Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 325/2014-T
Data da decisão: 2014-11-08  IMI  
Valor do pedido: € 4.890,25
Tema: IMI – Isenção de IMI – artigo 44.º, n.º 1, n) alínea do EBF
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Processo 325/2014

Decisão Arbitral

                                                                                                                                   

I - Relatório

 

1. No dia 08-04-2014, os contribuintes A, NIF ..., casado, portador do Cartão de Cidadão n.° ..., válido até ..., residente na ..., ...; B, NIF ..., casado, portador do Cartão de Cidadão n.° ..., válido até …, residente na ..., ...; C, NlF ..., solteiro, portador do Cartão de Cidadão n.° ..., válido até ..., residente na ..., D, NIF ..., divorciada, portadora do Cartão de Cidadão n.° ..., válido até ..., residente na ... e E, NIF ..., divorciado, portador do Cartão de Cidadão n.° ..., válido até ..., residente na ..., ..., apresentaram um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), tendo por objecto a anulação das notas de liquidação n.°s 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ... e 2012 ..., a concessão da isenção de IMI, ao abrigo do disposto na alínea n) do n.° 1 do art. 44.° dos Estatuto dos Benefícios Fiscais e o reembolso da importância paga pelo requerente C, constante da nota de liquidação no valor de  122,15 € (cento e vinte e dois euros e quinze cêntimos) acrescido dos respectivos juros indemnizatórios, previstos nos arts. 43.° da LGT e no art.° 61.° do CPPT.

 

2. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o ora signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. Dessa designação foram notificadas as partes, não tendo manifestado vontade de recusar o iao de cesse do nege m cessionnássiuonginºariu constitudessa decisçaipelo adquirente q uer peliao de cesse do nege m cessionnássiuonginºariu constitudessa decisçaipelo adquirente q uer pelárbitro, considerando-se por isso o Tribunal Arbitral constituído em 10 de Abril de 2013, nos termos da alínea c) do nº1 do art. 11º do RJAT.

 

3. O tribunal encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do presente processo.

 

4. As alegações que sustentam o pedido de pronúncia arbitral da Requerente são em súmula, as seguintes:

 

4.1. Os requerentes são comproprietários dos imóveis sitos na ..., n.°s … a … e …, freguesia de …, concelho do ....

 

4.2. Os referidos imóveis do centro histórico do ... fazem parte da lista do Património Mundial da Unesco.

 

4.3. De acordo com o disposto na alínea n) do n.° 1 do art.° 44.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais, ficam isentos de IMI: "os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável".

 

4.4. Entre a legislação aplicável para a qual esta disposição remete encontra-se, nomeadamente, a Lei de Bases para a Protecção e Valorização do Património Cultural (Lei n.° 107/2001, de 8 de Setembro).

 

4.5. Nos termos do n.° 1 do art.° 15.° da referida Lei n.° 107/2001, os bens imóveis podem pertencer às categorias de monumento, conjunto ou sítio, nos termos em que tais categorias estão definidas no Direito Internacional, nomeadamente no art. 1.° da Convenção da Unesco para a Protecção Mundial, Cultural e Natural, concluída em Paris, em 16 de Novembro de 1972 e no art. 1.° da Convenção para a Salvaguarda do Património Arquitectónico da Europa, assinada em Granada, em 3 de Outubro de 1985. 

 

4.6. Acresce que, de acordo com o disposto no n.° 2 do art. 15.°, da referida Lei, os bens imóveis podem ser classificados de interesse nacional, interesse público ou interesse municipal e especificamente nas categorias supra mencionadas de Monumento, Conjunto e Sítio.

 

4.7. Ora, no caso concreto do imóvel em apreço, o mesmo está classificado como monumento nacional de acordo com o disposto nos n.°s 3 e 7 do art.° 15.° da Lei n.° 107/2001, por estar inscrito na Lista do Património Mundial da Unesco, em 1996, como “Centro Histórico …” (Zona Especial de Protecção).

 

4.8. Na classificação deste conjunto ― como é o caso da Zona Histórica do ... — é relevante o facto do património protegido ser visto como um todo, pelo que é impossível classificar individualmente cada imóvel, que deve ser considerado no seu todo, enquanto conjunto.

 

4.9. Acresce que é a própria legislação, nomeadamente o Estatuto dos Benefícios Fiscais, que refere que os prédios classificados como monumentos nacionais estão desde logo isentos deste imposto.

 

4.10. Por outro lado é importante realçar que a classificação deste património acarreta para os imóveis inseridos nestes centros históricos um conjunto de restrições regulamentares que têm por objectivo preservar as suas características particulares, como salvaguarda do interesse patrimonial que lhes está reconhecido.

 

4.11. Ora, as isenções fiscais (nomeadamente em sede de IMI), constituem uma forma de incentivo directo para promover a captação e fixação de novos habitantes em áreas que estão sujeitas ao abandono de população, como é o caso do Centro Histórico do ....

 

4.12. Ora, se é suficiente para efeitos de direito de preferência, entre outras limitações ao direito de propriedade destes bens, a inserção do imóvel em apreço na Zona Histórica do ..., ainda que não classificado individualmente, também o deverá ser para efeitos fiscais, nomeadamente em sede de IMI.

 

4.13. Nesta conformidade, a Zona Histórica do ... deve ser vista como um conjunto.

 

4.14. Tendo a lei visado a protecção de todos os imóveis nela inseridos como um todo não faz sentido exigir a classificação individual dos imóveis integrados na referida Zona Histórica.

 

4.15. Consideram por isso os requerentes ser ilegal a posição da Administração Tributária ao exigir essa classificação individual para efeitos da concessão do benefício de isenção de IMI, solicitando consequentemente a anulação das liquidações impugnadas e a restituição do pagamento efectuado, acrescido de juros indemnizatórios.

 

5. Por seu turno, a Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, na qual se defendeu nos seguintes termos:

 

5.1 A actual redacção desta norma foi introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, que aprovou o Orçamento do Estado para 2007, e teve como objectivo consagrar expressamente no texto da lei a exigência de um novo pressuposto para efeitos de isenção de IMI - a classificação individualizada como imóvel de interesse público ou interesse municipal.

 

5.2. Consequentemente, procedeu aquela Lei à alteração do art.º 112.° do Código do lmposto Municipal sobre lmóveis, passando o seu n.º 12 a prever a possibilidade de os municípios, mediante deliberação da assembleia municipal, fixarem uma redução até 50% da taxa que vigorar no ano a que respeita o imposto a aplicar aos prédios classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, nos termos da legislação em vigor, desde que estes prédios não se encontrem abrangidos pela alínea n) do n.º 1 do art.º 40.° (actual 44.º) do EBF (vide artigo 77.° da Lei n.º 53-A/2006, de 29.12).

 

5.3 A classificação individual dos imóveis, regulada no Decreto-Lei n. 309/2009, de 30.10, corresponde ao acto final do procedimento administrativo mediante o qual se determina que certo bem possui um inestimável valor cultural. (Cfr. art. 18. ° da Lei n.º 107/2001)

 

5.4 E constitui um procedimento autónomo previsto e regulado na lei que se verifica de per si.

 

5.5 E tanto assim e que o artigo 56.° do Decreto-Lei n. 309/2009, de 23.10 refere o seguinte: "Na área abrangida pela delimitação de um conjunto ou de um sítio podem coexistir imóveis individualmente classificados".

 

5.6 Resulta assim como evidente que a classificação individual de imóveis a que se refere a alínea n) do art.º 44.° do EBF corresponde a um acto final de um procedimento previsto e regulado na legislação sobre o património cultural.

 

5.7 Ora, no caso em apreço o que está classificado é o "Centro Histórico do ... " e não os imóveis que são propriedade do Requerentes.

 

5.8 A classificação individualizada dos imóveis não resulta por inerência da pertença a um determinado conjunto mas sim da presença de outro conjunto de factores de diferente natureza.

 

5.9 Sendo certo que o Estatuto dos Benefícios Fiscais apenas concede a isenção de IMI a prédios e não a conjuntos.

 

5.10 Caso prevalecesse a tese dos Requerentes, no sentido que a classificação do conjunto dispensa e substitui a classificação individualizada o que por mera hipótese se concede, não se compreenderia qual o sentido útil da alteração ao regime dos benefícios fiscais introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12

 

5.11 Não existe no âmbito da legislação fiscal ou mesmo no âmbito da legislação sobre o património cultural qualquer norma que estenda a classificação individual à classificação de um conjunto.

 

5.12 Donde, na falta de prova documental e na ausência de norma expressa e atenta à alteração legislativa entretanto ocorrida que não se pode ignorar, augura-se abusiva a interpretação extensiva da lei no sentido de alargamento do âmbito pessoal e material do benefício fiscal previsto na alínea n) do n. e do artigo 44.º do EBF ao arrepio do entendimento já veiculado pela doutrina citada.

 

5.13 A partir de 1 de Janeiro de 2007 a lei passou a consagrar expressamente como um pressuposto para a atribuição do benefício fiscal de isenção de IMI a classificação individualizada dos imóveis determinando a cessação da isenção do IMI.

 

5.14. Essa cessação resultou assim de um imperativo legal, tendo a Administração Tributária se limitado a cumprir e executar o comando normativo previamente aprovado.

 

5.15. A classificação do conjunto não implica a classificação individualizada dos imóveis que o integram, como não só é o entendimento dos serviços do Ministério da Cultura como também constitui a posição consolidada da doutrina e corresponde a correcta interpretação do texto da lei, pelo que se concluiu que não se verificam os requisitos legalmente previstos para a isenção de IMI.

 

5.16. Mesmo tratando-se de benefício de concessão automática, a sua atribuição depende sempre e necessariamente da verificação do cumprimento dos pressupostos legais o que requer informação nesse sentido por parte dos competentes serviços do Ministério da Cultura de que o imóvel preenche os requisitos previstos na lei, o que não se verificou no caso em apreço.

 

5.17. Donde, enquanto não for alterada a redacção da alínea n) do artigo 44.º do EBF a pretensão do Requerentes não pode proceder por falta de enquadramento legal.

 

6. No dia 4/09/2014, foi proferido despacho arbitral, ao abrigo do disposto na al. c) do art. 16.º do RJAT, dispensando a reunião prevista no art. 18º mesmo diploma, tendo em conta que o objecto do litígio respeita fulcralmente a matéria de direito, não foram deduzidas excepções, e constam dos autos os documentos pertinentes, não se tendo igualmente considerada necessária a apresentação de alegações de direito.

 

II - Factos Provados

1. Os requerentes foram notificados das seguintes notas de liquidação:

a) A:

- n.° 2009 ..., no valor de 259,43 €, relativa ao ano de 2009;

- n.° 2010 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2010; 

-  n.° 2011 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2011; 

-  n.° 2012 ..., no valor de 135,75 €, relativa ao ano de 2012. 

 

b) B:

- n.° 2009 ..., no valor de 259,43 €, relativa ao ano de 2009;

- n.° 2010 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2010;

- n.° 2011 , no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2011;

- n.° 2012 ..., no valor de 135,75 €, relativa ao ano de 2012.

 

c) C

- n.° 2009 ..., no valor de 259,43 €, relativa ao ano de 2009; 

- n.° 2010 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2010;

- n.° 2011 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2011;

- n.° 2012 ..., no valor de 135,75 €, relativa ao ano de 2012.

 

d) D:

- n.° 2009 ..., no valor de 259,43 €, relativa ao ano de 2009;

-  n.° 2010 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2010;

-  n.° 2011 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2011;

- n.° 2012 ..., no valor de 135,75 €, relativa ao ano de 2012.

 

e) E

- n.° 2009 ..., no valor de 259,43 €, relativa ao ano de 2009; 

- n.° 2010, no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2010; 

- n.° 2011 ..., no valor de 279,22 €, relativa ao ano de 2011;

- n.° 2012 ..., no valor de 135,75 €, relativa ao ano de 2012

 

2. O requerente C foi notificado da primeira prestação relativa ao ano de 2013 e liquidou em 31 de Março de 2014, o valor de 122,15 € (cento e vinte e dois euros e quinze cêntimos).

 

Não há factos não provados, com relevo para a decisão da causa.

 

III - Do Direito

 

São as seguintes as questões a apreciar:

- Da ilegalidade das liquidações de IMI

- Dos juros indemnizatórios

 

I- DA ILEGALIDADE DAS LIQUIDAÇÕES DE IMI

 

1. Nos termos do artigo 44º do Estatuto de Benefícios Fiscais, nº 1: "Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis: (...) n) Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável".

 

2. Podemos verificar que este artigo é composto por duas previsões. Em primeiro lugar, estão isentos de imposto municipal sobre imóveis os prédios classificados como monumentos nacionais. Em segundo lugar, estão isentos do mesmo imposto os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal.

 

3. De acordo com o artigo 15º da Lei 107/2001, de 8 de Setembro:

 

"1 - Os bens imóveis podem pertencer às categorias de monumento, conjunto ou sítio, nos termos em que tais categorias se encontram definidas no direito internacional, e os móveis, entre outras, às categorias indicadas no título VII.

2 - Os bens móveis e imóveis podem ser classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal.

3 - Para os bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos, conjuntos ou sítios, adoptar-se-á a designação «monumento nacional» e para os bens móveis classificados como de interesse nacional é criada a designação «tesouro nacional».

4 - Um bem considera-se de interesse nacional quando a respectiva protecção e valorização, no todo ou em parte, represente um valor cultural de significado para a Nação.

(...)"

 

4. Esta formulação vem a ser reiterada no art. 2º do Decreto-Lei 309/2009, referindo o seu art. 3º, nº1 que "um bem imóvel pode ser qualificado como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal", e acrescentando o nº3 que "a designação «monumento nacional» é atribuída aos bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos conjuntos ou sítios".

 

5. Os imóveis em questão fazem parte da Zona Histórica do ..., que foi inscrita na Lista do Património Mundial da UNESCO, conforme declarado pelo Aviso nº 15173/2010, publicado no Diário da República, II Série de 30 de Julho de 2010, emitido ao abrigo do nº 3 do art. 72º do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de Outubro.

 

6. O art. 15º, nº7, da Lei 107/2001 refere expressamente que "os bens culturais imóveis incluídos na lista do património mundial integram, para todos os efeitos e na respectiva categoria os bens qualificados como de interesse nacional".

 

7. É esse naturalmente o caso da Zona Histórica do ..., tendo sido alterada a sua classificação como imóveis de interesse público, que constava originariamente do Decreto 67/97, de 31 de Dezembro.

 

8. Hoje, em face da Lei 107/2001, os prédios em questão são de de interesse nacional, e não de interesse meramente público ou municipal, sendo consequentemente classificados como monumentos nacionais.

 

9. Efectivamente, e conforme consta do artigo 15º da Lei 107/2001 e do art. 3º do Decreto-Lei 309/2009, um bem classificado como de interesse nacional é designado como "monumento nacional", independentemente de se tratar de um único edifício, conjunto ou sítio, sendo claro que os imóveis que compõem o conjunto ou sítio são abrangidos por essa classificação.

 

10. O facto de poderem coexistir prédios individualmente classificados, em caso de delimitação de um conjunto ou de um sítio, nos termos do art. 56º do Decreto-Lei 309/2009 apenas tem relevo provisório para delimitar a zona de protecção desse imóvel até à publicação da classificação do conjunto ou do sítio (cfr. nº2).

 

11. Por esse motivo se compreende que o artigo 44º do Estatuto dos Benefícios Fiscais distinga entre "prédio classificado como monumento nacional" e "prédio individualmente classificado como de interesse público ou municipal", só exigindo a individualização em relação a estas duas últimas categorias, não já à dos prédios de interesse nacional.

 

12. É um facto que há autores como José Casalta Nabais ou Nuno Sá Gomes, que defenderam uma interpretação restritiva das isenções aos imóveis classificados no intuito de excluir dos benefícios atribuídos em sede de IMI ou IMT todas as situações em que não tenha ocorrido um procedimento ou acto de classificação individual como monumento nacional, imóvel de interesse público ou municipal[1].

 

13. O intuito de seguir a posição expressa por estes ilustres autores determinou a alteração ao art. 6º g) do Código do IMT pela Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, levando a que a isenção tenha deixado de abranger "as aquisições de prédios classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal, ao abrigo da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro" para passar apenas a contemplar apenas "as aquisições de prédios individualmente classificados como de interesse nacional, de público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável".

 

14. Sucede, porém, que o legislador não alterou simultaneamente os benefícios fiscais em sede de IMI no mesmo sentido, apesar de ter procedido à modificação da redacção do próprio art. 44º do EBF, continuando a sua alínea n) a exigir a classificação individual para atribuição da isenção apenas no caso dos imóveis de interesse público ou municipal, mas não fazendo exigência semelhante para os monumentos nacionais.

 

15. Antes pelo contrário, a norma do nº5 do art. 44º, na redacção que lhe foi atribuída pela Lei 3-B/2010, de 28 de Abril, dispõe expressamente que "a isenção a que se refere a alínea n) do nº. 1 é de carácter automático, operando mediante comunicação da classificação como monumentos nacionais ou da classificação individualizada como imóveis de interesse público ou de interesse municipal (…)". Resulta, pois, em termos muitos claros que a intenção do legislador foi dispensar a classificação individualizada para efeitos de isenção de IMI aos monumentos nacionais, apenas a exigindo em relação a imóveis de interesse público ou de interesse municipal.

 

16. Ora, estando os prédios em questão integrados na Zona Histórica do ..., legalmente qualificada como monumento nacional, é manifesto que beneficiam da referida isenção, sendo assim ilegais as liquidações de IMI impugnadas, e devendo ser restituído o imposto que foi pago.

 

17. Consideram-se assim ilegais as liquidações n.°s 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010..., 2011 ... e 2012 ..., determinando-se a sua anulação na totalidade.

 

DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS

18. Foi solicitado ainda pelos Requerentes o pagamento de juros indemnizatórios em relação ao pagamento feito por um deles, ao abrigo do artigo 43º da LGT e do artigo 61º CPPT

 

19. Decorre do número 1 desse artigo que "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido".

 

20. Podemos entender ainda que, como decorre do n.º 5 do art. 24.º do RJAT, o direito a juros indemnizatórios pode ser reconhecido em processo arbitral.

 

21. Ter-se-á, no entanto, de determinar se houve ou não erro imputável aos serviços.

 

22. A informação relativa à inscrição do "Centro Histórico do ..." foi publicada no Diário da República, no dia 30 de Julho de 2010, tendo a Administração Tributária conhecimento desta informação.

 

23. A lei é clara, no que toca à determinação de isenção de IMI, por parte de monumentos, conjuntos ou sítios classificados como "monumentos nacionais".

 

24. Estamos assim, neste caso, perante um erro imputável aos serviços, conforme consta do art. 43º da LGT.

 

25. Tendo em conta o estabelecido no artigo 61º do CPPT e tendo sido verificada a existência de erro imputável aos serviços da Administração Tributária, do qual resultou pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (vide art. 43º, nº1 da LGT), podemos entender que a Requerente tem direito a juros indemnizatórios à taxa legal, calculados sobre o valor de 122,15 euros, que serão contados desde 31-03-2014, até ao integral reembolso dessa mesma quantia.

 

IV - Decisão:

 

Termos em que este Tribunal Arbitral Singular:

a) Julga procedente o pedido de anulação das liquidações n.°s 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010 ..., 2011 ..., 2012 ..., 2009 ..., 2010..., 2011 ... e 2012 ...,

b) Determina o reembolso da importância paga pelo requerente C, no valor de 122,15 € (cento e vinte e dois euros e quinze cêntimos), acrescido dos respectivos juros indemnizatórios, contados desde 31-03-2014, até ao integral reembolso dessa mesma quantia.

 

Valor do processo: Fixa-se ao processo o valor de € 4890,25 (valor indicado e não contestado), e nos termos do art.º 22.º, n.º 4 do RJAT, o valor da correspondente taxa de arbitragem em € 612, nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária.

Custas a cargo da entidade requerida.

 

Lisboa, 8 de Outubro de 2014

 

O Árbitro

 

 

(Luís Menezes Leitão)



[1] Cfr. neste sentido, JOSÉ CASALTA NABAIS, "Considerações sobre o quadro jurídico do património cultural", em JORGE MIRANDA (org.), Estudos em homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano no centenário do seu nascimento, I, Lisboa, Faculdade de Direito de Lisboa, Coimbra Editora, 2006, pp. 727-745 (735-736) e NUNO SÁ GOMES, "Os incentivos fiscais na tributação do património cultural", na Revista da FDUP, ano 3 (2006), pp. 589-611 (600 e ss.).