Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 630/2018-T
Data da decisão: 2019-05-13  IMT  
Valor do pedido: € 1.308.125,00
Tema: Fundos de investimento imobiliário – IMT - Redução de taxas. Artigo 49.º, n.º 1.º, do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
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DECISÃO ARBITRAL

 

Acordam em Tribunal Arbitral

 

I – Relatório

 

1. A..., S.A., com o número de identificação fiscal..., com sede social na Rua ... n.º..., ... andar, ...-...Lisboa, apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º e segs. do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade do acto tributário de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), no montante global de € 2.616.250,00, relativo à aquisição de um imóvel  em 27 de Janeiro de 2015, bem como do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa deduzido contra esse acto tributário, requerendo ainda a condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

 

Fundamenta o pedido nos seguintes termos.    

 

A Requerente assume a forma jurídica de uma sociedade anónima que tem por objeto social, entre outras atividades, a exploração de atividades e unidades hoteleiras.

 

A 27 de janeiro de 2015, adquiriu ao Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., através da celebração de contrato de compra e venda sob a forma de escritura pública, o imóvel ..., sito na ..., n.º..., com o valor patrimonial tributário de € 21.472.440,00.

 

À data da celebração do referido contrato de compra e venda, a B..., alienante do imóvel, era um fundo de investimento imobiliário aberto, constituído para operar nos termos estipulados no Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 60/2002, de 20 de março.

 

No referido contrato foi acordado pelas partes o preço de € 40.250.000,00, tendo a Autoridade Tributária emitido, em 22 de janeiro de 2015, o documento de cobrança n.º..., do qual resultou uma importância a pagar, a título de IMT, de € 2.616.250,00.

 

No entanto, à data da aquisição do imóvel pela Requerente vigorava a norma de isenção parcial prevista no n.º 1 do artigo 49.º do EBF, com a redação dada pela Lei n.º 83.º-C/2013, de 31 de dezembro, na medida em que o imóvel adquirido estava integrado num fundo de investimento imobiliário aberto, pelo que as taxas de imposto municipal sobre imóveis e de imposto municipal sobre as transmissões onerosas estavam reduzidas para metade.

 

Assim, era devido imposto no montante de € 1.308.125,00 e não no montante de € 2.616.250,00, isso porque a taxa aplicável era de 3,25%, e não de 6,5%, por efeito do estabelecido na referida disposição do artigo 49.º do EBF, na redação vigente à data da aquisição do imóvel.

 

Concluiu no sentido da procedência do pedido arbitral.

 

A Autoridade Tributária, na sua resposta, sustenta que o facto de o artigo 31.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, que revogou o Código de Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, referir que as menções nos textos legais àqueles impostos se consideram feitas para o Código do IMT não tem a virtualidade de manter a isenção de IMT para as aquisições de imóveis efectuadas pelos todos os fundos de investimento.

 

A entender-se aplicável a isenção de IMT às aquisições de imóveis efectuadas por fundos de investimento imobiliário, desde 1987, nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/87, bem como às aquisições feitas por terceiros de imóveis dos fundos de investimento, por força do disposto no artigo 49.º do EBF (entretanto revogado pela Lei nº 7-A/2016, de 30 de Março), os fundos de investimento imobiliário seriam duplamente beneficiados, gerando uma situação de desigualdade face aos restantes intervenientes no mercado imobiliário, quer na aquisição de imóveis, quer ainda na alienação de imóveis a terceiros. 

 

Conclui pela improcedência do pedido

 

2. No seguimento do processo, foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, bem como a produção da prova testemunhal indicada pela Requerente, tendo-se remetido o processo para alegações pelo prazo sucessivo de dez dias.

Em alegações, a Requerente manteve a sua anterior posição. A Autoridade Tributária não contra-alegou.

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 25 de Fevereiro de 2019.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

Cabe apreciar e decidir.

 

II -Fundamentação

 

 

Matéria de facto

 

4. A matéria de facto relevante para a decisão da causa é a seguinte:

 

a) A Requerente é uma sociedade anónima que tem por objeto social, entre outras atividades, a exploração de atividades e unidades hoteleiras.

 

b) Em 27 de janeiro de 2015, adquiriu ao Fundo de Investimento Imobiliário Aberto B..., através da celebração de contrato de compra e venda sob a forma de escritura pública, o imóvel ..., sito na ..., n.º..., pelo preço de € 40.250.000,00;

 

c) A Autoridade Tributária emitiu, em 22 de janeiro de 2015, o acto tributário de liquidação de IMT, sob o n.º..., no montante de € 2.616.250,00.

 

d) A Requerente procedeu ao pagamento do imposto;

 

e) Em 24 de Maio de 2018, a Requerente deduziu pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação que não foi objecto de decisão no prazo legalmente previsto.

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e os constantes do processo administativo apresentado pela Autoridade Tributária com a sua resposta.

 

 

Questão de direito

 

5. A Requerente pretende que a aquisição de um bem imóvel a um Fundo de Investimento Imobiliário Aberto se encontra abrangido pela isenção parcial de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis nos termos do n.º 1 do artigo 49.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redacção introduzida pela Lei n.º 83.º-C/2013, de 31 de dezembro, pelo que o IMT deveria ter sido liquidado à taxa de 3,25%, e não de 6,5%, correspondendo ao montante global de € 1.308.125,00.

 

A Autoridade Tributária sustenta que a isenção originariamente prevista no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/87, de 3 de Janeiro, como isenção de sisa, não se encontra já em vigor e que a atribuição aos fundos de investimento imobiliário de isenção de IMT relativamente às aquisições de imóveis que realizem, bem como às alienações de imóveis a terceiros pelos fundos de investimento, implicando um duplo benefício, geraria uma situação de desigualdade relativamente aos demais intervenientes no mercado imobiliário.

 

A questão que se coloca é, pois, a de saber se o artigo 49.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais contemplava a pretendida redução a metade das taxas sobre o IMT e se mantinha em vigor à data da alienação do imóvel à Requerente, justificando-se analisar a evolução legislativa subsequente ao referido artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/87.

 

O Decreto-Lei n.º 1/87 estatui, no seu artigo 1.º, que “são isentas de sisa as aquisições de imóveis efectuadas para um fundo de investimento imobiliário pela respectiva sociedade gestora”. A estatuição surge na sequência da regulamentação dos fundos de investimento imobiliário, operada pelo Decreto-Lei n.º 246/85, de 12 de julho, e, como ressalta do respectivo preâmbulo, teve em vista definir um quadro fiscal adequado para a criação desses fundos a que o Governo reconhece um importante contributo para a formação de poupanças e mobilização de investimentos no sector imobiliário, com efeitos positivos na construção e no mercado de arrendamento de imóveis.

 

Entretanto, o Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, que procedeu à reforma da tributação do património, aprovando em anexo o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), e o Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), determinou, no seu artigo 28.º, n.º 2, que as remissões constantes dos textos legais para o imposto municipal de sisa se consideram como referidas ao Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis.

 

Além disso, o mesmo diploma, no artigo 31.º - que incluiu diversas normas revogatórias - ressalvou, no seu n.º 6, a manutenção em vigor dos benefícios fiscais respeitantes ao imposto municipal de sisa estabelecidos em legislação extravagante.

.

Assim, de acordo com a interpretação conjugada das citadas disposições dos artigos 28.º e 31.º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 287/2003, as isenções ao imposto de sisa constantes de quaisquer diplomas avulsos deveriam considerar-se reportadas ao IMT, e, por outro lado, as aquisições de bens imóveis efectuadas para um fundo de investimento imobiliário continuariam isentas de IMT por efeito do estabelecido no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/87.

 

Após a criação da isenção do imposto de sisa relativamente à aquisição de imóveis para os fundos de investimento imobiliário, em 1987, o Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, veio aprovar o Estatuto dos Benefícios Fiscais, com o claro propósito de sistematização dos princípios gerais a que deve obedecer a atribuição das situações de benefício. O EBF surgiu na sequência da reforma do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (CIRS), do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (CIRC) e da contribuição autárquica  (CA), que já haviam introduzido alguns mecanismos estruturais de desagravamento do imposto, pelo que o Estatuto teve em vista caracterizar algumas outras situações de carácter menos estrutural mas que se revestissem de relativa estabilidade, deixando para as futuras leis de orçamento de Estado os benefícios com finalidades marcadamente conjunturais ou que exigissem uma regulamentação mais frequente (cfr. a respectiva nota preambular).

 

Na primitiva redação do EBF, e em relação às sociedades de gestão e de investimento imobiliário, apenas se contemplava um regime fiscal específico de tributação em matéria de IRC e, em sede de IRS, quanto aos lucros distribuídos por aquelas sociedades aos respectivos sócios (artigo 26.º). Esse regime manteve-se com diversas alterações e veio a transitar para o artigo 22.º com a Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro, sob a epígrafe “Fundos de investimento”, que foi igualmente objecto de diversas modificações legislativas.

 

É a nova redacção dada ao artigo 46.º do EBF pela Lei de Orçamento do Estado para 2003 (Lei n.º 32-B/2002, de 30 de dezembro) que prevê, pela primeira vez, um regime de isenção fiscal a favor dos fundos de investimento imobiliário em matéria de contribuição autárquica, nos seguintes termos:       

 

Ficam isentos de contribuição autárquica os prédios integrados em fundos de investimento imobiliário e equiparáveis, em fundos de pensões e em fundos de poupança-reforma, que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional.

 

Após a reforma da tributação do património, aprovada pelo referido o Decreto-Lei n.º 287/2003 – que revogou o Código da Contribuição Autárquica –, esse artigo 46.º, na redacção dada pela Lei do Orçamento de Estado para 2007 (Lei 53-A/2006, de 29 de dezembro) passou a estabelecer a isenção de imposto municipal sobre imóveis (IMI) e de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) para os prédios integrados em fundos de investimento imobiliário, nas mesmas condições que já constavam da redacção anterior do preceito, e o Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de junho, e manteve nos mesmos termos essa mesma isenção.

 

A Lei nº 3-B/2010, de 28 de abril, sendo também uma lei orçamental, através de nova redacção dada ao artigo 49.º do EBF, passou a isentar de imposto municipal sobre imóveis e de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis apenas os “prédios integrados em fundos de investimento imobiliários abertos”, e a Lei do Orçamento de Estado para 2012 (Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro) alargou essa isenção aos “prédios integrados em fundos de investimento imobiliários abertos ou fechados de subscrição pública”.

 

A Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, alterando esse artigo 49.º, suprimiu a isenção, passando a prever a redução para metade das taxas de imposto municipal sobre imóveis e de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis aplicáveis a prédios integrados em fundos de investimento imobiliários abertos ou fechados de subscrição pública.

 

O n.º 1 desse preceito passou a ostentar a seguinte redacção:

 

“São reduzidas para metade as taxas de imposto municipal sobre imóveis e de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis aplicáveis aos prédios integrados em fundos de investimento imobiliário abertos ou fechados de subscrição pública, em fundos de pensões e em fundos de poupança-reforma que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional”.

 

O artigo 49.º do EBF foi revogado pelo artigo 215.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março.

 

6. Da evolução legislativa acabada de descrever ressalta a ideia de que os benefícios fiscais atribuídos aos fundos de investimento imobiliário não têm um carácter sistemático, assumindo antes uma natureza marcadamente conjuntural, assim se justificando que as sucessivas alterações ao regime legal tenham sido estabelecidas, em regra, por via de leis orçamentais.

 

Basta notar que começou por prever-se a isenção da contribuição autárquica - e do IMI e do IMT - em relação a prédios integrados em qualquer tipo de fundo imobiliário, para depois se restringir essa isenção aos prédios integrados em fundos de investimento imobiliários abertos. Mais tarde foi resposta a isenção quanto a prédios integrados em fundos de investimento imobiliários abertos ou fechados de subscrição pública até que o benefício fiscal foi transformado em redução da taxa de imposto aplicável e, finalmente, foi suprimido.

 

Não é possível ver, por conseguinte, na aprovação do EBF e nas múltiplas alterações desse Estatuto um critério geral que permita definir um regime fiscal estável que possa sobrepôr-se a outras disposições avulsas que subsistiam já na ordem jurídica.

 

Para além disso, importa fazer notar que o âmbito aplicativo da isenção inicialmente criada pela Lei 53-A/2006, mediante a alteração do artigo 46.º do EBF - que passou a prever a isenção de IMI e de IMT em relação a prédios integrados em fundos de investimento imobiliários -, não é coincidente com o da isenção contemplada no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/87, que se refere a aquisições de imóveis efectuadas para um fundo de investimento imobiliário pela respectiva sociedade gestora. Na verdade, por efeito da nova disposição do artigo 46.º do EBF, passaram a estar isentos do IMT os prédios já integrados nos fundos imobiliários, ao passo que a isenção a que se referia o diploma de 1987 abrangia as aquisições de bens imóveis efectuadas por sociedades gestoras de fundos de investimento imobiliário para passarem a integrar o património desses fundos. O que significa que o EBF veio ampliar a isenção, cobrindo não apenas as situações em que o fundo se encontrasse na posição de adquirente do imóvel, mas também aquelas em que o fundo age na posição de alienante do imóvel (cfr. neste sentido, o acórdão arbitral proferido no Processo n.º 544/2016, em que se analisou a mesma questão).

 

7. À luz da evolução legislativa anteriormente descrita, e como tem sido sublinhado pela jurisprudência arbitral, não há motivo para considerar verificada a revogação do  artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 1/87, visto que esse diploma não foi objecto de revogação expressa, nem existe qualquer incompatibilidade entre essa norma e aquela que veio a ser introduzida no EBF (artigo 46.º depois renumerado como artigo 49.º), visto que essas disposições contêm diferentes âmbitos aplicativos e esta última limitou-se a ampliar a isenção já estabelecida pelo diploma de 1987 (cfr., entre outros, os acórdãos proferidos nos Processos n.ºs 622/2017, 316/2018, 326/2018 e 606/2018).

 

Em todo o caso, o que está em causa não é a isenção prevista naquele preceito do diploma de 1987, mas antes a redução a metade das taxas de IMT relativamente a transmissões onerosas de imóveis aplicáveis aos prédios integrados em fundos de investimento imobiliário a que se refere o artigo 49.º, n.º 1, do EBF, na redacção da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro.

 

De facto, como se deixou referido, enquanto o citado diploma de 1987 se reportava a aquisições de bens imóveis efectuadas para um fundo de investimento imobiliário, a redução das taxas aplicáveis a que se refere o artigo 49.º do EBF abrange as transmissões de prédios integrados em fundos de investimento imobiliário, cobrindo quer as aquisições quer as alienações de imóveis.

 

No caso vertente, estamos perante a alienação à Requerente, por um fundo de investimento imobiliário, de um imóvel que se encontrava integrado no seu património. A alienação foi realizada em 2015, ainda antes de se ter operado a revogação desse artigo 49.º, que apenas ocorreu através da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março.

 

A citada norma do artigo 49.º, n.º 1, do EBF, encontrando-se vigente à data da transação, é também muito clara ao fixar uma redução para metade das taxas aplicáveis aos prédios integrados em fundos de investimento imobiliário, pelo que o acto de liquidação, ao desconsiderar esse benefício fiscal, violou frontalmente essa disposição.

 

Não há motivo, por outro lado, para considerar verificada a violação do princípio da igualdade. Como resulta do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 1/87, a isenção de imposto originariamente estabelecida nesse diploma visava estabelecer condições para a criação de fundos de investimento imobiliário para desse modo induzir efeitos positivos na indústria de construção e no mercado de arrendamento. E terá sido esse objectivo que justificou a isenção prevista no EBF, depois convertida em redução das taxas aplicáveis.

 

Existe, por conseguinte, um fundamento material bastante para estabelecer um regime mais favorável nas transações de imóveis integrados nos fundos de investimento imobiliário, o que afasta à partida a pretendida violação do princípio da igualdade.

 

Como se impõe concluir, o acto tributário de IMT relativo à aquisição de um imóvel pela Requerente é ilegal por violação do disposto no citado artigo 49.º, n.º 1, do EBF, na redacção da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro.

 

Juros indemnizatórios

 

                A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre o imposto, até ao reembolso integral da quantia devida.

 

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

Há assim lugar, na sequência de declaração de ilegalidade do acto de liquidação de IMT, ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das citadas disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).

 

 

III – Decisão

 

Termos em que se decide:

 

a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e anular o acto tributário de liquidação de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis n.º..., bem como o acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa;

 

b) Condenar no pagamento de juros indemnizatórios desde o pagamento do imposto até à data da emissão da nota de crédito, nos termos dos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

 

Valor da causa

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 1.308.125,00, que corresponde ao valor do imposto que seria devido se fosse aplicada a disposição do artigo 49.º, n.º 1, do EBF. No entanto, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, o valor da causa, no caso de impugnação de liquidação, é o da importância cuja anulação se pretende. Tendo sido o imposto fixado, no acto de liquidação, em € 2.616.250,00, fixa-se nesse montante o valor da causa.

 

Custas

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 33.660,00, que fica a cargo da Requerida.

 

Notifique.

Lisboa, 13 de Maio de 2018

   

 

O Presidente do Tribunal Arbitral

Carlos Fernandes Cadilha

 

O Árbitro vogal

Paulo Nogueira da Costa

 

O Árbitro vogal

A. Sérgio de Matos