Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 438/2018-T
Data da decisão: 2019-03-01   Outros 
Valor do pedido: € 10.894,99
Tema: AIMI - Terrenos para construção. Inconstitucionalidade.
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Decisão Arbitral

 

 

I - Relatório

1. A A... S. A., pessoa coletiva n.º..., com sede no Lugar ..., ...-... ... (doravante designado por “Requerente”), apresentou, em 04-09-2018, um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do artigo 2.º n.º 1, alínea a) e do artigo 10.º, n.ºs 1 e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66- B/2012, de 31 de Dezembro (doravante abreviadamente designado “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

2. A Requerente pretende a pronúncia do Tribunal Arbitral com vista a declarar a ilegalidade do ato de liquidação de Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”) n.º 2017..., relativo ao ano de 2017, no valor de €10.894,99 (dez mil oitocentos e noventa e quatro euros e noventa e nove cêntimos), e, bem assim, do despacho proferido pelo Diretor Adjunto da Direção de Finanças de … que indeferiu a reclamação graciosa n.º ...2018... sobre o mencionado ato de liquidação.

3. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada por “Requerida”).

4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 05-09-2017.

5. Nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular o Exmo. Senhor Dr. Olívio Mota Amador que, no prazo aplicável, comunicou a aceitação do encargo.

6. A Requerente foi notificado, em 24-10-2018, da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar a designação, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

7. De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 14-11-2018.

8. A Requerida, devidamente notificada através do despacho arbitral, de 19-11-2018, apresentou, em 20-11-2018, a sua Resposta.

9. Em 20-11-2018, a Requerida juntou aos autos o Processo Administrativo.

10. O Tribunal Arbitral por despacho, de 11-01-2019, determinou: (i) dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, considerando que não foi invocada matéria de exceção nem existe prova a produzir; (ii) caso as partes pretendam proferir alegações escritas, estas deverão ser produzidas no prazo de 10 dias, com caracter sucessivo, a partir da notificação do presente despacho; (iii) indicar o dia 28 de fevereiro de 2019 como prazo limite para a prolação da decisão arbitral.

11. A Requerida, em 18-01-2019 requereu a junção aos autos da Decisão Arbitral de 15-01-2019, proferida no processo n.º 420/2018-T.

12. O Tribunal Arbitral por despacho, de 08-02-2018, concedeu à Requerente o prazo de cinco dias para se pronunciar, querendo, sobre do documento apresentado perla Requerida. A Requerente não se pronunciou.

13. A Requerente e a Requerida não apresentaram alegações.

14. A posição da Requerente, de harmonia com o disposto no pedido de constituição do Tribunal Arbitral, é, em síntese, a seguinte:

14.1. Como decorre do n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI, verifica-se que o AIMI incide sobre os imóveis com afetação habitacional, bem como os terrenos para construção, independentemente da sua afetação – na medida em que os mesmos não constam expressamente na norma de delimitação negativa de incidência.

14.2. Considerando que é inegável o paralelismo entre a Verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo e a configuração atual do AIMI, pretende a ora Requerente demonstrar que o AIMI padece dos mesmos vícios que o seu precedente. Sobretudo porque, relativamente aos imóveis essenciais na obtenção de rendimentos no âmbito da atividade económica, carece de idêntica sustentação material no plano tributário.

14.3. Este Tribunal Arbitral Tributário veio a entender de forma unânime que os terrenos para construção não podem ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto do Selo, como prédios urbanos com afetação habitacional.

14.4. Neste contexto, e atendendo ao espírito que presidiu à Proposta de Lei do Orçamento de Estado para 2017, de onde brotou o AIMI, é de concluir que se visou tributar a titularidade de património imobiliário por revelar uma superior capacidade contributiva de quem os detém, concretizando, assim, o princípio da repartição justa e da capacidade contributiva.

14.5. Desde logo, cumpre relembrar que os imóveis detidos pela ora Requerente, e que estão a ser alvo de tributação em sede de AIMI, são, face ao seu objeto social, essenciais para a obtenção de rendimentos no âmbito da sua atividade económica – eles próprios também sujeitos a tributação. Assim, a Requerente detém os imóveis em causa no âmbito da sua atividade e por causa dela. Efetivamente, a propriedade sobre os imóveis consiste, no caso de sociedades comerciais deste tipo, no substrato patrimonial da sua atividade económica, e na concretização de um verdadeiro meio essencial à prossecução do seu escopo. Pelo que falha em absoluto o pressuposto de que a propriedade sobre tais imóveis possa constituir manifestação de uma (ou de uma acrescida) capacidade contributiva que, por si só, deva ser sujeita a ablação por via tributária.

14.6. Vale isto por dizer que a tributação em AIMI deve necessariamente operar uma destrinça entre, por um lado, a titularidade de património imobiliário que, só por si, constitua uma manifestação de uma acrescida abastança económica. E, por outro lado, a titularidade de direitos reais sobre imóveis destinados ao exercício de uma atividade económica e que, como tal, possam ser reconhecidos como fatores de produção. Neste último caso, a dimensão e valor patrimonial de tais imóveis não constitui, nem pode constituir, a manifestação de uma riqueza que deva ser tributada mas, outrossim, materializa apenas um conjunto de elementos necessários e essenciais ao desenvolvimento de uma atividade económica.

14.7. Está assim criada, sem qualquer fundamento de base, uma gritante desigualdade no plano material entre as empresas que tenham decidido prosseguir uma atividade económica que pressuponha a detenção de imóveis, em relação a outras empresas cuja atividade não decorra da detenção de imóveis. Mais do que isso, estão legalmente criadas as condições para a constituição de manifestas situações de desigualdade material entre a Impugnante e empresas que, detendo bens imóveis, prossigam nos mesmos uma atividade comercial, industrial ou de prestação de serviços.

14.8. Ora, a configuração do facto tributário que opera a distinção entre diversas utilizações e destinações dos prédios, em função da correspondente atividade económica do seu titular – nomeadamente pela consideração daqueles que se encontram sujeitos à tributação em AIMI - não se encontra minimamente justificada face à finalidade da medida fiscal adotada, E, sobretudo, não salvaguarda devidamente as empresas que, para o desenvolvimento da sua atividade económica, carecem de deter imóveis – o que contribui decisivamente para a sua descriminação negativa no plano fiscal, sem qualquer justificação de base.

 

14.9. Com efeito, face ao desiderato expressamente enunciado dessa tributação, não se vislumbra qualquer motivo para discriminar negativamente os imóveis detidos por empresas que tenham por escopo social a realização de operações imobiliárias. Com o imposto em causa, trata-se de forma desigual, sem qualquer fundamento material de suporte, as empresas proprietárias de imóveis destinados ao exercício de uma atividade económica, relativamente às empresas que, pelo mesmo motivo, são proprietárias de imóveis classificados como “comerciais, industriais ou para serviços” – os quais são isentos de AIMI.

14.10. E, para mais, o valor considerado para aplicação do imposto não é um custo efetivo de produção, apurado e registado na contabilidade, mas sim o VPT determinado para efeitos fiscais.

14.11. Ora, os imóveis detidos por empresas que prosseguem atividades imobiliárias não são “património imobiliário de luxo”. Nessa medida, a tributação em causa constitui uma violação dos princípios da capacidade contributiva, da igualdade e da proporcionalidade - na medida em que o facto de a Requerente ter no seu inventário imóveis para construção, exploração ou venda, em nada exterioriza uma relevante capacidade contributiva digna de ser (diferente e autonomamente) tributada. O que é tão mais evidente quando se constata que outras empresas detentoras de imóveis de idêntico ou superior VPT, igualmente afetos à sua atividade económica, não estão sujeitas a semelhante tributação.

14.12. Quando na feitura das normas ocorrem desvios ao imperativo original que preside à tributação as mesmas serão inconstitucionais, por violação do princípio da capacidade contributiva, pois os contribuintes não serão tributados de acordo com a sua capacidade económica, nem por causa dos factos relativamente aos quais se justifica a incidência do imposto.  É o que sucede no caso dos autos – na medida em que não existe fundamento material minimamente percetível e racional para propugnar uma discriminação negativa, a nível fiscal, das empresas de cariz imobiliário.

14.13. A liquidação ora em apreciação viola o princípio da igualdade fiscal previsto no artigo 13.º da CRP e o princípio da capacidade contributiva previsto no artigo 104.º da CRP, na medida em que: (i) é baseada numa norma que trata de forma bem diferente contribuintes que se encontrem em situações idênticas, não sendo a medida da diferença aferida pela sua real capacidade contributiva; (ii) é baseada numa solução legal arbitrária e desprovida de qualquer fundamento material percetível ou racional.

14.14. Ao incidir sobre a propriedade de imóveis destinados ao exercício de uma atividade económica, sem qualquer fundamento bastante, deve ser desaplicado o artigo 135.º-B n.º 2 do CIMI por inconstitucionalidade material, na medida em que viola o princípio da igualdade tributária consagrado nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3 da CRP,

14.15. Devendo ser declarada ilegal a decisão e liquidação aqui impugnadas, porquanto, não atendem à diferente capacidade contributiva dos proprietários dos prédios sobre os quais incide, atingindo indiscriminadamente contribuintes com e sem a força contributiva que se pretendeu abarcar.

14.16. Constata-se a existência de uma diferenciação negativa, acrítica, arbitrária e aleatória, entre, por um lado, imóveis (habitacionais) detidos por empresas que os utilizam na prossecução da sua atividade, e, por outro lado, imóveis detidos por empresas que os afetam a indústria comércio e serviços. Sendo certo que não se vislumbra qualquer fundamento ou justificação minimamente plausível e racional para defender que “a progressividade global do sistema” sai reforçada através da tributação de imóveis detidos por empresas de cariz imobiliário. Acresce que tais sujeitos passivos de imposto são fiscalmente penalizados em relação a empresas que detenham no seu ativo fixo imóveis, de igual valor, destinados à indústria, comércio ou serviços.

14.17. Verifica-se que a norma legal em causa é manifestamente desequilibrada, desconforme e desadequada à prossecução do fim legal, a mesma é materialmente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade.

14.18. Verificamos, em conclusão, que estamos perante a violação de dois princípios basilares da Constituição Portuguesa, padecendo o artigo 135.º-B, n.º 1, do CIMI de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, na sua vertente da capacidade contributiva, bem como por violação do princípio da proporcionalidade

14.19. É convicção da Requerente que, face aos princípios constitucionais fiscais vigentes, o n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI deve ser reputado de materialmente inconstitucional, na parte em que não exclui do AIMI os terrenos para construção que figurem nas existências de sociedades de escopo imobiliário, por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, ínsitos nos artigos 13.º e 104.º, n.º 2 e 3, todos da CRP – a determinar a anulação da decisão e da liquidação impugnadas.

15. A posição da Requerida, expressa na resposta, pode ser sintetizada no seguinte:

15.1. Verifica-se que o AIMI incide sobre os prédios classificados como habitacionais e como terrenos para construção – independentemente da sua afetação potencial (atento o facto de a lei remeter, sem mais, para o artigo 6.º do CIMI) –, na medida em que os mesmos não constam expressamente na norma de delimitação negativa de incidência.

15.2. Atento o exposto, pode, pois, afirmar-se que, no que concerne ao AIMI incidente sobre os prédios urbanos de que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários pessoas coletivas e estruturas equiparadas (artigo 135.º-A/2 do CIMI), o imposto assume a natureza de imposto real, na medida em que a modelação do quantitativo a pagar abstrai da dimensão económica das entidades, designadamente a qualificação como pequena, média ou grande empresa, bem como não atinge a totalidade do património líquido das entidades.

15.3. Deste modo, não se pode qualificar o AIMI como um tributo de natureza pessoal, pois, por uma questão de rigor concetual, importa dizer que não se está perante um imposto pessoal, na linha da construção da doutrina. Deste modo, no que respeita às pessoas coletivas e estruturas equiparadas, o AIMI tem natureza de tributação real, refletindo desta forma a ideia que os elementos integrantes do património imobiliário detido por estas entidades desempenham, em regra, uma função económica, não representando, por isso, uma mera acumulação de riqueza. Importando ainda notar que o AIMI, na esteira do IMI, enquanto impostos imobiliários, inscrevem-se na categoria de impostos parcelares ou analíticos sobre o património.

15.4. O legislador afastou da incidência os prédios urbanos classificados como “industriais, comerciais ou de serviços” e “outros” mas, optou expressamente por manter outros prédios que também integram o ativo das empresas, como sejam os classificados como habitacionais ou os terrenos para construção, ao não os incluir na delimitação negativa consagrada.

15.5. Face às decisões do Tribunal Constitucional é claro que toda a argumentação da Requerente ao querer assacar uma qualquer desconformidade da liquidação ora em dissídio com a lei fundamental, não tem qualquer fundamento.

15.6. Nada na letra da lei autoriza a concluir que a intenção do legislador do AIMI tenha sido a de excluir de tributação os prédios urbanos que se encontrem afetos ao exercício de uma atividade económica. Pois, o único critério relevante para delimitar o âmbito da incidência objetiva é, tão-só, a tipologia de classificação dos prédios urbanos, prevista no artigo 6.º/1 do CIMI, para a qual remete expressamente o artigo 135.º-B/2.

15.7. O AIMI incidente sobre as pessoas coletivas e estruturas equiparadas reveste a natureza de um imposto real sobre o património imobiliário, constituído por prédios urbanos que preenchem os tipos visados pelo artigo 135.º-B/2, independentemente das classes do ativo em que se encontram inscritos – inventários, ativo fixo tangível ou ativo não corrente detido para venda. Portanto, a Requerente encontra-se sujeita ao AIMI pelos prédios urbanos de que seja proprietária, usufrutuária ou superficiária e que preencham as condições enunciadas naquele preceito do CIMI.

15.8. Acresce que, também a ratio legis da norma não permite conclusão contrária, pois o seu espírito não tem a amplitude pretendida pela Requerente. Assinalando a teleologia do AIMI, interpreta-se que este visa, primeiramente, atingir uma parcela do património dos sujeitos passivos do imposto, incidindo sobre os bens imóveis constitutivos de um património, reconhecível juridicamente como capital de uma determinada entidade (singular ou coletiva), independentemente de estar afeto a qualquer processo produtivo ou gerador de rendimentos – crê-se ser este o propósito do artigo 135.º-B/1 do CIMI.

15.9. Logo, como se viu, o universo de prédios urbanos sujeitos ao AIMI é apurado por recurso às restantes duas tipologias constantes do artigo 6.º/1: prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção. Nesta delimitação da incidência real, fica patente que o critério adoptado pretende ser universalmente objetivo, induzindo maior uniformidade e igualdade no tratamento dos prédios alvo da tributação, em detrimento de outros critérios que apelassem a verificações casuísticas sobre o destino efetivo dado aos prédios. É, pois, inequívoco que se está perante uma norma de incidência objetiva de caráter geral e abstrato, aplicável de forma indistinta a todos os casos em que se preencham os respetivos pressupostos de facto e de direito. Assim, contrariamente ao que a Requerente pretende fazer crer, não pode a ratio legis da exclusão de tributação prevista no artigo 135.º-B/2 do CIMI ter o alcance por si pretendido – isto é, abranger igualmente os prédios urbanos classificados como habitacionais e terrenos para construção, aí não mencionados, quando constituíssem bens objecto da atividade económica dos sujeitos passivos

15.10. E, ainda que os prédios aqui em dissídio que foram tributados possam revelar-se instrumentais das suas atividades, temos que os mesmos são idóneos a indicar que aquelas pessoas coletivas são titulares de bens que, em si mesmos, evidenciam uma específica abastança face aos demais proprietários imobiliários. Como se viu, atenta a formulação objetiva consagrada no artigo 135.º-B/2 do CIMI, foi, inquestionavelmente, afastado pelo legislador a opção casuística defendida pela Requerente, na qual se trata de invocar elementos de consistência económica muitíssimo variável e contingente, que dependem amplamente do modo de gestão, das situações conjunturais de enquadramento, do tipo de aproveitamento realizado dos prédios, da situação em cada ano dos ativos patrimoniais detidos. Não se deteta, pois, qualquer ilegalidade na sujeição ao AIMI dos prédios urbanos detidos pela Requerente.

15.11. Não cabe à Requerida proceder a interpretações corretivas de normas de incidência tributária, nem, como se explicita infra, a emitir juízos de constitucionalidade sobre normas aplicáveis, por a tanto não estar habilitada, contrariamente ao que sucede com os tribunais (artigo 204.º da Constituição [“CRP”]).

15.12. Nesta delimitação da incidência real, fica patente que o critério adotado pretende ser universalmente objetivo, induzindo maior uniformidade e igualdade no tratamento dos prédios alvo da tributação, em detrimento de outros critérios que apelassem a verificações casuísticas sobre o destino efetivo dado aos prédios. Com efeito, a diferente valoração e tributação de um imóvel com afetação habitacional, face a um imóvel destinado a comércio, indústria ou serviços, resulta da diferente aptidão dos imóveis em causa, a qual sustenta o diferente tratamento dado pelo legislador que, por razões económicas e sociais, decidiu, no âmbito da sua liberdade conformadora, afastar da incidência do imposto os imóveis destinados a outros fins que não os habitacionais. É, pois, inequívoco que se está perante uma norma de incidência objetiva de carácter geral e abstrato, aplicável de forma indistinta a todos os casos em que se preencham os respetivos pressupostos de facto e de direito. E, como se viu, o imposto em sindicância não visa uma tributação genérica do património.

15.13. Deste modo, o AIMI respeita uma tributação parcelar do património, sem visar especificamente empresas ou um tipo de empresas específico, pois compreende toda a espécie de sujeitos passivos que sejam titulares dos direitos reais enunciados sobre os prédios em causa, independentemente de assumirem carácter empresarial ou não, abrangendo, assim, para além de sociedades, fundações, associações, pessoas singulares.

15.14. Mas antes se divisa uma potencial discriminação negativa, derivada do facto de tais empresas –pois que comercializam prédios classificados como habitacionais e/ou terrenos para construção –ficarem com uma oneração adicional, quando em cotejo com a generalidade das demais pessoas coletivas. Quanto aos terrenos para construção, estes não se reconduzem a meros direitos de construção, de coisas futuras, e todos eles são bens autónomos, que, até, pela sua natural escassez, têm sempre valor económico intrínseco e, normalmente, cotação no mercado imobiliário (i.e., podem ser vendidos, trocados, dados como garantia de obrigações).

15.15. Ainda que os imóveis tributados possam revelar-se instrumentais da atividade económica, temos que os mesmos são idóneos a indicar que aquela pessoa coletiva é titular de bens que, em si mesmos, evidenciam uma específica abastança face aos demais proprietários imobiliários. Ou seja, a circunstância de um dado bem valer, como “fator de produção de riqueza", não é suficiente para contrariar a constatação que o correspondente titular detém um imóvel apenas acessível a detentor de peculiar capacidade contributiva e, assim, capacitado para suportar uma contribuição adicional para a desejada consolidação orçamental. Em sede de AIMI não faz sentido invocar jurisprudência referente à Verba 28.1 da TGIS, porque o AIMI ignora a potencial afetação dos terrenos para construção e porque se aplica indistintamente da qualidade do sujeito passivo, desde que seja titular de direitos reais sobre prédios urbanos abrangidos pelo artigo 135.º-B do CIMI.

15.16. Com efeito, na data da tributação em AIMI dos terrenos para construção, só cabe atender à própria realidade do terreno, tal como o mesmo é legalmente caracterizado, e tendo em conta o VPT constante da matriz. E não uma edificação futura, com a consequente espécie de prédio urbano que venha a surgir subsequentemente, incluindo as frações autónomas ou andares suscetíveis de utilização independente que possam existir.

15.17. Reitera-se, pois, que não cabe aqui qualquer hipótese de julgamento de inconstitucionalidade do AIMI com base na violação do princípio da igualdade, partindo-se de premissas que se baseiam numa comparação entre situações incomparáveis (i.e., de um lado o que é factual, do outro meros juízos de prognose, abstrações virtuais e especulações sobre situações não constituídas e que poderão nunca vir a ser constituídas).

15.18. Ademais, como qualquer imposto sobre o património, o AIMI está dissociado de uma eventual realização de lucro com a venda dos bens imóveis, bem como da existência, ou não, de situação líquida negativa ou positiva, relevando, para a economia do imposto, apenas o valor patrimonial dos terrenos para construção e prédios habitacionais. Mas sempre se dirá que, o facto de os imóveis serem bens de investimento, afetos a operações imobiliárias habitualmente desenvolvidas pelos proprietários, não afetando a capacidade contributiva revelada (como erradamente alega a Requerente), determinará que a tributação em AIMI seja suscetível de alguma atenuação no âmbito empresarial, já porque constitui custo da atividade, já pela possibilidade de repercussão (nos preços) que, em maior ou menor grau, sempre existe mesmo nos impostos sobre o rendimento das empresas

15.19. Assim, face ao exposto, não podendo ser imputado aos serviços da Requerida erro que, por si, tenha determinado o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido – uma vez que não estava na sua disponibilidade decidir de modo diferente daquele que decidiu – não pode senão concluir-se no sentido de que não são devidos juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

             

II - Saneamento

16. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

17. O tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído.

18. Não foram suscitadas exceções de que cumpra conhecer.

19. Não se verificam nulidades nem quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

20. Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.

III - Mérito

III.1. Matéria de facto

21. Factos provados

21.1. Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

A)           A Impugnante é uma sociedade que tem como objeto social a realização de urbanizações e construção de edifícios, o planeamento e gestão urbanística, a realização de estudos e consultadoria imobiliária, a compra e venda de terrenos e edifícios, e a revenda dos imóveis adquiridos para esse fim.

 

B)           A Impugnante, em 01-01-2017, era proprietária dos prédios urbanos – talhões de terrenos para construção - inscritos na matriz predial sob os artigos ...-... (Valor Patrimonial Tributário: € 2.716.180,00) e ...-... (Valor Patrimonial Tributário: € 7.567,48), situados na freguesia e concelho de ... .

 

C)           A Requerente foi notificada pelo Serviço de Finanças da ... da liquidação de AIMI, referente ao ano de 2017, sob o n.º 2017-..., efetuada em 30-06-2017, relativamente aos prédios identificados na alínea anterior, no montante de € 10.894,99.

 

D)           A Requerente, em 29-09-2017, procedeu ao pagamento do acto tributário referido, no montante global de € 10.894,99.

 

E)            A Requerente apresentou, em 01-02-2018, reclamação graciosa contra a liquidação, identificada na alínea C), que recebeu o n.º ...2018... .

 

F)            A reclamação graciosa, identificada na alínea anterior, foi indeferida por despacho, de 04-06-2018, do Diretor Adjunto da Direção de Finanças de ..., ao abrigo de delegação de competências, e notificada à Requerente através do ofício n.º..., de 04-06-2018, da Direção de Finanças de... .

21.2. Inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

21.3. Fundamentação da matéria de facto

Relativamente à matéria de facto, atendendo ao disposto no artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e no artigo 607.º, n.º 3, do Código do Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada.

Assim, de acordo com o disposto no artigo 596.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual foi estabelecida tendo em conta as questões de Direito suscitadas.

Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT, a prova documental e o Processo Administrativo, juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

III.2. Matéria de Direito

22. A questão principal a decidir nos presentes autos consiste em saber se o n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI na parte em que não exclui do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis os terrenos para construção, que figurem nas existências de sociedades de escopo imobiliário, deve ser considerado materialmente inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, ínsitos nos artigos 13.º e 104.º, n.ºs 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa.

23. Importa começar por referir que a Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro, Lei do Orçamento do Estado para 2017, introduziu o Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (“AIMI”), que entrou em vigor na data da referida lei, ou seja, a 1 de Janeiro de 2017.

A regulamentação do AIMI foi aditada ao Código do IMI através do capítulo XV, tendo por epígrafe “Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis”, compreendendo os artigos 135.º-A a 135.º-K .

Os n.ºs 1 e 3 do artigo 135.º-A do Código do IMI estabelecem que são sujeitos passivos do AIMI “as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português” a 1 de Janeiro do ano a que o referido Adicional diz respeito.

O n.º 2 do mesmo artigo dispõe que: “são equiparados a pessoas coletivas quaisquer estruturas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do imposto municipal sobre imóveis, bem como a herança indivisa representada pela cabeça de casal”.

O AIMI incide, de acordo com o n.º 1 do artigo 135.º-B do Código do IMI, “sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular” – sendo que, a esta soma, deverá ser deduzida a quantia de € 600.000 sempre que o sujeito passivo seja uma pessoa singular ou uma herança indivisa.

Foram excluídos da incidência objetiva do AIMI “os prédios urbanos classificados como “comerciais, industriais ou para serviços” e “outros” nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código”, conforme disposto no n.º 2 do artigo 135.º-B do Código do IMI.

A taxa aplicável é de 0,4% para pessoas coletivas e de 0,7% para pessoas singulares e heranças indivisas, sempre que o valor tributável não seja superior a € 1.000.000, nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-F do Código do IMI, sendo que, nos casos em que o valor tributável seja superior a € 1.000.000, é aplicável uma taxa de 1%, quando o sujeito passivo seja uma pessoa singular.

Nos termos do n.º 1 do artigo 135.º-G e do artigo 135.º-H, do Código do IMI, o AIMI é liquidado anualmente, no mês de Junho, com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios sujeitos a imposto e em relação aos sujeitos passivos que constem nas matrizes em 1 de Janeiro de cada ano, devendo o mesmo ser pago até ao final do mês de Setembro.

24. A Requerente começa por invocar a jurisprudência arbitral que se firmou em torno da Verba n.º 28 da Tabela Geral de Imposto do Selo, porque considera inegável o paralelismo entre a referida Verba e a configuração do AIMI. Assim, a Requerente pretende demonstrar que o AIMI padece dos mesmos vícios daquela Verba, sobretudo porque, relativamente aos imóveis essenciais na obtenção de rendimentos, no âmbito da atividade económica, carece de idêntica sustentação material no plano tributário (vd., 14.2. e 14.3. supra).

A este respeito importa sublinhar que a Verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo não tem o mesmo conteúdo normativo que a norma referente ao AIMI agora em apreciação. Como se afirma na Decisão Arbitral, de 26-06-2018, proferido no processo n.º 664/2017-T,  a inclusão no âmbito de incidência da Verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo “(…) de um terreno para construção a par de um prédio habitacional já edificado não reflecte a diferente capacidade contributiva dos respectivos proprietários, sendo essa a razão determinante do juízo de inconstitucionalidade. No caso vertente, ao contrário, para efeito da exclusão do Adicional ao IMI, pretende-se estabelecer a equiparação entre terrenos para construção e prédios urbanos comerciais, industriais ou para serviços na perspectiva inversa de que os terrenos para construção potencialmente utilizáveis para esse fins não se distinguem dos prédios já edificados que se encontrem classificados como comerciais, industriais ou para serviços.”

Além disso, o AIMI não onera a tributação de imóveis de luxo, como pretendia a Verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, mas pretende criar uma forma de financiamento do sistema de segurança social.

Acresce, a este respeito, que o Plenário do Tribunal Constitucional, através do acórdão n.º 378/2018, de 04-07-2018, julgou não inconstitucional a Verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, aprovada pela Lei n." 55-A/2012, de 29 de outubro, e alterada pela Lei n.° 83-C/2013, de 31 de dezembro, na parte que impõe a tributação anual sobre a propriedade de terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação e cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € l.000.000,00.

Nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, “as decisões do Tribunal Constitucional são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as dos restantes tribunais e de quaisquer outras autoridades”.

Assim, em função do decidido pelo Tribunal Constitucional tem de se concluir que as liquidações da Autoridade Tributária e Aduaneira que aplicaram a Verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo aos terrenos para construção, nas condições referidas, não enfermam dos vícios de inconstitucionalidade que lhes tinham sido imputados.

Deste modo e face ao exposto, julga-se ser de improceder, neste ponto, o alegado pela Requerente.

 

25. A Requerente alega depois que, no seu caso, os terrenos para construção são essenciais para a obtenção de rendimentos no âmbito da sua atividade económica devendo considerar-se excluídos de tributação (vd., n.ºs 14.5. a 14.12 infra).

O legislador na delimitação negativa da incidência do AIMI remete para tipologia de prédios, de acordo com a caracterização que o Código do IMI lhe atribui. A este respeito, concordamos com a Decisão Arbitral, de 04-05-2018, proferida no processo n.º 675/2017-T, ao afirmar: “Se tivesse sido mantida, na redação final do Orçamento, a intenção legislativa de afastar a incidência sobre os imóveis diretamente afetos ao funcionamento das pessoas coletivas, decerto teria sido mantida a referência a esta afetação que constava da proposta e que expressava claramente essa opção legislativa. Assim, tendo sido suprimida essa alusão à afectação dos imóveis, não há suporte legal para concluir que os prédios habitacionais e os terrenos para construção afectos ao funcionamento das pessoas colectivas não relevem para a incidência do AIMI. “.  E acrescenta “(…) em face do afastamento da redacção proposta em que se dava relevância à afectação dos imóveis, não há razão para concluir que o legislador não soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como tem de se presumir, por força do disposto no artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil.”

Efetivamente, entendemos que a posição segundo a qual o legislador pretendeu excluir os terrenos para construção do âmbito de incidência do AIMI para não sobrecarregar fiscalmente os sujeitos passivos que possuem este tipo de prédios, por efeito do seu objecto social, não tem sustentação na letra da lei.

O critério relevante para o legislador, no âmbito da sua margem de conformação, foi a classificação dos prédios face ao artigo 6.º do Código do IMI e não a afetação dos mesmos à atividade económica dos contribuintes.

Tendo o legislador definido uma cláusula de exclusão por referência expressa a certas espécies de prédios urbanos, que estão definidos na lei, não é possível efetuar uma interpretação extensiva para abranger outras tipologias que o legislador não contemplou.

A Decisão Arbitral, proferida no processo n.º 676/2017-T, refere, de forma pertinente, que:“A exclusão do imposto abrange, por conseguinte, os prédios classificados como comerciais, industriais ou para serviços, entendendo-se como tais os edifícios ou construções licenciados para esses efeitos ou que tenham como destino normal cada um destes fins. Abarca, para além disso, a espécie residual referida na alínea d) do n.º 1 desse artigo 6.º, aí se incluindo os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem prédios rústicos e ainda os edifícios e construções que se não enquadrem em qualquer das anteriores classificações. O âmbito de incidência objetiva, por efeito da remissão para aquele artigo 6.º, ficou assim definido não só por referência a uma certa espécie de prédios urbanos, mas também por referência ao procedimento administrativo através do qual foi efetuada a classificação ou, na falta de licença, à normal destinação desses prédios para os fins comerciais, industriais e serviços ou outros.”

Eventuais razões de política fiscal poderiam justificar conferir aos terrenos para construção destinados a edificações para fins comerciais, industriais ou para serviços o mesmo estatuto que veio a ser atribuído aos prédios classificados como “comerciais, industriais ou para serviços”, mas não foi essa a opção legislativa.

Consequentemente, o facto de a Requerente ser proprietária dos terrenos para construção, identificados nos autos, enquanto substrato da sua atividade económica não afasta a incidência do AIMI.

Não assiste, desta forma, razão à Requerente neste ponto.

26. As questões de inconstitucionalidade suscitadas nos presentes autos (vd., 14.13. a 14.19. supra) já foram analisadas por diversas decisões arbitrais em sentido contrário ao defendido pela Requerente, nomeadamente pela decisão arbitral proferida no processo n.º 690/2017-T, que o árbitro do presente processo subscreveu na qualidade de vogal do Tribunal Arbitral Coletivo.

27. A Requerente afirma a inconstitucionalidade resultante da discriminação contida na norma do artigo 135.º-B, n.º 2, do Código do IMI, quanto aos terrenos de construção relativamente aos prédios classificados como comerciais, industriais ou para serviços, que se encontram excluídos da tributação por força do disposto daquela norma. Só que importa salientar que estamos perante factos tributários diversos que configuram situações diferentes.

Numa situação, a lei sujeita a tributação terrenos urbanizáveis que constituem um ativo económico devido à sua aptidão para a construção. O terreno para construção tem um valor patrimonial próprio que constitui um indicador de capacidade contributiva independentemente da sua eventual e futura utilização no âmbito da construção.

Na outra situação, a lei exclui do imposto o património edificado com uma função instrumental relativamente à atividade produtiva. O património já construído que se encontre classificado como imóvel comercial, industrial ou para serviços tem já uma função instrumental relativamente a uma certa atividade produtiva que o legislador pretendeu salvaguardar, no âmbito da sua margem de livre conformação.

Assim, é possível descortinar um fundamento material suficiente que permite ao legislador distinguir, para efeito da tributação do património, entre esses diferentes factos tributários. Em suma, existe fundamento material suficiente para estabelecer a diferenciação de tratamento, em linha com o regime legalmente consagrado.

Como foi afirmado na Decisão Arbitral, de 04-05-2018, proferida no processo n.º 675/2017-T: “a titularidade de um património imobiliário de valor elevado evidencia, como em relação a qualquer proprietário de imóvel destinado a habitação, uma especial capacidade económica para poder contribuir adicionalmente para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, a que está consignada a receita do AIMI, e que «corresponde ao objetivo do programa do governo de alargar a base de financiamento da Segurança Social» (Relatório do Orçamento para 2017, página 57). Por isso, a imposição à generalidade dos detentores de imóveis habitacionais ou terrenos para construção de prédios habitacionais não se afigura materialmente inconstitucional, à face dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.”

Afiguram-se, assim, improcedentes os vícios de inconstitucionalidade alegados pela Requerente.

28. Relativamente à alegada violação do princípio da proporcionalidade (vd., 14.17. supra), cumpre sublinhar que o AIMI revela-se adequado e necessário ao objetivo de aumentar as receitas da Segurança Social e não ultrapassa uma medida razoável, designadamente quanto às pessoas coletivas, porque as taxas não são elevadas, o imposto pago é dedutível à matéria tributável de IRC, nos termos do artigo 135.º-J do Código do IMI. Além disso, são deduzidos valores significativos ao valor tributável, de acordo com o artigo 135.º-C do Código do IMI.

Por fim, não ficou demonstrado que os montantes arrecadados com a cobrança do AIMI ultrapassem o que é necessário para a finalidade de reforçar a sustentabilidade e estabilidade da Segurança Social.

Em suma, a Requerente não logrou demonstrar que se verifica uma violação do princípio da proporcionalidade.

 

IV – Decisão

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar improcedente o pedido de pronuncia arbitral e, em consequência, absolver a Requerida do pedido, com as devidas consequências legais.

 

V - Valor do Processo

Atendendo ao disposto nos artigos 32.º do CPTA, 306.º, n.º 2, do Código do Processo Civil e 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se o valor do processo em €10.894,99 (dez mil oitocentos e noventa e quatro euros e noventa e nove cêntimos).

VI - Custas

O montante das custas é fixado em € 918,00 (novecentos e dezoito euros) a cargo da Requerente, nos termos da Tabela I do RCPAT, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, bem como do disposto no artigo 4.º, n.º 4, do RCPAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 1 de março de 2019

 

 

O Árbitro

 

Olívio Mota Amador