Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 707/2018-T
Data da decisão: 2019-05-03   Outros 
Valor do pedido: € 45.248,83
Tema: Revogação dos atos tributários objeto do processo; Inutilidade Superveniente da Lide.
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DECISÃO ARBITRAL


 

I – Relatório

 

1. No dia 31.12.2018, a Requerente, A...– SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO MOBILIÁRIO, S.A., com o número de identificação fiscal..., com sede na..., nº ..., Direito, na qualidade de sociedade gestora e em representação do B...– Fundo de Investimento Imobiliário […], com o número de identificação fiscal..., requereu ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do artigo 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à anulação  das liquidações de imposto de selo com os números 2013..., 2013..., 2013..., 2013..., respeitantes  ao ano de 2012 e  2014..., 2014..., 2014..., relativos ao ano de  2013, referentes ao prédio inscrito na matriz sob o artigo matricial ...  da União das Freguesias  de ... e ..., Concelho de ... (artigo ... da extinta freguesia de ..., ao tempo dos factos)  e das liquidações com os números 2013..., 2013..., 2013... referentes ao prédio urbano com o artigo matricial..., da União das Freguesias da ..., Concelho de Lisboa (artigo..., da extinta freguesia de ..., ao tempo dos factos), e respeitantes  ao ano de 2012, no montante total de € 45.248,83, bem como dos atos de indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa apresentados pela Requerente contra estas liquidações.

A Requerente peticiona, ainda, a condenação da Requerida ao reembolso do valor das liquidações, que alega ter pagado, bem como os correspondentes juros indemnizatórios à taxa legal em vigor.

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do artigo 6.º, do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo, no prazo regularmente aplicável.

O Tribunal Arbitral foi constituído em 7 de março de 2019.

 

 

3. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, sinteticamente, os seguintes:

 

a.            O Fundo é proprietário do prédio urbano com o artigo matricial ... da União das Freguesias de ... e ..., Concelho de ... e do prédio urbano com o artigo matricial ... da União das Freguesias da ..., Concelho de Lisboa.

 

b.            As liquidações objeto do presente processo resultam, alegadamente, da aplicação pela Requerida do artigo 1º, nº 1 do Código de Imposto de Selo, conjugado com a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro e com o artigo 6º deste diploma legal.

 

c.            A Requerente não concorda com as liquidações em causa, porque ilegais, uma vez que o prédios inscrito na matriz como “terrenos para construção” não são subsumíveis no conceito de “prédio com afectação habitacional” previsto na referida verba 28.1, da Tabela Geral do Imposto do Selo (na sua redação inicial, aqui aplicável).

 

 

4. A ATA – Administração Tributária e Aduaneira, chamada a pronunciar-se, apresentou Requerimento do seguinte Teor:

 

“A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), entidade requerida no processo arbitral acima identificado, tendo sido notificada para responder nos termos e para os efeitos do art. 17º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro), vem dar conhecimento aos autos que não apresenta Resposta. 

 

Mais se comunica que o acto de liquidação de IMT impugnado foi revogado por Despacho do Director da U.G.C. (Unidade dos Grandes Contribuintes), de 21.02.2019, proferido na Informação nº ...-CIP1/2019, notificado ao requerente por ofício nº ... de 07.03.2019, conforme documento em anexo.”

 

 

5. Determinada a notificação da Requerente para se pronunciar sobre o requerimento apresentado pela Requerida, veio aquela dizer o seguinte:

“Na sequência do requerimento apresentado pela Fazenda Pública no passado dia 18.03.2019, e do despacho arbitral proferido hoje, vimos, pelo presente, informar que não mantemos o interesse no prosseguimento da acção, ao abrigo do disposto no n.º 2 do argo 13.º do RJAT, uma vez que o acto tributário impugnado foi objecto de revogação por parte da Autoridade Tributária.

Adicionalmente, requeremos que seja decretada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, bem como condenada a Autoridade Tributária no pagamento das custas do processo por lhe ser imputável a referida inutilidade, nos termos do disposto na alínea e) do argo 277.º e dos n.ºs 3 e 4 do argo 536.º, ambos do Código de Processo Civil.

Mais se informa que os montantes indevidamente liquidados, e cujo reembolso se peticionou, ainda não foram pagos pela Autoridade Tributária.”

 

6. Em 3.04.2019 foi proferido despacho arbitral do seguinte teor:

“ Uma vez que a Requerente refere, no seu requerimento de 20.03.2019  que “não mantemos o interesse no prosseguimento da acção”, requerendo que seja decretada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide e informando, simultaneamente,  que “os montantes indevidamente liquidados, e cujo reembolso se peticionou, ainda não foram pagos pela Autoridade Tributária” e tendo, ainda,  em conta o pedido de juros indemnizatórios formulado, enquanto não ocorrer o reembolso e o  pagamento de juros, manifestamente, não ocorre, quanto a esta parte do pedido, inutilidade superveniente,  notifique-se a  Requerente para, no prazo de dez dias:

a)            Esclarecer se desiste destes pedidos.

b)           Em caso de desistência, juntar procuração com poderes especiais de desistência daqueles  pedidos a favor da sua mandatária, tendo em conta que a procuração junta não inclui tais poderes.

 

Solicita-se, ainda, à  Requerente, caso entretanto ocorra o reembolso e o pagamento dos juro peticionados,  que informe o tribunal de tais factos.”

 

A Requerente nada disse no prazo indicado, nem posteriormente.

 

 

7. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.

O processo não padece de vícios que o invalidem.

 

II – A matéria de facto relevante

 

8. Consideram-se provados os seguintes factos:

1.            Por despacho do Exmo. Senhor Diretor da Unidade dos Grande Contribuintes, por delegação, proferido a 21/02/2019, foram revogados os atos tributários de liquidação objeto do processo, no valor total de € 45.248,33.

2.            Os pedidos de revisão oficiosa das liquidações objeto do processo foram apresentados em 12.11.2015.

 

9.Factos não provados

 

Com interesse para a decisão da causa, não se provou que a Requerente tenha pagado o montante das liquidações objeto do presente processo.

 

10.         A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto, relativamente à matéria de facto provada em no nº 1 dos factos provados, baseou-se em documento junto aos autos pela Requerida. Relativamente ao nº 2 da matéria de facto, a prova de tal resulta das decisões que incidiram sobre os pedidos de revisão juntos pela Requerente, donde consta tal facto, não objeto de contestação por qualquer das partes.

 

Quando à matéria de facto considerada não provada a decisão do tribunal resulta da ausência de prova sobre tal matéria, uma vez que a Requerente, para além de genericamente alegar que efetuou atempadamente o pagamento mas  sem concretizar a(s) respetiva(s) data(s), não juntou qualquer documento comprovativo, sendo que não  consta a certificação de tal  facto em nenhum dos documentos para pagamento  emitidos pela Requerida (juntos aos autos pela Requerente),  nos quais  inexiste qualquer menção na parte referente à “certificação do pagamento”.

 

 

-III- O Direito aplicável

 

11.          Conforme resulta provado, a Requerida revogou em 21.02.2019 os atos tributários objeto do presente processo.

                Face à extinção destes atos, torna-se inútil e inviável o prosseguimento da presente lide no que respeita à pretensão anulatória, uma vez esta incidia sobre atos que já não se mantêm na ordem jurídica.

Verifica-se a inutilidade superveniente da lide quando, por facto ocorrido na pendência da causa, a solução do litígio deixe de ter interesse e utilidade, o que justifica a extinção da instância (cfr. artigo 277.º, al. e), do Código de Processo Civil). Como referem LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA, RUI PINTO , a inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide “dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou se encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio”.

 

Como se refere na decisão proferida no processo 672/2018-T:

“Assim, se, por virtude de factos novos ocorridos na pendência do processo, o escopo visado com a pretensão deduzida em juízo já foi atingido por outro meio, então a decisão a proferir não envolve efeito útil, pelo que ocorre, nesse âmbito, inutilidade superveniente da lide.

                Decorre da actuação administrativa dada como provada que a pretensão formulada pela Requerente, que tinha como finalidade a declaração de ilegalidade e anulação por este Tribunal do acto sindicado, ficou prejudicada porquanto a supressão desse acto e seus efeitos da ordem jurídica foi conseguida por outra via, depois de iniciada a instância. Na verdade, a prática posterior do acto expresso de revogação da liquidação impugnada (cfr. art. 79.º, n.º 1 da LGT) implica que a instância atinente à apreciação da legalidade dessas liquidações se extingue por inutilidade superveniente da lide, dado que, por terem sido eliminados os seus efeitos pela revogação anulatória, perde utilidade a apreciação, em relação a tais liquidações, dos vícios alegados em ordem à sua invalidade, ficando sem objecto a pretensão impugnatória contra elas deduzida.”

Verifica-se, assim, a inutilidade superveniente da lide no que respeita ao pedido de anulação dos atos tributários objeto do presente processo.

 

12.         Questões diversas são as pretensões da Requerente referente à restituição dos impostos alegadamente pagos e a juros indemnizatórios, uma vez que, não tendo sido alegado pelas partes que tais pretensões tenham sido satisfeitas pela Requerida, não ocorre inutilidade superveniente relativamente às mesmas.

Todavia, como resulta do probatório, os alegados pagamentos não resultaram provados, não podendo, em consequência, deixar de ser julgados improcedente tais pedidos.

 

 

-IV- Decisão

 

 

Assim, decide o Tribunal arbitral:

a)            Julgar superveniente inútil a presente lide no que respeita ao pedido de anulação dos atos tributários objeto do processo, absolvendo-se a Requerida da instância, nesta parte.

b)           Julgar improcedentes os pedidos de condenação da Requerida à restituição do valor das liquidações, alegadamente pagos e a juros indemnizatórios.

 

Valor da ação: € 45.248,33 Quarenta e cinco mil duzentos e quarenta e oito euros e trinta e três  cêntimos) nos termos do disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

Custas pela Requerida, no valor de 2 142.00 € (dois mil cento e quarenta e dois euros) nos termos do nº 4, do artigo 22º do RJAT e do artigo 536.º, nº 3 do CPC aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT.

 

 

Notifique-se.

 

 

Lisboa, CAAD, 3.05.2019

 

 

O Árbitro

Marcolino Pisão Pedreiro