Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 598/2018-T
Data da decisão: 2019-04-30  IRS  
Valor do pedido: € 24.654,22
Tema: IRS – Mais – valias imobiliárias de não residentes – Decisão de Reenvio Prejudicial (anexa à decisão).
REENVIO PREJUDICIAL   Versão em PDF

Decisão Arbitral

Reenvio Prejudicial

 

1. Relatório

 

O Requerente, A..., casado, contribuinte fiscal n.º..., residente em ..., ..., França, tendo como Serviço de Finanças Local o SLF de Coimbra ..., vem , nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, n.º 2 do artigo 5.º, n.º 1 do artigo 6.º e dos artigos 10.º e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem (RJAT), em conjugação com a alínea a) do artigo 99.º e das alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 102.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral. 

 

O Requerente pede:

a)            A declaração da ilegalidade e consequente anulação do ato de liquidação de IRS n.º 2018..., de 05.07.2018, no montante de € 24.654,22;

b)           Seja ordenado o reembolso da referida importância a título de imposto indevidamente pago;

c)            A condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios contados até à data da emissão e processamento da nota de crédito respetiva, tudo nos termos dos artigos 43.º e 100.º da LGT e artigo 61.º do CPPT.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 30 de novembro de 2011, tendo sido automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nessa mesma data.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o signatário, que comunicou atempadamente a aceitação do encargo em 20 de dezembro de 2018.

Em 22-01-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular foi devidamente constituído em 11-02-2019 e é materialmente competente.

As Partes estão devidamente representadas e gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas.

                A Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada em 12-02-2019, respondeu em 18-03-2019, alegando que face à redação introduzida ao artigo 72.º do Código do IRS pela Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, resultou um novo quadro jurídico normativo que ainda não foi alvo de análise pelo TJUE, para efeitos de verificação da sua compatibilidade com o Direito Comunitário, já que a decisão tomada pelo TJCE no Acórdão C-443/06 é de 2007OUT11, embora em sentido da existência de contrariedade da disciplina de então da tributação das mais-valias imobiliárias em Portugal de não residentes, prevista nos artigos 72.º, n.º 1 e 43.º, n.º 2 do Código do IRS, se mostra ultrapassada em virtude das supra referidas alterações ao artigo 72.º Código do IRS pela Lei n.º 67.º/2007, de 31/12, no sentido da sua adequação ao disposto no artigo 56.º CE.

Mais alega a Requerida que o presente quadro normativo passou a prever duas hipóteses em alternativa, a saber:

1.ª -  A tributação do sujeito passivo Requerente nos presentes autos, por opção, à taxa que lhe competia, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º do Código do IRS, com aplicação do artigo 42.º, n.º3 ;

2.ª A tributação, por opção, (como, aliás, foi assinalado pelo Requerente) pela taxa autónoma específica de 28%, conforme previsto no artigo 72.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, sem aplicação da redução a 50% conforme artigo 43.º, n.º 2, e pela qual lhe foi liquidado o IRS assim devido;

A Requerida sugere, por isso, que deverá suspender-se a presente instância arbitral e sujeitar a questão ao Tribunal de Justiça Europeu, nos termos previstos no instituto do reenvio prejudicial (artigo 267 do TFUE) a que o Estado Português se vinculou.

Face à proposta da Requerida, foi notificada a Requerente para o devido contraditório.

Em 11/4/2019, vem a Requerente alegar que o assunto já foi objeto de análise pelos tribunais nacionais, remetendo para os seguintes processos:

a) - Proc. n.º 45/2012-T, de 5 de julho, decidido no âmbito do CAAD, que com base no Acórdão do TJUE, de 18 de março de 2010, proferido no processo C-440, de 18 de março de 2010 , extratando parte deste acórdão, de que se dá conta da seguinte passagem:

" Neste sentido se pronunciou o TJUE (…no Acórdão citado), numa situação que              apresenta manifesto paralelismo, somente com a diferença de que neste processo estava     em causa a violação do artigo 49.º e não do artigo 63.º do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia.

Salienta aquele órgão jurisdicional que "a opção de equiparação permite a um contribuinte não residente, (…) escolher entre um regime discriminatório e um outro    regime supostamente não discriminatório", frisando que essa escolha não é passível de excluir efeitos discriminatórios do primeiro desses dois regimes fiscais"1.

E continua aquele tribunal revelando o paradoxo:

                "O reconhecimento de um efeito dessa natureza à referida escolha teria por      consequência (…) validar um regime fiscal que continuaria, em si mesmo, a violar o   artigo 49.º do TFUE em razão do seu carácter discriminatório "16.

Conclui o TJUE que o Tratado…

                 "se opõe a uma regulamentação nacional que discrimina os contribuintes não residentes na concessão de um benefício fiscal (…) apesar de esses contribuintes poderem         optar, no que se refere a esse benefício, pelo regime aplicável aos contribuintes          residentes".

Reconhece, porém, o Requerente o seguinte:

 - Não se desconhece que as consequências aqui retiradas da jurisprudência comunitária acima mencionada, em particular do Acórdão Hollmann , propiciam uma tributação mais favorável das mais-valias imobiliárias auferidas por não residentes em Portugal, que residam na União Europeia, do que por residentes, pois, para além de beneficiarem de igual modo da redução a 50% da base de incidência de IRS, são sujeitos a uma taxa única de 25% que será, na maioria dos casos, inferior às taxas progressivas dos residentes, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º do Código do IRS, a que acresce o facto de estes últimos terem de englobar todos os rendimentos.

 

Remete ainda o Requerente para a decisão do Tribunal Arbitral, no âmbito do processo n.º 127/2012-T, em que foi decidido (…) que o disposto no artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS "não está em conformidade quer com o direito comunitário, na qual se inclui a jurisprudência comunitária, quer com a jurisprudência portuguesa" .

 

Também cita o Processo n.º 748/2015-T, de 27 de julho de 2016, que concluiu pela violação do direito comunitário, por incompatibilidade com o mesmo da norma do artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS e por alegada violação da liberdade de circulação de capitais .

 

E o Requerente remete, finalmente, para o objeto da pronúncia do Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 22-03-2011, no âmbito do processo n.º 1013/10, de 22-03-2011 (…) nos seguintes termos:

"É, aliás, sabido, que o legislador, por via da Lei n.º 67.º-A/2007, de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2008), procura obviar a esse tratamento de favor dos não residentes comunitários e do espaço económico europeu que obtivessem em Portugal mais-valias imobiliárias, permitindo-lhes a opção pela tributação desses rendimentos em condições similares às aplicáveis aos residentes em Portugal (cfr. o aditamento ao artigo 72.º do Código do IRS dos seus números 7 e 8, actuais números 8 e 9) após a renumeração operada pelo artigo 4.º do decreto-Lei n.º 240/09, de 23 de setembro).

Sucede, contudo, que, daí não se pode retirar qualquer consequência para o caso dos autos, pois foi a Administração fiscal que, perante a declaração dos contribuintes, lhes liquidou o imposto que considerou devido (como aliás sempre sucede no IRS): à taxa prevista para os não residentes  (25% nos termos do artigo 72.º, n.º 1 do Código do IRS) e sobre o montante total da mais-valia realizada e não apenas sobre 50% deste valor (artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS), assim ignorando a jurisprudência comunitária e a deste Supremo Tribunal que a acolheu (cfr. o Acórdão de 16 de Janeiro de 2008, rec. n.º 439/06) quanto à incompatibilidade daquela disposição legal, assim aplicada, com o (então) artigo 56.º do TJCE (actual artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia), sujeitando deste modo, como veio a acontecer, a ver anulada nessa parte a liquidação impugnada, da do o primado do direito comunitário.", disponível em: http:/www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5942b010aec666d280257862003e595e?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1

 

Salienta-se que a decisão proferida no douto Acórdão do STA - Supremo Tribunal Administrativo seguiu, no Processo n.º 0439/06, de 2008JAN16, o entendimento do douto Acórdão do TJCE, por à data ainda não se encontrarem em vigor as alterações introduzidas pela referida Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

a) O Requerente tem residência fiscal em Paris, França, em ..., ..., tendo como Serviço Local de Finanças o de Coimbra-..., cfr. Doc. 2 Anexo à PI. 

 

b) O Requerente adquiriu em 17-01-2002 a fração autónoma designada pela letra C do prédio sito na Rua ..., n.º..., Lisboa, inscrita na respetiva matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ..., pelo preço de € 79.807,66, tendo pago imposto da sisa sobre esse valor ;

 

c) Conforme respetiva declaração, o Requerente assinalou no Rosto da mesma, no Quadro 8B, o campo 4 (correspondente a não residente), o campo 6 (correspondente a residente em país da EU) e o campo 7 (optando pela tributação aplicável aos não residentes), excluindo a opção do campo 09 (tributação pelas taxas gerais do artigo 68.º do CIRS, bem como a opção do campo 10 (Opção pelas regras dos residentes).

 

c) Apresentou oportunamente a sua declaração Mod. 3 de IRS relativa ao ano fiscal de 2017, Via Internet, tendo declarado, no respetivo Anexo G (Mais-Valias e outros incrementos patrimoniais) os valores de compra e venda de uma habitação, bem como os respetivos anos e despesas e encargos de aquisição e de alienação;

 

e) A Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à respetiva liquidação de IRS n.º 2018..., de 05-07-2018, no montante de € 24.654,22, com aplicação às mais-valias imobiliárias apuradas a taxa autónoma de 28%, com exclusão, portanto, de 50% das mais-valias aplicável aos sujeitos passivos residentes.

 

f) O Requerente reagiu contra esta liquidação em 30-11-2018, mediante impugnação arbitral, perante o CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, por considerar que a mesma se encontrava ferida de ilegalidade, por descriminação negativa em relação aos sujeitos passivos residentes, com a alegação de que tal situação constitui uma restrição à liberdade de circulação de capitais previsto no n.º 1 do artigo 63.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pelo Requerente, que não são questionadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Não há controvérsia sobre a matéria de facto.

 

3. Questão da incompatibilidade da lei portuguesa em matéria da tributação das mais-valias imobiliárias com o direito europeu.

 

3.1 A Legislação atual de Portugal em matéria de tributação das mais-valias imobiliárias obtidas por residentes na União Europeia é a seguinte:

 

a) Matéria legislativa - Alterações introduzidas ao artigo 72.º do Código do IRS:

 

a.1 - Redação em vigor a 31/12/2007, dada pela Lei n.º 55.º-B/2004, de 30 de dezembro:

"Art.º 72.º

Taxas especiais

1 - As mais-valias e outros rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável nele situado e que não sejam sujeitos a retenção na fonte às taxas liberatórias são tributados à taxa autónoma de 25%, ou de 15% quando se trate de rendimentos prediais, salvo o disposto no n.º 4.

 

2 - Os rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável aí situado, são tributados à taxa de 25%;

3 - …

4 - O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 10%.

 

a.2- Redação introduzida pela lei n.º 67-A/2007, de 31/12, com entrada em vigor em 1/1/2008:

"Art.º 72.º

Taxas especiais

1 - As mais-valias e outros rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável nele situado e que não sejam sujeitos a retenção na fonte às taxas liberatórias são tributados à taxa autónoma de 25%, ou de 15% quando se trate de rendimentos prediais, salvo o disposto no n.º 4.

 

2 - Os rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável aí situado, são tributados à taxa de 25%;

3 - …

4 - O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 10%.

5 -…

6 - …

7 - Os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nos n.ºs 1 e 2, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.

8 - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes.

 

 

a.3 - Redação introduzida pela lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, com entrada em vigor em 1/1/2015:

 

7 - (Revogado)

8 - …

9 - Os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2 , pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.

 

10 - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes.

11 - …

12 - …"

 

 

a.4) Redação dada ao artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS pela Lei n.º 42/2016, de 28/12 (OE/2013), aplicável à situação do processo em análise:

Artigo 43.º

Mais-valias

1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes:

 

2 - O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efetuadas por residentes previstas nas alíneas a) , c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor.

…..

 

b) Alteração declarativa - Alterações introduzidas à Declaração Modelo 3 de IRS em vigor a partir de 2009 (relativa aos rendimentos de 2008 e seguintes), a que se refere o artigo 57.º do Código do IRS, cujo modelo foi utilizado pelo Requerente, na sua declaração apresentada relativamente ao ano fiscal de 2017:

b.1 - Rosto da declaração - Quadro 8 B:

Campo 04 - Não residentes (assim assinalada pelo Requerente)

Campo 06 - Residência em país da EU ou EEE (indicando o código 250 - respeitante a     França)

Campo 7 - Pretende a tributação pelo regime geral (por ser residente na União Europeia             ou no Espaço Económico Europeu)

Campo 10 - Opção pela tributação segundo as regras aplicáveis aso residentes (artigo   17.º-A do CIRS) - Não foi assinalado pelo Requerente.

 

Não se ignora que o artigo 56.º do TCE (atual 63.º do TFUE) proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais, não só entre Estados-Membros, mas também entre Estados-Membros e países terceiros.

 

Igualmente não se ignora a jurisprudência do Acórdão do TJUE de 11/10/2007, proferido no processo C-443/06 (Hollmann), que decidiu que:

 

                "O artigo 56.º CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação       nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal , que sujeita as mais-         valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso    vertente Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-             Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de                 operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado              esse bem imóvel…".

 

Apesar da douta decisão citada, continuam a restar-nos dúvidas sobre se a situação dos presentes autos se poderá subsumir inteiramente à do processo C-443/06, porquanto a legislação atualmente existente já não é a mesma de então, possibilitando hoje ao residente num Estado-Membro obviar a esse tratamento desigual, se optar por ser tratado como residente, com todas as legais consequências, em igualdade com a legislação aplicável a residentes.

 

7. Decisão          

 

De harmonia com o exposto, e precisamente porque o atual quadro legal fiscal português, em matéria de tributação em IRS das mais-valias imobiliárias obtidas em Portugal por residentes na União Europeia, bem como a própria obrigação declarativa, já não é aquele que existia à data do Acórdão citado pelo Requerente, do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, Processo n.º C-443-06, de 11 de novembro de 2007, (Hollmann), por força das alterações antes referidas, designadamente por força do aditamento dos n.ºs 7 e 8 (atuais 9 e 10) ao artigo 72.º do Código do IRS pela Lei n.º 67-A/2007, de 31/12,

 

Decide este Tribunal Arbitral:

 

1 - Submeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo da alínea a) do artigo 267.º do TFUE, a seguinte questão prejudicial necessária ao julgamento da causa:

 

Questão:

As disposições conjugadas dos artigos 12.º, 56.º, 57.º e 58.º do Tratado da Comunidade Europeia [atuais 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no presente processo (n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442.º-A/88, de 30 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro), com as alterações introduzidas pela Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, com aditamento dos n.ºs 7 e 8 (atuais 9 e 10) ao artigo 72.º do Código do IRS, por forma a permitir que as mais-valias resultantes da alienação de imóveis situados num Estado-Membro (Portugal), por um residente de um outro Estado-Membro da União Europeia (França) não fiquem sujeitos, por opção, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde estão situados os imóveis?

 

2 - Suspender a presente instância até à decisão a proferir pelo Tribunal de Justiça Europeu, nos termos que antes se solicita.

   

 

Custas a final.

 

Lisboa, 30-04-2019

 

O Árbitro,

 

(José Rodrigo de Castro)
 

2.ª DECISÃO Versão em PDF

Decisão Arbitral

 

1. Relatório

 

O Requerente, A..., casado, contribuinte fiscal n.º..., residente em Paris,  ..., ..., ..., França, tendo como Serviço de Finanças Local o SLF de Coimbra ..., vem , nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, n.º 2 do artigo 5.º, n.º 1 do artigo 6.º e dos artigos 10.º e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem (RJAT), em conjugação com a alínea a) do artigo 99.º e das alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 102.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral. 

 

O Requerente pede:

a)            A declaração da ilegalidade e consequente anulação do ato de liquidação de IRS n.º 2018..., de 05.07.2018, no montante de € 24.654,22;

b)           Seja ordenado o reembolso da referida importância a título de imposto indevidamente pago;

c)            A condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios contados até à data da emissão e processamento da nota de crédito respetiva, tudo nos termos dos artigos 43.º e 100.º da LGT e artigo 61.º do CPPT.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 30 de novembro de 2011, tendo sido automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nessa mesma data.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o signatário, que comunicou atempadamente a aceitação do encargo em 20 de dezembro de 2018.

Em 22-01-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular foi devidamente constituído em 11-02-2019 e é materialmente competente.

As Partes estão devidamente representadas e gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas.

                A Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada em 12-02-2019, respondeu em 18-03-2019, alegando que face à redação introduzida ao artigo 72.º do Código do IRS pela Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, resultou um novo quadro jurídico normativo que ainda não foi alvo de análise pelo TJUE, para efeitos de verificação da sua compatibilidade com o Direito Comunitário, já que a decisão tomada pelo TJCE no Acórdão C-443/06 é de 2007OUT11, embora em sentido da existência de contrariedade da disciplina de então da tributação das mais-valias imobiliárias em Portugal de não residentes, prevista nos artigos 72.º, n.º 1 e 43.º, n.º 2 do Código do IRS, se mostra ultrapassada em virtude das supra referidas alterações ao artigo 72.º Código do IRS pela Lei n.º 67.º/2007, de 31/12, no sentido da sua adequação ao disposto no artigo 56.º CE.

Mais alega a Requerida que o presente quadro normativo passou a prever duas hipóteses em alternativa, a saber:

1.ª - A tributação do sujeito passivo Requerente nos presentes autos, por opção, à taxa que lhe competia, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º do Código do IRS, com aplicação do artigo 42.º, n.º 3;

2.ª A tributação, por opção, (como, aliás, foi assinalado pelo Requerente) pela taxa autónoma específica de 28%, conforme previsto no artigo 72.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, sem aplicação da redução a 50% conforme artigo 43.º, n.º 2, e pela qual lhe foi liquidado o IRS assim devido;

A Requerida sugere, por isso, que deverá suspender-se a presente instância arbitral e sujeitar a questão ao Tribunal de Justiça Europeu, nos termos previstos no instituto do reenvio prejudicial (artigo 267 do TFUE) a que o Estado Português se vinculou.

Face à proposta da Requerida, foi notificada a Requerente para o devido contraditório.

Em 11/4/2019, vem a Requerente alegar que o assunto já foi objeto de análise pelos tribunais nacionais, remetendo para os seguintes processos:

a) - Proc. n.º 45/2012-T, de 5 de julho, decidido no âmbito do CAAD, que com base no Acórdão do TJUE, de 18 de março de 2010, proferido no processo C-440, de 18 de março de 2010 , extratando parte deste acórdão, de que se dá conta da seguinte passagem:

" Neste sentido se pronunciou o TJUE (…no Acórdão citado), numa situação que apresenta manifesto paralelismo, somente com a diferença de que neste processo estava               em causa a violação do artigo 49.º e não do artigo 63.º do Tratado sobre o funcionamento da União Europeia.

Salienta aquele órgão jurisdicional que "a opção de equiparação permite a um contribuinte não residente, (…) escolher entre um regime discriminatório e um outro    regime supostamente não discriminatório", frisando que essa escolha não é passível de             excluir efeitos discriminatórios do primeiro desses dois regimes fiscais"1.

E continua aquele tribunal revelando o paradoxo:

"O reconhecimento de um efeito dessa natureza à referida escolha teria por consequência (…) validar um regime fiscal que continuaria, em si mesmo, a violar o artigo 49.º do TFUE em razão do seu carácter discriminatório "16.

Conclui o TJUE que o Tratado…

 "se opõe a uma regulamentação nacional que discrimina os contribuintes não residentes           na concessão de um benefício fiscal (…) apesar de esses contribuintes poderem         optar, no que se refere a esse benefício, pelo regime aplicável aos contribuintes          residentes".

Reconhece, porém, o Requerente o seguinte:

 - Não se desconhece que as consequências aqui retiradas da jurisprudência comunitária acima mencionada, em particular do Acórdão Hollmann , propiciam uma tributação mais favorável das mais-valias imobiliárias auferidas por não residentes em Portugal, que residam na União Europeia, do que por residentes, pois, para além de beneficiarem de igual modo da redução a 50% da base de incidência de IRS, são sujeitos a uma taxa única de 25% que será, na maioria dos casos, inferior às taxas progressivas dos residentes, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º do Código do IRS, a que acresce o facto de estes últimos terem de englobar todos os rendimentos.

 

Remete ainda o Requerente para a decisão do Tribunal Arbitral, no âmbito do processo n.º 127/2012-T, em que foi decidido (…) que o disposto no artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS "não está em conformidade quer com o direito comunitário, na qual se inclui a jurisprudência comunitária, quer com a jurisprudência portuguesa" .

 

Também cita o Processo n.º 748/2015-T, de 27 de julho de 2016, que concluiu pela violação do direito comunitário, por incompatibilidade com o mesmo da norma do artigo 43.º, n.º 2 do  Código do IRS e por alegada violação da liberdade de circulação de capitais .

 

E o Requerente remete, finalmente, para o objeto da pronúncia do Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 22-03-2011, no âmbito do processo n.º 1013/10, de 22-03-2011 (…) nos seguintes termos:

                "É, aliás, sabido, que o legislador, por via da Lei n.º 67.º-A/2007, de 31 de Dezembro     (Orçamento de Estado para 2008), procura obviar a esse tratamento de favor dos não residentes comunitários e do espaço económico europeu que obtivessem em Portugal   mais-valias imobiliárias, permitindo-lhes a opção pela tributação desses rendimentos     em condições similares às aplicáveis aos residentes em Portugal (cfr. o aditamento ao   artigo 72.º do Código do IRS dos seus números 7 e 8, actuais números 8 e 9) após a     renumeração operada pelo artigo 4.º do decreto-Lei n.º 240/09, de 23 de setembro).

                Sucede, contudo, que, daí não se pode retirar qualquer consequência para o caso dos   autos, pois foi a Administração fiscal que, perante a declaração dos contribuintes, lhes liquidou o imposto que considerou devido (como aliás sempre sucede no IRS): à taxa           prevista para os não residentes  (25% nos termos do artigo 72.º, n.º 1 do Código do IRS) e         sobre o montante total da mais-valia realizada e não apenas sobre 50% deste valor (artigo                 43.º, n.º 2 do Código do IRS), assim ignorando a jurisprudência comunitária e a deste    Supremo Tribunal que a acolheu (cfr. o Acórdão de 16 de Janeiro de 2008, rec. n.º 439/06)       quanto à incompatibilidade daquela disposição legal, assim aplicada, com o (então)       artigo 56.º do TJCE (actual artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União    Europeia), sujeitando deste modo, como veio a acontecer, a ver anulada nessa parte a liquidação impugnada, dado o primado do direito comunitário.", disponível em:                 http:/www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5942b010aec666d28025                7862003e595e?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1

 

Salienta-se que a decisão proferida no douto Acórdão do STA - Supremo Tribunal Administrativo seguiu, no Processo n.º 0439/06, de 2008JAN16, o entendimento do douto Acórdão do TJCE, por à data ainda não se encontrarem em vigor as alterações introduzidas pela referida Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

a) O Requerente tem residência fiscal em Paris, França, em ..., ..., ..., tendo como Serviço Local de Finanças o de Coimbra-..., cfr. Doc. 2 Anexo à PI. 

 

b) O Requerente adquiriu em 17-01-2002 a fração autónoma designada pela letra C do prédio sito na Rua ..., n.º..., ..., Lisboa, inscrita na respetiva matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ..., pelo preço de € 79.807,66, tendo pago imposto da sisa sobre esse valor;

 

c)  Conforme respetiva declaração, o Requerente assinalou no Rosto da mesma, no Quadro 8B, o campo 4 (correspondente a não residente), o campo 6 (correspondente a residente em país da EU) e o campo 7 (optando pela tributação aplicável aos não residentes), excluindo a opção do campo 09 (tributação pelas taxas gerais do artigo 68.º do CIRS, bem como a opção do campo 10 (Opção pelas regras dos residentes).

 

d)  Apresentou oportunamente a sua declaração Mod. 3 de IRS relativa ao ano fiscal de 2017, Via Internet, tendo declarado, no respetivo Anexo G (Mais-Valias e outros incrementos patrimoniais) os valores de compra e venda de uma habitação, bem como os respetivos anos e despesas e encargos de aquisição e de alienação;

 

e) A Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu à respetiva liquidação de IRS n.º 2018..., de 05-07-2018, no montante de € 24.654,22, com aplicação às mais-valias imobiliárias apuradas a taxa autónoma de 28%, com exclusão, portanto, de 50% das mais-valias aplicável aos sujeitos passivos residentes.

 

f) O Requerente reagiu contra esta liquidação em 30-11-2018, mediante impugnação arbitral, perante o CAAD - Centro de Arbitragem Administrativa, por considerar que a mesma se encontrava ferida de ilegalidade, por discriminação negativa em relação aos sujeitos passivos residentes, com a alegação de que tal situação constitui uma restrição à liberdade de circulação de capitais previsto no n.º 1 do artigo 63.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pelo Requerente, que não são questionadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Não há controvérsia sobre a matéria de facto.

 

3. Questão da incompatibilidade da lei portuguesa em matéria da tributação das mais-valias imobiliárias com o direito europeu.

 

3.1 A legislação atual de Portugal em matéria de tributação das mais-valias imobiliárias obtidas por residentes na União Europeia é a seguinte:

 

a) Matéria legislativa - Alterações introduzidas ao artigo 72.º do Código do IRS:

 

a.1 - Redação em vigor a 31/12/2007, dada pela Lei n.º 55.º-B/2004, de 30 de dezembro:

"Art.º 72.º

Taxas especiais

1 - As mais-valias e outros rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável nele situado e que não sejam sujeitos a retenção na fonte às taxas liberatórias são tributados à taxa autónoma de 25%, ou de 15% quando se trate de rendimentos prediais, salvo o disposto no n.º 4.

 

2 - Os rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável aí situado, são tributados à taxa de 25%;

3 - …

4 - O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 10%.

 

a.2- Redação introduzida pela lei n.º 67-A/2007, de 31/12, com entrada em vigor em 1/1/2008:

"Art.º 72.º

Taxas especiais

1 - As mais-valias e outros rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável nele situado e que não sejam sujeitos a retenção na fonte às taxas liberatórias são tributados à taxa autónoma de 25%, ou de 15% quando se trate de rendimentos prediais, salvo o disposto no n.º 4.

 

2 - Os rendimentos auferidos por não residentes em território português que não sejam imputáveis a estabelecimento estável aí situado, são tributados à taxa de 25%;

3 - …

4 - O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 10%.

5 -…

6 - …

7 - Os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nos n.ºs 1 e 2, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.

8 - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes.

 

 

a.3 - Redação introduzida pela lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, com entrada em vigor em 1/1/2015:

 

7 - (Revogado)

8 - …

9 - Os residentes noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português.

 

10 - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes.

11 - …

12 - …"

 

 

a.4) Redação dada ao artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS pela Lei n.º 42/2016, de 28/12 (OE/2013), aplicável à situação do processo em análise:

Artigo 43.º

Mais-valias

1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes:

 

2 - O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efetuadas por residentes previstas nas alíneas a) , c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor.

…..

 

b) Alteração declarativa - Alterações introduzidas à Declaração Modelo 3 de IRS em vigor a partir de 2009 (relativa aos rendimentos de 2008 e seguintes), a que se refere o artigo 57.º do Código do IRS, cujo modelo foi utilizado pelo Requerente, na sua declaração apresentada relativamente ao ano fiscal de 2017:

b.1 - Rosto da declaração - Quadro 8 B:

Campo 04 - Não residentes (assim assinalada pelo Requerente)

Campo 06 - Residência em país da EU ou EEE (indicando o código 250 - respeitante a     França)

Campo 7 - Pretende a tributação pelo regime geral (por ser residente na União Europeia             ou no Espaço Económico Europeu)

Campo 10 - Opção pela tributação segundo as regras aplicáveis aos residentes (artigo   17.º-A do CIRS) - Não foi assinalado pelo Requerente.

 

Não se ignora que o artigo 56.º do TCE (atual 63.º do TFUE) proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais, não só entre Estados-Membros, mas também entre Estados-Membros e países terceiros.

 

Igualmente não se ignora a jurisprudência do Acórdão do TJUE de 11/10/2007, proferido no processo C-443/06 (Hollmann), que decidiu que:

 

                "O artigo 56.º CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação       nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal , que sujeita as mais-         valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso    vertente Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-             Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de                 operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado              esse bem imóvel…".

 

Apesar da douta decisão citada, continuam a restar-nos dúvidas sobre se a situação dos presentes autos se poderá subsumir inteiramente à do processo C-443/06, porquanto a legislação atualmente existente já não é a mesma de então, possibilitando hoje ao residente num Estado-Membro obviar a esse tratamento desigual, se optar por ser tratado como residente, com todas as legais consequências, em igualdade com a legislação aplicável a residentes.

 

4. Reunião do art.º 18 do RJAT

 

Por não terem sido arroladas testemunhas, nem haver matéria de exceção, o Tribunal proferiu despacho arbitral em 18/4/2021, dispensado a Reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, ao abrigo dos princípios da autonomia do processo, e em ordem a promover maior celeridade, simplificação e informalidade, conforme previsto nos artigos 19.º, n.º 2 e 29.º, n.º 2, ambos do RJAT.

 

5. Alegações escritas

 

Pela mesma decisão arbitral foi determinada a notificação das Partes para, no prazo de 10 dias, a contar da notificação, produzirem alegações escritas facultativas.

 

A Requerente apresentou alegações escritas, em que vem reafirmar todos os fundamentos já expressos na sua petição inicial, agora reforçados com o decidido pelo Douto Acórdão do TJUE, n.º C-388/19, de 18 do mês em curso, terminando por requerer que o Tribunal Arbitral declare a ilegalidade da liquidação de IRS efetuada pela AT, n.º 2018.5005417010, de 05/07/2018, no montante de € 24.654,22, proceda ao reembolso do imposto indevidamente pago, com pagamento dos juros indemnizatórios devidos, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT e artigo 61.º do CPPT, calculados desde a data do pagamento do imposto, à taxa resultante do n.º 4 do artigo 43.º da LGT (4% ao ano), até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que serão incluídos.

 

Assim, mostram-se reunidas com todas condições para ser proferida:

 

6 – Decisão definitiva

 

Antes, porém, do douto Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 18 de março de 2021, já transitado em julgado, importa extrair os seguintes aspetos relevantes para os autos:

               

“Quanto aos princípios e às liberdades aplicáveis

 

20 A título preliminar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o artigo 18.º do TFUE apenas deve ser aplicado de modo autónomo às situações regidas pelo direito da União Europeia para as quais o Tratado FUE não preveja regras específicas de não discriminação (v., neste sentido, Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, n.º 28 e jurisprudência referida).

 

21 Ora, o Tratado FUE prevê, designadamente, no seu artigo 63.º, uma regra específica de não discriminação no domínio da liberdade de circulação de capitais (v., neste sentido, Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, n.º 28 e jurisprudência referida).

 

22 Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que uma operação de liquidação de um investimento imobiliário, como a que está em causa no processo principal , constitui um movimento de capitais (Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, n.º 28 e jurisprudência referida).

 

23 Daqui decorre que a alienação onerosa de um bem imóvel situado no território de um Estado-Membro, efectuada por pessoas singulares não residentes, é abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 63.º TFUE.

 

24. Por outro lado, na medida em que, na decisão de reenvio, não é feita referência a nenhum elemento suscetível de incluir tal operação no âmbito de aplicação do artigo 64.º TFUE, não há, no caso em apreço, que examinar a questão à luz das disposições deste artigo”

 

“Quanto à livre circulação de capitais

 

25 Importa recordar que o artigo 63.º TFUE proíbe quaisquer restrições aos movimentos de capitais entre os Estados-Membros, sem prejuízo das justificações previstas no artigo 65.º TFUE.

 

26 No caso em apreço, resulta do pedido de decisão prejudicial que, tratando-se de mais-valias realizadas no momento da alienação onerosa de um bem imóvel situado em Portugal, o artigo 43.º, n.º 2, e o artigo 72.º, n.º 1, do CIRS previam regras de tributação diferentes consoante os sujeitos passivos do imposto sobre o rendimento residissem ou não no território desse Estado-Membro.

 

27 Em especial, nos termos do artigo 43.º, n.º 2, do CIRS, as mais-valias realizadas por residentes no momento da alienação de bens imóveis situados em Portugal eram apenas consideradas em50% do seu valor. Em contrapartida, para os não residentes, o artigo 72.º, n.º 1, do CIRS previa a tributação dessas mesmas mais-valias sobre a totalidade do seu montante à taxa autónoma de 28%.

 

28 Daqui decorre que, em aplicação destas disposições, a matéria coletável deste tipo de mais-valias não era a mesma para os residentes e para os não residentes. Assim, no que diz respeito à venda de um mesmo bem imóvel situado em Portugal, no caso de realização de mais-valias, os não residentes estavam sujeitos a uma carga fiscal superior àquela que era aplicada aos residentes, encontrando-se, portanto, numa situação menos favorável que estes últimos (v., neste sentido, Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, n.º 37).

 

29 Com efeito, enquanto, por força do artigo 72.º, n.º 1, do CIRS, um não residente era tributado a uma taxa de 28% aplicada sobre a matéria coletável correspondente à totalidade das mais-valias realizadas, a consideração de apenas metade da matéria coletável das mais-valias realizadas, por um residente permitia que este beneficiasse sistematicamente de uma carga fiscal inferior a esse título, qualquer que fosse a taxa de tributação aplicada à totalidade dos rendimentos, uma vez que, segundo as observações apresentadas pelo Governo Português, os rendimentos dos residentes estavam sujeitos a um imposto de acordo com uma tabela de taxas progressiva cujo escalão mais elevado era 48%, isto embora se pudesse aplicar uma taxa adicional de solidariedade de 2,5% a rendimentos coletáveis de 80 000 euros a 250 000 euros e de 5% acima desse valor.

 

30 Ora, no Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, n.º 40), o Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de declarar que a fixação, pelo artigo 43.º, n.º 2, do CIRS, de uma matéria coletável de 50% para as mais-valias realizadas apenas por sujeitos passivos residentes em Portugal, e não por sujeitos passivos não residentes, constituía uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 63.º TFUE.

 

31 Esta constatação não é posta em causa pelo n.º 44 do Acórdão de 19 de novembro de 2015, Hirvonen (C-623/13, EU:C:2015:765), no qual o Tribunal de Justiça declarou que uma diferença de tratamento entre contribuintes não residentes e contribuintes residentes, que consiste em sujeitar os rendimentos brutos dos primeiros a uma tributação a título definitivo a uma taxa única, através de retenção na fonte, ao passo que os rendimentos líquidos dos segundos são tributados de acordo com uma tabela progressiva que inclui um abatimento de base, é compatível com o direito da União, na medida em que essa constatação está sujeita, todavia, à condição de a taxa única não ser mais elevada do que a taxa resultante da aplicação efetiva para o interessado da tabela progressiva aos rendimentos líquidos que excedem o abatimento de base. Ora, no caso em apreço, como resulta do artigo 29.º do presente acórdão, o regime de tributação diferenciado em causa conduz a que os não residentes sejam sistematicamente sujeitos a uma carga fiscal superior à aplicada aos residentes aquando da realização de mais-valias sobre a venda de imóveis.

32 Nestas condições, a fixação da matéria coletável em 50% para as mais-valias realizadas por todos os sujeitos passivos residentes em Portugal, e não para os sujeitos passivos não residentes que optarem pelo regime de tributação previsto no artigo 72.º, n.º 1 do CIRS, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 63.º, n.º 1, TFUE.

 

33 Por conseguinte, importa verificar se essa restrição pode ser considerada objetivamente justificada, à luz do artigo 65.º, n.ºs 1 e 3, TFUE.

 

Quanto à existência de uma justificação para as restrições à livre circulação de capitais à luz do artigo 65.º, n.ºs 1 e 3, TFUE

 

34 Resulta do artigo 65.º, n.º 1, TFUE, lido em conjugação com o n.º 3 do mesmo artigo, que os Estados-Membros podem estabelecer, na sua regulamentação nacional, uma distinção entre contribuintes residentes e contribuintes não residentes, desde que essa distinção não constitua um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada à livre circulação de capitais.

 

35 Há, portanto, que distinguir os tratamentos desiguais permitidos ao abrigo do artigo 65.º, n.º 1, alínea a), TFUE das discriminações arbitrárias proibidas pelo n.º 3 do mesmo artigo. A este respeito, resulta da Jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para que as disposições fiscais nacionais, como o artigo 43.º, n.º 2, e o artigo 72.º, n.º 1, do CIRS, possam ser consideradas compatíveis com as disposições do Tratado relativas à livre circulação de capitais, é necessário que a diferença de tratamento diga respeito a situações não comparáveis objetivamente ou se justifique por razões imperiosas de interesse geral (v., neste sentido, Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, n.ºs 44 e 45 e jurisprudência referida).

 

36 Ora, no caso em apreço, a diferença de tratamento entre os sujeitos passivos residentes e os sujeitos passivos não residentes prevista pela regulamentação portuguesa diz respeito a situações objetivamente comparáveis. Além disso, esta diferença de tratamento não é justificada por uma razão imperiosa de interesse geral.

 

37 Quanto, em primeiro lugar, à comparabilidade das situações, importa recordar que, no n.º 50 do Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, o Tribunal de Justiça já declarou, em primeiro lugar, que a tributação das mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel incide, nos termos do artigo 43.º, n.º 2, e do artigo 72.º, n.º 1, do CIRS, sobre uma única categoria de rendimentos dos contribuintes; e, em terceiro lugar, que o Estado-Membro de onde o rendimento coletável provém é sempre a República Portuguesa.

 

38 Resulta do exposto, nomeadamente do n.º 29 do presente acórdão, que não existe nenhuma diferença objetiva de situação entre os contribuintes residentes e os contribuintes não residentes, suscetível de justificar uma desigualdade de tratamento fiscal entre eles, nos termos do artigo 43.º, n.º 2, e do artigo 72.º, n.º 1, do CIRS, no que respeita à tributação do saldo positivo das mais-valias realizadas na sequência de alienações de bens imóveis situados em Portugal. Por conseguinte, a situação em que se encontra um contribuinte não residente, como MK, é comparável à de um contribuinte residente.

 

39 Esta constatação mão é posta em causa pela ratio legais do artigo 43.º, n.º 2, do CIRS, que prevê o abatimento de 50% aplicável às mais-valias realizadas pelos residentes, que, segundo o Governo português, consiste em evitar a tributação excessivamente onerosa desses rendimentos considerados anormais e fortuitos, na medida em que nada permite excluir que essa consideração não possa vir a dizer respeito aos sujeitos passivos não residentes.

 

40 Quanto, em segundo lugar, à existência de justificações baseadas em razões imperiosas de interesse geral, importa salientar que o Governo português não refere a existência de tais razões, No entanto, alega que, no âmbito da tributação do saldo positivo das mais-valias imobiliárias realizadas em Portugal, o artigo 43.º, n.º, do CIRS tem por objetivo evitar penalizar os sujeitos passivos residentes em Portugal ou os sujeitos passivos não residentes que escolham ser tributados como tais nos termos do artigo 72.º, n.ºs 9 e 10, do CIRS, devido ao facto de lhes ser aplicada uma taxa progressiva.

 

41 Ora, nos n.ºs 58 a 60 do Acórdão de 11 de Outubro de 2007, Hollmann, C-443/06, EU:C:2007:600, o Tribunal de Justiça considerou que o benefício fiscal concedido aos residentes, que consistia numa redução de metade da matéria coletável correspondente às mais-valias realizadas, excedia, em todo o caso, a contrapartida que consiste na aplicação de uma taxa progressiva à tributação dos rendimentos. Consequentemente, no processo que deu origem a este acórdão, o Tribunal de justiça considerou que não estava demonstrada uma relação direta entre o benefício fiscal em causa e a compensação desse benefício através de determinada imposição fiscal e que a restrição resultante da regulamentação nacional em causa não podia, portanto, ser justificada pela necessidade de garantir a coerência do regime fiscal.

 

Quanto à opção de tributação segundo as mesmas modalidades que os residentes

 

42 Antes de mais, há que salientar que a possibilidade de as pessoas residentes na União ou no EEE optarem, ao abrigo do artigo 72.º, n.ºs 9 e 10, do CIRS, por um regime de tributação análogo ao aplicável aos residentes portugueses e, assim, beneficiarem do abatimento de 50% previsto no artigo 43.º, n.º 2, desse código permite a um contribuinte não residente, como MK, escolher entre um regime fiscal discriminatório, a saber, o previsto no artigo 72.º, n.º 1, do CIRS, e outro que não o é.

 

43 Ora, cumpre frisar a este respeito que, no caso em apreço, essa escolha não é suscetível de excluir os efeitos discriminatórios do primeiro desses dois regimes fiscais.

 

44 Com efeito, o reconhecimento de um efeito dessa natureza à referida escolha teria por consequência validar um regime fiscal que continuaria, em si mesmo, a violar o artigo 63.º TFUE em razão de ser do seu caráter discriminatório (v., neste sentido, Acórdão de 18 de março de 2010, Gielen, C-440/08, EU:C:2010:148, n.º 52).

 

45 Por outro lado, como o Tribunal de Justiça já teve ocasião de precisar, um regime fiscal que limite uma liberdade fundamental garantida pelo Tratado FUE, no caso em apreço a livre circulação de capitais, é, incompatível com o direito da União, mesmo que a sua aplicação seja facultativa (v., neste sentido, Acórdão de 18 de março de 2010, Gielen, C-440/08, EU:C:2010:148, n.º 53 e jurisprudência referida).

 

46 Daqui resulta que a escolha concedida, no litígio no processo principal, ao contribuinte não residente, de ser tributado segundo as mesmas modalidades que as aplicáveis aos contribuintes residentes, não é suscetível de tornar a restrição constatada no n.º 32 do presente acórdão compatível com o Tratado.

 

47 Tendo em conta todas as considerações precedentes, importa responder à questão submetida que o artigo 63.º TFUE, lido em conjugação com o artigo 65.º TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à regulamentação de um Estado-Membro que, para permitir que as mais-valias provenientes da alienação de bens imóveis situados nesse Estado-Membro, por um sujeito passivo residente noutro Estado-Membro, não sejam sujeitas a uma carga fiscal superior à que seria aplicada, para esse mesmo tipo de operação, às mais-valias realizadas por um residente do primeiro Estado-Membro, faz depender da escolha do referido sujeito passivo o regime de tributação aplicável.

 

Quanto às despesas

 

48 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

O artigo 63.º TFUE, lido em conjugação com o artigo 65.º TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à regulamentação de um Estado-Membro que, para permitir que as mais-valias provenientes da alienação de bens imóveis situados nesse Estado-Membro, por um sujeito passivo residente noutro Estado-Membro, não sejam sujeitas a uma carga fiscal superior à que seria aplicada, para esse mesmo tipo de operação, às mais-valias realizadas por um residente do primeiro Estado-Membro, faz depender da escolha do referido sujeito passivo o regime de tributação aplicável”,

 

 

Face ao decidido pelo Douto Acórdão do TJUE acima transcrito, para melhor explicitação futura, importa proferir, então,

 

 

6. DECISÃO DEFINITIVA

 

Que a este Tribunal Arbitral, independentemente da sua interpretação, face às normas do artigo 17.º-A do Código do IRS, na redação dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, que, em seu entender, visavam eliminar o tratamento discriminatório mais desfavorável que era dado aos residentes noutro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, bem como no artigo 72.º, pela Lei n.º 82.º-E/2014, de 31 de dezembro, com entrada em vigor em 1/7/2015, quer no artigo 43.º, n.º 2, do mesmo Código, pela Lei n.º 42/2016, de 28/12 (IOE/2013), quer ainda às alterações introduzidas à Declaração Modelo 3 de IRS em vigor a partir de 2009 (relativa aos rendimentos de 2008 e seguintes), a que se refere o artigo 57.º do Código do IRS, cujo modelo foi utilizado pelo Requerente, na sua declaração apresentada relativamente ao ano fiscal de 2017, alterações já anteriormente transcritas com desenvolvimento,

 

Entende, sem mais, decidir o seguinte:  

 

a)            Que a liquidação de IRS n.º 2018..., de 05/07/2018, no montante de € 24.654,22, efetuada pela AT – Autoridade Tributária pelo valor integral do saldo das mais-valias obtidas em resultado da alienação da fração autónoma designada pela letra “C”, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., do concelho de Lisboa, sob o artigo..., que o Requerente A... havia adquirido em 17/01/2002, pelo preço de € 79.807,66 e alienado em 17/07/2017 pelo valor de € 180.000,00 e despesas e encargos comprovados de € 989,61, deveria ter sido efetuada apenas por 50% da mais-valia obtida, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 43.º do CIRS, por respeitar a transmissões previstas na alínea a) do artigo 10.º do mesmo Código, tal como se verifica em relação aos residentes em território português, por forma a não violar o artigo 63.º, conjugado com o artigo 65.º TFUE.

 

b)           Que na situação em apreço, a liquidação efetuada pela AT, mediante a declaração mod. 3 de IRS do ano de 2017 oportunamente apresentada, liquidação de IRS n.º 2018..., de 05-07-2018, no montante de € 24.654,22, mostra-se violadora do TFUE (artigos 63.º e 65.º) , ao considerar o saldo total das mais-valias imobiliárias obtidas pelo Requerente, residente em França, País-Membro da EU, e não 50% do mesmo como acontece com os residentes deste Estado-Membro e, portanto, ferida de ilegalidade.

 

Que, em consequência, decide:

1.            Conceder provimento integral ao presente Recurso Arbitral, com as legais consequências para a Autoridade Tributária e Aduaneira, designadamente,

 

2.            Determinar a ilegalidade da liquidação de IRS n.º n.º 2018..., de 05-07-2018, no montante de € 24.654,22;

 

3.            Determinar o reembolso ao Requerente, como é requerido, do imposto indevidamente pago, relativamente à referida liquidação de IRS, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, desde a data do pagamento indevido até à data da emissão do reembolso devido, porquanto, mostrando-se comprovado o pagamento integral do IRS em causa, em 16/08/2018, o pedido de reembolso e de juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 43.º, n.º 1, da LGT é também procedente.

 

Valor do processo

 De harmonia com o disposto no artigo 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicável por força do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor da causa em € 24.654,22 (vinte e quatro mil seiscentos e cinquenta e quatro euros e vinte e dois cêntimos).

 

Custas

 

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 1.530,00, nos termos da Rabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem, a pagar integralmente pela Requerida, uma vez que o pedido foi julgado totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT e artigo 4.º, n.º 4 do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 26 de abril de 2021.

 

 

O árbitro singular,

 

 

(José Rodrigo de Castro)