemnizatórios são devidos desde a data do pagamento (4-12-2013), até à do processamento da nota de crédito, em que são incluídos (art. 61.º, n.º 5, do CPPT).

 

III – DECISÃO

De harmonia com o exposto, decide este Tribunal Arbitral, julgar, totalmente procedentes os pedidos de anulação das liquidações de IUC e, em consequência, anula esses atos tributários e condena a Autoridade Tributária e Aduaneira na restituição à requerente dos respetivos valores pagos, com juros indemnizatórios contados à taxa legal nos termos expostos supra, desde a data do pagamento (4-12-2013) até ao processamento da nota de crédito.

 Valor do processo

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 2.079,48.

Custas

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612,00 (seiscentos e doze euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Lisboa, 18 de setembro de 2014

O Árbitro,

 

(José Poças Falcão)

 



[1] Art. 73.º da LGT.

[2] Acrónimo de Código do Imposto Único de Circulação.

[3]  Em que foi também árbitro o signatário.

[4] A génese da relação jurídica de imposto pressupõe a verificação cumulativa dos três pressupostos necessários ao seu surgimento, a saber: o elemento real, o elemento pessoal e o elemento temporal. (Neste sentido veja-se, entre muitos outros autores, Freitas Pereira, M. H., Fiscalidade, 3ª Edição, Almedina, Coimbra, 2009).

 

[5] Sob a epígrafe “princípio da equivalência” estabelece o artigo 1º do CIUC: “O imposto único de circulação obedece ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida do custo ambiental e viário que estes provocam, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.

Sobre a noção do princípio da equivalência diz-nos SÉRGIO VASQUES: “Em obediência ao princípio da equivalência, o imposto deve ser conformado em atenção ao benefício que o contribuinte retira da actividade pública, ou em atenção ao custo que imputa à comunidade pela sua própria actividade”(Cfr. Os Impostos Especiais de Consumo, Almedina, 2000, p. 110).

E, mais à frente, explica este Professor, relativamente aos automóveis: “um imposto sobre os automóveis assente numa regra de equivalência será igual apenas se aqueles que provoquem o mesmo desgaste viário e o mesmo custo ambiental paguem o mesmo imposto; e aqueles que provoquem desgaste e custo ambiental diverso, paguem imposto diverso também.