Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 539/2018-T
Data da decisão: 2019-04-22  IRS  
Valor do pedido: € 24.794,42
Tema: IRS - IRS de 2017 sobre mais-valias mobiliárias e imobiliárias de residente na União Europeia.
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DECISÃO ARBITRAL

I - RELATÓRIO

 

1 - DAS PARTES E DA CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL

 

            1.1 - A..., casado, contribuinte fiscal número ..., residente em ..., n.º..., ..., ..., Madrid, Espanha, doravante designado por Requerente, vem nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1 do Regime Jurídico da Arbitragem (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, solicitar pronúncia arbitral para a declaração de ilegalidade parcial da liquidação n.º 2018..., relativa ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), para o ano de 2017, no montante de €47.034,56.

            A liquidação em causa encontra-se devidamente identificada e junta aos autos (doc. n.º 8), bem o comprovativo do seu pagamento (doc.s 9 e 10).

            Esta liquidação, impugnada pelo Requerente, constitui uma segunda liquidação, por erro da primeira por parte dos Serviços da Administração Tributária.

 

            1.2 - O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado pela Requerente em 31 de outubro de 2018, tendo sido aceite pelo Senhor Presidente do CAAD. O Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, foi designado pelo Conselho Deontológico do CAAD o signatário, Dr. José Rodrigo de Castro, em 07-12-2018, encargo que aceitou em 10-12-2018, do que foram notificadas as Partes em 20 do mesmo mês.

 

            1.3 - Por despacho de 10 de janeiro de 2019, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico deu por constituído o tribunal arbitral, determinando, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, que se procedesse aos pertinentes trâmites legais.

 

            1.4 - As Partes foram notificadas da constituição do tribunal nessa mesma data de 10 de janeiro de 2019.

 

            1.5 - Ainda nessa mesma data foi proferido despacho arbitral, determinando-se a notificação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) para apresentar resposta no prazo legal e envio do respetivo processo administrativo, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT.

 

            1.6 - A Requerida juntou aos autos a sua resposta em 13-02-2019, que se dá aqui por reproduzida, sem processo administrativo por não ter sido aberto.

 

            1.7 - Em 13 de fevereiro de 2019 foi proferido despacho arbitral, dispensando a realização da Reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em razão da inexistência de prova testemunhal e de se tratar apenas de matéria de direito, com notificação das partes paras alegações escritas facultativas e designando o dia 30 de abril para a prolação da decisão.

 

            1.8 - Não foram proferidas alegações escritas por qualquer das partes, até esta data, apesar de o prazo limite dado ser até 12 de março de 2019.

 

 

 

2 - DO PEDIDO FORMULADO PELO REQUERENTE

 

            2.1 - O Requerente, residente à data de 2017, em Madrid, Espanha, apresentou o seu pedido de pronúncia arbitral para a declaração de ilegalidade parcial da liquidação n.º 2018..., relativa ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), para o ano de 2017, no montante de €47.034,56.

 

            2.2 - A liquidação impugnada respeita à tributação da totalidade do saldo positivo das mais-valias imobiliárias realizadas, e não apenas a 50% do seu valor, saldo esse que respeita à alienação oneração dos seguintes bens imóveis participações sociais:

 

            a) Fração autónoma designada pela letra C, a que corresponde o 1.º andar D.to, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua ..., n.º ..., ..., freguesia de ..., concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz da freguesia de ... sob o artigo ... (Doc. 4), por escritura de 15/09/2017, pelo preço de €255,000,00 (Doc. 3).

 

            A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €90.000,00, por escritura pública de 20/04/2015 (Doc. 2).  

 

            b) Fração autónoma designada pela letra F, a que corresponde o 2.º andar Esq.º, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua ..., n.º..., em ..., concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (Doc. 4), por escritura de venda de 21/03/2017, pelo preço de €155,000,00 (Doc. 5).

 

            A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €55.000,00, por escritura pública de 10/11/2015 (Doc. 4).

 

            c) Participações sociais vendidas 06/10/2017, pelo montante de €21.290,10, que havia adquirido em 26/08/2014, pelo preço de €19.805,40.

 

            d) No ano de 2017, o Requerente, ainda auferiu rendimentos prediais na importância de €4.300,00.   

 

            2.3 - O Requerente apresentou a sua Declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, com o Anexo G, declarando para efeitos de mais-valias os valores de aquisição e de venda dos referidos prédios urbanos, participações sociais, valor de despesas e encargos e rendimentos prediais (Doc. 6). 

 

            2.4 - A sua declaração foi aceite e validada pela Autoridade Tributária, dando origem à liquidação n.º 2018..., com um montante de imposto a pagar de €46.551,36 (Doc. 7), posteriormente retificada por uma 2.ª liquidação com o n.º 2018..., com um valor de imposto a pagar de €47.034,56, originando um estorno do montante a pagar, em relação à 1.ª liquidação, de €483,20 (Doc.8).

 

            2.5 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 e também de €483,20, num total de €47.034,56 (Doc.s 9 e 10).

 

            2.6 - O Requerente fundamenta o seu pedido de pronúncia arbitral pelo facto de a Autoridade Tributária ter considerado a totalidade do saldo positivo das mais-valias imobiliárias realizadas, e não apenas 50% do seu valor, aplicando àquele saldo positivo total a taxa de 28%, prevista no artigo 72.º, n.º 1 do CIRS, apesar de se tratar de um residente na União Europeia.

 

            2.7 - Entende, por isso, o Requerente que a Autoridade Tributária praticou uma discriminação negativa injustificada em relação aos residentes, proibida pelo Direito Comunitário, designadamente o artigo 62.º, n.º 1 do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), o que determinou uma tributação excessiva em IRS.

 

            2.8 - E considera que o total do saldo positivo das mais-valias imobiliárias que deveria ter sido tributado seria de €81.408, 63, sendo € 46.862,68 relativamente ao artigo ... e €34.545,95 relativamente ao artigo ..., apurado pela Requerente, que considerou a correção monetária, as despesas e encargos e apenas 50% das mais-valias, a que aplicando a taxa de tributação autónoma de 28% lhe daria, segundo cálculos do Requerente, o valor de imposto a pagar, relativamente a estas mais-valias de €22.749,42, ou seja, (€46.862,68 + €34.545,95) X 28%. [1]

 

            2.9 - Mais refere que o TJUE, no seu Acórdão de 11/10/2007, P.º C-443/06, veio a considerar que o artigo 43.º, n.º 2 do CIRS, ao estabelecer um regime diferenciado entre os residentes em território português e os residentes na União Europeia, violava o artigo 56.º do Tratado das Comunidades Europeias.

 

            2.9.1 - Mais refere a seguinte Jurisprudência no mesmo sentido:

 

            a) Os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 22/03/2011, Processo n.º 1031/10 e de 30/04/2013, Processo 01374/12,

 

            b) Bem como os Processos do CAAD n.ºs 45/2012-T, 127/2012-T e 748/2015-T.

 

 

3 - DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

            3.1 - A Requerida AT - Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou oportunamente a sua Resposta, referindo ab initio que nada tem a impugnar relativamente aos factos vertidos no pedido de pronúncia arbitral (artigos 1.º a 12.º).

 

            3.2 - E porque não ocorreu nenhum procedimento administrativo - nem reclamação graciosa nem recurso hierárquico - não existe processo administrativo, por se tratar de matéria exclusivamente de direito.

 

            3.3 - E a este respeito, realça que a matéria relativamente à qual foi suscitada a apreciação do Tribunal Arbitral, reporta-se à exclusão do Requerente (residente num Estado-membro da EU - a Espanha) da incidência de imposto de mais-valias imobiliárias tributadas apenas em 50%, tal como acontece com os residentes em território português, com alegada violação do Direito Comunitário.

 

            3.4 - E a Requerida realça que o Requerente entende que o disposto no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS se aplica aos não residentes em Portugal, mas residentes num Estado-Membro da União Europeia.

 

            3.5 - A Requerida reconhece que no Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 2007OUT11, foi decidida a contrariedade com o Direito Comunitário da disciplina da tributação das mais-valias imobiliárias de não residentes, resultante dos artigos 72.º, n.º 1 e 43.º, n.º 2 do Código do IRS, por entender que "o artigo 56.º CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel".

 

            3.6 - Mais refere a AT que no seguimento desse Acórdão, também o Supremo Tribunal Administrativo, no seu Acórdão de 2008JAN16 (Processo 0439/06), se pronunciou no mesmo sentido.

 

            3.7 - Argumenta, porém, a AT que tendo em conta o teor do Acórdão do TJCE de 2007OUT11, foi adaptada a legislação nacional àquelas decisões, para o que foi aditado ao artigo 72.º do Código do IRS, pela Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, o n.º 7 (atual n.º 9), cujo teor foi o seguinte:

 

            "7 (atual 9) - Os residentes noutro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal, podem optar, relativamente aos rendimentos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 e no n.º 2, pela tributação desses rendimentos à taxa que, de acordo com a tabela prevista no n.º 1 do artigo 68.º, seria aplicável no caso de serem auferidos por residentes em território português."

 

            3.8 - Mais refere a Requerida AT que, por sua vez, o n.º 8 (atual n.º 10) do mesmo artigo e diploma legal, também aditado pela referida Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, prescrevia, à data dos factos, que:

 

            "8 (atual 10) - Para efeitos de determinação da taxa referida no número anterior são tidos em consideração todos os rendimentos, incluindo os obtidos fora deste território, nas mesmas condições que são aplicáveis aos residentes."

 

            3.9 - Salienta ainda a Requerida que a referida Lei n.º 67.º-A/2007, de 31/12, é o Orçamento de Estado para 2008.

 

            3.9.1 - E que é por força das alterações legislativas antes referidas, que as declarações de rendimentos respeitantes aos anos fiscais de 2008 (em vigor a partir de janeiro de 2009) e seguintes, mais concretamente o Modelo 3, contêm um campo para ser exercida a opção pela taxa do artigo 68.º do Código do IRS, aplicável aos residentes.

 

            3.9.2 - E que, portanto, a aplicação das taxas do artigo 68.º do Código do IRS aos residentes num Estado-Membro dependia do exercício da opção referida no aditado n.º 10 do artigo 72.º, o que o Requerente não fez na sua Declaração de substituição relativa ao ano de 2017.

 

            3.9.3 - Esclarece a Requerida, que se verifica, de facto, que no quadro 8 B do Modelo 3 foram assinalados pelo Requerente o campo 4 (não residente), o campo 6 (residência em país da União Europeia) e o campo 7 (pretende a tributação pelo regime geral aplicável aos não residentes).

 

            3.9.4 - Entende, assim, a Requerida que as alegações do Requerente não podem obter provimento, face às alterações introduzidas pela Lei do OE n.º 67.º-A/2007, de 31/12.

 

            3.9.5 - Por outro lado, lembra a Requerida que nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Código do IRS, "sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território".

 

            3.9.6 - E conclui que para efeitos de tributação do Requerente pelas taxas do artigo 68.º, ou seja, como residente, era condição necessária ter preenchido os campos 9 (opção pelas taxas do artigo 68.º do Código do IRS) e o quadro 11 (total dos rendimentos obtidos no estrangeiro) - o que não aconteceu por opção do próprio Requerente.

 

            3.9.7 - A Requerida realça ainda que a norma do artigo 43.º, n.º 2 do Código do IRS, que o Requerente pretende que lhe seja aplicada, insere-se no capítulo II do CIRS, da Determinação do rendimento coletável, o que não é legalmente possível aplicá-la, porquanto para efeitos de incidência, no que toca à matéria das mais-valias, os artigos relevantes são o 9.º e o 10.º do mesmo Código.

 

            3.9.8 - Por todo o exposto e porque o quadro legal existente (bem como a obrigação declarativa) já não são os mesmos que existiam à data do Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, por forças das referidas alterações introduzidas pela Lei do OE n.º 67.º-A/2007, de 31/12, não vê a Requerida que assista razão ao Requerente e entende que deve ser mantida na ordem jurídica a liquidação n.º 2018..., referente ao IRS de 2017. 

 

II - SANEAMENTO

 

1. - O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

 

2. - As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas, nos termos dos artigos 4 e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de março.

 

3. - O processo não padece de vícios que invalidem a sua apreciação.

 

4. - Face à prova documental junta aos autos, não contestada pelas partes, cumpre fixar a matéria de facto relevante para a decisão e proceder à prolação da mesma.

 

III - MATÉRIA DE FACTO

 

A) - Factos provados

 

O Tribunal considera como matéria de facto relevante os seguintes factos:

 

1 - O Requerente era residente à data de 2017, em Madrid, Espanha, ou seja, era residente num Estado-Membro da União Europeia, como comprovou;

 

2 - O Requerente apresentou a sua Declaração Modelo 3 de IRS, de substituição, com o Anexo G, declarando para efeitos de mais-valias os valores de aquisição e de alienação onerosa de dois prédios urbanos, participações sociais, valor de despesas e encargos e rendimentos prediais (Doc. 6).

 

3 - Verifica-se pelo Rosto da Declaração Mod. 3 que no quadro 8 B foram assinalados pelo Requerente o campo 4 (não residente), o campo 6 (residência em país da União Europeia) e o campo 7 (pretende a tributação pelo regime geral aplicável aos não residentes).

 

4 - E verifica-se também que o Requerente não preencheu os campos 9 (opção pelas taxas do artigo 68.º do Código do IRS) e 11 (total dos rendimentos obtidos no estrangeiro).

 

5 - Os referidos bens alienados e rendimentos declarados foram todos auferidos todos em território português e eram os seguintes:

 

            3.1 - Fração autónoma designada pela letra C, a que corresponde o 1.º andar D.to, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua ..., n.º..., freguesia de..., concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz da freguesia de ... sob o artigo ... (Doc. 4), por escritura de 15/09/2017, pelo preço de €255,000,00 (Doc. 3).

 

            A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €90.000,00, por escritura pública de 20/04/2015 (Doc. 2).  

 

            3.2 - Fração autónoma designada pela letra F, a que corresponde o 2.º andar Esq.º, destinado à habitação, do prédio urbano sito na Rua ..., n.º..., em ..., concelho de Lisboa, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ... (Doc. 4), por escritura de venda de 21/03/2017, pelo preço de €155,000,00 (Doc. 5).

 

            A referida fração havia sido adquirida pelo preço de €55.000,00, por escritura pública de 10/11/2015 (Doc. 4).

 

            3.3 - Participações sociais vendidas 06/10/2017, pelo montante de €21.290,10, que havia adquirido em 26/08/2014, pelo preço de €19.805,40.

 

            3.4 - Rendimentos prediais de €4.300,00 respeitantes às rendas relativas às duas frações autónomas alienadas, referidas nos pontos anteriores, sem menção de encargos ou retenções por conta.   

 

 6 - A sua declaração foi aceite e validada pela Autoridade Tributária, dando origem à liquidação n.º 2018..., com um montante de imposto a pagar de €46.551,36 (Doc. 7), posteriormente retificada por uma 2.ª liquidação com o n.º 2018..., com um valor de imposto a pagar de €47.034,56, originando um estorno do montante também a pagar, em relação à 1.ª liquidação, de €483,20 (Doc.8).

 

7 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 em 24-08-2018 e também de €483,20 na mesma data, num total de €47.034,56 (Doc.s 9 e 10).

 

8 - Pela demonstração da 2.ª liquidação de IRS, com o n.º 2018..., conforme certidão junta aos autos, constata-se o apuramento de um rendimento global e coletável de €167.980,58 e a coleta de €47.034,56 (à taxa de 28%).

 

 

9 - O Requerente procedeu ao pagamento da quantia de €46.551,31 e também de €483,20, num total de €47.034,56, em 24-08-2018 (Doc.s 9 e 10).

 

B) - Factos não provados

 

Não existem factos invocados que não se mostrem comprovados nos autos.

 

C) - Fundamentação dos factos provados

 

Todos os factos anteriormente descritos e invocados pelo Requerente (não há processo administrativo) têm por base prova documental junta aos autos, considerando-se, portanto, provados e não contestados e relevam para a decisão a proferir.

 

IV - DO DIREITO

 

Fixada a matéria de facto, importa conhecer do direito a aplicar.

 

1 - Nos presentes autos está em causa, segundo petição da impugnação, saber se no caso das mais-valias resultantes da alienação das duas frações autónomas descritas no processo, se deve aplicar o regime de tributação igual ao aplicável aos residentes, sem discriminação negativa quanto a estes, em obediência ao Direito Comunitário.

 

2 -  A liquidação impugnada respeita à tributação da totalidade do saldo positivo das mais-valias imobiliárias realizadas, e não apenas a 50% do seu valor, saldo esse respeitante à alienação oneração dos bens imóveis e das mais-valias das participações sociais descritas.

 

3 - O Requerente fundamenta o seu pedido de pronúncia arbitral pelo facto de a Autoridade Tributária ter considerado a totalidade do saldo positivo das mais-valias imobiliárias realizadas, e não apenas 50% do seu valor, com violação do disposto no artigo 43.º, n.º 2 do CIRS, embora aceite que lhe seja aplicado ao saldo positivo das referidas mais-valias imobiliárias, como sugere nos seus cálculos constantes do artigo 20.º da PA, a taxa autónoma de 28%, prevista no artigo 72.º, n.º 1 do CIRS, aplicável aos não residentes.

 

4 - Entende, por isso, o Requerente que a Autoridade Tributária praticou uma discriminação negativa injustificada em relação aos residentes, proibida pelo Direito Comunitário, designadamente o artigo 62.º, n.º 1 do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), o que determinou uma tributação excessiva em IRS.

 

5 - E apresenta no artigo 19.º da sua PA cálculos do apuramento das mais-valias dos imóveis alienados (artigos matriciais ... e ...) no valor, respetivamente, de € 46.862,68 e €34.545,95, depois de ter aplicado a respetiva correção monetária de 1,01 para os anos de 2012 e 2015 e os encargos e despesas respetivamente de €70.374,65 e €30.358,10, para além da aplicação aos saldo positivos assim obtidos de, respetivamente, €93.725,35 e €69.091,90, a redução de 50% nos termos do artigo 43.º, n.º 2 do CIRS. 

 

5 - Importa, pois, saber se a diferenciação no tratamento dado pela AT na liquidação efetuada de acordo com a legislação nacional, prevista nos artigos 10.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 72.º, n.º 1, ambos do Código do IRS, na redação em vigor à data dos factos, sem consideração do disposto no artigo 43.º, n.º 2, viola as disposições do Direito Comunitário, designadamente os artigos 18.º e 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

 

6 - Saliente-se que o Requerente não questiona a aplicação dos referido saldo da taxa autónoma de 28% prevista no n.º 1, alínea a) do artigo 72.º do CIRS, aplicável ao saldo das mais-valias resultantes de alienação de imóveis por não residentes.

7 - Questiona apenas, recorde-se, a não aplicação do disposto no artigo 43.º, n.º 2 do CIRS, que reduz a 50% o saldo a tributar das mais-valias de imóveis obtidas por residentes.

 

8 - E o Requerente remete, em defesa da sua tese, para o Acórdão de 11/10/2007, Processo C-443/06, que veio a considerar que o artigo 43.º, n.º do CIRS ao estabelecer um regime diferenciado para os residentes em Portugal e para os residentes noutros Estados da União Europeia, violava o artigo 56.º do Tratado da Comunidade Europeia.

 

9 - E citou também, os Acórdãos do STA do STA de 22/3/2011, Processo n.º 1031 e o de 30/4/2013, Processo 01374/12, bem com os as Decisões Arbitrais proferidas nos Processos n.ºs 45/2012-T, 127/2012-T e 748/2015-T.

 

10 - Contrapõe a Requerida que o quadro legal (bem como a obrigação declarativa) já não é aquele que existia à data do Acórdão do TJCE citado, tendo em conta as alterações introduzidas pela Lei (do OE) n.º 67.º-A/2007, de 31/12, e o aditamento dos n.ºs 7 e 8 (atuais 9 e 10) ao artigo 72.º do Código do IRS.

 

11 - Relativamente à restante Jurisprudência citada pelo Requerente, não se verificam exatamente todos os circunstancialismos verificados no caso dos autos, pelo que não é relevante para a decisão do mérito da causa.

 

12 - Salienta, ainda, a Requerida que o artigo que o Requerente pretende que lhe seja aplicado (43.º, n.º do CIRS), está incluso no capítulo II do CIRS que tem como epígrafe "Determinação do rendimento coletável", quando, para efeitos de incidência, que é o que está em causa (no que toca à matérias das mais-valias) são os artigos 9.º e 10.º do CIRS,

 

13 - Pelo que entende que o n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS não pode ser aplicável ao caso em análise.

 

14 - Apresenta-se, pois, neste processo, uma dupla situação que encerra incongruências, entre si, quanto ao que o Requerente pretende, porquanto:

            a) Por um lado, pretende a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, que é aplicável às mais-valias obtidas em território português, que, de facto manda considerar a tributação de 50% saldo das mais-valias de imóveis, respeitantes às transmissões efetuadas por residentes, previstas na alínea a)[2] do n.º 1 do artigo 10.º.

 

            b) Por outro lado, exige que seja feita uma tributação do referido saldo, reduzido em 50%, com aplicação da taxa aplicável a não residentes de 25%, conforme opção de tributação pelo regime geral, conforme campo 07 do quadro 8B da sua Declaração mod. 3 de IRS, e não pela aplicação das taxas gerais do artigo 68.º e das demais regras aplicáveis aos residentes.

 

15 - Ora, esta forma de tributação mista, de escolha do melhor dos regimes de tributação, ou seja, ser considerado como residente para efeitos de aplicação do artigo 43.º, n.º 2 e não residente para efeitos de aplicação da taxa do artigo 72.º, n.º 1, ambos do CIRS, o que é incongruente e inaplicável, e nem sequer se pode argumentar que há violação dos Tratados da União Europeia, por não se estar perante uma qualquer discriminação.

 

16 - Isto porque o Requerente tinha ao seu dispor a possibilidade de ver tributadas as suas mais-valias de harmonia com todas as regras aplicáveis aos residentes, se, para tanto, tivesse feito essa opção, ao abrigo do n.º 9 do artigo 72.º do Código do IRS, como a lei lhe permite - o que não aconteceu.

 

17 - Assim, ao não ter optado pela tributação das suas mais-valias imobiliárias, pela aplicação das taxas do artigo 68.º do CIRS e das demais regras aplicáveis aos residentes, mas sim pelas taxas gerais, não assiste razão ao Requerente.

 

18 - Aliás, nem aos residentes as normas do CIRS permitem esta dualidade de tratamento, ou seja, redução a 50% das mais-valias imobiliárias e aplicação das taxas do artigo 72.º do CIRS, obrigando sempre, neste caso, ao englobamento deste saldo com os demais rendimentos para aplicação à totalidade dos rendimentos auferidos as taxas gerais do artigo 68.º do Código do IRS.

 

19. O regime escolhido pelo Requerente, embora invoque que é um residente na União Europeia, foi o da tributação pelas taxas do artigo 72.º aplicáveis a não residentes e não as aplicáveis a residentes, pelo que o regime escolhido deve ser aplicado "in toto", como procedeu, e bem, a Requerida, no entender do Tribunal.

 

19 - Assim sendo, não se poderá invocar a discriminação negativa como pretende o Requerente e isto porque as suas opções foram respeitadas.

 

20- Recorda-se que o Acórdão do TJCE de 2007OUT11 (Hollman) foi proferido antes das alterações introduzidas ao artigo 72.º do CIRS, já anteriormente citadas, precisamente para permitir uma tributação igualitária entre residentes em território português e não residentes, desde que os sujeitos passivos o requeiram - o que não foi o caso. 

 

20 - Nesta conformidade, entende este Tribunal que a liquidação impugnada não sendo incompatível com o disposto no artigo 63.º do TFUE, dada a opção do Requerente, julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica a liquidação n.º 2018..., relativa ao ano de 2017 e no valor de €47.034,56.

 

 

V - JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

Embora se reconheça legitimidade ao Requerente para solicitar o pagamento dos juros indemnizatórios devidos nos termos do disposto no artigo 43.º da Lei Geral Tributária, e o Tribunal ser competente em razão da matéria, a verdade é que não tendo sido proferida declaração de ilegalidade da liquidação em causa e consequente anulação do montante do IRS que reclamava como indevidamente pago, não se mostram preenchidos os pressupostos previstos no artigo 43.º da Lei Geral Tributária para exigência legal dos mesmos. 

             

 

VI - DECISÃO

 

Termos em que se decide:

            a) Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada.

            b) Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a favor do Requerente.

            c) Condenar o Requerente ao pagamento integral das custas do processo.

 

 

VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em €24.794,42, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a) do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

 

 

CUSTAS

 

Fixa-se o valor das custas em €1.530,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem, a pagar pelo Requerente, visto que o pedido foi integralmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT e artigo 4.º, n.º 4 do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 22 de abril de 2019.

 

                                                O Árbitro do Tribunal Arbitral Singular,

 

José Rodrigo de Castro

                                              

                                              

 



[1] Refira-se que este cálculo efetuado pelo Requerente, mesmo a ser tido como válido em termos legais, se mostra incorreto, porquanto (€46.862,68 + €34.545,95) X 28% = €22.816,20 e não € 22.794,42 como refere.

 

[2] Para o caso que importa aos autos.