Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 608/2018-T
Data da decisão: 2019-06-25  IVA  
Valor do pedido: € 6.170,73
Tema: IVA – Inversão do Sujeito Passivo.
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DECISÃO ARBITRAL

 

O Árbitro Marisa Almeida Araújo, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar este Tribunal Arbitral Singular, toma a seguinte,

 

I – RELATÓRIO

A..., LDA., (adiante designada por “Requerente”), com sede na ..., n.º ... – ..., ...-... Porto, titular do Número Único de Matrícula na Conservatória do Registo Comercial e de Identificação de Pessoa Coletiva ... veio, ao abrigo do art. 2.º n.º 1, al. a) e dos arts. 10.º e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo art. 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro (doravante abreviadamente designado “RJAT”) e dos arts. 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, apresentar pedido de pronúncia arbitral para que seja anulada a demonstração da liquidação de IVA, do período de 2017/03T, com o n.º 2018..., no montante total de € 46.042,32 e a sua substituição por outra que reembolse o montante em falta de € 6.170,73.

 

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “AT” ou “Requerida”).

 O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) a 04/12/2018 e automaticamente notificado à Requerida nos termos regulamentares.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 6.º e da al. b) do n.º 1 do art. 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redacção introduzida pelo art. 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular a signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo legal.

Em 24/01/2018, as Partes foram devidamente notificadas, não tendo manifestado, nos termos e prazo legais, vontade de recusar a designação do árbitro (art. 11.º, n.º 1, al. a) e b) do Regime Jurídico de Arbitragem Tributária (RJAT), conjugado com os arts 6.º e 7.º do Código Deontológico).

Em conformidade com o preceituado na al. c), do n.º 1, do art. 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 13/02/2018.

Devidamente notificada, a Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu a improcedência do pedido e juntou cópia do processo administrativo.

Foi dispensada a reunião a que alude o art. 18.º do RJAT e, considerando a posição das partes já vertida nas respectivas peças, a ausência de outra prova para além da documental junta aos autos.

As partes não alegaram.

 

A Requerente sustentou o seu pedido, sumariamente, alegando que,

1.            Submeteu declaração periódica de IVA referente ao período de 2017/03T tendo solicitado o reembolso n.º ... no valor de € 61.820,15; foram efectuadas, no âmbito da inspecção tributária a que a Requerente foi sujeita correcções ao IRC do período de 2016 e correcções ao período em causa no montante de € 15.777,83.

2.            A Requerente foi notificada do relatório de inspecção a 21/12/2017 e da demonstração de liquidação de IVA n.º 2018 ... que apurou um reembolso de IVA no aludido período de € 46.042,32.

3.            A Requerente apresentou reclamação graciosa que foi indeferida.

4.            Em causa está, segundo a Requerente, o entendimento da Requerida quanto à factura n.º 4 emitida a 21/03/2017 pelo fornecedor B..., Lda. no montante de € 33.000,00 (IVA incluído) pelo fornecimento de bens e serviços descritos na proposta daquele fornecedor n.º ... ..., relativa à aquisição de serviços, para efeitos da aplicação da alínea j) do n.º 1 do art. 2.º do CIVA que, a AT, entende que devia ter sido aplicada a inversão do sujeito passivo.

5.            Interpretação que a Requente não acompanha.

6.            A AT entende, segundo a Requerente, que esta deduziu indevidamente o IVA constante da aludida factura no valor de € 6.170,73, nos termos do n.º 8 do art. 19.º do CIVA.

7.            A Requerente tem, não obstante, outro entendimento, interpretando para efeitos da alínea j) do n.º 1 do art. 2.º do CIVA socorrendo-se da interpretação, alegadamente, do Ofício-Circulado n.º 30 101, de 24 de maio de 2007, segundo o qual se “consideram serviços de construção civil todos os que tenham por objecto a realização de uma obra (…)”.

8.            Entendendo a Requerente que, sendo o que está em causa é o fornecimento e montagem de aparelhos de som, imagem e comunicações, não implica qualquer processo construtivo.

9.            Não havendo qualquer processo construtivo, segundo a Requerente, já que as instalações eléctricas em causa já estavam efectuadas e, para além disso, os aparelhos não fazem parte integrante do imóvel.

10.          Concluindo, desta forma, que o fornecimento e montagem de equipamentos de som, vídeo, imagem e comunicações não constituem serviços de construção civil pugnando, em conformidade, pela anulação da demonstração da liquidação de IVA referida.

11.          Sem prejuízo, a Requerente invoca ainda que mesmo que, mesmo sendo serviços de construção civil, entende que não há qualquer prejuízo já que o imposto foi liquidado e entregue ao Estado pelo que sempre estaria em causa a neutralidade fiscal, bem como do princípio da igualdade.

12.          Termina com o pedido de pronuncia arbitral e condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios.

 

Por sua vez, a Requerida, sustenta a sua posição, sumariamente, alegando que,

1.            A Requerente foi objeto da ação inspetiva credenciada pelas ordens de serviço n.º 012017... e 012017..., da qual resultaram, entre outras, correções em sede de IVA, decorrentes de IVA indevidamente deduzido, no período de 2017/03T, no valor de € 15.777,83.

2.            A ação inspetiva foi desencadeada na sequência de um pedido de reembolso, para o período de 2017/03T e das conclusões apuradas, segundo a Requerida, e no que se refere apenas ao peticionado, uma vez que a Requerente apenas põe em causa uma correção verificou-se a existência de uma fatura emitida à Requerente, de serviços prestados de construção civil pela empresa "B..., Lda.", NIPC..., cujo IVA, no valor de € 6.170,73 que foi, segundo a AT, indevidamente deduzido, por se tratar de IVA indevidamente liquidado, nos termos da alínea j) do n.º 1 do art. 2.° do CIVA.

3.            A 2018/05/2017 foi deduzida reclamação graciosa da liquidação supra identificada de IVA decorrente de correções apuradas pelos Serviços de Inspeção Tributária, referentes ao período de 2017/03T, no valor de € 15.777,83.

4.            Das quais resultou o indeferimento parcial do reembolso solicitado de € 61.820, 15, para o valor de € 46.042,32.

5.            A Requerida entende que, quanto à matéria sub judice o Ofício Circulado n.º 30101, de 2007.05.24 da DSIVA, no ponto 1.2, é explicito ao referir: “para que haja inversão do sujeito passivo é necessário que, cumulativamente:

a) se esteja na presença de aquisição de serviços de construção civil;

b) o adquirente seja sujeito passivo de IVA em Portugal e aqui pratique operações que confiram, total ou parcialmente, o direito à dedução do IVA”. Mas, refere, ainda que resulta do mesmo Ofício-Circulado que: “A mera transmissão de bens (sem instalação ou montagem por parte ou por conta de quem os forneceu) não releva para efeitos da regra de inversão (ponto 1.5.1). A entrega de bens, com montagem ou instalação na obra, considera-se abrangida pela regra de inversão, desde que se trate de entregas no âmbito de trabalhos contemplados pela Portaria nº 19/2004, de 10 de janeiro. Excluem-se da regra de inversão os bens que, inequivocamente, tenham a qualidade de bens imóveis, isto é, bens que não estejam ligados materialmente ao bem imóvel com caráter de permanência (ponto 1.5.3).

6.            Segundo a Requerida do que foi possível aferir face ao descritivo da proposta está em causa, nomeadamente, a instalação de sistemas de controlo de iluminação automatizados e personalizados, sistemas de vídeo vigilância, segurança, automação de portas de correr duplas, concluindo que as mesmas preenchem aqueles requisitos. Tais equipamentos, ou parte deles, segundo a AT, são montados ou instalados nas paredes, chão ou tetos do imóvel através dos mais variados meios, pelos técnicos certificados, com recurso a serviços de construção civil – diga-se no mínimo com recurso a furação e fixação ao imóvel e mesmo que inseridos em condutas já existentes para o efeito, sendo trabalhos, segundo a Requerida, referidos na 4.ª e 5.ª categoria da Portaria 19/2004 de 10/01/2004. E a sua utilização está mesmo dependente da correta instalação, isto é implementação duma dada estrutura fixa, com carácter de permanência, independentemente de poderem ser removidos e levados para outro local, não pode, para este fim, ser relevante, uma vez que, também, são necessários serviços de construção civil para os retirarem.

7.            Contrariamente ao alegado pelo Requerente, segundo a Requerida, não há contrariedade das correções face às orientações genéricas divulgadas pela AT, o enquadramento efetuado em sede de inspeção Tributária, é também o que se encontra plasmado nas várias instruções emitidas quanto a esta matéria, nomeadamente Informação Vinculativa nº A 100 2007957, invocada pelo própria Requerente: "6. Quando está em causa um sistema integrado de ar condicionado, composto por vários aparelhos, funcionando em conjunto, fazendo parte integrante do imóvel, normalmente encastrados no teclo ou no chão do mesmo, muito embora também possam estar instalados de outra forma, deve ser aplicada a regra da inversão em causa. 7. Pelo contrário, quando está em causa o fornecimento e simples montagem de aparelhos de ar condicionado, que funcionem isoladamente, ainda que possuam um aparelho no exterior e outro no interior do imóvel, porque não ficam a fazer parte integrante do imóvel, não deve ser aplicada a regra de inversão em causa".

8.            Quanto à alegada neutralidade na operação, para efeitos de IVA, defende a Requerida que a aplicação do regime da inversão do sujeito passivo, prevista na alínea j) do n.º 1 do art.º 2. ° do CIVA, não é optativa, recaindo o ónus de prova que tem direito aquela dedução à ora Requerente nos termos 74º da LGT; No presente caso, dado o IVA ter sido indevidamente liquidado por caber essa liquidação ao adquirente e não ao prestador de serviços foi a sua dedução não aceite.

9.            Acrescente-se, em relação à alegada violação do princípio da neutralidade fiscal em sede de IVA, que as correções levadas a cabo pelos serviços de inspeção decorrem do incumprimento dos normativos legais aplicáveis ao caso, que vão de encontro a tal princípio, pelo que se este se mostra posto em causa, não o foi pela atuação dos serviços de inspeção, mas pelo incumprimento das partes.

10.          Terminando com o pedido de improcedência do pedido arbitral.

               

II – SANEADOR

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas, o tribunal é competente e o pedido não é extemporâneo, nos termos do disposto nos arts 4.º e 10.º do RJAT e do art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

Não há questões prévias ou incidentais, matéria de excepção ou nulidades processuais para conhecer.

 

III – MÉRITO

1. MATÉRIA DE FACTO

 

1.1.        Factos provados e não provados

Cabe ao tribunal seleccionar os factos que importam para a decisão da causa e discriminar a matéria provada da não provada (conforme artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (conforme anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos abaixo elencados.

a)            A Requerente submeteu declaração periódica de IVA referente ao período de 2017/03T tendo solicitado o reembolso n.º ... no valor de € 61.820,15.

b)           A Requerente foi objeto da ação inspetiva credenciada pelas ordens de serviço n.os 012017... e 012017..., da qual resultaram, entre outras, correções em sede de IVA no período de 2017/03T, no valor de € 15.777,83.

c)            Foi emitida à Requerente uma factura relativa à aquisição de serviços de construção civil pela empresa "B..., Lda.", NIPC ... cujo IVA, no valor de € 6.170,73.

d)           Os serviços encontram-se descritos na proposta n.º ... ..., sendo relativos à aquisição e montagem de sistema de automação, Network & Infraestruture, light & shade automation, home control. Audio & vídeo, ou seja, sistemas de controlo de iluminação automatizados e personalizados, sistemas de vídeo vigilância, segurança, automação de portas de correr duplas.

e)           A instalação/montagem foi efetuada pelos técnicos certificados da B..., Lda. inseridos em condutas existentes para o efeito, mas montados e instalados pelas paredes, chão e tectos do imóvel através de furação e fixação ao imóvel por aqueles técnicos.

f)            Os bens e equipamentos foram montados no imóvel, pelos técnicos referidos no ponto anterior, tendo a instalação durado entre 7 a 8 dias conforme proposta.

g)            A 2018/05/2017 foi deduzida reclamação graciosa da liquidação supra identificada de IVA decorrente de correções apuradas pelos Serviços de Inspeção Tributária, referentes ao período de 2017/03T, no valor de € 15.777,83.

h)           Foi indeferimento parcialmente o pedido de reembolso de € 61.820,15, para o valor de € 46.042,32.

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa, considerando as possíveis soluções de direito.

Não há factos dados como não provados.

 

1.2.        Motivação quanto à matéria de facto

Os factos provados, têm por base os documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral e o processo administrativo junto pela Requerida.

 

2. MATÉRIA DE DIREITO

2.1. Questões principais

Do peticionado pela Requerente o que está em causa é a aplicação da inversão do sujeito passivo de IVA.

 

Cumpre decidir,

Considerando a relação material controvertida articulada pela Requerente na sua causa de pedir e, consequentemente, no respectivo petitório, o objecto da causa diz respeito ao ponto III.8 do Relatório Inspetivo - “O IVA deduzido indevidamente na aquisição de serviços de construção civil”.

Como dado como provado, resulta no Ponto 2 - Factura emitida em 21/03/2017 pelo fornecedor da Requerente “B..., Lda.”, no valor de € 26.829,27, acrescido de IVA de € 6.170,73, num total de €33.000,00, com o descritivo: “adjudicação da n/ proposta ... ...”.

Também segundo o que é dado como provado em causa está a aquisição e montagem de sistema de «automação, Network & Infraestruture, light & shade automation, home control. Audio & vídeo, (…)”, ou seja, a aquisição e montagem – o que foi feito por técnicos da fornecedora da Requerente – de sistemas de controlo de iluminação automatizados e personalizados, sistemas de vídeo vigilância, segurança, automação de portas de correr duplas.

O que importa apreciar neste caso é, considerando os serviços em causa, se os mesmos se enquadram, ou não, como serviços de construção civil para efeito de inversão do sujeito passivo de IVA.

Estabelece o art. 2.º, n.º 1 al. j) do CIVA que, são sujeitos passivos de IVA:

“As pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada”.

Sendo que, nos termos do art. 19.º do mesmo diploma, o seu n.º 8 prevê que,

“Nos casos em que a obrigação de liquidação e pagamento do imposto compete ao adquirente dos bens e serviços, apenas confere direito a dedução o imposto que for liquidado por força dessa obrigação”.

A inversão do sujeito passivo de IVA na construção civil aplica-se sempre que se esteja na presença de:

a)            Adquirente seja sujeito passivo de IVA em Portugal que realiza operações que confiram o direito total ou parcial à dedução de IVA; e,

b)           Se esteja na presença de uma aquisição de serviços na construção civil;

No caso em apreço, o que se apresenta controvertido, é este segundo requisito, ou seja, se, no caso concreto estamos ou não na presença de uma aquisição de serviços na construção civil ou, ao invés, ou a instalação de bens móveis não ligados materialmente ao imóvel com carácter de permanência.

No âmbito do Ofício circulado n.º 30101, de 2007/05/24 da DSIVA esclarece-se que “A norma em causa é abrangente, no sentido de nela serem incluídos todos os serviços de construção civil, independentemente de os mesmos fazerem ou não parte do conceito de empreitadas ou subempreitadas a que se referem os artigos 1207.° e 1213.° do Código Civil.

(...)

“Consideram-se serviços de construção civil todos os que tenham por objeto a realização de uma obra, englobando todo o conjunto de actos que sejam necessários à sua concretização”.

(...)

“Sempre que, no âmbito de uma obra, o prestador fatura serviços de construção propriamente dita ou quaisquer outros com ela relacionados e necessários à sua realização, (v.g. aluguer ou colocação de andaimes, aluguer de gruas e de outros bens, serviços de limpeza, sinalização, fiscalização, remoção de entulhos, serviços de projetistas ou de arquitetura, etc.), bem como materiais ou outros bens, entende-se que o valor global de fatura, independentemente de haver ou não discriminação dos vários itens e da faturação ser conjunta ou separada, é abrangido pela regra de inversão de sujeito passivo. (...)”.

Do referido Ofício Circulado consta ainda em anexo uma lista exemplificativa de serviços aos quais se aplica a regra de inversão (Anexo I), do qual constam serviços elencados na Portaria 19/2004, de 10 de Janeiro (não mencionados no anexo II).

A Portaria 19/2004, de 10 de Janeiro que, regulamentando o DL 12/2004, de 9 de Janeiro - que estabelece o regime jurídico de ingresso e permanência na actividade da construção civil – elenca categorias que, quanto ao caso sub judice, deparamo-nos, desde logo, com a 4.ª categoria: “Instalações eléctricas e mecânicas” que, inclui, entre “outras instalações mecânicas e electro-mecânicas”, “8.ª Sistemas de extinção de incêndios, segurança e detecção”, o que desde logo, inclui expressamente os sistemas de vídeo vigilância e segurança em apreço nos autos.

Quanto aos restantes sistemas, nomeadamente, sistemas de controlo de iluminação automatizados e personalizados, automação de portas de correr duplas entendemos enquadrável na referida portaria, nomeadamente na aludida subcategoria 15.ª da 4.ª categoria.

Em qualquer caso importa verificar a ligação destes bens ao imóvel, ou seja, a sua ligação com carácter de permanência. Interessa, então, saber se há ou não serviços de construção civil para que os bens fiquem a fazer parte integrante do imóvel, ou seja, o que está em causa é a montagem ou instalação dos bens, que ficou a cargo do fornecedor, fazendo com que os bens fornecidos façam pare integrante do imóvel, com carácter de permanência, por aqueles serviços prestados.

Como resulta da decisão n.º 457/2017-T do CAAD (in www.caad.org.pt) “(…) não será a circunstância de pode ser instalado noutro local que determinará a sua qualificação”.

Considerando que os bens fornecidos dizem respeito à instalação e montagem de sistemas de controlo de iluminação automatizados e personalizados, sistemas de vídeo vigilância, segurança, automação de portas de correr dupla parece evidente que, por um lado, a ligação tem carácter permanente – independentemente de poder ser retirada – ou seja, tem ligação por tempo indeterminado não resultando uma qualquer fixação de termo final ou sequer de condição para a sua utilização ou para ser desmontado.

Por outro lado, para o efeito, e para cumprimento da prestação de serviços, estes bens tiveram que, para além de recurso a técnicos da empresa fornecedora, ser ligados materialmente ao imóvel, mormente tendo que ser aparafusados, fixados, ligados, instalados, conectados entre si, pelo tecto, chão e paredes do imóvel, ou seja, por técnicas de construção civil e numa instalação correcta para o seu funcionamento integrado.

Aliás, conforme proposta apresentada e como foi dada como provado foram aqueles bens instalados e montados, por técnicos da fornecedora durante cerca de 8 dias. Dificilmente se concebe que um serviço que demora pelo menos uma semana a ficar completo implique que seja facilmente desmontado – o que de facto também imporia serviços de construção civil para serem desmontados, desaparafusados, desconectados.

Os serviços prestados pelos técnicos da fornecedora da Requerente implicaram a montagem e instalação dos sistemas, pelo edifício, aos quais foram ligados – por aqueles – ficando a fazer parte da estrutura fixa do imóvel aos quais foram materialmente ligados por aqueles, ou seja, através de serviços de construção civil.

Assim, esta ligação e montagem, para que seja completa, como foi, implica, como se entende face aos sistemas em causa, recurso a técnicas de construção civil.

Ficaria a Requerente satisfeita, quanto ao cumprimento das obrigações que resultam do contrato que celebrou com a fornecedora, se as ligações fossem exclusivamente feitas sem a ligação material ao imóvel? Feitas por técnicos especializados? Ou seja, tomemos o exemplo dos sistemas de vídeo vigilância e segurança. A Requerente consideraria cumpridas as obrigações de instalação e montagem deste sistema pela sua fornecedora caso os bens que os integram não fossem colocados, fixados ao imóvel, nos locais próprios, ligados ao imóvel, mormente aparafusando câmaras nas paredes? Encastrados e ligados por forma a terem uma utilização de conjunto e integrada? Com toda a certeza que não, nem, caso não fosse isso a prestação de serviços não teria uma duração de 7 a 8 dias.

É, pois, inequívoco, que a instalação do equipamento adquirido pela Requerente se enquadra no âmbito de um serviço de construção civil dado que os bens passaram a integrar a estrutura fixa do imóvel, por serviços – e sem estes não teria sido possível – de construção prestados por técnicos da fornecedora da Requerente, com carácter de permanência.

Quanto a isto entendemos, assim, não assistir, razão à Requerente.

               

Quanto à suscitada questão da neutralidade para efeitos de IVA.

Nesta matéria e como resulta da decisão n.º 457/2017-T do CAAD (in www.caad.org.pt) “ (…) a aplicação, pelo legislador nacional, do regime de reverse change (inversão do sujeito passivo) nas prestações de serviços de construção civil é expressamente consentida pela Directiva n.º 2006/69/CE de 24 de Julho.

Como se diz no preâmbulo do DL 21/2007 de 29 de Janeiro:

- “O presente decreto-lei procede à introdução na legislação do IVA de um conjunto de medidas destinado a combater algumas situações de fraude, evasão e abuso que se vêm verificando na realização das operações imobiliárias sujeitas a tributação, seguindo, nesta matéria, a experiência anteriormente adquirida e as melhores práticas adoptadas em outros Estados membros da União Europeia.

(…) Fora do âmbito das operações previstas nos nºs 30 e 31 do artigo 9,° do Código do IVA, mas ainda no domínio de algumas prestações de serviços relativas a bens imóveis, nomeadamente nos trabalhos de construção civil realizados por empreiteiros e subempreiteiros, o presente decreto-lei vem adoptar, de igual modo, uma outra faculdade conferida pela Directiva n.° 2006/69/CE, do Conselho, de 24 de Julho. Assim, por via da inversão do sujeito passivo, passa a caber aos adquirentes ou destinatários daqueles serviços, quando se configurem como sujeitos passivos com direito à dedução total ou parcial do imposto, proceder à liquidação do IVA devido, o qual poderá ser também objecto de dedução nos termos gerais. Com esta medida, visam acautelar-se algumas situações que redundam em prejuízo do erário público, actualmente decorrentes do nascimento do direito à dedução do IVA suportado, sem que esse imposto chegue a ser entregue nos cofres do Estado”.

Assim, por força do disposto no art. 2º, n.º 1, j) do CIVA, na redacção dada do referido DL 21/2007 “as pessoas singulares ou colectivas referidas na alínea a) que disponham de sede, estabelecimento estável ou domicílio em território nacional e que pratiquem operações que confiram o direito à dedução total ou parcial do imposto, quando sejam adquirentes de serviços de construção civil, incluindo a remodelação, reparação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis, em regime de empreitada ou subempreitada”.

                 Sendo manifesto que, por virtude disso, não ocorre duplicação de colecta.

               

Como se extrai do Ac. STA de 27-02-2013 – Proc. 1079/12:

“I - Por aplicação das regras gerais, o prestador de serviços é o sujeito passivo de IVA, mas nas denominadas situações de reversão da dívida tributária ou inversão da sujeição ou do sujeito passivo (reverse charge), o adquirente dos serviços ou dos bens torna-se o sujeito passivo do imposto pela respectiva aquisição, devendo proceder, em conformidade, à liquidação do imposto, sendo-lhe atribuído o direito à dedução do IVA pago pela aquisição dos serviços.

II - A duplicação da colecta, prevista no art 205.° do CPPT, resulta da aplicação do mesmo preceito legal mais do que uma vez ao mesmo facto tributário ou situação tributária concreta, sendo que a não exigência de segundo pagamento [à recorrente/requerente], a que a invocação da duplicação de colecta se reconduz, apenas se pode justificar se o primeiro [exigido à prestadora de serviços] era devido, pois, se não o foi, o que foi pago poderá ser ulteriormente reembolsado, através dos meios adequados de impugnação e revisão do acto tributário e, numa situação desse tipo, não se justifica que se prescinda do segundo pagamento, que é efectivamente devido.”

                Por outro lado,

As exigências do princípio da igualdade reconduzem-se à proibição do arbítrio, não impedindo, em absoluto, toda e qualquer diferenciação de tratamento, não resultando, neste caso, qualquer violação do princípio da igualdade suscitado pela Requerente.

Em conclusão, não padece de qualquer vício o acto sub judice que, por isso, deve ser mantido.

Considerando a decisão de mérito fica prejudicado, por ser inútil [art. 130º do Código do Processo Civil (CPC)], o conhecimento das demais questões colocadas.

 

IV – DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

a)            Declarar improcedente o pedido de pronúncia arbitral.

b)           Condenar a Requerente nas custas do processo.

 

V – VALOR DO PROCESSO

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2 do CPC, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 6.170,73.

 

VI – CUSTAS

Nos termos do art. 22.º, n.º 4 do RJAT, fixa-se o montante das custas em

€ 612,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, ficando a cargo da Requerente.

 

Notifique-se.

Lisboa, 25 de junho de 2019

 

O árbitro,

Marisa Almeida Araújo