Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 638/2018-T
Data da decisão: 2019-06-28  IVA  
Valor do pedido: € 21.896,45
Tema: IVA – Exclusão do direito à dedução - Operações simuladas
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DECISÃO ARBITRAL

 

O árbitro, Dra. Sílvia Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 26 de Fevereiro de 2019, decidiu o seguinte:

 

1.            RELATÓRIO

 

1.1.        A..., Lda., pessoa colectiva nº..., com sede na Rua ..., nº..., ..., no … (adiante designada por “Requerente”), apresentou pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Singular, no dia 14 de Dezembro de 2018, ao abrigo do disposto no artigo 2, nº 1, alínea a) e do disposto no artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

1.2.        O pedido arbitral diz respeito às seguintes liquidações de IVA e juros compensatórios:

 

LIQUIDAÇÃO Nº               PERÍODO             IMPOSTO            JUROS   TOTAL

2018 ... 201403T               1.380,00               --            1.612,29

2018 ...                --             232,29  

2018 ... 201406T               1.725,00               --            1.997,59

2018 ...                --             272,59  

2018 ... 201409T               3.105,00               --            3.564,71

2018 ...                --             459,71  

2018 ... 201412T               3.105,00               --            3.533,84

2018 ...                --             428,84  

2018 ... 201503T               3.105,00               --            3.503,80

2018 ...                --             398,80  

2018 ... 201506T               3.795,00               --            4.243,37

2018 ...                --             448,37  

2018 ... 201509T               3.105,00               --            3.440,85

2018 ...                --             335,85  

TOTAL   19.320,00             2.576,45               21.896,45

 

1.3.        A Requerente peticiona no pedido arbitral que este seja “(…) considerado procedente e por via dele, anular-se a liquidação oficiosa efetuada pela Autoridade Tributária por ausência de razão e ordenar-se a restituição à impugnante da quantia de €21.896,45 acrescida de juros indemnizatórios à taxa legal (…)” requerendo, para efeitos de prova, a audição de declarações de Parte e a inquirição de Testemunha.

 

1.4.        O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 17 de Dezembro de 2018 e notificado, na mesma data, à Requerida.

 

1.5.        Dado que a Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 1 do RJAT, foi a signatária designada como árbitro, em 6 de Fevereiro de 2019, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

 

1.6.        Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

1.7.        Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1 e nº 8 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 26 de Fevereiro de 2019, tendo sido proferido despacho arbitral, em 27 de Fevereiro de 2019, no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.

 

1.8.        Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.

 

1.9.        Em 4 de Abril de 2019, a Requerida apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação e concluído que deve ser negado provimento ao pedido, bem como peticionando o indeferimento da prova testemunhal.

 

1.10.      Na mesma data a Requerida remeteu a este Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo.

 

1.11.      Por despacho arbitral, datado de 8 de Abril de 2019, foi a Requerente notificada para “(…) no prazo de 5 dias, indicar se mantém interesse na inquirição da prova testemunhal e, em caso afirmativo, para concretizar os artigos referentes aos aspectos de facto relativamente aos quais pretende produzir essa prova testemunhal”.

 

1.12.      Em 12 de Abril de 2019, o Requerente apresentou requerimento no sentido de referir que “mantém o interesse na produção da prova testemunhal quanto aos seguintes pontos do petitório [que indica], para clarificação e explicação mais pormenorizada dos factos ínsitos a esses pontos. A prova requerida será por prestação de declarações de parte, de B..., por tais factos serem do seu prefeito conhecimento pessoal, por neles ter intervenção direta”.

 

1.13.      Nesta conformidade, foram ambas as Partes notificadas de despacho arbitral, datado de 17 de Abril de 2019, com o seguinte teor:

 

“(…) Decidiu este Tribunal, em consonância com os princípios processuais consignados no artigo 16º Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar [alínea c)] e da livre condução do processo consignado nos artigos 19º e 29º, nº 2 do RJAT:

- Agendar a reunião (a que alude o artigo 18º do RJAT) para o próximo dia 20 de Maio de 2019, pelas 11:00, a realizar nas instalações do CAAD, em Lisboa, para efeitos audição da declaração de Parte relativamente aos factos identificados pela Requerente no requerimento apresentado e decidir da possibilidade de dispensa da apresentação de alegações.(…)”.

 

1.14.      Em 20 de Maio de 2019 foi realizada no CAAD, nos termos do disposto no artigo 18º do RJAT, a reunião arbitral agendada para audição da declaração de Parte indicada pela Requerente, com reprodução sonora do depoimento prestado e da qual foi lavrada a corresponde acta, que faz parte integrante do presente processo.

 

1.15.      No âmbito da referida reunião, dado que as Partes não prescindiram da apresentação de alegações escritas, o Tribunal notificou a Requerente e a Requerida para apresentarem, de modo sucessivo, alegações escritas no prazo de 10 dias, tendo sido agendada para 28 de Junho de 2019 a prolação da decisão arbitral.

 

1.16.      Por último, o Tribunal advertiu a Requerente que, até à data da prolação da decisão arbitral deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar esse pagamento ao CAAD (o que efectuou em 23 de Maio de 2019).

 

1.17.      Em 27 de Maio de 2019, a Requerente apresentou as suas alegações escritas, no sentido de reiterar a argumentação apresentada no pedido arbitral, concluindo nos mesmos termos.

 

1.18.      Em 6 de Junho de 2019, a Requerida apresentou as suas alegações escritas, no sentido de reiterar a argumentação apresentada na Resposta, concluindo nos mesmos termos.

 

2.            CAUSA DE PEDIR

 

2.1.        A Requerente começa por referir no pedido arbitral que “entre a (…) requerente e as sociedades C... SA e D..., Lda. foram celebrados mutuamente diversos contratos de prestação de serviços nomeadamente (…)” de “(…) elaboração de diversos catálogos para as ditas sociedade, para estas apresentarem candidatura ao programa (…) QREN (…)”.

 

2.2.        Segundo a Requerente, a “criação, elaboração e execução de catálogos (…) implica e implicou (…) diversos atos, nomeadamente, criação de identidade corporativa, design, sessões fotográficas, copyright (textos longos ou curtos, traduções para diversas línguas, produção de conteúdos digitais (catálogos digitais), animações, vídeo, criação de base de dados de potenciais clientes nos países onde decorreram os eventos (feiras), envio de catálogos, mesmo que digitais a clientes-alvo, para a oferta de serviços da empresa, nos países onde se realizaram as feiras, envio de convites, criação de plataforma web para o efeito e a correspondente impressão dos catálogos (…)”.

 

2.3.        Por outro lado, e segundo a Requerente, foram também celebrados:

 

2.3.1.     “Contrato de cedência de espaço para armazém, pelo qual a sociedade C... cederia espaço temporário à [Requerente] para armazém pelo valor mensal de €500,00 (…)” e,

2.3.2.     “Contrato de exploração de espaços publicitários, pelo qual as sociedades D... e C... cediam à [Requerente] os direitos de exploração da publicidade nas lonas e toldos dos atrelados dos camiões de que aquelas eram proprietárias (…)”.

 

2.4.        Acrescenta a Requerente que “(…) em consequência do cumprimento de tais contratos foram, atempadamente emitidas (…)” pela Requerente, em 2014 e em 2015, as facturas identificadas no processo, bem como foram emitidas pela C... as facturas “(…) aludidas no relatório da requerida (…), que [deram] azo à correção tributária de que aqui se insurge a requerente”.

 

2.5.        Com efeito, segundo a Requerente, os fundamentos invocados pela Requerida no relatório e que deram origem às liquidações em sede de IVA que impugna no pedido, no montante total de EUR 21.896,45 (imposto e juros), são ilegais.

 

2.6.        Neste âmbito, entende a Requerente que “é (…) inatacável a facturação (…)” emitida, refutando que se está perante “negócio simulado”, como entendeu a Requerida, porquanto reitera a Requerente que todos os serviços contratualizados com as sociedades identificadas e, em consequência, a elas facturados foram efectivamente prestados, estando os mesmos devidamente documentados.

 

2.7.        Assim, para a Requerente não é lícito concluir que “(…) se está perante negócios simulados entre as empresas em causa” porquanto “(…) nenhuma das conclusões apresentadas (…) são por si bastantes para concluir que não houve negócios entre as empresas visadas (…)”.

 

2.8.        E, consequentemente, não acompanha a Requerente a conclusão a que chegou a Requerida de que, quer em 2014, quer em 2015, a dedução do IVA é indevida por “(…) não se estar em presença de verdadeiras transações (…)”.

 

2.9.        Ora, segundo a Requerente, a AT não apresentou “(…) argumentação consistente que leve (…) a presumir (…) que houve da parte da (…) requerente, atuação delituosa ou condutas ilegítimas”, porquanto a AT “(…) não aponta nenhuma conduta que possa ser considerada ilegítima”, “(…) nem sequer aponta qual o negócio simulado que entende ter existo ou sido praticado” “e muito menos, os factos minimamente consistentes - que não meras dúvidas - que suportem tal afirmação de negócio simulado”.

 

2.10.      Com efeito, sustenta a Requerente que “ao contrário das afirmações da AT, no relatório, as declarações dos contribuintes (…) é que gozam de presunção de veracidade (…)” e, “estando em causa indícios de faturação falsa, a AT tem de provar que os indícios de falsidade são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que a faturação [é] falsa”.

 

2.11.      Reitera ainda a Requerente que “quando a AT desconsidera faturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova constantes do art. 74º da LGT, competindo à AT, fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais da sua atuação e que as operações das faturas não correspondem à realidade”.

 

2.12.      Nestes termos, entende a Requerente que “(…) não há qualquer violação dos enumerados artigos sejam do CIVA, do RGIT ou qualquer outra disposição legal”, pelo que conclui que devem anular-se as liquidações de IVA e de juros efectuadas pela Requerida e ordenar-se a restituição da quantia total paga, acrescida dos respectivos juros indemnizatórios.

 

3.            RESPOSTA DA REQUERIDA

 

3.1.        Começa por referir a Requerida que foram identificadas, “segundo o relatório de inspeção tributária, (…) incongruências entre determinadas faturas emitidas, os contratos apresentados e as declarações prestadas (…), indiciando que não se tratou de operações económicas reais, o que fundamentou a correção das deduções efetuadas com base em tais faturas, nos termos do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA”.

 

3.2.        Prossegue a Requerida referindo que a Requerente, no pedido arbitral “(…) não traz elementos comprovativos da realidade das operações desconsideradas, que permitam controverter os factos e respetivas conclusões apontados pelos SIT, limitando-se, no essencial, a defender que a sua contabilidade e respetivas declarações gozam de presunção de verdade e que a AT não cumpriu o seu ónus de prova no sentido de fazer cessar essa presunção”.

 

3.3.        Ora, segundo entende a Requerida, “contrariamente ao que vem defendido na PI, a AT verificou não ter sido produzida a quantidade de catálogos faturada pela Requerente à D... Lda e à E... SA como se retira de todos os indícios/factos constantes no Relatório de Inspecção Tributária”.

 

3.4.        Por outro lado, defende a Requerida que “quanto às faturas que lhe foram emitidas por parte daquelas entidades e correspondentes contratos de publicidade/exploração de espaços publicitários (…) detetaram-se incoerências e indícios de não se tratar de operações económicas reais (…)”, suscitando a Requerida, em sede de Resposta, diversas questões com as quais tenta demonstrar/complementar esses indícios.

 

3.5.        Adicionalmente, entende a Requerida que “também as faturas e nota de crédito emitidas, de e para as entidades em causa, aproximando os valores devidos pela Requerente aos que a mesma teria a receber, bem como as datas em que se efetivou o pagamento em desacordo com os prazos de pagamento supostamente estabelecidos, indiciam que não se tratou de reais operações económicas entre as entidades envolvidas”, “verificando-se indícios fundados de que operações concretas, declaradas e registadas pela Requerente não correspondem à realidade (…)”, concluindo a Requerida que “(…) de harmonia com o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, deixa de valer a presunção de verdade constante do enunciado normativo do n.º 1 do mesmo artigo”.

 

3.6.        Nestes termos, cita a Requerida o nº 3 do artigo 19º do Código do IVA, nos termos do qual “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada (…)”, referindo que “sobre a questão de saber se o artigo 19.º, n.º 3, do Código do IVA, se basta com meros indícios ou se exige a prova da simulação, o STA considera como requisitos para que a administração tributária possa proceder à liquidação adicional fundada na existência de deduções declaradas superiores às devidas, (…) a sua consideração subjectiva, na sua actividade de controlo ou de fiscalização relativa ao cumprimento dos deveres dos contribuintes, de que estes fizeram constar das suas declarações uma dedução superior à que seria devida; que essa consideração seja tomada de modo, objectivo e materialmente, fundamentado (…)”.

 

3.8.        Ora, “sendo a dedução do IVA um direito do sujeito passivo que suportou o imposto, pois lhe confere a possibilidade de recuperar o imposto que suportou na aquisição de bens ou serviços, (…) não caberá à administração o ónus de prova da inexistência dos factos tributários cujo imposto considerou fundamentadamente deduzido ilegalmente por parte do contribuinte, mas caberá ao próprio contribuinte o ónus de prova da existência dos factos tributários em que fundou a dedução que declarou”.

 

3.9.        Assim, reitera a Requerida, “quando o acto de liquidação adicional do IVA se fundamente no não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte cabe à administração apenas a prova da verificação dos pressupostos legais que legitimam a sua actuação (…) e ao contribuinte o ónus de prova de existência dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do art.º 19º do CIVA”.

 

3.10.      Adicionalmente, refere a Requerida que “do artigo 75º, da LGT, resulta a existência de presunção legal de verdade ou veracidade das declarações apresentadas pelo contribuinte à AT e dos dados que constarem da sua contabilidade e escrita quando de acordo com a legislação comercial e fiscal”, pelo que “(…) só quando a AT previamente prove que existem fundados indícios de deficiente contabilidade ou de que esta e/ou documentos que lhe servem de suporte não refletem a matéria tributável real do sujeito passivo, é que será exigível ao contribuinte que seja ele a provar ou demonstrar o eventual erro da AT na quantificação ou na desconsideração total ou parcial da matéria coletável. Igual ónus incumbe, em princípio, ao contribuinte se se verificarem os pressupostos elencados no artigo 75º-2, da LGT (...)”.

 

3.11.      E, segundo a Requerida, “tratando-se de faturas falsas (…)” pode a AT exigir, “relativamente a tais facturas, o IVA, mau grado elas não corresponderem a operações ou transacções realmente efectuadas”.

 

3.12.      Por último, e no que diz respeito à prova testemunhal indicada pela Requerente no pedido arbitral, entende a Requerida que “(…) atenta a natureza da matéria controvertida, não se antevê a necessidade da realização da respectiva inquirição, uma vez que não há factos que não resultem de documentos e, por outro lado, trata-se essencialmente de matéria de direito”.

 

3.13.      Não obstante, “(…) caso se entenda não ser de dispensar a produção de prova testemunha (…)” veio a Requerida requerer que o Tribunal Arbitral notificasse “(…) o Requerente para indicar quais os factos que pretende ver provados mediante prova testemunhal que não sejam susceptíveis de prova documental”.

 

4.            SANEADOR

 

4.1.        O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto na alínea a), do nº 1, do artigo 10º do RJAT.

 

4.2.        O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT.

 

4.3.        As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 

4.4.        Não existem excepções nem nulidades de que cumpra conhecer.

 

5.            MATÉRIA DE FACTO

 

5.1.        Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].

 

5.2.        Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.

 

Dos factos provados

 

5.3.        A Requerente é uma sociedade comercial por quotas que iniciou a sua actividade em 10 de Janeiro de 2007, dedicando-se às seguintes actividades:

 

ACTIVIDADES    DESCRIÇÃO        CAE

ACTIVIDADE PRINCIPAL Comércio por grosso de computadores, equipamentos periféricos e programas informáticos.                46510

ACTIVIDADE SECUNDÁRIA           Outras actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares.           74900

                Outras actividades relacionadas com as tecnologias da informação e informática.            62090

                Organização de feiras, congressos e outros eventos similares.    82300

 

5.4.        A Requerente está enquadrada, para efeitos de IRC, no regime normal de tributação e, em sede de IVA, no regime normal trimestral.

 

5.5.        A Requerente apresentou cópia de um contrato de exploração de espaços publicitários, celebrado com a sociedade C..., Lda. (C...), NIPC..., em 1 de Janeiro de 2014, pelo qual a C... cedia à Requerente “os direitos de exploração comercial de espaços publicitários, correspondentes às lonas ou toldos dos atrelados dos camiões de que é proprietária e/ou legítima possuidora, com ou sem semirreboque, os quais são afetos à colocação de publicidade (…)”, ficando a produção das telas e/ou lonas publicitárias da responsabilidade da Requerente.

 

5.6.        O preço mensal da exploração dos espaços publicitários contratualmente convencionados foi de EUR 2.000,00, aos quais acrescia o valor do IVA, à taxa em vigor, devendo tal montante ser facturado trimestralmente.

 

5.7.        O prazo de vigência do referido contrato de exploração de espaços publicitários foi de 2 anos, com início a 1 de Janeiro de 2014 e termo em 31 de Dezembro de 2015.

 

5.8.        Foi efectuado um aditamento, em 20 de Janeiro de 2014, ao contrato de exploração de espaços publicitários celebrado entre a Requerente e a C... pelo qual se contratualizou que a responsabilidade pelo custo e produção das telas/lonas publicitárias, de acordo com as características e dimensões de cada espaço afecto a esse fim, era da C... .

 

5.9.        O contrato de exploração de espaços publicitários celebrado entre a Requerente e a C... foi denunciado em 2 de Junho de 2015, com efeitos a partir de 30 de Janeiro de 2015, com fundamento no facto dos clientes da C... “não aceitarem que os camiões ao serviço usem publicidade de uma empresa que não a própria C...”.

 

5.10.      Na sequência da celebração do referido contrato de exploração de espaços publicitários com a C..., foram por esta entidade emitidas, em 2014 e 2015, à Requerente, as seguintes facturas:

 

ANO 2014

FACTURA Nº      DATA     VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

219         31-03-2014          6.000,00               1.380,00

413         16-06-2014          6.000,00               1.380,00

713         30-09-2014          6.000,00               1.380,00

982         19-12-2014          6.000,00               1.380,00

TOTAL   24.000,00             7.520,00

ANO 2015

FACTURA Nº      DATA     VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

254         13-03-2015          6.000,00               1.380,00

634         29-06-2015          6.000,00               1.380,00

TOTAL   12.000,00             2.760,00

 

5.11.      A Requerente apresentou cópia de um contrato de exploração de espaços publicitários, celebrado com a sociedade D..., Lda. (D...), NIPC..., em 1 de Abril de 2014, pelo qual a D... cedia à Requerente “os direitos de exploração comercial de espaços publicitários, correspondentes às lonas ou toldos dos atrelados dos camiões de que é proprietária e/ou legítima possuidora, os quais são afetos à colocação de publicidade (…)”, ficando “a produção das lonas (…) da sua responsabilidade”.

 

5.12.      O preço mensal da exploração dos espaços publicitários, contratualmente convencionados foi de EUR 833,33, aos quais acrescia o valor do IVA, à taxa em vigor, devendo tal montante ser facturado trimestralmente.

 

5.13.      O prazo de vigência do referido contrato de exploração de espaços publicitários foi de 18 meses, com início a 1 de Abril de 2014 e termo em 30 de Setembro de 2015.

 

5.14.      A D... enviou carta à Requerente, datada de 30 de Outubro de 2015, na qual solicitava “o encontro de contas entre o saldo da nossa conta corrente (…)” (que naquela data ascendia a EUR 27.675,00) e o saldo da conta corrente da Requerente (que naquela data coincidia com o saldo da conta corrente da D...), alegando para o efeito que “uma vez que a nossa empresa se encontra com um processo especial de revitalização (…) não nos será possível liquidar a vossa conta corrente de outra forma”.

 

5.15.      Na sequência da celebração do referido contrato de exploração de espaços publicitários com a D..., foram por esta entidade emitidas, em 2014 e em 2015, à Requerente, as seguintes facturas:

 

ANO 2014

FACTURA Nº      DATA     VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

124         30-06-2014          7.500,00               1.725,00

181         30-09-2014          7.500,00               1.725,00

262         22-12-2014          7.500,00               1.725,00

TOTAL   22.500,00             5.175,00

ANO 2015

FACTURA Nº      DATA     VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

88           30-03-2015          7.500,00               1.725,00

198         29-06-2015          7.500,00               1.725,00

308         28-09-2015          7.500,00               1.725,00

TOTAL   22.500,00             5.175,00

 

5.16.      A Requerente apresentou cópia de um contrato de cedência de espaço para armazém, celebrado com a C..., em 1 de Janeiro de 2015, pelo qual a sociedade C...cederia à Requerente “a ocupação temporária de um espaço, com tudo o que o integra, o qual faz parte do prédio urbano correspondente a um Armazém (…)” destinando-se este espaço “ao armazenamento de Lonas e outros materiais”.

 

5.17.      O preço mensal da cedência e ocupação temporária do espaço identificado no ponto anterior foi de EUR 500,00, aos quais acrescia o valor do IVA, à taxa em vigor.

 

5.18.      O prazo de vigência do referido contrato de cedência de espaço para armazém foi de 6 meses, com início a 1 de Janeiro de 2015 e termo em 30 de Junho de 2015.

 

5.19.      Na sequência da celebração do referido contrato de cedência de espaço para armazém com a C..., foi por esta entidade emitida, em 2015, à Requerente, a seguinte factura:

 

FACTURA Nº      DATA     VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

635         30-06-2015          3.000,00               690,00

TOTAL   3.000,00               690,00

 

5.20.      Em 2015, a Requerente contabilizou ainda a nota de crédito nº 3, de 23-10-2015, emitida pela sociedade C... à Requerente, no montante de EUR 11.000,00 (valor sem IVA), acrescida de IVA no montante de EUR 2.530,00, referente à anulação da factura nº 413, de 16-06-2014 (vide ponto 5.10., supra) e desconto comercial sobre as facturas nº 634, de 29-06-2015 (vide ponto 5.10., supra) e nº 635, de 30-06-2015 (vide ponto anterior).

 

5.21.      A Requerente elaborou, nos anos de 2014 e 2015, diversos catálogos em papel e em suporte digital, quer para a C..., quer para a D... .

 

5.22.      A criação, elaboração e execução dos catálogos em papel implicou, nomeadamente, a criação de identidade corporativa, design, sessões fotográficas, traduções de textos para diversas línguas, produção de conteúdos digitais, animações, vídeos, criação de base de dados de potenciais clientes nos países onde decorreram as feiras, envio desses catálogos, mesmo que digitais a clientes-alvo, para a oferta de serviços da empresa, nos países onde se realizaram as feiras, envio de convites, criação de plataforma web para este efeito e a correspondente impressão de quantidade indeterminada de catálogos.

 

5.23.      Na sequência da prestação de serviços referida no ponto anterior foram emitidas pela Requerente, em 2014 e 2015, à D... e à C..., as seguintes facturas:

 

ANO 2014

CLIENTE               FACTURA Nº      DATA    VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

D...         106         22-07-2014          12.500,00            2.875,00

                427         31-12-2014          12.500,00            2.875,00

TOTAL   25.000,00             5.750,00

ANO 2015

CLIENTE               FACTURA Nº      DATA    VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

D...         221         28-04-2015          12.500,00            2.875,00

                248         08-05-2015          12.500,00            2.875,00

TOTAL   25.000,00             5.750,00

 

ANO 2014

CLIENTE               FACTURA Nº      DATA    VALOR SEM IVA VALOR DO IVA

C...         176         30-06-2014          10.000,00            2.300,00

                422         31-12-2014          10.000,00            2.300,00

                426         31-12-2014          10.000,00            2.300,00

TOTAL   30.000,00             6.900,00

ANO 2015

C...         220         28-04-2015          10.000,00            2.300,00

TOTAL   10.000,00             2.300,00

 

5.24.      A Requerente foi objecto de uma acção inspectiva, em matéria de IRC e de IVA, relativa aos anos de 2014 e 2015, na sequência da acção inspectiva efectuada à sociedade E..., S.A. e à sociedade D..., Lda.

 

5.25.      A acção inspectiva efectuada na Requerente foi credenciada através do Despacho Externo DI2017..., de 11-05-2017, da Direção de Finanças de ..., cuja extensão de competências (ao distrito do …) foi solicitada à Direção de Finanças do … e autorizada pelos serviços competentes (Despacho nº..., de 02-06-2017).

 

5.26.      A acção inspectiva efectuada na Requerente teve início em 01-08-2017 tendo, em

17-01-2018, o Despacho da Direção de Finanças de ... referido no ponto anterior sido convertido em Ordem de Serviço para o ano 2014 (OI2018...) e em Ordem de Serviço para o ano 2105 (OI2018...).

 

5.27.      A Requerente foi notificada das Ordens de Serviço identificadas no ponto anterior em 18-01-2018, através do Ofício nº..., de 17-01-2018.

 

5.28.      Na mesma data, foi a Requerente notificada da prorrogação da acção inspectiva por um prazo de 3 meses.

 

5.29.      Em 12-04-2018, foi a Requerente notificada, através do Ofício nº..., de 12-04-2018, da segunda prorrogação da referida acção inspectiva por um novo período de 3 meses.

 

5.30.      Os actos de inspecção identificados nos pontos anteriores consideraram-se concluídos em 30-07-2018, com o envio da nota de diligência através do Ofício nº..., da mesma data.

 

5.31.      Da acção inspectiva realizada na Requerente resultaram, em sede de IRC e de IVA, correcções meramente aritméticas.

 

5.32.      No que diz respeito às correcções em sede de IVA, que deram origem às liquidações de imposto objecto deste pedido arbitral, as mesmas resultaram do facto dos Serviços de Inspecção Tributária (SIT) terem considerado que a Requerente deduziu indevidamente IVA, nos anos de 2014 e 2015, no montante de EUR 9.135,00 e EUR 7.475,00, respectivamente, como a seguir se detalha:

 

PERÍODO             MONTANTE

1º TRIMESTRE 2014         1.380,00

2º TRIMESTRE 2014         1.725,00

3º TRIMESTRE 2014         3.105,00

4º TRIMESTRE 2014         3.105,00

TOTAL 2014        9.315,00

1º TRIMESTRE 2015         3.105,00

2º TRIMESTRE 2015         3.795,00

3º TRIMESTRE 2015         3.105,00

4º TRIMESTRE 2015        -2.530,00

TOTAL 2015        7.475,00

 

5.33.      A Requerente foi notificada, através do Ofício nº..., de 11-07-2018, do projecto de Relatório de Inspecção Tributária (RIT), bem como para exercer no prazo de 15 dias o direito de audição sobre o teor do mesmo.

 

5.34.      A Requerente não exerceu o direito de audição pelo que as correcções propostas se mantiveram, tendo a Requerente sido notificada, através do Ofício nº..., de 30-07-2018, da versão final do RIT.

 

5.35.      De acordo com o descrito no RIT, os SIT identificaram incongruências (i) nas facturas emitidas pela Requerente e a esta pelas sociedades C... e D..., (ii) nos contratos de prestação de serviços celebrados entre a Requerente e aquelas sociedades, bem como nas (iii) declarações prestadas, no âmbito do procedimento de inspecção, pela Requerente, pela C... e pela D... .

 

5.36.      A Requerida entendeu no RIT que as facturas emitidas, quer pela Requerente (vide ponto 5.23., supra), quer pela C... (vide ponto 5.10. e ponto 5.19., supra) e pela D... (vide ponto 5.15., supra) oferecem dúvidas quanto a titularem operações verdadeiras, como a seguir se transcreve:

 

“Análise faturas da e para E... SA:

Através do ofício nº ... de 2017-08-03, notificamos a A... Lda, para apresentar os documentos dos custos da produção dos catálogos e para explicar o porquê de não existir fatura do aluguer dos camiões para o 2° semestre de 2015, uma vez que o contrato tem duração de dois anos, com início a 01-01-2014.

- Em relação aos documentos de custo da produção das telas, foram apresentadas faturas de aquisição a uma tipografia, mas que em nada justificavam a elaboração dos ditos catálogos.

A A... Lda, veio depois argumentar, que os catálogos não tiveram sucesso, pelo que tiveram de ser elaborados através de suporte digital, isto é, nas feiras, a publicidade seria efetuada através de suporte digital em monitores.

- Em relação ao facto de não existir fatura para o 2° semestre de 2015 referente ao aluguer do camião, a A... Lda apresentou-nos um documento de denúncia do contrato por parte da E..., pelo facto dos clientes desta não aceitarem publicidade de outra empresa nos camiões da E... . A denúncia produziu efeitos a partir de 30-01-2015.

Na mesma notificação, solicitamos ainda, os termos do negócio relacionado com o aluguer do camião para a realização de campanha publicitária.

A sociedade remeteu um contrato de publicidade assinado pelas duas partes, em que era mencionado que o mesmo consistia na produção de telas de camiões com publicidade à A... Lda e que era da responsabilidade desta a produção das telas.

Assim, pedimos os documentos de suporte ao custo da produção das mesmas.

A A... Lda remeteu um aditamento ao contrato em que passa a ser da responsabilidade da E... SA a produção das telas.

No entanto, da análise à contabilidade da E... SA não verificamos custos para esse fim.

Assim, através do ofício nº ... de 2017-11-03, notificamos a E... SA para exibir os documentos de suporte aos custos de produção das telas.

Em resposta a E... SA explica que as lonas fazem parte integrante dos atrelados, quer seja por renting ou leasing e que a publicidade referida no aditamento do contrato foi efetuada por um funcionário ao serviço da C..., como é normal neste tipo de situações.

Em 2018-03-21, via correio eletrónico, solicitamos os seguintes esclarecimentos adicionais à A... Lda:

Uma vez que os catálogos não tiveram sucesso nas feiras e houve necessidade de efetuar publicidade via suporte digital, perguntamos se foram efetuados/produzidos efetivamente 40.000 catálogos, se não, quantos?

Em resposta de 2018-04-07, explicaram que a produção de catálogos em papel foi suspensa a certa altura (é difícil determinar quando), pois á medida que o tempo avançava na realização dos projetos chegou-se à conclusão que os mesmos rapidamente ficavam desatualizados, e por essa razão houve uma alteração de estratégia de marketing apostando no formato digital.

Analisamos as transferências bancárias, suporte dos meios de pagamento e recebimento das faturas (…) acima identificadas (…) concluímos o seguinte:

- O prazo de vencimento mencionado nas faturas emitidas pela A... Lda é imediato e o prazo de vencimento mencionado nas faturas emitidas pela E... SA é de 30 dias;

- Apesar das faturas emitidas pela E... SA serem anteriores às emitidas pela A... Lda, a E... SA efetua o pagamento antes da A... Lda.;

- A A... Lda efetua o pagamento das faturas, no mesmo dia ou alguns dias depois da  E... SA efetuar o pagamento, apesar do vencimento e datas das faturas serem anteriores;

- A fatura nº 413 emitida pela E... SA (de 16-06-2014), que foi contabilizada em 2015 pela A... Lda, foi anulada pela nota de crédito nº 3, no entanto, a fatura n°634 (de 29-06-2015) foi paga parcialmente e anulada pelo restante. A fatura nº 413 não deveria ter sido paga? E a fatura nº 634 totalmente anulada?

Conclusão:

- não há na contabilidade da E... SA, custos da produção das telas;

- as explicações dadas pela E... SA e A... Lda em relação à denúncia do contrato de aluguer de camião, quando refere que este contrato foi anulado porque os clientes da  E... SA não aceitavam publicidade de outras entidades que não fossem fornecedores e pela incongruência verificada pela emissão da nota de crédito que anula faturas mais antigas e não mais recentes não são aceitáveis;

- os pagamentos e os recebimentos em desacordo com o prazo de vencimento;

- a emissão da nota de crédito nº 3 apenas serviu para acertar a conta corrente do cliente da  E... SA;

- o facto de não terem sido produzidos os catálogos na sua totalidade, o que contraria a descrição das faturas e das propostas anexas às mesmas emitidas pela A... Lda.

Concluímos que as faturas emitidas entre estas duas empresas, não correspondem a verdadeiras operações, apesar do circuito financeiro existir, as faturas emitidas pela E... SA à A... Lda, apenas serviram para eliminar o efeito da emissão das faturas à E... SA, que assim consegue receber 100% das despesas elegíveis para efeitos de investimento.

Análise faturas da e para D... Lda:

No contrato de exploração de espaços publicitários, é descrito que a D... Lda fica com a responsabilidade da produção das lonas dos camiões. Analisamos as transferências bancárias, suporte dos meios de pagamento e recebimento das faturas (…) identificadas (…)” e “analisados os meios de pagamento e de recebimento, concluímos o seguinte:

- O prazo de vencimento mencionado nas faturas emitidas pela A... Lda é de 30 dias e o prazo de vencimento mencionado nas faturas emitidas pela D... Lda é de 30 dias;

 - A D... Lda. deve em 31-10-2015, 27.675,00€ e a A... Lda deve em

31-10-2015, 27.675,00€;

- Em 30-10-2015, a D... Lda. remete uma carta à A... Lda a solicitar o encontro de contas, uma vez que o valor em dívida entre as duas empresas é o mesmo, pela razão de que a D... Lda. se encontra nessa data com um processo de revitalização e não ser possível efetuar qualquer pagamento.

Conclusão:

- não há na contabilidade da D... Lda., gastos com a produção das telas;

- o encontro de contas efetuado entre as duas empresas;

- em 2018-03-21, via correio eletrónico solicitamos esclarecimentos à A... Lda para explicar:

- Se em relação aos catálogos produzidos, houve ou não aceitação, dos mesmos e se houve necessidade de recorrer à publicidade digital, à semelhança do que ocorreu com o cliente E... SA. Se sim os 50000 catálogos foram produzidos na totalidade, se não, quantos.

- Se em relação à publicidade da A... Lda. nos camiões da D..., encontraram as mesmas dificuldades com a publicidade nos camiões da E... no sentido dos clientes da E... não aceitarem a publicidade de outros clientes.

Em resposta remetida em 2018-04-07, que os trabalhos realizados em papel terão sido aproximadamente 10% e que foram efetuados trabalhos em formato digital.

Em relação à publicidade nos camiões da D... Lda, a A... Lda refere que este serviço apenas findou devido ao processo de PER que a mesma detêm.

Analisando as respostas:

- não foram produzidos todos os catálogos, dos 50000 faturados apenas 5000 foram produzidos, por isso a descrição das faturas não corresponde a serviços efetuados.

- o facto da publicidade dos camiões ter vigorado entre 01 de abril de 2014 a setembro de 2015, não tem lógica, na medida em que 96% do volume de negócios da D... Lda é para a E... SA e  D... Sul Lda. em regime de subcontratação e do volume de negócios da D... Sul Lda. 80% é para a E... SA em regime de subcontratação, logo os clientes da D... Lda. são os da  E... SA, os mesmos que não queriam publicidade nos camiões de outras empresas, que não da E... .

Se a E... denunciou o contrato de publicidade com a A... Lda. com efeitos a 30 de janeiro de 2015, a D... Lda. não deveria ter feito o mesmo?

Concluímos que as faturas emitidas entre estas duas empresas, não correspondem a verdadeiras operações, apesar do circuito financeiro estar correto, as faturas emitidas pela D... Lda à A... Lda, apenas serviram para eliminar o efeito da emissão das faturas à D... Lda.” (sublinhado nosso).

 

5.37.      Em consequência, tendo a Requerida concluído no RIT que se estava perante negócios simulados, entendeu que não era legítimo que a Requerente deduzisse o IVA subjacente às facturas emitidas, quer pela C..., quer pela D... .

 

5.38.      A Requerida procedeu à correcção das declarações trimestrais de IVA dos anos de 2014 e 2015, das quais resultaram as liquidações de imposto e de juros objecto deste pedido arbitral, a seguir identificadas, no montante total de EUR 21.896,45, que a Requerente aqui veio impugnar (montantes expressos em Euros – EUR):

 

PERÍODO             LIQUIDAÇÃO     DATA    IMPOSTO            JUROS

201403T               2018 ... 09-08-2018         1.380,00              

                2018 ...                                232,29

201406T               2018 ...                 1.725,00              

                2018 ...                                272,59

201409T               2018 ...                 3.105,00              

                2018 ...                                459,71

201412T               2018 ...                 3.105,00              

                2018 ...                                428,84

201503T               2018 ...                 3.105,00              

                2018 ...                                398,80

201506T               2018 ...                 3.795,00              

                2018 ...                                448,37

201509T               2018 ...                 3.105,00              

                2018 ...                                335,85

TOTAL   19.320,00             2.576,45

 

5.39.      Na reunião a que alude o artigo 18º do RJAT (realizada a 20 de Maio de 2019) foi obtida, da Requerida, a confirmação que a Requerente efectuou o pagamento das liquidações identificadas no ponto anterior.

 

Motivação quanto à matéria de facto

 

5.40.      No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto), no teor dos documentos juntos aos autos por ambas as Partes, bem como nas declarações de Parte prestadas e na análise do processo administrativo remetido pela Requerida.

 

Dos factos não provados

 

5.41.      Não ficou provado que os serviços decorrentes dos contratos cuja cópia foi anexada ao processo, celebrados entre a Requerente e a C... (identificados nos pontos 5.5. a 5.10. e 5.16. a 5.19., supra) e a Requerente e a D... (identificado nos pontos 5.11. a 5.15., supra) tivessem sido efectivamente prestados.

 

5.42.      Não se verificaram quaisquer outros factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.

 

6.            MATÉRIA DE DIREITO

 

6.1.        Encontrando-se fixada a matéria de facto dada como provada, de seguida importa determinar o direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões a decidir.

 

6.2.        Nos autos, os pedidos formulados pela Requerente são no sentido de serem anuladas as liquidações de IVA e juros identificadas, no montante total de EUR 21.896,45, pelo facto das mesmas serem alegadamente ilegais, peticionando-se o reembolso do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, calculado à taxa legal, desde a data do pagamento até à sua integral restituição.

 

6.3.        A Requerente sustenta o seu pedido arbitral no facto de entender que os fundamentos invocados pela Requerida (no RIT) e que deram origem às liquidações em sede de IVA e de juros que impugna no pedido, no montante total de EUR 21.896,45, são ilegais, refutando que se esteja perante “negócio simulado”, como entendeu a Requerida, porquanto reitera que todos os serviços contratualizados com as sociedades identificadas foram efectivamente prestados, estando os referidos serviços devidamente documentados.

 

6.4.        Assim, a Requerente não acompanha a conclusão a que chegou a Requerida de que, quer em 2014, quer em 2015, a dedução do IVA é indevida por “(…) não se estar em presença de verdadeiras transações (…)” porquanto, defende a Requerente, a AT não apresentou “(…) argumentação consistente que leve (…) a presumir (…) que houve da parte da (…) requerente, atuação delituosa ou condutas ilegítimas”.

 

6.5.        Com efeito, sustenta a Requerente que “ao contrário das afirmações da AT (…), as declarações dos contribuintes (…) gozam de presunção de veracidade (…)” e “estando em causa indícios de faturação falsa, a AT tem de provar que os indícios de falsidade são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que a faturação [é] falsa”.

 

6.6.        Nestes termos, reitera a Requerente que se “(…) a AT desconsidera faturas que reputa de falsas (…)” competirá “(…) à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais da sua atuação e que as operações das faturas não correspondem à realidade” o que, segundo a Requerente, a Requerida não fez no âmbito de todo o processo.

 

6.7.        Por seu lado, a Requerida sustenta a sua posição (no que a este pedido arbitral aproveita), no facto de “(…) não ter sido produzida a quantidade de catálogos faturada pela Requerente à D... Lda e à E... SA como se retira de todos os indícios/factos constantes no Relatório de Inspecção Tributária” e, “quanto às faturas que lhe foram emitidas por parte daquelas entidades [D... e C...] e correspondentes contratos de publicidade/exploração de espaços publicitários (…) detetaram-se incoerências e indícios de não se tratar de operações económicas reais (…)”.

 

6.8.        Assim, para a Requerida, “verificando-se indícios fundados de que operações concretas, declaradas e registadas pela Requerente não correspondem à realidade (…)”, “(…) de harmonia com o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, deixa de valer a presunção de verdade constante do enunciado normativo do n.º 1 do mesmo artigo” (sublinhado nosso).

 

6.9.        Por outro lado, argumenta a Requerida que, de acordo com o disposto no nº 3 do artigo 19º do Código do IVA, “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada (…)” referindo que “(…) o STA considera como requisitos para que a administração tributária possa proceder à liquidação adicional fundada na existência de deduções declaradas superiores às devidas, (…) a sua consideração subjectiva, na sua actividade de controlo ou de fiscalização relativa ao cumprimento dos deveres dos contribuintes, de que estes fizeram constar das suas declarações uma dedução superior à que seria devida; que essa consideração seja tomada de modo, objectivo e materialmente, fundamentado (…)” (sublinhado nosso).

 

6.10.      Nestes termos, conclui a Requerida que “sendo a dedução do IVA um direito do sujeito passivo que suportou o imposto (…) não caberá à administração o ónus de prova da inexistência dos factos tributários cujo imposto considerou fundamentadamente deduzido ilegalmente por parte do contribuinte, mas caberá ao próprio contribuinte o ónus de prova da existência dos factos tributários em que fundou a dedução que declarou” (sublinhado nosso).

 

6.11.      Neste âmbito, cumpre ao Tribunal Arbitral analisar o pedido e decidir a qual das Partes assiste razão nos argumentos que apresenta de modo a poder decidir do pedido arbitral sendo que, para este efeito, tendo em consideração as correcções efectuadas em matéria de IVA dedutível e as posições assumidas pelas Partes, importará determinar:

 

6.11.1.  Se a Requerida apresentou indícios suficientemente fortes da existência de simulação nas prestações de serviços prestadas, quer pela C..., quer pela D...  à Requerente, relativas à exploração de espaços publicitários e cedência de espaço de armazém;

6.11.2.  O ónus da prova;

6.11.3.  Se a Requerente logrou demonstrou a veracidade das operações tituladas pelas facturas identificadas nos autos (emitidas pelas sociedades D... e C...) e se, sendo reais tais operações, é legal a dedução do IVA suportado pela Requerente, à luz do disposto no artigo 19º, nº 3, do Código do IVA.

 

Enquadramento geral em sede de IVA

 

6.12.      Preliminarmente, refira-se que o IVA (introduzido no sistema tributário português pelo Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26/12), pode definir-se como um imposto geral sobre o consumo, na medida em que incide (em princípio) sobre todas as transmissões de bens e prestações de serviços com características onerosas (cfr. artigo 1º do Código do IVA).

 

6.13.      E caracteriza-se, igualmente, como um imposto plurifásico porque incide sobre todas as fases do circuito económico, desde a produção ao consumidor final, não sendo cumulativo, na medida em que em cada fase do circuito económico tributa apenas o valor acrescentado, isto é, o acréscimo de valor que os bens ou serviços passam a ter na fase em que se encontram, evitando, assim, o efeito cumulativo de imposto sobre imposto.

 

6.14.      Para além das características apontadas nos dois pontos anteriores, o IVA apresenta ainda a característica da neutralidade dado que (mercê do mecanismo das deduções), o imposto virá a ser suportado, na totalidade, pelo consumidor final, tornando fiscalmente irrelevante o número de fases que integrem o circuito económico.

 

6.15.      Por último, refira-se que a liquidação do imposto é feita pelos operadores económicos que repercutem o imposto liquidado a montante para o cliente, devendo-se utilizar o método subtractivo indirecto na determinação do valor acrescentado, de acordo com o disposto no artigo 19º do Código do IVA.

 

6.16.      Nestes termos, a acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista, abstracta e tipicamente, na lei fiscal como geradora do direito ao imposto, sendo que essa situação factual e concreta se define como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal.

 

6.17.      Com efeito, as normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real (as quais definem os seus elementos objectivos), pelo que só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto, porquanto se consubstancia em qualquer transmissão de bens ou prestação de serviços, a título oneroso, que seja efectuada no território nacional (cfr. artigo 1º do Código do IVA).

 

6.18.      Assim, a existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada.

 

6.19.      Por outro lado, nos termos do Código do IVA, a obrigação geral dos sujeitos passivos disporem de contabilidade adequada ao apuramento e fiscalização do imposto deriva do estabelecido no artigo 28º, nº 1, alínea g), assim se explicando que os sujeitos que, face à lei comercial e fiscal, estão obrigados a dispor de contabilidade organizada, devam observar também certas obrigações contabilísticas com o objectivo de obter segurança e clareza no registo das operações decorrentes da aplicação do Código do IVA e necessárias ao cálculo do imposto, bem como para permitir o seu controlo.

 

6.20.      E, ainda no que diz respeito ao específico regime do IVA, igualmente se dirá que o legislador se socorre de presunções que estabelecem a prova legal para alguns factos particulares, as quais implicam uma verdadeira inversão do ónus da prova e se explicam pela natureza deste tributo.

 

6.21.      Por último, atendendo mais uma vez à especificidade do IVA, será também de referir que não pode a Autoridade Tributária operar alterações à quantificação da base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa.

 

Da alegada existência de negócio simulado

 

6.22.      Neste âmbito, no caso em análise, importará em primeiro lugar delimitar o conceito de “negócio simulado” sendo que, posteriormente, haverá que analisar e distribuir o ónus da prova de forma a aquilatar se as Partes lograram ou não demonstrar os factos por si invocados, nos termos legalmente adequados.

 

6.23.      De acordo com o disposto no nº 3, do artigo 19º do Código do IVA, “não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada (…)”.

 

6.24.      Contudo, dado que a lei fiscal nada estatui relativamente ao conceito de “simulação”, haverá que ter em consideração o disposto no artigo 11º, nº 2, da Lei Geral Tributária (LGT), nos termos do qual “sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos do direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei” (sublinhado nosso).

 

6.25.      Assim, atento o disposto na referida disposição legal, se outro sentido não decorrer da lei fiscal, deve entender-se que o Direito Tributário utiliza os conceitos elaborados por outros ramos de direito no mesmo sentido que aquele aí têm, não tendo o intérprete-aplicador a faculdade geral de os alterar.

 

6.26.      Nestes termos, deverá entender-se que o legislador fiscal acolheu o termo ou conceito no mesmo sentido que este tem no ramo de direito que o elaborou, ou seja, no Direito Civil.

 

6.27.      Ora, o conceito de simulação vem definido no artigo 240º, nº 1, do Código Civil, nos termos do qual se pode ler que “se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado” (sublinhado nosso).

 

6.28.      Assim, do exposto no citado artigo do Código Civil decorre que são três os elementos característicos da simulação, como a seguir se indica:

 

             A divergência entre a vontade e a declaração;

             O acordo ou conluio entre as Partes e,

             A intenção de enganar terceiros.

 

6.29.      Em primeiro lugar, a simulação pressupõe que o lado externo da declaração negocial (a declaração) e o seu lado interno (a vontade) não coincidam sendo que, em termos gerais, esta divergência entre a vontade e a declaração pode ser absoluta (nos casos em que o declarante, não querendo celebrar qualquer negócio jurídico, diz querer fazê-lo e celebra um negócio jurídico qualquer) ou relativa (quando o declarante, querendo celebrar um negócio jurídico, diz querer e celebra um negócio jurídico diferente).

 

6.30.      Com efeito, a identificação da divergência, quer absoluta, quer relativa, pressupõe a identificação da vontade real do declarante e a sua comparação com a declaração negocial produzida.

 

6.31.      Nestes termos, na simulação absoluta, sob a capa da declaração não se esconde nenhuma vontade negocial, mas sim a ausência de qualquer vontade negocial mas, pelo contrário, na simulação relativa, sob a capa da declaração esconde-se uma declaração negocial com ela divergente, o negócio jurídico que corresponde à vontade real do declarante, designado negócio dissimulado.

 

6.32.      Por outro lado, a simulação pressupõe também que (i) não haja erro na declaração, (isto é, que o declarante conheça a divergência entre a sua declaração e a sua vontade) e que (ii) não haja reserva mental (ou seja, que o declaratário também a conheça).

 

6.33.      Contudo, o conceito de simulação exige, porém, mais do que a simples consciência ou representação do declarante sobre a divergência entre a sua vontade e a sua declaração porquanto, para que se possa falar de simulação é também necessária a existência de um acordo ou de um encontro de vontades sobre a própria simulação entre os dois sujeitos (declarante e declaratário).

 

6.34.      Assim, é ainda elemento constitutivo do conceito de simulação um acordo fraudulento sobre a própria divergência entre um e outro.

 

6.35.      Nesse acordo, que se designa por pacto simulatório, manifesta-se uma contra-declaração na qual ambas as Partes declaram a sua vontade real ou a sua vontade de se querer vincular nos termos do negócio simulado.

 

6.36.      Por último, e uma vez que seja verificada a divergência entre declaração e vontade, bem como o acordo sobre ela, para que se possa falar de simulação é ainda necessário verificar se há ou não uma intenção fraudulenta no pacto simulatório, destinada a enganar e prejudicar terceiros.

 

6.37.      Neste âmbito, quando o pacto simulatório visa apenas enganar, mas não prejudicar terceiros, a simulação diz-se inocente mas a simulação será qualificada como fraudulenta quando o pacto simulatório se destina não só a enganar mas também a prejudicar esses terceiros.

 

6.38.      Ora, analisados que estão, em termos gerais, todos os requisitos exigidos por lei para a configuração de uma operação como sendo simulada, importará aferir no caso em análise:

 

6.38.1.  Se se encontram ou não preenchidos todos os requisitos da simulação, em conformidade com o exposto nos pontos anteriores e;

6.38.2.  Se a Requerida coligiu, em matéria de inspecção tributária, indícios da existência de negócios simulados que sejam aptos a colocar em causa a presunção de veracidade de que goza a escrita da Requerente.

 

6.39.      Com efeito, recorde-se, a Requerida refere, no RIT, que da análise das facturas emitidas pela C... e à C..., face aos indícios aí descritos (vide ponto 5.36., supra), lhe foi possível concluir que “(…) as faturas emitidas entre estas duas empresas, não correspondem a verdadeiras operações, apesar do circuito financeiro existir (…)” porquanto “(…) as faturas emitidas pela E... SA à A... Lda, apenas serviram para eliminar o efeito da emissão das faturas à  E... SA, que assim consegue receber 100% das despesas elegíveis para efeitos de investimento” (sublinhado nosso).

 

6.40.      Por outro lado, refere também a Requerida no RIT que, da análise das facturas emitidas pela D... e à D..., face aos indícios descritos no RIT (vide ponto 5.36., supra), lhe foi também possível concluir que “(…) as faturas emitidas entre estas duas empresas, não correspondem a verdadeiras operações, apesar do circuito financeiro estar correto, as faturas emitidas pela D... Lda à A... Lda, apenas serviram para eliminar o efeito da emissão das faturas à D... Lda.” (sublinhado nosso).

 

6.41.      Ora, foi entendido pelos SIT no RIT que a Requerente efectuou “dedução de IVA de faturas que não correspondem a verdadeiras transações em 2014 (…)” e em 2015, tendo deste modo contrariado o disposto no artigo 19º do Código do IVA.

 

6.42.      Adicionalmente, na Resposta apresentada no âmbito deste processo arbitral, a Requerida entendeu que a Requerente não veio trazer ao processo “(…) elementos comprovativos da realidade das operações desconsideradas, que permitam controverter os factos e respetivas conclusões apontadas pelos SIT, limitando-se (…) a defender que a sua contabilidade e respetivas declarações gozam de presunção de verdade e que a AT não cumpriu o seu ónus de prova no sentido de fazer cessar essa presunção”.

 

6.43.      Assim, segundo a Requerida “verificando-se indícios fundados de que operações concretas, declaradas e registadas pela Requerente não correspondem à realidade (…) deixa de valer a presunção de verdade constante do enunciado normativo (…)”, cabendo ao contribuinte “(…) demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos e respectivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles fundados indícios” (sublinhado nosso).

 

6.44.      E, concluindo a Requerida nos termos referidos no ponto anterior, reitera a sua posição de que se está perante facturas falsas porquanto, citando o Acórdão do STA de 20-11-2002 (nº 01483/02), a “contabilidade considera (…) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem (…) não tiveram lugar” (sublinhado nosso).

 

6.45.      Assim, considera a Requerida que o IVA associado às referidas facturas não é dedutível, na esfera da Requerente, nos termos do disposto no artigo 19º, nº 3 do Código do IVA entendendo que os indícios recolhidos apontam no sentido de terem sido praticadas, pela Requerente e com a Requerente, diversas operações simuladas conducentes à prática de fraude fiscal.

 

6.46.      Ora, atento o acima exposto, analisemos se os factos descritos constituem “(…) indícios fundados (…)” que permitam concluir pela existência de operações simuladas e, em consequência, concluir pela (i)legalidade das deduções do IVA incidente sobre os montantes relativos a esses operações.

 

6.47.      Neste âmbito, conforme referido em Acórdão do TCAN de 11-04-2014 (nº 00142/08.4BEBRG), “(…) existindo (…) indícios da falsidade das facturas (…) tal circunstância não permite, por si só, que se conclua pela existência de simulação (…)” porquanto “aceitar-se que um utilizador de facturas veja os custos desconsiderados sem que de alguma forma a administração tributária o ligue ao esquema fraudulento, seria violador do princípio da justiça. E poria em causa a confiança nas relações comerciais. Este entendimento vai de encontro ao do Tribunal de Justiça que no Acórdão de 31 de Janeiro de 2013, processo C-642/11 (…)”, nos termos do qual se entendeu que “(…) cabe às autoridades e aos tribunais nacionais recusar o direito a dedução, se se demonstrar, face a elementos objectivos, que esse direito é invocado fraudulenta ou abusivamente (v., neste sentido, acórdão de 6 de Julho de 2006, Kittel e Recolta Recycling, C-439/04 e C-440/04, Colet., p.I-6161; e acórdãos, já referidos, Mahagében e David, n.º 42, e Bonik, n.º 37)” (sublinhado nosso).

 

6.48.      “Contudo, também segundo jurisprudência bem assente, não é compatível com o regime do direito à dedução prevista pela Diretiva 2006/112 sancionar, com a recusa desse direito, um sujeito passivo que não sabia nem podia saber que a operação em causa fazia parte de uma fraude cometida pelo fornecedor ou que outra operação incluída na cadeia de fornecimento, anterior ou posterior à realizada pelo referido sujeito passivo, estava viciada por fraude ao IVA (v., especialmente, acórdão de 12 de Janeiro de 2006, Optigen e o., C-354/03, C-355/03 e C-484/03, Colet., p. I-483, n.ºs 52 e 55; e acórdãos, já referidos, Kittel e Recolta Recycling, n.ºs 45, 46, e 60, Mahagében e Dávid, n.º 47, e Bonik, n.º 41)” (sublinhado nosso).

 

6.49.      Ora, constitui requisito do direito à dedução, nas operações internas, que “(…) tenha sido o utilizador a adquirir esses bens e serviços” porquanto de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 20º do Código do IVA, “só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens e serviços adquiridos (…) pelo sujeito passivo para a realização das operações (…)” aí elencadas, nomeadamente, “transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas” [alínea a)].

 

6.50.      E dado que a dedutibilidade do imposto só pode ser afastada por uma norma de exclusão, só nos interessará aqui analisar a que serviu de base aos SIT para procederam às liquidações de IVA aqui impugnadas, ou seja, analisar o disposto no nº 3 do artigo 19º do Código do IVA e a sua aplicabilidade ao caso.

 

6.51.      Ora, como acima vimos, segundo esta norma, “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente” (sublinhado nosso).

 

6.52.      Neste âmbito, tendo os SIT e a Requerida (na Resposta) vindo sustentar que se estaria, no caso em análise, perante operações simuladas, será necessário aferir se competia ou não à Requerida provar o acordo simulatório sendo que, em matéria tributária, será crucial, repita-se, analisar a questão da repartição do ónus probatório entre ambas as Partes para efeitos de aferir da legalidade do exercício à dedução.

 

Do ónus da prova

 

6.53.      Sobre esta matéria, dispõe o artigo 74º, nº 1, da LGT, nos termos do qual “o ónus de prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”.

 

6.54.      “Assim, e tomando como modelo o procedimento de liquidação da iniciativa da administração tributária, esta terá o ónus de demonstrar a ocorrência dos factos de que deriva o direito à liquidação (os factos-pressupostos da existência, qualificação e quantificação do facto tributário). E o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito”.

 

6.55.      “Todavia, o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 2003-05-07 [Processo n.º 01026/02 (…) seguindo o entendimento do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2002-04-17, processo n.º 026635, (…)], firmou jurisprudência no sentido de que recai sobre o contribuinte a prova da existência dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado” (sublinhado nosso).

 

6.56.      E, ainda em conformidade com o Acórdão do TCAN acima citado (vide ponto 6.47.,supra), “a razão de ser deste entendimento é a seguinte: ao contrário do que sucede em regra, em que a administração tributária afirma a ocorrência do facto de que deriva o direito à tributação, neste caso é o sujeito passivo que afirma o facto tributário de que deriva o direito à dedução e a administração tributária que põe em causa a sua ocorrência. Deve salientar-se, porém, que esta regra do ónus probatório só opera verdadeiramente depois de a administração tributária ter reunido e invocado indícios fundados de que o facto tributário não ocorreu (…)” (sublinhado nosso).

 

6.57.      Com efeito, de acordo com a posição assumida no Acórdão do TCAN nº 01679/06.5BEBRG, de 27-02-2014, “quando a liquidação adicional de IVA tem por fundamento o não reconhecimento do direito às deduções declaradas pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação. Tendo o juízo da administração tributária assentado no pressuposto de que ocorreu simulação relativa das operações tituladas pelas facturas em causa (…), impunha-se que recolhesse indícios sérios e objectivos dessa simulação. Feita essa prova, cabia então ao contribuinte o ónus da prova de que as facturas em causa correspondem a operações realmente efectuadas pela empresa que as emitiu e, assim, comprovar o direito às deduções que efectuou do IVA nelas mencionado” (sublinhado nosso).

 

6.58.      Ou seja, “(…) compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais legitimadores da sua actuação constantes do artigo 82º, nº 1 do CIVA (…)” porquanto “(…) assentando o juízo da administração tributária na consideração de que as operações (…) a que se referem as facturas em causa não correspondem à realidade, terá de demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas facturas foram simuladas. Feita essa prova, cabe ao contribuinte o ónus da prova de que as operações económicas que estiveram subjacentes à dedução do imposto (artigo 19º do CIVA) se realizaram efectivamente, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada (…)” (sublinhado nosso).

 

6.59.      E, como se refere no Acórdão do nº 08959/15, de 22-02-2018, “a AT pode lançar mão de elementos obtidos através de fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, porém, não se pode bastar com esses elementos (indícios externos), tem necessariamente de obter alguns indícios junto do contribuinte (indícios internos) que, ainda que conjugado com aqueles outros, conduzam à elevada probabilidade de que as facturas não correspondem a operações efectivas (…)” (sublinhado nosso).

 

6.60.      Nestes termos, cumpre averiguar se, no caso em análise, a administração tributária fez prova, como lhe competia, da existência de indícios sérios e objectivos, susceptíveis de permitir a conclusão de que as facturas contabilizadas pela Requerente, respeitantes a serviços prestados pelas sociedades C... e D... não corresponderam a operações reais, para que possa vir liquidar adicionalmente o IVA à Requerente, respeitante às deduções que considerou, no âmbito do procedimento inspectivo, como indevidamente efectuadas.

 

6.61.      No caso, segundo os SIT, no âmbito do exposto no RIT, face aos indícios recolhidos (vide ponto 5.36., supra):

 

6.61.1.  As facturas emitidas entre a C... e a Requerente “(…) não correspondem a verdadeiras operações, apesar do circuito financeiro existir (…)” porquanto “(…) as faturas emitidas pela E... SA à A... Lda, apenas serviram para eliminar o efeito da emissão das faturas à E... SA, que assim consegue receber 100% das despesas elegíveis para efeitos de investimento”.

6.61.2.  As facturas emitidas entre a D... e a Requerente “(…) não correspondem a verdadeiras operações, apesar do circuito financeiro existir (…)” porquanto “(…) as faturas emitidas pela D... Lda. à A... Lda, apenas serviram para eliminar o efeito da emissão das faturas à D... Lda.”.

 

6.62.      Ou seja, segundo a Requerida, terá ocorrido uma simulação justificativa do não reconhecimento do direito da Requerente à dedução do IVA liquidado nas facturas que lhe foram emitidas pela C... e pela D..., uma vez que as operações tituladas por estas não teriam, segundo entenderam os SIT, existido.

 

6.63.      Ora, “é certo que a administração tributária não tem de fazer a prova directa da simulação, isto é, a prova dos pressupostos exigidos pela lei civil para que se verifique a simulação (artigo 240º do Código Civil), sendo suficiente a prova indirecta (…)” através de “(…) factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” (sublinhado nosso).

 

6.64.      Assim, compulsado o teor do RIT verifica-se que os SIT concluíram, em conformidade com o acima transcrito no ponto 5.36. (de acordo com o acima referido no ponto 6.61.), ou seja que, quer quanto às facturas emitidas pela C..., quer quanto às facturas emitidas pela D..., “(…) as faturas emitidas (…) não correspondem a verdadeiras operações (…)” tendo servido “(…) para eliminar o efeito da emissão das faturas à E... SA (…)” e “(…) para eliminar o efeito da emissão das faturas à D... Lda.”.

 

6.65.      Tendo em consideração a documentação anexada pelas Partes, nomeadamente pela Requerente com o pedido e, de acordo com as declarações de Parte, prestadas pelo sócio-gerente da Requerente na reunião havida em 20 de Maio de 2019, resultou a convicção para este Tribunal Arbitral que foram realizadas as prestações de serviços pela Requerente relativas à elaboração de catálogos, quer para a C..., quer para a D..., para serem utilizados em feiras, tendo sido subcontratados pela Requerente profissionais com formação específica para efectuar os serviços necessários à concepção dos mesmos (“fizemos o design e enviamos tudo”, “foram contratadas pessoas para efectuar serviços de tradução e fotografia”, “nunca tinha feito nada igual” mas tendo “o feed-back do cliente, ia ajustando” e “todo o trabalho foi apresentado à AT”), ainda que tais serviços possam ter sido, eventualmente, prestados por um valor inferior ao valor contratado/declarado.

 

6.66.      Não obstante, tendo em consideração o objecto do pedido de pronúncia arbitral (liquidações adicionais de IVA relativas a imposto indevidamente deduzido pela Requerente – vide ponto 5.38., supra), não cabe a este Tribunal Arbitral analisar os serviços prestados pela Requerente, em 2014 e 2015, e objecto de facturação por parte desta à sociedade C... e à sociedade D... (ainda que chamados referenciados no processo arbitral, quer pela Requerente, quer pela Requerida, ora para legitimar a totalidade das transacções subjecentes (Requerente), ora para legitimar as suspeitas de simulação suscitadas pela Requerida.

 

6.67.      Não obstante, das declarações de Parte prestadas na reunião havida já não resultou para este Tribunal Arbitral a convicção de que as prestações de serviços contratualizadas pelos seguintes contratos celebrados entre a Requerente e a C... e entre a Requerente e a D... respeitassem a verdadeiras operações:

 

6.67.1.  Relativo à cedência de espaço pela C... à Requerente para armazém e de cedência de espaços publicitários nos camiões, para publicidade à Requerente nas lonas;

6.67.2.  Relativo à cedência de espaços publicitários nos camiões, pela C... e pela D..., para publicidade nas lonas;

 

6.68.      Com efeito, a declaração (de Parte) do sócio-gerente da Requerente de que esta tinha interesse em celebrar, com a C..., o contrato de cedência de espaço para armazém, porquanto “tínhamos coisas muito sensíveis (equipamentos caros) que precisávamos de armazenar num sítio de confiança” e, estando disponível aquele espaço em ... (...), “pusemos lá”, não convenceu este Tribunal Arbitral de que havia interesse da Requerente em arrendar o referido espaço porquanto as instalações da Requerente eram, à data a que se reporta o contrato, em ..., muito distantes da localização do referido armazém e, por isso, não seria prático ir lá buscar ou levar bens para armazenar, quando o podiam fazer muito mais perto.

 

6.69.      Adicionalmente, refira-se que nenhuma prova foi efectuada pela Requerente de que o espaço objecto de cedência pela C... à Requerente foi efectivamente ocupado por esta, durante o prazo contratualizado, o que poderia ter sido feito, nomeadamente, através de facturas de consumos de água, de energia ou outros.

 

6.70.      Por outro lado, o sócio-gerente da Requerente, apesar de ter referido que foi ele que, nas datas em que foram efectuados pela Requerente os serviços de produção de catálogos, emitiu as respectivas facturas (“era sozinho”), já no que diz respeito aos serviços que foram prestados à Requerente, no mesmo período, não se recordou, nomeadamente:

 

6.70.1.  Do extravio da factura nº 413/2014, de 16/06/2014 (emitida pela C...) e alegadamente só recebida e registada pela Requerente em 2015, posteriormente anulada pela nota de crédito nº 3, de 23/10/2015, emitida pela C...;

6.70.2.  Se foram efectuadas diligências no sentido de averiguar, junto da C..., o que se teria passado com aquela factura nº 413/2014 para não ter sido, alegadamente, recepcionada pela Requerente, quando lhe chegou a factura seguinte (a nº 713, de 30/09/2014).

 

6.71.      E não foi efectuada pela Requerente nenhuma prova documental (nomeadamente através de fotografias dos camiões com as lonas a fazer publicidade à Requerente), ou por via das explicações obtidas nas declarações de Parte, no âmbito do processo arbitral, de que a cedência de espaços publicitários nos camiões, quer da C..., quer da D..., para publicidade à Requerente (nas lonas daqueles veículos) foi efectivamente prestada por estas duas entidades.

 

6.72.      A corroborar a convicção do Tribunal Arbitral, à semelhança do entendido da Requerida, refiram-se os quadros resumo de pagamentos e recebimentos de facturas emitidas pela Requerente e à Requerente pelas sociedade C... e D..., em 2014 e 2015, apresentados pelos SIT no RIT e não contestados pela Requerente, nos termos dos quais:

 

6.72.1.  A Requerente emitiu à C..., em 2014 e 2015, facturas no total de

EUR 59.000, tendo esta pago à Requerente EUR 49.200;

6.72.2.  A C... emitiu à Requerente, em 2014 e 2015, facturas no total de

EUR 50.430, tendo esta pago à  C... EUR 47.970;

6.72.3.  A Requerente emitiu à D..., em 2014 e 2015, facturas no total de

EUR 61.500, tendo esta pago à Requerente EUR 33.825;

6.72.4.  A D... emitiu à Requerente, em 2014 e 2015, facturas no total de

EUR 55.350, tendo esta pago à D... EUR 27.675.

 

6.73.      Ou seja, a totalidade dos valores facturados por cada uma das entidades nunca corresponde ao valor que foi pago, verificando-se semelhanças entre os valores que foram pagos e recebidas por cada uma das entidades, identificadas no ponto anterior, entre si.

 

6.74.      Nestes termos, conclui-se que a administração tributária indicou no RIT factos capazes de suportar a conclusão da existência de acordos simulatórios entre as entidades identificadas, com o intuito de enganar terceiros, tendo sido recolhidos elementos que relacionaram a Requerente com o esquema de fraude, ou seja, foram reunidos indícios de que a utilizadora das facturas (ou seja, a Requerente) participou e sabia que as entidades emitentes das facturas cujo IVA foi pela Requerente deduzido (C... e D...) tinham intuitos ilícitos com a emissão das mesmas.  

 

6.75.      E feita essa prova pela Requerida (no RIT e reiterado na Resposta), cabia à Requerente o ónus da prova de que as facturas em causa (as emitidas pela C... e pela D...) correspondiam a operações realmente efectuadas por cada uma destas empresas à Requerente e, assim, comprovar o direito à dedução do IVA nelas mencionado, o que no entender deste Tribunal Arbitral não aconteceu.

 

6.76.      Assim, não pode deixar de se concluir que a Requerida demonstrou, como lhe competia, factos que, conjugados uns com os outros e apreciados à luz das regras da experiência comum, a legitimavam a corrigir as deduções de IVA efectuadas, em 2014 e 2015, pela Requerente, com fundamento em simulação relativa das operações tituladas pelas facturas em causa, ilidindo, assim, a presunção da veracidade de que goza a contabilidade da impugnante [artigo 75º, nº 1 da LGT], daí decorrendo a legalidade das liquidações de IVA e de juros aqui impugnadas.

 

6.77.      Nestes termos, conclui este Tribunal Arbitral pela legalidade das liquidações de IVA e de juros aqui impugnadas, improcedendo o pedido de anulação das mesmas e de reembolso das quantias pagas.

 

Do pagamento dos juros indemnizatórios

 

6.78.      A par do pedido de declaração da ilegalidade das liquidações de imposto e juros identificadas no processo, a Requerente peticionava ainda o pagamento de juros indemnizatórios, pela Requerida, ao abrigo do disposto no artigo 43º da LGT.

 

6.79.      Contudo, face à conclusão obtida nos pontos 6.76. e 6.77., supra de que são legais as liquidações de IVA e de juros objecto do pedido arbitral fica prejudicado o conhecimento do pedido de pagamento de juros indemnizatórios.

 

Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

6.80.      Nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

 

6.81.      Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a Parte vencida, na proporção em que o for.

 

6.82.      Nestes termos, tendo em consideração o acima exposto, a responsabilidade em matéria de custas arbitrais deverá ser imputada exclusivamente à Requerente.

 

7.            DECISÃO

 

7.1.        Nestes termos, tendo em consideração as conclusões apresentadas nos Capítulos anteriores, decidiu este Tribunal Arbitral Singular:

 

7.1.1.     Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente no que diz respeito ao pedido de declaração de ilegalidade e de anulação das liquidações de IVA e de juros identificadas no pedido, sendo assim de manter as mesmas por não enfermarem de qualquer ilegalidade;

7.1.2.     Julgar, em consequência, improcedente, o pedido de reembolso das quantias pagas acrescidas de juros indemnizatórios;

7.1.3.     Condenar a Requerente no pagamento das custas do presente processo.

 

Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 21.896,45.

 

Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 1.224,00, a cargo da Requerente, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.

 

*****

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 28 de Junho de 2019

 

O Árbitro,

 

Sílvia Oliveira