Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 637/2018-T
Data da decisão: 2019-05-14  IRC  
Valor do pedido: € 305.518,88
Tema: Retenção na fonte. Competência dos tribunais arbitrais. Benefício fiscal.
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DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

 

                Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. João Taborda da Gama e Dr. Henrique Nogueira Nunes (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 26-02-2019, acordam no seguinte:

 

                1. Relatório

 

A..., entidade não residente sem estabelecimento estável em Portugal e detentora em Portugal do número de identificação fiscal..., registada junto do ... Office sob o n.º..., número de identificação fiscal irlandês ...T, com sede em ..., ..., Irlanda (“Requerente” ou “A...”), apresentou, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”) pedido de pronúncia arbitral tendo em vista:

(i)           à declaração de ilegalidade, e consequente anulação, dos atos tributários consubstanciados nas guias de retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) melhor identificadas na tabela abaixo, efetuadas pela B..., S.A., sociedade de direito português, contribuinte fiscal português n.º ..., com sede na Rua ..., ..., ...-... Lisboa (“A...”) relativas aos meses de outubro de 2015 a outubro de 2016, no montante global de €305.518,88;

(ii)          à declaração de ilegalidade, e consequente anulação, da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa onde a Requerente contestou a legalidade daquelas retenções na fonte de IRC (“Decisão Contestada”) – cf. documento n.º 1 que junta e dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; e

(iii)         à condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) no reembolso das quantias indevidamente suportadas com respeito a tais retenções na fonte – no montante total de €305.518,88 –, acrescidas dos devidos juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 43.º da Lei Geral Tributária (“LGT”) e de juros de mora, se a eles houver lugar.

 

Subsidiariamente, a Requerente defende  que «a AT sempre teria que ser condenada à anulação parcial da Decisão Contestada, na parte em que indefere o reembolso do montante de €24.906,11 correspondente à retenção na fonte de IRC do mês de outubro de 2015, sendo esse montante restituído à Requerente, acrescido dos juros indemnizatórios devidos, nos termos do disposto no artigo 43.º da LGT e de juros de mora, se a eles houver lugar».

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-12-2018.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 06-02-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 26-02-2019.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que suscitou a excepção da incompetência material do Tribunal Arbitral e defendeu que o pedido deve ser julgado improcedente.

Por despacho de 01-04-2019 foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações, com possibilidade de a Requerente se pronunciar sobre a excepção suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

A Requerente pronunciou-se sobre a excepção.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

Importa apreciar prioritariamente a excepção de incompetência suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

2. Excepção da incompetência material do Tribunal Arbitral

 

A excepção da incompetência é de conhecimento prioritário, como resulta do disposto no artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entende que

 

– a Requerente não imputa às retenções na fonte qualquer vício de ilegalidade;

– a Requerente pretende que fosse a Autoridade Tributária e Aduaneira a conceder uma extensão do termo do prazo de concessão do benefício fiscal - previsto no artigo 28.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) - de modo arbitrário e ilegal, incumprindo, se assim o fizesse, as condições determinadas no Despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais n.º 276/2017 - XXI, de 11/07/2017.

– deste modo, o objeto mediato do presente pedido de pronúncia arbitral não são as retenções na fonte identificadas, mas sim o Despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais n.º 276/2017 - XXI, de 11/07/2017.

– na competência dos tribunais arbitrais não se inclui a apreciação da legalidade do Despacho do Secretário de Estado dos assuntos fiscais como almeja a Requerente, apreciação essa que deveria ser feita através de acção administrativa, da competência do Tribunal Central Administrativo.

 

A Requerente respondeu à excepção dizendo o seguinte, em suma:

– os pedidos que formulou reportam-se apenas à ilegalidade dos actos de retenção na fonte e da decisão da reclamação graciosa em que foi contestada a sua legalidade e não ao referido Despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais;

– a Requerente suscitou diversas ilegalidades, que imputou à decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa apresentada e aos actos tributários (por retenção na fonte) contestados;

– a Requerente limita-se, ao longo do PPA, a defender que a interpretação que a AT está a fazer do conteúdo do despacho é que não está correta e é ilegal (o que inquina de ilegalidade os atos de retenção na fonte contestados, não se discutindo contudo nesta sede a legalidade do despacho);

– a ilegalidade da interpretação de um determinado ato administrativo – como pode ser o caso de um despacho de reconhecimento de um benefício fiscal – não implica que esse ato administrativo seja ele próprio objeto de qualquer tipo de impugnação;

– não existe nenhum ato em matéria tributária, autónomo e destacável, dos actos tributários consubstanciados nas guias de retenção na fonte de IRC que a Requerente pretendesse contestar através de ação administrativa especial;

–a Requerente entende que a sua pretensão – a restituição das retenções na fonte de IRC feitas em excesso – resulta expressamente do despacho de reconhecimento dos benefícios fiscais emanado pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, pelo que dissente da AT na regra que extrai do despacho, mas não está a questionar nesta sede (como não o fez em qualquer outra por entender que aquele ato não é ilegal) a conformidade com a lei do referido despacho.

 

A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é definida, em primeira linha, pelo artigo 2.º, n.º 1, do RJAT, que estabelece o seguinte:

 

1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais;

 

Em segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é limitada pela vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira que, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, do RJAT, veio a ser definida pela Portaria n.º 112-A/2011, de 12 de Março, que estabelece o seguinte, no que aqui interessa:

 

Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto -Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes:

a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

b) Pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;

c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indirectos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação; e

d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efectuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira.

 

Como se vê, apenas em relação a matérias aduaneiras a definição de competências é feita tendo em atenção o tipo de tributos a que se dirigem as pretensões. E quanto a estes a Autoridade Tributária e Aduaneira só se vinculou quanto aos impostos por esta administrados.

Quanto ao resto, a competência é definida apenas tendo em atenção o tipo de actos que são objecto da impugnação, não havendo, designadamente, qualquer proibição de apreciação de matérias relativas a isenções fiscais ou quaisquer outras questões de legalidade relativas aos actos dos tipos referidos no artigo 2.º do RJAT.

O facto de a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT fazer referência aos n.ºs 1 e 2 do artigo 102.º do CPPT, em que se indicam os vários tipos de atos que dão origem ao prazo de impugnação judicial, inclusivamente a reclamação graciosa, deixa perceber que serão abrangidos no âmbito da jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD todos os tipos de atos passíveis de serem impugnados através do processo de impugnação judicial, abrangidos por aqueles n.ºs 1 e 2, desde que tenham por objecto um ato de um dos tipos indicados naquele artigo 2.º do RJAT. Aliás, esta interpretação no sentido da identidade dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral é a que está em sintonia com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, em que se revela a intenção de o processo arbitral tributário constitua “um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.

Uma liquidação de imposto (ou qualquer acto que a concretize, como é o caso dos de autoliquidação e de retenção na fonte) que parta da desconsideração de uma isenção não deixa de ser um acto tributário de liquidação. E a apreciação da legalidade ou da ilegalidade dessa desconsideração não deixa, portanto, de ser a apreciação de uma pretensão relativa à declaração de ilegalidade de actos de liquidação.

No caso em apreço, são impugnados actos de retenção na fonte de IRC, que se inserem na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, e cuja apreciação não é excluída por qualquer das normas da referida Portaria.

Por outro lado, foi deduzida reclamação graciosa dos actos retenção na fonte, sendo contra a decisão que a indeferiu e dos actos de retenção na fonte que foi apresentado o pedido de pronúncia arbitral.

                A apreciação da legalidade destes actos insere-se manifestamente na competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.

                No entanto, resulta do teor expresso da referida autorização legislativa concedida no artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, que o âmbito possível do processo arbitral foi estabelecido como alternativa ao processo de impugnação judicial e à acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo e não a outros meios processuais de impugnação de actos em matéria tributária ou sobre questões fiscais, como era o recurso contencioso, depois a acção administrativa especial e, actualmente, é a acção administrativa [artigos 97.º, n.ºs 1, alínea p) e n.º 2, do CPPT e artigo 191.º do CPTA, as redacções da Lei n.º 15/2002 ,de 22 de Fevereiro (alterada pela Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro) e do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro].

                Os actos de «indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais» são referidos expressamente na alínea p) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT como sendo impugnáveis através de recurso contencioso, a que corresponde actualmente a acção administrativa, por força do disposto no artigo 191.º do CPTA.

Nestes casos em que se estabelece legislativamente a impugnabilidade autónoma de actos sobre benefícios fiscais, a sua legalidade não pode ser apreciada no âmbito da impugnação da liquidação, pois o estabelecimento da autonomia da impugnação tem por fim, precisamente, autonomizar a apreciação dos vícios de que possam enfermar. Por isso, se os actos sobre reconhecimento de benefícios fiscais que são autonomamente impugnáveis não forem impugnados, através do meio próprio de impugnação, a decisão administrativa neles contida consolidar-se-á na ordem jurídica e o que neles se decidiu será pressuposto do acto de liquidação, em cuja impugnação não podem ser apreciados eventuais vícios do acto autonomamente impugnável.

No caso em apreço, foi apreciada uma isenção dependente de reconhecimento, nos termos do artigo 28.º do EBF, da competência de entidade distinta da que tem competência para a liquidação, pelo que o acto proferido sobre essa matéria apenas pode ser impugnado autonomamente, nos termos do artigo 97.º, n.ºs 1, alínea p), e 2 do CPPT.

Por isso, as eventuais ilegalidades do acto de reconhecimento da isenção não podem ser apreciadas no presente processo.

Mas já se insere nas competências deste Tribunal Arbitral apreciar se os actos de retenção na fonte e a decisão da reclamação graciosa estão em conformidade com o decidido sobre a isenção.

Ora, no caso em apreço, como a Requerente esclarece ao pronunciar-se sobre a excepção, o que defende é que «a interpretação que a AT está a fazer do conteúdo do despacho é que não está correta e é ilegal (o que inquina de ilegalidade os atos de retenção na fonte contestados, não se discutindo contudo nesta sede a legalidade do despacho)».

Assim, esclarecido nestes termos o pedido de pronúncia arbitral, afastada do seu âmbito a apreciação da legalidade do despacho sobre a isenção, tem de se concluir, pelo que se disse, que a apreciação da legalidade dos actos de retenção na fonte e da decisão da reclamação graciosa que os confirmou se insere nas competências deste Tribunal Arbitral.

Mas, como a Requerente reconhece, não se pode discutir no presente processo a legalidade do despacho que concedeu a isenção, apenas podendo questionar-se, em relação a este, se é correcta a interpretação desse despacho que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou para indeferir a reclamação graciosa, mantendo os actos de retenção na fonte.

Improcede, assim, a excepção da incompetência, em relação ao pedido de pronúncia arbitral, com este alcance.

 

3. Matéria de facto

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)            A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à locação de aeronaves;

b)           A Requerente é residente fiscal na República da Irlanda e não dispõe de qualquer estabelecimento estável em Portugal;

c)            No dia 05-01-2015, a Requerente celebrou, com uma sociedade comercial portuguesa – a B... –, um contrato denominado Aircraft Lease Agreement (doravante designado como “Contrato” – documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

d)           O Contrato tinha por objeto a locação da aeronave ... ...-200, com o número de série do fabricante ..., matrícula n.º .../1 e dois motores, marca e modelo ... PW ... A na mesma instalados, com os números de série do fabricante ESN... e ES... (a aeronave e os motores doravante conjuntamente denominados a “Aeronave”);

e)           No âmbito deste contrato, a Requerente assumiu a posição contratual de locadora da Aeronave, enquanto a B... assumiu a posição contratual de locatária;

f)            Nos termos conjugados da cláusula 2.1 e Anexos 1 e 2A do Contrato, estava previsto que a Aeronave seria locada desde a data da sua entrega (“Delivery Date”) – pela Requerente à B...– até à data da devolução da Aeronave (“Termination Date”) – pela B... à Requerente;

g)            Nos termos do Contrato, estava previsto que o seu início, ou seja, a entrega da Aeronave, teria lugar no dia 01-04-2015 (“Scheduled Delivery Date” – cf. anexos 1 e 2A do Contrato);

h)           No entanto, caso a entrega da Aeronave (“Delivery”) apenas tivesse lugar num momento posterior, o período de duração da locação (“Lease Term”) apenas se iniciaria na data da entrega efetiva, pelo que o período de duração da locação não teria que se iniciar necessariamente no dia 01-04-2015 (cláusula 2.1 e Anexos 1 e 2A do Contrato);

i)             Nos termos conjugados da cláusula 2.1 e Anexos 1 e 2A do Contrato, o fim do período de duração da locação (“Termination Date”) poderia ter lugar, alternativamente, num dos seguintes momentos:

(i) Na data prevista para a devolução (“Return”) da Aeronave pela B... à Requerente, desde que a devolução viesse a ser efetivamente concretizada até à data prevista para o efeito – “Scheduled Termination Date”, que inicialmente correspondia a 31 de outubro de 2015; ou

(ii) Em data posterior, caso a Aeronave não fosse devolvida pela locatária na data prevista para a sua devolução (“Scheduled Termination Date”);

j)             No que respeita às rendas devidas pela B... à Requerente, o Anexo 2B do Contrato previa que seriam devidas as seguintes rendas mensais em contrapartida da locação da Aeronave:

(i) Desde a data de entrega da Aeronave até 31 de maio de 2015, o valor base da renda mensal correspondia à soma dos seguintes valores: (1) USD 150.000,00 (cento e cinquenta mil dólares americanos) ou o respetivo contravalor em Euros e (2) USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo que ultrapassasse as 150 horas de voo mensais. Em qualquer caso, a renda mensal resultante da soma daqueles dois valores não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(ii) De 1 de junho de 2015 a 30 de setembro de 2015, o valor base da renda mensal correspondia a USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(iii) De 1 de outubro de 2015 até ao fim do período de duração da locação (“Termination Date”) 2 , o valor base da renda mensal correspondia à soma dos seguintes valores: (1) USD 300.000,00 (trezentos mil dólares americanos) e (2) um montante adicional de USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo que ultrapassasse as 150 horas de voo mensais. Em qualquer caso, a renda mensal resultante da soma daqueles dois valores não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

k)            Em junho de 2015 a Requerente e a B... assinaram o Aircraft Lease Amendment Agreement (doravante designado como “Primeiro Aditamento Contratual” – documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

l)             Nesse Primeiro Aditamento Contratual foi revisto o Anexo 2A do Contrato (onde se encontra previsto o período de duração da locação – “Lease Term”) nos seguintes termos (cláusula 2.2.1 do Primeiro Aditamento Contratual):

(i) O período de duração da locação (“Lease Term”) inicia-se na data de entrega da Aeronave (“Delivery Date”) 3 e termina no dia 31 de março de 2016;

(ii) A partir de 1 de novembro de 2015, a locadora (a Requerente) podia, a qualquer momento, optar por fazer cessar o Contrato, desde que dê-se conhecimento de tal intenção à locatária (a B...), com pelo menos 60 dias de antecedência.

m)          Nesse Primeiro Aditamento Contratual foi também revista a cláusula 1.1 do Anexo 2B do Contrato, que passou a prever o seguinte relativamente às rendas mensais, devidas pela B..., em contrapartida da locação da Aeronave pela Requerente:

(i) Desde a data de entrega da Aeronave até 30 de abril de 2015, o valor mensal da renda corresponde a USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo. Em qualquer caso, a renda mensal não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(ii) Desde 1 de maio de 2015 até 31 de maio de 2015, o valor base da renda mensal correspondia à soma dos seguintes valores: (1) USD 100.000,00 (cem mil dólares americanos) ou o respetivo contravalor em Euros e (2) um montante adicional de USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo que ultrapassasse as 150 horas de voo mensais. Em qualquer caso, a renda mensal resultante da soma daqueles dois valores não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(iii) Desde 1 de junho de 2015 até 30 de setembro de 2015, o montante de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos);

(iv) Desde 1 de outubro de 2015 até 31 de outubro de 2015, o valor base da renda mensal correspondia à soma dos seguintes valores: (1) USD 250.000,00 (duzentos e cinco mil dólares americanos) ou o respetivo contravalor em Euros e (2) um montante adicional de USD 1.000,00 (mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo que ultrapassasse as 150 horas de voo mensais. Em qualquer caso, a renda mensal resultante da soma daqueles dois valores não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(v) Desde 1 de novembro de 2015 até ao fim do período de duração da locação (“Termination Date”), o valor mensal da renda corresponde a USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo.

n)           No âmbito do Primeiro Aditamento Contratual, foi ainda acordado pela Requerente e pela B... que o montante de USD 150.000,00 (cento e cinquenta mil dólares americanos), pago no mês da entrega da Aeronave, seria descontado ao valor da segunda renda mensal devida pela B... (cláusula 3 do Primeiro Aditamento Contratual);

o)           No dia 18-12-2015 a Requerente e a B... assinaram o Aircraft Lease Amendment Agreement No. 2 (doravante designado como “Segundo Aditamento Contratual” –documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)

p)           Nesse Segundo Aditamento Contratual foi dada nova redação ao Anexo 2A do Contrato (onde se encontra previsto o período de duração da locação – “Lease Term”) nos seguintes termos (cf. cláusula 2.2 do Segundo Aditamento Contratual): o período de duração da locação (“Lease Term”) inicia-se na data de entrega da Aeronave (“Delivery Date”) 4 e termina no dia 31 de outubro de 2016;

q)           Nesse Segundo Aditamento Contratual foi também dada nova redação à cláusula 1.1 do Anexo 2B do Contrato, que passou a prever o seguinte relativamente às rendas mensais, devidas pela B..., em contrapartida da locação da Aeronave pela Requerente:

(i) Desde 1 de novembro de 2015 até 30 de abril de 2016, o valor mensal da renda corresponde a USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo. Em qualquer caso, a renda mensal não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(ii) Desde 1 de maio de 2016 até 30 de junho de 2016, o valor mensal da renda corresponde à soma dos seguintes valores: (1) USD 100.000,00 (cem mil dólares americanos) ou o respetivo contravalor em Euros e (2) um montante adicional de USD 2.000,00 (dois mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo que ultrapassasse as 150 horas de voo mensais. Em qualquer caso, a renda mensal resultante da soma daqueles dois valores não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

(iii) Desde 1 de julho de 2016 até 30 de setembro de 2016, o montante de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos);

(iv) Desde 1 de outubro de 2016 até 31 de outubro de 2016, o valor base da renda mensal correspondia à soma dos seguintes valores: (1) USD 250.000,00 (duzentos e cinco mil dólares americanos) ou o respetivo contravalor em Euros e (2) um montante adicional de USD 1.000,00 (mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros, por cada hora de voo que ultrapassasse as 150 horas de voo mensais. Em qualquer caso, a renda mensal resultante da soma daqueles dois valores não poderia ultrapassar o limite máximo de USD 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil dólares americanos), ou o respetivo contravalor em Euros;

r)            A B..., locatária da Aeronave e entidade obrigada aos pagamentos das rendas em resultado da locação, apresentou um pedido de reconhecimento da isenção de IRC sobre as rendas pagas à Requerente no âmbito do Contrato;

s)            O pedido de reconhecimento da isenção de IRC (ao abrigo do artigo 28.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais) foi apresentado pela B..., junto do Ministério das Finanças, no dia 22-01-2015 (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

t)            A B... terminou o pedido de isenção nos seguintes termos:

“Face ao acima exposto, vem a B... requerer a Vossa Excelência, ao abrigo do disposto no artigo 28º do EBF, a concessão de isenção total de IRC relativamente às rendas de locação de equipamento por si devidas no âmbito da operação de locação de Aeronave, descrita nos pontos 2 e 3 supra”.

u)           Nos dias 20 e 30 de abril de 2015, a B..., juntou ao procedimento os documentos solicitados pela AT (documentos n.ºs 6 e 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

v)            No dia 19-08-2015, a B... solicitou a prestação de informação sobre o estado do pedido de reconhecimento da isenção em apreço e da data prevista para a notificação da decisão (documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

w)          Em Agosto de 2017, a B... foi notificada, por ofício datado de 24-08-2017, da concessão da isenção no termos que constam do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

Na sequência da pretensão formulada ao abrigo do art. 28º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, comunica-se que por despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nº 276/2017-XXI, de 11.07.2017, foi concedida isenção total em sede de IRC, relativamente às rendas de locação pagáveis mensalmente nos seguintes termos: - de 1 de abril a 31 de maio de 2015, o valor base consistirá na soma de USD$ 150,000.00 (cento e cinquenta mil dólares americanos), ou respetivo contra valor em euros, e o equivalente a USD$ 2,000.00 ou respetivo contravalor em euros, por cada número de horas de voo acima das 150 horas, com o limite de USD$450,000.00, ou respetivo contravalor em euros; - de 1 de Junho a 30 de Setembro de 2015, o valor base será de USD$450,000.00, ou respetivo contravalor em euros; - de 1 a 31 de Outubro de 2015, o valor base consistirá na soma de USD$300,000.00 (trezentos mil dólares americanos), ou respetivo contravalor em euros, e o equivalente a USD$1,000.00, ou respetivo contravalor em euros, por cada número de horas de voo acima das 150 horas, com o limite de USD$450,000.00, ou respetivo contravalor em euros.

As referidas rendas, são resultantes de um Contrato de Locação celebrado em 05.01.2015 entre a "B... SA" a e a "A...", denominado "Aircraft Lease Agreement, respeitante a uma aeronave com o (S/N) 802 e matricula ..., com dois motores instalados modelo ... PW ... A, com os (S/Ns) ... e..., pelo prazo de 7 meses, contados a partir de 1 de abril de 2015. A isenção em causa fica condicionada ao facto de sempre que se verifiquem alterações durante o período de vigência contratual, ser apresentado pela requerente novo requerimento a solicitar a isenção.

x)            No âmbito da locação da Aeronave, a Requerente faturou um montante total de USD 5.075.560,00 entre maio de 2015 e outubro de 2016 (cópia das 20 faturas emitidas durante esse período que constam do documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

y)            Embora a entrega da Aeronave à B... (locatária) tenha ocorrido a 17-04-2015, não houve lugar a qualquer pagamento de renda no mês de abril, em resultado da inexistência de qualquer hora de voo nesse mês;

z)            Uma vez que apenas em 2017 o pedido veio a ser apreciado, durante todo o período de vigência do Contrato (quer no período inicialmente previsto, até 31 de outubro de 2015, quer nos subsequentes períodos de duração do Contrato em virtude da alteração da data prevista para a devolução da Aeronave para 31 de outubro de 2016), a Requerente esteve sujeita a tributação em IRC (por retenção na fonte);

aa)         Apesar de as Rendas deverem ser pagas em Dólares Americanos, de acordo com a lei Portuguesa a retenção na fonte de IRC deve ser feita em Euros, o que levou à necessidade de as partes acordarem uma taxa de câmbio Dólar-Euro, tendo sido acordada e aplicada a taxa de câmbio oficial, entre aquelas duas moedas, correspondente ao primeiro dia útil do mês do pagamento;

bb)         Nos termos exposto, a B... procedeu mensalmente à retenção na fonte de IRC num montante total agregado de €496.234,65 (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

cc)          Os montantes retidos pela B... foram comunicados através das declarações Modelo 30 apresentadas para os meses de maio de 2015 a outubro de 2016 (declarações Modelo 30 que constam do documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

dd)         Todos os montantes de retenção na fonte em questão foram entregues à AT através das guias de retenção na fonte a não residentes emitidas para o efeito com referência a cada um dos períodos relevantes (guias de retenção na fonte e respetivos comprovativos bancários de pagamento, que constam do documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

ee)         Em 27-12-2017, a Requerente apresentou reclamação graciosa dos actos de retenção na fonte (pedindo a anulação e reembolso do imposto pago, no montante de € 496.234,65 (documento n.º 14 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

ff)           A Requerente foi notificada, no dia 17-07-2018 do projecto de indeferimento da reclamação graciosa (documento n.º 15 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), em que se refere, além do mais o seguinte:

16. Neste contexto, o despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais invocado pela reclamante apenas concedeu a isenção total em sede de IRC relativamente às rendas de locação no período de 2015-04-01 a 2015-10-31 (7 meses), nos restantes termos descritos supra no ponto 5, pelo que o imposto devido sobre as rendas a partir de 2016-11-31 até 2016-10-31 está fora do perímetro legal da isenção conferida superiormente.

17. Por outro lado, os benefícios fiscais quando temporários caducam pelo decurso do prazo por que foram concedidos (n.º 2 do artigo 14.º do EBF).

18. Nesta perspectiva, mesmo que no período coberto pelo despacho de isenção, deverá ser comprovado que as guias de retenção na fonte do imposto correspondem às rendas locativas pagas e relativas à Aeronave com a matrícula ... e número de série S/N..., conforme certificado de matrícula emitido pela ANAC – Autoridade Nacional da Aviação Civil, com data de 2015-04-24 (a fls. 251).

19. Com efeito, o documento que certifica a retenção com o montante total de € 496.234,65 (a fls. 190) identifica uma aeronave com o número de série MSM... .

 

gg)         A Requerente, em requerimento que deu entrada nos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira em 06-08-2018, exerceu o direito de audição prévia, nos termos que constam do documento n.º 16 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido (página 10 da 3.ª parte do processo administrativo);

hh)         No requerimento referido, a Requerente diz, além do mais, que «após a receção da notificação da AT para o exercício do presente direito de audição, a Reclamante verificou que, de facto, a declaração referida em b) continha um lapso, pois - apesar de indicar corretamente o valor das retenções na fonte de IRC que estão em causa na presente reclamação graciosa - fazia referência à aeronave "MSN ..." em vez da aeronave ''MSN ..." (que é a aeronave objeto do Contrato, que esteve na origem do pagamento das rendas sujeitas a retenção na fonte de IRC, cujo reembolso se reclama nesta sede)» e que «solicitou imediatamente à B... a emissão de uma declaração corrigida -i.e., com referência à aeronave correta (MSN...) -, tendo a B... emitido uma nova declaração com a informação correta», juntando um documento que consta da 3.ª parte do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido;

ii)            Por despacho de 07-09-2018, foi deferida parcialmente a reclamação graciosa, com os fundamentos que constam do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

IV - INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR

20. A reclamante foi notificada do projeto de decisão de indeferimento do pedido, através do Ofício n.º ... datado de 2018-07-16 (a fls. 299 e 300), considerando-se notificada a 2018-07-19 (a fls. 301), para querendo exercer o direito de audição prévia, nos termos do artigo 60.º da LGT, no prazo de 15 dias.

21. O requerimento com o exercício do direito de audição prévia foi remetido a esta Direção de Finanças, por via postal, em 2018-08-03 (a fls. 302 a 328) e, como tal, tempestivo, pelo que deverá ser apreciado:

22. Com referência ao fundamentado nos pontos 18 e 19 supra, começa a reclamante por assumir o lapso constante num documento entregue com a petição inicial, nomeadamente no que toca à declaração emitida pela B... na qual atestava os valores de retenção em cada mês, fazendo alusão â aeronave "MSN ..." ao invés da "MSN ...", objeto do contrato em análise.

23. Para o efeito, a reclamante junta nova declaração da B... agora já corrigida (a fls. 326), pelo que diz impor-se a correção do lapso, com o deferimento das retenções relativas às rendas pagas até outubro de 2015, no valor de € 190.715,77.

24. No que respeita as rendas de novembro de 2015 a novembro de 2016, a reclamante refere que a prorrogação do prazo de vigência do contrato até 2016-03-31 e depois até 2016-10-31 não é impeditivo do deferimento da presente reclamação graciosa.

25. Desde logo, o artigo 28.º do EBF não obriga à comunicação de quaisquer alterações nos contratos objeto de isenção, nem ela pode resultar do despacho de reconhecimento do benefício, sob pena de ilegalidade.

26. Mas mesmo que assim não fosse, teria sido impossível cumprir tal exigência hipotética porquanto o deferimento da isenção foi notificado apenas dois anos e meio após o pedido e também após as prorrogações contratuais em questão.

27. "O que não se poderá aceitar é que a AT (i) incumpra, em mais de dois anos, o prazo de que dispõe para o reconhecimento do benefício fiscal e (ii) nessa decisão coloque exigências adicionais relativamente a um período em que o sujeito passivo já nada pode fazer por não ter havido uma decisão administrativa em tempo útil (ponto 27 do requerimento, a fls. 308).

28. Começar dizendo que, com a nova declaração corrigida pela B... se encontra corrigido o lapso inicialmente verificado com a referência à unidade em questão, estando assim em consonância com a declaração oficial emitida pela Autoridade Nacional da Aviação Civil (a fls, 261),

29. Pelo que, estando abrangido pelo período de isenção concedido, deverá ser de atender parcialmente o pedido e conferir o valor das retenções desse período, no montante de € 190.715,77 (a fls. 210 a 219, 326 e 329).

30. Todavia, no que concerne aos restantes períodos, como já mencionado anteriormente, não existe isenção fiscal.

31. Ou seja, não foram objeto de análise nem escalpelizados nos seus contornos os contratos de locação em causa que se pretendem ver abrangidos pela isenção fiscal reconhecida para o período de 2015-04-01 a 2015-10-31.

32. Independentemente da data de notificação da decisão de deferir e reconhecer aquele benefício fiscal, essa decisão tinha um objecto muito preciso e concreto, definido temporalmente.

33. Quaisquer alterações e extrapolações ao seu conteúdo seriam merecedoras de nova apreciação - o que não sucedeu.

34. Desta feita, não pode senão o pedido ser indeferido fora do perímetro temporal da isenção concedida.

jj)           As adendas ao contrato com a alteração do período de vigência não foram comunicadas à Autoridade Tributária e Aduaneira, antes da decisão sobre o pedido de isenção;

kk)         Em 13-12-2018, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

3.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente e que constam também do processo administrativo.

Não há controvérsia sobre a matéria de facto.

 

4. Matéria de direito

 

Como se referiu, a competência deste Tribunal Arbitral não se estende à apreciação da legalidade do despacho proferido sobre a isenção.

Os actos de retenção na fonte foram praticados pela B..., relativamente a rendas de locação de uma aeronave, antes de ser concedida a isenção, não lhes sendo imputada pela Requerente qualquer ilegalidade, à face do condicionalismos em que foram praticados.

Depois de concedida a isenção, a Requerente apresentou reclamação graciosa em que a Autoridade Tributária e Aduaneira reconheceu que era aplicável a isenção à parte dos actos de retenção que considerou incluídos no período inicialmente fixado para a vigência do Contrato, deferindo a pretensão da aí Reclamante quanto a retenções na fonte praticadas em relação a rendas referentes ao período de 1 de abril de 2015 e 31 de outubro de 2015.

No entanto, a Autoridade Tributária e Aduaneira indeferiu o pedido da Requerente na parte em que entendeu que a isenção não se aplicava, designadamente relativamente a actos de retenção na fonte referentes a rendas de períodos posteriores.

Assim, na reclamação graciosa, já depois da concessão da isenção, foram mantidos os actos de retenção na fonte que são objecto do presente processo.

É a legalidade do indeferimento do pedido de anulação desses actos, que se reconduz à afirmação da sua legalidade e manutenção na ordem jurídica com os fundamentos que consta da decisão da reclamação graciosa, que constitui o objecto imediato do presente processo.

A Requerente imputa à decisão da reclamação graciosa, na parte em que manteve os actos de retenção na fonte, vícios que sintetiza desta forma:

 

i.  Violação do princípio da legalidade previsto nos termos do artigo 8.º da LGT e 103.º, n.º 2 da CRP; 

ii.  Violação do princípio da justiça e da boa-fé, a que a AT se encontra vinculada, nos termos do artigo 266.º, n.º 2 da CRP;

iii.  Falta de fundamentação da Decisão Contestada, em violação dos artigos 77.º da LGT, 153.º do Código de Procedimento Administrativo (“CPA”) e 268.º, n.º 3, da CRP, o que deve conduzir à sua anulação; e

iv.  A título subsidiário, erro manifesto da Decisão Contestada, por erro na determinação do valor de retenções na fonte de IRC a restituir à Requerente.

 

4.1. Vício de violação do princípio da legalidade previsto nos termos do artigo 8.º da LGT e 103.º, n.º 2 da CRP

 

                A Requerente defende, em suma, que  

– o contrato inicial já previa uma possível duração no tempo superior a 7 meses,  pelo  que  o  perímetro  temporal  da  isenção  reconhecida  com  base  em  exclusivo  no Contrato não é necessariamente o que foi considerado;

– mesmo que se entendesse existir uma obrigação de comunicação de alterações contratuais à AT (o que não é o caso), importa distinguir alterações ao conteúdo do contrato, que possam ser passíveis de afetar ou contender com os requisitos de que depende o reconhecimento da isenção de imposto (que não existiram no caso), de meros aditamentos formalizando a opção (prevista  no  Contrato)  de  alargamento  do  seu  período  de  vigência  por  convenção  entre  as partes de uma data diferente para a devolução da Aeronave.

– a alteração da data de devolução da Aeronave era possível e estava prevista no Contrato, pelo que a sua ocorrência não constitui qualquer alteração contratual;

– ainda que assim  não  fosse,  e  existisse  uma  qualquer  alteração  contratual  (no  que  não  se concede), a lei não prevê qualquer obrigação de comunicação de alterações contratuais, pelo que a exigência prevista no despacho de reconhecimento da isenção de IRC é ilegal.

 

                Os artigos 103.º, n.º 2, da CRP e 8.º da LGT, invocados pela Requerente, reportam-se à criação de normas sobre matéria fiscal, que não estão em causa no caso em apreço, pois não é questionada a constitucionalidade ou legalidade do artigo 28.º do EBF. De qualquer modo, não se vislumbra a inconstitucionalidade ou ilegalidade deste artigo 28.º, que é uma norma criada pela Assembleia da República.

Mas, de qualquer modo, no nosso regime constitucional de administração executiva, para além da criação de normas (actos de natureza geral e abstracta) em matéria tributária, são atribuídos à Administração Pública poderes de auto-tutela declarativa, designadamente através de actos administrativos que, por definição, «visam produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta» (artigo 148.º do Código do Procedimento Administrativo).

Neste âmbito do exercício de poderes administrativos, o princípio da legalidade tem outra dimensão, prevista nos artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT, e é enunciado no artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo, que exige uma actuação da Administração Pública «em obediência à lei e ao direito», em que se inclui o respeito pela  definição de situações jurídicas pela Administração Pública  através de actos administrativos.

Na verdade, o próprio artigo 155.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, invocado pela Requerente, corrobora este entendimento, pois estabelece que «o acto administrativo produz os seus efeitos desde a data em que é praticado, salvo nos casos em que a lei ou o próprio ato lhe atribuam eficácia retroativa, diferida ou condicionada». O que resulta desta norma é que os efeitos dos actos administrativos se produzem nos termos nele definidos, com as condições nele incluídas.

Por isso, subsistindo os actos administrativos na ordem jurídica, é a própria lei que impõe que produzam os seus efeitos próprios da definição do regime legal aplicável à situação individual e concreta. Assim, por força da lei, a legalidade e o direito aplicáveis à situação individual e concreta passam a ser os que resultam da definição consubstanciada no acto administrativo.

No caso em apreço, a Requerente tem razão quanto ao facto de no contrato já se prever que o período de vigência inicial não ter de coincidir com o período entre 1 de abril de 2015 e 31 de outubro de 2015, nem se limitar a 7 meses.

Porém, o que delimita o âmbito da isenção não é o pedido que a Requerente apresentou nem os termos do contrato, mas sim, a decisão administrativa que recaiu sobre o pedido.

E é inequívoco que, apesar de a Requerente ter pedido a isenção abrangendo a totalidade da vigência do contrato, ela apenas foi concedida «pelo prazo de 7 meses, contados a partir de 1 de abril de 2015».

                Se é certo que o contrato inicial já previa vigência em períodos diferentes do período entre 1 de abril de 2015 e 31 de outubro de 2015 e que a ora Requerente pretendia a concessão para qualquer período de vigência do contrato, também é certo que essa pretensão não foi atendida e apenas foi deferido o pedido de isenção relativamente a rendas referentes àquele período. Isto é, a decisão de reconhecimento da isenção tem ínsito o indeferimento parcial da pretensão, com maior amplitude, não temporalmente pré-determinada, que a Requerente pretendia.

Aliás, a fixação das datas de início e termo dos benefícios fiscais é obrigatória (artigo 65.º, n.º 4, do CPPT), pelo que é manifesto que não há ilegalidade da decisão de reconhecimento do benefício fiscal ao fixar limites temporais.

De qualquer modo, não consta do processo que tenha sido anulada a decisão de reconhecimento da isenção com a referida limitação temporal, pelo que é nestes termos que ela tinha de ser aplicada pela Administração Tributária ao apreciar a reclamação graciosa.

A hipotética ilegalidade ou inconstitucionalidade da decisão de reconhecimento, à face do preceituado no artigo 28.º do EBF, ao restringir a isenção às rendas do período referido e ao condicionar a isenção à comunicação de alterações contratuais (designadamente pela alegada «inexistência de margem de livre decisão quanto ao reconhecimento do benefício fiscal» e por a decisão da não dever ser «diferente se a versão inicial do Contrato previsse que a devolução da Aeronave se previa para outubro de 2016 e não para outubro de 2015»), é  matéria que só poderá ser apreciada em processo próprio de impugnação dessa decisão, que, pelo que se referiu, não se inclui nas competências deste Tribunal Arbitral.

Prevendo a lei a possibilidade de impugnação contenciosa da decisão  proferida sobre o pedido de reconhecimento do benefício fiscal [artigos 97.º, n.º 1, alínea p), e 2, do CPPT e 51.º do CPTA], por qualquer lesado [artigo 55.º, n.º 1, alínea a),do CPTA], inclusivamente a partir do conhecimento do acto pelos lesados não notificados [artigo 59.º, n. 3, alínea b), do CPTA], está perfeitamente assegurada legislativamente a possibilidade de tutela judicial efectiva dos interesses da Requerente, pelo que este regime legal não pode ser considerado incompaginável com o artigo 268.º, n.º 4, da CRP.

Assim, tendo a decisão da reclamação graciosa aplicado o que foi decidido pela entidade que concedeu a isenção, aquela decisão não viola o princípio da legalidade, ao não anular os actos de retenção na fonte relativos a rendas respeitantes a períodos diferentes do de 1 de abril de 2015 e 31 de outubro de 2015.

 

4.2.  Violação do princípio da justiça e da boa-fé, a que a AT se encontra vinculada, nos termos do artigo 266.º, n.º 2 da CRP

 

O artigo 266.º, n.º 2, da CRP estabelece que «os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé».

O artigo 55.º da LGT reafirma estes princípios no procedimento tributário estabelecendo que «a administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários».

A Requerente invoca jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sobre a aplicação do princípio da justiça, prevalecendo sobre o princípio da legalidade, em situações em que da violação deste não há prejuízo para o interesse público. (   )

Porém, isso não sucede na situação em apreço, pois da extensão do âmbito do reconhecimento da isenção resulta perda de receita para o Estado, designadamente o montante que a Requerente pretende obter com o presente processo.

Para além disso,  o artigo 28.º do EBF prevê um benefício fiscal que, por natureza, constitui  uma medida de carácter excepcional instituída para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impede (artigo 2.º, n.º 1, do EBF), pelo que o respectivo reconhecimento baseia-se em considerações de oportunidade assentes na ponderação dos referidos interesses conflituantes e não em considerações de justiça, que enformam a tributação geral, mas não (pelo menos, não necessariamente) os benefícios fiscais.

Neste específico caso, estabelece-se que «o Ministro das Finanças pode, a requerimento e com base em parecer fundamentado da Direcção-Geral dos Impostos, conceder isenção total ou parcial de IRS ou de IRC ...», o que revela se estar perante um benefício fiscal dependente de reconhecimento por um membro do Governo (e não qualquer outra entidade, designadamente a Autoridade Tributária e Aduaneira), a quem é atribuído um poder discricionário de definir o âmbito do benefício (total ou parcial) ponderando casuisticamente, relativamente a cada pedido de isenção, a relevância dos interesses públicos extrafiscais que estão em causa e o prejuízo para obtenção de receitas que a satisfação daqueles interesses pode justificar.

Em situações deste tipo, em que há uma deliberada intenção legislativa de reservar a decisão sobre a concessão do benefício fiscal a quem possui a globalidade da informação relevante, com ponderação casuística dos interesses extrafiscais e da tributação que se entrechocam, não é admissível que outras entidades (quer da Administração Tributária, quer judiciais) se substituam a quem a lei atribui o poder de decidir, nomeadamente com base em considerações de justiça, que não são o fundamento da atribuição do benefício. Nestes casos o controlo jurisdicional actua apenas sobre os limites da margem de livre apreciação e não sobre o seu conteúdo.

De qualquer forma, a ocorrer violação do princípio da justiça, ela deriva da decisão sobre o benefício fiscal e não da decisão da reclamação graciosa, que se limitou a aplicar o decidido por acto administrativo que subsiste na ordem jurídica. Esta mesma constatação vale quanto à alegada falta de razoabilidade do incumprimento do prazo de 4 meses para decidir o pedido de reconhecimento da isenção, conjugado com a exigência de que «tivesse sido prestada informação sobre aditamentos contratuais que já tinham tido lugar muito tempo antes». Também aqui, a alegada injustiça e o respectivo vício poderá afectar o acto em que se faz tal exigência e não o de indeferimento da reclamação graciosa, que nada inovando a este respeito, não pode ser anulado com fundamento nesse vício, como decorre do n.º 3 do artigo 53.º, do CPTA.

Estas considerações valem em relação à alegada violação do princípio da boa-fé, consubstanciada em que «não se pode aceitar como razoável que a AT se atrase, em mais de dois anos, na decisão de reconhecimento da isenção de IRC e venha, através de tal decisão, fazer exigências relativamente a aditamentos contratuais que, como a AT bem sabe, já tinham tido lugar no passado porque o prazo de vigência do Contrato que a AT estava a considerar (7 meses) já tinha sido ultrapassado».

Com efeito, essas exigências foram decididas no despacho de reconhecimento parcial do benefício fiscal, susceptível de impugnação pela Requerente, e não no de indeferimento da reclamação graciosa, que nada tem de inovador, limitando-se a constatar que, no que concerne aos períodos posteriores a outubro de 2015, não existindo uma decisão da entidade competente que reconheça o benefício fiscal, «não existe isenção fiscal».

Em suma, como bem diz a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta, «as retenções na fonte que foram mantidas em cumprimento do Despacho do Secretário de Estado», «o intuito da Requerente centra-se exclusivamente na pretensão da alteração das condições estatuídas naquele Despacho», «não sendo esta a sede própria para o fazer».

Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto estes vícios.

 

4.3. Questão da falta de fundamentação

  

A Requerente imputa à decisão da reclamação graciosa vício de falta de fundamentação, designadamente porque «em nenhum momento a AT apreciou ou analisou qualquer um dos argumentos apresentados pela Requerente em sede de exercício do direito de audiência prévia, tendo apenas repetido a parca argumentação que já constava do projeto de indeferimento da reclamação graciosa».

A exigência de fundamentação dos actos administrativos lesivos é feita no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, que estabelece, que «carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos».

Concretizando o conteúdo da fundamentação no procedimento tributário, o artigo 77.º da LGT que estabelece a regra geral de que «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária».

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender uniformemente que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. (   )

Assim, para a fundamentação ser considerada suficiente não é necessário que sejam apreciados todos os argumentos invocados pelos interessados no procedimento, mas sim que sejam perceptíveis as razões por que se decidiu no sentido em, que se decidiu.

No caso em apreço, são perceptíveis as razões pelas quais a reclamação graciosa foi indeferida, designadamente a constatação feita pela Autoridade Tributária e Aduaneira que o despacho que concedeu a isenção não a reconheceu relativamente a rendas respeitantes a períodos posteriores a outubro de 2015, como resulta do teor dos pontos 16, 17, e 30 a 34  da i9nformaçao em que se baseou a decisão:

– «o despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais invocado pela reclamante apenas concedeu a isenção total em sede de IRC relativamente às rendas de locação no período de 2015-04-01 a 2015-10-31 (7 meses), nos restantes termos descritos supra no ponto 5, pelo que o imposto devido sobre as rendas a partir de 2016-11-31 até 2016-10-31 está fora do perímetro legal da isenção conferida superiormente»;

– «os benefícios fiscais quando temporários caducam pelo decurso do prazo por que foram concedidos (n.º 2 do artigo 14.º do EBF);

– «no que concerne aos restantes períodos, como já mencionado anteriormente, não existe isenção fiscal»;

– «não foram objeto de análise nem escalpelizados nos seus contornos os contratos de locação em causa que se pretendem ver abrangidos pela isenção fiscal reconhecida para o período de 2015-04-01 a 2015-10-31»;

 – «independentemente da data de notificação da decisão de deferir e reconhecer aquele benefício fiscal, essa decisão tinha um objecto muito preciso e concreto, definido temporalmente»;

– «quaisquer alterações e extrapolações ao seu conteúdo seriam merecedoras de nova apreciação - o que não sucedeu»;

– «desta feita, não pode senão o pedido ser indeferido fora do perímetro temporal da isenção concedida».-

 

Assim, independentemente da correcção jurídica destas considerações, são perfeitamente perceptíveis as razões que levaram a Autoridade Tributária e Aduaneira a indeferir parcialmente a reclamação graciosa.

Por isso, a decisão da reclamação graciosa não enferma de vício de falta de fundamentação.

 

4.4. Pedido subsidiário com base em erro da decisão da reclamação graciosa, relativo à quantificação do benefício fiscal, na parte em que foi deferida

 

A Requerente defende, a título subsidiário que «a anulação parcial da Decisão Contestada, na parte em que indefere o reembolso do montante de €24.906,11 correspondente à retenção na fonte de IRC do mês de outubro de 2015, sendo esse montante restituído à Requerente, acrescido dos juros indemnizatórios devidos, nos termos do disposto no artigo 43.º da LGT e de juros de mora, se a eles houver lugar».

A Autoridade Tributária e Aduaneira nada diz sobre esta matéria.

A Requerente tem razão quanto a esta questão, pois, à face da decisão de concessão do benefício fiscal, a renda referente ao mês de outubro de 2015 é abrangida pela isenção.

O facto de a declaração respectiva ter sido apresentada em novembro de 2015, não obsta a que se aplique a isenção, pois no despacho de concessão referem-se as «rendas de locação pagáveis mensalmente» no período de sete meses de 01-04-2015 a 31-10-2015, pelo que releva o mês a que se reporta a renda e não o mês em que é feito o pagamento do imposto retido. De resto, só assim se podem contar os sete meses que são abrangidos pela isenção.

Pelo exposto, a decisão da reclamação graciosa enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto ao não deferir a pretensão da Requerente de anulação do acto de retenção na fonte relativo ao mês de outubro de 2015, vício este que justifica a anulação da referida retenção e da decisão da reclamação graciosa na parte em que a manteve.

 

5. Juros indemnizatórios

 

A Requerente pede juros indemnizatórios.

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

No caso em apreço, na sequência da aplicação da isenção, a retenção na fonte relativa ao mês de outubro de 2015 passa a ser indevida, pelo que há lugar a restituição do imposto pago, por força dos referidos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois, após a concessão da isenção, esse pagamento não é devido.

O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

A ilegalidade da decisão da reclamação graciosa, na parte relativa à retenção na fonte respeitante ao mês de outubro de 2015, é imputável à Administração Tributária, que a indeferiu por sua iniciativa, quando tinha na sua posse, a partir de 06-08-2018,  todos os elementos que lhe permitiam apurar que esse pagamento estava abrangido pela isenção, como decorre das alíneas gg) e hh) da matéria de facto fixada.

O prazo legal para proferir decisão, na sequência da apresentação dos documentos pela Requerente, é de 8 dias, nos termos do artigo 57.º, n.º 2, da LGT, pelo que a decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa deveria ser proferida até 16-08-2018.

Esta situação de a Autoridade Tributária e Aduaneira manter uma situação de ilegalidade, quando devia repô-la, deverá ser enquadrada, por mera interpretação declarativa, no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, pois trata-se de uma situação em que há nexo de causalidade adequada entre um erro imputável aos serviços e a manutenção de um pagamento indevido e a omissão de reposição da legalidade quando se deveria praticar a acção que a reporia deve ser equiparada à acção. (   )

Assim, a partir de 17-08-2018, o erro que afecta a decisão da reclamação graciosa é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, pelo que são devidos juros indemnizatórios a partir dessa data.

Os juros indemnizatórios são devidos, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, à taxa legal supletiva, e contados desde a data em que o erro passou a ser imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira (17-08-2018) até à data do processamento da respectiva nota de crédito e calculados sobre a quantia de € 24.906,11.

 

6. Decisão

 De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em

a)            Julgar totalmente improcedente o pedido principal e absolver do mesmo a Autoridade Tributária e Aduaneira;

b)           Julgar procedente o pedido subsidiário e anular o acto de retenção na fonte referente ao mês de outubro de 2015 (documento n.º..., junto com o pedido de constituição do tribunal arbitral), bem como a parte da decisão de indeferimento da reclamação graciosa que o manteve;

c)            Julgar procedente o pedido subsidiário de reembolso da quantia de € 24.906,11, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a Requerente dessa quantia;

d)           Julgar procedente o pedido subsidiário de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-los a Requerente nos termos indicados no ponto 5 do presente acórdão.

 

6. Valor do processo

 De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 305.518,88.

 

7. Custas

                Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 5.508,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente na percentagem de 91,85% e a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira na percentagem de 8,15%.

 

Lisboa, 14-05-2019

Os Árbitros

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

(João Taborda Gama)

 

(Henrique Nogueira Nunes)