Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 610/2018-T
Data da decisão: 2019-06-25  IRC  
Valor do pedido: € 172.646,01
Tema: IRC - Fusão invertida; gastos de financiamento. Art. 23.º do CIRC
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DECISÃO ARBITRAL

 

Os árbitros Juiz Conselheiro Dr. Carlos Fernandes Cadilha (árbitro-presidente), Doutor Tomás Cantis¬ta Tavares e Dr. Jorge Carita (árbitros vogais), designados, respetivamente, pelo Conselho Deontológico do CAAD, pela Requerente e pela Requerida para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

1. Relatório

A... SGPS, SA NIPC..., com sede na Av. ..., n.º..., ..., ...-... Lisboa (doravante A... ou Requeren¬te) apresentou pedido de constituição do tribunal arbitral coletivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, al. a) e 6.º, n.º 2, al. b) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA), com vista à declaração de ilegalidade da liquidação de IRC e Juros compensatórios e de mora de 2014, no valor de 172.646,01€ (n.º 2018...; 2017...; 2017..., acerto de contas 2018...) – doc. n.º 1 a 3, juntos com o Requerimento Inicial (RI).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e se-guiu a sua normal tramitação. O tribunal arbitral coletivo foi constituído em 18/2/2019.

A ATA respondeu, por impugnação, defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente, revogou parcialmente o ato contestado (como se exporá adiante) e solicitou suspensão da instância até decisão do processo C-751/18, que corre termos no Tribunal de Justiça da União Europeia (doravante TJUE), sobre questão idêntica à dos presentes autos.

Por desnecessidade, foi dispensada a reunião do artigo 18.º do RJAT. As partes foram notificadas para prestarem alegações escritas, querendo – e só a requerida o fez.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, como se dispõe no art. 2.º, n.º 1, al. a) e 4.º, ambos do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão re¬pre¬sen¬tadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art. 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão:

FACTOS GERAIS

a)            A Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais (SGPS), que tem por objeto social a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas.

b)           A Requerente é a sociedade cúpula de um grupo de sociedades, que em 2014 estava sujeito ao regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS), que, entre outras, detinha 100% do capital social das seguintes entidades (integradas no perímetro de consolidação fiscal): B..., SA [doravante B... SA] (Nif...) e C..., SA [doravante C..., SA] (nif...).

c)            A requerente (sociedade cúpula) foi alvo de inspeção individual ao seu IRC de 2014, no âm¬bito do qual foram propostas correções à matéria tributável no montante de 1.243.235,89€.

d)           A B..., SA foi alvo de inspeção individual ao seu IRC de 2014, no âmbito do qual foram propostas correções à matéria tributável no montante de 886.426,91€.

e)           A C... SA foi alvo de inspeção individual ao seu IRC de 2014, no âmbito do qual foram propostas correções à matéria tributável no montante de 820.811,78€.

f)            Posteriormente, a requerente foi alvo de procedimento de inspeção interna, enquanto sociedade dominante do grupo, de âmbito parcial ao IRC de 2014, por forma a refletir no grupo os procedimentos inspetivos realizados individualmente e referidos nos factos provados c) a e).

g)            Do relatório inspetivo (doc. n.º 8 do RI) decorre uma correção ao resultado do grupo de 2.950.474,58€ (1.243.235,89€ + 886.426,91€. + 820.811,78€), passando assim de um prejuízo de 1.050.340,46€ para um lucro tributável no valor de 1.896.134,02€.

h)           Em sequência, tais correções foram materializadas na liquidação (impugnada nos presentes autos) de IRC e juros compensatórios de mora de 2014, no valor de 172.646,01€ (n.º 2018...; 2017...; 2017..., acerto de contas 2018...).

i)             Em 16/8/2018, a requerente procedeu ao pagamento total desta liquidação, no valor de 172,646,01€.

j)             A requerente foi notificada do relatório inspetivo e da liquidação.

FACTOS RELATIVOS À CORREÇÃO DA A... DE 1.243.235,89€

k)            A Requerente aceita e confessa que não deveria levar a custo fiscal a quantia de 243.235,89€ - e que o custo fiscal seria tão só de 1 milhão de euros (nos termos do art. 67.º e 23.º do CIRC) – art. 68.º do RI.

l)             A ATA revogou parcialmente o ato impugnado: deferiu o pedido, na parte relativa a correções da sociedade dominante, reduzindo o valor desconsiderado como gasto para efeitos de apuramento do seu resultado tributável individual do montante de 1.243.235,89€ para o montante de 243.235,89€ (Despacho de 19/1/2019 da subdiretora geral da área de gestão tributária do IR – cfr. art. 10.º da resposta).

FACTOS RELATIVOS À CORREÇÃO DA C... SA (820.811,78€)

m)          A C..., SA atua no setor dos serviços de comunicação e marketing direto, especificamente na distribuição de folhetos publicitários em caixas de correio de destinatários indiferenciados.

n)           A C..., SA era totalmente detida por D..., SGPS, SA.

o)           Em Dezembro de 2010, a D...  alienou 100% do capital da C..., SA à sociedade E..., SA (NIPC...) – entidade dominada a 100% pela Sociedade A..., SGPS, SA (aqui requerente), a qual, por seu turno é totalmente detida pelo fundo F...– Fundo de Capital de Risco.

p)           A E... foi constituída em Novembro de 2010 e o seu objeto era a distribuição e divulgação de folhetos, promoções comerciais e publicitárias, ações de marketing e comunicação.

q)           O F... é uma entidade de capital de risco, dedicando-se (em geral, através de sociedades por ele dominadas) à aquisição de participações de capital e controlo de sociedades, na mira de valorização do capital adquirido, por incremento da qualidade de gestão, e, consequentemente, da remuneração dos investidores.

r)            A E..., para a consumação da compra da C..., financiou-se através de: i) Suprimentos concedidos pelo acionista A..., SGPS, SA, de 6,4 Milhões de Euros, à taxa de 15%/ano; ii) Empréstimos bancários (mutuados pela ...) de 23 milhões de euros, sendo que a tranche B, de 3,5 Milhões de euros, foi destinada à compra do capital social da C..., SA.

s)            Em Setembro de 2011 (e com efeitos contabilísticos a 1/1/2011), a E... (sociedade in¬cor-porada) fundiu-se na C..., SA (sociedade incorporante), por transferência glo¬bal do património da incorporada na incorporante – numa operação usualmente designada por fusão inversa ou invertida.

t)            Após a fusão, a C..., SA (incorporante) assumiu a (i) totalidade das dívidas da E... e (ii) os encargos (juros) contraídos pela E... junto da Banca e do acionista – que, em 2014, ascenderam a 820.811,78€.

u)           A AT não aceita a dedução fiscal desses encargos (juros) e promoveu, em consequência, a liquidação objeto do presente processo arbitral (IRC de 2014), com base no art. 23.º do CIRC.

FACTOS RELATIVOS À CORREÇÃO DA B... SA (886.426,41€)

v)            A B..., SA dedica-se à atividade no setor de transportes, especificamente no transporte rodoviário de mercadorias para entregas ao domicílio.

w)          A B... era totalmente detida por D..., SGPS, SA.

x)            Em Dezembro de 2010, a D... alienou 100% do capital da B..., SA à sociedade G..., SA (NIPC...) – entidade dominada a 100% pela Sociedade A..., SGPS, SA (aqui requerente), a qual, por seu turno é totalmente detida pelo fundo F...– Fundo de Capital de Risco.

y)            A G... foi constituída em Setembro de 2010 e o seu objeto era a prestação de serviços administrativos e de apoio a empresas de transporte.

z)            O F... é uma entidade de capital de risco, dedicando-se (em geral, através de sociedades por ele dominadas) à aquisição de participações de capital e controlo de sociedades, na mira de valorização do capital adquirido, por incremento da qualidade de gestão, e, consequentemente, da remuneração dos investidores.

aa)         A G..., SA para a consumação da compra da B..., financiou-se através de: i) Suprimentos concedidos pelo acionista A..., SGPS, SA, de 13,6 Milhões de Euros, à taxa de 15%/ano; ii) Empréstimos bancários (mutuados pela ...) de 23 milhões de euros, sendo que a tranche A, de 19,5 Milhões de euros, foi destinada à compra do capital social da B..., SA.

bb)         Em Setembro de 2011 (e com efeitos contabilísticos a 1/1/2011), a G... (sociedade incorporada) fundiu-se na B..., SA (sociedade incorporante), por transferência global do património da incorporada na incorporante – numa operação usualmente designada por fusão inversa ou invertida.

cc)          Após a fusão, a B..., SA (incorporante) assumiu a (i) totalidade das dívidas da G... e (ii) os encargos (juros) contraídos pela G... junto da Banca e do acionista – que, em 2014, ascenderam a 886.426,91€.

dd)         A AT não aceita a dedução fiscal desses encargos (juros) e promoveu, em consequência, a liquidação objeto do presente processo arbitral (IRC de 2014), com base no art. 23.º do CIRC.

 

2.2. Factos não provados

Não há factos com relevo para a apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pelas partes, no consenso destas (também em relação aos documentos, valores e datas dos pagamentos), na revogação parcial da requerida e confissão da requerente (factos provados k e l), nas informações oficiais e demais documentação constante do processo administrativo.

 

3. Matéria de direito

3.1. Questão a decidir

As questões a decidir nos presentes autos são as seguintes:

a)            Alegada falta (insuficiência) de fundamentação dos atos de liquidação de imposto e juros.

b)           Alegada preterição de formalidade essencial: falta de notificação do relatório final de inspeção tributária.

c)            Correção (esfera individual) da A... SGPS, SA (de 1.243.235,89€).

d)           Correção (na esfera individual) da B... SA (886.426,91€) e C..., SA (820.811,78€) – tratadas unitariamente, dada a similitude factual e jurídica do tema.

Por facilidade sistemática, cada tema constará de um capítulo autónomo da sentença – onde se reterão, por remissão, os factos relevantes, as posições e argumentos das partes, se refe¬rirão as leis e direito aplicável e a decisão do tribunal, perante todo o acervo factual e jurídico.

 

3.2. Alegada falta (insuficiência) de fundamentação dos atos de liquidação de imposto e juros lei aplicável

A requerente invoca, no RI, que a liquidação não está fundamentada, pois nesse documento não são explicitados os fundamentos, de facto e de direito, que justificariam o ato administrativo em matéria fiscal (liquidação do imposto e dos juros compensatórios) – nem se-quer existe uma remissão expressa ou implícita para a fundamentação anterior já entregue ao contribuinte; e tal seria legalmente exigível, segundo a tese da requerente. E quanto aos juros compensatórios, advoga-se ainda que não existe qualquer fundamentação, pois não se explicitam os seus fundamentos, mas apenas que decorre de recebimento indevido.

A requerida contrapõe dizendo, em síntese, que a fundamentação alicerça-se num exaustivo processo inspetivo, anterior ao ato de liquidação, que permite que o requerente conheça todos os factos e argumentos em que se estriba a posição da ATA, seja quanto ao valor do imposto, seja em relação aos juros (houve inspeções a cada uma das entidades do grupo, e a seguir inspeção interna à sociedade dominante, para lhe dar a conhecer as correções efetuadas na esfera individual de cada uma delas, bem como para promover a subsequente emissão de liquidações adicionais de IRC, no período de 2014, em cumprimento das regras do RETGS).

O tribunal decide no sentido de que não existe qualquer falta de fundamentação do ato de liquidação de IRC e de juros compensatórios.

A AT realizou processos de inspeção, onde analisou operações várias de cada entidade e, depois, cumprindo as regras do RETGS, efetuou inspeção à sociedade cúpula onde lhe dá a conhecer as correções a cada uma das entidades do grupo. Os relatórios inspetivos (fundamentação) são extensos e explanam, de forma organizada, clara, exaustiva e suficiente, quais os fundamentos e raciocínios (com documentos anexos) que presidem a cada uma das correções – e que determinam depois a liquidação de imposto e juros. Um destinatário médio, como o contribuinte, compreende, perfeitamente, o teor e fundamentos em causa neste processo. Comprova-o o teor da petição inicial, em que o requerente rebate os argumentos da fundamentação, em normal contraditório, sinal que os percebeu perfeitamente. Foram assim cumpridas as exigências de fundamentação descritas nos artigos 268.º da CRP, do art.º 77.º da LGT e do art.º 124 e 125.º do CPA.

Questão diversa, mas que ao tribunal também não merece censura, é a de saber se a liquidação do imposto e juros (melhor dito, o documento da liquidação de imposto e juros) tem de conter a fundamentação ou pelo menos indicá-la por remissão, sob pena desse incumprimento formal determinar a ilegalidade da liquidação por falta de fundamentação ou preterição de formalidade essencial. O tribunal entende que não existe qualquer ilegalidade, sustentando que o ato de liquidação adicional está fundamentado por se basear no relatório inspetivo, ainda que não lhe faça referencia expressa ou implícita – dado que se situa, não pode deixar de se situar, no respetivo quadro legal e fáctico, perfeitamente claro, esclarecedor e devidamente notificado. Ou seja, o contribuinte (requerente) sabe que aquela liquidação de imposto e juros decorre de uma fundamentação, em corolário de uma inspeção de que foi alvo (cfr. neste sentido, ac. STA de 9/5/2001, proc. 025832).

Não existe, outrossim, qualquer falta de fundamentação quanto aos juros compen¬sa¬tórios. O juro compensatório, por imposição legal, decorre do retardamento da liquidação por facto im-pu¬tável (culposo) do contribuinte (art.º 35.º da LGT). Ora, da fundamentação decorre que, na opinião da AT, houve um retardamento do imposto (IRC de 2014) por atos imputáveis à reque¬rente – e por isso, os juros compensatórios estão legal e suficientemente fundamentados.

 

3.3. Alegada preterição de formalidade essencial: falta de notificação do relatório final de inspeção tributária

O requerente invoca que não foi notificada do relatório inspetivo e sua fundamentação (fundamentos subjacentes à liquidação) – em violação do art. 62.º e 63.º do RCPIT, que implicaria, na sua ótica, a anulação do ato de liquidação impugnado, por preterição de formalidade legal e falta de fundamentação.

A requerida contrapõe dizendo, em síntese, que a ATA elaborou e notificou o contribuinte dos 3 relatórios inspetivos por correções individuais, às sociedades A..., B..., SA e C..., SA; que lhe foi dada a possibilidade de exercer, querendo, o direito de audição prévia (e que o fez); que depois foi efetuada inspeção interna, por causa do RETGS, que deu a conhecer à requerente as correções individuais realizadas na esfera individual de cada uma das sociedades; e que pela leitura do RI, se demonstra que a requerente tem perfeito e total conhecimento da liquidação e dos seus exatos fundamentos.

O tribunal decide no sentido de que não existe qualquer preterição de formalidade essencial, falta de fundamentação no caso em apreço; ou seja, não se verifica qualquer ilegalidade, ao contrário do apontado pela Requerente.

A própria requerente, em vários artigos do RI (art. 56.º a 76.º), confessa que recebeu e foi notificada e conheceu as inspeções individuais e relatórios finais a cada uma das sociedades do grupo; e que sabe e conhece a realização da ulterior inspeção interna, por força do RETGS – e conhece o relatório final inspetivo, que lhe foi notificado. Ou seja: a requerente obteve todas as fundamentações necessárias para conhecer os exatos fundamentos corretivos e para poder assim exercer, plena e eficazmente, os seus direitos de defesa.

 

3.4. Correções na A... (1.243.235,89€): gastos associados a rendimentos sujeitos a IRC (art. 23.º e 67.º do CIRC)

Este tema, com correções à matéria tributável de 1.243.235,89€ (e depois refletidas no ato impugnado) foi totalmente resolvido pelas partes, por (i) revogação parcial (por iniciativa da requerida) quanto ao valor de 1 milhão de euros (ii) e confissão de aceitação da correção, por parte da requerente, em relação à parte não revogada (no valor de 243.235,89€).

A Requerente aceita e confessa que não deveria levar a custo fiscal a quantia de 243.235,89€; e a ATA revogou a correção em relação a 1 milhão de euros, e só manteve a correção em 243.235,89€ - que a requerente aceitou e não contestou.

Donde, quanto a este tema não existe qualquer matéria em discussão entre as partes – e o tribunal, assim sendo, limita-se a reconhecer essa revogação e aceitação.

 

3.5. Correções na B..., SA e na C..., SA: gastos de financiamento, na sequência de fusão (art. 23.º do CIRC)

3.5.1. Questão a decidir

Como é aceite pelas partes, a questão que se coloca nos presentes autos prende-se apenas com o tratamento fiscal a dar aos juros e demais encargos suportados, em 2014, pela B..., SA e C..., SA, relativos aos empréstimos (de sócios e de terceiros [bancário]) contraídos em anos anteriores pelos seus sócios únicos (E... e G...) para a compra do capital dessas próprias entidades, e que ambas passaram a suportar diretamente (e assim ainda ocorreu em 2014) em virtude e por decorrência das fusões (invertidas), em 2011, com os seus acionistas E... e G... (os quais contraíram, originariamente, essas obrigações).

Na opinião da ATA, expressa na fundamentação da liquidação, esses juros e encargos não seriam fiscalmente dedutíveis, nos termos do art. 23.º do CIRC (na redação e numeração à data dos factos), porque sem ligação com a atividade da sociedade que depois deduz esses encargos.

Para a Requerente, ao invés, esses juros e encargos seriam fiscalmente dedutíveis, por preenchimento dos requisitos ínsitos no art. 23.º do CIRC.

Como decorre da fundamentação da liquidação (e dos demais documentos juntos ao processo), a questão a decidir não incide, nem sequer incidentalmente, sobre uma eventual correção do preço de transferência nos juros devidos ao acionista (art. 63.º do CIRC), nem com a aplicação da Cláusula Geral Anti abuso (art. 38.º, n.º 2, da LGT ou art. 73.º, n.º 10, do CIRC) por eventual enca¬deamento abusivo de operações com intuitos fiscais exclusivos ou preponderantes, em abuso de formas jurídicas (endividamento [e juros decorrentes] para compra de capital seguida de fusão de empresas, para que a entidade operacional lucrativa suporte esses encargos e diminua o seu lucro fiscal anual).

               

3.5.2. A lei aplicável

Segundo o art. 23.º do CIRC (na redação e numeração à data dos factos), consi¬de¬ram-se custos ou gastos:

“1. […] todos os gastos ou perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC”

Entre os quais,

2. c) De natureza financeira, tais como juros de capitais alheios aplicados na exploração […], gastos com operações de crédito […]”;

Por outro lado, com a fusão de empresas “extinguem-se as sociedades incorporadas […], transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante” (art. 112.º, al. a), do Código das Sociedades Comerciais).

 

3.5.3. Os argumentos das partes

A fundamentação da liquidação (e resposta da Requerida) invoca, em síntese, que os juros suportados pela C..., SA e B..., SA após a consumação das fusões (e por decorrência destas operações) relativos ao financiamento inicialmente contratado pela G..., SA e E..., SA diretamente para a aquisição do capital da C..., SA e B..., SA não se encontram enquadrados no art. 23.º do CIRC, dado que não foram gastos conexionados com a atividade desta empresa nem seriam aptos à realização ou manutenção de proveitos sujeitos a imposto: após as fusões já não financiam as aquisições das participações (e não são aplicados na exploração); teria de haver, em cada ano em que se registam os juros, um balanceamento entre os encargos financeiros suportados e os proveitos e existência do ativo; esses juros não estariam ligados com a atividade normal da requerente e o ativo associado não existe e não contribuiria futuramente para rendimentos tributáveis. E os escassos momentos temporais entre a constituição das sociedades veículo com vista à compra e suas ulteriores extinções por fusão (invertida) comprovariam essa falta de preenchimento dos requisitos do art. 23.º do CIRC.

O Requerente advoga, ao invés, que os juros suportados em 2014 pela C..., SA e B..., SA preenchem os requisitos do art. 23.º do CIRC, sendo por isso de qualificar como gasto fiscal. Os juros são suportados pela C..., SA e B..., SA no exercício da sua atividade; os empréstimos (e, consequentemente, os juros deles decorrentes), quando incorridos inicialmente (pela G..., SA e E... SA), foram aplicados na exploração e eram indispensáveis aos proveitos e manutenção da fonte produtora – e se o eram no momento inicial, terão de o ser para sempre, quaisquer que sejam as modificações ulteriores (mesmo com a fusão); a fusão, entre os seus efeitos normais, leva ao resultado económico e fiscal dos autos; a fusão é uma operação permitida pela lei comercial e fiscal e a ATA, na fundamentação do ato, não invoca o pretenso abuso da operação de fusão, seguida da aquisição, nos termos do art. 38.º, n.º 2, da LGT. A não-aceitação fiscal deste gasto implicaria uma violação da Diretiva das fusões (Diretiva 2009/133/CE do Conselho) que reconhece a neutralidade fiscal absoluta a essas operações de reestruturação empresarial.

 

3.5.4. Decisão

Os árbitros analisaram toda a retórica aduzida pelas partes (em todas as peças escritas e documentos apresentados ao longo do processo), bem como a argumentação e ponderação de decisões arbitrais anteriores sobre o tema – explanadas, aliás, pelas partes –, mas tendo sempre presente as (pequenas) particularidades do caso (“cada caso é um caso”).

Com efeito, várias decisões arbitrais (por exemplo, nos processos 14/2011-T e 87/2014-T) recusaram a dedução fiscal dos juros suportados pelas incorporantes pós fu¬são, relativos a financiamentos contraídos pela incorporada pré-fusão com vista à aqui¬sição do capital social da futura incorporante. Ao invés, existem muitas outras decisões arbitrais, por exemplo, nos processos 101/2013-T, 42/2015-T (aqui numa fusão não invertida, mas as considerações são iguais), 92/2015-T e 93/2015-T, 108/2015-T, 537/2016-T, 120/2018-T e 607/2018-T, 143/2018-T que se pronunciaram em sentido oposto, acei¬tan¬do a dedução destes encargos financeiros, por os considerarem ligados com os proveitos sujeitos a imposto.

Os árbitros ponderaram todos os argumentos das partes e o conteúdo de todas as decisões supra referidas e de¬cidiram no sentido da anulação da liquidação impugnada. Con¬sideraram que estes juros e encargos suportados pela Requerente preenchem os requisitos ínsitos no art. 23.º do CIRC para legitimar a sua dedutibilidade fiscal, com base nos argumentos a seguir explanados: (i) por adesão ao teor da decisão 537/2016-T que, com a devida vénia, reproduzem seguidamente; (ii) mas também tendo em conta considerações ulteriores, expostas após a citação do Acórdão 537/2016-T, que se prendem com a interpretação e aplicação da nova redação do art. 23.º do CIRC.

 

Início da transcrição do Acórdão n.º 537/2016-T – adaptada às circunstâncias factuais deste processo.

“Comecemos por QUATRO notas de enquadramento, totalmente pacíficas, que ajudam a recortar a decisão da causa.

Em primeiro lugar, e como já foi referido, o tema dos autos resume-se apenas à aplicação do art. 23.º do CIRC aos juros suportados em 2014 pela C..., SA e B..., SA, relativos aos empréstimos (de sócio e de terceiros) contraídos para a compra do capital da própria C..., SA e B..., SA e que ambas suportam em virtude e por de¬corrên¬cia da fusão com a sua acionista G... e E..., as quais contraíram originariamente essas dívidas.

Como segunda nota – relevante para a decisão – é necessário ter presente o teor do Acórdão do STA de 2/12/2011, proc. 0865/11 (num caso de cisão-fusão).

Esse aresto veio estabelecer que a noção fiscal de fusão (passível de neutralidade fiscal) é mais alargada do que a definição legal do CIRC que exigia, à época, o formalismo jurídico de atribuição aos respetivos sócios de títulos representativos do capital social da outra entidade. Há neutralidade fiscal na operação de fusão regulada no direito comercial, ainda que não envolva a atribuição aos sócios de títulos representativos de capital – como acontece, sinto-mati¬camente - entre outros casos, na situação de fusão invertida. Quer dizer: o STA equiparou em termos fiscais a fusão inversa e a fusão não inversa, reconhecendo a neutralidade fiscal de ambas as operações, ainda que não envolvam a atribuição de ações aos sócios.

Esta jurisprudência ilumina a decisão dos autos: é um dado assente que as fusões, invertidas ou não invertidas, possuem o mesmo regime jurídico, seja no âmbito do direito comercial, seja em matéria fiscal, nomeadamente ao nível do regime fiscal de neutralidade fiscal descrito no art. 73.º e ss. do CIRC. Ou seja, a operação de fusão descrita no direito comercial – seja invertida ou não – merece o mesmo tratamento e regime para o direito fiscal: quer no que tange à neutralidade fiscal (diferimento de tributação dos réditos associados a estas operações de fusão); quer, em geral, nas consequências tributárias, diretas ou indiretas, delas decorrentes.

Não há, por assim dizer, uma fusão de primeira – não inversa – com neutralidade fiscal e, em geral, aceitação fiscal da estatuição imposta pelo direito comercial; e uma fusão de segunda – a inversa – em que essas estatuições ou não se verificariam ou verificar-se-iam de forma mais casuística e excecional.

Nada disso: existe apenas a operação de fusão, englobando a invertida e não invertida, exatamente com o mesmo regime jurídico tributário, e com as mesmas e exatas motivações para as diversas consequências fiscais que lhe estão associadas.

Quer isto dizer, olhando para o caso dos autos, que a resposta legal é a mesma, quer exista ou não uma fusão invertida. O regime da aceitação fiscal dos juros em causa tem o mesmo enquadramento, considerações e solução, quer a fusão fosse não invertida (com a incorporação da C..., SA e B..., SA na G... e E...), quer no caso de fusão invertida escolhida pelas partes. Nem tem, sequer, de existir uma fundamentação acrescida dos requerentes para explicarem porque escolheram uma e não a outra. Isso entra na liberdade total das partes, que ao intérprete cabe respeitar, no pressuposto, evidentemente, de ocorrer uma verdadeira e real fusão – e isso é um dado assento no processo, pois ninguém o põe em causa.

A terceira nota tem que ver com o regime da fusão sob a perspetiva jurídica e do direito comercial. Uma fusão (invertida ou não) não se assemelha, em termos económicos, a uma liquidação de sociedades. Aqui, ocorre o desaparecimento jurídico e económico de uma sociedade, porque esgotou o seu objeto ou interesse societário.

Na fusão, ao invés, o desaparecimento jurídico não se associa à morte económica da empresa, que continua, embora reestruturada, na sociedade resultante da fusão, quer na perspetiva da sociedade (prossecução da atividade), quer na ótica dos sócios (igual empenho naquelas atividades). Extingue-se a sociedade incorporada, sem dúvida; mas transmitem-se todos os direitos e obrigações para a Sociedade incorporante, que prossegue a atividade da “falecida” (art. 112.º, al. a), do CSC). Há uma modificação jurídica, com continuidade económica (Ac. do STA de 13-04-2005, proferido no processo 01265/04 e Ac. do TCA-Sul de 17-04-2012, proferido no processo 04172/10, consultável em www.dgsi.pt).

A quarta nota – dado aceite pelas partes – tem que ver com a pacífica aceitação, expressa e implícita, da dedução destes encargos financeiros se não tivesse ocorrido a fusão, por cumprimento dos requisitos do art. 23.º do CIRC. Aqui, em 2010 e 2011 uma sociedade (G... e E...) para adquirir um ativo (capital social da C..., SA e B..., SA), como forma de exercício da sua atividade e perspetiva lucrativa, tem de se financiar junto de terceiros (banca e sócios), suportando, ao longo do tempo, os inerentes encargos financeiros anuais associados ao financiamento. Não se questiona – e cremos que bem – que previamente à fusão, na perspetiva da G... e E..., estávamos em presença de juros de capitais alheios aplicados na exploração (art. 23.º, n.º 1, al. c), do CIRC).

Pois bem:

A questão dos autos é assim a de saber se a fusão – invertida ou não – altera este estado de coisas; se os juros, outrora aceites em termos fiscais (de forma pacífica), deixam de o ser após a fusão, por incumprimento superveniente dos requisitos do art. 23.º, do CIRC (requisito geral da indispensabilidade e especial de aplicação na exploração).

A resposta, como o dissemos, vai no sentido da dedução fiscal desses juros, mesmo após a fusão, agora na esfera da Requerente, por três principais argumentos, a seguir explanados – e tendo presente as considerações anteriores.

O PRIMEIRO prende-se com a análise do teor literal art. 23.º, n.º 1 do CIRC [atual art. 23.º, n.º 2, al. c)]: a dedução dos encargos financeiros exige que os “juros de capitais alheios sejam aplicados na exploração”. E todos concordam que, no momento inicial, o crédito obtido (dos bancos e dos sócios) foi aplicado na exploração, com a aquisição da participação na Requerente, por parte da G..., SA e E..., SA – subsumindo-se, no exercício da sua atividade e prossecução do lucro.

Ocorre depois uma fusão, segundo as regras legais do direito comercial – fosse invertida ou não (como se viu, o padrão para o caso concreto é o mesmo). Com essa operação, não se pode dizer que os capitais alheios deixaram de ser aplicados (os financiamentos continuaram) e mantêm-se afetos à exploração, agora reestruturada por efeitos legais da fusão (transmissão dos direitos e obrigações para a sociedade incorporante). Ou seja: não ocorre um desvio do financiamento, num intuito abusivo, no sentido que serve-se agora o favorecimento de interesses extra empresariais, p. ex., em benefício de um sócio. Nada disso: o que ocorre é apenas a produção dos normais efeitos económicos da fusão, consentidos e impostos pelo direito comercial, e é impossível concluir que os efeitos dessa operação, seguindo os estritos ditames do direito comercial, redundam na tutela de interesses alheios ao interesse societário, apenas para beneficiar abusivamente terceiros da operação de fusão. Este resultado interpretativo seria uma verdadeira contradição nos seus termos, porque equivaleria a admitir que o direito comercial, ao regular a fusão (invertida ou não) permitiria resultados que violariam a tutela dos interesses acautelados por essa disciplina jurídica.

Em suma: se os juros eram fiscalmente aceites previamente à fusão (porque os capitais alheios estavam aplicados na exploração), então também o serão após a fusão (invertida ou não), que se limitou a seguir as regras do direito comercial, de transmissão de todos os direitos e obrigações da incorporada, porque após a fusão, continuam a ser considerados juros de capitais alheios aplicados na exploração.

O SEGUNDO argumento pondera a situação similar (idêntica aos autos) em que, havendo ou não uma fusão superveniente, a Sociedade decidisse abdicar do objeto do investimento (por não ser rentável), mas tivesse evidentemente de manter o financiamento que proporcionou os meios financeiros para o investimento.

Suponhamos que uma empresa X compra uma máquina de valor elevado para prosseguir uma nova atividade – e financia-se junto da Banca para a comprar e que pagará 100 mil euros de juros durante 10 anos (e no final terá de amortizar o capital). Imagine-se agora que a empresa conclui, no final do 4º ano, que essa atividade não é rentável, pois não há mercado para os produtos produzidos pela máquina, pelo que decide abandonar a produção e a máquina é desligada e “abandonada”. Claro que terá de continuar a pagar os juros anuais de 100 mil euros. Mas será que esses juros, a partir do 5º ano, não serão dedutíveis ao rendimento fiscal, por se advogar que não são aplicados na exploração ou que não são indispensáveis para os proveitos ou manutenção da fonte produtora?

Ora, aqueles encargos manter-se-ão dedutíveis, não obstante o desaparecimento – por via de uma decisão empresarial – do objeto em que os capitais alheios que remuneram foram aplicados. O capital alheio foi aplicado na exploração no momento inicial – dando origem ao investimento produtivo. E isso é suficiente e bastante para legitimar a dedução fiscal dos juros daí decorrentes, independentemente das vicissitudes empresariais futuras desse investimento. Os encargos financeiros continuam a ser dedutíveis, ainda que o investimento se tenha gorado ou se tenha revelado como um mau negócio ou uma decisão empresarial infrutífera – pois, e é isso que importa, os capitais alheios estiveram ligados a um investimento que no momento inicial foi aplicado na exploração.

E se isto é assim, independentemente da ocorrência de qualquer fusão (mas no desinvestimento económico), sê-lo-á ainda com mais propriedade em caso de fusão, em que, como se viu, não há uma decisão subjetiva de qualquer desinvestimento, mas apenas a objetiva transmissão de direitos e obrigações, por efeito legal desse instituto do direito comercial.

Claro que as considerações anteriores poderiam ser confrontadas – em termos fiscais – e este é o TERCEIRO argumento, com a existência de um encadeamento de operações para propositadamente proporcionar um resultado fiscal indesejado, de abusiva poupança de impostos, traduzido numa aquisição de partes sociais com utilização de financiamento, imediatamente seguida de fusão (invertida ou não) com o propósito de diminuir abusivamente os impostos a pagar nos anos seguintes pela sociedade operacional e lucrativa (por efeito dos encargos financeiros que haviam sido suportados para a sua aquisição). Não estamos a dizer que esse abuso ocorreu no caso dos autos. O que importa frisar é que a AT, na fundamentação do ato tributário, não convocou esse arsenal argumentativo para justificar a liquidação, em substituição ou cumulativamente com o art. 23.º do CIRC. Apesar de desconfiar do encadeamento temporal e cronológico das operações e da “poupança fiscal” assegurada com a dedução dos juros do financiamento da aquisição da C..., SA e B..., SA sobre os proveitos operacionais das mesmas empresas (pós fusão), não sustentou a correção fiscal no art. 38.º, n.º 2, da LGT ou no art. 73.º, n.º 10, do CIRC ou sequer no art. 63.º do CIRC (invocando uma quantificação excessiva dos juros entre sociedades em relações especiais). E o julgador, no contencioso fiscal, tem de se debruçar sobre o objeto do processo, tal como recortado pela fundamentação, sob pena de ilegal fundamentação a posteriori e intromissão no poder dever do poder executivo.

E, para finalizar, o art. 23.º do CIRC não se reconduz a uma norma antiabuso, que pudesse ser utilizada em substituição do art. 38.º, n.º 2, da LGT, art. 73.º, n.º 10 do CIRC ou art. 63.º do CIRC. Cada norma tem um conteúdo prescritivo diverso – e o art. 23.º do CIRC não funciona como uma norma anti abuso substitutiva daqueles outros preceitos. O art. 23.º do CIRC limita o seu raio de ação à não dedução fiscal dos gastos assim contabilizados, mas que, quando contraídos (ou os investimentos efetuados) não se inserem no interesse económico da Sociedade, mas servem interesses extra societários, dos administradores ou de terceiros. Suponhamos que uma Sociedade suporta os juros de um financiamento por si contraído para efetuar um investimento apenas em benefício privado de um sócio ou administrador (e isso não é reconduzido a um rendimento em espécie da pessoa singular). Ou que se financia na banca para entregar essa quantia financeira a terceiro, sem qualquer contrapartida, fora do grupo ou fora do seu objeto social. Nesses casos, os juros que vier a suportar com esses fundos não são fiscalmente dedutíveis porque não foram (ab initio e para sempre) aplicados na exploração da Sociedade.

O caso dos autos é totalmente diverso. Os capitais alheios foram aplicados na exploração; e caso se pretendesse invocar que todas as operações se reconduziriam a um abusivo esquema de encadeamento de operações, ainda que lícitas sob o ponto de vista civil, para obter-se um ganho fiscal – o que nalguns passos da inspeção é isso o que fica subentendido – então a fundamentação não se teria de socorrer do instituto do art. 23.º do CIRC mas, como se explicou já, de outros institutos à mercê da lei fiscal para tentar alcançar tal resultado corretivo.

*

A argumentação exposta basta para se proceder à anulação da liquidação im¬pugna¬da. Não é assim necessário explorar os demais argumentos expostos pela impu¬gnan¬te (repercussão da neutralidade fiscal da operação de fusão sobre a dedução dos encargos financeiros decorrentes de empréstimos transmitidos por via de fusão neutra) e que decorrem dos demais processos judiciais (assistência financeira).

Fim da citação do processo 537/2016-T

*

A adesão ao teor do Acórdão 537/2016-T acabada de efetuar obriga a que se efetue consideração adicional, tendo presente o caso dos autos – onde se reforça, ainda mais, a decisão de anulação da liquidação impugnada.

A redação do art. 23.º do CIRC foi parcialmente alterada, com efeitos a 1/1/2014 – e no caso dos autos sindica-se a liquidação do ano de 2014, quando naqueles outros arestos (e também no citado) se reportam a exercícios anteriores, perante a interpretação e aplicação da lei antiga.

A lei nova (nova redação do art. 23.º do CIRC) não altera substancialmente os dados da questão e a definição da noção de gasto fiscal.

Desde logo, porque o anterior art. 23.º, n.º 1, al. c) é idêntico ao atual n.º 2, al. c), no sentido da dedução fiscal dos encargos “de natureza financeira, tais como juros de capitais alheios aplicados na exploração” – o que sucede manifestamente nos casos dos autos e nos juros relativos aos anos anteriores.

E depois, porque a nova redação do art. 23.º do CIRC retirou o vocábulo “indispensabilidade” da noção de gasto fiscal, no sentido de que agora, mas não outrora, não se intima uma relação de indispensabilidade entre o gasto e o proveito associado; ou seja, se antes a dedução dos encargos financeiros em causa pressupunha uma certa relação causal com os proveitos ou manutenção da fonte produtora, exigindo-se uma interpretação lógica e teleológica do vocábulo indispensabilidade; agora, ao invés, perante a ausência desse vocábulo, é evidente que a lei quer acolher todos os gastos (no sentido da qualificação como gastos fiscais), também os financeiros, suportados no exercício da sua atividade, no sentido de que deles poderão brotar rendimentos sujeitos e imposto. E é isso o que se verifica in casu: aqueles gastos foram suportados para a aquisição de ativos (partes de capital) como forma do exercício de atividade da empresa. Em suma: se um gasto era dedutível perante a anterior redação do art. 23.º do CIRC, também o é perante a nova redação, como sucede no caso dos autos, já que a lei nova se limitou a ser mais abrangente e esclarecedora quanto à aceitação da qualificação de gastos contabilísticos como gastos fiscais.

Por fim:

A Requerida solicitou a suspensão da instância (com oposição da Requerente), com imediato reenvio prejudicial do presente processo para o Tribunal de Justiça da União Europeia, na medida em que o tema contende com a aplicação da diretiva das fusões (Diretiva 2009/133/CE do Conselho), tal como foi, aliás, indicado pelo Requerente na sua Petição inicial, e seguindo o decidido noutro caso arbitral com matéria similar (dedução dos juros após fusão invertida), a saber no proc. 521/2017-T e 144/2018-T.

O Tribunal decidiu, como se viu, pela anulação da liquidação – e neste segmento decisório, a Sentença nunca contende com a hipotética violação da norma e direito comunitário. Advogou-se uma interpretação do art. 23.º do CIRC que não cria distorções fiscais à operação de fusão com neutralidade fiscal: o juro era dedutível pré fusão e continua a ser fiscalmente dedutível após a fusão (tal como seria se não ocorresse esta operação de reestruturação). Logo, a interpretação do art. 23.º do CIRC, como preconizada nesta sentença arbitral, nunca pode redundar num obstáculo fiscal à neutralidade fiscal da fusão, qualquer que seja o sentido e alcance dessa neutralidade fiscal indicado pelo Direito Comunitário. Improcede assim o pedido de reenvio prejudicial.

 

4. Quanto aos juros indemnizatórios

O art. 43.º, n.º 1, da LGT dispõe que são devidos juros indemnizatórios a favor do contribuinte quando se determine em impugnação judicial (e a ação arbitral é incluída nesse ditame legal, por coerência e unidade do sistema jurídico) que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento de dívida tributária superior à devida.

Ora, é isso o que sucede nos autos. A AT, ao produzir a liquidação adicional de IRC – agora anulada – implicou um pagamento de imposto pelo contribuinte, afinal indevido e exigido apenas, por erro imputável aos serviços da AT (que efetuou uma liquidação de imposto ilegal).

Donde, preenchendo-se os requisitos do art. 43.º da LGT, a AT tem de proceder ao pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, desde o momento do pagamento pelo contribuinte até integral devolução ao contribuinte do imposto por ele pago (cfr. também art. 24.º do RJAT e art. 100.º da LGT).

 

5. Decisão

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a.            Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação impugnada de IRC e Juros compensatórios e de mora de 2014, no valor de € 172.646,01 (n.º 2018...; 2017...; 2017..., acerto de contas 2018...)

E, em consequência:

b.            Ordenar a devolução à requerente do IRC e juros de 2014 por ela já pago (€ 172.646,01) – com exceção da parte do valor da liquidação e juros associado ou decorrente da correção à matéria coletável de 243.235,89€ (ponto 3.4 supra);

c.            Condenar a AT a pagar juros indemnizatórios à Requerente, à taxa legal, sobre a quantia referida no ponto anterior, desde o momento do pagamento (18/6/2018) até integral reembolso.

 

6. Valor do processo

De harmonia com o disposto no art. 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 172.646,01€

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 25 de Junho de 2019

 

Os Árbitros

Carlos Fernandes Cadilha (árbitro Presidente)

Tomás Cantista Tavares (árbitro Vogal)

Jorge Carita (com declaração de voto de vencido)

 

 

(Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131º nº 5 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º nº 1 alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária)

 

 

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO

Com todo o respeito pela posição que saiu vencedora neste Tribunal Arbitral Coletivo, voto vencido a presente Decisão, como já o fiz em anteriores processos em que estão em causa os mesmos factos e a mesma questão de direito, o que faço, nos moldes já utilizados, entre outros, no Procº. nº. 143/2018-T, que também remete para idêntico voto proferido no Procº. nº. 120/201-T, que desde já transcrevo.

“Votei vencido, porque os argumentos para dar suporte à tese da não indispensabilidade dos custos referentes ao preço que uma sociedade paga para se adquirir a si própria, não me convenceram.

 Mas revejo-me na primeira onda de Decisões Arbitrais (Proc. 14/2011-T, 87/2014-T) e do mesmo modo nos votos de vencido mais recentes (Proc. nº. 92/2015-T, 93/2015-T e 88/2016-T) que não conseguiram vislumbrar a absoluta indispensabilidade de tais gastos, suportados relativamente a um activo, a propriedade dela própria, infelizmente desaparecido aquando da fusão face à sua própria natureza.

 Torna-se evidente que em todas estas decisões participaram dos melhores especialistas em direito fiscal actualmente em colaboração com o CAAD.

Não consigo compreender que numa empresa que revelava no exercício de 2008 modestos custos financeiros mensais, passe, após uma operação de fusão invertida de um grupo (para além de tudo o que foi feito antes para ali se chegar), a suportar quase 10 milhões de euros no primeiro ano, que a Autoridade Tributária tem que continuar a aceitar como dedutíveis para efeitos fiscais, nos anos seguintes e no que diz respeito a 2012, face a esta decisão do Tribunal.

É notável a constatação da evolução do lucro tributável da Requerente antes da fusão e depois da fusão, como bem consta do RIT e que aqui se transcreve:

Mat Colectável 2005       4.761.972,91 €

Mat Colectável 2006       8.843.208,32 €

Mat Colectável 2007       10.369.376,60 €

Mat Colectável 2008       7.645.442,00 €

Mat Colectável 2009       234.135,10 €

 

E pagar os juros devidos pelos empréstimos contraídos pela “mãe” para comprar a “filha” e aceitar fiscalmente como custo da filha, é tal e qual o mesmo que comprar matéria prima para fabricar e vender sucatas e desperdícios metálicos!!!

 Tudo se passa, efectivamente, como se a actividade da Requerente fosse a sua própria aquisição, como diz a AT noutros processos em que está em causa igual situação, ou melhor, os custos “dizem respeito à sua Auto-aquisição”.

E toda a gente sabe que isto é mesmo assim e que é próprio, é inerente a qualquer uma aquisição de LEVERAGED BUYOUT (LBO), que constitui um mecanismo utilizado para tornar custos inadmissíveis em eficiência fiscal. (Não é preciso ir pela aplicação do CGAA, bastava não aceitar estes juros como custo).

 E também não se diga que o caráter de indispensabilidade dos custos, deve ser aferido quando a dívida é contraída, esquecendo por completo o momento em que os juros são efectivamente suportados (adeus princípio da especialização dos exercícios, e para já não falar do sempre necessário nexo de causalidade entre custos e proveitos).

Efetivamente, tenho dificuldade em aceitar que os juros contraídos por uma sociedade para adquirir outra sociedade na qual ela própria se veio a incorporar, possam vir a ser aceites para efeitos fiscais.

E, se não tenho dúvidas de que no momento em que a dívida foi contraída os respectivos encargos eram um custo para efeitos fiscais, já tenho dúvidas que o possam continuar a ser após a fusão (invertida) e que ainda para mais que haja quem entenda que se o eram nesse momento, em que foram contraídos “terão que o ser para sempre…” (posição da Requerente no Proc. n.º 88/2016-T, pág. 7), independentemente das mudanças que ocorrerem, incluindo a fusão, ainda para mais invertida (ninguém dúvida que a fusão é uma operação prevista na lei e não está aqui em causa a aplicação de uma CGAA, mas sim a aplicação do art.º 23 do CIRC).

Como é que se pode referir que “… os gastos com juros em questão, correspondem a capitais alheios que foram aplicados na exploração da entidade que os suporta” (Proc. n.º 88/2016-T, pág. 9), quando eles serviram para que terceiros adquirissem precisamente a sociedade que actualmente os suporta.

Custa-me a compreender!!! Confesso.

Seria o mesmo que no âmbito de uma reestruturação societária, abrangida pelos benefícios fiscais no art.º 60.º do Estatutos dos Benefícios Fiscais, da qual constam uma fusão invertida, depois das isenções de IMT, IS, etc., ainda se viessem a considerar os juros de um idêntico endividamento, como custo fiscal da sociedade filha, que incorpora a mãe que a comprou.

Como é que se afirma que os capitais alheios foram aplicados na exploração pela sociedade incorporante, quando ela não comprou o capital social de qualquer outra sociedade!!!

Diz-se que importa averiguar “… a afectação efectiva e concreta do financiamento de que os juros suportados são a remuneração ou, por outras palavras importa verificar o destino ou uso dos fundos obtidos em relação aos quais o sujeito passivo pretende deduzir fiscalmente, …, os juros e demais encargos associados que suportou.” (Decisão citada, pág. 11/12)

 Mas qual é a dúvida?

 Não serviram os financiamentos para pagar o preço de aquisição da Requerente por parte da sociedade que nela se veio a incorporar. Os juros decorrem do endividamento de terceiros, tendo a dívida sido contraída antes da fusão.

 Desse modo, a sociedade está a pagar aos seus próprios accionistas (ou parte deles, dependendo da relação de troca de fusão) o preço de aquisição das acções dela própria.

Nos processos do CAAD que analisei e que estão escalpelizados na presente Decisão, não posso, por isso, deixar de subscrever a Declaração de Voto subscrito pelo Dr. António Brás Carlos (Proc. n.º 88/2016-T), nomeadamente quando ele manifesta a sua discordância relativamente à tese do prolongamento da existência da sociedade incorporante.

Por seu turno, a síntese factual ali efectuada deixa a nu o propósito de toda a operação, colocando naturalmente em causa que os juros suportados possam continuar a ter relevância fiscal no período pós-fusão.

Categórico o ponto 8 desta declaração de voto, que aqui transcrevo, com a devida vénia:

“8. Todos os passos da operação estão inseridos na mesma “unidade de intenção e ação” e são, desde o início, unicamente dirigidos ao objectivo referido no número anterior. Objetivo esse estranho ao interesse empresarial da Requerente, não sendo o financiamento e o pagamento dos concomitantes encargos necessários à sua atividade, nem indispensáveis para a prossecução do seu interesse empresarial específico concretizado na produção dos seus rendimentos sujeitos a imposto ou na manutenção da sua fonte geradora. A obrigação de pagamento dos encargos em análise nunca foi, desde a primeira hora, contraída no interesse empresarial da Requerente, sendo para mim claro que não poderia, após a fusão, passar a considerar-se que tais financiamentos eram para si indispensáveis para efeitos do nº 1 do artigo 23º do CIRC.”

Razão tem o Dr. António Brás Carlos quando refere em síntese final (ponto 10) que a decisão ali em causa naquele processo não respeita, antes contrariando ostensivamente, a jurisprudência dos Tribunais Superiores (STA/TCA).

“10. Em consequência, tendo presente o acima referido, os encargos respeitantes àqueles empréstimos, suportados pela Requerente, não preenchem o requisito da indispensabilidade a que se refere o nº 1 do artigo 23º do CIRC, porque, em síntese:

a) Não respeitam à actividade por si desenvolvida (Ac. STA, proc. 171/11);

b) Os gastos correspondentes aos juros suportados por uma sociedade incorporante em virtude da aquisição de capitais alheios por parte da sociedade incorporada para adquirir 100% das ações da primeira, não são indispensáveis para esta sociedade (incorporante), porque não foram constituídos no seu interesse empresarial, não sendo, assim, necessárias para a prossecução do seu escopo societário (Ac. STA, proc. 164/12 e Acs. TCA-Sul, proc. nº 5327/12 e proc. nº 8137/14);

c) Não existe qualquer nexo causal entre aqueles gastos e os seus proveitos ou ganhos, explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica (Ac. TCA-Sul, proc. nº 6754/13);”

Importa, igualmente, ter em conta neste contexto o Voto de Vencido do Prof. João Menezes Leitão nos Processos n.ºs 92/2015-t e 93/2015-T.

 Aqui se reitera a referência à jurisprudência dos Tribunais Tributários que consagram que “os custos (…) não podem deixar de respeitar, desde logo, à própria sociedade contribuinte. Ou seja, para que determinada verba seja considerada custo daquela é necessário que a actividade respectiva seja por ela própria desenvolvida, que não por outras sociedades” (Acórdão do STA de 30.05.2012, Proc. 0171/11).

É por isso vasta a análise da jurisprudência que fazendo uso da leitura correcta do princípio da indispensabilidade de custos, leva a que da sua aplicação resulta a não indispensabilidade daqueles que em tais Decisões estão em causa (92/2015-T e 93/2015-T)

 “… que esses gastos não respeitam à actividade desenvolvida pela própria sociedade contribuinte, carecem de relação com a actividade prosseguida pelo sujeito passivo, não foram incorridos no interesse da empresa, na prossecução das respectivas actividades, são estranhos à actividade da empresa, não é possível descortinar neles qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos, explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica, foram incorridos para além do objectivo social, ou seja, na prossecução de outro interesse que não o empresarial.” (sublinhado meu). Será que não chega!!!

Também tenho que concordar com o Prof. Menezes Leitão quando ele refere que:

“… assumir os indicados gastos de financiamento a Requerente fica obrigada a desviar recursos extraídos do seu património, que deveriam ser destinados à prossecução da sua actividade e à realização do seu objecto social, para o pagamento da dívida e dos encargos financeiros respeitantes à aquisição das participações sociais no seu capital por outrem.” (pág. 62 e 63 da Decisão)

 Com aplicação ipis verbis ao caso nos autos!!!

 E se a empresa não tiver suporte financeiro para suportar encargos desse montante (juros de milhões) e entrar em processo de insolvência?!!

 “Sendo assim, os referidos custos financeiras não têm enquadramento na definição de custos e perdas (gastos) para efeitos de determinação do lucro tributável, uma vez que a assunção dos encargos em causa foi determinada por motivações empresariais no âmbito de uma política de interesses particulares ditada pelos responsáveis das sociedades interligadas e que só a eles diz respeito, e, nessa conformidade, tais custos não devem ser havidos por indispensáveis, em harmonia com o estatuído no art. 23° do CIRC”.

Razão pela qual não posso acompanhar a douta decisão proferida.

O bem fundado Relatório da Autoridade Tributária merecia melhor destino.”

 

Finalmente, umas pequenas notas sobre o texto específico da Decisão proferida neste Processo.

 

i).            Na alínea t) do Probatório, que se repete na alínea cc), está apenas dado como provada a transmissão do passivo, sem qualquer referência à transmissão do ativo, sendo que se mais tarde se invoca que tudo isto é muito próprio da fusão, então pela fusão “extinguiram-se as sociedades incorporadas […], transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante” (art.º 112º, al. C) do Código das Sociedades Comerciais. (com sublinhado nosso)

Por isso, não vejo, como não dar igualmente como provado que os direitos se transmitem igualmente, mas para terceiros, que não a Requerente.

Poderia, por exemplo, concluir a parte final desta alínea i) com o seguinte:

“, sem que os ativos lhe tenham sido transmitidos.”

Então, provavelmente, neste caso não estamos perante uma fusão, porque os Direitos não foram transmitidos para a sociedade incorporante, só as Obrigações.

 

ii).           Na pág. 14, 1.º parágrafo, depois de se referir que:

“Extingue-se a sociedade incorporada, sem dúvida; mas transmitem-se todos os direitos e obrigações para a Sociedade incorporante, que prossegue a atividade da “falecida”, não corresponde integralmente à realidade, pelas razões que já se referiu em i). desta Declaração.

 

 

Primeiro, porque se transferem todas as obrigações, mas não todos os direitos (as ações e os direitos que elas representam vão para terceiros e não são transferidos para a Requerente).

Segundo, porque a sociedade incorporada deixa de desenvolver a atividade da incorporante.

 

iii).          Quando se diz no pág. 14, 2.º parágrafo que os juros foram aplicados na exploração, importa considerar que após a fusão a exploração não é a mesma.

 

iv).         O exemplo dado relativamente à máquina não ajuda a reforçar a minha modesta posição relativamente a este assunto. Senão vejamos.

 

Os juros de um empréstimo destinado a comprar uma máquina que depois é “abandonada”.

Esta situação é completamente diferente daquela que acontece no nosso caso.

Aqui, as ações da Requerente, não desaparecem, foram transmitidas a terceiros.

 

Ou seja, há uma terceira entidade que vai beneficiar no futuro da distribuição de dividendos da Requerente, ou vai obter uma mais-valia quando as revender.

 

As ações não foram “abandonados”.

 

Estão até em boas mãos e vão ser muito proveitosas.

 

Não foram “desligadas”.

 

Estão bem vivas e valiosas.

A aceitar-se esta dedutibilidade fiscal, poderíamos atingir, no final, uma situação como esta:

 

Haverá uma accionista única da Requerente, mas é a Requerente que paga os seguintes juros:

 

a)            Ao Banco que financiou a sociedade incorporada para que ela própria fosse comprada;

b)           Deixa de pagar a si própria, porque incorpora a sociedade que era credora desses juros, os juros dos suprimentos;

c)            Ao Banco que financiou a sua acionista única para ocorrer ao seu aumento de capital social.

 

Razões estas pelas quais, não posso acompanhar a douta decisão proferida no âmbito deste processo., salvaguardando o que vem decidido nos pontos 3.2, 3.3 e 3.4.

 

(Jorge Carita)